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literatura_infantojuvenil (1)

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Literatura
GISELE THIEL DELLA CRUZ
LUCIANA CAROLINA SANTOS ZATERA
Infantojuvenil
Literatura in
fan
tojuven
il
GISELE THIEL DELLA CRUZ / LUCIANA CAROLINA SANTOS ZATERA
Literatura
GISELE THIEL DELLA CRUZ
LUCIANA CAROLINA SANTOS ZATERA
Infantojuvenil
Literatura in
fan
tojuven
il
GISELE THIEL DELLA CRUZ / LUCIANA CAROLINA SANTOS ZATERA
Código Logístico
59640
Fundação Biblioteca Nacional
ISBN 978-85-387-6702-2
9 7 8 8 5 3 8 7 6 7 0 2 2
Literatura 
infantojuvenil 
Gisele Thiel Della Cruz 
Luciana Carolina Santos Zatera
IESDE BRASIL
2020
Todos os direitos reservados.
IESDE BRASIL S/A. 
Al. Dr. Carlos de Carvalho, 1.482. CEP: 80730-200 
Batel – Curitiba – PR 
0800 708 88 88 – www.iesde.com.br
© 2020 – IESDE BRASIL S/A. 
É proibida a reprodução, mesmo parcial, por qualquer processo, sem autorização por escrito das autoras e do 
detentor dos direitos autorais.
Projeto de capa: IESDE BRASIL S/A. Imagem da capa: Popmarleo/Shutterstock
CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO NA PUBLICAÇÃO 
SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ
D398L
Cruz, Gisele Thiel Della
Literatura infantojuvenil / Gisele Thiel Della Cruz, Luciana Carolina 
Santos Zatera. - 1. ed. - Curitiba [PR] : Iesde, 2020.
136 p. : il.
Inclui bibliografia
ISBN 978-85-387-6702-2
1. Literatura infantojuvenil - História e crítica. 2. Literatura infantojuve-
nil brasileira. 3. Leitura - Estudo e ensino. I. Zatera, Luciana Carolina Santos. 
II. Título.
20-67284 CDD: 808.899282
CDU: 82-93(81).09
Gisele Thiel Della Cruz Doutora em Estudos Literários e mestra em História 
do Brasil pela Universidade Federal do Paraná (UFPR). 
Especialista em Escola e Currículo pela Pontifícia 
Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ). 
Graduada em História pela Universidade Federal 
do Rio Grande (FURG), em Letras pela Universidade 
Federal do Paraná (UFPR) e em Pedagogia pelo Centro 
Universitário Internacional Uninter. É professora de 
História e de Literatura no ensino médio. No ensino 
superior, leciona em cursos de Pedagogia, Arquitetura, 
Letras e História, além de coordenar cursos de 
graduação em Letras e História (EAD). Produz material 
didático para a educação a distância.
Luciana Carolina 
Santos Zatera
Mestra em Educação pela Pontifícia Universidade 
Católica do Paraná (PUC-PR) e licenciada em Letras-
-Português pela mesma instituição. Licenciada 
em Pedagogia e História pelo Centro Universitário 
Internacional Uninter. Atua como professora em 
cursos superiores de Pedagogia e Letras há onze anos 
nas modalidades presencial e EAD. É professora de 
Língua Portuguesa da Educação Básica há vinte anos. 
Coordena curso de licenciatura em Letras-Português 
a distância. Publica trabalhos nas áreas de literatura 
infantil e escreve livros e materiais destinados às áreas 
de metodologias de ensino e práticas pedagógicas, 
especialmente voltadas à aprendizagem da linguagem. 
Agora é possível acessar os vídeos do livro por 
meio de QR codes (códigos de barras) presentes 
no início de cada seção de capítulo.
Acesse os vídeos automaticamente, direcionando 
a câmera fotográ�ca de seu smartphone ou tablet 
para o QR code.
Em alguns dispositivos é necessário ter instalado 
um leitor de QR code, que pode ser adquirido 
gratuitamente em lojas de aplicativos.
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SUMÁRIO
1 História da literatura infantil 9
1.1 O nascimento da infância 10
1.2 A literatura burguesa 12
1.3 A literatura infantil 15
1.4 Alguns clássicos dos séculos XVIII e XIX 19
2 Literatura infantil no Brasil 26
2.1 As primeiras obras de literatura infantil no Brasil 26
2.2 Monteiro Lobato: um novo paradigma da literatura infantil 33
2.3 A literatura infantil entre 1940 e 1960 40
2.4 Literatura infantil brasileira contemporânea: de 1970 
 – atualidade 43
3 A literatura infantojuvenil na escola 50
3.1 Encaminhamentos metodológicos para a literatura 
 infantojuvenil 50
3.2 As narrativas 58
3.3 A poesia e o teatro 65
3.4 O livro infantil e as ilustrações 72
4 Formação de leitores: estratégias e projetos 79
4.1 O papel do professor e a formação do leitor 80
4.2 Estratégias de leitura 85
4.3 A escolha do livro literário e o Método Recepcional 89
4.4 Sugestões de trabalho com a literatura infantojuvenil 93
5 A leitura da literatura: imagens e palavras 102
5.1 A literatura infantil e o intertexto 103
5.2 O livro de imagem infantil 109
5.3 Novos temas para a literatura infantil 116
5.4 A periferia da escrita na literatura juvenil 122
 Gabarito 130
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Este livro abordará quatro temas-chave na literatura 
infantojuvenil: sua história, sua estruturação, sua projeção 
ao longo do tempo e sua metodologia de ensino. Ao pensar 
a literatura infantil é impossível não associá-la aos conceitos 
e condicionantes básicos: a literatura e a educação. Por isso, 
a historicidade da literatura infantil se confunde, em grande 
medida, com a trajetória da pedagogia. 
A condução desta obra será alicerçada, primeiramente, no 
surgimento da literatura infantojuvenil, em suas transformações 
e reformulações. Já em um segundo momento, serão 
aprofundados autores e teorias fundamentais, que estudam a 
função estética da literatura e as metodologias necessárias para 
o trabalho docente com as práticas de leitura. 
Considerando as reflexões que tomaram como base os textos 
de criação, serão propostas metodologias já desenvolvidas por 
estudiosos do tema, bem como teorias fundamentais para a 
compreensão do texto de literatura infantojuvenil. Ainda, visando 
à formação leitora de crianças e jovens, serão apresentadas 
sugestões de leitura de obras de importante circulação nacional. 
Desse modo, o conteúdo deste livro pretende contribuir para a 
formação teórica e prática daqueles que se dedicam à docência e/
ou à formação de leitores.
No primeiro capítulo, a abordagem irá centrar-se na 
trajetória histórica da literatura infantil, tendo como referência 
os primeiros clássicos que surgiram no fim do setecentos e 
início do oitocentos. As discussões a respeito da relação entre 
a sociedade burguesa industrial, o pensamento educacional e a 
literatura voltada à criança serão os norteadores do texto. Ainda, 
serão apresentadas análises e referências quanto às alterações 
estruturais e composicionais das obras infantis, tais como a voz 
narrativa e a personagem, elementos de grande relevância na 
ficção infantil. 
O segundo capítulo irá tratar da produção infantojuvenil brasileira 
desde o seu início – no fim do século XIX – até a contemporaneidade. 
Com base em temas, obras e autores, a cronologia será delineada, 
APRESENTAÇÃO
Vídeo
8 Produção e interpretação de Textos
bem como a formação da literatura infantil no país, com o objetivo de auxiliar na 
compreensão dos fatores históricos de cada época e sua influência na criação 
literária. Nesse percurso, ganhará destaque a obra lobatiana e suas contribuições 
para o amadurecimento e para a envergadura da literatura infantil nacional. 
Já o terceiro capítulo apresentará possibilidades de abordagem do texto 
literário em sala de aula, destacando a função da literatura enquanto direito 
humano. Nesse sentido, será evidenciada a concepção sociointeracionista, 
que considera o leitor como sujeito ativo, capaz de dar sentido ao que lê. 
Ainda, quanto ao texto, serão abordados os gêneros literários, os elementos 
da narrativa e as ilustrações no livro infantil. No que se refere às orientações 
nacionais sobre o ensino da literatura, o capítulo irá expor as recomendações 
presentes nos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) e os direcionamentosfeitos pela Base Nacional Comum Curricular (BNCC). 
O quarto capítulo discorrerá sobre a formação leitora e a mediação 
literária. Ao longo do texto, serão apresentadas estratégias de compreensão 
leitora, embasadas por autores que trabalham a temática. Ainda, haverá 
uma discussão em relação ao papel do professor como mediador, além de 
sugestões metodológicas para as práticas de leitura na escola. 
Por fim, o capítulo cinco contará com possíveis leituras e análises de 
textos literários verbais e não verbais. Nele, há sugestões de metodologias de 
leitura e abordagens de textos imagéticos, tendo como referência a semiótica 
e/ou teorias que discutem o símbolo e a construção iconográfica. Também 
serão apresentadas obras que tratam de temas relevantes para a sociedade 
atual e que são fundamentais para a formação do indivíduo: o preconceito, 
a identidade, as diferenças geracionais, a traição, o desamor, a morte, as 
variações de modelos familiares, entre outros. Nesse sentido, a ideia central 
será trazer à tona temáticas necessárias ao repertório de leitura, tanto de 
professores quanto de alunos, e que devem ser vistas e lidas – obras que 
sejam instigantes, questionadoras e críticas. Por isso, o espaço da narrativa 
será plural: descrito no circo, na favela, na escola, na casa desfeita e na cidade 
composta pela diversidade da população.
Dessa forma, espera-se que esse percurso proporcione aprendizados, 
experiências, descobertas e encantamento pela leitura literária.
História da literatura infantil 9
1
História da literatura infantil
A história da literatura infantil, em grande medida, confunde-se 
com a história da infância burguesa. Pensar a literatura infantil no fim 
do século XVIII significa também refletir sobre a concepção de infância 
experienciada naquele contexto.
A infância, tal qual a conhecemos hoje, está bem distante daquela 
dos tempos medievais. O conceito, ou a noção de infância, constituiu- 
-se progressivamente ao longo da transição do medievo para a Idade 
Moderna e foi, aos poucos, ganhando os contornos do atual modelo 
de infância: a criança como um ser sob a proteção da família, a qual, 
de certa forma, coloca sobre ela os desejos de um bom futuro. Um 
ser protegido e cuidado, além de ser, ao mesmo tempo, visto como 
alguém em fase formativa.
Quando acontece, ao longo do século XVIII, uma grande transforma-
ção na Europa em decorrência do início da industrialização e dos questio-
namentos ao Antigo Regime, uma onda de revoluções burguesas coloca 
todo um modelo social, político e econômico em questionamento. Esse 
período é considerado o Século das Luzes, o Iluminismo, o qual, dentre 
tantas renovações, instaura uma nova concepção sobre a forma de a 
Europa e o mundo se organizarem. O mundo dos séculos XVIII e, princi-
palmente, XIX introduz uma sociedade de cunho burguês em que, sob ela, 
estão estabelecidos novos valores e novas preocupações.
A família e a criança da sociedade burguesa industrial, de final do 
setecentos e do oitocentos, são mais centradas e individualistas, mais 
moralistas e ambiciosas. A infância, como faixa etária diferenciada, é 
um dos arquétipos desse modelo doméstico, de um indivíduo mere-
cedor de cuidados e cujo futuro deve garantir um universo saudável e 
maduro intelectualmente. Esse modelo se tornou a conduta da classe 
média em ascensão.
Já a família moderna desse novo período se institui sob uma orga-
nização mais fechada, de caráter nuclear, em que os filhos precisam de 
um espaço onde esses valores possam ser experimentados: a escola. 
Inicialmente, o lugar da norma e da disciplina. Tratados pedagógicos e 
estudos são direcionados à infância. Há a preocupação, também, com 
uma literatura dirigida ao público jovem. Não é à toa que surgem as 
literaturas infantis dos séculos XVIII e XIX, condicionadoras de um estilo 
de vida, impositivas e moralizantes, apesar de bastante imaginativas, 
criativas e divertidas.
10 Literatura infantojuvenil
1.1 O nascimento da infância 
Vídeo A origem da literatura infantojuvenil está vinculada a um contexto 
histórico bastante específico, o qual remonta à constituição da socieda-
de burguesa industrial do século XVIII. Nessa sociedade, está em cons-
trução a noção de infância, que está sofrendo modificações ao passar 
do século. Com isso, a criança passou a ser um indivíduo que precisava 
de tratamento diferenciado e, ao mesmo tempo, de possibilidades for-
mativas e morais. Essa nova abordagem em relação à infância é cons-
truto da modernidade. Isto é, até a passagem da Idade Média (séculos 
V ao XV) para a modernidade, a criança era vista como um adulto em 
miniatura, conceituação sugerida por Philippe Ariès (1981) e por outros 
historiadores da infância e da família.
Nesse universo medieval, as estruturas feudais eram extremamen-
te rígidas. A ascensão social ou a produção em larga escala não faziam 
parte do que se denominava como feudalismo. O mundo feudal, cris-
talizado e restritivo, garantia às famílias a sobrevivência de poucas 
crianças; além do trabalho pesado, principalmente para aqueles na 
condição de servos. Havia, nesse contexto, apenas duas possibilidades 
sociais ditadas pelo nascimento: a servidão e a nobreza.
Nesse momento da história, de acordo com Ariès (1981), as crian-
ças nobres experimentavam uma forma de ensino bastante peculiar: 
a aprendizagem, costume que foi sendo difundido na Inglaterra. Du-
rante o tempo em que ficavam em casas de estranhos, as crianças 
executavam serviços pesados e eram então confiadas a mestres. Essa 
aprendizagem era uma forma de ensino e, de certa maneira, de esta-
belecer laços, o que podemos denominar de sociabilidade. No entanto, 
esse cenário não se estendia a toda população, uma vez que servos 
(camponeses) não participavam dessa forma de educação.
Com isso, podemos compreender que, para Ariès (1981, p. 228),
o serviço doméstico se confundia com a aprendizagem, como 
uma forma muito comum de educação. A criança aprendia pela 
prática, e essa prática não parava nos limites de uma profissão, 
ainda mais porque na época não havia (e por muito tempo ainda 
não haveria) limites entre a profissão e a vida particular; a par-
ticipação na vida profissional – expressão bastante anacrônica, 
aliás – acarretava a participação na vida privada, com a qual se 
confundia aquela. Era através do serviço doméstico que o mestre 
O historiador Philippe Ariès é um 
dos primeiros pesquisadores a 
descrever a história da infância 
em sua obra denominada 
História social da criança e da 
infância, escrita na década 
de 1970. Nela, por meio de 
diferentes fontes históricas, 
mas principalmente por meio 
da iconografia, o historiador 
identificou as diferentes posições 
que a criança foi obtendo no seio 
da família. As primeiras refe-
rências da arte medieval, ainda 
no século XII, desconheciam a 
infância ou não a representa-
vam. Algumas apresentavam 
miniadultos (pequenos homens) 
sem nenhuma característica de 
infância. A partir do século XIII, 
há modificações consideráveis, 
em muito associadas a imagens 
de santos e anjos. Já nos séculos 
XV e XVI, as cenas se modificam: 
a criança é vista com a família, 
com jogos, na multidão (mas 
ressaltada), no colo da mãe, 
dentre outras manifestações. 
Portanto, a criança no centro da 
pintura e agraciada pela família 
é uma representação moderna e 
foi o ponto-chave da discussão 
proposta por Ariès.
Curiosidade
História da literatura infantil 11
transmitia a uma criança, não ao seu filho, mas ao filho de outro 
homem, a bagagem de conhecimentos, a experiência prática e o 
valor humano que pudesse possuir.
Já ao fim da Idade Média, período denominado Baixa Idade Média, 
com o renascimento das atividades comerciais e das cidades surgiu 
uma nova classe social: a burguesia. Essa burguesia, especificamente 
a do medievo, vivia das práticas da produção artesanal e/ou manufa-
tureira e das atividades bancárias ou comerciais. É nesse momento 
que as crianças, segundo Ariès, passama frequentar espaços especí-
ficos para a sua formação, em detrimento das práticas de aprendiza-
gem adotadas pela nobreza e que demandavam o fortalecimento de 
laços entre as famílias, as alianças e as longas temporadas nas casas 
de outros nobres.
A partir do século XV, as realidades e os sentimentos da família 
se transformariam: uma revolução profunda e lenta, mal perce-
bida tanto pelos contemporâneos como pelos historiadores, e 
difícil de reconhecer. [...] Dessa época em diante, ao contrário, 
a educação passou a ser fornecida cada vez mais pela escola. A 
escola deixou de ser reservada aos clérigos para se tornar um 
instrumento normal da iniciação social, da passagem do estado 
da infância ao do adulto. (ARIÈS, 1981, p. 231)
As escolas, agora destinadas à burguesia, criam ao mesmo tempo 
a possibilidade de distanciamento e de retorno para casa. É a partir 
desse momento que, segundo Ariès (1981), surgem os sentimentos 
de saudade, de retorno ao lar, de afetividade, permitindo que sejam 
constituídos laços importantes para a construção da família moderna 
e da infância.
No século XVIII, as grandes transformações na sociedade e a 
aceleração de um mundo ditado pela industrialização constituíram um 
novo fenômeno que alimentará um modo de vida contemporâneo. 
Com isso, a burguesia industrial em ascensão diferenciou-se da 
burguesia na Baixa Idade Média e configurou um padrão diferente de 
comportamento, acompanhado de uma nova moral. As necessidades 
de “classe”, em grande medida definida por seus valores e suas 
formas de vida como classe média, constituiu um modelo que se 
estendeu pelos séculos seguintes. Inicialmente, esse comportamento 
mais regrado, contido e disciplinado foi a marca desse grupo social e, 
consequentemente, estendeu-se à vida operária, ou seja, a burguesia 
exercia um controle sobre as classes consideradas inferiores.
12 Literatura infantojuvenil
De acordo com Zilberman (2003, p. 17): “A ficção do século XVIII 
está impregnada pela propagação dessa visão de mundo: ao mesmo 
tempo que diagnostica a decadência da aristocracia tradicional [...], 
qualifica positivamente aspectos relativos à vida burguesa ascen-
dente”. Desse modo, a criança e a família burguesas fomentaram 
um estilo de vida e uma visão de mundo que foram reproduzidos 
e firmados pela escola e pela ficção. Valores como vida doméstica, 
solidariedade e afeto entre os membros, privacidade e intimidade 
familiar compuseram esse cenário. 
1.2 A literatura burguesa 
Vídeo A burguesia do século XVIII tem novos traços e exige cada vez mais 
uma formação adequada para suas crianças. As transformações são 
cruciais para que a escola e a pedagogia ocupem um lugar importante 
na formação moral da infância. Por isso, o Século das Luzes colaborou 
na complementação de um processo que se iniciou na Idade Média: a 
decadência das linhagens, a desvalorização dos laços de parentesco e, 
em contrapartida, a formação da unidade familiar e dos laços afetivos.
De acordo com Zilberman (2003, p. 133),
A ascensão da ideologia burguesa a partir do século 18 modifica 
esta situação: promovendo a distinção entre o setor privado e 
a vida pública, entre o mundo dos negócios e a família, provoca 
uma compartimentação na existência do indivíduo, tanto no âm-
bito horizontal, opondo casa e trabalho, como na vertical, sepa-
rando a infância da idade adulta e relegando aquela à condição 
de etapa preparatória aos compromissos futuros.
Nesse cenário, a educação ganhou terreno importante no que 
se refere aos cuidados e às orientações que devem ser fornecidos à 
criança. O objetivo era garantir a formação de um adulto que estivesse 
de acordo com as demandas sociais daquele contexto, uma vez que 
a escola se tornou um espaço de normas e controle que, às vezes, 
tornavam-se muito mais presentes do que a formação intelectual.
De acordo com Zilberman (2003), a escola deveria ajudar a projetar 
a ideia de uma infância frágil e que, ao mesmo tempo, precisava ser 
incorporada à vida adulta. Como instituição de ensino, deveria auxiliar 
na proteção da criança em relação ao mundo exterior, impondo sua au-
toridade no espaço da sala de aula. Além disso, a escola tinha também 
História da literatura infantil 13
como diretriz o ato de impor limites, visando à homogeneidade – to-
dos iguais e voltados para um sujeito que tem autoridade: o professor. 
Portanto,
[...] a escola participa do processo de manipulação da criança, 
conduzindo-a ao respeito da norma vigente, que é também a da 
classe dominante, a burguesia, cuja emergência, como se viu, de-
sencadeou os fatos até aqui descritos. A literatura infantil, por 
sua vez, é outro dos instrumentos que têm servido à multiplica-
ção da norma em vigor. Transmitindo, em geral, um ensinamento 
conforme a visão adulta de mundo, ela se compromete com pa-
drões que estão em desacordo com os interesses do jovem. Con-
tudo, pode substituir o adulto, até com maior eficiência, quando 
o leitor não está em aula ou mantém-se desatento às ordens dos 
mais velhos. Ocupa, pois, a lacuna surgida nas ocasiões em que 
os maiores não estão autorizados a interferir, o que acontece 
no momento em que os meninos apelam à fantasia e ao lazer. 
(ZILBERMAN, 2003, p. 23)
Por fim, pode-se afirmar que a escola e a literatura, em grande parte 
do oitocentos, forjaram um comportamento para a infância e uma voz 
para a criança.
No entanto, a literatura infantil surge quase ao mesmo tempo que 
a narrativa romance. O romance, segundo Ian Watt (1990) em seu livro 
A ascensão do romance, surgiu ao fim do século XVIII e tem estreita re-
lação com o despontar do que definimos como burguesia industrial. O 
comportamento individualista e o espírito competitivo foram bastante 
favoráveis ao florescimento desse formato de narrativa.
Essa nova expressão literária quebrava um modelo de recepção co-
letiva da arte, como o drama nos teatros, os recitais de poesia e os 
saraus. Em seu lugar, a leitura do romance garantia uma recepção in-
dividual da leitura, na sala, no escritório, no quarto. Segundo o autor, 
até as personagens da trama são encaradas como indivíduos particula-
res. O romance deixa a tradição das histórias atemporais para fazer do 
tempo uma das características definidoras de sua essência. De acordo 
com Watt (1990, p. 22):
Em nada o romance é tão característico de nossa cultura como 
a forma pela qual reflete essa orientação típica do pensamento 
moderno. E. M. Forster considera o retrato da ‘vida através do 
tempo’ como a função distintiva que o romance acrescentou à 
preocupação mais antiga da literatura pelo retrato da ‘vida atra-
vés de valores’.
14 Literatura infantojuvenil
Além de Edward Morgan Forster, outros pensadores identificaram o 
romance moderno como uma forma literária capaz de dar conta da to-
talidade da vida ou como uma espécie de narrativa que estabelece uma 
aliança entre o tempo e o homem. Por fim, segundo Watt (2007), o ro-
mance é o “relato autêntico das verdadeiras experiências individuais”.
O crescimento da população em Londres acarretou maneiras es-
pecíficas de viver na cidade industrial: a proximidade física, a distância 
social e a ênfase nos valores materiais. A cidade exige segurança emo-
cional e intimidade dos relacionamentos pessoais. Por isso, a natureza 
privada da leitura do romance, que censura atitudes públicas, alimenta 
a individualidade e assegura sentimentos e fantasias privadas. Além 
disso, com o decorrer do tempo, a forma romance, no denominado ro-
mance romântico da virada do século XVIII para o XIX, evoluiu de modo 
exponencial, e editores, autores e administradores de bibliotecas pro-
duziam essa narrativa em grande escala.
Desse modo, a tematização do indivíduo resultou nessa forma 
narrativa definida como romance moderno. O cotidiano burguês fez 
surgir narrativas de cunho psicologizante. A crítica literária da época, que 
observava esse modelo de texto de criação, procurou explicar o modo 
de ser das personagens, relacionando a sua constituição àvida do autor.
Os romances românticos, os primeiros surgidos nesse período, traziam 
na trama um tom sentimental vivenciado pelos heróis românticos, ge-
ralmente belos e corajosos e por heroínas puras, frágeis e capazes de 
muitos sacrifícios em nome do amor. Qualquer comportamento que 
fizesse oposição à moral e à ordem, no enredo da ficção romântica, era finalizado, obri-
gatoriamente, pela falta do final feliz e pelo tom de castigo. Muitos heróis enfrentam 
mentiras, ódios e incompreensões. Um traço bastante acentuado no romance românti-
co é a valorização da família e a defesa do casamento. Nesse sentido, o romance valoriza 
o namoro casto e puro, bem como um casamento com um lar estável.
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Foi com base nesse tipo de romance que a literatura infantil en-
fatizou, em suas narrativas, a moral, a obediência, o controle, entre 
outras características dos contos de fadas e das histórias que foram 
criadas ainda nos séculos XVIII e XIX. O adulto que fala pela criança 
e que, ao final, ensina o bom comportamento e o desfecho com a 
moral da história são aspectos típicos das primeiras obras de ficção 
dedicadas ao público infantil.
História da literatura infantil 15
A respeito disso, e com base nos estudos de Zilberman (2003, p. 23),
Nessa medida, também a obra literária pode reproduzir o mundo 
adulto: seja pela atuação de um narrador que bloqueia ou censu-
ra a ação de suas personagens infantis; seja pela veiculação de 
conceitos e padrões comportamentais que estejam em conso-
nância com os valores sociais prediletos; seja pela utilização de 
uma norma linguística ainda não atingida por seu leitor, devido 
à falta de experiência mais complexa na manipulação da lingua-
gem. Assim, os fatores estruturais de um texto de ficção – narra-
dor, visão de mundo, linguagem – podem-se converter no meio 
por intermédio do qual o adulto intervém na realidade imaginá-
ria usando-a para incutir sua ideologia.
Com base nos contextos históricos que estudamos até aqui, que 
tal nos aprofundarmos e pensarmos mais sobre essa literatura que se 
constituiu para o universo infantil a partir do fim do século XVIII? Va-
mos entendê-la um pouco mais e verificar quais são as suas principais 
características.
1.3 A literatura infantil 
Vídeo Ligada à missão pedagógica da escola, a literatura infantil tem 
como objetivo moldar o indivíduo para a sociedade, tendo como prin-
cipal característica o caráter formativo. Esse processo, que forma por 
meio da leitura e colabora na (re)produção de valores de um compor-
tamento burguês, está presente, como já comentamos, também nos 
romances românticos do fim do século XVIII e da primeira metade do 
século XIX.
Em suma, pode-se dizer que a literatura infantojuvenil foi constituí-
da com base em um material literário já existente e de vertente adul-
ta. Os contos de fadas, por exemplo, foram retirados de uma tradição 
oral, de origem adulta, e adaptados ao universo infantil. Outro fator 
importante a respeito dessa literatura é que, em sua essência, ao ser 
produzida para o leitor infantil e jovem, deveria ter uma referência final 
que elabora, de modo explícito ou não, a moral da história e uma voz 
narrativa que, de maneira constante, manifesta a fala e os ensinamen-
tos adultos.
Desse modo, ao utilizar essa literatura dentro da escola burguesa, 
garantiu-se o processo formativo das crianças com base na seleção de 
16 Literatura infantojuvenil
aspectos, características e temas que contribuíam para a formação de 
um bom cidadão. E foi com base na escolha desses textos, adaptados 
de obras adultas, que se gerou um grande interesse pedagógico por 
parte das escolas, interesse que estava muito além da fruição do texto 
enquanto literatura.
Desse modo, para Zilberman (1987, p. 44):
Fomentando a necessidade da formação pessoal de tipo cognitivo 
e ético, a pedagogia encontra um lugar destacado no contexto da 
configuração e transmissão da ideologia burguesa. A literatura 
infantil emerge dentro desse panorama, contribuindo para a 
preparação da elite cultural, pela reutilização do material literário 
oriundo de duas fontes distintas e contrapostas: a adaptação dos 
clássicos e dos contos de fadas de proveniência folclórica. 
Com o passar do tempo, já na virada do século XIX para o XX, as nar-
rativas começaram a apresentar personagens infantis menos dependen-
tes da voz adulta, sendo representadas pela instância do narrador, mais 
autônomas em suas atitudes. Aos poucos, a moral da história também 
vai deixando de ser o fio condutor e o desfecho do enredo. Esse amadu-
recimento tem seu auge já na segunda metade do século XX e aparece, 
explicitamente, na produção da literatura infantojuvenil brasileira.
Recentemente, a crítica e a teoria literária, vertentes de estudo da lite-
ratura, também passaram a fazer do texto literário infantil um objeto de 
análise. O gênero passou a ser estudado não somente nos cursos de Pe-
dagogia, como também nos cursos de Letras. Por esse motivo, sobre a fic-
ção infantil recaíram as noções de arte literária e de público especializado.
Segundo Zilberman (2003, p. 25), é possível perceber que:
A literatura infantil atinge o estatuto de arte literária e se dis-
tancia de sua origem comprometida com a pedagogia quando 
apresenta textos de valor artístico a seus pequenos leitores, e 
não é porque estes ainda não alcançaram o status de adultos 
que merecem uma produção literária menor. [...] Em vista disso, 
a grande carência dela é o conhecimento de si mesma e do am-
biente no qual vive, que é primordialmente o da família, depois o 
espaço circundante e, por fim, a história e a vida social. O que a 
ficção lhe outorga é uma visão de mundo que ocupa as lacunas 
resultantes de sua restrita experiência existencial, por meio de 
sua linguagem simbólica.
História da literatura infantil 17
Quadro 1
Personagem, narrador e valor pedagógico na literatura infantil
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SÉCULO XVIII E INÍCIO 
DO XIX
• A criança sob a voz do adulto.
• A linguagem é composta por 
uma intermediação entre a 
criança e o adulto.
• A criança não percebe por 
conta própria. A realidade 
é apresentada de maneira 
sistemática.
• Enredos com desfechos 
pedagogizantes, sustentados 
na moral da história.
SEGUNDA METADE DO 
SÉCULO XIX
• A personagem infantil 
independente e criativa.
• Meninos e meninas passaram 
a protagonizar o gênero.
• Bonecos são humanizados.
O leitor encontra um elo visível 
com o texto. 
• A voz das personagens é 
relativizada pelas indicações 
do narrador. O texto literário 
demanda a interpretação do 
leitor. 
• Identificação da criança 
leitora com o herói da ação.
• Modificação de temas e 
técnicas. 
• Desfecho que provoca 
reflexão.
SÉCULO XX
• Amadurecimento da 
personagem infantil.
• Equilíbrio entre o respeito 
ao universo em formação 
da criança e os meios 
linguísticos que representam.
• Textos com consciência 
verbal, que assumem sua 
natureza cultural e ideológica.
• O texto literário demanda a 
interpretação do leitor. 
• Fabulação que desperta para 
as questões sociais.
• Temas amplos relacionados 
às questões sociais.
• Desfecho que provoca 
reflexão.
Fonte: Elaborado pelas autoras.
Padrões estéticos e modelos preestabelecidos para o texto literário 
infantojuvenil que antes garantiam a disseminação de valores conser-
vadores e moralistas foram gradativamente substituídos por temas e 
questões polêmicas que, em certa medida, ora privilegiam o caráter 
literário do texto ora são condicionantes para ele. Esse movimento foi 
sentido já na segunda metade do século XX. No Brasil, por exemplo, 
essas características aparecem na literatura infantojuvenil produzidas 
nos anos de 1960 e 1970.
No início de sua produção, a literatura infantojuvenil esteve asso-
ciada, basicamente, aos contos de fadas; uma vez que foram estes os 
primeiros materiais direcionados a um público com faixa etária especí-
fica. As adaptações feitas por CharlesPerrault são os primeiros textos 
com essa finalidade. Os autores que vieram em sequência continuaram 
adaptando, de fontes folclóricas, contos em que a presença do maravi-
lhoso foi se tornando constante.
Com isso, a característica do maravilhoso nessas narrativas se 
tornou, de fato, uma das marcas da literatura infantojuvenil: ações 
18 Literatura infantojuvenil
impossíveis de acontecerem na realidade e seres sobrenaturais, 
como duendes, dragões, bruxas, magos e gigantes eram parte 
essencial das histórias. No entanto, a produção com um viés realista 
também está incorporada nessa literatura e tem como objetivo 
inserir, por meio do cotidiano da criança – ou próximo a ele –, 
algumas visões de mundo.
Com base nessas proposições, um texto mais realista ou de cará-
ter maravilhoso permite questionamentos que partem de dois prin-
cipais pontos: um defende a necessidade da fuga do maravilhoso 
e a preparação da criança para viver em um mundo real; e outro 
defende a necessidade do recurso da fantasia para garantir a saúde 
psíquica e o imaginário infantil.
Esses questionamentos estiveram muito mais presentes nos 
anos de 1950. Na produção atual, nas discussões e nos estudos 
referentes a essas indagações, alguns pontos já estão mais diluídos. 
Mas para que isso aconteça cada vez mais, são feitas releituras 
de contos de fadas e discussões que se propõem a ponderar as 
questões sociais com o intuito de trabalhar a consciência crítica do 
leitor. Para Coelho (2000, p. 52), essas ponderações são proposições 
feitas para a literatura em geral:
É importante notar que a atração de um autor pelo ‘registro 
realista’ do mundo à sua volta ou pelo ‘registro fantasista’ re-
sulta de sua intencionalidade criadora: ora ‘testemunhar a rea-
lidade’ (o mundo, a vida real...) ‘representando-a’ diretamente 
pelo ‘processo mimético’ (pela imitação fiel), ora ‘descobrir o 
outro lado’ dessa mesma realidade, o não imediatamente vi-
sível ou conhecido – transfigurando-a pelo ‘processo metafó-
rico’ (representação figurada). Nesse caso, a matéria literária 
identifica-se não com a ‘realidade concreta’, mas com a ‘rea-
lidade imaginada’, com o sonho e a fantasia, o imaginário, o 
desconhecido.
Uma metodologia para trabalhar o texto literário infantojuvenil, se-
gundo Costa (2013), precisa distinguir dois principais fatores: o mora-
lizador e o imaginativo. Para isso, o leitor deve ter, em sua formação, 
ferramentas que o habilitem para o prazer da leitura e a compreensão 
de uma literatura significativa.
Em suma, independentemente do fio condutor da narrativa, am-
bas falam da realidade humana ou, no caso que nos interessa aqui, 
da vida da criança. Nenhuma tendência é mais importante do que a 
Para aprofundarmos 
um pouco mais nosso 
estudo, que tal ouvirmos 
a opinião de um dos 
maiores escritores de li-
teratura infantojuvenil no 
Brasil, Ziraldo, a respeito 
da importância da litera-
tura desse gênero?
Disponível em: https://
www.youtube.com/
watch?v=VCRKrxxHYtg. Acesso em: 
4 set. 2020.
Vídeo
https://www.youtube.com/watch?v=VCRKrxxHYtg
https://www.youtube.com/watch?v=VCRKrxxHYtg
https://www.youtube.com/watch?v=VCRKrxxHYtg
História da literatura infantil 19
outra. Além disso, segundo Coelho (2000), o fundamental é como a 
obra se configura e como ela, de acordo com seus elementos, deve 
ser recebida e interpretada pelo leitor.
1.4 Alguns clássicos dos séculos XVIII e XIX 
Vídeo Conforme estudamos neste capítulo, o século XVIII é o século da 
racionalidade das luzes e do desenvolvimento do processo de indus-
trialização. Concomitantemente, a Europa experimenta a ascensão 
do pensamento liberal econômico e político, além da queda de regi-
mes absolutistas.
Com isso, a alfabetização nas escolas garantiu à burguesia 
uma formação intelectual e, ao mesmo tempo, o endosso 
de seus valores. No setecentos, circulavam nas escolas as 
fábulas de Jean de La Fontaine, de François Fénelon e de 
Charles Perrault. Além delas, estavam presentes adaptações 
de clássicos como Robinson Crusoé, de Daniel Defoe, 
publicado originalmente em 1719; e As viagens de Gulliver, de 
Jonathan Swift, lançado originalmente em 1726.
Já com relação aos contos infantis de origem europeia, 
estão as narrativas populares de procedência folclórica. Na 
França, Contos de Mamãe Gansa (1607), de Charles Perrault, 
representa concepções romanescas do século XVII. Nesse 
modelo de narrativa, o real e o maravilhoso estão harmoni-
zados de modo perfeito assim como nos contos tradicionais 
oriundos da tradição popular.
As narrativas organizadas por Perrault conhecidas até 
hoje são: A Bela Adormecida no bosque, Chapeuzinho Vermelho, 
O Barba Azul, O Gato de Botas, As fadas, A Gata Borralheira, 
Henrique do Topete, O Pequeno Polegar, Pele de Asno, entre 
outras. Essas narrativas provêm das tradições orais célticas e bretãs, 
sendo influenciadas pelos folclores italiano e francês, bem como 
por elementos religiosos e pagãos. Nelas também estão presentes 
temas como incesto, canibalismo, demônios e adultério, os quais 
foram reelaborados por Perrault e compuseram o que se define 
como literatura infantil: devidamente adaptada ao público infantil e 
direcionada a garantir a moral e os valores burgueses.
Para relembrar, a leitura 
tornou-se sinônimo de uma 
sociedade burguesa com 
dinheiro que, naquele momento, 
privilegiou as ações individuais 
em detrimento do sentimento 
coletivo do medievo. A leitura 
do romance, por exemplo, é 
uma leitura individual, que se 
faz no espaço privado, dentro 
de casa, em qualquer ambiente. 
Ela é o símbolo da forma de vida 
burguesa.
Por sua vez, o espaço da escola 
garante uma maneira de ver o 
mundo, a qual é tipicamente 
burguesa. A ideologia burguesa, 
solidificada na escola, defende 
determinado padrão de família, 
um modelo de infância e uma 
norma comportamental.
Atenção
20 Literatura infantojuvenil
No que diz respeito ao canibalismo presente nos contos, conta-se que:
Na época em que os contos de fadas foram escritos, o hábito não esta-
va extinto. A humanidade nunca deixou de recorrer ao canibalismo em 
épocas de fome severa – e fome era carne de vaca nos séculos passados. Na Prússia, 
a escassez foi tanta entre 1708 e 1711 que 41% da população (ou 250 mil pessoas) 
morreu. Duas grandes fomes também atropelaram a França entre 1693 e 1710, ma-
tando mais de 2 milhões de pessoas. Assim, o canibalismo acabou saindo da lista de 
tabus. O historiador Jay Rubinstein conta que, nos séculos 11 e 12, havia feiras de 
carne humana na Inglaterra e na França – e que há relatos de pais comendo seus 
bebês em momentos de extrema pobreza. Outra grande época de carnificina foram 
as Cruzadas. Há uma história famosa, do rei inglês Ricardo Coração de Leão, líder da 
Terceira Cruzada, que ficou doente ao chegar à Terra Sagrada, e ficou implorando por 
carne de porco. Na falta de suínos, seus empregados acabaram assando um infiel – 
que o monarca achou uma delícia. “O quê? Carne de sarraceno é boa assim?”, disse. A 
história humana é mais indigesta do que parece. (HUECK, 2020)
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No século XIX, na Europa, a literatura destinada ao público 
infantojuvenil se consolidou com os contos de fadas dos irmãos Grimm, 
as histórias fantásticas de Hans Christian Andersen, Lewis Carroll e Carlo 
Collodi, as histórias de aventuras de Júlio Verne e Robert Louis Stevenson 
e as histórias do cotidiano da Condessa de Ségur, por exemplo.
Além disso, os irmãos Grimm, na Alemanha, reuniram centenas de 
fábulas, lendas e contos, buscando produzir os Contos para a infância e para 
o lar (1812). Eles foram os primeiros autores da Europa a dar valor estético 
e humano à matéria popular. Em seus contos predominam a esperança 
e a confiança. Apesar das agruras da vida e das injustiças constantes, o 
herói sempre vence os obstáculos que lhe são impostos. São contos que 
constituem essa obra: A Bela Adormecida, Os músicos de Bremen, A Branca 
de Neve e os Sete Anões, Chapeuzinho Vermelho,A Gata Borralheira, O corvo, 
As aventuras do Irmão Folgazão, A Dama e o Leão, entre outros.
Na Dinamarca, no mesmo período, Hans Christian Andersen 
produziu os primeiros contos direcionados a crianças. Em 1835, 
Andersen publicou sua obra Contos de fadas e histórias. Já em 1872, 
produziu 168 contos em cinco séries, dentre eles: A pastora e o limpador 
de chaminés, A Rainha das Neves, O Soldadinho de Chumbo, O pinheirinho, 
A pequena vendedora de fósforos, A roupa nova do imperador, O rouxinol, 
O jardineiro, A princesa e a ervilha e O companheiro de viagem. Uma 
característica das obras de Hans Andersen é a expressão de sonho e 
De acordo com Lajolo e Zilberman 
(2009), os Contos de Mamãe 
Gansa estavam, originalmente, 
em histórias ou narrativas 
do tempo passado e foram 
publicados por Perrault em 1697. 
No entanto, o livro foi atribuído 
ao seu filho, Pierre Darmancourt, 
e dedicado ao delfim da França. 
Nessa época, Perrault já era um 
escritor importante e, talvez, com 
medo de assinar a primeira edição 
por não saber o destino do novo 
gênero, delegou ao filho a autoria 
da obra.
Segundo as autoras, “para um 
membro da Academia Francesa, 
escrever uma obra popular 
representa fazer uma concessão 
a que ele não podia se permitir”. 
(2009, p. 16). No entanto, foi em 
terras francesas que esse gênero 
ganhou popularidade, dando 
preferência aos livros de contos 
de fadas. Perrault é o autor 
responsável pelo surgimento 
exponencial de literatura infantil. 
Depois disso, muitos outros 
autores e escritores, de outros 
lugares e, principalmente, da 
Inglaterra, passaram a adotar o 
conto de fadas. Consequente-
mente, devido à industrialização, 
essa literatura passou a ser 
absorvida e produzida em 
grande quantidade.
Saiba mais
História da literatura infantil 21
realidade, do mundo fantástico e da extrema sensibilidade, bem como 
da humanização delicada da figura infantil.
Com base nessas características da obra de Andersen, pode-se di-
zer que a literatura infantil é composta, em sua essência, pela fantasia, 
somada ao comprometimento com o interesse adulto. Esse gênero faz 
um movimento de eliminação da realidade. Segundo Zilberman (2003), 
a fantasia tem um sentido compensatório em oposição à extrema po-
breza e à impossibilidade de mudar o mundo. Os contos de fadas são 
assim adequados ao novo público emergente.
Desse modo, a fantasia é subsídio para a compreensão de mundo por 
parte da criança, preenchendo as lacunas que o indivíduo tem durante a 
infância. De acordo com a pesquisadora, o caráter maravilhoso presente 
no conto de fadas poderá corporificar o adulto onipotente, aliado e bom, 
que soluciona o problema do herói. Ainda, segundo ela, a passagem da 
narrativa folclórica aos contos de fadas isentou o conteúdo de rebeldia e 
proferiu a impotência do protagonista central: a criança.
Narrativas como as de Perrault e Grimm explicitam essas escolhas 
em que a presença de um ente auxiliar extraordinário se coloca a ser-
viço do herói: uma fada, um duende, um animal encantado. “Essa co-
laboração voluntária possibilita a superação, por parte da personagem 
central, do conflito que deflagra o evento ficcional; e sua ajuda é im-
prescindível devido à condição sempre precária ou carente da figura 
principal” (ZILBERMAN, 2003, p. 48).
Essas obras, por fim, contribuíram para garantir as prerrogativas in-
fantis, menos pela presença da fantasia e mais pelo embelezamento do 
real e pela construção de modelos perfeitos de comportamento.
Vamos ler um pouco mais a respeito da origem dos contos de fadas? Que tal 
descobrir algumas curiosidades?
A Revista Superinteressante traz um artigo chamado O lado sombrio dos 
contos de fadas, que conta um pouco sobre os contos mais renomados sob 
uma perspectiva de mundo diferente.
Acesso em: 4 set. 2020.
https://super.abril.com.br/especiais/o-lado-sombrio-dos-contos-de-fadas/
Artigo
Ao longo do século XIX, principalmente na segunda metade, há 
uma mudança na composição da literatura infantil no que diz respei-
to à personagem infantil.
Para aprofundar mais 
seus estudos a respeito 
do tema, recomendamos 
o vídeo de uma entrevista 
com a professora Karin 
Volobuef com a temática: 
Literatura Fundamental 85: 
Contos de Hans Christian 
Andersen. Nessa entrevis-
ta, ela conversa a respeito 
do desenvolvimento 
da obra de Andersen e 
a importância de seus 
contos.
Disponível em: https://
www.youtube.com/
watch?v=sTDF0YtWRO4. Acesso 
em: 15 set. 2020.
Vídeo
https://super.abril.com.br/especiais/o-lado-sombrio-dos-contos-de-fadas/
https://www.youtube.com/watch?v=sTDF0YtWRO4
https://www.youtube.com/watch?v=sTDF0YtWRO4
https://www.youtube.com/watch?v=sTDF0YtWRO4
22 Literatura infantojuvenil
O Maravilhoso Mágico de Oz, escrito por Lyman Frank Baum, foi 
publicado pela primeira vez em 1800 e, em sua introdução, o autor 
anuncia: “[a obra] aspira ser um conto de fadas modernizado [...]” 
(2014, p. 9). Sem dúvida, para além de sua inovadora estrutura narra-
tiva, o autor garantiu enorme sucesso e permaneceu por décadas no 
imaginário de muitas gerações.
Uma das novidades trazidas pela obra, e também por Alice no País 
das Maravilhas (1865), de Lewis Carroll, e As aventuras de Pinóquio (1883), 
de Carlo Collodi, segundo Zilberman (2003), é a de que são narrativas 
em que a personagem infantil está realmente exercendo o papel de 
protagonista. Algo que o leitor passa a identificar visivelmente no tex-
to é essa alteração na construção da personagem. O adulto continua 
participando do texto e pode ser um leitor desse gênero, no entanto 
a obra direciona-se, impreterivelmente, ao público infantil, e isso fica 
evidente na incorporação do adjetivo infantil para essa modalidade li-
terária. Além disso, os livros falam a linguagem de seus leitores e, por 
esse motivo, o público que irá receber aquele livro sabe efetivamente 
do que se trata e quais aventuras poderá encontrar em seu interior.
Para entender como esse processo ocorre e identificar o lugar que a 
criança irá ocupar na trama, vamos analisar uma obra específica.
Em O Maravilhoso Mágico de Oz, obra analisada por Zilberman 
(2003), a personagem-protagonista Dorothy realiza um percurso pelo 
mundo de Oz. Esse percurso retrata as conquistas do espaço de uma 
menina não somente em sua terra, mas também no espaço 
imaginário de Oz. Essa obra traz em seu discurso valores 
da cultura ocidental, principalmente a americana. Nela 
são proclamadas a inteligência, os sentimentos, a cora-
gem e a valorização do lugar. Dorothy declara: “não im-
porta o quanto sombrios e cinzentos nossos países são, 
nós, as pessoas de carne e osso, preferimos viver lá do 
que em qualquer outro lugar, por mais bonito que seja. 
Não há lugar como o lar” (BAUM, 2014, p. 37).
A obra, para além das pretensões do autor, de ser 
um conto modernizado, pode ser classificada como 
uma narrativa maravilhosa. Para isso, podemos utilizar 
uma classificação de Todorov:
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(Continua)
História da literatura infantil 23
No caso do maravilhoso, os elementos sobrenaturais não 
provocam qualquer reação particular nem nas persona-
gens, nem no leitor implícito. Não é uma atitude para com 
os acontecimentos narrados que caracteriza o maravilho-
so, mas a própria natureza desses acontecimentos. 
[...] Relaciona-se geralmente o gênero maravilhoso ao conto 
de fadas; de fato, o conto de fadas não é senão uma das varie-
dades do maravilhoso e os acontecimentos sobrenaturais 
aí não provocam qualquer surpresa [...]. (TODOROV, 2008, 
pp. 59-60)
Desde a saída de Dorothy da casa, arrastada por um ciclone 
rumo a Oz, e seu retorno ao lugar, a obra não coloca em dúvida 
que se trata de um conto maravilhoso. Tia Em estava preocupa-
da com o destino da menina, além de Dorothy retornar para casa 
apenas de meias, sem os sapatos de prata (símbolo típico dos 
contos de Grimm, como as botas sete léguas). Ao mesmo tempo, 
o pacto de leitura já está estabelecido e, em nenhum momento, 
há dúvidas de que aviagem aconteceu, mesmo que o sapato 
tenha se perdido. Esse conjunto de elementos faz um aporte 
em um modelo clássico do conto e, ao mesmo tempo, sugere 
modificações.
De acordo com Zilberman (2003), Dorothy, e não o mágico, é 
a personagem central da narrativa. Durante sua viagem, ela en-
contra três amigos: o Espantalho, o Homem de Lata e o Leão Co-
varde, os quais esperam que o mágico resolva seus problemas, 
assim como Dorothy, que deseja voltar para casa.
A trajetória de Dorothy e seus amigos representa a necessidade 
do encontro de cada um consigo mesmo e é isso o que dá tom à 
narrativa de aventura. O desdobramento do relato está vinculado 
ao deslocamento no espaço e aos problemas das personagens 
(heróis) dentro delas. Cada uma das personagens tem dentro de si 
as virtudes que procura, assim como Dorothy, que deseja retornar 
a casa, pois, ao chegar em Oz, recebe os sapatos que, desde o início, 
já possibilitariam seu regresso. As viagens, além de reforçarem a 
narrativa de aventura, garantem o tempo necessário para que as 
personagens reconheçam as suas qualidades.
A voz do narrador indica ao leitor possibilidades de interpre-
tação. “Este terá que reconhecer, antes de todos, que as perso-
(Continua)
24 Literatura infantojuvenil
nagens possuíam de antemão o que buscavam, faltando-lhes 
apenas a autoconfiança adquirida após o segundo encontro com 
o mágico” (ZILBERMAN, 2003. p. 77). É por meio da construção 
da autoconfiança e do reconhecimento do grupo (os heróis) que 
nasce a própria identificação de Dorothy e da criança leitora. A 
narrativa, segundo Zilberman, sugere recursos para que cada 
um possa refletir sobre si mesmo com base nas atitudes dos 
heróis que, por sua vez, revelam que nada lhes falta. As perso-
nagens Leão, Homem de Lata e Espantalho encarnam a busca da 
identidade e refletem sobre seus dramas íntimos.
Dorothy é a única personagem com atributos reais, fato que, 
para Zilberman (2003), é ponto de entrada no texto. A menina 
ocupa o lugar do herói, o ponto de confluência entre o real e o 
ficcional. Ela, expelida pelo ciclone, deseja retornar aos tios e a 
Kansas. Em tempo algum a menina deseja ficar em Oz. Sua von-
tade é retornar à cidade com os tios, na fazenda. Em seu percur-
so em busca de uma forma para voltar, a heroína destrói, direta 
ou indiretamente, a Bruxa Má do Leste, a Bruxa Má do Oeste e 
o Mágico de Oz.
Dorothy pode ser definida como a heroína do relato porque 
destrói as figuras malignas e instaura a boa ordem em Oz, pois 
mesmo não sendo uma fada, no sentido do termo, é ela quem 
desbanca as bruxas más. Finalmente, na personagem do mágico 
está representado o adulto, vinculado às mentiras e às trapaças. 
Dorothy, a criança, desvela o adulto, nesse caso o mágico, em 
seus medos e suas mentiras. O exercício liberal cabe à criança e 
à sua nova configuração.
Por fim, o livro é uma aventura infantil, cuja narrativa toma partido 
da criança. Ela é a protagonista do texto, o que demonstra claramente a 
ruptura e a mudança em relação aos modelos anteriores. Assim como 
Dorothy, são Alice, Tom Sawyer, Peter Pan, Pinóquio, Emília, crianças 
ou bonecos humanizados que são verdadeiramente protagonistas, 
têm voz e maior poder decisório, questionam a autoridade e, acima de 
tudo, têm ética.
História da literatura infantil 25
CONSIDERAÇÕES 
FINAIS
Neste capítulo fizemos uma viagem pela história da literatura infantil. 
Procuramos identificar o seu surgimento e as relações com o contexto em 
seu entorno. Em grande medida, ela se mistura com a própria formação 
da escola moderna e com uma noção moderna de infância. Observamos 
e compreendemos que para a sociedade burguesa em ascensão foi cons-
truído um aparato para formação intelectual e de normas, em muito soli-
dificado pela literatura infantil e pela escola.
Depois, conhecemos os primeiros autores da literatura infantil que 
produziram, primeiramente, os contos de fadas, cuja característica 
principal está centrada no maravilhoso e no fantástico, além de representar 
a criança pelo olhar do adulto, dando pouca voz a essa personagem e 
propondo comentários e desfechos moralizantes via voz narrativa. Por 
fim, nas últimas décadas do século XIX, há uma significativa alteração na 
composição da narrativa e a criança passa a ter voz, a opinar e dar sentido 
a sua existência dentro do enredo. O “olhar” adulto se distancia um pouco. 
A personagem infantil é criativa e ousada, como Dorothy, Alice e Pinóquio.
ATIVIDADES
1. Descreva o contexto que favoreceu o surgimento da literatura infantil 
e qual foi a sua relação com a escola.
2. Apresente a importância de Perrault para a literatura infantil.
3. Quais são as inovações que aconteceram na literatura infantil no que 
diz respeito à personagem criança, das narrativas do século XVIII para 
as do XIX (principalmente mais para o fim desse século)?
REFERÊNCIAS
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BAUM, L. F. Ozma de Oz. Rio de Janeiro: Editora Marinho, 2014.
COELHO, N. N. Literatura infantil: teoria, análise, didática. São Paulo: Ática, 2000.
COSTA, M. M. Metodologia do ensino da literatura infantil. Curitiba: Intersaberes, 2013.
HUECK, K. O lado sombrio dos contos de fada. Superinteressante. Disponível em: https://super.
abril.com.br/especiais/o-lado-sombrio-dos-contos-de-fadas/. Acesso em: 15 set. 2020.
LAJOLO, M.; ZILBERMAN, R. Literatura infantil brasileira. 6. ed. São Paulo: Ática, 2009.
TODOROV, T. Introdução à literatura fantástica. São Paulo: Perspectiva, 2008.
WATT, I. A ascensão do romance: estudos sobre Defoe, Richardson e Fielding. Trad. de 
Hildegard Fiest. São Paulo: Companhia das Letras, 1990.
ZILBERMAN, R. A literatura infantil e o leitor. In: CADEMARTORI, L.; ZILBERMAN, R. (org.). 
Literatura infantil: autoritarismo e emancipação. São Paulo: Ática, 1987.
ZILBERMAN, R. A literatura infantil na escola. São Paulo: Objetiva, 2003.
https://super.abril.com.br/especiais/o-lado-sombrio-dos-contos-de-fadas/
https://super.abril.com.br/especiais/o-lado-sombrio-dos-contos-de-fadas/
26 Literatura infantojuvenil
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Literatura infantil no Brasil
Quando criança, você costumava ouvir histórias contadas pe-
los seus pais, avós, tios ou professores? Quando nos perguntam 
de quais histórias nos lembramos da época da infância, é comum 
citarmos os contos de fadas: Cinderela, Chapeuzinho Vermelho, Os 
três porquinhos e tantos outros. Essas histórias, porém, foram re-
colhidas da tradição popular europeia e chegaram ao nosso país 
por meio de adaptações e traduções realizadas por pioneiros da 
literatura infantil brasileira.
Além desses contos que povoaram nosso imaginário e conti-
nuam a encantar crianças, você conseguiria se recordar de autores 
ou obras autenticamente nacionais lidas ou ouvidas por você na in-
fância ou que continuam a circular entre o público infantil até hoje?
Neste capítulo, abordamos justamente a produção infantojuve-
nil nacional, do seu início, no final do século XIX, até a contempo-
raneidade. Vamos analisar, com base em temas, obras e autores, 
como a literatura infantojuvenil se formou no Brasil, compreen-
dendo os fatores históricos de cada época e em que medida eles 
influenciaram na criação literária ao longo do tempo: desde que os 
materiais escritos para crianças e jovens eram escassos e a litera-
tura infantil se restringia à adaptação de modelos estrangeiros até 
ela ganhar força e ter sua própria identidade.
2.1 As primeiras obras de literatura 
infantil no BrasilVídeo
Enquanto na Europa a literatura infantil surgiu no século XVIII, no 
Brasil esse evento foi mais tardio, em razão da própria configuração 
política do país, que foi colônia de Portugal por mais de trezentos anos.
Literatura infantil no Brasil 27
No entanto, o surgimento da Imprensa Régia no Brasil, em 1808, 
proporcionou a publicação de algumas produções voltadas ao público 
infantil, mas, segundo Lajolo e Zilberman (2010), não o suficiente para 
configurar, ainda no século XIX, o aparecimento,de fato, de uma litera-
tura para a infância.
Com a Independência, em 1822, buscava-se progresso econômico 
para o país, porém, na área da educação, assim como em outras, o 
Brasil enfrentava dificuldades para colocar significativas mudanças em 
prática. Desse modo, no período do Império, apesar de vários projetos 
terem sido concretizados (como as reformas de ensino), grande parte 
deles, de acordo com Coelho (2010), frustrou-se.
Por essa razão, é possível afirmar que apenas no final do século XIX 
a literatura infantil teve início no país. Esse surgimento coincidiu com 
o advento da República e foram várias as razões contribuintes para 
que a literatura voltada às crianças ganhasse espaço, como a mudança 
de regime político e a intensificação das políticas abolicionistas. Além 
disso, o mercado interno brasileiro estava em desenvolvimento, o que 
colaborou para a expansão da indústria nacional e para a formação de 
camadas médias da população.
A abolição da escravatura ocorreu em 1888, mas, anteriormente já havia leis aboli-
cionistas, como a proibição do tráfico de pessoas da África para o Brasil. Além disso, 
fugas e rebeliões de escravizados eram comuns. Desse modo, o capital necessário para 
a manutenção da mão de obra negra ficava muito alto (LAJOLO; ZILBERMAN, 2010). A 
república foi proclamada em 1889, por Marechal Deodoro da Fonseca e um grupo de 
militares do exército brasileiro, destituindo, assim, o imperador D. Pedro II do poder e 
alterando o regime político do país.
As camadas médias eram intermediárias: havia a aristocracia rural e a alta burguesia 
de um lado; e escravos e trabalhadores rurais de outro. Durante o período colonial e o 
Império, havia praticamente apenas essas duas classes definidas. De acordo com Lajolo 
e Zilberman (2010), com o movimento republicano e a camada média ascendendo, o 
número de bancos aumentou, assim como o funcionalismo público, as ferrovias, o mo-
vimento dos portos e, especialmente, segundo Coelho (2010), os profissionais liberais.
Saiba mais
Por conseguinte, as cidades foram se formando por meio des-
ses grupos, intensificando o processo de urbanização ocorrido no 
entresséculos. Essa configuração social, de acordo com Lajolo e Zil-
berman (2010), foi favorável ao surgimento da literatura infantil no 
Com a vinda da família real, em 
1808, foi necessário tomar algu-
mas medidas administrativas no 
Brasil Colônia. Uma delas foi a 
criação da Imprensa Régia, que 
foi a única tipografia existente 
no país até a Independência. Ela 
era a responsável por imprimir 
textos legislativos, encadernar 
impressos, editar livros etc.
Curiosidade
28 Literatura infantojuvenil
Brasil, uma vez que a população, constituída por diferentes públi-
cos, consumia produtos industrializados, como revistas femininas, 
romances, materiais escolares e livros para crianças.
É nesse período que o sistema educacional “passa por reformas 
de real alcance”, conforme Coelho (2010, p. 220), “e incorpora em 
sua área também a produção literária para crianças e jovens”. Há, 
portanto, nesse contexto, a valorização da instrução e da escola.
Um país em crescente urbanização e modernização, enfim, mos-
trava-se preparado para iniciar, de fato, a formação de uma litera-
tura infantil brasileira. O novo público formado por consumidores 
desse tipo de cultura era favorável “ao contato com livros e literatu-
ra, na medida em que o consumo desses bens espelha o padrão de 
escolarização e cultura com que esses novos segmentos sociais de-
sejam apresentar-se frente a outros grupos”, identificando-se com 
a alta burguesia ou diferenciando-se dos mais humildes (LAJOLO; 
ZILBERMAN, 2010, p. 27).
Todavia, os materiais impressos destinados à leitura nas esco-
las brasileiras eram escassos. Por isso, ainda no final do século 
XIX, alguns pioneiros dedicaram-se a produzir livros destinados às 
crianças, principalmente para serem utilizados nas escolas. Assim, 
a literatura infantil brasileira nasce intimamente relacionada à edu-
cação escolar e, por essa razão, nos períodos posteriores ao século 
XIX, será difícil desvincular a arte literária da concepção pedagógica.
O debate sobre a literatura infantil e a pedagogia é bastante polêmico. Afinal 
de contas, a literatura infantil pertence à arte literária ou à área pedagógica?
Para ampliar seus conhecimentos sobre esse tema, leia o artigo Literatura 
infantil: entre a infância, a pedagogia e a arte, de Lucila Simões, publicado no 
Caderno de Letras da UFF.
Acesso em: 2 set. 2020.
http://www.cadernosdeletras.uff.br/joomla/images/stories/edicoes/46/diversa1.pdf
Artigo
Nesse momento inicial, ainda de pouca criação, destacam-se 
as traduções e as adaptações de obras estrangeiras, realizadas 
por escritores e intelectuais, como Figueiredo Pimentel e Carlos 
Jansen, que viam nessa atividade uma oportunidade econômica, 
http://www.cadernosdeletras.uff.br/joomla/images/stories/edicoes/46/diversa1.pdf
Literatura infantil no Brasil 29
já que seus livros poderiam ser adotados pelas escolas. Algumas 
das obras adaptadas e traduzidas por eles, citadas por Lajolo e 
Zilberman (2010), foram: Contos seletos das mil e uma noites (1882); 
Robinson Crusoé (1885), Viagens de Gulliver (1888); D. Quixote de la 
Mancha (1901); Contos da Carochinha (1894); Histórias da Vovozinha 
(1896); Histórias da baratinha (1896) etc. As três últimas obras tra-
ziam adaptações dos contos clássicos de Perrault, irmãos Grimm 
e Andersen.
Esse primeiro período da literatura infantil brasileira 
constituiu-se, basicamente, da produção de dois tipos de literatura 
para crianças: traduções e adaptações de contos de fadas europeus 
e obras que atendiam a um projeto educativo e ideológico para a 
formação de cidadãos, também inspirado em um modelo europeu, 
conforme apontam Lajolo e Zilberman (2010). As autoras nomeiam 
essa primeira etapa de nacionalismo na literatura infantil.
As obras europeias, que inspiraram as brasileiras, tinham como 
protagonista uma criança, normalmente criada com base em uma 
imagem estereotipada, seja ela bem comportada ou malvada. As 
situações em que essa personagem se envolve também são mo-
delares, como “lendo livro, ouvindo histórias edificantes, tendo 
conversas educativas com os pais e professores, trocando cartas 
de bons conselhos com parentes distantes” (LAJOLO; ZILBERMAN, 
2010, p. 34). Ou seja, a personagem reproduz comportamentos e 
valores esperados, de modo passivo, e com o objetivo de os leito-
res repetirem essas atitudes em seu cotidiano.
Esse modelo de história para crianças atendia aos anseios bra-
sileiros republicanos, já que o patriotismo fazia parte do projeto de 
modernização do país.
Além de algumas traduções de livros europeus com esse tipo de 
conteúdo, Adelina Lopes Vieira e Júlia Lopes de Almeida publicaram 
Contos Infantis, em 1886. Já no início do século XX, Olavo Bilac, 
Coelho Neto, Manuel Bonfim e Júlia Lopes de Almeida publicaram 
outros livros, notadamente com temáticas patrióticas, como Poe-
mas infantis (1904), de Bilac, e Através do Brasil (1910), de Bilac e 
Manuel Bonfim, inspirado em uma obra francesa.
30 Literatura infantojuvenil
Em 1905, surge a primeira revista em 
quadrinhos brasileira voltada ao públi-
co infantojuvenil, chamada O Tico-Tico. 
Foram muitas as personagens que 
passaram pelas histórias da revista, inclusive vindas 
de fora, como Gato Felix e Mickey Mouse, da Disney, 
e super-heróis norte-americanos, como o Super-Ho-
mem. Além de histórias em quadrinhos, as publicações 
traziam passatempos, literatura juvenil, informações 
sobre história, ciências, civismo etc.
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De modo geral, essas obras que marcam a primeira fase da litera-
tura infantil brasileira revelam os pilares que sustentavam o sistema 
educacional da época. Vamos observar um breve resumo no quadro a 
seguir.
Quadro 1
Características das obras da primeira fase da literatura infantil brasileira
• Entusiasmo e dedicação 
à pátria.
• Culto às origens e amor 
pelaterra (idealização da 
vida rural em oposição à 
urbana).
Nacionalismo
• Valorização dos grandes 
autores e obras 
literárias do passado 
como modelos a serem 
imitados.
Tradicionalismo 
cultural
• Valorização do estudo 
e do livro como meio à 
ascensão econômica.Intelectualismo
• Imposição de 
valores cristãos: 
caráter, honestidade, 
solidariedade, 
fraternidade, pureza.
Moralismo e 
religiosidade
Fonte: Elaborado pelas autoras com base em Coelho, 2010, p. 223-224.
Como exemplo, vamos ler dois trechos de obras dessa época para 
compreendermos como essas características se apresentam nos tex-
tos. O primeiro é o conhecido poema A pátria, de Olavo Bilac; o segun-
do, é um conto do livro Contos infantis, de Adelina Lopes Vieira e Julia 
Lopes de Almeida.
Literatura infantil no Brasil 31
A Pátria
Ama, com fé e orgulho, a 
terra em que nasceste!
Criança! não verás nenhum 
país como este!
Olha que céu! que mar! que 
rios! que floresta!
A Natureza, aqui, perpetua-
mente em festa,
É um seio de mãe a 
transbordar carinhos.
Vê que vida há no chão! vê 
que vida há nos ninhos,
[...]
Boa terra! jamais negou a 
quem trabalha
O pão que mata a fome, o 
teto que agasalha...
Quem com seu suor a 
fecunda e umedece,
Vê pago seu esforço, e é 
feliz, e enriquece!
Criança! não verás país 
nenhum como este:
Imita na grandeza a terra 
em que nasceste!
(BILAC, 1904, p. 114-115)
O bem
Iam três amiguinhos, três crianças a caminho da 
escola. Um deles disse:
- Se eu estudar bastante, o meu paizinho prome-
teu-me uma libra. Que festanças farei!
- Pois eu, reponde com meiguice o segundo, 
ficando bem quietinho dá-me um beijo a mamãe.
Diz o terceiro:
- Eu sou um órfão, não tenho um seio amigo, nem 
pai, nem mãe, nem teto hospitaleiro. Quero estudar 
sem outra recompensa que o prazer de ser bom. 
Ah! Se o consigo!...
Fazer bem pelo bem, virtude imensa!
(VIEIRA; ALMEIDA, 1910, p. 21)
No final do século XIX e início do 
XX, era comum os livros destina-
dos às crianças apresentarem nos 
prefácios ou notas da editora “a 
manifestação consciente do proje-
to de uma literatura adequada às 
condições brasileiras e essencial 
à nossa nacionalidade” (LAJOLO; 
ZILBERMAN, 2010, p. 44).
Como exemplo, podemos citar 
um trecho do prefácio de Poesias 
infantis, de Olavo Bilac (1904, 
p. 5): “O que o autor deseja é 
que se reconheça [...] a boa 
vontade com que um brasileiro 
quis contribuir para a educação 
moral das crianças do seu país”. 
Ou, ainda, em um fragmento 
do prólogo de Contos infantis, 
de Adelina Lopes Vieira e Julia 
Lopes de Almeida (1910, p. 6-7): 
“[...] são [...] de grande valor, 
para o espírito [...] das crianças, 
umas frases bondosas, em que 
a virtude derrame seu perfume 
suave, capaz de modificar 
ímpetos de gênio e indiferença 
pelo sofrimento alheio”.
Saiba mais
32 Literatura infantojuvenil
Na leitura do poema A Pátria, podemos perceber o patriotismo 
como característica principal do texto, isso porque os versos acon-
selham a criança leitora a amar sua terra. O tom imperativo (pre-
sente no uso dos verbos “ama”, “olha”, “vê”) associa-se ao elogio 
exacerbado à nação e à exaltação da paisagem brasileira, evocan-
do a natureza rica e bela, inclusive, a partir de metáforas femininas 
relacionadas à fertilidade, como nos versos A natureza [...] / É um 
seio de mãe a transbordar carinhos.
Já nas três últimas estrofes do poema, temos o enaltecimento 
ao trabalho, como fonte de dignidade e riqueza. Essa ideia está 
relacionada tanto ao cultivo da terra como solo fértil, quanto ao 
fato de que a nação reconhece e recompensa o amor e o esforço de 
“seus filhos”. Temos, portanto, com base nesse texto e em outros 
da mesma época, a difusão de uma visão da realidade brasileira 
deturpada pela ideologia ufanista, de acordo com Lajolo e Zilber-
man (2010).
No conto O bem, é notável a valorização do moralismo por meio 
da obediência aos pais, e que a bondade deve ser uma virtude da 
criança. Percebemos, sobretudo, um tom demasiadamente ideali-
zado, característica própria dos textos dessa fase, pois forneciam 
“exemplos de qualidades, sentimentos, atitudes e valores a se-
rem interiorizados pelas crianças”, conforme asseveram Lajolo e 
Zilberman (2010, p. 42).
Temos, portanto, nessa fase, uma literatura infantil excessiva-
mente marcada pela adesão ao projeto ideológico nacionalista, 
cujas “campanhas de difusão patriótica, escolarização e serviço 
militar apresentavam-se como salvadoras, no discurso otimista da 
sociedade dominante” (LAJOLO; ZILBERMAN, 2010, p. 38).
Esse primeiro período encerra-se com Tales de Andrade, ao pu-
blicar, em 1919, o livro Saudade, cuja temática 1 , voltada, segundo 
Coelho (2010, p. 240), à “valorização nostálgica dos acontecimentos 
simples do campo em confronto com as dificuldades e fracassos 
encontrados na vida da cidade”, influenciará decisivamente na pro-
dução direcionada à infância nas próximas décadas.
Consiste no orgulho exacerbado 
pela nação em que o indivíduo 
se sente superior aos demais que 
não são de mesma nacionalida-
de. É considerada uma forma de 
patriotismo.
Glossário
A temática rural ganhou destaque 
no contexto pós-Primeira Guerra, 
quando os valores da sociedade 
urbana, que ansiava ser moderna, 
foram postos à prova. O início da 
industrialização atraiu a população 
rural para as cidades e, como 
consequência, problemas sociais 
e econômicos se agravaram no 
espaço urbano (COELHO, 2010). 
Assim, a vida idealizada no campo 
passou a ser tema fértil para a 
literatura infantil.
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Literatura infantil no Brasil 33
2.2 Monteiro Lobato: um novo 
paradigma da literatura infantil Vídeo
A partir de 1920, inaugura-se uma nova fase da literatura infantil, 
notadamente representada por Monteiro Lobato que, por essa razão, 
ganha o título de pai da literatura infantil brasileira. Para Coelho (2010, 
p. 247), Lobato foi um divisor de águas nessa área, pois “encontrou o 
caminho criador de que a Literatura Infantil estava necessitando. Rom-
pe, pela raiz, com as convenções estereotipadas e abre as portas para 
as novas ideias e formas que o novo século exigia”.
Anteriormente, o autor já havia publicado livros não infantis, como 
Urupês (1918), no qual reuniu contos escritos para o jornal O Estado de 
S. Paulo. O conto que dá nome à obra denuncia o modelo agrário bra-
sileiro, destacando a miséria, a violência e o atraso econômico do país, 
especialmente na figura da personagem Jeca Tatu.
Você sabia que a palavra jeca faz parte dos dicionários de Língua Portuguesa como um brasileirismo que 
significa caipira? Ela passou a ser usada em razão do grande sucesso da personagem de Monteiro Lobato.
Essa personagem é avessa à figura romântica do interior do país retratada, até então, nas obras literárias, 
como se anuncia em nota, no início de Urupês (LOBATO, 2009, p. 11): “na contramão dos cânones do 
romantismo, nascia Jeca Tatu, ‘sombrio urupê de pau podre a modorrar silencioso no recesso das grotas’”.
Com um olhar crítico sobre a realidade brasileira da época, Lobato denuncia a situação em que se 
encontravam os moradores do campo e o descaso das autoridades públicas, fato que pode ser percebido 
no trecho: “no meio da natureza brasílica, tão rica de formas e cores [...], o caboclo é o sombrio urupê 
de pau podre [...]. Só ele não fala, não canta, não ri, não ama. Só ele, no meio de tanta vida, não vive... 
(LOBATO, 2009, p. 170).
Saiba mais
Ainda na década de 1920, o Brasil passaria por diversas renova-
ções no âmbito cultural. Há pelo menos duas delas que nos interes-
sam nesse espaço: a Semana da Arte Moderna e a Escola Nova. Em 
relação à Escola Nova, conforme Lajolo e Zilberman (2010), peda-
gogos brasileiros (Anísio Teixeira, Francisco Campos, Fernando de 
Azevedo, entre outros), opondo-se à educação tradicional e elitista, 
propuseram a escolarização em massa da população, o desenvol-
vimento do pensamento reflexivo e a atividade de pesquisa. Ainda, 
sugeriram que o Estado deveria se responsabilizar pela gestão da 
educação, tornando-auniversal e homogênea.
34 Literatura infantojuvenil
Em relação aos ideais modernistas que influenciaram a literatu-
ra do período, destaca-se o nacionalismo, tema também explorado 
pela literatura europeia da época. Entre as características comuns 
nas produções modernas, Lajolo e Zilberman (2010, p. 52) citam: “a 
pesquisa do passado nacional na busca de fontes autênticas de bra-
silidade não contaminadas [...] pela influência europeia”, o recurso 
ao folclore (indígena e africano) e “a criação de tipos humanos que 
representem [...] o homem brasileiro”.
Desse modo, é possível afirmar que Lobato iniciou sua produção 
literária infantil nesse contexto, todavia sofreu influência também 
do humanismo liberal, cuja filosofia, segundo Coelho (2010, p. 248, 
grifos do original), aponta para a ideia de que está “no indivíduo de 
exceção, na inteligência, na cultura e no esforço das minorias escla-
recidas (e não nos movimentos de massa) a solução para os grandes 
problemas que afligem a humanidade”. A consciência nacionalista 
era um dos problemas a serem enfrentados, uma vez que não era 
fácil encontrar a identidade nacional de um povo por tantos anos 
“colonizado culturalmente e dependente economicamente” de ou-
tros países (COELHO, 2010, p. 248).
No entanto, foi em sua produção literária infantil que Lobato dei-
xou evidente a busca pela brasilidade. Isso pode ser notado por 
meio de adaptações de histórias como: O irmão de Pinóquio e O Gato 
Félix (1927); História do mundo para crianças (1933); D. Quixote para 
crianças (1936); O Minotauro (1939); de traduções de obras estrangei-
ras na década de 1930: Alice no País das Maravilhas; Mowgli, o menino 
lobo; ou da criação de suas próprias narrativas: A menina do nariz ar-
rebitado (1920); O Saci (1921); Fábulas (1922); Reinações de Narizinho 
(1931); Viagem ao céu (1932); As caçadas de Pedrinho (1933); Memó-
rias de Emília (1936); O poço do Visconde (1937); O Pica-Pau Amarelo 
(1939); A chave do tamanho (1942).
Em busca de uma linguagem que de fato atingisse os jovens lei-
tores, inclusive criticando a literatura da época feita para esse pú-
blico, Lobato escreve, em 1920, seu primeiro livro infantil: A menina 
do nariz arrebitado. Obra que foi considerada sucesso absoluto de 
vendas, principalmente porque foi adotada nas escolas públicas de 
São Paulo. Além de escritor famoso, passou a preocupar-se com a 
publicação de livros no Brasil, fundando sua própria editora.
Literatura infantil no Brasil 35
São várias as passagens em obras de Lobato que criticam o modo de se 
fazer literatura infantil em sua época. Desde cartas escritas ao amigo 
Godofredo Rangel até trechos nos próprios livros infantis. Vamos con-
ferir alguns?
“Ah Rangel, que mundos diferentes, o do adulto e o da criança! Por não 
compreender isso e considerar a criança ‘um adulto em ponto pequeno’, é 
que tantos escritores fracassam na literatura infantil e Andersen fica eterno” 
(LOBATO, 1964, p. 347).
“— Ignoro se o Pequeno Polegar anda aqui pelo meu reino. Não o vi, nem 
tive notícias dele, mas a senhora pode procurá-lo. Não faça cerimônia...
— Por que ele fugiu? — Indagou a menina.
— Não sei — respondeu dona Carochinha — mas tenho notado que mui-
tos dos personagens das minhas histórias já andam aborrecidos de viverem 
toda a vida presos dentro delas. Querem novidade. Falam em correr mundo 
a fim de se meterem em novas aventuras. [...] Andam todos revoltados, dan-
do-me um trabalhão para contê-los. Mas o pior é que ameaçam fugir, e o 
Pequeno Polegar já deu o exemplo” (LOBATO, 1980, p. 14).
No primeiro trecho, Lobato critica os autores que o precederam, pois não valo-
rizavam a imaginação da criança e insistiam em uma linguagem moralizante e 
instrutiva, o que tornava as obras deles insossas, incapazes de despertar a curio-
sidade do jovem leitor.
No segundo trecho, aparece a personagem Dona Carochinha, que originalmente re-
feria-se à figura de uma velhinha bondosa, contadora de histórias, ideia que surgiu 
do livro Contos da Carochinha, de Figueiredo Pimentel, primeiro a ser publicado no 
Brasil com contos europeus traduzidos e adaptados.
Contudo, em Reinações de Narizinho, Lobato caracteriza essa personagem como uma 
barata velha e ranzinza, que conta histórias emboloradas, das quais as crianças já 
estavam cansadas. Assim, fica evidente a crítica à reprodução de antigos modelos 
europeus e a necessidade de criar histórias que valorizassem a imaginação e a inte-
ligência do leitor infantil.
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O público infantojuvenil identificou-se rapidamente com a pri-
meira história de Lobato para crianças, especialmente pelo modo 
como foi possível construir, nela, um universo familiar e afetivo, 
permeado pelo maravilhoso. É por meio dessa obra que o autor 
consolida o espaço e grande parte do elenco que vai preenchê-lo: 
o Sítio do Picapau Amarelo (LAJOLO; ZILBERMAN, 2010), em que o 
meio rural é local de alegria, fantasia, criatividade e aventuras vivi-
das pelas célebres personagens Emília, Narizinho, Pedrinho, Dona 
36 Literatura infantojuvenil
Benta, Tia Nastácia e tantas outras que povoam a imaginação das 
crianças e jovens há um século.
Assim sendo, o sítio não é apenas o cenário onde a ação pode 
transcorrer. Ele representa igualmente uma concepção a respei-
to do mundo e da sociedade, bem como uma tomada de posição 
a propósito da criação de obras para a infância. Nessa medida, 
está corporificado no sítio um projeto estético envolvendo a lite-
ratura infantil e uma aspiração política envolvendo o Brasil – e 
não apenas a reprodução da sociedade rural brasileira. Pois, pro-
ceder a essa reprodução corresponderia a assumir uma atitude 
retrógrada, se lembrarmos que o país começava a passar por um 
avançado processo de urbanização para o qual Lobato estava to-
talmente alerta. (LAJOLO; ZILBERMAN, 2010, p. 56)
Monteiro Lobato, portanto, não inaugura o rural como temática 
na literatura infantil, pois este já fora cenário de outras obras – 
como em Saudade, de Tales de Andrade –, contudo supera a visão 
romântica de felicidade e riqueza por meio da agricultura. O sítio 
é muito mais um espaço metafórico, conforme afirmam Lajolo e 
Zilberman (2010), especialmente em suas obras criadas após 1930. 
Além das riquezas que nele são encontradas, como o petróleo, em 
O poço do Visconde, o sítio é aberto às inovações tecnológicas, às 
novidades estrangeiras, ao cinema, aos quadrinhos etc.
Além da inclusão desses elementos que caracterizam a cultura 
internacional, podemos destacar outros aspectos das obras loba-
tianas que foram responsáveis pela inovação da literatura infantil 
brasileira e pela singularidade do autor. Podemos observar alguns 
desses aspectos no quadro a seguir.
Malba Tahan é o pseu-
dônimo de Julio Cesar de 
Melo e Souza, professor 
e escritor brasileiro que 
estudou a cultura e a lín-
gua árabe para traduzir, 
adaptar e escrever várias 
obras inspiradas nessa 
cultura e sobre o ensino 
de Matemática. O homem 
que calculava é uma 
de suas histórias mais 
conhecidas.
Para saber um pouco mais sobre 
o autor e suas obras, você pode 
acessar: https://www.malbatahan.
com.br/. Acesso em: 14 set. 2020.
Livro
(Continua)
Quadro 2
Características das obras de Monteiro Lobato
Características Exemplos
Questionamento 
do uso da língua 
padrão escrita 
e valorização da 
língua falada
Lobato busca recuperar o estatuto oral da literatura infantil, pois Dona Benta conta as 
histórias em voz alta aos moradores do Sítio, adotando um estilo coloquial, sem erudição 
e preocupação com a gramática. Incorpora a oralidade sem infantilidade, tanto nas falas 
das personagens quanto no discurso do narrador. Em Reinações de Narizinho o narrador 
comenta: “a moda de Dona Benta ler era boa. Lia ‘diferente’ dos livros. Como quase to-
dos os livros para crianças que há no Brasil são muito sem graça, cheios de termos do 
tempo do Onça ou só usados em Portugal, a boa velha lia traduzindo aquele português 
de defunto em língua do

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