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Turismo: Desenvolvimento e Gestão

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TURISMO: 
PLANEJAMENTO ESTRATÉGICO E CAPACIDADE DE GESTÃO – DESENVOLVIMENTO REGIONAL, REDES DE PRODUÇÃO E CLUSTERS
BENI, MARIO CARLOS (ORG.)
INTRODUÇÃO 
O turismo é um fenômeno inter e transdisciplinar. Tal qual um sistema aberto,
ele está em contínua simbiose com quatro amplos e complexos cenários conectados à base de um conjunto de relações ecológicas, sociais, econômicas e culturais. Nesse sentido, está sujeito a vetores de transformações de diferentes origens. Importantes desenvolvimentos recentes são, por exemplo, o surgimento de demanda por tendências influenciadas por novos padrões e valores da sociedade e da família; a consolidação do setor, em virtude das inovações tecnológicas, da globalização ou do resultado das adaptações necessárias, decorrentes das mudanças climáticas; a retratilidade econômica; as convulsões sociais; a instabilidade política; a insegurança nos modos de transporte; os riscos meteorológicos e geológicos; os adventos epidêmicos e pandêmicos; o terrorismo; entre outros. Por outro lado, o perfil de gerenciamento das evoluções é desafiado pela interdependência sistemática. Como modelo, podemos tomar a direção contrária aos níveis de empresas, como também o confronto entre política e gestão institucional da atividade. Falta-nos, até o momento, uma visão holística e abrangente sobre o direcionamento bem-sucedido que suscite os requisitos necessários para sua realização, no sentido das evoluções no turismo. Fato que se torna desestimulante ao considerarmos que as mudanças ou adaptações à transformação e à inovação representam mais que uma prospectiva ou um desenvolvimento de novos produtos. A mudança exige acesso a novos modelos de desenvolvimento sustentável e ao gerenciamento orientado em longo prazo, o qual deverá levar em conta um conjunto de fatores estratégicos, logísticos e inovadores, ou seja, o espectro de novos cenários exógenos e endógenos. O turismo também sempre fará parte do sistema socioeconômico, com importantes aproximações dos elos natural e cultural, promovendo mudanças no campo do complexo fenômeno do setor. Será necessária, portanto, uma linguagem comum a todos os elementos que compõem o sistema. Para compreender e liderar as mudanças, será necessário proceder, ainda, a uma análise profunda desses intercâmbios, como pretende o Sistema de Turismo (Sistur) em toda sua abrangência, representação holística e complexidade. Como modelo teórico, o Sistur busca em sua instrumentalização retratar, até o limite máximo, a configuração de um fenômeno como o do turismo, tão sujeito a variáveis internas e externas que nos escapam no momento da análise científica, procurando, assim, em seu esforço de cristalização, estudá-las, determiná-las e avaliá-las. Esse modelo referencial revela, como um instantâneo fotográfico do turismo em sua amplitude, complexidade e multi causalidade, um esquema sintetizador, dinâmico, que demonstra as combinações de forças e energias sempre em movimento. A visão arguta desse universo inter, multi e transdisciplinar obrigam-nos a rever, continuamente, instrumentos de investigação e análise para atingir nosso ideal, embora eles sempre estejam defasados pela celeridade dos acontecimentos. De acordo com o estado atual do desenvolvimento do turismo, chegamos à conclusão de que, na esteira dos grandes movimentos de capitais e negócios, é preciso surgir oportunidades inéditas de estudos, pesquisas e programas de capacitação e qualificação, bem como uma permanente inovação e atualização da ciência, da tecnologia e da pesquisa para colimar o desenvolvimento global sustentável do sistema de turismo. O crescimento do turismo gera externalidades positivas e negativas na sociedade, na economia e no meio ambiente, que podem fortalecer ou enfraquecer o desenvolvimento no sentido da realimentação sistêmica. Desse modo, surge uma importante questão: que nível de crescimento pode ser considerado ideal e sustentável na região considerada? Importantes tendências neste início de século XXI, relacionadas ao turismo, são resultantes da combinação e do agrupamento de atividades de trabalho e lazer; do emprego eficiente do escasso tempo para o ócio contemplativo e participativo; da procura por um leque de pacotes de serviços; e, ainda, do novo comportamento da sociedade baseada no consumo e na mídia globalizada. Um novo modelo de vida nasce do número crescente de pessoas que dividem sua permanência em diferentes destinos, como decorrência de suas atividades de trabalho amplamente dilatadas pela internacionalização da economia, paralelamente à disponibilidade e à qualidade de lazer e entretenimento. As tendências de produção influenciam consideravelmente o fenômeno do turismo, acelerando a produtividade, a competitividade, a evolução na produção de bens e serviços, bem como as mudanças e transformações na estrutura do setor. O desenvolvimento no mercado financeiro, por sua vez, lidera os investimentos latentes voltados a modalidades específicas de infraestrutura do turismo. O surgimento das facilidades do leasing impulsionou os investimentos em fretamento de voos para pacotes turísticos, cruzeiros marítimos e roteiros rodoviários de longo percurso. Larga escala de empreendimentos – como resorts, bloqueio permanente de unidades habitacionais em redes empresariais entre operadoras e hotéis – tem sido requisito importante para reorientar o crescimento do tráfego turístico. Em vez de serviços individuais entregues por empresas de viagens tipo all inclusive, torna-se necessário o turismo customizado e diferenciado. Assim, novos desenvolvimentos na demanda e no atendimento causam um impacto no ciclo de vida dos produtos, fidelizando o cliente. Eles comandam a emergência de novas destinações e novos segmentos de produtos de turismo. Turismo que depende dos recursos externos e contagia o entorno dos núcleos receptivos e dos polos de atração em que a comunidade local deve participar e engajar-se nesse processo cooperado de produção. Há mudança de produtos turísticos, como o crescimento de uma parte secundária dos meios de hospedagem, que vão desde o bed and breakfast, com residências familiares, pousadas e acomodações extra-hoteleiras, até cadeias hoteleiras e redes integradas de hospitalidade. Esse fato tem sido um fardo pesado e um desafio permanente e complexo à adaptação ao meio ambiente, considerando os aspectos natural e social. O gerenciamento da mudança tem de superar esses obstáculos e contribuir para o crescimento sustentável. O turismo deve integrar políticas públicas e ações privadas, contribuindo sempre para o equilíbrio do desenvolvimento sustentável. Ele deve aperfeiçoar a situação econômica nas áreas de estrutura fraca e, igualmente, concorrer para o bem-estar da população local, reduzindo o desemprego e a pobreza. Assim, a adaptação para a mudança inclui, também, a reciclagem dos recursos naturais e culturais. O gerenciamento da mudança, com necessário e imprescindível planejamento, monitoramento, avaliação e controle, não tem sido prática corrente em nossas destinações turísticas. Razão pela quais muitos lugares turísticos tiveram sua competitividade enfraquecida, integrando um círculo vicioso de decréscimo de demanda e redução na área de investimentos por não readaptarem continuamente suas estruturas às novas exigências do mercado, aos desenvolvimentos tecnológicos e aos cenários de sustentabilidade. Este livro pretende avançar na definição e na configuração de políticas públicas que vêm se implantando no processo de regionalização do turismo, ainda lento e incipiente em sua execução. Visa também destacar o valor primordial dos clusters na transformação integrada e no desempenho da tríplice combinação de atuação comunitária efetiva, de ação governamental obrigatória e de presença maciça da iniciativa privada. Nesse sentido, a preocupação maior ao elaborar o conteúdo deste livro foi abranger, tanto quanto possível, os temas que conformam essencialmente a instrumentalização, o planejamento, a intervenção do Estado, a mobilização social e a rede empresarialde produção na formação e consolidação de clusters de turismo. A seleção dos colaboradores baseou-se na experiência, no conhecimento e na prática das especialidades que dominam, em especial na observação constante de suas trajetórias pessoal e profissional, de produção de pesquisa, desenvolvimento da teoria e projeção intelectual. O intuito final desta obra foi munir os estudiosos do turismo de um instrumento capaz de transpor limites de desafios instigantes, da real e inequívoca passagem de meros roteiros turísticos para a verdadeira regionalização do turismo, sem a qual nenhuma providência, seja pública ou privada, resultará de fato em um processo indispensável de manutenção e consolidação das etapas que compõem a meta almejada do desenvolvimento sustentável do turismo. Como uma nota final de apresentação, gostaria de salientar a ausência de atenção e consideração para a inclusão das populações locais em processos produtivos locais e regionais, como também a falta de sensibilidade, de conhecimento e de apreensão mental de lideranças públicas e empresariais em torno do que seja desenvolvimento endógeno, ou seja, com a efetiva participação da comunidade local.
A falta de sintonia entre o planejado, o vivido e o desejado, principalmente entre os legisladores e executores de qualquer programa político-partidário-institucional, obstam em muito a total compreensão da realidade concreta e prejudicam o surgimento da universidade como mediadora por excelência e perenidade, de impasses, entraves e outros problemas de conflito de competência, áreas exclusivas de domínio e capacidade profissional dos recursos humanos envolvidos. Resta, assim, ponderar o exposto, refletir sobre a dinâmica da movimentação social e cultural e propor as diretrizes necessárias para o alcance real da sustentabilidade.
 Mario Carlos Beni Organizador
PARTE 1
POLÍTICAS PÚBLICAS E PLANEJAMENTO DE ESPAÇOS TURÍSTICOS
1
Espaço, paisagem, lugar, território e região –
a organização do espaço turístico
 ANTONIO CARLOS SARTI
ODALÉIA TELLES MARCONDES MACHADO QUEIROZ
Introdução 
Observando as profundas modificações que vêm acontecendo na atualidade decorrentes, principalmente, do processo de globalização, pode‐se visualizar um novo panorama geopolítico e econômico apontando para uma grande reestruturação do espaço em escala mundial. O principal propósito deste capítulo é apresentar um painel das conjunturas passadas e atuais em que a atividade turística ocorreu e vem ocorrendo como fator impulsionador de arranjos e rearranjos sócio espaciais, que podem ser locais e/ou ter base regional no Brasil. Além disso, pretende‐se localizar o fenômeno turismo no espaço, evidenciando suas formas e estratégias, identificando como ele causa mudanças e adaptações onde é realizado, algumas vezes contribuindo para a individualidade dos lugares e, muitas vezes, uniformizando‐os e massificando‐os. Objetivou‐se captar a coexistência do turismo com outras forças que atuam no espaço, identificando uma variedade de fenômenos interligados, suas alterações concretas e aparentes, discutindo a sua relação com a sociedade e com a natureza dos lugares. A intenção é buscar a origem das principais características da atividade turística junto ao espaço, tentando estabelecer generalizações e, ao mesmo tempo, buscando especificidades.
Duas características intrínsecas ao turismo o diferenciam, fundamentalmente, de outras atividades econômicas ou produtivas. Uma delas é o fato de o turismo ser, antes de qualquer coisa, uma prática social. A outra é o fato de ser o espaço seu principal objeto de consumo. Como prática social, a atividade do turismo tem o turista como principal protagonista, e isso implica reconhecer que, mesmo diante da hegemonia de agentes de mercado e do estado, o “mundo do turismo” não se restringe às ações hegemônicas de atores hegemônicos. O turismo se dá na escala e na efervescência da vida nos lugares e mesmo nos lugares cuja vida está profundamente imbricada à atividade do turismo, sua existência sempre vai além das lógicas impostas pela atividade. Contramovimentos, contrarracionalidades, horizontalidades, como quer que as denominemos, as relações social e historicamente construídas por um dado grupo dão o tom da maior ou menor resistência dos lugares aos vetores alienados e alienígenas trazidos com o turismo. (Cruz, 2006, p. 338)
É finalidade deste capítulo entender as intervenções e induções do Estado relacionadas ao turismo. Como fenômeno de deslocamento firmado na atualidade, o turismo é cada vez mais valorizado, provocando desafios econômicos, sociais, culturais e políticos; assumindo novos formatos; e atingindo cada vez mais indivíduos. É fundamental uma análise de seus desdobramentos, que necessitam ser examinados com atenção, pois seus impactos possuem caráter dialético, pois, apesar de trazerem benefícios, podem ter consequências indesejadas. A ciência geográfica tem contribuído para o aprimoramento do conhecimento acerca do turismo como fenômeno sócio espacial e econômico, elucidando contradições da realidade. A pesquisa produzida a partir dessa relação de colaboração e a compreensão das extensões social, política, econômica, psicológica e afetiva relativas ao turismo apoiam‐se sobre conceitos da geografia como espaço, território, paisagem e região. O espaço é uma categoria, é construído historicamente e é uma liga que mistura elementos distintos formando um todo. Entender como se dá seu domínio e sua organização, a apropriação do território e a variação regional leva à compreensão da sociedade que ali vive. Neste texto, adotou‐se a teoria do espaço, de Milton Santos (1996), por ser abrangente, e apresentar como uma linha de interpretação e de pensamento que oferece subsídios e bases consistentes para explicar o processo social de construção do espaço e do território turísticos. Santos (1978) apresenta o espaço geográfico como a união indissociável de sistemas de objetos e sistemas de ações e suas formas híbridas, configurando‐se também como um conjunto de fluxos e fixos. Fluxos resultam de ações que atravessam ou se instalam nos fixos, modificando seu significado e valor. Fixos e fluxos, juntos, expressam a realidade geográfica.
O espaço é fruto de uma construção histórica que inclui ordens local e global;
construção esta realizada por meio das técnicas, que “são um conjunto de meios instrumentais e sociais, com os quais o homem realiza sua vida, produz e, ao mesmo tempo, cria espaço” (Santos, 1996, p. 16). Pode‐se afirmar, então, que Santos (1996) adota em sua teoria do espaço uma abordagem geográfico‐humana, indicando serem os geoobjetos resultantes das ações antrópicas. É relevante destacar os pesquisadores Moraes e Costa (1984), que explicam os conceitos de valor do espaço e valor no espaço. O valor do espaço (contido) diz respeito aos recursos naturais existentes previamente, e o valor no espaço é aquele agregado a ele (valorização econômica, valor de troca, criado). A investigação dos estudiosos evidencia principalmente a valorização do espaço do ponto de vista capitalista, mas também o destaca a partir de um procedimento de valorização subjetiva. Esses pesquisadores “abrem as vias para a construção de uma teoria que abarque o espaço como um sistema de valores” (Pereira e Oliveira, 2010, p. 867). Nos dias de hoje, a valorização do espaço ocorre de diferentes formas, muitas vezes ultrapassando o monetário e podendo envolver também a cultura e a política (Moraes, 2002). O espaço apresenta contradições e “ao mesmo tempo que ações e objetos interagem de forma mútua e simultânea a esses objetos e a essas ações são produzidos valores que fazem parte do processo de produção espacial” (Pereira e Oliveira, 2010, p. 859). O processo de produção espacial descrito pelos autores citados anteriormente pode ser exemplificado por meio do estabelecimento dos balneários turísticos da costa brasileira. O surgimento deles ocorreu em um determinado período,com a implementação gradativa de equipamentos de infraestrutura, saneamento, meios de hospedagem, casas de veraneio e restaurantes, o que elevou “o preço do solo urbano [...] aumentando a especulação imobiliária e produzindo novas formas de habitação e consumo” (Pereira e Oliveira, 2010, p. 869). Esse mesmo litoral possui atributos naturais preexistentes, como o mar, os rios, as formas de relevo, a vegetação, que compõem o espaço com um valor paisagístico que passa pela percepção e apreciação dos visitantes. “Em outras palavras, os objetos geográficos contêm valores que podem mudar de acordo com a situação e com os interesses dos atores sociais” (Pereira e Oliveira, 2010, p. 869). Nesse contexto, é fundamental, então, dizer que o espaço é um elemento essencial para o turismo.
As imagens de lugares longínquos, paradisíacos, que evocam o desejo de conhecê‐los, é uma força fundamental que motiva e influencia o movimento das migrações em massa verificado na sociedade contemporânea. São migrações que, fazendo uso do tempo de ócio e de lazer, buscam o enriquecimento cultural [...] Mas o turismo é também um fenômeno espacial [...] porque a ideia [...] da viagem turística é interpretada pelo turista como a possibilidade de realizar um deslocamento [...] de sair do seu espaço vivido à procura de outros lugares [...], porque o turismo contribui para a valorização de espaços estruturados com a finalidade de acomodar os visitantes [...] Essa valorização dos espaços pelo turismo [...] decorre [...] das ações executadas por agentes públicos e privados através da implantação de infraestruturas. (Silveira, 2005, p. 1).
Os turistas buscam os núcleos receptivos de acordo com seus atrativos, que,conforme Valenzuela (1984, p. 4), são os “fatores espaciais de decisão turística”. As atrações que têm maior potencialidade são: paraísos tropicais, com muito sol e mar, reservas naturais e espaços rurais. Para que haja uma verdadeira compreensão do espaço e de sua transformação pelo turismo é cabível entender ainda as categorias de análise da paisagem, do lugar, do território e da região, sendo fundamental apreender a estreita sobreposição entre o natural e o artificial. A paisagem pode ser vista de diferentes óticas: na ciência geográfica é observada como objeto de estudo e na visão do turismo é um recurso, uma mercadoria. Para Milton Santos, a paisagem foi concebida como a expressão materializada do espaço geográfico, interpretando‐a como forma que exprime heranças representativas das contínuas relações encontradas entre o homem e a natureza (Santos,1996). Dessa forma, o estudioso afirma que paisagem é um sistema material que junta objetos passados e presentes, expressão materializada do espaço geográfico, forma e parte constituinte deste. O espaço é tudo isso e também a vida que lhe dá animação, constituindo‐se em um sistema de valores que passa por metamorfoses constantemente. Bertrand (1971, p. 2) diz que a paisagem é “[...] o resultado da combinação dinâmica de elementos físicos, biológicos que [...] fazem da paisagem um conjunto único e indissociável, em perpétua evolução”, é uma determinada porção materializada do espaço. Percebe‐se a paisagem por meio dos sentidos e, assim, ela pode provocar as mais diferentes sensações, dependendo do olhar de cada um. De acordo com Rodrigues (2001), a paisagem possui força suficiente para excitar modalidades sensoriais perceptivas, como visão, audição, tato, temperatura, sinestesia, dor, paladar e olfato, cada uma delas captando uma parte da realidade de acordo com a subjetividade de quem observa. Há uma estreita relação entre paisagem e turismo. Este valoriza a paisagem, transformando‐a em recurso turístico a ser apropriado, tanto a natural como a humanizada, já modificada pelas ações antrópicas. Há, então, inúmeros motivos que podem direcionar a demanda turística, muitos deles relacionados a uma maior apreciação dos aspectos ambientais e paisagísticos a serem consumidos no núcleo receptor (OMT, 1999)
Para um turista, a paisagem oferece elementos únicos de um lugar, com uma dinâmica constante, que é o resultado de processos físicos, biológicos e culturais interagindo. Ao apreciar uma paisagem, que pode ser urbana ou rural, litorânea ou continental, o turista poderá ver sua beleza cênica e, com um olhar um pouco mais atento, interpretar suas marcas, entendendo como os homens que ali viveram e aqueles que ainda ali moram, se apropriaram daquele espaço e o modificaram no decorrer do tempo. (Queiroz, 2009, p. 46).
O turismo vai transformando o espaço, configurando‐se como um devorador de paisagens, abocanhando territórios e natureza (Krippendorf, 1977), causando uma série de impactos. Os locais mais atingidos por essa transformação são as áreas de deslocamento e os núcleos receptores onde ocorre o processo de observação da paisagem.
Dentro desse contexto temos o turismo paisagístico praticado em áreas de beleza cênica e qualidade visual, locais que guardam certas especificidades socioambientais como vegetação exuberante, exótica ou simplesmente diferente, rede hidrográfica peculiar, aspectos do clima e da topografia formando conjuntos únicos, grutas, cavernas, praias, ilhas, bem como características da comunidade local que exercem atração para visitantes (danças, música, artesanato, gastronomia). A atividade oferece a oportunidade de lazer, deslocamento, evasão, belas paisagens, satisfação e descanso. Praticar o turismo paisagístico significa fugir dos meios artificiais, das ruas e prédios, procurando a natureza perdida em algum lugar do passado. (Queiroz, 2009, p. 50)
O espaço geográfico compreendido como palco onde as inter‐relações se concretizam e resultam em um produto social, em um tempo histórico, tem suas particularidades em um lugar específico. Este é construído na vida cotidiana, sofrendo influência das instituições hegemônicas (multinacionais, grupos econômicos etc.) e das necessidades e anseios daqueles que ali vivem. Na verdade, lugar pode ser considerado a expressão do espaço geográfico em escala local, ou seja, a sua dimensão pontual. De acordo com Santos (1996), lugar constitui a dimensão da existência que se manifesta por meio do cotidiano compartido entre as pessoas, firmas e instituições. É nessa linha de pensamento que o autor afirma que “no lugar, nosso próximo, se superpõe, dialeticamente ao eixo das sucessões, que transmite os tempos externos das escalas superiores e o eixo dos tempos internos, que é o eixo das coexistências” (Santos, 1996, p. 18). O lugar torna‐se singular a partir do subjetivo relacionado aos aspectos perceptivos de cada um, processo que, geralmente, envolve sentimentos, e isso leva à compreensão do lugar pelas lentes das necessidades existenciais, como localização, mobilidade, interação com os objetos e com as pessoas. É o que Santos (1996) chamou de mundo vivido local‐global. Carlos (2007, p. 11) ensina que
o lugar guarda em si e não fora dele o seu significado e as dimensões do movimento da vida, possível de ser apreendido pela memória, através dos sentidos e do corpo. O lugar se produz na articulação contraditória entre o mundial que se anuncia e a especificidade histórica do particular. Deste modo o lugar se apresentaria como ponto de articulação entre a mundialidade em constituição e o local enquanto especificidade concreta, enquanto momento.
A história de cada lugar se realiza de acordo com os valores socioculturais tradições e costumes próprios, em uma dinâmica que conta com elementos de dentro e de fora, desenvolvendo‐se a existência. Sendo assim,
o lugar abre a perspectiva para se pensar o viver e o habitar, o uso e o consumo, os processos de apropriação do espaço. Ao mesmo tempo, posto que preenchido por múltiplas coações, expõe as pressões que se exercem em todos os níveis. Refere‐se ao fato de que a realidade do mundo moderno reproduz‐se em diferentes níveis [...] no lugar encontramos as mesmas determinações da totalidade sem com isso eliminar‐se as particularidades, pois cada sociedade produz seu espaço, determina os ritmosda vida, os modos de apropriação expressando sua função social, seus projetos e desejos. (Carlos, 2007, p. 14‐5)
Na atualidade, tem havido uma revalorização dos hábitos, dos costumes e das tradições das pequenas comunidades do lugar, configurando‐se, em um primeiro momento, como a emergência das especificidades locais, em uma tentativa de não se perder a identidade no mundo globalizado. Entretanto, é relevante dizer que esses mesmos costumes e tradições, ao se constituírem em algo diverso do que é massificado, transformam‐se em “bens” a serem comercializados, criando‐se novo segmento de mercado turístico. Os saberes tradicionais tornam‐se atrativos por meio da gastronomia típica, do artesanato, dos festejos, da história e da cultura. As diversas regiões brasileiras, especialmente as pequenas comunidades estabelecidas como lugares especiais e diferentes, possuem uma riqueza cultural significativa e, gradativamente, o turismo tem se apropriado delas, fortalecendo a atividade e dando maior visibilidade à importância de seu patrimônio, aproximando muitos visitantes. Continuando o entendimento das modificações sócio espaciais decorrentes do turismo, é fundamental também a compreensão de território. Para Raffestin (1993),
o território é delimitado por e a partir de relações de poder, sendo um espaço político por excelência. Forma‐se a partir do espaço resultante da ação de um agente. Este se apropria do espaço e o territorializa (Raffestin, 1993, p. 143). É fundamental esclarecer que, quando o espaço é apropriado, transforma‐se em lugar, segundo Lefebvre (2006), e essa apropriação, ocorrendo por meio das construções socioculturais, torna o espaço um território. Território é entendido também como uma extensão usada e apropriada, área
de vivência e de reprodução, é unidade e diversidade (Santos e Silveira, 2008). Seguindo o mesmo raciocínio citado, Saquet (2007) diz que o território é resultado das relações socioespaciais e ambientais, apresentando conteúdo, meio e processo; estes mudam conforme o tempo histórico e a cultura da sociedade. Então, pode‐se dizer que essas mudanças históricas e culturais podem criar novos territórios, fragmentando‐os ou juntando‐os, imprimindo‐lhes novos significados resultantes da apropriação por certo agente social que passará a ter controle sobre estes (Rosen‐dahl, 2004). O Estado brasileiro, por meio do Ministério do Desenvolvimento Agrário,
aborda território como:
um espaço físico, geograficamente definido, geralmente contínuo, compreendendo a cidade e o campo, caracterizado por critérios multidimensionais – tais como o ambiente, a economia, a sociedade, a cultura, a política e as instituições –, e uma população com grupos sociais relativamente distintos, que se relacionam interna e externamente por meio de processos específicos, onde se pode distinguir um ou mais elementos que indicam identidade e coesão social, cultural e territorial. (Brasil, 2004, p. 5‐6)
Em outras palavras, Souza (2002) diz que território pode ser entendido como limite político administrativo e também como espaço efetivamente usado, apresentando, na atualidade, características de aspecto dialético: densidade e rarefação, fluidez e viscosidade. No mundo globalizado de hoje, em que as empresas transnacionais têm buscado os mais diversos territórios para sua expansão, vem sendo implementada uma nova forma de fragmentação territorial. Os territórios mais densos são espaços luminosos e os rarefeitos são opacos. Os espaços luminosos apresentam maiores densidades técnicas e informacionais, chamando para si maiores investimentos das empresas que geram fluidez e movimento, geralmente, comandados por agentes externos, desprestigiando a sociedade local (Santos, 1996). Enfim, pode‐se dizer que o território é sim um tecido social dinâmico, caracterizado pelas relações de poder da sociedade que ali vive, pelos seus sentimentos de pertencimento e identidade, que produzem a territorialidade dos indivíduos. Por outro lado, o território também pode ser influenciado por forças externas que não correspondem ao local, e sim aos desígnios globais.
Focalizando o turismo na escala planetária, é consensual considerá‐lo como um dos elementos fundamentais da globalização, estando subordinado aos atores hegemônicos que capitaneiam a economia global [...]. Assim, o turismo só pode ser entendido à luz de matrizes conceituais‐metodológicas que iluminam o contexto social da modernidade, particularmente a partir do fordismo, o qual impôs um pacto social baseado na redistribuição do excedente material da produção e na distinção bipolar do espaço‐tempo, nomeada como esfera de trabalho e esfera do ócio. Essa dualidade dilui‐se no pós‐fordismo nos países centrais do capitalismo, mas não desaparece por completo, embora se considere a flexibilidade da produção e dos calendários operativos. Tais ambiguidades dificultam as análises que procuram apreender as dinâmicas dos espaços de lazer, tanto no campo como na cidade, assim como as novas territorialidades produzidas pelo turismo. (Rodrigues, 2009, p. 298)
Região é um subespaço composto por um conjunto de municípios, formando um certo conjunto com determinadas características. Santos (1996) afirmou que a região está relacionada às ações da sociedade, que cria formas‐objeto no espaço, materializando‐a. Na atualidade, a região tornou‐se extremamente complexa, qualquer subespaço está sujeito ao processo de globalização e fragmentação, ou seja, de individualização e regionalização (Santos, 1999). Complementando a citação acima, Elias (1996) diz que região constitui‐se em uma fração do território que recebe influências externas que a transformam, atendendo a interesses socioeconômicos e políticos. É composta por um conjunto de formas típicas que lhe são próprias e por multiplicidades de ações que lhe são externas. Atualmente, os regionalismos se propagam a despeito da globalização, que tende a homogeneizar os lugares. Em outras palavras, as especificidades e heterogeneidades emergem com força, evidenciando as diferenças nesse contexto de globalização e fragmentação. Em muitos lugares, as identidades locais, mesmo pressionadas pela globalização, organizam‐se para resistir à massificação. A regionalização relaciona‐se às novas formas de manifestação da diversidade territorial. “[...] os processos responsáveis pela formação de regiões acabam interligando o político, o econômico e o cultural” (Haesbaert, 1999, p. 10).
Regionalizar não é simplesmente recortar o espaço a partir de parâmetros genéricos, quantitativos, diferenças de grau como faixas de renda, produto interno bruto, fluxos comerciais etc. Deve envolver, igualmente, as diferenças de natureza como aquelas de ordem mais estritamente cultural. (Haesbaert, 1999, p. 24)
Por outro lado, os regionalismos contemporâneos são apreciados em função da própria conjuntura de globalização, uma vez que a “diversidade vende” e novos nichos de mercado aparecem em função da valorização de costumes e tradições regionais (Herbertson, 1995 apud Haesbaert, 1999, p. 24).
Organização do turismo – recortes socioespacial e temporal 
Amplas mudanças ocorreram no Brasil, principalmente a partir dos anos de 1950, quando foram intensificados os processos de industrialização e do êxodo rural; transformações essas decorrentes de um projeto modernizador implementado, principalmente, pelo Estado, que acarretou uma série de rearranjos socioespaciais caracterizados por “novos fixos e fluxos, ligados aos diversos setores econômicos, produtivos e lucrativos, a exemplo da agricultura com base técnico‐científica e do turismo” (Lima et al., 2009, p. 1). A intenção foi intensificar a produtividade espacial, introduzindo novas racionalidades em diversos lugares que possuíam potencialidade turística ou outra vocação econômica. Assim, compreende‐se que os espaços turísticos foram sendo construídos no país, notadamente no litoral, com principais atrativos tropicais relacionados ao sol e à praia – muito valorizados hoje –, incrementando uma atividade bem diversa daquela preexistentena comunidade, o que causou muitos impactos, alguns positivos e outros indesejáveis, como a degradação ambiental. Com o desenvolvimento de atividades turísticas “estranhas às coletividades, verticalidades dão novos significados aos [...] espaços de todos, até então” (Lima et al., 2009, p. 3). Em outras palavras, é possível assegurar que o incremento do turismo causa conflitos e tensões na extensão socioespacial do núcleo receptivo, fenômeno tipicamente capitalista, cheio de contradições e dinâmico. Por outro lado, é importante dizer que a atividade turística pode sim modificar os lugares, e refuncionalizar espaços, criando, às vezes, um outro meio geográfico. Ao mesmo tempo, o turismo pode também valorizar os patrimônios naturais e culturais, o que nos faz concordar com Santos (1996) quando este afirma que a associação ou a fusão entre os meios técnico e natural resulta no meio geográfico, meio técnico‐científico‐informacional, e assim “o espaço é um misto, um híbrido, um composto de formas‐conteúdo” (Santos, 1996, p. 42). O composto de formas resultante do turismo ocorre em situações particulares nos lugares, influenciando as maneiras de viver daqueles que ali residem. O espaço em processo de turistificação vai se modificando, se rearranjando e se reconstruindo a partir da implantação da atividade. Em outras palavras, o espaço sob a égide do turismo modifica‐se, fruto das relações sociais entre população autóctone e visitantes, entre estes e os recursos naturais existentes. A paisagem nativa é a matéria‐prima a ser explorada, a ser consumida; antes ignorada, com seus novos significados, ela passa a ser cobiçada. A sua apropriação pelo turismo pode levar a uma outra ordenação mais restrita, o lugar e o cotidiano abrem‐se aos negócios e à especulação imobiliária. Pelo menos por certo período de tempo, a atividade turística, se bem encaminhada, pode ser respeitável fonte de renda. Novas infraestruturas são implementadas, objetivando oferecer as condições ideais para receber o turismo, muitas vezes com suporte de financiamentos dos cofres públicos e empresários, como: construção de estradas, urbanização, saneamento básico etc. Assim, pode‐se afirmar que o território turístico socialmente construído tem características específicas, evidenciando o momento de sua apropriação e particularidades que dizem respeito ao processo de sua implementação. O território brasileiro tem sofrido muitas mudanças principalmente em virtude dos avanços tecnológicos dentro de um processo socioeconômico. Há grande dinâmica nos sistemas estruturais relacionados ao aproveitamento dos recursos hídricos (irrigação, barragens, geração de energia elétrica); sistemas de transportes (portos, aeroportos, dutos, ferrovias, rodovias, hidrovias); avanços em telecomunicações e insumos agrícolas. A implementação desses objetos no espaço conferiu valor às atividades ali desenvolvidas. criando uma rede de pontos interligados a um rearranjo da configuração territorial (Santos e Silveira, 2008). Dentro desse contexto de inúmeras modificações, o turismo também aparece com vitalidade no Brasil, causando diversos impactos socioeconômicos e ambientais, que acompanham o processo de construção do espaço turistificado com fixos e fluxos. É relevante dizer que esse território específico, o do turismo, origina‐se de uma ampla multiplicidade de funções, de situações e de diferentes processos. Os fixos são elementos naturais, como água, solo, clima, relevo, fauna e flora, e os elementos construídos pelos homens, como as edificações e as infraestruturas urbanas, amplamente usadas pelas atividades turísticas. O subsistema dos fluxos diz respeito às dinâmicas socioculturais (renda, trabalho, lazer, escolaridade, organização e comportamento social) e às dinâmicas econômicas (produção, distribuição, consumo e acumulação), segundo Santos (1996). O Brasil é um país com muitos atrativos naturais e culturais, ou seja, os fixos, como os recursos hídricos, edáficos, climatológicos, geomorfológicos, geológicos e a biodiversidade, bem como seu patrimônio cultural presente na sociedade e em prédios históricos, monumentos e relíquias arquitetônicas constitui uma imensa riqueza. O país apresenta uma grande diversidade de paisagens que são constantemente reestruturadas em função da dinâmica socioeconômica e política e, por outro lado, muitas delas resistem ao novo, exibindo vestígios do passado com usos atuais. As paisagens recebem influência dos fluxos endógenos e exógenos que, com o uso de novas tecnologias, passam por remodelação. A atividade turística vem, há várias décadas, se apropriando dos elementos naturais e construídos pelas ações humanas, (re)organizando o espaço, turistificando o território. Assim, a paisagem do turismo torna‐se um espaço com uma funcionalidade própria, valorizado pelos seus aspectos cênicos e estéticos, compondo um cenário como em um espetáculo a ser observado e admirado pelos turistas; espetáculo esse que pode ser rural, urbano, cultural ou natural. O espaço é o objeto central de consumo do turismo e, em função disso, evidencia as mudanças que a atividade cria, fazendo que apareçam outros objetos e se apropriando dos já existentes.
primeira metade do século XX – termas e cassinos O turismo, nos moldes que conhecemos hoje, se desenvolveu vagarosamente
no Brasil. É uma atividade oriunda, principalmente, do aporte do uso de novas tecnologias criadas pela Revolução Industrial, como a melhoria dos transportes marítimos, ferroviários, rodoviários e aéreos. Esse movimento surgiu na Europa e foi incorporado gradativamente aos hábitos dos brasileiros.
Os verdadeiros “Anos Dourados” do turismo brasileiro acontecem [...] no século XX, quando surgem construções fora dos padrões comuns, dando vida a shows e espetáculos voltados para uma elite acostumada à moda europeia, surgindo os cassinos, incorporados ora por hotéis luxuosíssimos, ora por estâncias hidrominerais, termais ou climáticas de alta classe. (Paixão, 2003, p. 1)
Até os anos de 1930, o Brasil ainda vivia o período da Primeira República, com os seus controles político e econômico nas mãos da oligarquia rural. Com a Revolução de 1930, o contexto nacional mudou radicalmente, principalmente no que se refere ao fim da hegemonia da burguesia do café. As atividades urbanas tiveram uma significativa dinamização, graças ao crescimento da produção industrial que já vinha ocorrendo. Nesse princípio da Segunda República (1930‐1937) e, depois, durante o período da ditadura do Estado Novo (1937‐1945), imposta por Getúlio Vargas, o êxodo rural teve início; foi nesse momento também que as viagens pelo país foram intensificadas (Pesavento, 1995). Essa conjuntura socioeconômica, então, era propícia ao desenvolvimento do turismo, e foram surgindo as estâncias termais brasileiras, bem como as hidrominerais e climáticas, lugares de cura construídos especificamente para práticas lúdicas, com destaque para os cassinos junto aos balneários (Aucilino, 2000). Nesse cenário, houve uma requalificação do território e de suas características, que se voltaram para a atividade turística. O turismo se cristalizou na paisagem, em objetos geográficos constituídos principalmente pelos recursos naturais, como a água e o clima. As estâncias brasileiras também revelam as marcas deixadas no espaço pelas relações entre o homem e a natureza (Santos, 1996).
As décadas de 1960 a 1980 – criação da Embratur
O turismo como elemento causador de mudanças socioespaciais não pode ser encarado isoladamente, mas sim dentro de um movimento maior, integrando a história do território brasileiro. A sua trajetória, como uma expressão da visão do Estado sobre o território nacional, aponta para uma tradição de história recente, derivada de conhecimentos gestados no âmbito do planejamento econômico, primeiro nos países de economia centralizada e, depois, em países de economia de mercado aberto. Onde o acúmulo foi do planejamento centralizado, o turismo, mais comumente visto como recurso recreacional, entrou como um componente a mais entre ostantos que o Estado deveria suprir aos cidadãos, acoplado a políticas de lazer e recreação fortemente orientadas para nutrir a visão nacionalista e aprofundar a orientação ideológica. Onde a tradição vai se formando a partir das regras do mercado aberto, o pensamento econômico liberal ainda trabalha com enfoques setoriais. No caso do planejamento em turismo, esta característica foi particularmente enfatizada, pois os vários componentes da cadeia de serviços que ordena foram isolados e tratados segundo o modelo reducionista. Entretanto, no meio acadêmico, o fenômeno vai sendo investigado e conhecidos seus entrelaçamentos em múltiplas e simultâneas dimensões nos campos social, ambiental, econômico, cultural e outras, provocando impressões no espaço e na paisagem. Reconhece‐se que está fortemente alicerçado em infraestrutura de uso comum entre visitantes, turistas ou não, e residentes, sendo dialeticamente dependente de mecanismos próprios do setor terciário avançado. No momento em que se afirmam propósitos expansionistas para atender a um fenômeno típico da sociedade industrial, no pós‐guerra, caracterizado pelo turismo de massas, o planejamento orientado pelo Estado, mesmo que na esfera privada, ainda carrega em si a maneira compartimentada e difusa de compreensão das decorrências positivas e negativas de sua operação. Na verdade, a concepção reinante de planejamento pregava a capacidade do meio técnico dominar e controlar todas as variáveis envolvidas em qualquer atividade, o que encobre e embaça a possibilidade de deixar revelar‐se a face perversa de uma atividade tão sedutora, levando à absoluta e completa ignorância dos impactos negativos, em detrimento da propalada imagem de “salvador da pátria” atribuída ao turismo. Do meio técnico dominante a um Estado forte em poder ou em autoritarismo, funde‐se a aliança entre este e a iniciativa privada. Consolida‐se a concepção de que cabe ao Estado planejar, implantar a infraestrutura e viabilizar a superestrutura necessária para a intervenção no território; e, ao empresariado, compete criar as soluções, na forma de negócios destinados ao atendimento das necessidades identificadas, no presente ou no futuro, em determinados lugares. O planejamento da atividade turística como competência do Estado passa a ser relevante ante a importância relativa que assume nas economias do pós‐guerra, especialmente em países ou regiões onde outras atividades econômicas são inviáveis ou de implantação mais complexa, surgindo vários modelos de planejamento derivados de outras áreas de conhecimento, especialmente da economia. Na América Latina, o interesse pelo planejamento econômico está relacionado com as ações da Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (Cepal), organismo vinculado à Organização das Nações Unidas (ONU), que promoveu, em 1953, a divulgação do documento Estudio Preliminar sobre la Técnica de Programación del Desarrollo Econômico (Angel Acerenza, 1999). No Brasil, a bossa nova reelabora a tradição do samba e incorpora a visão otimista dos Anos JK (governo de Juscelino Kubistchek de Oliveira, de 1956 a 1961) em si mesmo, propalando uma mensagem política e estética de planejar ao adotar o slogan “trinta anos em cinco” e edificar uma Nova Capital Federal, Brasília, no Planalto Central. Parece natural, portanto, que a iniciativa pioneira na direção de planejar o turismo remonte ao final dos anos de 1950, por meio do Tourism Project Brazil, resultado de parceria entre Ministério das Relações Exteriores, Confederação Nacional do Comércio e a International Corporation and Administration (ICA), de Washington, visando trazer ao Brasil (Rio de Janeiro, Ipanema) cidadãos nor‐te‐americanos (Pinto e Moesch, 2006). Durante a década de 1960 houve a criação de alguns órgãos estaduais de turismo e iniciativas governamentais pontuais ocorreram no sentido de levantar as potencialidades para a implementação da atividade. A Embratur é criada por meio do decreto‐lei n. 55, de 18.12.66, com sede no Rio de Janeiro, embora a capital já fosse Brasília. A inauguração do planejamento em turismo no Brasil pode ser identificada por meio da contratação, em 1971, da empresa francesa Scet Internacional para elaborar o Projeto Turis – Plano de Aproveitamento Turístico, objetivando equacionar o problema turístico no litoral Rio‐Santos, propondo “um planejamento normativo global, com estudos e normas de ocupação que integrassem as construções aos ambientes e destinações turísticas, visando à maximização da rentabilidade de toda a região aliada a uma implantação adequada” (Siqueira, 2010, p. 1). O modelo importado orientava‐se pelos mesmos pressupostos aplicados na ordenação territorial do litoral francês, transplantando‐o ao litoral da costa Rio‐Santos. Inicia‐se a construção da rodovia Rio‐Santos, integrante da BR‐101, aterrando mangues e florestas, invadindo áreas de comunidades tradicionais caiçaras e indígenas, mas, de outro lado, permitindo o acesso da classe média motorizada a praias ditas paradisíacas, até então acessíveis apenas aos mais radicais visitantes alocêntricos, aqueles que se sentem atraídos por novos destinos desconhecidos, onde ainda não existe o turismo (Plog, 1977). Fruto da concepção de “território como suporte físico para a ocupação humana, devendo ser corrigido na medida das necessidades básicas de salubridade e conforto” (Fratucci, 2010, p. 7), o ciclo perverso do turismo se instala irreversivelmente, transformando a paisagem e a vida das pessoas. Fica evidente que, mesmo com as advertências a respeito da fragilidade do ecossistema costeiro e as críticas contumazes durante a fase de construção, o planejamento turístico fora apenas um pretexto para outros tipos de negócios de interesse do Estado, então controlados pela Doutrina da Segurança Nacional. Também serviu para reforçar o imaginário da construção da megalópole São Paulo‐Rio de Janeiro, unificando as pequenas cidades do eixo rodoviário. No âmbito paulista surge, em 1974, o Projeto Rodotur, capitaneado pela então. Secretaria de Cultura, Esportes e Turismo, que destacava as rodovias do estado como vias dos fluxos de passageiros por finalidade, quantificando turistas que poderiam agregar à economia de um dado município e projetando os resultados para 1980 (São Paulo, 1974). A década de 1980 ficou caracterizada como um período de descontrole econômico brasileiro, com muitos problemas relativos à moeda, ao câmbio e financiamento etc., reduzindo a possibilidade de iniciativas de planejamento turístico. Entretanto, e por decorrência de tais fatores, tão fundamentais a qualquer economia, internalizar moeda forte por meio da exportação passa a ser estratégico. O turismo receptivo internacional passa a ser fonte de dólares ao mesmo tempo que o emissivo é reprimido. Tais condições foram levando ao fortalecimento da demanda interna, associada, evidentemente, a outros fatores, como a rápida urbanização. É um período cheio de conflitos, pois ao mesmo tempo que o país necessitava internalizar os gastos dos turistas estrangeiros, estes, apesar de reconhecerem a qualidade dos atributos paisagísticos e culturais locais, rejeitavam nosso país, principalmente em função dos problemas de violência e da falta de infraestrutura receptiva. Novas destinações e incentivos para o setor mobilizam a Embratur a deflagrar processo de inventariação da oferta turística, a partir de 1984, em resposta ao quadro dramático. O município foi identificado como a unidade de planejamento de onde deveriam partir as informações básicas, obedecendo à metodologia nacionalmente unificada, credenciando‐o para obter verbas e financiamentos federais. O programa deveria ser sustentado com o preenchimento de formulários pelos municípios, exigindo pessoal qualificado e reconhecimento inequívoco do turismo como um fator prioritário de desenvolvimento econômico, político e social. Nenhum desses fatores era (ou é) frequente num país tão desigual, o que prejudicou os esforços do planejar. Para o futuro do planejamento em turismo, a década de 1980 não foitotalmente perdida porque, durante esse período, Mario Carlos Beni desenvolveu o modelo do Sistur em sua tese de doutoramento Sistema de Turismo: construção de um modelo teórico‐referencial para aplicação na pesquisa em turismo, defendida, em setembro de 1988, na Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo – ECA‐USP – (Panosso Netto, 2005). Esse fato é marcante, porque o processo de criação do Sistur decorre da elaboração de conceitos desenvolvidos a partir da visão sistêmica, podendo ser entendido como marco na mudança de paradigma no planejamento em turismo no Brasil, pois emerge e se consolida amplamente como um modelo articulador em substituição ao modelo fragmentador. Beni aplicou esses conceitos ao turismo, e a visão sistêmica passou a influenciar a visão do Estado e da iniciativa privada, principalmente após a edição da obra Análise estrutural do turismo, em 1998. No início dos anos de 1990, com o nascimento de um governo marcado pela descentralização e abertura ao mercado mundial, a Embratur foi reformulada, tornando‐se Instituto Brasileiro de Turismo, vinculando‐se à Secretaria de Desenvolvimento Regional da Presidência da República, quando implementa a primeira política de âmbito nacional. A Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente e Desenvolvimento, realizada em junho de 1992, marca um momento de inflexão na afirmação do paradigma da sustentabilidade, derivado do conceito de eco desenvolvimento pregado por economistas desde a década de 1970. Dessa nova orientação resultam muitas decisões no âmbito das relações internacionais e, no final do evento, o mundo conheceu a Agenda 21 ali construída. Assim, a “Cúpula da Terra”, como ficou conhecida a Conferência, consolida o pensamento que concebe o desenvolvimento econômico dentro de certos limites balizados por princípios éticos, prudência, justiça e viabilidade. Assim, todas as atividades humanas no planeta devem ser orientadas pela solidariedade sincrônica e diacrônica entre as atuais e futuras gerações, o turismo incluso. Nos anos seguintes, termos e conceitos como turismo sustentável, ecoturismo,
turismo na natureza, turismo rural, assim como setores de serviços e atividades industriais (de transformação) acoplados a esses temas, ganham enorme visibilidade, e novos e amplos mercados. Essa nova visão do território em busca de atrativos que pudessem ser convertidos em produtos desencadeia uma corrida a espaços onde os atributos naturais são o foco do interesse. Unidades de conservação aceleram a elaboração e aprovação de planos de manejo, procurando conciliar a pressão para uso público com as demais finalidades previstas para as diferentes modalidades. Entretanto, o processo de impeachment e a renúncia do presidente da República, Fernando Collor de Mello, em dezembro de 1992, levaram à montagem de um novo governo e à priorização de ações na área da macroeconomia. Os planos de turismo ficam adormecidos até que a Embratur, em 1993, implanta o inventário da oferta turística, unificando as metodologias desenvolvidas nos anos anteriores, prevendo a realização de oficinas de treinamento e mantendo os mesmos critérios de hierarquização. A Embratur apresenta o inventário com a seguinte conceituação:
Inventário da oferta turística é o processo pelo qual se registra o conjunto de atrativos turísticos, dos equipamentos e serviços turísticos e da infraestrutura de apoio turístico, visando a correta ordenação e exploração do território, de forma a otimizar a utilização de seus recursos naturais e culturais. (Brasil, 1993)
Como é possível depreender, embora incorpore o conceito de “processo”, ele parece voltar‐se mais para questões de procedimento que de método. Tal concepção aprimora mas não rompe com o modelo compartimentador voltado para a gestão territorial e para objetivos econômicos, alicerçados nos recursos naturais e culturais percebidos como insumos. A inovação foi a abertura de diálogo com os municípios. A partir do Plano Real, em 1994, uma solução de política monetária para o crônico problema da hiperinflação, forma‐se um ambiente altamente favorável para o planejamento turístico de longo prazo. Por meio do Plano Nacional de Municipalização do Turismo (PNMT), adotando metodologia da Organização Mundial do Turismo (OMT), priorizam‐se as ações de planejamento e gestão em âmbito municipal, definindo‐se uma política nacional amplamente aceita, que elege o município como locus do planejamento turístico. O mesmo PNMT adota o modelo norte‐americano de planejamento participativo (Bissoli, 2000) e passa a oferecer oficinas Zielorientiert Projektplanung (Zoop) – Planejamento de Projetos Orientado por Objetivos – como solução para contemplar o envolvimento dos cidadãos nos diversos momentos do processo de planejamento, incorporando e popularizando a análise dos dados inventariados pelo método Strenghts, Weakness, Opportunities, Threats (Swot) – Pontos Fortes, Pontos Fracos, Oportunidades, Riscos (Dencker, 1998). Os municípios são incentivados a buscar credenciamento junto ao governo federal como município turístico ou de potencial turístico, podendo, com isso, candidatar‐se aos recursos oficiais. Tais iniciativas são implantadas e mantidas durante os dois mandatos do governo Fernando Henrique Cardoso (1995 a 2003).
da década de 1990 aos dias atuais – criação do ministério do turismo (mtur).
No governo de Luiz Inácio Lula da Silva, iniciado em 2003, instala‐se o MTur e dão‐se novas atribuições ao Embratur, focando‐o no mercado externo. Define‐se o Plano Nacional do Turismo 2003‐2007, que elege como prioridade o Programa de Regionalização do Turismo – Roteiros do Brasil. Esse critério implicou na elaboração de produtos regionalizados, recortados pelos limites político‐administrativos estaduais. O inventário passa a ser orientado segundo o desenho de uma estratégia regional (embora o conceito não seja elucidado), com o qual se elabora um mapa das regiões turísticas do Brasil. À Embratur caberá difundir no exterior os produtos criados por meio do Plano Aquarela, iniciado a partir de março de 2005, dividido em fases de diagnóstico, formulação da estratégia de marketing e plano operacional. “Esse conjunto de macro programas foi estruturado a partir de uma definição inicial dos diferentes tipos de programas, projetos e ações recomendadas como as mais adequadas ao turismo internacional do Brasil hoje” (Brasil, 2007). Tal procedimento elencou um rol de produtos e destinos organizados na forma de roteiros que foram ofertados no exterior segundo as estratégias de marketing, visando públicos e mercados determinados. O Estado brasileiro, do município à federação, olha para o território como suporte físico das manifestações e visa identificar produtos vendáveis. Mesmo quando a população teve inserção na ponta de origem, o procedimento extremamente tecnocratizado fez com que se perdessem pelo labiríntico caminho percorrido os recursos auferidos. Com a reeleição de Lula para o período 2007‐2010, o Plano Nacional do Turismo foca destinos turísticos selecionados a partir da experiência dos Roteiros do Brasil, do mandato anterior, elegendo um rol de 65 regiões com possibilidade de atendimento em âmbito internacional, por meio dos quais se projetou ampliar a atratividade e os esforços de divulgação no exterior. Nesse período, os procedimentos de inventário incorporaram várias novidades, atendendo, em grande parte, às críticas e aos reparos que vinham sendo feitos havia muito tempo pela comunidade científica e pela iniciativa privada. Os principais óbices estavam na questão da uniformidade dos procedimentos para um país tão diverso, desigual e desnivelado; os dados eram homogeneizados e não permitiam a visibilidade e valoração daquilo que deveria ser o principal foco, ou seja, a originalidade; eram elaborados de forma compartimentada, de modo que não representavam a complexidade inerente ao produto turístico; a massa de dados ganhava uma certa autonomia, dando a impressão de que era um fim em si mesmo, desarticulando‐a dos seus contextos sociale geográfico. A manutenção dos mesmos instrumentos e metodologias por tanto tempo acabou por fragilizar o processo, pois foram muitas as alterações ocorridas na sociedade brasileira e no pensamento elaborado por meio de intensos debates durante o período. Os instrumentos deveriam ser ágeis o suficiente para captar as reverberações dessas mudanças no campo do turismo. No dizer de Pinto e Moesch (2006), havia chegado a hora de promover mudanças.
As metodologias propostas, principalmente, nos modelos de inventariação já utilizados deixavam pouco espaço para as subjetividades, conflitos, diferenças, enfim para a dinâmica do real pesquisado. Nesse contexto, é necessária a utilização de uma metodologia de inventário sistêmica que permita o entendimento do sistema turístico como um sistema aberto e orgânico que mantém um contínuo processo de relações dialéticas, de conflito e colaboração dos seus produtores e reprodutores. (Pinto e Moesch, 2006)
Ora, era o momento da mudança fundamental a partir da qual o Estado deixaria de olhar para o território em busca de produtos, passando a identificar arranjos em rede nos quais o cidadão assume protagonismo, isto é, identifica‐se com o espaço vital, define lugares e outras territorialidades. Com tais observações e críticas advindas de aplicação piloto, o MTur implanta o Sistema de Inventariação da Oferta Turística (Invtur), visando ao armazenamento e à organização das informações e optando, mais uma vez, por constituir um banco de dados de abrangência nacional.
Para que as informações sejam de total confiabilidade e possam alcançar os objetivos propostos, uma metodologia única e oficial foi adotada em todas as unidades da federação para levantar informações, por meio dos cursos de capacitação para a inventariação da oferta turística, que incluem no programa um treinamento para o uso do Invtur, em parceria com a Universidade Federal do Paraná – UFPR. (Brasil, 2010, p.1)
Os trabalhos de inventário foram dinamizados com a disponibilização dos formulários e dos manuais de aplicação no site do MTur, de onde podem ser acessados, preenchidos e remetidos por meio do Invtur. Entretanto, os dados podem existir, mas a informação pode não necessariamente fluir. Assim, as dinâmicas social e cultural que moldam o espaço, constituem territórios e identificam lugares, podem submergir ante a replicação do modelo ainda eivado do viés autoritário herdado do período da ditadura militar, sobrevivente graças ao esfumaçamento conceitual. Como se procurou demonstrar, a experiência acumulada desde 1984 reflete a consolidação das metodologias de inventário, diagnóstico e prognóstico, contemplando a participação da comunidade, primeiro a partir de uma concepção meramente aquiescedora e, depois, mais na atualidade, buscando mecanismos participativos com maior grau de empoderamento (Beni, 2006). Essas metodologias são a expressão daquilo que a academia e os órgãos de governos nacional e subnacional criaram em parceria simbiótica com consultorias. Foram testadas em diferentes regiões do país, com diferentes escalas e abrangências, permitindo inferir que o engessamento que provocam ainda não foi removido, possibilitando, doravante, a incorporação das adequações necessárias para captar as características próprias de cada lugar. Dessa maneira, o Invtur é composto por um conjunto de instrumentos que pode ser entendido como uma mediana dessa produção, e que está em consonância com os bons manuais disponíveis no mercado editorial específico. Está evidenciado um longo período continuado – quase duas décadas – de uma mesma política de planejamento inspirada na visão sistêmica. Seus efeitos rizomatizam‐se pela área privada, extrapolando a esfera pública, buscando envolver o conjunto da sociedade, estabelecendo um novo patamar de inclusão do turismo como componente da qualidade de vida dos cidadãos, diferenciando‐o da mera condição reificada. Mesmo assim, para um trabalho de elaboração de planejamento a partir dos mecanismos disponibilizados no momento pelo Estado, a visão territorialista ainda condiciona as iniciativas pela exacerbação de valores e imagens definidoras de determinados lugares e pelas consequentes dificuldades para a articulação de produtos compostos nas interfronteiras municipais, estaduais e nacionais; nos espaços virtuais; nos pontos nodais da pátria‐mundo.
A organização do espaço turístico brasileiro Buscando explicações sobre como o espaço turístico vem sendo construído no Brasil, os estudos evidenciam o uso do território por meio da apropriação no decorrer do tempo. A contextualização das diferentes iniciativas do Estado e dos empreendimentos privados relacionados ao turismo permite reconhecer as marcas deixadas pelo passado e a força da inovação. Entrementes, mesmo decorridas tantas experiências, chama a atenção a constatação de que há uma dimensão esquecida no pacto estabelecido entre a esfera governamental e a esfera empresarial: a presença do cidadão.
O turismo tem sido tratado como uma atividade [rentável] e que pode trazer desenvolvimento para as comunidades que o recebem, sem gerar grandes impactos ambientais. Entretanto, o tratamento da atividade turística apenas sob a ótica do aspecto econômico é limitado, uma vez que grande parte de seus impactos é social e, especialmente, cultural. (Pádua e Lombardo, 2010, p. 3050)
As iniciativas pioneiras de planejamento do turismo por parte do Estado, ainda nos anos de 1930, decorrem da percepção de um território nacional consolidado e repleto de atrativos, que, potencialmente, poderiam ser fruídos pela população nacional, constituída por uma burguesia industrial e urbana crescente e por turistas internacionais buscadores de emoções exóticas. No primeiro caso, agregaria e amplificaria o sentimento de nacionalidade tão ao gosto do Estado Novo e, no segundo, incorporaria moeda forte à economia nacional. A solução em curto prazo foi a opção pela instalação dos cassinos, o fortalecimento das empresas aéreas e a institucionalização do patrimônio histórico e cultural no Brasil, tendo a organização do espaço a partir de uma concepção de território controlado pelo poder central, com claros objetivos de manter e aprofundar sua presença como fator de segurança. Ao povo dos lugares não foi dedicada nenhuma atenção, a não ser a propaganda de que o turismo é uma “indústria sem chaminés” que abre vagas de trabalho em uma extensa gama de atividades econômicas e, por isso, é muito salutar e desejável, mesmo que não se soubesse (como ainda hoje não se sabe muito bem) quais sejam as ocupações, as remunerações e a durabilidade das vagas de trabalho criadas. Nos anos de 1950, com o país já em pleno processo de consolidação da urbanização, as exigências cotidianas são distintas. A classe média passou a exigir acesso a lugares produzidos para uso turístico, anteriormente acessíveis apenas aos mais ricos. Os balneários precisaram ser modificados e as cidades dedicadas ao atendimento dos banhistas só se tornam viáveis se acessíveis por automóvel. Populariza‐se o turismo de massa, e as cidades litorâneas, principalmente, passam a ser ocupadas por projetos de segundas residências, colapsando a infraestrutura que, na alta temporada, é incapaz de atender ao conjunto da população, desencadeando processos que sufocam a população autóctone. Do ponto de vista urbanístico e paisagístico, ergue‐se uma muralha entre a orla e as áreas mais distantes da praia, supervalorizando aquela e subvalorizando esta, surgindo conflitos nas relações de convivência entre os habitantes da cidade e os veranistas. O fenômeno multiplica‐se por todo o país, perdurando até os dias atuais, sem que haja intervenção decisiva nas políticas de planejamento urbano, mesmo depois do advento do Estatuto das Cidades (Brasil, Lei n. 10.257, de 10.07.2001). Uma conclusão possível é que a dinâmica de ocupação do espaço transformado em território turístico impede, muitas vezes, que a população local exerça sua cidadania. São raríssimos os casos de empreendimentos de qualquer tipo e porte, independentementeda região ou do bioma, que não deram as costas para as populações locais, tratando‐as como parte do projeto e não como insumo. Experiências como o Prodetur e o Programa para o Desenvolvimento do Ecoturismo na Amazônia Legal (Proecotur), desenvolvidas em longo prazo, reproduzem o modelo supracitado em escala mais abrangente, uma vez que possibilita aos governos estaduais e municipais, associados ou não a grupos empresariais, ter acesso a financiamentos de somas mais vultosas e definir a conversão de amplas parcelas de seus territórios em regiões de uso turístico, segundo a lógica da maximização dos benefícios financeiros. São projetos que obedecem à concepção de desenvolvimento ainda impregnada da apropriação do espaço, do território, das paisagens e do lugar como componentes inesgotáveis e capturáveis, para os quais não há necessidade de reposição, e que, portanto, não compõem a matriz dos custos. Como exemplo, a implantação de resorts que emprega pessoas da comunidade local na fase de edificação e, em muitos casos, para a operação do equipamento nos anos seguintes importa mão de obra especializada com salários mais elevados. Em alguns casos, há treinamento de mão de obra local, pagando salários muitíssimo mais baixos. É rica a bibliografia que flagra e comenta a contradição que vê sucesso em empreendimentos quando associados à indústria da construção civil e, ao mesmo tempo, recebe críticas por propalar a sustentabilidade por meio de fotografias ilustrativas de emprego da mão de obra e da cultura locais como forma de composição da imagem trabalhada com eficientes programas de marketing. Mais uma vez, a visão empresarial que encara o espaço turístico como algo a ser consumido (“vendido”), está orientando as ações em detrimento da população do lugar que foi apropriado pela atividade. É importante dizer que a vida econômica brasileira, quando inserida no processo de globalização, tornou‐se cada vez mais complexa, assumindo gradativamente o discurso do paradigma da sustentabilidade. Todos os setores econômicos são atingidos, mas os mecanismos institucionais de construção e atualização de bancos de dados na administração central do governo federal não acompanham essas mudanças, tornando seu entendimento um exercício ficcional. Estabelece‐se tal distância entre os mecanismos existentes e as condições reais do país e suas diversidades que o sistema não se sustenta. A revisão é consequência natural, tanto da ineficiência como da força da mudança provocada pelo conceito de sustentabilidade afirmado e consolidado durante a Eco 92 – Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente e o Desenvolvimento (Cnumad). O vetor da participação da comunidade no processo decisório aflora como um valor definitivo e a busca ao seu atendimento indica que o diálogo deve ser ampliado com a realização de oficinas. Infelizmente, essas oficinas inspiradas na metodologia Zopp, oferecidas no pacote de legitimação no sistema de montagem do banco de dados nacional, são insuficientes para atender toda a demanda, fazendo‐a vítima do próprio sucesso. No momento, no que concerne à orientação do governo federal para a montagem e alimentação de um banco de dados com o qual se possa ter base para elaborar políticas mais realistas, pode‐se ver um passo novo: a evolução, ao permitir o ingresso de informações únicas do lugar cadastrado, concretizando o espaço para o exercício das diferenças. Do ponto de vista da articulação do mercado local com as possíveis introduções provocadas pelo mercado global, o modelo atual parece ser melhor construído, ensejando, pela primeira vez, leituras que independem das fronteiras político‐administrativas. O que prevalece são os arranjos produtivos, em função dos recursos existentes, e a inserção da população local, portadora terminal da cultura, das festas, da gastronomia, da música, da dança, dos fazeres e dos saberes, motivo maior e determinante para a instalação dos serviços turísticos, deles se beneficiando. De outra maneira, certamente também é um recurso de planejamento à mão do Estado para avançar da visão meramente territorializada para alocar investimentos a partir do turismo, mesmo que para atender outras áreas da infraestrutura. Tem sido muito frequente o uso de argumentos e embasamentos legais para destinação de verbas federais para projetos de infraestrutura viária, de transportes, de comunicações e de abastecimento, argumentando que são benéficos ao turismo. Apesar dessa afirmação ser verdadeira, vistas dessa maneira, as intervenções no espaço são ilimitadas, pois, praticamente quase todas as atividades humanas encontram algum tangenciamento com o turismo. Outro fator a se destacar nessa reflexão acerca dos rebatimentos que os conceitos têm para o planejamento das atividades do turismo diz respeito à organização da concorrência dentro da cadeia produtiva. O modelo de investimento privilegiado em empreendimentos ditos de ponta necessita de certa calibragem entre os fatores que são de responsabilidade do Estado e os que são de responsabilidade da iniciativa privada, visando garantir que os benefícios recaiam sobre o conjunto dos negócios, existentes no local, em diferentes escalas. Também é preciso atentar para que “os arranjos produtivos locais de base comunitária, ao se organizarem territorialmente e se articularem em redes, constituam um contraponto à organização capitalista de mercado” (Coriolano et al., 2009, p. 273). Já que há o reconhecimento de que existe um impacto de vizinhança decorrente da implantação de equipamentos, e esse impacto já se encontra institucionalizado por meio do Estatuto das Cidades (Brasil, Lei n. 10.257, de 10.07.2001, Seção XII, Artigos 36 a 38), ele deveria ser conhecido e dimensionado, projetando‐se a parcela no modelo de financiamento, que recairá, por meio de externalidades positivas e negativas, no conjunto, independentemente de ser locado no espaço urbano ou rural. Estudos de impacto ambiental já são previstos para licenciamento de empreendimentos a partir de uma determinada área a ser ocupada. Mas, como está sendo discutido, apenas o tratamento advindo da concepção de território como sendo uma parcela de espaço sobre a qual se tem o domínio e o poder não tem respondido adequadamente quando a questão envolve pessoas direta ou indiretamente vinculadas ao turismo, pois há reverberações, ondas de impacto nem sempre concêntricas e rugosidades sociais, culturais e econômicas imperceptíveis para o modelo existente. Cabe ampliá‐lo para um estudo prévio de impacto ambiental e de vizinhança, obedecidas as escalas. Nos últimos anos tem crescido o esforço da academia, de setores mais avançados do empresariado e de agentes da administração pública em ampliar o debate, trazendo para ele novas questões. Exemplos importantes são notados com a realização de encontros regionais que jogam luz sobre problemas locais e soluções encontradas, como forma de elucidar outras paragens de situações semelhantes. Esse movimento deve ser incentivado como recurso para aproximar as inúmeras e possíveis leituras e compreensões sobre o território, sobre a percepção dos recortes regionais, para a identificação de atributos da paisagem e para a vinculação da diversidade a lugares únicos, movimentos necessários para a ampliação da participação do turismo no cotidiano das populações.
PARTE II
SUSTENTABILIDADE
SUSTENTABILIDADE: DIMENSÃO AMBIENTAL
Paulo Dos Santos Pires
Introdução
A dimensão ambiental da sustentabilidade (Sachs, 2002) possibilita delimitar um campo de abordagem, o qual será aqui estabelecido em sua interface com o turismo, e este, por sua vez, em suas múltiplas interações com o meio ambiente. Para tanto, adotou‐se como referência básica o Programa de Turismo e Meio Ambiente das Nações Unidas (Unep, 2010), cujo conteúdo e estrutura programática refletem de forma pertinente, representativa e consistente, a ampla e complexa interface entre o turismo e o meio ambiente, mantendo permanentemente como pano de fundo o paradigma da sustentabilidade. Por outro lado, o caráteruniversal e a ascendência desse Programa sobre a governança ambiental em todo o mundo levam a considerá‐lo como fonte de consulta regular para o processo de ensino e de difusão do conhecimento, exatamente da forma como ocorrerá nesta oportunidade. Com isso, o texto pretende descortinar para o leitor a dimensão ambiental do turismo, primeiramente apresentando um breve resgate conceitual sobre sustentabilidade, assim como uma base de entendimento sobre a sua aplicação no campo do turismo. Na sequência, a dimensão ambiental da sustentabilidade do turismo é desdobrada em três principais enfoques, como mostra a Figura 9.1
Figura 9.1: A dimensão ambiental da sustentabilidade do turismo
DIMENSÃO AMBIENTAL
Impactos
ambientais do turismo
A contribuição do turismo para a sustentabilidade ambienta
Impactos
ambientais no turismo
Fonte: Baseada em Unep (2010).
Cada um desses três enfoques serão desdobrados da seguinte forma: os impactos ambientais provocados pelo turismo serão abordados como impactos localizados e em nível global; a contribuição do turismo para a sustentabilidade ambiental será exposta em seis aspectos principais, ora relacionados à conservação da natureza, ora à proteção ambiental; e os impactos ambientais sobre o turismo serão abordados de duas formas, como impactos globais e como impactos com incidência em destinos e regiões turísticas. Ainda como forma de contemplar o turismo em um âmbito ambiental, com o qual possui um papel a desempenhar juntamente com outras atividades humanas, o item sobre o turismo inserido em outras esferas de interesse ambiental amplia um pouco mais o contexto de sustentabilidade ambiental do turismo, seguido das considerações finais, com o arremate e fechamento do capítulo.
A sustentabilidade do turismo
A universalização da ideia e do ideal de sustentabilidade, na acepção difundida pela Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento da Organização das Nações Unidas, remonta ao ano de 1987, com o seu registro histórico no documento Our Common Future, logo no ano seguinte, traduzido e publicado no Brasil com o título Nosso futuro comum (CMMA, 1988). Porém, as suas bases conservacionistas foram apresentadas anteriormente num outro documento, não menos histórico, lançado oficialmente em 1980 pela União Internacional para a Conservação da Natureza e dos Recursos Naturais e também publicado no Brasil com a denominação de Estratégia Mundial para a Conservação (IUCN, 1984). Nele, o princípio da sustentabilidade emerge de uma articulação orgânica e lógica entre a concepção de desenvolvimento: “modificação da biosfera e aplicação. dos recursos humanos, financeiros, vivos ou inanimados, visando à satisfação das necessidades humanas e à melhoria da qualidade de vida do homem”; e de conservação: “a gestão da utilização da biosfera pelo ser humano, de maneira a produzir o maior benefício sustentado para as gerações atuais, mas que mantenha a sua potencialidade para satisfazer as necessidades e as aspirações das gerações futuras”. O turismo, como uma necessidade humana e como fator de qualidade de vida, participa do desenvolvimento e, por isso, tem um papel a cumprir na conservação da biosfera da qual se utiliza. Por ser um dos maiores e mais pujantes setores econômicos da atualidade, o turismo traz consigo uma variedade de impactos, com efeitos tanto positivos como negativos para a sociedade e o ambiente. As diretrizes para o desenvolvimento do turismo sustentável e sua gestão são aplicáveis a todas as formas de turismo em todos os tipos de destinos, incluindo o turismo de massa e os diversos segmentos alternativos do turismo e seus nichos. Os princípios de sustentabilidade aplicados ao desenvolvimento do turismo se referem basicamente às dimensões ambiental, econômica e sociocultural desse desenvolvimento, sendo imperativo que se estabeleça um equilíbrio adequado entre essas três dimensões a longo prazo, para garantir a sua sustentabilidade. Assim, o turismo sustentável deve:
· Otimizar, porém não maximizar a utilização dos recursos ambientais que constituem um elemento fundamental no desenvolvimento do turismo, mantendo os processos ecológicos essenciais e ajudando a conservar o patrimônio natural e a biodiversidade.
· Respeitar a autenticidade sociocultural das comunidades receptoras e conservar o seu patrimônio construído, sua cultura e seus valores tradicionais. O turismo sustentável deve ainda contribuir para a aproximação intercultural entre turistas e anfitriões e para a tolerância recíproca.
· Viabilizar as operações econômicas de longo prazo que proporcionem benefícios socioeconômicos para todos os interessados, bem como a sua distribuição de forma justa. Viabilizar ainda o emprego estável e as possibilidades de geração de renda e serviços sociais às comunidades receptoras, contribuindo para a redução da pobreza.
Dessa forma, o desenvolvimento do turismo sustentável exige a participação consciente de todos os interessados, bem como uma forte liderança política para garantir a ampla participação e a busca do consenso. Atingir o turismo sustentável é um processo contínuo e requer o monitoramento constante dos impactos e a adoção de ações preventivas e/ou medidas corretivas quando se fizer necessário diante dos riscos ou das ameaças ao seu desenvolvimento. O turismo sustentável deve também manter um elevado nível de satisfação e garantir uma experiência significativa para os turistas, aumentando sua consciência sobre as questões de sustentabilidade.
Impactos ambientais do turismo
A qualidade do ambiente, tanto o natural como o humanizado, é essencial para o turismo. Por sua vez, como qualquer setor produtivo, o turismo traz impactos com efeitos positivos e também negativos para o ambiente, considerando todas as escalas espaciais: local, regional, nacional e global. A complexidade dessa relação aumenta com a constatação de que são numerosas as atividades que podem ter efeitos ambientais adversos, estando os mais conhecidos ilustrados na Figura 9.2.
Figura 9.2: Os impactos ambientais do turismo.Impactos ambientais do turismo
Esgotamento dos recursos naturais
Impactos biofísicos nos ecossistemas
Poluição do ambiente
IMPACTOS EM NÍVEL GLOBAl
IMPACTOS LOCAIS
Mudanças climáticas
Redução da biodiversidade
Destruição da camada de ozônio
Fonte: Baseada em Unep (2010). 
Muitos impactos são induzidos pelo crescimento do turismo e são decorrentes ou estão relacionados com a construção de infraestruturas gerais, como estradas e aeroportos. Outros impactos provêm de instalações que servem diretamente ao turismo, como os resorts, hotéis, campos de golfe e marinas. Em ambos os casos, o ambiente e mais especificamente os recursos naturais poderão ser afetados negativamente pelo turismo, o qual, para o seu desenvolvimento, depende de um ambiente equilibrado e protegido e da existência dos recursos naturais conservados em sua integridade e originalidade. Cria‐se, portanto, um paradoxo cuja superação tem sido o grande desafio para governantes e todos os demais setores envolvidos. Para melhor conhecer o âmbito desses impactos, segue a sua caracterização de acordo com a estrutura oferecida pela Figura 9.2
Impactos locais do turismo 
Os impactos do turismo quando localizados diretamente nos destinos e atrativos e no seu entorno, como as cidades e microrregiões, podem ser estudados a partir de três vertentes principais: no esgotamento dos recursos naturais, na geração de poluição e nos impactos físicos.
Esgotamento dos recursos naturais 
Três são as situações que, em razão da sua importância e gravidade, merecem ser destacadas: a escassez e esgotamento da água (recursos hídricos), a degradação dos recursos da terra e a pressão sobre os recursos locais.
Escassez e esgotamento dos recursos hídricos
 A água doce, em especial, é um dos recursos naturais em situação mais crítica na atualidade. Em torno do turismo e de suas atividades, costuma ocorrer um uso excessivo dos recursos hídricos em hotéis, piscinas, campos de golfe e uso pessoal pelos turistas. Essa

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