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Singular_e_plural-19_04_2012

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Singular e plural 
de brunnocfd | trabalhosfeitos.com 
PSICOLOGIA(S): SINGULAR OU PLURAL? 
 
Fabio Thá Psicanalista Mestre em Letras (Lingüística) / UFPR Doutorando em Estudos 
Lingüísticos / UFPR Professor da Universidade Tuiuti do Paraná 
 
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PSICOLOGIA(S): SINGULAR OU PLURAL? Fabio Thá 
n. 01, Curitiba, out. 2002 www.utp.br/psico.utp.online 
 
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RESUMO 
Este texto discute a pluralidade teórica na psicologia fazendo um breve percurso pela 
história da constituição da psicologia como ciência e como profissão, mostrando a 
diferença de suas origens teóricas. Enquanto a psicologia como ciência - herdeira da 
agenda de questões referentes à teoria do conhecimento, presente no pensamento 
ocidental desde os pré-socráticos - nasceu como uma atividade de investigação e 
pesquisa, a psicologia aplicada - que deve suas origens ao pensamento funcionalista e 
ao contexto histórico do início do Século XX – pretende aplicar os conhecimentos 
psicológicos a diversas áreas da atividade humana. Como a psicologia não é uma 
ciência unificada, os psicólogos convivem com uma diversidade de escolas e 
orientações teóricas onde buscam subsídios para fundamentar suas práticas. 
Utilizando conceitos das teorias da ciência de Karl Popper e Thomas Kuhn indaga-se 
que postura adotar diante dessa diversidade, como compreendê-la, abrindo a questão 
de que futuro se poderia conceber para a psicologia. Palavras-chave: epistemologia, 
teorias psicologicas, psicologia científica, psicologia aplicada. 
 
ABSTRACT 
This text concerns the theoretical pluralism in psychology going briefly through the 
history of its foundations both asscience and profession, showing its different 
theoretical origins. While psychology as a science – inheriting questions about the 
theory of knowledge, present in the western thinking since the pre-socratics – was born 
as an activity of investigation and research, psychology as a profession – originated in 
the functionalist thinking and in the historical context of the beginning of the 20th 
Century – intends to apply the psychological knowledge to several areas of human 
activities. Psychology, however, is not an unified science and psychologists must live 
with several schools and theoretical orientations, where they look for theoretical 
background to their practical activities. Borrowing concepts from Karl Popper’s and 
Thomas Kuhn’s theories of science, we wonder what attitude should be adopted to 
face and understand this diversity, proposing the question about what kind of future 
could be conceived to psychology. Key words: epistemology, psychological theories, 
scientific psychology, practical psychology 
 
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n. 01, Curitiba, out. 2002 www.utp.br/psico.utp.online 
 
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I 
Em março de 2002, os legisladores do estado americano do Novo México, aprovaram 
uma lei que permite a psicólogos prescrever medicamentos psicotrópicos, como 
antidepressivos. Este foi o primeiro estado americano a aprovar uma legislação como 
esta, embora iniciativas semelhantes estejam pendentes de discussão em mais outros 
quatro estados: Georgia, Hawaii, Illinois e Tennessee. Estas iniciativas têm a bênção 
da AmericanPsychological Association (APA), que considera a permissão para 
prescrever medicamentos uma extensão natural do papel do psicólogo como 
profissional da saúde. Para permitir a prescrição exige-se que o psicólogo tenha nível 
de doutorado e complete 300 horas de cursos específicos em neurociência, fisiologia e 
farmacologia, seguidos de quatro meses de tratamento supervisionado de 100 
pacientes. Evidentemente essa idéia não está livre de opositores. Como seria de se 
esperar, uma das vozes mais fortes da oposição é a da American Medical Association. 
Mas ela tem encontrado um suporte surpreendente para seus argumentos: os próprios 
psicólogos, ao menos uma grande parte deles, temem que a maior vítima dessa 
experiência possa ser a própria ciência da psicologia. Para seus oponentes, o 
problema de legislações como estas não diz respeito à eficácia ou não da medicação 
no tratamento de certas desordens. O problema é transformar a psicologia numa 
profissão prescritiva. Isto porque acreditam que, se a autorização para prescrever 
medicamentos tornar-se a norma, conhecimentos biomédicos inevitavelmente tomarão 
grande parte dos currículos dos cursos de psicologia, marginalizando as matérias 
tradicionais da metodologia e da teoria da psicologia. Para um campo que tem lutado 
com muito esforço durante as últimas décadas para provar que a mente e o 
comportamento podem ser estudados científicamente, leis como essas podem ser 
uma ameaça. Elaine M. Heiby, presidente da American Association of Applied and 
Preventive Psychology, diz que “O momento é peculiar paraabandonar a ciência 
psicológica ou para convertê-la em uma ciência médica”. Scott Lilienfeld, presidente da 
Society for a Science of Clinical Psychology, pensa que entre as prioridades da APA 
deveria estar a de “Garantir que psicólogos praticantes estão intervindo junto a seus 
pacientes baseados na melhor ciência psicológica disponível” e não ocupar-se com 
autorizações prescritivas. (Scientific American, julho de 2002, pág. 11/12. Tradução do 
autor) Do lado da oposição também está a American Psychological Society (APS). 
Sabe-se que a APA está dominada por praticantes de psicologia aplicada, enquanto 
que a APS tem como maioria de seus membros acadêmicos e pesquisadores. 
Historicamente, em 1940, 75% dos psicólogos associados à APA trabalhavam em 
ambientes acadêmicos. Já em 1980 eles representavam apenas 42%. Isso, 
evidentemente resultou numa mudança de mãos do poder na APA, onde os 
psicólogos aplicados (predominantemente os psicólogos clínicos) assumiram a 
posição de comando. (conf. Schultz & Schultz, 1981: 202) Foi a insatisfação com isso 
que levou os professores e investigadores da psicologia, orientados para atividades de 
pesquisa, a fundarem sua própria organização, a APS, que hoje contam com15.000 
membros. (Scientific American, julho de 2002, pág. 11/12) O debate exposto acima 
não é senão mais um capítulo de uma longa história que começou nos primeiros anos 
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do Século XX, quando os primeiros psicólogos americanos, formados nos re- 
 
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cém-fundados laboratórios de psicologia europeus, retornaram a seu país. É 
consensual que a data de fundação da psicologia como ciência é 1879 quando, em 
dezembro daquele ano, Wilhelm Wundt implantou em Leipzig o primeiro laboratório de 
psicologia do mundo. Herdeiro das grandes questões da filosofia ocidental, 
particularmente aquelas relacionadas à teoria do conhecimento, e ao mesmo tempo 
homem de ciência, docente de fisiologia e assistente do laboratório de Helmholtz em 
Heidelberg, Wundt produziu a depuração das questões epistemológicas de seus 
métodos de investigação racionalistas e metafísicos, e a aplicação a elas dos métodos 
empíricos de investigação utilizados pela psicofísica. Fundou, então, o que chamou de 
psicologia fisiológica, em seu famoso livro Princípios de psicologia fisiológica, 
publicado em duas partes em 1873 e 1874, cujo objetivo explícito era “delimitar um 
novo domínio da ciência”. (in. Schultz & Schultz, 1981: 79). Que o termo fisiológica não 
nos engane aqui, na época a palavra era utilizada como sinônimo de experimental. 
Elegeu como seu campo fenomênico de estudo a experiência ideativa conscienteque, 
tal como a experiência física é abordada pela observação exterior, deve ser abordada 
pela observação interior, derivando-se daí o seu método de investigação: a 
introspecção. Este tão malfadado termo para ele queria dizer: o método por meio do 
qual uma pessoa presta atenção meticulosa e controlada as suas próprias sensações 
e as relata da forma mais objetiva possível, independentemente de seu significado ou 
docontexto de estímulos em que ocorreram. Além disso, reconheceu que há aspectos 
da experiência humana que não podem ser acessados pela introspecção, os aspectos 
de natureza social e comunitária. Assim, em sua psicologia experimental, ao lado do 
investigador de laboratório, estavam os investigadores étnicos ou populares (a famosa 
folk psychology), cuja missão era estudar objetivamente as atividades humanas 
complexas como os costumes, os rituais, etc... Assim nasceu a psicologia, como uma 
proposta de investigação científica dos fenômenos mentais, fundamentada nos 
cânones metodológicos das ciências naturais. Que eles fossem redutíveis à 
consciência e pudessem ser concebidos como combinações complexas de elementos 
sensoriais brutos como apregoava a escola de Leipzig, isto era matéria de discussão. 
Os primeiros ex-alunos de Wundt a questionar esse modelo teórico foram os 
psicólogos instalados na Universidade de Würzburg, que diziam que não se pode 
simplesmente assumir que todos os aspectos importantes dos processos mentais são 
conscientes e que conteúdos mentais, como as sensações, são necessariamente os 
elementos constitutivos do pensamento. Desse dabate resultou um descrédito na 
introspecção como método fundamental da psicologia, mas não no empreendimento 
experimental. Prova disso são os trabalhos de cunho eminentemente experimental da 
psicologia da Gestalt. Relembro essa história para salientar o caráter de investigação 
e pesquisa que teve a psicologia em seu nascimento. Ela nasceu como uma ciência 
experimental e investigativa que herdouuma agenda de questões que se originou entre 
os pré-socráticos e que tinha ficado a cargo da filosofia quando de sua reformulação 
radical diante da revolução científica do Século XVII. Tratava-se de investigar a mente, 
individual ou coletiva, mas a mente representacional, com a metodologia própria de 
uma ciência. Embora a ciência de Wundt tenha se espalhado pelo mundo, inclusive 
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logo alcançando o outro lado do Atlântico com Edward Titchener, o decano dos 
psicólogos americanos dessa época, William James, logo se desencantou com as 
idéias do mestre alemão. O eminente filósofo da pragmática estava interessado pelas 
questões da psicologia conforme são encontradas na vida cotidiana. 
 
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Em seu Principles of psychology, de 1890, adotou uma abordagem pragmática das 
questões psicológicas, sugerindo que mecanismos psicológicos existem porque são 
úteis e auxiliam os indivíduos a sobreviver e a realizar importantes atividades na vida. 
Declarou que “Nossas várias formas de sentir e pensar se tornaram o que são devido 
à sua utilidade na modelação de nossas reações ao mundo exterior.” (in. Gardner, 
1996: 122) É muito evidente o sabor funcionalista dessas afirmativas. Sabemos que 
suas origens não são as mesmas que as da psicolgia experimental. Devemos buscá-
las no evolucionismo de Darwin e em sua aplicação à psicologia por Francis Galton. 
Embora o funcionalismo nunca tenha sido uma posição sistemática rígida e 
diferenciada como o experimentalismode Wundt ou de Titchener, deu origem a várias 
psicologias funcionais que partilhavam o mesmo interesse pelas funções da 
consciência. E, devido a essa ênfase no funcionamento do organismo em seu 
ambiente, os funcionalistas interessaram-se pelas possíveis aplicações da psicologia. 
Assim, a psicologia aplicada desenvolveu-se rapidamente nos Estados Unidos, onde é 
hoje o mais importante legado do movimento funcionalista. (Schultz & Schultz, 1981: 
124) Talvez o grande sucesso das idéias funcionalistas nos Estados Unidos, que logo 
converteram para seu credo eminentes psicólogos que acabavam de chegar de 
Leipzig, como Granville Stanley Hall, James McKeen Cattell, entre outros, seja devido 
a algumas condições contextuais reinantes na sociedade americana e mundial nos 
inícios do século passado. A nascente ciência da psicologia teve um crescimento 
impressionante nos Estados Unidos na virada do Século XIX para o Século XX. Para 
se ter uma idéia, em 1880 não haviam laboratórios nos EUA. Em 1895 havia vinte e 
seis. Em 1880 não haviam revistas americanas de psicologia. Em 1895 elas eram três. 
Em 1880 os americanos tinham que ir à Alemanha para estudar psicologia. Em 1900 
eles já dispunham de vários programas de graduação em casa. Em 1903, o número de 
Ph.D. em psicologia nas universidades americanas só perdia para os conferidos em 
química, zoologia e física. (conf. Schultz & Schultz, 1981:175). Isso conduziu à 
seguinte situação: havia três vezes mais psicólogos nos EUA do que empregos em 
laboratórios. Felizmente, o número de cursos universitários namatéria crescia 
exponencionalmente. Mas a maioria das universidades com vagas disponíveis eram 
instituições estaduais, e a psicologia como ciência nova acabava recebendo a menor 
parcela dos recursos financeiros. Os psicólogos logo perceberam que, se quisessem 
receber um volume maior de recursos, teriam que demonstrar aos administradores e 
legisladores a utilidade da psicologia na solução de problemas sociais, educacionais e 
empresariais. Alguns fatores sociais colaboraram com isso, abrindo e ampliando o 
campo de aplicação. Na virada do século, os EUA receberam um contingente enorme 
de imigrantes que fez saltar as matrículas nas escolas públicas, que eram construídas 
na proporção de uma por dia. Além disso o advento da primeira guerra possibilitou a 
colocação de psicólogos em tarefas como a seleção de pessoal, avaliações com 
testagens, etc... Todos esses fatores em conjunto produziram uma rápida virada na 
psicologia americana: a ênfase passou do laboratório acadêmico para a aplicação da 
psicologia aos problemas escolares, de aprendizagem, da vida comunitária, da vida 
empresarial, etc... Já a psicologia clínica, embora tenha 
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dado seus primeiros passos na primeira década do século, só veio a encontrar seu 
pleno florescimento durante a Segunda Guerra mundial. Foi esse evento, mais do que 
qualquer outro, que tornou a psicologia clínica a ampla e dinâmica área aplicada 
especializada que veio a ser desde então. O exército instalouprogramas de 
treinamento para várias centenas de psicólogos clínicos, necessários ao tratamento de 
distúrbios emocionais dos militares. (Schultz & Schultz, 1981: 208) Como se pode ver 
a psicologia pura, experimental e investigativa, e a psicologia aplicada tiveram 
diferentes origens e não compartilham dos mesmos pressupostos teóricos. Porém, oproblema da psicologia aplicada, ao menos em suas origens derivadas do 
funcionalismo, é que este não durou como escola de pensamento distinta. De certa 
forma ele deve ser considerado muito mais como uma atitude do que como uma 
teoria. Mas esta história resultou na psicologia propondo-se a ocupar seu lugar no 
mundo tanto como ciência quanto como profissão, pretendendo aplicar suas 
descobertas aos diversos aspectos da vida social e comunitária. E, na medida em que 
o funcionalismo fundou a psicologia como profissão, imprimiu-lhe a idéia utilitária, de 
que ela deve servir para fazer algo pelos homens e pelas sociedades. Mas, toda a 
prática sem teoria é cega e logo consome-se em seu prórpio vazio. Assim a psicologia 
aplicada teve que buscar elaborações teóricas na psicologia pura para compreender e 
intervir em seu campo de aplicação. Porém a psicologia aplicada não pode ser 
considerada uma aplicação prática da psicologia pura, como a engenharia é uma 
aplicação prática da física ou a medicina uma aplicação prática da biologia. Isso pela 
simples razão de que não há uma psicologia pura. Ora, a física, a química e a biologia 
são consideradas ciências unificadas, cujos pesquisadores compartilham dos 
mesmospontos de vistas e dos mesmos paradigmas teóricos. Este não é o caso da 
psicologia. Tomemos o caso específico da psicologia clínica. Seus praticantes tiveram 
que procurar nas teorias disponíveis subsídios para suas práticas. Conseqüentemente, 
as diferentes teorias resultaram nas diferentes abordagens clínicas que hoje são 
praticadas. Os pressupostos teóricos da psicanálise, da psicologia analítica, do 
comportamentalismo, da gestalt, da sistêmica, do psicodrama (só para citar algumas 
das mais praticadas) não são os mesmos, tendo gerado, evidentemente, diferentes 
formas de aplicação clínica. Um paciente fóbico, consultando praticantes dessas seis 
escolas, encontra seis propostas de tratamento diferentes. E pacientes com diferentes 
sintomatologias, consultando os praticantes de uma mesma escola, encontram a 
mesma forma de tratamento. Chegamos, assim, a uma curiosa situação na psicologia 
clínica: diferentes tratamentos para o mesmo sintoma, e o mesmo tratamento para 
diferentes sintomas. 
 
II 
Em nosso cotidiano encontramos freqüentemente diversas manifestações da mesma 
questão referida no início deste texto que aflige atualmente os psicólogos americanos. 
Ela se manifestou, por exemplo, numa conversa que tive com uma aluna do Curso de 
Psicologia, que me parece refletir 
 
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adequadamente o pensamento de muitos alunos. Como o curso em que ela estuda é 
generalista, como penso que seja a maioria dos Cursos de Psicologia em nosso país, 
elase vê diante de todo o leque de teorias disponíveis. Citava como exemplo de sua 
posição conflituosa, e algo angustiada, a seguinte situação. Em uma das disciplinas 
ela aprende a teoria kleiniana das psicoses que, ela confessa, no começo lhe causava 
arrepios, pois não conseguia distinguir se o que ouvia e estudava era da ordem de 
uma teoria séria ou da ordem do delírio. No começo, optou pela segunda alternativa. 
Em outra disciplina, o professor criticava intensamente a teoria kleiniana, além de 
todas as teorias psicológicas da psicose, afirmando que a questão é, na verdade, 
genética. Se as coisas tivessem parado aí, ela não teria tido problemas em decidir, 
pois genes lhe pareciam muito mais plausíveis como explicação que fases esquizo-
paranóides. Mas o problema é que ela tem bons professores e, na seqüência das 
aulas, os exemplos e evidências que eles apresentavam para suas posições teóricas 
eram consistentes. Aquilo que, inicialmente, lhe parecia um delírio começou a fazer 
sentido, a adquirir consistência interna a ponto de tornar-se, também, plausível. E 
agora, o que fazer? Como escolher entre duas teorias radicalmente opostas mas, 
aceitemos tácitamente, igualmente plausíveis? Sua resposta, como a resposta que 
ouço da maioria dos alunos, e devo confessar, também de muitos profissionais, é: 
você deve escolher a teoria com a qual você mais se identifica. A meu ver, é 
exatamente nessa resposta que mora o maior perigo. Em primeiro lugar porque a 
matéria em questão não é de decisão, de gosto ou de preferências pessoais. 
Tampouco a respostadeve ser pautuada pelas crenças da pessoa. No mínimo a 
decisão deveria ter suporte na pergunta: qual dessas teorias corresponde melhor com 
à realidade que ela quer descrever e mais verdadeiramente explica os fenômenos 
observados? Isso, evidentemente exclui questões de preferências pessoais. Em 
segundo lugar, a pergunta é tanto mais aguda por envolver questões práticas, que, 
imediatamente, envolvem questões éticas. Os estudantes de psicologia vieram 
aprender uma profissão. Sua intenção é, depois de formados, exercer uma prática e 
ganhar dinheiro com isso. Dessa forma eles estão primordialmente interessados na 
psicologia aplicada e muito pouco dispostos à psicologia pura. Estão ávidos por 
soluções, não por questionamentos. No entanto, as questões éticas envolvidas na 
prática profissional tornam a dúvida desta aluna ainda mais séria. Pois a decisão vai 
envolver, não apenas uma escolha pessoal, mas também o tratamento dispensado a 
outros. Este drama tem um nome na epistemologia contemporânea: chama-se o 
problema da demarcação. Trata-se da questão de como, com que critérios, decidir, 
entre duas teorias rivais e igualmente plausíveis, qual é a que melhor explica os 
fenômenos em jogo. Em termos mais genéricos, como decidir se uma teoria é uma 
descrição adequada dos fenômenos que ela propõe descrever e se fornece 
explicações dos fatos observáveis que podem ser tidas como verdadeiras? Esta não é 
uma questão simples, pois não basta olhar para uma teoria, e ver se ela tem bastante 
números e fórmulas, ou apresenta formulações muito herméticas, ouestá entupida de 
dados estatísticos e resultados de pesquisas, para decidir que ela é científica. 
Tampouco resolve dizer que ela não é científica se ela tem conceitos meio fantasiosos 
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e em seu conjunto parece meio delirante, apelando para forças e causas contra-
intuitivas e aparentemente pouco naturais. Se nos basseássemos nesses dois critérios 
acima, decidiríamos que a teoria quântica é um mito e que 
 
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mapas astrais são ciência pura. Sabe-se que Karl Popper enfrentou essa questão e 
produziu sobre ela algumas idéias muito influentes. Como ele próprio relata, em 
Conjectures and Refutations(1963), encontrou-se com ela na Viena dos anos 20 onde 
estavam na moda três teorias revolucionárias recém-formuladas: a relatividade, o 
marxismo e a psicanálise. Nos meios acadêmicos da época, ao menos entre os 
estudantes, todas as três eram consideradas científicas. Porém Popper sentia que não 
eram a mesma coisa, que havia uma diferença entre elas no que tange à 
cientificidade. Esse sentimento provinha da constatação de que, para os psicanalistas 
e para os marxistas, não havia comportamento individualou fenômeno social que não 
pudesse ser explicado por suas teorias. Tudo cabia dentro da roupa, não importava 
que tamanho tivesse. Todos os fenômenos de seu campo de aplicação eram 
verificações de suas teorias. Já o mesmo não acontecia com a relatividade, pois sabia-
se que, se certas coisas fossem observadas, a teoria seria desconfirmada. Mas,para a 
psicanálise e para o marxismo, não havia fenômeno no horizonte que pudesse 
contradizê-las. A teoria da ciência que Popper (1965) desenvolveu explica por que isso 
acontece. Em primeiro lugar, ele demonstrou que as verificações experimentais de 
uma teoria não são confirmações de sua verdade. Seu famoso exemplo é o do cisne 
branco. Se, baseados em exaustivas observações de cisnes, sempre brancos, 
concluímos que ‘todos os cisnes são brancos’, podemos, evidentemente, considerar 
cada novo cisne branco que encontramos como uma confirmação da verdade do 
universal. Podemos, inclusive, passar a vida acreditando nisso e encontrando 
confirmações a cada novo cisne branco. Mas isso não garante que a teoria seja 
verdadeira. E, o pior, bastará uma única experiência, um único cisne preto que 
apareça em nosso campo visual, para que a teoria inteira se revele falsa. Por esta 
razão Popper vai situar, na refutação, e não na confirmação, o teste da demarcação. 
Ou seja: só posso decidir se uma teoria é falsa, nunca se ela é verdadeira. Moral da 
história: confirmações das teorias, é fácil encontrá-las. Sempre é possível encontrar 
observações ou planejar experimentos que confirmem uma teoria. O problema é que 
essas observações e experimentos não garantem a veracidade dela. Que isso tenha 
colocado sérias objeções aos “métodos científicos tradicionais”, àquela idéia comum 
de ciência que se tinha no Século XIX, que via na atividade científica um processo 
exclusivamente indutivo, abre toda uma excitante discussão no âmbito da 
epistemologia das ciências, masnão é o caso de tratar disso neste texto. O fato é que 
essas discussões são muito enfadonhas, conduzem mais a perguntas do que a 
respostas, nos obrigam a colocar em dúvida coisas que sempre tivemos como 
verdadeiras, nos arrancam da paz dos caminhos conhecidos para a angústia dos 
caminhos tortuosos e obscuros. E, o que é mais importante, no que essas discussões 
servem para a prática? Afinal – dizem os alunos – não viemos aqui discutir teorias, 
viemos aprender técnicas, aprender a fazer, não aprender a pensar. De certa forma 
eles têm razão. Diante disso tem-se adotado, pragmaticamente, a seguinte solução: 
‘adotarei a teoria com a qual mais me identifico, assumindo, daqui por diante, que ela 
é verdadeira.’ Todos nós acabamos por resolver a questão desse modo, embora seja 
fato que alguns são mais moderados e ecumênicos em sua relação com a verdade, 
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enquanto que outros são mais radicais e exclusivistas. Mas, queiramos ou não, 
gostemos ou não, essa é a realidade da psicologia hoje. Ou falando mais exatamente, 
no plural, das psicologias. 
 
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III 
Segundo Thomas Kuhn, outro influente epistemólogo e historiador da ciência 
contemporâneo, os inícios de uma disciplina científica são marcados pela concorrência 
entre diversas escolas e tendências (Kuhn, 1978). Não existe consenso entre os 
pesquisadores quanto à natureza dos fenômenos estudados, vale dizer, quanto ao 
objeto de estudo, nem quanto aos métodos adequados de investigação. Esta fase 
dadisciplina científica é chamada de pré-paradigmática. A superação dessa fase 
ocorre quando emerge uma construção teórica, acolhida pela comunidade como 
superior às suas concorrentes, fixando um objeto único e uma metodologia própria, e 
recebendo, em função de sua força descritiva e explicativa, a adesão da maioria dos 
cientistas. A disciplina atingiu, nesse momento, seu paradigma. Há ciências, como a 
física, a química, a biologia que já atingiram esse ponto. Quanto a nós, na psicologia, 
estamos na fase pré-paradigmática, em que convivemos com uma multiplicidade de 
modelos teóricos, cada um com seu objeto, teoria e metodologia próprios. Qual é o 
objeto da psicologia? Talvez a resposta venha facilmente: o comportamento. Sem 
dúvida, o comportamento, e particularmente o comportamento humano, é o que todos 
nós, psicólogos, estudamos. Ocorre que este não é o objeto que estudamos, é o 
fenômeno que investigamos. O termo comportamento recorta aquela parte da 
realidade fenomênica que cabe ao estudo da psicologia. O objeto de uma teoria não é 
o fenômeno que ela estuda, é um ente teórico, um objeto abstrato construído a partir 
do fenômeno através dos axiomas teóricos com os quais se aborda o fenômeno. 
Tomemos o exemplo da fobia. Se perguntarmos a um psicanalista o que é a fobia, ele 
dirá que ela é uma evitação sistemática de um objeto que simboliza para o fóbico a 
castração, sendo portanto uma manifestação deslocada de um temor registrado no 
inconsciente do sujeito. Nesse caso, o comportamento é um símbolo de uma outra 
coisa, a ser buscada numapeculiar organização subjetiva inconsciente. Se 
perguntarmos a um behaviorista, ele dirá que a fobia é fruto de condicionamento, no 
qual um estímulo inócuo foi condicionado a despertar uma resposta que corresponde a 
outro estímulo. Nesse caso, o comportamento consiste na resposta desencadeada 
pela presença de um determinado estímulo condicionado. Ora, o mesmo fenômeno se 
explica, para a psicanálise, pelo inconsciente, para o behaviorismo, pelo 
condicionamento. O objeto de estudo da teoria psicanalítica é o inconsciente; o do 
behaviorismo, o condicionamento. A base teórica define os objetos e métodos de cada 
abordagem e é aprendida através de instrução e treinamento. Isso faz com que o 
adepto de uma abordagem desenvolva determinada concepção acerca dos 
fenômenos, um modo particular de enxergar a realidade. Evidentemente a concepção 
que ele desenvolve carrega consigo os fundamentos teóricos dos quais ela é derivada, 
aquilo que os lógicos chamam de axiomas e teoremas, mas o senso comum intitula de 
pré-conceitos. Esses preconceitos moldam a visão da realidade de tal forma que o 
sujeito passa a acreditar que o universo se ajusta perfeitamente às suas concepções e 
crenças, chegando ao ponto de muitas vezes acreditar que seus objetos teóricos são 
objetos reais. De fato este é o curso normal do conhecimento pois, se não se 
assumem ilusões como estas, acaba-se por não poder pensar. O problema é que esse 
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saber não é explícitamente formulado e se transmite de professor para aluno sem que 
o processo lhes seja consciente. Esse tipo de conhecimentotácito determina formas 
coletivas de comportamento e o desenvolvimento de posturas mentais no seio da 
comunidade que compartilha tal ou tal 
 
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teoria. (ver: Carvalho, M.C.M, 2000) Isso faz com que as comunidades teóricas 
tendam a fechar-se em torno de si mesmas, e os sujeitos que dela participam a 
ignorarem sistematicamente aquilo que não se ajusta a seus modelos teóricos. A 
teoria acaba adquirindo um caráter dogmático, sendo que toda tentativa de inovação 
dentro da teoria é vista como desviante. 
 
IV 
Diante desta pluralidade, que fazer? Penso que essa diversidade é o que torna a 
psicologia tão excitante e desafiadora pois, afinal, é uma ciência em construção. Edna 
Heidbreder (1969) propõe a seguinte metáfora: as diferentes escolas de psicologia são 
como os andaimes utilizados na construção dos prédios. Sem eles, a estrutura do 
prédio não pode ser construída, mas quando o prédio está pronto, os andaimes 
perdem sua função e podem ser dispensados. Para levar a cabo essa construção é 
indispensável uma atitude fundamental por parte do homem de ciência: sua adesão 
irrestrita ao que Popper chama de “tradição racionalista”: Um dos elementos mais 
importantes de nossa civilização ocidental é o que posso chamar de “tradição 
racionalista” que herdamos dos gregos. É a tradição da discussão crítica – não por si 
mesma, mas nos interesses da procura da verdade. A ciência grega, como a filosofia 
grega, foi um dos produtos dessa tradição, e daurgência de entender o mundo em que 
vivemos; e a tradição fundada por Galileu foi seu renascimento. (1963: 101) O que 
deve estar acima de nossas teorias é a procura pela verdade, procura que só pode 
ocorrer dentro da tradição da discussão crítica das idéias. A realização concreta desta 
tradição no dia a dia de nossas atividades implica assumir uma determinada atitude. 
Diante de um conjunto de crenças – e as teorias nada mais são do que conjuntos 
ordenados de crenças estruturados em torno de algumas crenças fundamentais – 
pode-se ter duas atitudes distintas: a atitude dogmática ou a atitude crítica. Passo a 
compará-las relativamente a três pontos que foram tratados anteriormente: 1 – A 
atitude dogmática em relação às crenças tende a confundí-las com a realidade, ou 
seja, tomar o que é um construto teórico como algo existente no real. Por exemplo, 
quando se fala em inconsciente na psicanálise não se está referindo a um ente 
concreto, existente em algum lugar lá dentro do nossa mente. Inconsciente é um 
conceito, uma entidade teórica que só existe no mundo das idéias e que foi cunhado 
por Freud para explicar alguns fenômenos da vida mental. Todos os conceitos teóricos 
são frutos de dedução e não de pura observação empírica. A atitude crítica sabe que 
idéias são idéias, e as coisas, outra coisa. Sabe que os conceitos são explicações 
provisórias das coisas, conjecturas que podem perfeitamente revelar-se falsas e, 
quando isso acontece, devem ser abandonadas em favor de conjecturas mais 
genuínas. 2 – Decorre disso que a atitude dogmática, uma vezque toma crenças por 
realidades, crê na verdade das crenças. Isso significa comportar-se como se a 
essência das coisas tivesse sido desvendada. Volto ao exemplo do inconsciente. Para 
alguns adeptos da psicanálise o incons- 
 
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ciente freudiano é a essência do mental, é uma verdade estabelecida que nunca 
poderá ser refutada. O problema dessas profissões de fé não é que elas possam estar 
erradas, isso nunca se sabe. O problema é que essa atitude impede o progresso do 
conhecimento, pois cria zonas teóricas inquestionáveis e jamais sujeitas a dúvidas. 
Disso resulta que as contradições, ou os fatos que não se explicam pelas crenças, são 
ignorados ou bloqueados, ou ainda, distorcidos para adequar-se à forma teórica. A 
tendência do crente é buscar verificações de sua teoria e ignorar as refutações. Faz 
parte da atitude crítica saber que a verdade é o que todos buscamos, mas que nossas 
teorias são sempre provisórias em relação a ela. A grande companheira de jornada, 
com quem o cientista dialoga constantemente, é a realidade. Por essa razão, os erros 
e os enganos na ciência são muito mais importantes e fecundos que os acertos, pois é 
o que põe em marcha o progresso do saber. Ao contrário, se se crê que as idéias 
estão absolutamente certas, nada mais há a fazer do que repeti-las indefinidamente. 3 
– Finalmente, a atitude dogmática mantém caladas e silenciosas as crenças básicas e 
fundamentais do sistema, as que fazem parte do paradigma. Aspessoas pensam e 
agem baseadas em convicções que elas próprias nem sabem que têm. Todos adotam 
paradigmas, no mais das vezes de forma totalmente implícita. É somente uma atitude 
crítica na discussão entre ímpares que pode proporcionar a necessária explicitação 
desses paradigmas. A psicologia nasceu como uma disciplina investigativa que se 
propôs retomar, com uma metodologia inspirada na das ciências naturais, uma agenda 
de questões que está na pauta do pensamento ocidental desde os gregos. Por outras 
razões, fundamentalmente culturais e contextuais, ela ofereceu-se também como 
prática profissional capaz de intervir em diversos campos da atividade humana. Desde 
então sofre com essa ambigüidade estrutural, pois se vê obrigada a responder em sua 
prática por um objeto sobre o qual seus próprios praticantes não estão de acordo. É 
comum o ser humano lidar com a ambigüidade e com o sofrimento buscando idéias 
nas quais ele possa acreditar, elevando-as ao estatuto de verdades. Mas o futuro de 
nossa ciência depende da atitude que tomamos em relação a essas idéias que 
ocupam o lugar da verdade. A atitude crítica só pode acontecer em seu debate franco, 
seja dentro de uma mesma abordagem teórica, seja entre as diversas abordagens 
dentro do campo, seja com outras disciplinas. Concluo estas considerações com um 
parágrafo de Georges Canguilhem que resume a questão que procurei situar com 
estas linhas: É, pois, muito vulgarmente que a filosofia coloca para a psicologia a 
questão: dizei-me em que direção tendes, para que eu saiba que sois? Mas ofilósofo 
pode também se dirigir ao psicólogo sob a forma – uma vez que não é costume – de 
um conselho de orientação, e dizer: quando se sai da Sorbonne pela rue 
SaintJacques, pode-se subir ou descer; se se sobe, aproxima-se do Pantheon, que é o 
Conservatório de alguns grandes homens, mas se se desce dirige-se certamente para 
a Chefatura de Polícia. (Canguilhem,G., 1972: 123) 
 
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 
CANGUILHEM, G. (1972). O que é a psicologia?.In: Tempo Brasileiro 30/31. Julho-
dezembro. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, pp. 104 a 124. CARVALHO, M. C. M. 
(2000). A Construção do saber científico: algumas posições. In: Carvalho, M. C. M. 
(org.) Construindo o saber. Metodologia científica – fundamentos e técnicas. 
Campinas: Papirus, pp. 63 a 86. GARDNER, H. (1996). A nova ciência da mente. São 
Paulo: Edusp. HEIDBREDER, E. (1969). Psicologias do Século XX. São Paulo: Mestre 
Jou. KUHN, T. S. (1978). A estrutura das revoluções científicas. São Paulo: 
Perspectiva. POPPER, K. (1963). Conjectures and refutations. The growth of scientific 
knowledge. London: Routledge. ______. (1965). A lógica da investigação científica. In: 
São Paulo: Abril Cultural. Coleção Os Pensadores. SCHULTZ , D. P.; SCHULTZ S. L. 
(1981). História da Psicologia moderna. São Paulo:Cultrix. SCIENTIFIC AMERICAN 
(2002). Vol. 287, nº 1, july, pp. 11 e 12. 
 
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