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Aranha e Martins, Filosofando - Filosofia da Ciencia_033cbdc94c8515f8774605c26035ba38

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aparece como construção da mente, hipótese de tra-
balho, modelo, função pragmática que torna possível 
a previsão e a ação, descrição de relações entre ele-
mentos, nunca a garantia de certeza definitiva. 
m o desenvolvimento das 
ciências da natureza 
Após a física e a astronomia estabelecerem seus 
métodos, foi a vez de se constituírem outras ciências, 
como a química. Depois foi a vez das ciências biológicas 
e da medicina, que se desenvolveram no século XIX. 
• A evolução das espécies 
O feito mais notável da biologia no século 
XIX, no entanto, foi a teoria da evolução orgânica. 
Inicialmente Jean-Baptiste Lamarck levantou uma 
hipótese sistemática, mas Charles Darwin o supe-
rou com um trabalho baseado em exemplares de 
plantas e animais coletados em suas pesquisas. 
A partir do resultado dessas investigações, tra-
zido a público em 1859, na famosa obra A origem das 
espécies, Darwin conclui que a variação e a seleção 
natural são os fatores principais na origem de novas 
espécies. A teoria evolucionista abrange todos os 
animais, inclusive os seres humanos. Essa última 
referência, porém, só foi amplamente esclarecida 
em sua obra seguinte, na qual mostra que descen-
demos originalmente de algum ancestral simiesco 
há muito extinto, provavelmente o mesmo antepas-
sado de antropoides ainda existentes. Como ele pró-
prio esperava, sofreu críticas apaixonadas e foi por 
muitos considerada uma obra herética. 
O navio Beagle aportando na Terra do Fogo, sul da 
América do Su l, em tela do século XIX, de Conrad Martens, 
pi ntor que acompanhou Darwin em sua expedição. 
Lil PARA SABER MAIS 
Na tradição greco-medieva l preva leceu a concepção 
estática do mundo, segundo a qual cada ser busca rea-
lizar sua essência (eterna e universal), o que se opõe 
à visão transformista da natureza. Do mesmo modo, 
a interpretação bíblica tradiciona l rejeitava qualquer 
teoria que contrariasse a tese da criação divina. 
As hipóteses evolucionistas tomaram corpo após 
Darwin ter coletado dados em grande escala, depois 
de engajar-se em uma viagem, a bordo do navio 
Beagle, de levantamento cartográfico na América do 
Sul, organizada pelo governo da Inglaterra. Durante 
cinco anos (1831-1836), observou que determinada 
espécie sofria mudanças nas diferentes regiões que 
visitava, mas encontrava dificuldade em explicar 
como a seleção se configurava, até que se inspirou 
em uma leitura da obra de Malthus, como diz neste 
trecho: 
Em outubro de 1938, isto é, quinze meses após ter 
iniciado minha pesquisa sistemática, aconteceu estar 
lendo, por entretenimento, a obra de Malthus sobre 
a população. Estando bem preparado para apreciar 
a luta pela sobrevivência que se trava em todo lugar, 
surgiu-me a ideia de que sob tais circunstâncias, 
variações favoráveis seriam preservadas e as não 
favoráveis, destruídas. O resultado deste mecanismo 
seria a formação de novas espécies. Daí em diante 
tinha finalmente uma teoria em que trabalhar.8 
U' PARA REFLETIR 
Observe, na citação biográfica de Darwin, como se 
configurou a cr iação da hipótese da seleção natu-
ral. Compare com o que foi visto neste capítulo no 
tópico sobre hipótese. 
Lil PARA SABER MAIS 
Thomas Malthus (1766-1834), economista inglês, 
em Ensaio sobre o princípio da população, afirmava 
que o fato de a população crescer ma is que a pro-
dução de alimento é a causa da fome, da doença e 
da guerra. 
> Simiesco. Relativo a sím io, macaco. 
8 DARWIN, Charles. Autobiografia. Citado por: EPSTEIN, Isaac. Divulgação científica: 96 verbetes. São 
Paulo: Pontes, 2002. p. 139. 
O método das ciências da natureza Capítulo 31 
Usuário
Realce
O criacionismo 
Ainda hoje grupos de inspiração religiosa opõem 
o criacionismo à teoria darwiniana, sobretudo 
entre os que não querem descartar a fé na cria-
ção divina. Trata-se de um movimento que nasceu 
nos Estados Unidos, tendo recrudescido a partir de 
1999, quando o estado do Kansas determinou por 
lei que não era obrigatório o ensino da evolução 
biológica em suas escolas.9 
Existem diversas linhas de adesão ao criacio-
nismo. Os mais radicais são antievolucionistas, 
pois creem na versão bíblica, rejeitando que os 
seres humanos tenham derivado de um ancestral 
simiesco. No entanto, há os criacionistas modera-
dos, que reconhecem as evidências científicas da 
evolução de plantas e animais, mas atribuem a Deus 
uma ação contínua nessa evolução. 
A polêmica: evolucionismo ou criacionismo? 
As críticas que os cientistas fazem ao criacio-
nismo é que desde a Idade Moderna a ciência se 
tornou laica, isto é, a fé não deve ser tomada como 
critério de avaliação de uma teoria. Apenas o que 
pode ser testado de maneira objetiva e a partir de 
ampla discussão na comunidade científica deve ser 
levado em consideração - ainda que as teorias pos-
sam ser modificadas ao longo do tempo. 
Isso não significa desrespeitar ou negar crenças 
pessoais, mas apenas não aceitá-las como critério 
de fundamento para teorias científicas, porque a fé 
não se coaduna com a exigência de evidência empí-
rica e de rigor do método científico. 
Charge satirizando a teoria da evolução de Charles 
Darwin. Nela um gorila pede proteção de Henry Bergh, 
fundador da Sociedade Americana para a Prevenção da 
Crue ldade com Animais. Thomas Nast, 1871. O impacto 
da teoria evo lucionista inspirou a criação de inúmeras 
caricaturas, gera lmente para ironizar o cientista. 
9 Citado em: RevistaNature, lO ago.l999. p. 697. 
Quanto ao ensino nas escolas, se considerarmos 
o pluralismo que caracteriza os alunos, vindos de 
famílias de diferentes religiões ou mesmo ateias, 
pergunta-se o que seria mais conveniente ensinar. 
Em entrevista, a secretária da Educação Básica do 
Ministério da Educação afirmou que o criacionismo 
pode ser discutido nas aulas de religião, como visão 
teológica, mas não nas aulas de ciências, nas quais 
deve prevalecer o enfoque laico. 10 
Além disso, as verdades da fé são irrefutáveis, 
porque derivam de revelação divina e trazem con-
sigo valores éticos que deverão ser seguidos, o que 
contraria a possibilidade de revisão de toda conclu-
são científica e vincula-lhes automaticamente nor-
mas de conduta moral. 
Os criacionistas rebatem alegando que, devido à 
complexidade do Universo, não é possível explicá-lo 
apenas pela evolução e pelo acaso, sendo necessá-
rio admitir uma primeira Inteligência criadora. 
Mais ainda, aceitar o evolucionismo seria colocar 
em questão a criação divina. Com relação ao ensino 
nas escolas, eles consideram mais justo apresentar 
ambas as orientações, mostrando os pontos fortes 
e fracos de cada uma. 
U' PARA REFLETIR 
Diante da polêmica sobre o que ensinar nas escolas -
a teoria da evolução ou o criacion ismo - como você 
se posiciona? Justifique sua resposta. 
• A genética 
Apenas seis anos após a publicação de A ori-
gem das espécies, um monge austríaco chamado 
Gregor Mendel apresentou os resultados de uma 
experiência com ervilhas. Procedendo ao cruza-
mento de sucessivas sementes a partir da combi-
nação de sete caracteres, como cor, forma, altura 
etc., chegou a resultados estatísticos importan-
tes para elucidar fatores da hereditariedade. 
Note-se que, pela primeira vez, um biólogo usava 
a matemática em um campo que aparentemente 
a dispensava. 
Curiosamente, seu trabalho permaneceu quase 
desconhecido, até que em 1900, De Vries baseou-se 
nele para explicar a evolução como resultante de 
saltos repentinos, por mutações. Pouco depois, em 
1909, Morgan incorporou o termo "gene" para refe-
rir-se aos "fatores hereditários" mendelianos. 
10 Citado em: Folhaonline. Disponível em: www.folha.uol.com.br. Acesso em: 12 dez. 2008. 
Filosofia das ciências 
Representação de molécula de DNA. 
Se observarmos a figura da dupla hélice, 
veremos que ela é constituída por duas tiras, 
que representam as cadeias formadas pela 
sequência de um açúcar ligado a um fosfato. 
Essa unidade liga-se a outra idêntica inúmeras 
vezes, paralelamente ao eixo da dupla hélice 
(açúcar-fosfato-açúcar-fosfatoetc.). As hastes 
horizontais, no interior da hélice, são as 
bases (adenina, timina, guanina e dtosina) 
que compõem o nosso DNA e costumam 
ser representadas por A, T, G e C. Essa 
estrutura permitiu explicar duas propriedades 
importantes do gene: a codlii.cação de 
proteínas, dada pela sequência de bases, e 
a duplicação do gene. Dessa forma, Crick e 
Watson revelaram o mecani.smo de cópi.a para 
o material genético, o que levou a uma série de 
explicações de como a vida funciona. 
Tomavam impulso os estudos de genética. Mas 
a grande descoberta da molécula do DNA, em 1953, 
pelo inglês Francis Crick e pelo norte-americano 
]ames Watson, exigiu muito trabalho dos cientistas 
na primeira metade do século XX. Para se chegar a 
essa descoberta e entender a estrutura molecular 
dos genes e como eles controlam as células, foi pre-
ciso reunir cientistas de diversas disciplinas, como 
a bioquímica, a biofísica e a microbiologia. 
Outros pesquisadores já sabiam que as molé-
culas de DNA eram longas cadeias de átomos 
com largura constante em todo o comprimento. 
Crick e Watson conseguiram explicar como os 
átomos se organizavam e se duplicavam, con-
cebendo o que passou a ser conhecido como o 
modelo da dupla hélice. Segundo esse modelo, a 
molécula de DNA consiste em duas hélices enro-
ladas uma na outra, como uma escada em espi-
ral, com "degraus" compostos por pares de gru-
pos de átomos químicos. 
A fantástica descoberta da molécula do DNA 
esclareceu o fenômeno da hereditariedade ao expli-
car como os ácidos nucleicos dirigem a produção de 
proteínas, cuja sequência é única em cada pessoa. 
Com isso vislumbrou-se a possibilidade de interpre-
tar o plano genético de qualquer organismo vivo, o 
que começou a se concretizar na década de 1970 
com a destinação de vultoso financiamento do 
governo norte-americano ao Projeto Genoma. 
Esse projeto reúne vários programas de pesqui-
sas, que se orientam no sentido de fazer o mapea-
mento genético dos organismos e depois o sequen-
ciamento das bases de cada um dos fragmentos de 
DNA já ordenados. As vantagens de se decifrar a 
constituição genética estão na prevenção de doen-
ças e no seu tratamento. Tanto é que já existem 
patentes sobre genes para doenças desde o Mal de 
Alzheimer até a calvície. 
A grande polêmica que se seguiu, no entanto, 
deve-se a inúmeros aspectos éticos e legais, aos 
quais se juntam temores e mitos arraigados das 
mais diversas naturezas, sobretudo no que diz res-
peito ao uso de transgênicos, à clonagem humana e 
à utilização de células-tronco. 
m A crise da ciência 
O desenvolvimento da ciência tinha sido tão 
significativo até o século XIX que não era possí-
vel negar a excelência do método científico para 
conhecer a realidade. Filosofias como o positi-
vismo de Comte e o evolucionismo de Spencer 
traduziam o otimismo generalizado que exaltava 
a capacidade de transformação humana em dire-
ção a um mundo melhor. 
No entanto, algumas novidades golpearam rude-
mente as concepções clássicas, originando o que se 
chamou de crise da ciência moderna. São elas as geo-
metrias não euclidianas e a física não newtoniana. 
No século XIX alguns matemáticos construíram 
outros modelos de geometria que partiam de axio-
mas que contradiziam os clássicos de Euclides: sur-
giram então as geometrias não euclidianas. 
DNA. Ácido desoxirribonucleico.A sigla deriva do inglês 
Deoxyribonucleic acid. 
O método das ciências da natureza Capítulo 31 
Usuário
Realce
Vê-se, a partir de cima, o triângulo na geometria elíptica 
de Riemann, na geometria hiperbólica de Lobatchevski e 
na geometria plana de Euclides. ilustração disponível em: 
http:l /wa pedia.mobi/pt!Ficheiro: E nd _ of _ u niverse.jpg. 
Acesso em: abr. 2010. 
O russo Nikolai Lobatchevski, em vez de conside-
rar o espaço um plano euclidiano - no qual por um 
ponto fora de determinada reta passa uma e só uma 
paralela a essa reta-, pressupôs o espaço de curva-
tura negativa, e concluiu que seria possível traçar infi-
nitas paralelas a essa reta. No final da década de 1850, 
o matemático alemão Bernhard Riemann construiu 
sua geometria em espaço de curvatura positiva, na 
qual não existem paralelas. 
Os novos modelos não anulavam a geometria eucli-
diana, mas desmoronaram o critério de evidência em 
que os postulados euclidianos pareciam repousar. 
Como consequência, seria preciso repensar a "verdade'' 
na matemática, que dependia do sistema de axiomas 
postos de início e tomados como verdadeiros por con-
venção, a partir do qual poderiam ser construídas geo-
metrias igualmente coerentes e rigorosas. 
• A física não newtoniana 
Outra crise na ciência decorreu da física não 
newtoniana, cujos pressupostos eram o mecani-
cismo e o determinismo. 
Mas a teoria da relatividade de Einstein veio sub-
verter a concepção newtoniana do Universo, sobre-
tudo devido a descobertas como a curvatura da 
luz das estrelas. Mais ainda, segundo essa teoria, o 
ritmo da passagem do tempo não é certo nem abso-
luto: tempo e espaço não são mais entidades sepa-
radas, mas são substituídos pelo conceito de uma 
quarta dimensão, o espaço-tempo. 
No início do século XX, outra instigante constata-
ção confrontou o princípio do determinismo: após o 
desenvolvimento da teoria quântica e do estudo do 
fóton, Werner Heisenberg formulou o principio da 
incerteza, que seria o reconhecimento de uma certa 
indeterminação nesse campo da ciência, ou seja, a 
impossibilidade de precisão. 
..._ __ _.l Unidade 6 Filosofia das ciências 
fJ Novas orientações 
epistemológicas 
As "crises" da ciência no final do século XIX e 
começo do século XX exigiram que a epistemologia 
contemporânea fizesse uma revisão da concepção 
de ciência e da sua metodologia. 
m ETIMOLOGIA 
Epistemologia. Do grego episteme, "ciência", e Jogos, 
"teoria". 
Henri Poincaré ( 1854-1912) afirmou que "as teo-
rias não são nem verdadeiras, nem falsas, mas úteis", 
querendo significar que a crença na infalibilidade da 
ciência é uma ilusão. O que ocorreu naquele período 
foi a necessidade de reavaliar o conceito de ciência, 
os critérios de certeza, a relação entre ciência e rea-
lidade, a validade dos modelos científicos. 
Essas questões são o objeto da epistemologia 
científica. Essa denominação começou a ser usada 
em meados do século XIX, correspondendo à teoria 
do conhecimento. Com maior precisão, e tendo em 
vista a intensificação das discussões contemporâ-
neas em torno da ciência, o termo "epistemologia" 
passou a ser mais usado para designar o estudo do 
conhecimento científico do ponto de vista crítico, 
isto é, do seu valor. Em outras palavras, para exami-
nar o valor objetivo dos princípios, das hipóteses e 
das conclusões das diferentes ciências. 
• O Circulo de Viena 
O Círculo de Viena foi fundado no final da década 
de 1920 por um grupo de cientistas, lógicos e filóso-
fos da ciência, liderados por Rudolf Carnap e do qual 
participaram Otto Neurath e Moritz Schlick, entre 
outros. Sofreram influência de Einstein, Russell e 
Wittgenstein, considerados os principais represen-
tantes da concepção científica do mundo. 
Os filósofos do Círculo de Viena pertencem ao 
movimento filosófico do positivismo lógico ou empi-
rismo lógico, segundo o qual o saber científico deve 
ser expurgado de conceitos vazios e dos falsos proble-
mas metafísicos, submetendo-se ao critério da veri-
ficabilidade. Desse modo, a verdade ou a falsidade 
dos enunciados sintéticos só pode ser comprovada 
empiricamente, porque não há um saber apriorístico 
sobre a realidade. As leis científicas são sempre a pos-
teriori, porque dependem da experiência. 
Nesse processo é importante o sistema de con-
venções pelo qual a lógica simbólica permite a clari-
ficação da linguagem científica . 
• Popper e a "falseabilidade" 
O filósofo austríaco Karl R. Popper ( 1902-1994) 
sofreu inicialmente a influência do Círculo de Viena, 
mas depois teceu diversas críticas a ele. Para Popper, 
ao cientista não interessa a justificação de sua teo-
ria, que tradicionalmenteé feita por experimentação, 
hipótese e confirmação, já que a indução apresenta 
sempre inúmeras dificuldades. Propõe, então, o prin-
cípio da falseabilidade ou da refutabilidade. 
Segundo esse critério, o cientista imagina uma 
hipótese e a submete ao levantamento de possíveis 
maneiras de falseá-la, de refutá-la pela experiência. 
Ou seja, não podemos provar que uma teoria uni-
versal é verdadeira, mas podemos provar que é falsa. 
Quando uma teoria resiste à refutação pela expe-
riência, dizemos que está corroborada. 
Portanto, os cientistas avançam quando deter-
minam os limites das conjeturas que utilizam, ten-
tando mostrar que são "falsas", para então substituí-
-las. Gérard Fourez dá um exemplo: 
[ .. . ] se digo que a aceleração de um objeto que cai é 
constante, trata-se de uma proposição que poderia 
se revelar falsa por ocasião de uma experiência para 
a qual se utilizassem critérios precisos; é portanto 
'falseável '. [ ... ]a proposição 'ajo assim porque é do 
meu interesse agir assim' pode ser compreendida 
como uma proposição não falseável , na medida em 
que posso inventar para mim múltiplos interesses 
que farão com que esses interesses sejam sempre a 
causa da minha ação. Por exemplo, se não existem 
interesses finance iros, poderei dizer que há um 
interesse pol ítico, ou afetivo etc., de modo que se 
agirá sempre por interesse.11 
Por isso Popper critica a psicanálise e o mar-
xismo, cujos universos teóricos restringem-se às 
explicações de seus idealizadores e não dão condi-
ções de refutabilidade empírica. 
• Kuhn e o conceito de paradigma 
Na obra Estrutura das revoluções científicas, o 
filósofo norte-americano Thomas Kuhn ( 1922-1996) 
desenvolve uma nova noção de paradigma, segundo 
a qual a ciência progride pela tradição intelectual 
representada pela visão de mundo assumida pela 
comunidade científica, que fornece problemas e 
soluções exemplares para a pesquisa futura. 
Não se trata de um conceito simples, mesmo por-
que o próprio Kuhn o define de diferentes modos em 
sua obra, mas o principal é que o trabalho científico 
se desenvolve baseado no modelo consensual ado-
tado pelos cientistas. 
ll:lill PARA SABER MAIS 
O conceito de paradigma variou na história do pen-
samento. Para Platão, era o modelo do mundo das 
ideias; para Aristóteles, era o exemplo em lógica. 
Kuhn distingue os seguintes três momentos: o pe-
ríodo pré-paradigmático, a ciência normal e a crise. 
No período pré-paradigmático ou imaturo, os 
problemas originados no cotidiano pedem explica-
ções que não apresentam ainda o consenso a res-
peito dos compromissos básicos. Quando é alcan-
çado o consenso, temos a ciência normal, em que o 
trabalho científico se desenvolve com base no para-
digma adotado, que dirige a resolução dos proble-
mas e a acumulação de descobertas. Chega, porém, 
o momento de crise, em que o paradigma é questio-
nado porque já não resolve uma série de anomalias 
acumuladas, processo que pode levar à revolução 
cientifica. 
Por exemplo: até Copérnico era aceito o paradigma 
ptolomaico; até a teoria da relatividade, a ciência nor-
mal se sustentava pelo paradigma newtoniana. 
• Feyerabend: contra o método 
Enquanto Popper afirma que a ciência é racional, 
na medida em que atende ao ideal de refutabilidade, 
Kuhn argumenta que uma teoria, como paradigma, 
deve na maior parte do tempo ser desenvolvida em 
vez de criticada. Feyerabend, por sua vez, radicaliza 
e questiona a própria racionalidade científica. 
O filósofo Paul K. Feyerabend ( 1924-1994) abando-
nou cedo o empirismo, classificando-se como "anar-
quista epistemológico''. Critica as posições positivis-
tas por considerar que as metodologias normativas 
não são instrumentos adequados de investigação e 
defende o pluralismo metodológico. Segundo o filó-
sofo, por uma questão democrática, já que há plura-
lidade de ideias e formas de vida, não seria na ciên-
cia que haveria imposição de métodos. A famosa 
afirmação de que "o único princípio que não inibe o 
progresso é: tudo vale" aparece num livro cujo título 
sugestivo indica sua posição: Contra o método. 
11 FOUREZ. Gérard. A construção das ciências: introdução à filosofia e à ética das ciências. São Paulo: 
Editora Unesp, 1995. p. 72-73. 
O método das ciências da natureza Capítulo 31 
:. 
Para Feyerabend, não existe norma de pesquisa 
que não tenha sido violada, por isso o cientista pode 
fazer aquilo que lhe agrada mais. E deve tornar per-
suasiva a teoria utilizando-se de recursos retóricos 
por meio de propaganda, a fim de melhor conven-
cer a comunidade científica. Como exemplo, cita 
Galileu, que procedeu desse modo para convencer 
acerca da hipótese do movimento relativo. 
Gilles-Gaston Granger destaca o duplo signifi-
cado dessa teoria provocadora: 
O aspecto positivo deste anarquismo consiste, sem 
dúvida, numa crítica violenta ao conservadorismo 
e ao dogmatismo, sublinhando a mobilidade do 
conhecimento científico e sua abertura às novidades. 
Seu aspecto negativo vem da insistência em 
considerar a diversidade, ou até a incoerência, como 
um valor em si, e a indiferença em procurar critérios 
de decisão e de escolha entre as teorias, exagero este 
que, a meu ver, desqualifica a doutrina.12 
13 A ambiguidade do progresso 
cientifico 
No esboço que fizemos sobre o desenvolvimento 
da ciência, iniciado na Idade Moderna, ficou patente 
o incrível impulso adquirido por ela durante o século 
XX. Além de inúmeras descobertas, houve também 
um avanço sem precedentes nas conquistas tecno-
lógicas. Os professores - e irmãos -David e Arnold 
Brody disseram a esse respeito: 
Entramos no século XX a cavalo. Sairemos dele 
a bordo de naves espaciais. Ingressamos neste 
século morrendo de febre tifoide e varíola, e nos 
despediremos dele tendo vencido essas doenças. Na 
virada do século XIX, transplantes de órgãos eram 
inconcebíveis, enquanto na virada deste século 
muitos terão sobrevivido por que o coração ou outro 
órgão vital de uma outra pessoa os sustenta. Em 
1900, a expectativa de vida humana era de 47 anos. 
Hoje é de 75. Adentramos este século comunicando-
-nos a curta distância com o recém-inventado rádio. 
Hoje enviamos sinais e imagens coloridas através de 
bilhões de quilômetros no espaço. 13 
O cubismo, movimento artístico iniciado em 1907 
por George Braque e Pablo Picasso, introduziu na 
arte conceitos emprestados das geometrias não 
euclidianas do século XIX e da teoria da relatividade de 
Ei nstein: o espaço da pintura passa a ser fragmentado 
e articulado com o tempo. No quadro de Mareei 
Duchamp, Nu descendo a escada (1911}, o espaço 
está completamente fragmentado, e o homem 
descendo a escada realiza movimento contínuo. 
Contudo, é importante acrescentar: se, por um 
lado, a ciência tem proporcionado maior conheci-
mento do mundo e ampliado os poderes humanos, 
não há como negar o risco dos seus efeitos maléfi-
cos, como a guerra ou a poluição. Não é excessivo 
enfatizar que esses problemas não se devem pro-
priamente à ciência ou à tecnologia, mas ao uso que 
delas fazem as pessoas, seja individualmente ou por 
meio de empresas privadas ou do poder público. 
Resta lembrar a importância da liberdade 
de manifestação do pensamento. O espírito da 
Inquisição, que condenou Galileu, tem ressurgido 
na forma de Estados totalitários e ditatoriais, mas 
também nas mentes que temem as novidades tra-
zidas pelas conquistas científicas, pois elas colocam 
em xeque sua maneira tradicional de ver o mundo. 
12 GRANGER, Gilles-Gaston.A ciência e as ciências. São Paulo: Hucitec/Editora Unesp,l994. p. 43. 
13 BRODY, David Eliot e BRODY, Arnold R. As sete maiores descobertas científicas da história. São Paulo: 
Companhia das Letras, 1999. p. 396. 
Unidade 6 Filosofia das ciências

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