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TEORIA GERAL DO DIREITO CIVIL Programa de Pós-Graduação EAD UNIASSELVI-PÓS Autoria: Patrícia Ribas Athanázio Hruschka Vanilda da Silva Vargas CENTRO UNIVERSITÁRIO LEONARDO DA VINCI Rodovia BR 470, Km 71, no 1.040, Bairro Benedito Cx. P. 191 - 89.130-000 – INDAIAL/SC Fone Fax: (47) 3281-9000/3281-9090 Reitor: Prof. Hermínio Kloch Diretor UNIASSELVI-PÓS: Prof. Carlos Fabiano Fistarol Equipe Multidisciplinar da Pós-Graduação EAD: Carlos Fabiano Fistarol Ilana Gunilda Gerber Cavichioli Cristiane Lisandra Danna Norberto Siegel Camila Roczanski Julia dos Santos Ariana Monique Dalri Bárbara Pricila Franz Marcelo Bucci Revisão de Conteúdo: Ivan Tesck Revisão Gramatical: Equipe Produção de Materiais Diagramação e Capa: Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI Copyright © UNIASSELVI 2018 Ficha catalográfica elaborada na fonte pela Biblioteca Dante Alighieri UNIASSELVI – Indaial. 340 H873t Hruschka, Patrícia Ribas Athanázio Teoria geral do direito civil / Patrícia Ribas Athanázio Hruschka; Vanilda da Silva Vargas. Indaial: UNIASSELVI, 2018. 138 p. : il. ISBN 978-85-53158-05-8 1.Direito. I. Centro Universitário Leonardo Da Vinci. Patrícia Ribas Athanázio Hruschka Vanilda da Silva Vargas Advogada, graduada em Direito pela Universidade Regional de Blumenau - FURB, com habilitação em “Direito Empresarial e Direito Privado”. Especialista em Direito Processual Civil pela Universidade do Vale do Itajaí - UNIVALI. Especialista em Direito Penal e Processual Penal pela Universidade do Vale do Itajaí - UNIVALI. Mestra em Ciência Jurídica pela Universidade do Vale do Itajaí - UNIVALI. Autora do livro “Holding: planejamento sucessório de empresa à luz dos princípios constitucionais”, Editora CRV, 2015. Advogada, graduada em Direito pela Universidade Regional de Blumenau-FURB, com habilitação em “Direito Empresarial e Direito Privado”. Especialista em Direito Civil pelo Centro de Ensino Superior de Blumenau - CESBLU, Mestre pelo Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Regional da Universidade Regional de Blumenau – FURB. Professora Substituta do Departamento de Direito da FURB. Professora em Direito da UNIASSELVI-FAMEBLU. Sumário APRESENTAÇÃO ..........................................................................01 CAPÍTULO 1 Introdução ao Estudo do Direito Civil ....................................09 CAPÍTULO 2 Das Pessoas .................................................................................23 CAPÍTULO 3 CAPÍTULO 4 CAPÍTULO 5 Dos Bens .......................................................................................73 Dos Negócios Jurídicos .............................................................89 Da Prescrição e da Decadência ...............................................125 APRESENTAÇÃO Ao longo dos tempos os indivíduos foram levados a se aproximarem uns dos outros, para saciar suas necessidades, constituindo-se em sociedade. Para essa vivência, num primeiro momento foram criadas regras sociais, com normas mínimas de convivência, vez que a total liberdade é incompatível com a convivência harmoniosa entre pessoas diferentes. À medida que as sociedades evoluíram e se tornaram complexas, houve a necessidade de institucionalizar as regras, dando origem ao direito, como forma de garantir a convivência social harmônica, regulamentar as relações jurídicas e punir excessos. Nessa ótica surge o Direito Civil, dentro do ramo do direito privado, como regulador do dia a dia do ser humano em sociedade, posto que grande parte das relações sociais, como o casamento, o contrato, a propriedade, a sociedade empresária, estão sob esse manto. Não se trata de um direito estanque, por não mais se apresentar com um enfoque voltado apenas à proteção do interesse patrimonial e individualista, mas com uma proposta humanizada e coletiva, sendo que tal perspectiva se originou a partir da constitucionalização do Direito Civil, ocorrido após o advento da Constituição Federal de 1988. Adequando-se a essa realidade a edição do Código Civil de 2002 apresentou três princípios otimizando a aplicação do diploma civil, ajustando-o ao tempo e espaço atuais, desafiado todos os dias pela sociedade, frente aos novos arranjos e interesses das atuais relações jurídicas. Para tanto devemos conhecer os sujeitos e objetos de direito, o que os difere e quais os contornos jurídicos dessas relações. Por isso a importância do estudo sob a vida e a morte em nosso ordenamento e seus efeitos para a sociedade, em virtude dos comandos de direitos e deveres na ordem civil. O surgimento da pessoa jurídica, as consequências, direitos e obrigações até a extinção também estão sob o olhar do Direito Civil. Considerando que não se pode admitir a perpetuação eterna para o exercício de um direito, o Código Civil de 2002 elucidou os institutos da prescrição e da decadência, definindo prazos e consequências, tratando de maneira muito mais clara do que a legislação que o antecedeu (de 1916). Vamos conhecer esse novo mundo que se descortina? Bons estudos! CAPÍTULO 1 Introdução ao Estudo do Direito Civil A partir da perspectiva do saber fazer, neste capítulo você terá os seguintes objetivos de aprendizagem: � Compreender a sistemática da Lei de Introdução às normas do Direito Brasileiro. � Identificar a estruturação da normativa legal referente ao Direito Privado brasileiro. � Aplicar as normas introdutórias ao Direito Brasileiro, especialmente em relação ao Direito Civil. � Estabelecer um panorama diferenciador acerca da normativa afeta ao Direito Privado em relação ao Direito Público. 10 TEORIA GERAL DO DIREITO CIVIL 11 Introdução ao Estudo do Direito Civil Capítulo 1 Contextualização Para bem viver coletivamente, o ser humano necessita de um sistema capaz de regular seus atos, relações e situações jurídicas. Nessa ordem surge em nosso ordenamento o Direito Civil como regulador do dia a dia do ser humano em sociedade. Assim, nossas relações em sociedade, tais como o casamento, o contrato, a propriedade, enfim, tudo o que circunda o meio social está sob a proteção do Direito Civil. Conceito de Direito Civil Diante do imenso campo de abrangência das relações estabelecidas entre as pessoas e reguladas pelo Direito Civil, é necessário observar o posicionamento de alguns doutrinadores a respeito da conceituação. Melo (2015, p. 34) conceitua: Direito Civil é o direito comum, também chamado de direito privado (quando incluímos o direito comercial), que rege as relações entre os particulares, disciplinando a vida e as relações das pessoas naturais, desde a sua concepção e até após a morte, bem como das pessoas jurídicas, regulando as relações pessoais e patrimoniais, bem como as formas de aquisição e transferência de bens. Gonçalves (2015, p. 41) registra que “[...] o Código Civil é a Constituição do homem comum, porque rege as relações mais simples da vida cotidiana, das ocorrências do dia a dia”. Até se alcançar o Código Civil de 2002 houve um longo caminho. Veja: a) Ordenações Filipinas (que vigorou no Brasil até o CC/1916), editada em 1603, pela Coroa portuguesa; b) Consolidação das Leis Civis: realizada pelo jurisconsulto baiano Augusto Teixeira de Freitas, iniciada em 1855, concluída em 1858; c) Esboço Teixeira de Freitas: em 1859 o jurisconsulto foi contratado pelo governo brasileiro para elaborar o Código Civil, que mesmo contando com 4.900 artigos não chegou a ser submetido à aprovação, mas é considerado um “esboço” do Código Civil; d) Projeto Clóvis Beviláqua: em 1899 foi escolhido pelo presidente para elaborar o projeto do primeiro Código Civil Brasileiro, encaminhado para o Congresso em 1900 e aprovado em 1916, entrando em vigor em 1º. de janeiro de 1917 (Lei nº 3.071/1916). Continha1.807 artigos e era antecedido pela Lei de Introdução ao Código Civil. Possuía uma parte geral (com conceitos, categorias e princípios básicos) e uma parte especial. Sofreu grande influência do Código Civil alemão de 12 TEORIA GERAL DO DIREITO CIVIL 1896 e do Código Napoleônico, de 1804; e) Leis especiais do século XX: algumas leis esparsas surgiram no século XX, diante da necessidade de acompanhar a evolução da sociedade. Exemplos: Lei de Alimentos (Lei 5.478/68); Lei de Registros Públicos (Lei 6.015/73); Código de Defesa do Consumidor (Lei 8.078/90); Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei 8.069/90) etc.; f) Código Civil de 2002: Lei 10.406/2002, de 10 de janeiro de 2002. (GONÇALVES, 2015, p. 42-43). Tinha sido tentada a revisão do Código Civil de 1916 por duas vezes (em 1941 e em 1961), sem êxito. Então, em 1967, o Governo nomeou uma comissão sob a supervisão de Miguel Reale, para a elaboração de um projeto, composta dos seguintes juristas: José Carlos Moreira Alves (Parte Geral), Agostinho Alvim (Obrigações), Sylvio Marcondes (Empresas), Ebert Vianna Chamoun (Direito das Coisas), Clovis do Couto e Silva (Direito de Família) e Torquato Castro (Direito das Sucessões). O projeto foi entregue ao Congresso Nacional em 1975 (Projeto de Lei nº 634/75) e somente foi aprovado em 10 de janeiro de 2002 – Lei nº 10.406/2002, com período de vacatio legis de um ano, entrando em vigor no dia 11 de janeiro de 2003 (MELO, 2015). Gonçalves (2015, p. 44) destaca que o Código Civil de 2002 tem as seguintes características: - Preserva a estrutura do Código Civil de 1916; - Unifica o direito das obrigações; - Inclui matéria das leis especiais posteriores a 1916 e contribuições da jurisprudência; - Exclui matéria de ordem processual, a não ser quando profundamente ligada à de natureza material; - Inclui o sistema de cláusulas gerais, concedendo ao juiz certa margem de interpretação, respeitados os princípios constitucionais concernentes à organização jurídica e econômica da sociedade. Ex.: cláusula geral que exige um comportamento condizente com a probidade e boa-fé objetiva (CC, art. 422) e a que proclama a função social do contrato (art. 421). Continuam em vigor, no que não conflitarem com o novo Código Civil, a Lei do Divórcio (somente na parte processual), o Estatuto da Criança e do Adolescente, o Código de Defesa do Consumidor, a Lei do Inquilinato (Lei nº 8.245/91) etc. Melo (2015, p. 38) alerta que durante esse período de tramitação o novo Código Civil sofreu diversas mudanças, em especial com o advento da Constituição Federal de 1988, tendo sido promovida uma: [...] espécie de constitucionalização do Direito Civil, com a inserção do princípio da dignidade humana (CF, art. 1º, III) e a necessária proteção aos direitos fundamentais da pessoa humana (CF, art. 5º e seus vários incisos); a concepção de família (CF, art. 226) e a proteção especial às crianças e adolescentes (CF, art. 227), assim como aos idosos (CF, art. 230), dentre outros aspectos importantes. 13 Introdução ao Estudo do Direito Civil Capítulo 1 Conforme já mencionado, o CC/2002 seguiu a estrutura do CC/16, acompanhando o modelo germânico preconizado por Savigny, colocando as matérias em ordem metódica, divididas em Parte Geral e Parte Especial, num total de 2.046 artigos. Quadro 1 – Estrutura do código civil de 2002 Parte Geral Parte Especial Das pessoas Direito das obrigações Dos bens Direito de empresa Dos fatos jurídicos Direito das coisas Direito de família Direito das sucessões Fonte: Os autores. Como se pode perceber, a estrutura do Código Civil de 2002 é bastante pragmática, visando facilitar as incursões do operador do Direito, por se tratar de uma ordenação sistematizada de artigos. Integração do Direito Civil no Ordenamento Jurídico Brasileiro O direito privado como ramo do direito traça contornos nas relações entre os indivíduos em sociedade. Pode-se considerar que o Direito Civil é o pilar central do direito privado, e como mola mestra, não há sociedade sem a regulação dos atos praticados pelos seus membros. No cenário do século XIX, com a influência do Código Civil Francês, o Direito Civil representado pelo Código Civil de 1916 se constituía como centro do sistema jurídico brasileiro. Tal consideração se deve pela dinâmica economicista vinculada às relações sociais e às necessidades humanas, aonde o Direito Civil vem a delinear os arranjos realizados no dia a dia em sociedade. Nessa ordem, entende-se por Direito Civil “[...] o conjunto de normas, categorias e institutos jurídicos que tem por objeto as pessoas e suas relações com as demais”. (LOBO, 2015, p. 17). 14 TEORIA GERAL DO DIREITO CIVIL Vamos compreender melhor o que significam as relações jurídicas, ou seja, “[...] é o vínculo que, nas situações que envolvam duas ou mais pessoas, atribui a umas e outras poderes e deveres juridicamente exigíveis, com vista à consecução de finalidades específicas” (NORONHA, 2010, p. 32). Assim, tem-se que as relações no Direito Civil estão inseridas nos espaços do direito privado que representam toda e qualquer prática realizada pelos sujeitos que gerem direitos e deveres juridicamente exigíveis, tais como, casamentos, contratos, testamentos e tantas outras situações. Cabe destacar que estas relações no passado tinham como centro de interesses as relações meramente patrimoniais, ou seja, o Direito Civil se regia sob o enfoque do individualismo jurídico na proteção do patrimônio ou da propriedade. Na atualidade, o Direito Civil se otimiza por meio da pessoa, focado na dignidade da pessoa humana, superando a concepção economicista e individualista. Para uma leitura crítica, com perspectivas do pluralismo jurídico, recomenda-se a seguinte obra: WOLKMER. Antônio Carlos. Introdução aos fundamentos de uma teoria geral dos novos direitos. Disponível em: <https://goo.gl/8YA9M2>. Acesso em: 15 fev. 2018. Assim, o Direito Civil, dentro de nosso ordenamento jurídico, é a mola mestra para regular as relações em sociedade, onde se impulsionam tanto as questões sociais, mas também as econômicas. Vamos perceber ao longo do nosso estudo que o Direito Civil estabelece relações com várias áreas do Direito e, depois da Constituição Federal de 1988, uma vertente direta com as garantias constitucionais. 15 Introdução ao Estudo do Direito Civil Capítulo 1 Constitucionalização do Direito Civil Vamos lá, pessoal! Como já verificamos, o Direito Civil tinha como mote as questões patrimoniais, não o sujeito em si e, assim, se localizava em nosso ordenamento como centro dos interesses jurídicos, pois tal visão se constituía pela influência do direito romano e do Código Civil Francês. Com o advento da 2ª Grande Guerra, o ser humano começou a refletir sobre sua subsistência e o centro de interesses passou a ser o sujeito. Assim, deu-se início a um novo processo do constitucionalismo no cenário mundial. Já no Brasil tal perspectiva surge pontualmente com a Constituição Federal de 1988, onde o direito constitucional é quem passa a ser o centro de interesses. A valorização do ser humano, fruto do reconhecimento da dignidade, por sua vez, está propiciando uma revisão dogmática e hermenêutica completa do ordenamento civil, pois o direito privado passa a se despatrimonializar. É o ser superando o ter (POPP, 2003). Essa posição do direito constitucional apresentou um fenômeno jurídico denominado constitucionalização do direito, e, em especial para nosso estudo, a constitucionalização do Direito Civil. Cabe lembrar que a Constituição de 1988 foi promulgada sob a orientação não só de um pacto político, mas buscou a definição de novos paradigmas jurídicos, além de estabelecer princípios programáticos que orientam a interpretação e a aplicação das normas infraconstitucionais, entre as quais o próprio Código Civil (MAMEDE, 2010). A constitucionalização do DireitoCivil não é o único caminho, mas, sim, um dos possíveis para a eleição de um novo paradigma de renovação dos institutos privados. (NALIN, 2004). No processo de constitucionalização do Direito Civil não há uma alteração nos preceitos do direito privado, mas há uma aplicação hermenêutica dos valores constitucionais. Nesse sentido, a Constituição passa a ser um filtro axiológico, um norte para a aplicação do Direito Civil sob a ótica dos valores constitucionais. No processo de constitucionalização do Direito Civil não há uma alteração nos preceitos do direito privado, mas há uma aplicação hermenêutica dos valores constitucionais. 16 TEORIA GERAL DO DIREITO CIVIL Para Carli (2005), o Direito Civil constitucionalizado, ou seja, o Direito Civil transformado pela normativa constitucional, tem como fundamentos a superação da lógica patrimonial (proprietária, produtivista, empresarial) pelos valores existenciais da pessoa humana, que se tornam prioritários no âmbito do Direito Civil, porque privilegiados pela Constituição Federal de 1988. Gonçalves (2015) chama a atenção à expressão “direito civil-constitucional”, pois defende a releitura do Código Civil à luz da Constituição, redefinindo categorias jurídicas civilistas a partir de comandos principiológicos constitucionais, pautados na dignidade da pessoa humana, na solidariedade social e igualdade substancial. Destaca Popp (2003) que há uma indistinta e direta aplicação da norma constitucional às relações privadas, sempre tendo como protagonista a pessoa humana. Assim, toda visão do Direito Civil passa, necessariamente, por uma releitura tendo como cerne principal a nova ótica descrita na Constituição. Nalin (2004) frisa que ler o Código Civil à luz da Constituição implica o distanciamento do individualismo e da patrimonialidade contratual, não em sentido de revogar, mas de recolocar e recondicionar na moldura dos direitos fundamentais a pessoa humana. Afinal, as normas constitucionais até certo ponto sempre foram aplicadas às relações privadas, então o que muda nesse processo denominado constitucionalização do Direito Civil? Barroso (2005, s.p.) afirma que o que alterou nesse processo foi na “determinação do modo” e da “intensidade dessa incidência” das normas constitucionais; assim, tanto a doutrina como a jurisprudência dividem-se em duas correntes: a) a da eficácia indireta e mediata dos direitos fundamentais, mediante atuação do legislador infraconstitucional e atribuição de sentido às cláusulas abertas; b) a da eficácia direta e imediata dos direitos fundamentais, mediante um critério de ponderação entre os princípios constitucionais da livre iniciativa e da autonomia da vontade, de um lado, e o direito fundamental em jogo, do outro lado. Nesse sentido, entende Barroso (2005) que entre estas duas correntes, sob o aspecto de aplicabilidade, a segunda é a mais adequada, pois esta eficácia se apresenta mediante um critério de ponderação, em que se deverá levar em consideração os elementos do caso concreto. 17 Introdução ao Estudo do Direito Civil Capítulo 1 Conclui Popp (2003) que a solução para cada controvérsia não pode mais ser encontrada levando em conta simplesmente o artigo de lei que parece contê- la e resolvê-la, mas, antes, à luz do inteiro ordenamento jurídico, e, em particular, dos seus princípios fundamentais, considerados como opções de base que o caracterizam. Para Popp (2003, p. 89) a influência da Constituição sobre o Direito Privado se destaca em alguns aspectos: ● A visão da Constituição não mais como regra política, mas também jurídica que passa a atingir não só as entidades públicas, mas também as particulares, deixando de ser mera cartilha de deveres aos administradores, mas também fonte de direito aos particulares; ● A chamada constitucionalização dos princípios fundamentais de direito privado; ● A globalização do direito, aspecto que diminuiu as distâncias e aumentou o interesse na unificação das regras jurídicas; ● A aceitação pelas novas constituições da importância da proteção dos direitos humanos e a ratificação de normas supranacionais neste sentido. É de se destacar que os princípios possuem densidade axiológica, ao carregar em si valores que fundamentam as normas, além de possuírem função de colmatar eventuais lacunas do ordenamento jurídico. Garantem, ainda, unidade e coerência ao sistema jurídico, de modo que não se pode mais analisar qualquer regra sem a associação aos princípios, principalmente os princípios constitucionais. Princípios Fundamentais do Código Civil de 2002 O Código Civil de 2002 veio depois de muito tempo de espera, pois em 1988 tínhamos uma nova ordem constitucional, que veio cheia de inovações e com preceitos conflitantes aos publicados no Código Civil de 1916. Todavia, para os críticos já nasceu velho, faltando-lhe uma série de ajustes de ordem social. 18 TEORIA GERAL DO DIREITO CIVIL Para conhecer os motivos que levaram o legislador a redigir o Código Civil de 2002, faça a leitura do texto de autoria de Lucas Abreu Barroso, disponível no seguinte endereço eletrônico: <https:// goo.gl/2BZy4K>. Vamos agora conhecer os três princípios norteadores do Código Civil de 2002. Veja: • Princípio da eticidade Consiste na busca da compatibilização dos valores técnicos conquistados na vigência do código anterior, com a participação de valores éticos no ordenamento jurídico. Salienta Gonçalves (2006) que o princípio da eticidade funda-se no valor da pessoa humana como fonte de todos os demais valores. Prioriza a equidade, a boa-fé, a justa causa e demais critérios éticos. Confere maior poder ao juiz para encontrar a solução mais justa ou equitativa. Lembra Monteiro de Barros (2005) que no Código Civil de 2002 nem tudo se resolve por meio de preceitos normativos expressos, pois são fartas as referências à equidade, à boa-fé, à justa causa e demais critérios éticos, por exemplo, a boa- fé na interpretação dos negócios jurídicos - art. 113 e a boa-fé na execução dos contratos – art. 422. • Princípio da socialidade Com efeito, o sentido social é uma das características mais marcantes do Código Civil de 2002, buscando preservar o sentimento de coletividade, muitas vezes em detrimento de interesses individuais, por exemplo, a função social dos contratos – art. 421 e a natureza social da posse – art. 1.239 e ss. • Princípio da operalidade Para Monteiro Barros (2005), consiste no fato de estabelecer soluções normativas de modo a facilitar a interpretação e a aplicação do direito, eliminando- se as dúvidas hermenêuticas que persistiam no Código Civil de 1916, como a polêmica distinção entre prescrição e decadência. O Código Civil de 2002 19 Introdução ao Estudo do Direito Civil Capítulo 1 Atividade de Estudos: 1) Vamos recapitular! De que trata o Direito Civil e qual sua relação com o Direito Constitucional? _______________________________________________ _______________________________________________ _______________________________________________ _______________________________________________ _______________________________________________ _______________________________________________ enumera, na parte geral, os casos de prescrição, inserindo as hipóteses de decadência em conexão com a disposição normativa que as estabelece. Importa na concessão de maiores poderes hermenêuticos ao magistrado. Nessa linha, privilegiou a normatização por meio de cláusulas gerais, que devem ser aplicadas no caso concreto. Entende Gonçalves (2006, p. 25) que “[...] no bojo do princípio da operalidade está implícito o da concretitude, que é a obrigação que tem o legislador de não legislar em abstrato”. Exemplificam Gagliano e Pamplona Filho (2006) com a nova regra de responsabilidade civil prevista no parágrafo único do art. 927, em que se admite a “[...] obrigação de reparar o dano, independentemente deculpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem” (BRASIL, 2002, s.p.). Pode-se exemplificar este princípio por meio da aplicabilidade dos artigos relacionados nas disposições finais e transitórias do Código Civil de 2002, dentre estes a citar o artigo 2041, onde há a indicação de qual legislação a ser aplicada no caso da abertura da sucessão antes da vigência do diploma civil de 2002. Para finalizar nossas considerações sobre a principiologia do Código Civil de 2002, há que se considerar que os valores trazidos pelos três princípios deram uma nova roupagem para os preceitos que foram inclusive reeditados no novo diploma civil, trazendo uma ferramenta hermenêutica otimizadora na aplicação dos preceitos legais ao caso concreto. 20 TEORIA GERAL DO DIREITO CIVIL Algumas Considerações Como estudamos até o momento, o Direito Civil se apresenta como um dos elos de maior importância em nosso sistema, haja vista sua função de regular as relações em sociedade. Em toda a sua história, o Direito Civil como regulador das relações privadas sofreu toda a influência dos fatores históricos e caminhou conforme os passos da sociedade. E, assim, buscou redimensionar seu foco, trazendo uma releitura das relações privadas com um enfoque voltado não mais só no interesse patrimonial e individualista, mas uma proposta humanizada e coletiva. Tal perspectiva foi oriunda da Constituição Federal de 1988, por meio da atual visão de constitucionalização do Direito Civil. Adequando nossa legislação civil, a edição do Código Civil de 2002 apresentou três princípios para melhor aplicá-lo, ou seja, esta principiologia otimizou a aplicação do diploma civil adequando-o ao tempo e espaço atuais. Assim, verifica-se a importância para todo o nosso ordenamento o Direito Civil, o qual é desafiado todos os dias pela sociedade, haja vista seus novos arranjos e interesses em suas relações jurídicas. Referências BARROS, Flávio Augusto Monteiro de. Manual de direito civil. São Paulo: Método, 2005. BARROSO, Luís Roberto. Neoconstitucionalismo e constitucionalismo do direito. Revista Direito Administrativo, Rio de Janeiro, n. 240, p. 1-42, abr./jun. 2005. CARLI, Vilma Maria Inocêncio. Teoria e direitos das obrigações contratuais. Campinas: Bookseller, 2005. GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: parte geral. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 2006. GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: parte geral. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2006. GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil 1: parte geral, obrigações e contratos. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2015. 21 Introdução ao Estudo do Direito Civil Capítulo 1 LOBO, Paulo. Direito civil: parte geral. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2015. MAMEDE, Gladston. Direito empresarial brasileiro: teoria geral dos contratos. São Paulo: Atlas, 2010. MELO, Nehemias Domingos de. Lições de direito civil: teoria geral para concursos, exame da Ordem e graduação em direito. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2015. NALIN, Paulo. Do contrato: conceito pós-moderno em busca de sua formulação na perspectiva civil–constitucional. 1. ed. Curitiba: Juruá, 2004. NORONHA, Fernando. Direito das obrigações. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. POPP, Carlyle. Responsabilidade civil pré-negocial: o rompimento das tratativas. 1. ed. Curitiba: Juruá, 2003. 22 TEORIA GERAL DO DIREITO CIVIL CAPÍTULO 2 Das Pessoas A partir da perspectiva do saber fazer, neste capítulo você terá os seguintes objetivos de aprendizagem: � Definir e compreender a extensão do termo “pessoa” no ordenamento jurídico. � Identificar e distinguir a pessoa natural e jurídica. � Compreender os significados e a extensão da personalidade e da capacidade civil. � Conhecer as hipóteses de fim e início da personalidade civil. 24 TEORIA GERAL DO DIREITO CIVIL 25 Das Pessoas Capítulo 2 Contextualização Para que o Direito seja colocado em movimento, necessita de um sujeito para dar início à ação. Assim, temos sujeitos de direito e objetos de direito, um que realiza a ação e outro que sofre a ação; o que difere um dos outros são os contornos delineados pelo nosso ordenamento, conforme veremos a seguir. Consideração do Sujeito de Direito Para que a norma jurídica cumpra sua função de orientar a superação dos conflitos de interesses, é necessário que descreva os fatos e seus agentes responsáveis. Assim, a pessoa é o titular das relações jurídicas e põe em movimento o Direito. Nesse sentido, pessoa é espécie do gênero sujeito de direito ou sujeito da relação jurídica. Barros (2005, p. 57) compreende que “sujeito de direito é o ente referido pela norma jurídica como sendo o titular ou o possível titular de direitos e obrigações”. Venosa (2012, p. 137) entende que pessoa é “[...] o ser ao qual se atribuem direitos e obrigações”. A própria legislação não difere desse sentido, pois o Código Civil em seu artigo 1° determina: “Toda pessoa é capaz de direitos e deveres na ordem civil” (BRASIL, 2002). Se o sujeito de direito é a pessoa determinada no artigo 1º do Código Civil, então aqueles que ali não se encontram elencados não são pessoas. Diante desta consideração, podem-se identificar seres ou entidades que, ao olhar comum, poderiam ser classificados como sujeitos, mas nossa legislação até o momento os coloca em outro patamar de consideração, objetos de direitos e outros, inclusive, sem qualquer consideração, conforme seguem: • animais: o direito é constituído hominum causa (animais excluídos), mas há lei de proteção aos irracionais (crueldade, destruição, perseguição), fim social; • entidades metafísicas: nula a disposição nomeada alma ou santo para herdeiro ou legatário; 26 TEORIA GERAL DO DIREITO CIVIL • coisas ou bens: não há, deste modo, vínculo entre patrimônio. Nesse sentido, Venosa (2012, p. 138) afirma que “[...] os animais e os seres inanimados não podem ser sujeitos de direito. Serão, quando muito, objetos de direito”. Esse pensamento é majoritário no direito pátrio. Todavia, pensadores, filósofos e juristas têm buscado a superação do paradigma antropocêntrico, onde o sujeito de direito não é o único sujeito de interesses. Com o intuito de diversificar seu pensamento e buscar novas perspectivas na consideração dos sujeitos, recomenda-se a leitura de Peter Singer (SINGER, Peter. Ética prática. São Paulo: Martins Fontes, 1994) e Sônia T. Felipe (FELIPE, Sonia T. Por uma questão de princípios: alcance e limites da ética de Peter Singer em defesa dos animais. Florianópolis: Fundação Boiteux, 2003). Coelho (2006) conclui que os sujeitos de direito podem ser pessoas (personificadas) ou não (despersonificadas). No primeiro caso, ele recebe do direito uma autorização genérica para a prática dos atos e negócios jurídicos. A pessoa pode fazer tudo o que não está proibido. Já os sujeitos não personificados podem praticar apenas os atos inerentes à sua finalidade (se possuírem uma) ou para os quais estejam especificadamente autorizados. Assim, temos como exemplo dos primeiros, as pessoas jurídicas, que veremos mais adiante; e como exemplo da segunda, o espólio sucessório. Da Personalidade Personalidade jurídica é a aptidão genérica para adquirir direitos e contrair obrigações. Tanto a pessoa física quanto a jurídica são dotadas dessa personalidade. Acerca da definição de personalidade, Gagliano e Pamplona Filho (2006, p. 80) citam: [...] a personalidade jurídica tem por base a personalidade psíquica, somente no sentido de que, sem essa última não se poderia o homem ter elevado até a concepção da primeira, mas no conceito jurídico e o psicológico não se confundem. Certamente o indivíduo vê na sua personalidade jurídica a 27 Das Pessoas Capítulo 2 projeção de sua personalidadepsíquica, ou ainda, um outro campo em que ela se afirma, dilatando-se ou adquirindo novas qualidades. Todavia, na personalidade jurídica intervém um elemento, a ordem jurídica, do qual ela depende essencialmente, do qual recebe a existência, a forma, a extensão e a força ativa. Assim, a personalidade jurídica é mais do que um processo superior da atividade psíquica; é uma criação social, exigida pela necessidade de pôr em movimento o aparelho jurídico, e que, portanto, é modelada pela ordem jurídica. Personalidade jurídica, portanto, é a aptidão genérica para titularizar direitos e contrair obrigações; é o atributo necessário para ser sujeito de direito. A pessoa pode se subdividir em pessoa natural/física ou jurídica. Então, a seguir vamos discorrer sobre a pessoa natural, para após versar sobre a pessoa jurídica. Pessoa Natural A pessoa natural para nosso ordenamento jurídico é o ser humano, independente da sua condição física ou mental. Perante nosso direito, qualquer criatura humana que venha a nascer com vida será uma pessoa, sejam quais forem as anomalias e deformidades que apresente (GONÇALVES, 2006, p. 78). Início da Personalidade Para a consideração do início da personalidade jurídica, tem-se a análise das teorias Natalista e Concepcionista. A Teoria Natalista compreende como sujeito de direito aquele que nasceu com vida, onde tal processo se verifica por meio do ato de respirar, ou seja, ao ser retirado do ventre materno, o sujeito deve ter respirado. Tal verificação, quando há dúvida, é procedida por meio de exame denominado de docimásia hidrostática de Galeno, onde se verifica se os alvéolos foram inflados de ar e, portanto, a criança respirou e passou a ser considerada sujeito de direitos na ordem civil. Assim, o art. 2º do Código Civil traz que a personalidade emana do simples fato do nascimento com vida, sendo que a pessoa jurídica só se alcança a partir do registro do seu ato constitutivo (BRASIL, 2002). No entanto, na segunda parte do art. 2º do Código Civil, percebe-se que também são tutelados os direitos do nascituro, desde sua concepção, ou seja, estamos aqui falando da Teoria Concepcionista (BRASIL, 2002). 28 TEORIA GERAL DO DIREITO CIVIL Para a Teoria Concepcionista, o marco para consideração do sujeito de direito é a sua fecundação, ou seja, o momento em que há a junção dos gametas masculinos e femininos, quando surge o ser humano. Nessa consideração não se faz a distinção do ser fecundado em processo natural ou artificial. Para melhor esclarecer esta polêmica, o projeto de lei denominado Estatuto do Nascituro (PL 478/07), em seu artigo 2º, parágrafo único, afirma que o nascituro é inclusive o ser humano concebido in vitro ou produzido por meio de clonagem, e o artigo 3º prevê que a personalidade do nascituro está condicionada ao nascimento com vida (PLANALTO, 2007). Assim, enquanto alojado no útero materno, o sujeito de direito é chamado de nascituro e não tem personalidade jurídica plena, ou seja, só pode praticar os atos para os quais haja expressa previsão legal, por exemplo, receber bens em doação – CC, art. 542 (BRASIL, 2002). Venosa (2012) esclarece que o nascituro é um ente já concebido que se distingue de todo aquele que não foi ainda concebido e que poderá ser sujeito de direito no futuro, dependendo do nascimento, tratando-se de uma prole eventual. Essa situação nos remete à noção de direito eventual, isto é, um direito em mera situação de potencialidade, de formação, para quem nem ainda foi concebido. Assim, com a leitura da segunda parte do art. 2º do Código Civil, conclui-se que o nascituro, pela Teoria Concepcionista, só possui direitos determinados, ou seja, aqueles que forem indicados a este sujeito de direito em potencial (BRASIL, 2002). Há que se considerar que o dito nascituro indicado no ordenamento civil se refere ao sujeito fecundado no ventre materno e, ainda, a doutrina e a prática em julgados destaca que só se considera sujeito aquele que se encontra com vida humana em potencial, ou seja, após o processo de nidação, ou seja, a fixação do pré-embrião no ventre humano. Sobre o nascituro, que tal aprofundar seus conhecimentos com a leitura do artigo científico intitulado “A situação jurídica do nascituro: uma página a ser virada no direito brasileiro”, de autoria do doutrinador Flávio Tartuce? Disponível no seguinte endereço eletrônico: <https://goo.gl/vaDaQP>. 29 Das Pessoas Capítulo 2 Mas, se a morte (ausência de movimentos cerebrais) marca o fim da personalidade, o início da personalidade também deveria ter o marco dos primeiros movimentos cerebrais, ou seja, quando o córtex cerebral está formado? A doutrina pátria tem acatado a teoria concepcionista, delineando-a com o processo de nidação, sendo este sujeito de direito possuidor de personalidade condicionada, ou seja, a personalidade do sujeito está condicionada pelo nascimento com vida, mas seus direitos, inclusive de se desenvolver de forma sadia, estão protegidos pela ordem legal. O surgimento da vida humana e a sua consideração para alcançar a personalidade jurídica foram debatidos no STF nas Arguições de Descumprimento de Preceito Fundamental n. 54 e n. 442, onde foram abordadas as questões sobre os fetos anencéfalos e, recentemente, sobre a criminalização do aborto. Como visto até aqui, o sujeito de direito é aquele que em nosso ordenamento põe em movimento o Direito por meio de seus atos; estando sua personalidade condicionada ao nascimento com vida, mas a lei põe a salvo os direitos do nascituro, ou seja, aquele que ainda se encontra no ventre materno, apresentando a ele uma personalidade condicionada. Fim da Personalidade A personalidade inicia com o ato de respirar - nascimento com vida, e finda com a morte – morte encefálica – CC, art. 6° (BRASIL, 2002). A morte pode ser: • Real: é a que pressupõe a existência de um cadáver. É atestada pelo médico, ou na ausência deste, por duas testemunhas (LRP – 6.015/77, art. 77). Prevalece o entendimento de que a verdadeira morte é a cerebral do tipo encefálica, revelada pela ausência de impulsos cerebrais (art. 3°, §1°, da Lei nº 9.434/97 e Resolução CFM nº 1.480/97). 30 TEORIA GERAL DO DIREITO CIVIL • Presumida: ocorre quando, a despeito de o cadáver não ser encontrado, há um juízo de probabilidade acerca da sua ocorrência, apurada por meio do silogismo lógico. Verifica-se em duas hipóteses: a) se for extremamente provável a morte de quem estava em perigo de vida – CC, art. 7°, I; b) se desaparecido em campanha ou feito prisioneiro não for encontrado até dois anos após o término da guerra – CC, art. 7°, II. Assim, constata-se que na primeira hipótese não há um prazo definido na lei, haja vista que naquela situação a morte é provável e sua indicação é extrema; já na segunda hipótese a morte também é provável, mas devido às possibilidades de o sujeito ter sido feito prisioneiro, o legislador indicou o prazo de dois anos após o término da guerra. Tanto na primeira como na segunda hipótese, a morte terá que ser investigada, haja vista a importância em nosso ordenamento de o sujeito estar munido de personalidade jurídica. Assim, será necessário ingressar com ação judicial para ser prolatada sentença declaratória de morte presumida. Além das hipóteses do artigo 7º do Código Civil, temos ainda a morte presumida quando ocorre a ausência. Neste caso, não há o risco de vida e, por este motivo, a sua caracterização demanda maior tempo, conforme veremos a seguir. Ausência Conceitua Rodrigues (2002, p. 77) que “[...] a ausência é quando uma pessoa desaparece do seu domicílio sem que dela haja notícia, sem que haja deixado representante ou procurador e sem que ninguém lhe saiba o destino ou paradeiro”. A importância desse instituto reside principalmente na preocupação com relação aos bens do ausente: quem será o guardião, como se conservarão e qual a sua destinação.Assim, para que se considere alguém desaparecido será necessário que não haja qualquer notícia sua, bem como nenhum procedimento para se ausentar tenha sido tomado, dentre estes, movimentação bancária, organização de malas ou qualquer outro ato que denote o querer se ausentar. Determina o CC/02, art. 22, que para que seja decretada a ausência de uma pessoa é necessário que o desaparecido não tenha representante ou procurador cuidando de seus negócios e bens (BRASIL, 2002). 31 Das Pessoas Capítulo 2 Duas atitudes são possíveis em face da ausência: • Na possibilidade de o ausente estar vivo, se revela pela necessidade de lhe preservar os bens, tendo em vista a defesa de seu interesse; • No caso da possibilidade de o ausente ter falecido, visa atender ao interesse de seus herdeiros, que, por sua morte, teriam se tornado senhores de seu patrimônio. Por isso recomenda Rodrigues (2002, p. 78): “[...] quer esteja o ausente vivo, quer esteja morto, é importante considerar o interesse social de preservar seus bens, impedindo que se deteriorem, ou pereçam”. Gagliano e Pamplona Filho (2006, p. 127) lembram que “[...] o Código Civil de 2002 reconhece a ausência como morte presumida, em seu art. 6°, a partir do momento em que a lei autorizar a abertura da sucessão definitiva”. Na hipótese da morte presumida por ausência há necessidade de se proceder em três fases, da curadoria, da sucessão provisória e da sucessão definitiva. Curadoria Assim, desaparecendo uma pessoa do seu domicílio, sem que haja notícia, se não houver deixado representante ou procurador, a quem toque administrar-lhe os bens, o juiz, a requerimento de qualquer interessado, ou do Ministério Público, os arrecadará, nomeando curador para administrá-los (RODRIGUES, 2002). Conforme já visto, a ausência deve ser declarada pelo juiz, e o artigo 24 do Código Civil determina que o juiz, ao nomear o curador, fixará seus poderes e obrigações. A lei civil estabelece também a ordem legal para a nomeação do curador, iniciando pelo cônjuge (desde que não esteja separado judicialmente ou de fato por mais de dois anos), equiparando-se o companheiro (de acordo com a jurisprudência), depois pais e descendentes e, por último, qualquer outra pessoa, se não houver cônjuge ou parentes, desde que não haja impedimentos ou incompatibilidades (MELO, 2015). Gagliano e Pamplona Filho (2006) ressaltam que na mesma situação se enquadrará aquele que, tendo deixado mandatário, este último se encontre impossibilitado, física ou juridicamente, quando os poderes outorgados forem insuficientes ou simplesmente não tenha interesse em exercer o múnus. 32 TEORIA GERAL DO DIREITO CIVIL A lei não exige um prazo mínimo para a caracterização do desaparecimento. Neste caso, os familiares ou as pessoas mais próximas ao desaparecido é que vão identificar o desaparecimento da pessoa através dos seus hábitos. As providências de tentar localizar o desaparecido por parte de seus familiares podem auxiliar na configuração do desaparecimento. Será feita a arrecadação dos bens do ausente e empossado o curador. O juiz ordenará a publicação de editais durante um ano, reproduzidos de dois em dois meses, editais que convocam o ausente para retomar a posse do seu patrimônio. Esclarece Rodrigues (2002) que não acudindo o ausente ao fim do prazo de um ano, a partir da publicação do último edital, ou de três anos se houver deixado procurador, a probabilidade de que tenha efetivamente falecido aumenta, de sorte que a posição do legislador, que até agora só tinha em vista o interesse do desaparecido, de certo modo se altera, pois passa a considerar também o interesse dos sucessores do ausente, permitindo que requeiram a abertura da sucessão provisória. Sucessão Provisória Transcorrido um ano da arrecadação dos bens do ausente, a probabilidade de retorno deste reduz. Afinal, o seu desaparecimento não é recente e, mesmo sendo reiteradamente convidado a se apresentar, o ausente declinou de fazê-lo. Assim, convém que se comece a ter em vista não apenas o interesse do desaparecido, que provavelmente está morto, mas também o de terceiros, a saber, o de seu cônjuge, de seu companheiro, de seus herdeiros e de pessoas com quem ele eventualmente viesse mantendo relações negociais (ROGRIGUES, 2002). De acordo com a legislação civil brasileira, decorrido, portanto, um ano da arrecadação dos bens ou três anos, se o ausente deixou procurador, é permitido aos interessados requererem a abertura da sucessão provisória, como se o ausente fosse falecido – art. 26 do Código Civil e artigos 744 e 745 do NCPC. Inicialmente, a sucessão é provisória em vista de três fatos que podem alterar a situação jurídica dos sucessores: • Retorno do ausente. • Descoberta de que está vivo. • Descoberta da data exata da sua morte. 33 Das Pessoas Capítulo 2 Gagliano e Pamplona Filho (2006, p. 128) esclarecem que “[...] a ideia de provisoriedade da sucessão é uma cautela que se exige, ainda que se anteveja o provável falecimento real do ausente, uma vez que não se tem, realmente, ainda, certeza de tal fato. Assim, em face do longo desaparecimento é mais provável que o ausente esteja morto, a hipótese contrária não é, de qualquer maneira, desprezível, de modo que o legislador, embora defira aos interessados a possibilidade de pleitearem a abertura da sucessão provisória, encara como plausível o retorno do ausente; e, para deixar assegurados seus direitos, na hipótese de isso ocorrer, prescreve severas medidas, capazes de garantir a restituição de seus bens, em caso de regresso (RODRIGUES, 2002). Assim: • A sentença que determina a abertura da sucessão provisória só produzirá efeito seis meses depois de publicada pela imprensa. • Procede-se a partilha dos bens do ausente. Mas os herdeiros imitidos na posse darão garantias da sua restituição, mediante penhores e hipotecas, equivalentes aos quinhões respectivos. O Código Civil em seu art. 30, §2°, dispensa os ascendentes, os descendentes e o cônjuge da oferta de garantia para entrar na posse da herança. • É vedada a venda de bens imóveis do ausente, exceto em caso de desapropriação, ou então por ordem judicial para lhes evitar a ruína, ou, quando convenha, para convertê-los em títulos da dívida pública. • As rendas produzidas pelos bens do ausente pertencem, na sua totalidade, aos seus herdeiros, se se tratar de ascendentes, descendentes, cônjuges ou companheiro. Todavia, se a sucessão for deferida a outros herdeiros, estes só terão direito à metade da renda em questão. A outra metade deve ser poupada para ser entregue ao ausente, caso ele retorne. O art. 1.790 do CC disciplina a participação do companheiro na sucessão do outro. Cabe aqui ainda lembrar que recentemente o STF se posicionou pela aplicação do art. 1.829 para os companheiros em pé de igualdade com a sucessão dos casados civilmente. O procedimento da sucessão provisória é preparar os bens para a sucessão definitiva, e, desta forma, tem o efeito de imitir na posse dos bens os possíveis herdeiros do ausente. Finda a sucessão provisória, dar-se-á início à sucessão definitiva: 34 TEORIA GERAL DO DIREITO CIVIL • Quando houver certeza da morte do ausente. • Dez anos depois de passada em julgado a sentença de abertura da sucessão provisória. • Quando o ausente contar oitenta anos de idade e houverem decorridos cinco anos das últimas notícias suas. Dos procedimentos adotados nesta fase – sucessão provisória – verifica- se que ainda há uma expectativa de que o ausente possa retornar, pois seus bens estão sendo resguardados. Na próxima fase – sucessão definitiva – ver- se-á que a hipótese a ser considerada é que o ausente não irá retornar, pois há a transmissão de seus bens. Sucessão Definitiva Por mais que se queira preservar o patrimônio do ausente, o certo é que a existência de um longo lapso temporal, sem qualquersinal de vida, reforça as fundadas suspeitas do seu falecimento. Gagliano e Pamplona Filho (2006) ressaltam que se um herdeiro, imitido na posse durante a sucessão provisória, não requerer a sucessão definitiva, mesmo passado lapso temporal superior ao previsto em lei, teremos mera irregularidade, uma vez que, aberta a sucessão provisória, a definitiva é apenas transmudação da natureza da propriedade já transferida provisoriamente. Para Rodrigues (2002), pode-se dizer que tal sucessão é quase definitiva, pois a lei ainda admite a hipótese, agora remotíssima, de retorno do ausente. E ordena que, se o ausente reaparecer nos dez anos seguintes à abertura da sucessão definitiva, haverá ele só os bens existentes e no estado em que se encontrarem. Retorno do Ausente Se o retorno do ausente ocorrer antes, ou seja, durante o período da sucessão provisória, e ficar provado que o desaparecimento foi voluntário e injustificado, perderá ele, em favor dos sucessores, sua parte nos frutos e rendimentos – CC/02, art. 33, parágrafo único. Nesta mesma fase, por outro lado, cessarão imediatamente as vantagens dos sucessores imitidos na posse provisória, e terão de restituí-las ao que se encontrava desaparecido, bem como tomar as medidas assecuratórias precisas, até a entrega dos bens a este – CC/02, art. 36. 35 Das Pessoas Capítulo 2 Se a sucessão, todavia, já for definitiva, terá o ausente direito aos seus bens, se ainda incólumes, não respondendo os sucessores pela sua integridade. Retornando o ausente no período da curadoria dos seus bens, esta cessará automaticamente, recuperando ele todos os seus bens. Há que lembrar que uma das hipóteses de dissolução do casamento é por meio da morte. Assim, será dissolvido o casamento pela consideração da morte do ausente. No entanto, se este retornar, a relação de conjugalidade será retomada tal qual antes de sua declaração de morte presumida – dissolução da sociedade conjugal – CC, art. 1.571, §1°. Além das hipóteses de morte presumida, na ordem civil a morte pode se apresentar por meio da comoriência. Sua ocorrência influencia diretamente nas questões da ordem vocacional da sucessão, pois é a morte de duas ou mais pessoas, na mesma ocasião, sendo elas herdeiras entre si. Por exemplo: Maria e João, casados entre si, falecem ao mesmo tempo. Maria tem somente, dentre os membros familiares vivos, sua irmã, e João seu primo. Nesse caso, Maria deixa a metade que lhe cabe no patrimônio do casal para sua irmã e João deixa sua metade ao seu primo. Como verificamos, a personalidade é um dos institutos mais importantes do nosso sistema, pois é a partir dessa aptidão genérica que o sujeito de direito passa a titularizar direitos e obrigações e, consequentemente, seu início e fim demanda de tanta importância. Direitos da Personalidade Personalidade jurídica é a aptidão genérica para adquirir direitos e contrair obrigações, tanto a pessoa física quanto a jurídica são dotadas dessa personalidade. Diniz (1999, p. 118) conceitua direitos da personalidade como “[...] direitos comuns da existência, porque são simples permissões dadas pela norma jurídica, a cada pessoa, de defender um bem que a natureza lhe deu, de maneira primordial e direta”. Nesse sentido, esclarece Rodrigues (2002) que dentre os direitos subjetivos de que o homem é titular pode-se facilmente distinguir duas espécies diferentes, a saber: uns que são destacáveis da pessoa de seu titular e outros que não o são. Assim, por exemplo, a propriedade ou o crédito contra um devedor constituem direito destacável da pessoa de seu titular; ao contrário, outros direitos há, que 36 TEORIA GERAL DO DIREITO CIVIL são inerentes à pessoa humana e, portanto, a ela ligados de maneira perpétua e permanente, não se podendo mesmo conceber um indivíduo que não tenha direito à vida, à liberdade física ou intelectual, ao seu nome, ao seu corpo, à sua imagem e àquilo que ele crê ser sua honra. Estes são os chamados direitos da personalidade. Gagliano e Pamplona Filho (2006, p. 136) falam da natureza dos direitos da personalidade afirmando que “[...] o direito existe para que a pessoa, em meio à vida social, seja aquinhoada segundo a justiça com os bens necessários à consecução dos seus fins naturais”. Venosa (2012) esclarece que há direitos denominados personalíssimos porque incidem sobre bens imateriais e incorpóreos, a exemplo os direitos à própria vida, à liberdade, à manifestação do pensamento. São direitos privados fundamentais, que devem ser respeitados como conteúdo mínimo para permitir a existência e a convivência dos seres humanos. Assim, com o advento do art. 5°, inciso X, da Constituição Federal de 1988, um grande passo foi tomado para a proteção dos direitos da personalidade: “X – são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurando o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrer de sua violação” (BRASIL, 1988). Acerca dos fundamentos jurídicos desses direitos, dois grupos bem distintos se posicionam: • A corrente positivista – toma por base a ideia de que os direitos da personalidade devem ser somente aqueles reconhecidos pelo Estado, que lhes daria força jurídica. Não aceitam, portanto, a existência de direitos inatos à condição humana (GAGLIANO; PAMPLONA FILHO, 2006). • A corrente jusnaturalista – destaca que os direitos da personalidade correspondem às faculdades exercidas naturalmente pelo homem, verdadeiros atributos inerentes à condição humana. Os defensores dessa corrente têm propugnado que, por se tratar de direitos inatos, caberia ao Estado apenas reconhecê-los e sancioná-los em um ou outro plano do direito positivo – em nível de legislação ordinária –, dotando-os de proteção própria, conforme o tipo de relacionamento a que se volte, a saber: contra o arbítrio do poder público ou as incursões de particulares. 37 Das Pessoas Capítulo 2 Gagliano e Pamplona Filho (2006) ressaltam que, independentemente da linha adotada, o importante é compreender que a dimensão cultural do Direito, como criação do homem para o homem, deve sempre conservar um conteúdo mínimo de atributos que preservem essa própria condição humana como um valor a ser tutelado. Sobre as características dos direitos da personalidade, o Código Civil, em seu art. 11, indica que os direitos da personalidade são intransmissíveis e irrenunciáveis, não podendo o seu exercício sofrer limitação voluntária. Todavia, Venosa (2012, p. 176-177) apresenta outras características, pela circunstância de estarem intimamente ligados à pessoa humana: a) São inatos ou originários porque se adquirem ao nascer, independendo de qualquer vontade; b) São vitalícios, perenes ou perpétuos, porque perduram por toda a vida. Alguns se refletem até mesmo após a morte da pessoa. Pela mesma razão são imprescritíveis porque perduram enquanto perdurar a personalidade, isto é, a vida humana. Na verdade, transcendem a própria vida, pois são protegidos também após o falecimento; c) São inalienáveis, ou, mais propriamente, relativamente indisponíveis, porque, em princípio, estão fora do comércio e não possuem valor econômico imediato. Esta expressão também abarca a característica da irrenunciabilidade que traduz a ideia de que os direitos personalíssimos não podem ser abdicados. Ninguém deve dispor de sua vida, da sua intimidade, da sua imagem, por razões de ordem pública que impõem o reconhecimento dessa característica. Abrange igualmente a intransmissibilidade, em que não se admite a cessão do direito de um sujeito para outro; d) São absolutos, no sentido de que podem ser opostos erga omnes. Os direitos da personalidade são, portanto, direitos subjetivos de natureza privada. Irradiam efeitos em todos os campos, impondo à coletividade o dever de respeitá-los. Assim, ninguém pode, por ato voluntário, dispor da sua privacidade, renunciar à liberdade,ceder seu nome de registro para utilização por outrem, renunciar ao direito de pedir alimentos no campo de família. Gagliano e Pamplona Filho (2006, p. 144) incluem ainda as seguintes características: Gerais – a noção de generalidade significa que os direitos da personalidade são outorgados a todas as pessoas, simplesmente pelo fato de existirem; 38 TEORIA GERAL DO DIREITO CIVIL Extrapatrimoniais – uma das características mais evidentes dos direitos puros da personalidade é a ausência de um conteúdo patrimonial direto, aferível objetivamente, ainda que sua lesão gere efeitos econômicos. Venosa (2012, p. 178) esclarece que: Na busca de audiência e sensacionalismo, já vimos exemplos de programas televisivos nos quais autorizam que seu comportamento seja monitorado e divulgado permanentemente; que sua liberdade seja cerceada e sua integridade física seja colocada em situação de extremo limite de resistência, etc. Ora, não resta dúvida de que, nesses casos, os envolvidos renunciam negocialmente a direitos em tese irrenunciáveis. A situação retratada é meramente contratual, nada tendo a ver com cessão de direitos da personalidade, tal como é conceituado. Cuida-se de uma representação cênica, teatral ou artística, nada mais que isso. O rol acima indicado das características é meramente exemplificativo, pois o Direito está sempre em movimento e o exercício da personalidade igualmente. Assim, podem surgir outras características que a doutrina e até mesmo os novos contornos do Direito possam apresentar. Proteção dos Direitos da Personalidade Reza o Código Civil no art. 12, que “Pode-se exigir que cesse a ameaça, ou a lesão, a direito da personalidade, e reclamar perdas e danos, sem prejuízo de outras sanções previstas em lei” (BRASIL, 2002). Para que a ameaça cesse, o lesionado deve ingressar com medida judicial, inclusive pleiteando medida de tutela antecipada para que se interrompa o ato lesivo. Podemos classificar esses direitos como: a) Direito à disposição do próprio corpo O princípio geral é no sentido de que ninguém pode ser constrangido à invasão do seu corpo contra sua vontade. Quanto aos atos de disposição do próprio corpo, há limites morais e éticos que são recepcionados pelo direito – CC/02, art. 13. Esclarece Gonçalves (2006) que o direito à integridade física compreende a proteção jurídica à vida, ao próprio corpo vivo ou morto, quer na sua totalidade, 39 Das Pessoas Capítulo 2 quer em relação a tecidos, órgãos e partes suscetíveis de separação e individualização, quer ainda ao direito de alguém submeter-se ou não a exame e tratamento médico. A proteção jurídica da vida humana e da integridade física tem como objetivo primordial a preservação desses bens jurídicos, que são protegidos pela Constituição Federal (art. 1°, III, e 5°, III), pelo Código Civil (arts. 12 a 15, 186 e 948 a 951) e pelo Código Penal, que pune, nos arts. 121 a 128, quatro tipos de crimes contra a vida (homicídio, induzimento, instigação ou auxílio a suicídio, infanticídio e aborto), e, no art. 129, o crime de lesões corporais. A Lei nº 9.434, de 4 de fevereiro de 1997, dispõe sobre a remoção de órgãos, tecidos e partes do corpo humano para fins de transplantes e tratamento. Lembrando que esse diploma especifica que não estão compreendidos em seu âmbito, entre os tecidos, o sangue, o esperma e o óvulo, pois são em tese renováveis no corpo humano. b) Direito ao nome O nome representa um direito inerente à pessoa humana, portanto, é um direito da personalidade. O nome do indivíduo é seu fator de individualização na sociedade, integrando sua personalidade e indicando, de maneira geral, sua procedência familiar. Ele se decompõe em duas partes, o patronímico familiar, que representa uma herança que se transmite de pai para filho, ou é adquirido por um dos cônjuges pelo casamento, e o prenome, que é atribuído à pessoa por ocasião da abertura do seu assento de nascimento. Venosa (2012) ressalta que dentro do meio artístico o nome é um patrimônio, protegido pela Lei nº 9.610/98, que no art. 12 autoriza que em toda divulgação de obra literária, artística ou científica, legalmente protegida no país, seja indicado, ainda que abreviadamente, o nome ou pseudônimo do autor ou autores, salvo convenção em contrário das partes. Determina o Código Civil, art. 16, que “Toda pessoa tem direito ao nome, nele compreendido o prenome e o sobrenome” (BRASIL, 2002). Como medida de exceção, a legislação prevê algumas hipóteses em que é possível a alteração do nome, a saber: 40 TEORIA GERAL DO DIREITO CIVIL • Vontade do titular No primeiro ano seguinte ao da maioridade civil, o prenome pode ser alterado, livremente, por qualquer outro do agrado do interessado, mas o sobrenome deve ser preservado. Admite-se, porém, o acréscimo de expressões componentes do sobrenome de antecedentes remotos, como avós, bisavós etc. – art. 56, LRP. Cabe esclarecer aqui que na Lei de Registros Públicos (Lei nº 6.015/73) não há previsão de justificativa para esta autorização; todavia, o Código de Normas da Corregedoria do Tribunal de Justiça de Santa Catarina prevê que tal alteração deva estar justificada. Nesse sentido, Gagliano e Pamplona Filho (2006) ressaltam que não é qualquer melindre ou capricho pessoal que autoriza a modificação desse sinal tão importante do ser humano. Veja: – Decisão judicial que reconheça motivo justificável para a alteração – a exemplo, os casos de pessoas que alteram cirurgicamente o sexo, devido a distúrbio psíquico ou fisiológico, têm o direito a prenome compatível com a aparência sexual que passam a ostentar; igualmente nas questões que venham a expor ao ridículo o indivíduo; casos de homônimos e que venham a causar danos ao indivíduo. – Substituição do prenome por apelido notório – admite a lei, também, quando útil aos interesses das pessoas, a substituição do prenome pelo apelido notório, ou mesmo o seu acréscimo – Lei nº 6.015/73, art. 58. – Substituição do prenome de testemunha de crime – para evitar alguma vingança que o condenado possa vir a praticar contra ela. – Adição ao nome do sobrenome do cônjuge – a pessoa pode mudar o nome através do casamento, agregando-lhe o sobrenome do cônjuge – CC/02, art. 1.565, §1°. – Adoção – o adotado passa a ter, no nome, o sobrenome do adotante em substituição ao que ostentava anteriormente – §5◦ do artigo 47 do Estatuto da Criança e do Adolescente – Lei nº 8.069/90. – Erro de grafia – no caso de erros de grafia, a correção pode ser feita a qualquer momento – Lei nº 6.015/73, art. 110. 41 Das Pessoas Capítulo 2 – Multiparentalidade – recentemente, o STF se posicionou favorável à alteração do nome em virtude da multiparentalidade. c) Direito à imagem A exposição ou a utilização da imagem de uma pessoa, o art. 5°, X, da Constituição Federal, considera um direito inviolável. A reprodução da imagem é emanação da própria pessoa e somente ela pode autorizá-la. Prevê ainda, o art. 5°, inciso XXVIII, letra “a”, da Constituição Federal, a proteção à transmissão da palavra abrange a tutela da voz, que é a emanação natural de som da pessoa. d) Direito à intimidade O uso do nome, da palavra, da imagem é um direito da personalidade, e a lei deve buscar um meio de protegê-los, pois lhe cabe proteger tudo que diz respeito à intimidade das pessoas. A proteção à vida privada visa resguardar o direito das pessoas de intromissões indevidas em seu lar, em sua família, em sua correspondência, em sua economia etc. Lembra Sílvio Rodrigues (2002, p. 74) que “[...] hoje o aparelho fotográfico, munido de teleobjetiva, pode invadir a intimidade de alguém”. Na atualidade, além dos aparelhos fotográficos comuns, deve-se despertar atenção aos aparelhos de drones e sua regulamentação, pois em virtude de seu alcance, podem invadir espaços urbanos junto aos arranha-céus. O Código Civil de 2002apresenta o rol acima de forma exemplificativa, é importante lembrar que a personalidade é a extensão do sujeito em sociedade e, portanto, não se deve limitá-lo somente aos preceitos da ordem civil, vai muito mais além, emana dos preceitos constitucionais. Da Capacidade Adquirida a personalidade jurídica, toda pessoa passa a ser capaz de direitos e obrigações. De acordo com Venosa (2012), a capacidade jurídica dá a extensão da personalidade, pois, à medida que nos aprofundarmos nos conceitos, veremos que pode haver capacidade relativa a certos atos da vida civil, enquanto a personalidade é terminologia genérica. Assim, distingue-se a capacidade de direito ou jurídica, aquela que gera a aptidão para exercer direitos e contrair obrigações, da capacidade de fato, que é a aptidão “pessoal” para praticar atos com efeitos jurídicos. 42 TEORIA GERAL DO DIREITO CIVIL Exemplo: homem maior de 18 anos entre nós, na plenitude de sua capacidade mental, tem ambas as capacidades, a de direito e a de fato, pode ser sujeito de direito, podendo praticar pessoalmente atos da vida civil; já o alienado mental, interditado por decisão judicial, não deixa de ter personalidade, como ser humano que é, possuindo capacidade jurídica, podendo figurar como sujeito de direito, porém necessita de que alguém, por ele, exercite a capacidade de fato que não possui, por lhe faltar o devido discernimento. Seus atos da vida civil são praticados por curador. As modalidades de capacidade são as seguintes: a) Capacidade de gozo (ou de direito) – essa espécie de capacidade é reconhecida a todo o ser humano, sem qualquer distinção. Estende-se aos privados de discernimento e aos infantes em geral, independentemente do seu grau de desenvolvimento mental. Ninguém pode dela ser privado pelo ordenamento jurídico. Ex.: direito a honra; a ser proprietário. b) Capacidade de exercício (ou de fato) – simples aptidão para exercitar, por si só, os atos da vida civil, direitos. Pode ser retirada ou restringida (incapacidade). Exercício de direito pressupõe: consciência e vontade. Ex.: praticar negócios jurídicos, locação, compra e venda etc. c) Legitimação – pode haver capacidade de gozo, mas a pessoa pode estar impedida de praticar determinado ato jurídico em virtude da sua posição especial em relação a certas pessoas, bens ou interesses. Ex.: venda de ascendente a descendente – CC, art. 496. Para melhor esclarecer, os doutrinadores Gagliano e Pamplona Filho (2006, p. 88) lecionam: A capacidade de direitos confunde-se, hoje, com a personalidade, porque toda pessoa é capaz de direitos. Ninguém pode ser totalmente privado dessa espécie de capacidade. A capacidade de fato condiciona-se à capacidade de direito. Não se pode exercer um direito sem ser capaz de adquiri-lo. Uma não se concebe, portanto, sem a outra. Mas a recíproca não é verdadeira. Pode-se ter capacidade de direito, sem capacidade de fato; adquirir o direito e não pode exercê- lo por si. A impossibilidade do exercício é, tecnicamente, incapacidade. Assim, a capacidade civil é o instrumento para que o sujeito possa realizar seus direitos e obrigações, o que poderá fazê-lo por si só ou por meio de outrem, conforme iremos discorrer. 43 Das Pessoas Capítulo 2 Incapacidade Incapacidade é a restrição legal ao exercício dos atos da vida civil, imposta pela lei somente aos que, excepcionalmente, necessitam de proteção, pois a capacidade é a regra. a) Incapacidade absoluta A incapacidade absoluta acarreta a proibição total do exercício, por si só, do direito. O ato somente poderá ser praticado pelo representante legal do absolutamente incapaz. A inobservância dessa regra provoca a nulidade do ato – CC, art. 166, I. O art. 3° do CC/02 avença uma hipótese de incapacidade absoluta: “São absolutamente incapazes de exercer pessoalmente os atos da vida civil os menores de 16 (dezesseis) anos” (BRASIL, 2002). Ressalta Rodrigues (2002, p. 40) que: “[...] se o negócio jurídico é ato de vontade humana a que a lei empresta consequências, e se a lei despreza a vontade do absolutamente incapaz, é evidente que este não pode, pessoalmente, ser a mola criadora de um ato jurídico. b) Incapacidade relativa As pessoas mencionadas neste preceito legal já têm razoável discernimento, não ficam afastadas da atividade jurídica, podendo praticar determinados atos por si só. Estes, porém, constituem exceções, pois elas devem estar assistidas por seus representantes para a prática dos atos em geral, sob pena de anulabilidade. Estão em uma situação intermediária entre a capacidade plena e a incapacidade total. O art. 4° do CC/02 disciplina as hipóteses de incapacidade relativa, elencando: Para os maiores de dezesseis e menores de dezoito anos o ordenamento jurídico não mais despreza a sua vontade. Ao contrário, a considera, atribuindo ao ato praticado pelo relativamente incapaz todos os efeitos jurídicos, desde que esteja assistido por seu representante. 44 TEORIA GERAL DO DIREITO CIVIL Ressalva o CC, art. 180, que o menor entre dezesseis e dezoito anos não pode, para eximir-se de uma obrigação, invocar a sua idade se dolosamente a ocultou quando inquirido pela outra parte, ou se, no ato de obrigar-se, declarou-se maior. Art. 4o São incapazes, relativamente a certos atos ou à maneira de os exercer: I - os maiores de dezesseis e menores de dezoito anos; II - os ébrios habituais e os viciados em tóxico; III - aqueles que, por causa transitória ou permanente, não puderem exprimir sua vontade; IV - os pródigos. Parágrafo único. A capacidade dos indígenas será regulada por legislação especial. Ébrios habituais, viciados em tóxicos – valendo-se de subsídios recentes da ciência médico-psiquiátrica, incluiu os ébrios habituais, os toxicômanos no rol dos relativamente incapazes. Pródigos – pródigo é o indivíduo que dissipa o seu patrimônio desvairadamente. Trata-se de um desvio da personalidade, comumente ligado à prática do jogo ou compulsão, e não, propriamente, de um estado de alienação mental. “Tal hipótese tem origem no Direito Romano, que considerando o patrimônio individual uma copropriedade da família, capitulava como prejudicial ao interesse do grupo familiar a dilapidação da fortuna” (GAGLIANO; PAMPLONA FILHO, 2006, p. 98). De um modo geral, há que se destacar que as alterações trazidas pelo Estatuto da Pessoa com Deficiência deixaram uma lacuna na incapacidade absoluta, que se preenche por meio do grau da limitação a ser identificada no sujeito. Assim, qualquer doença mental deverá ser diagnosticada por meio de laudo médico e o juízo deverá delinear os atos que podem ou não ser praticados por si só pelo sujeito. Breve Explanação Sobre os Silvícolas O Código Civil de 1916 disciplinava a matéria sobre os índios considerando- os relativamente incapazes. O atual Código Civil, no parágrafo único do art. 4°, determina que a capacidade dos índios será regulada por legislação especial. 45 Das Pessoas Capítulo 2 Assim, determina a Lei nº 6.001, de 19 de dezembro de 1973 - Estatuto do Índio (BRASIL, 1973) que o indígena, em princípio, é agente absolutamente incapaz, reputando nulos os atos por ele praticados sem a devida representação. Art. 9º Qualquer índio poderá requerer ao Juiz competente a sua liberação do regime tutelar previsto nesta Lei, investindo- se na plenitude da capacidade civil, desde que preencha os requisitos seguintes: I - idade mínima de 21 anos; II - conhecimento da língua portuguesa; III - habilitação para o exercício de atividade útil, na comunhão nacional; IV - razoável compreensão dos usos e costumes da comunhão nacional. Parágrafo único. O Juiz decidirá após instrução sumária, ouvidos o órgão de assistência ao índio e o Ministério Público, transcrita a sentença concessiva no registro civil. Art. 10. Satisfeitos os requisitos do artigo anterior e a pedido escrito do interessado, o órgão de assistênciapoderá reconhecer ao índio, mediante declaração formal, a condição de integrado, cessando toda restrição à capacidade, desde que, homologado judicialmente o ato, seja inscrito no registro civil. Assim, a situação jurídica dos indígenas está retratada em lei própria para melhor atender as suas necessidades, haja vista a sua situação tutelar. Suprimento da Incapacidade O suprimento da incapacidade absoluta dá-se através da representação. Os menores de dezesseis anos são representados por seus pais ou tutores, e os enfermos ou deficientes mentais, privados de discernimento, além das pessoas impedidas de manifestar sua vontade, mesmo que por causa transitória, por seus curadores. Já o suprimento da incapacidade relativa dá-se por meio da assistência. Diferentemente dos absolutamente incapazes, nessa hipótese, os relativamente incapazes praticam os atos jurídicos conjuntamente com o seu assistente. 46 TEORIA GERAL DO DIREITO CIVIL Cessação da Incapacidade Cessa a incapacidade desaparecendo os motivos que a ensejaram. Nos casos de enfermidade físico-psíquica, cessa quando da sua ausência. Quando a causa é a menoridade, desaparece pela maioridade e pela emancipação – CC, art. 5°. a) Emancipação É a aquisição da capacidade civil antes da idade legal. Tartuce (2015, p. 140) conceitua emancipação da seguinte forma: “Ato jurídico que antecipa os efeitos da aquisição da maioridade, e da consequente capacidade civil plena, para data anterior àquela em que o menor atinge a idade de 18 anos, para fins civis”. O Enunciado n. 530, aprovado na VI Jornada de Direito Civil de 2013, prevê que “A emancipação por si só, não elide a incidência do Estatuto da Criança e do Adolescente” (BRASIL, 2013). Assim, é possível a antecipação da capacidade plena, em virtude da autorização dos representantes legais do menor ou do juiz, ou pela superveniência de fato a que a lei atribui força para tanto. A emancipação poderá ser: • Emancipação voluntária – é a concedida pelos pais, se o menor tiver dezesseis anos completos, mediante instrumento público, independentemente de homologação judicial – CC, art. 5°, parágrafo único, I. Nesta hipótese, há que se verificar que o ato foi realizado no interesse do adolescente, em sendo identificado interesses escusos por parte dos responsáveis legais poderá ser anulada. • Emancipação judicial – é aquela concedida pelo juiz, ouvido o tutor, se o menor contar com dezesseis anos completos – CC, art. 5°, parágrafo único, I, segunda parte; • Emancipação legal – decorre de determinados acontecimentos a que a lei atribui esse efeito, quais sejam: – Casamento – casamento válido produz o efeito de emancipar o menor – CC, art. 5°, parágrafo único, II. A idade mínima para o casamento do homem e da mulher é dezesseis anos, com autorização dos representantes legais – CC, art. 1.517. Excepcionalmente será permitido o casamento de quem não alcançou a idade núbil, mediante suprimento 47 Das Pessoas Capítulo 2 judicial de idade, para evitar imposição ou cumprimento de pena criminal ou em caso de gravidez – CC, art. 1520. Aqui cabe destacar que a Lei nº 11.160/05 revogou os incisos VII e VII do artigo 107 do Código Penal, que previam a hipótese de casamento para extinção da punibilidade nos casos de estupro. Ocorre, que referida legislação revogou somente os artigos do Código Penal, não alterando o artigo 1.520 do Código Civil. Assim, este artigo não se encontra revogado, mas obsoleto. – Exercício de emprego público efetivo – se o menor após aprovação em concurso público é nomeado para cargo ou função efetiva – CC, art. 5°, parágrafo único, III. – Colação de grau em curso superior – se um menor precoce ou superdotado chegar à universidade e concluí-la antes do tempo da generalidade dos jovens de sua geração – CC, art. 5°, parágrafo único, IV. Na atualidade, estas duas últimas hipóteses se tornaram obsoletas, haja vista as limitações do MEC e nos editais de concursos. Assim, excepcionalmente poderá ocorrer que um adolescente de 16 anos completos possa ingressar em atividade pública ou na universidade. – Estabelecimento civil ou comercial – se o menor se estabelecer como explorador de atividade econômica, civil ou comercial – CC, art. 5°, parágrafo único, V. Tal emancipação se condiciona a idade mínima de dezesseis anos e a obtenção de economia própria, ou seja, ganhos independem de ato de seus pais. Coelho (2006, p. 169) observa que “[...] tendo demonstrado aptidão para montar e gerir um negócio, já revela o menor estar pronto para cuidar diretamente de seus bens e interesses”. – Relação de emprego – a emancipação do menor empregado está sujeita às mesmas condições da hipótese do estabelecimento civil ou comercial. Venosa (2012) ressalta que a simples relação de emprego ou estabelecimento próprio não será suficiente para o status, pois estaria a permitir fraudes. Discutível e apurável será no caso concreto a existência de economia própria, isto é, recursos próprios de sobrevivência e manutenção. Esse status poderá gerar dúvidas a terceiros e poderá ser necessária sentença judicial que declare a maioridade do interessado nesse caso. 48 TEORIA GERAL DO DIREITO CIVIL Assim, nosso ordenamento civil apresenta as hipóteses em que a incapacidade civil poderá cessar, gerando a antecipação da capacidade civil, fato este que desencadeará ao sujeito a realização de todos os atos da vida civil por si só. Das Pessoas Jurídicas Retomando nossa conversa sobre as pessoas inseridas no artigo 1º do Código Civil, a pessoa jurídica é tida como sujeito de direito em nosso ordenamento e, assim, detentora de personalidade jurídica, conforme veremos. Melo (2015, p. 81) define como: São entidades a quem a lei empresta personalidade, isto é, seres que atuam na vida jurídica, com personalidade própria, diversa da dos indivíduos que as compõem, capazes de serem sujeitos de direitos e obrigações na ordem civil. Para Venosa (2012, p. 229), “As pessoas jurídicas surgem, portanto, ora como conjunto de pessoas, ora como destinação patrimonial, com aptidão para adquirir direitos e contrair obrigações”. Gagliano e Pamplona Filho (2006, p. 182) conceituam pessoa jurídica como “[...] sendo o grupo humano, criado na forma da lei, e dotado de personalidade jurídica própria, para a realização de fins comuns”. Rodrigues (2002) entende que as pessoas jurídicas, portanto, são entidades a que a lei empresta personalidade, isto é, são seres que atuam na vida jurídica, com personalidade diversa da dos indivíduos que as compõem, capazes de serem sujeitos de direitos e obrigações na ordem civil. Tartuce (2015, p. 231) disserta que “[...] são pessoas coletivas, morais, fictícias ou abstratas, que são conceituadas como sendo conjuntos de pessoas ou de bens arrecadados, que adquirem personalidade jurídica própria por uma ficção legal”. Assim, a pessoa jurídica se apresenta como o agrupamento de pessoas naturais ou jurídicas, visando alcançar fins de interesse comum, criações conceituais destinadas a melhor disciplinar os interesses dos humanos. Exemplos: associações, sociedades, fundações e outros entes artificiais. 49 Das Pessoas Capítulo 2 Natureza Jurídica 1ª Teoria – Da ficção Sustentada por: Savigny, Ihering, Sareilles e Sommiéres. Características: • Pessoa jurídica é imaginária, sem qualquer realidade, sem objetividade, constituindo-se em mera forma especial da apresentação das relações jurídicas (Ihering). É criação legal, artificial, cuja existência só encontra explicação como ficção da lei (Savigny) ou da doutrina (Sareilles – Sommiéres). • Sujeito de direito – homem. • Natureza jurídica da pessoa jurídica, sua personalidade não mais residiria na própria pessoa jurídica, mas nos indivíduos que a compõem (Ihering). Críticas: • Del Vecchio – sendo o Estado pessoa jurídica e considerando que a lei emana do Estado, seriam os dois (Estado
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