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Bioquímica Aplicada à Enfermagem Responsável pelo Conteúdo: Prof. Me. Fabrício Ribeiro de Campos Revisão Textual: Prof.ª Esp. Kelciane da Rocha Campos Metabolismo das Proteínas e Lipídios Metabolismo das Proteínas e Lipídios • Conhecer o metabolismo das proteínas e a formação de seu substrato (ureia); • Conhecer o metabolismo dos lipídeos, seus produtos da oxidação e o perfil lipídico. OBJETIVOS DE APRENDIZADO • Metabolismo dos Lipídios; • Degradação dos Lipídios; • Síntese de Ácidos Graxos; • Metabolismo das Proteínas; • Degradação de Proteínas; • Síntese de Aminoácidos; • Dosagem Laboratorial de Proteínas Totais. UNIDADE Metabolismo das Proteínas e Lipídios Metabolismo dos Lipídios Quando comemos algum alimento gorduroso em nossa dieta, este será consumido ou ar- mazenado? Onde começa o processo de digestão desta molécula? Responderemos a estas questões nesta unidade, através do estudo do metabolismo dos lipídios. As gorduras da dieta são predominantemente representadas por triacilgliceróis, degradadas pela enzima lipase pancreática e absorvidas pelo intestino delgado. Em seguida, são transportadas pelas lipoproteínas plasmáticas para armazenamento ou utilização. A ação da lipase é facilitada pela bile, que age emulsificando as gorduras logo nas primeiras porções do intestino. A oxidação destes compostos, os triacilgliceróis, representa um rendimento ener- gético maior que os carboidratos (triacilgliceróis 9 kcal/g e carboidratos 4 kcal/g). Os triacilgliceróis são armazenados nas células adiposas (Figura 1). Figura 1 – Células do tecido adiposo (micrografia e ilustração 3D) Fonte: Getty Images Degradação dos Lipídios O consumo diário médio de lipídios é de 70 a 100 g e a maior parte se encontra sob a forma de triacilgliceróis. A digestão dos triacilgliceróis acontece principalmente no intestino delgado, onde a enzima lipase pancreática quebra as ligações dos áci- dos graxos ao glicerol, resultando em dois ácidos graxos livres e um monoglicerídeo (Figura 2). 8 9 Figura 2 – Degradação do triacilglicerol pela lipase pancreática Fonte: Wikimedia Commons Como os lipídios são insolúveis em água, no intestino delgado ocorre a emulsifi- cação, através da ruptura mecânica de gotículas de lipídios em partículas menores pela contração intestinal e ação de um agente emulsificante, os sais biliares secre- tados juntamente com a bile. Na Figura 3, podemos observar o local onde a bile é secretada. A bile é produzida pelo fígado (4), armazenada e concentrada na vesícula biliar (5) e posteriormente secretada na primeira porção do intestino delgado (6). Neste processo, o glicerol será absorvido pelos vasos linfáticos e levado ao fígado e o 2–monoacilglicerol e os ácidos graxos livres serão liberados na luz intestinal e, posteriormente, quando absorvidos pelas células da parede intestinal, voltam a for- mar triacilgliceróis, que se unem a proteínas, formando os Quilomícrons, que serão transportados pelos vasos linfáticos. 3 21 4 5 6 7 8 Figura 3 – Órgãos associados à secreção da bile Fonte: Wikimedia Commons 9 UNIDADE Metabolismo das Proteínas e Lipídios A emulsificação acelera a digestão, porém esta seria muito lenta se não houvesse uma segunda ação dos sais biliares: a formação de micelas. Estas micelas são com- postas por sais biliares, ácidos graxos, monoglicerídeos e fosfolipídios agrupados com as extremidades polares para a superfície e as apolares no centro da molécula, onde se encontram vitaminas lipossolúveis e colesterol. Em seguida, as micelas sofrem degradação, o seu conteúdo difunde-se através das membranas das células epiteliais intestinais. Os ácidos graxos e os monoacilgliceróis são ressintetizados em triacilgliceróis no retículo endoplasmático liso, formando go- tículas revestidas de proteínas. Ao deixar as células, estas gotículas são conhecidas como quilomícrons, contendo não só triacilgliceróis, mas também outros lipídios. Os quilomícrons vão para os vasos linfáticos e da corrente sanguínea até os tecidos. No capilar sanguíneo, a enzima lipase lipoproteica libera ácidos graxos e glicerol, onde os ácidos graxos penetram nas células teciduais e são oxidados para produção de energia ou armazenados. A imagem apresentada no link abaixo ilustra este processo. Captação dos lipídios alimentares e entrega dos ácidos graxos aos tecidos muscular e adipo- so, disponível em: https://bit.ly/2Ty51Cf Degradação dos Triacilgliceróis Os triacilgliceróis serão degradados pela ação da enzima lipase hormônio-sensível dos adipócitos. Esta enzima remove um ácido graxo dos triacilgliceróis e outras lipases completam o processo liberando glicerol e ácidos graxos. O glicerol liberado não é apro- veitado pelos adipócitos, pois estas células não possuem a enzima glicerol quinase, e por isso é liberado na circulação sanguínea, chegando ao fígado. No fígado, pela ação da glicerol quinase, é convertido em glicerol 3-fosfato e transformado em diidroxiacetona fosfato, que é um intermediário da glicólise e da gliconeogênese. Os ácidos graxos libe- rados sofrem o processo da β-oxidação para fornecimento de energia. Ácidos graxos liberados pelos tecidos adiposos são transportados pelo sangue ligados à albumina e utilizados pelos tecidos (incluindo fígado e músculos) como fonte de energia. São degradados através de uma via especial que se processa no interior das mitocôndrias. Degradação dos ácidos Graxos Para serem oxidados, os ácidos graxos são convertidos primeiramente em uma forma ativada – uma acil-CoA. A enzima que catalisa esta reação é a acil-CoA- -sintetase, formando compostos ricos em energia. Esta molécula recém-formada necessita ser transportada para o interior da mitocôn- dria, onde acontecerá a sua degradação, porém a membrana interna da mitocôndria é impermeável à acil-CoA. Existe nesta membrana uma molécula, chamada carnitina, 10 11 que se liga à acil-CoA, que funciona como um transportador desta molécula para o in- terior da mitocôndria, onde a mesma será oxidada até acetil-CoA. A ligação do grupo acila da acil-CoA com a carnitina é catalisada pela enzima carnitinaacil-transferase (Figura 4). Figura 4 – Mecanismo de entrada dos ácidos graxos no interior da mitocôndria pelo transportador carnitina Fonte: NELSON, D. L; COX, M., 2014, p. 359 A oxidação dos ácidos graxos ocorre em três estágios: • 1º estágio: β-oxidação; • 2º estágio: Ciclo de Krebs; • 3º estágio: Cadeia respiratória. • 1° Estágio: os ácidos graxos sofrem a remoção oxidativa de sucessivas unidades de dois átomos de carbono na forma de acetil-CoA. Por exemplo, o ácido palmítico (16 carbonos) sofre sete passagens através desta sequência oxidativa, em cada uma destas passagens perde dois átomos de carbono na forma de acetil-CoA. Resultado geral: conversão da cadeia de 16 átomos de carbono em 8 moléculas de acetil-CoA; • 2° Estágio: as moléculas de acetil-CoA são oxidadas até CO2, no Ciclo de Krebs (ma- triz mitocondrial). Os dois primeiros estágios do processo de oxidação de um ácido graxo produzem transportadores de elétrons reduzidos, NADH e FADH2; • 3° Estágio: NADH e FADH2 transferem os elétrons para a cadeia respiratória, onde estes são transportados até O2 e posteriormente participam da fosforilação do ADP para ATP. Iremos agora entender como ocorre o 1° Estágio deste processo, pois os outros dois estágios (Ciclo de Krebs e Cadeia Respiratória) já aprendemos em outra unidade e acontecem da mesma forma. O acetil-CoA na matriz mitocondrial será oxidado através de uma via conhecida como β-oxidação ou Ciclo de Lynen. Esta via ocorre através de uma série cíclica de 4 reações, em que ao final a acil-CoA é encurtada de dois carbonos, liberados sob a forma de acetil-CoA, com produção de FADH2 e NADH (coenzimas reduzidas). 11 UNIDADE Metabolismo das Proteínas e Lipídios Na β-oxidação, os ácidos graxos originam acetil-CoA e este processo envolve 4 etapas: • Desidrogenação; • Hidratação; • Oxidação; • Tiólise.Vamos entender cada uma destas etapas. • 1° etapa – Desidrogenização: produz dupla ligação entre os átomos α e β, libe- rando uma trans-Δ2-enoil-CoA. Δ2 representa o local da dupla ligação que tem configuração trans. A enzima responsável por este primeiro passo é a acil-CoA desidrogenase, que produz FADH2; • 2° etapa – Hidratação: uma molécula de água é adicionada à dupla ligação do trans-Δ2-enoil-CoA para formar a L-β-hidroxiacil-CoA. Catalisada pela enoil- -CoAhidratase; • 3° etapa – Oxidação: a β-hidroxiacil-CoA é desidrogenada para formar a β-cetoacetil-CoA. Pela ação da β-hidroxiacil-CoA desidrogenase, o NAD+ é o receptor de elétrons, formando NADH; • 4° etapa – Tiolase: catalisado pela acil-CoAaciltransferase (mais comumente chamada tiolase). Promove a reação da β-cetoacetil-CoA com uma molécula de coenzima A livre para romper o fragmento carboxila terminal de dois átomos de carbono na forma de acetil-CoA. O ciclo é refeito várias vezes até ser totalmente convertida a acetil-CoA. Quatro etapas básicas da β-oxidação, disponível em: https://bit.ly/2JdimOd A oxidação do ácido palmítico produz 106 ATP: a oxidação completa de um ácido graxo acontece pela junção do ciclo de Lynen e o ciclo de Krebs. O número de voltas no ciclo de Lynen depende da quantidade de carbonos em sua estrutura. Por exemplo, o ácido palmítico contém 16 carbonos (16 C), são necessárias 7 voltas no ciclo de Lynen (na última volta são produzidas 2 moléculas de acetil-CoA) com a produção de 8 acetil-CoA. A oxidação de cada acetil-CoA no ciclo de Krebs origina 3 NADH, 1 FADH2 e 1 GTP. Pela fosforilação oxidativa, NADH e FADH2 formam 2,5 2 1,5 ATP. Do total de ATP formado (108), deve ser descontado o gasto inicial na reação de ativação do ácido graxo, onde há conversão de ATP em AMP + 2Pi, que equivale ao consumo de 2 ATP. Desta forma, o total da oxidação do ácido palmítico é 106 ATP. Degradação de Ácidos Graxos de Número Ímpar Ácidos graxos com número ímpar de carbonos são considerados uma fração mi- noritária, mas também são oxidados pela via da β-oxidação. 12 13 Na última volta do Ciclo de Lynen, é produzida uma molécula de acetil-CoA e uma propionil-CoA, em vez de duas acetil-CoA. Para a oxidação da propionil-CoA, esta é convertida a succinil-CoA, um intermediário do Ciclo de Krebs. Esta reação ocorre através da formação de dois intermediários: D-metilmalonil-CoA e L-metil- malonil-CoA. Degradação de Ácidos Graxos Insaturados Se o ácido graxo a ser oxidado for insaturado, o processo tem dois passos enzi- máticos adicionais. Após a sua oxidação, o ácido graxo insaturado pode originar dois enoil-CoA. Se a dupla ligação for de número ímpar, é formada uma Cis-Δ3-enoil- CoA; se for de número par, é formada uma Cis-Δ4-enoil-CoA. Síntese de Ácidos Graxos Você já parou para pensar por que engordamos? Mesmo que tenhamos uma dieta pobre em gorduras e rica em carboidratos e proteínas, ainda assim o nosso corpo ganha peso. Mas por que isso acontece? Será que nosso organismo tem a capacidade de converter carboidratos da nossa dieta em gordura armazenada? Sim, isso é possível! Os ácidos graxos são produzidos nas nossas células hepáticas e no tecido adiposo através principalmente dos carboidratos, mas também do excedente de proteínas. Quando se descobriu que a oxidação dos ácidos graxos ocorre pela remoção oxidativa e sucessiva de unidades de dois átomos de carbono (acetil-CoA), os bioquímicos pensaram que a biossíntese dos ácidos graxos poderia ocorrer pela simples inversão de alguns passos enzimáticos empregados em sua oxidação. A síntese dos ácidos graxos e oxidação ocorrem por vias totalmente diferentes, são catalisadas por enzimas diferentes e ocorrem em compartimentos distintos da célula (matriz mitocondrial e citosol). Na via que leva à produção do ácido graxo, o substrato é o acetil-CoA e o produto é o ácido palmítico. A síntese ocorre no citosol, para onde deve ser transportada a acetil-CoA formada na mitocôndria a partir do piruvato. A primeira etapa da síntese de ácidos graxos é o transporte de acetil-CoA para o citosol. Como a membrana interna da mitocôndria é impermeável a acetil-CoA, os seus carbonos são transportados sob a forma de citrato. O citrato é transportado para o citosol por uma proteína translocase, onde é cindido a acetil-CoA e oxaloa- cetato, pela citrato liase. 13 UNIDADE Metabolismo das Proteínas e Lipídios Em seguida, o malonil-CoA é sintetizado a partir do acetil-CoA. A formação irre- versível do malonil-CoA a partir do acetil-CoA é catalisada pela acetil-CoA carbo- xilase, que contém uma molécula de biotina como grupo prostético. A enzima acetil-CoA carboxilase tem três domínios funcionais: • Proteína carreadora de biotina; • Biotina carboxilase: liga o CO2 à biotina; • Biotina transcarboxilase: transfere o CO2 da biotina para o acetil-CoA. A biotina é uma vitamina (B8) encontrada em carnes, gema de ovos, leite e peixes. A síntese dos ácidos graxos ocorre por uma via distinta. Consiste em quatro passos através dos quais são montados os átomos de carbono das cadeias longas dos ácidos graxos. Cada uma das passagens através do ciclo aumenta dois átomos de carbono. Quando o comprimento da cadeia atinge o número 16, o produto formado (palmitato) abandona o ciclo. Todas as reações são catalisadas por um complexo multienzimático: a ácido graxo sintetase. O sistema da ácido graxo sintetase consiste em sete grupos ativos diferentes e firmemente associados em um complexo único e organizado para catalisar a formação dos ácidos graxos a partir de acetil-CoA e malonil-CoA. A ácido graxo sintetase recebe os grupos acetila e malonil. Antes que comecem as reações que constroem a cadeia dos ácidos graxos, cada grupo malonil e acetil é ativado por um tioéster que se une à ácido graxo sintetase. • Condensação: o grupo acila é condensado com o grupo malonil. Na reação, forma-se um grupo β-cetoacil com 4 carbonos. O CO2 que havia sido incorpo- rado para formar o malonil é perdido; • Redução: o produto β-cetoacil desta condensação é então reduzido em três passos subsequentes muito idênticos às reações da β-oxidação, mas em sequência inversa: » Redução: o grupo β-cetoacil é reduzido a um álcool; » Desidratação: a eliminação de uma molécula de H2O cria uma dupla ligação; » Redução: a dupla ligação é reduzida para formar o grupo acil-graxo corres- pondente. As reações da ácido graxo sintetase são repetidas para formar o palmitato. Sete ci- clos de condensação e redução produzem o grupo palmitoil saturado com 16 carbonos. Discutimos nesta unidade o funcionamento normal do metabolismo dos lipídios em nosso orga- nismo. Porém, atualmente observa-se aumento do consumo de gorduras e açúcares. Isto se ma- nifesta com o aumento do sobrepeso/obesidade e na instalação de alterações metabólicas, como a Síndrome Metabólica. Leia o artigo “Síndrome metabólica, aterosclerose e inflamação: tríade indissociável?” para entender a associação da Síndrome Metabólica e algumas condições patológicas. Disponível em: https://bit.ly/2TLLD4O 14 15 Metabolismo das Proteínas Acessando o Instagram, vemos vários digital influencers indicando o consumo de colágeno. Você já comprou e consumiu colágeno alguma vez? Será que o colágeno que ingerimos é utilizado da mesma forma pelo nosso organismo? Ficou em dúvida? Será que você gastou dinheiro sem necessidade com as cápsulas de colágeno? Só para relembrar, as proteínas são polímeros de aminoácidos ligados através de ligações peptídicas. Os 20 aminoácidos possuem características estruturais em comum: presença de um átomo de carbono central; ligados a este carbono central, um grupamento CARBOXILA, um grupamento AMINA e um átomo de hidrogênio. O quarto ligante é um radical chamado genericamente de “R”, responsável pela dife- renciação entre os 20 aminoácidos e a cadeia lateral (Figura 5). Figura 5 – Estrutura de um aminoácido Fonte: Wikimedia Commons Bom, então quando ingerimos uma proteína, como o colágeno,no processo de digestão por enzimas serão liberados aminoácidos. E o que garante que estes aminoá- cidos liberados serão utilizados novamente para a produção de colágeno em nosso or- ganismo? Na verdade, a síntese de proteínas em nosso corpo depende das nossas ne- cessidades. Então, me responda: compensa o investimento em cápsulas de colágeno? Degradação de Proteínas Em nosso organismo, as proteínas não são moléculas permanentes e por isso a todo momento ocorrem síntese e degradação destas moléculas. Nos animais, os aminoácidos podem sofrer degradação oxidativa em três circunstâncias: • Durante a síntese e degradação normais das proteínas celulares (renovação das proteínas), alguns dos aminoácidos sofrerão degradação oxidativa caso eles não sejam necessários para a síntese de novas proteínas; 15 UNIDADE Metabolismo das Proteínas e Lipídios • Quando devido a uma dieta rica em proteínas, os aa. são ingeridos em excesso em relação às necessidades corporais de biossíntese de novas proteínas; • Durante o jejum severo ou diabetes melitus, quando os carboidratos são ina- cessíveis, as proteínas corporais serão chamadas a servirem como combustível. Um adulto necessita de 40 a 50 g de proteínas por dia para suprir os aminoácidos essenciais e o nitrogênio dos aminoácidos para ser convertido em ureia. As proteínas são degradadas em fragmentos peptídicos pela pepsina no estômago e pela tripsina e quimiotripsina no intestino delgado. As enzimas carboxipeptidase (do pâncreas) e aminopeptidase (das células epiteliais do intestino delgado) digerem os fragmentos em aminoácidos livres. Estes aminoácidos livres entram nas células epiteliais por transporte ativo secun- dário acoplado ao Na+ e posteriormente para o líquido intersticial através de trans- portadores de difusão facilitada. Os aminoácidos entram nos capilares sanguíneos e são transportados até o fígado. Um fator muito importante distingue a degradação dos aminoácidos dos proces- sos metabólicos descritos até agora: todos os aminoácidos contêm um grupo amino, portanto cada via degradativa passa por um passo-chave: o grupo amino é separado do esqueleto carbônico e desviado para uma via especializada para o metabolismo do grupo amino. A degradação dos aminoácidos compreende a remoção e a excreção do grupo amino e a oxidação da cadeia carbônica remanescente (α-cetoácido). O grupo amino é convertido a ureia e as 20 cadeias carbônicas resultantes são convertidas a compostos comuns ao metabolismo dos carboidratos e lipídios: • Piruvato; • Acetil-CoA; • Intermediários do Ciclo de Krebs. Remoção do Grupo Amino dos Aminoácidos A remoção do grupo amino ocorre através de uma reação de transaminação. O grupo amino é retirado por um processo comum, que consiste na transferência deste grupo para o α-cetoglutarato, formando glutamato. A cadeia carbônica do aa. é convertida ao α-cetoácido correspondente. Esta reação é catalisada por tran- saminases. No fígado, os grupos amino são removidos de vários aminoácidos por transaminação com o α-cetoglutarato para formar o glutamato. • Enzimas: aminotransferases ou transaminases; • Grupo prostético: piridoxal fosfato (vit. B6); • α-cetoglutarato: receptor do grupo amino. 16 17 Formado o glutamato, este pode seguir duas vias: I. Desaminação: que consiste na simples retirada do amino do Glutama- to, reobtendo α-Cetoglutarato; II. Aminotransferência: que é a transferência do amino do Glutamato para o Oxalacetato, originando Aspartato. De todo jeito, ao final da via obtêm-se Amônia (NH4 +) e Aspartato, que, juntamente com o CO2, são utilizados pelos hepatócitos no Ciclo da Ureia. Na desaminação oxidativa, o glutamato pode ser desaminado, ou seja, o grupo amino é liberado na forma de amônia (NH4 +). Esta reação é catalisada pela glutamato desidrogenase, uma enzima mitocondrial que utiliza NAD+ ou NADP+ como coenzima. Na aminotransferência, a remoção do grupo amino do glutamato também pode ocorrer através de uma nova transaminação, onde o grupo amino do glutamato é transferido para o oxaloacetato, formando aspartato, o segundo depósito do grupo amino dos aminoácidos. Essa reação é catalisada pela enzima aspartato transaminase. A ação combinada das aminotransferases e da glutamato desidrogenase resulta em dois compostos únicos: NH4 + e aspartato. A amônia (NH4 +) é altamente tóxica para os tecidos animais, principalmente para o cérebro, devendo, portanto, ser eliminada do organismo. A NH4 + produzida pelos outros tecidos deve ser transportada ao fígado para ser metabolizada através da Glutamina (tecidos extra-hepáticos) e Alanina (músculo). Posteriormente, a ureia é eliminada na urina. A produção de ureia a partir da amônia ocorre em um ciclo denominado Ciclo da Ureia ou de Krebs –Henseleit. Este ciclo se inicia na mitocôndria e três de seus passos ocorrem no citosol. No ciclo da ureia, a amônia vai ser convertida em ureia, nas mitocôndrias dos hepatócitos. Vamos entender como este ciclo acontece em etapas, conforme mostrado na Figura 6: • A amônia vinda da desaminação do glutamato combina-se com o gás carbônico respiratório na presença de ATP para formar carbamil-fosfato; • Formado o carbonil-fosfato, este reage com a ornitina, para formar a citrulina; • A citrulina combina-se com o aspartato, produzindo a arginina; • A arginina, por ação da enzima arginase, sofre cisão e acaba por produzir a ureia e regenerar a ornitina, que reinicia o Ciclo da Ureia. Vamos entender o Ciclo da Ureia? Este vídeo sintetiza o que aprendemos. Vamos lá! Disponível em: https://youtu.be/BNb8PSkHgAU 17 UNIDADE Metabolismo das Proteínas e Lipídios Figura 6 – Reações do Ciclo da Ureia Fonte: Wikimedia Commons Degradação das Cadeias Carbônicas dos Aminoácidos Removido o grupo amino do aminoácido, resta apenas a sua cadeia carbônica na forma de α-Cetoácido (originado na primeira aminotransferência). As vinte cadeias carbônicas diferentes não possuem uma via comum de degradação, entretanto pro- duzem somente alguns compostos: piruvato, acetil-CoA e intermediários do Ciclo de Krebs (oxaloacetato, alfa-Cetoglutarato, succinil-CoA e fumarato). Os aminoácidos são, então, divididos em seis grupos, conforme o produto formado: Quadro 1 Grupo 1 – Aminoácidos que são convertidos a piruvato • Alanina; • Cisteína; • Glicina; • Serina; • Treonina; • Triptofano. Grupo 2 – Aminoácidos que são convertidos a oxaloacetato • Aspargina; • Aspartato. Grupo 3 – Aminoácidos que são convertidos a fumarato • Aspartato; • Fenilalanina; • Tirosina. 18 19 Grupo 4 – Aminoácidos que são convertidos a succinil-CoA • Isoleucina; • Valina; • Metionina; • Treonina. Grupo 5 – Aminoácidos que são convertidos a α-cetoglutarato • Glutamato; • Glutamina; • Prolina; • Arginina; • Histidina. Grupo 6 – Aminoácidos que são convertidos a acetil-CoA • Fenilalanina; • Tirosina; • Triptofano; • Lisina; • Isoleucina; • Treonina; • Leucina. Síntese de Aminoácidos Os vegetais e bactérias são capazes de sintetizar todos os aminoácidos, entretanto os seres humanos dependem de um fornecimento externo de aminoácidos. Para a síntese de aminoácidos, a amônia é primeiramente incorporada ao glutamato. Para a produção de proteínas, é necessário que os vinte aminoácidos estejam pre- sentes, porém destes, nove não são sintetizados pelo organismo humano, devendo ser obtidos através da dieta. A Tabela 1 indica os aminoácidos essenciais (provenien- tes da dieta) e os aminoácidos não essenciais (sintetizados pelos seres humanos). Tabela 1 – Aminoácidos essenciais e não essenciais para os seres humanos Essenciais Não essenciais Fenilalanina Alanina Histidina Arginina Isoleucina Asparagina Leucina Aspartato Lisina Cisteína1 Metionina Glutamato Treonina Glutamina Triptofano Glicina Valina Prolina Serina Tirosina* *Sintetizados a partir de aminoácidos essenciais. Fonte: MARZZOCO, A.; TORRES, B. B., 2015. p. 237 A síntese do esqueleto carbono de cada um dos aminoácidos é agrupada de acor-do com a família dos seus precursores. As principais famílias são: 19 UNIDADE Metabolismo das Proteínas e Lipídios • Alfa-cetoglutarato: origina glutamato, glutamina, prolina e arginin; • 3-fosfoglicerato: origina serina, glicina e cisteína; • Oxaloacetato: origina aspartato, que vai originar asparagina, metionina, treo- nina e lisina; • Piruvato: origina alanina, valina, leucina e isoleucina. Dosagem Laboratorial de Proteínas Totais A proteína total sérica é a soma das proteínas circulantes no soro, das frações individuais no soro, albumina e globulinas. As proteínas plasmáticas são classificadas em dois tipos: albumina e globulinas. Valor de referência: 6 a 7,8 g/dL. Albumina...........: 3.5 a 5.5 g/dL Globulina...........: 2.5 a 3.5 g/dL • Albumina: representa 55% a 65% do total e mantém a pressão osmótica do sangue, impedindo a passagem excessiva da água para os tecidos. Muitas molé- culas pequenas são transportadas no sangue ligadas à albumina; • Globulinas: enzimas, anticorpos e mais de 500 outras proteínas. A relação albumina/globulinas é obtida dividindo-se a quantidade de albumina no sangue pela quantidade de globulinas. Hiperproteinemia A hiperproteinemia trata-se do excesso de proteínas no plasma sanguíneo. Existem diversos mecanismos que podem causar esta condição. A seguir, citaremos alguns. • Desidratação: inadequada ingestão de líquidos ou perda excessiva de água (vômito, diarreia intensa ou acidose diabética); • Enfermidades monoclonais: mieloma múltiplo promove a elevação de imuno- globulinas; • Enfermidades policlonais crônicas: cirrose hepática, lúpus eritematoso, infecção bacteriana crônica. Hipoproteinemia A hipoproteinemia é considerada a junção de diversos fatores que resultam em uma considerável queda na quantidade de proteína sanguínea. Alguns destes fatores são: • Aumento do volume plasmático: hemodiluição, como nos casos de cirrose associada à ascite; 20 21 • Perda renal: as proteínas de pequeno peso molecular são filtradas pelos glo- mérulos e quase que totalmente reabsorvidas pelos túbulos renais. Danos glo- merulares podem resultar na passagem de proteínas para a urina; • Perda pela pele: queimaduras graves; • Distúrbios da síntese proteica: desnutrição, má absorção, dietas pobres em proteínas e enfermidades hepáticas podem reduzir a síntese de proteínas. 21 UNIDADE Metabolismo das Proteínas e Lipídios Material Complementar Indicações para saber mais sobre os assuntos abordados nesta Unidade: Livros Vander fisiologia humana: os mecanismos das funções corporais WIDMAIER, E. P. Vander fisiologia humana: os mecanismos das funções corporais. 12ª ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2013. Bioquímica BERG, J. M. et al. Bioquímica. 7ª ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2014. Vídeos Ciclo da ureia https://youtu.be/BNb8PSkHgAU Leitura Síndrome metabólica, aterosclerose e inflamação: tríade indissociável? BARBALHO, S. M. et al. Síndrome metabólica, aterosclerose e inflamação: tríade indissociável? https://bit.ly/2TLLD4O 22 23 Referências MARZZOCO, A.; TORRES, B. B. Bioquímica básica. 4ª ed. Rio de Janeiro: Gua- nabara Koogan, 2015. NELSON, D. L; COX, M. M. Princípios de bioquímica de Lehninger. 6ª ed. São Paulo: Artmed, 2014. 23
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