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CASO CLÍNICO Paciente com perda de apetite e perda de peso há 3 meses, inchaço abdominal e meteorismo com anemia. Queixa atual: prolapso retal TRICHURIS TRICHIURA A infecção de T. trichiura é amplamente distribuída na população humana, sendo que as estimativas globais indicam que 600 a 800 milhões de pessoas encontram infectadas. Fatores climáticos, como temperatura e umidade média elevada, mas não extrema, pouca variação climática durante o dia, além do pH do solo variando de 5,3 a 5,6 e baixo nível de desenvolvimento humano (IDH) são fatores que aumentam o risco de contaminação humana por T. trichiura. Também foi verificado que atualmente, a população com maior risco de adquirir a infecção por este nematódeo no Brasil vive na periferia de centros urbanos e não em áreas rurais MORFOLOGIA ADULTOS Parasitos em forma de fio (nêmatos), cilíndricos e alongados. Possuem simetria bilateral (forma de chicote) Os machos são menores que as fêmeas. A boca, localizada na extremidade anterior, é uma abertura simples e sem lábios onde pode ser observado um pequeno estilete, seguida por um esôfago Os vermes adultos são dioicos e com dimorfismo sexual OVOS Apresentam um formato elíptico característico com poros salientes e transparentes em ambas as extremidades, preenchidos por material lipídico. A casca do ovo de Trichuris é formada por três camadas distintas, uma camada lipídica externa, uma camada quitinosa intermediária e uma camada vitelínica interna, que favorece a resistência destes ovos a fatores ambientais BIOLOGIA HABITAT Os adultos de T. trichiura são parasitos de intestino grosso de humanos, sendo que em infecções leves ou moderadas, estes vermes habitam principalmente o ceco e o cólon ascendente do hospedeiro. Nas infecções intensas ocupam também cólon distal, reto e porção distal do íleo. T. trichiura é considerado por muitos autores um parasito tissular, pois toda a região esofageana do parasito penetra na camada epitelial da mucosa intestinal do hospedeiro, onde ingere muco e células, principalmente restos dos enterócitos lisados pela ação de enzimas proteolíticas secretadas pelas glândulas esofageanas do parasito. Alguns autores demonstram a presença de sangue no esôfago de vermes adultos, sugerindo a possível utilização de sangue do hospedeiro como fonte alimentar A porção posterior de T. trichiura permanece exposta no lúmen intestinal, facilitando a reprodução e a eliminação dos ovos. CICLO BIOLÓGICO O desenvolvimento das espécies de Trichuris é do tipo monoxeno; fêmeas e machos que habitam o intestino grosso reproduzem-se sexuadamente e os ovos são eliminados para o meio externo juntamente com as fezes Uma vez no ambiente, estes ovos sofrem embriogênese formando uma larva de primeiro estágio. O período necessário para completar a embriogênese depende de condições ambientais, especialmente temperatura e umidade. Os ovos de T. trichiura são muito sensíveis à dessecação, não sobrevivendo por mais de 15 dias quando a umidade relativa é menor que 77% ou em áreas com insolação direta. Entretanto, em condições ambientais favoráveis, os ovos de T. trichiura contendo as larvas infectantes podem permanecer viáveis por longo período de tempo Os ovos contendo uma larva de primeiro estágio são infectantes para o hospedeiro, sendo geralmente ingeridos juntamente com alimentos sólidos ou água contaminados. As larvas de T. trichiura eclodem através de um dos poros presentes nas extremidades do ovo, no intestino delgado do hospedeiro. Estudos in vitro indicam que o processo de eclosão das larvas do parasito é estimulado pela exposição sequencial dos ovos aos componentes do suco gástrico e do suco pancreático. O desenvolvimento das larvas de T. trichiura no intestino do hospedeiro ainda apresenta aspectos bastante controversos e desconhecidos, especialmente nos primeiros dias de infecção. Estudos experimentais com T. vulpis em cães indicam que as larvas recém-eclodidas penetram no epitélio da mucosa intestinal na região duodenal, pela base das criptas de Lieberkuhn, permanecendo nesta localidade por 5 a 10 dias, e posteriormente estas larvas ganham a luz intestinal e migram para o ceco e o cólon onde completam seu desenvolvimento. Segundo Bundy e Cooper, os estudos histológicos revelam que as larvas de Trichuris sp. podem penetrar na mucosa em várias regiões do intestino, mas esta penetração ocorre principalmente no intestino grosso, e não foram encontradas evidências de que as larvas que penetram no duodeno completam seu desenvolvimento, ou mesmo que ocorra uma posterior migração das larvas do duodeno para o intestino grosso. Assim as larvas LI penetram preferencialmente nas criptas cecais, penetrando na mucosa intestinal onde as larvas habitam células da camada epitelial, formando túneis sinuosos na superfície epitelial da mucosa. Durante este período as larvas se desenvolvem em vermes adultos, passando pelos quatro estágios larvais típicos do desenvolvimento dos nematódeos. A primeira muda do ciclo deste parasito ocorre entre 9 e 11 dias após a penetração, a segunda muda ocorre a partir de 17 dias, a terceira após 22 dias e a última muda do ciclo corre a partir de 32 dias de infecção O crescimento e o desenvolvimento dos vermes levam ao rompimento das células epiteliais e a exposição da porção posterior do corpo de T. trichiura à luz intestinal do hospedeiro.. Apenas um a pequena parte (5 a 22%) dos ovos infectantes de T. trichiura ingeridos completam o desenvolvimento até vermes adultos. Estima-se que o período pré-patente da tricurose em humanos, tempo entre a infecção até a eliminação dos ovos pelas fezes do hospedeiro, é de aproximadamente 60 a 110 dias TRANSMISSÃO Os ovos de T. trichiura eliminados com as fezes do hospedeiro infectado contaminam o ambiente, em locais onde o saneamento básico é deficiente ou ausente. Como os ovos são extremamente resistentes às condições ambientais, podem ser disseminados pelo vento ou água e contaminar os alimentos e a água, sendo então ingeridos pelo hospedeiro. Ovos de T. trichiura também podem ser disseminados por moscas, que transportam os ovos do parasito do local onde as fezes foram depositadas até o alimento. Em áreas de alta prevalência, onde a contaminação do solo é elevada, a ingestão de ovos diretamente da mão contaminada e a prática de geofagia, comportamento relativamente frequente em crianças e mulheres grávidas especialmente em algumas regiões da África, da índia e da América Latina, também contribuem para a transmissão deste parasito PATOGENIA A gravidade da tricuríase depende da carga parasitária, mas também tem influência de fatores como a idade do hospedeiro, o estado nutricional e a distribuição dos vermes adultos no intestino. Com relação à carga parasitária, a OMS recomenda que os programas de controle de helmintos considerem como infecções leves, os pacientes cujo exame de fezes revela um número menor que 1.000 ovos/g fezes, infecções moderadas as que os pacientes eliminam entre 1.000 e 9.999 ovos/g fezes, e infecções graves quando um número superior a 10.000 ovos/g fezes é quantificado nas fezes dos pacientes A maioria dos pacientes com infecções leves é assintomática ou apresenta sintomatologia intestinal discreta; pouco específica. Pacientes com infecção moderada geralmente apresentam dores de cabeça, dor epigástrica e abaixo do abdome, diarreia, náusea e vômitos em grau variado, que podem resultar em diminuição da ingestão de alimentos e aumento de perdas nutricionais, comprometendo o estado nutricional do hospedeiro. A síndrome disentérica crônica é associada a infecções intensas, sendo que nestes casos pode observar uma diarreiaintermitente com presença. abundante de muco e, algumas vezes, sangue, dor abdominal com tenesmo, anemia, desnutrição grave caracterizada por perda de peso e, algumas vezes, prolapso retal. A sintomatologia associada à tricuríase é decorrência da interação deste parasito com seu hospedeiro. Como não existe migração sistêmica das larvas em humanos, as principais lesões provocadas pelas larvas e vermes adultos deste parasito estão confinadas ao intestino. Trichuris trichiura ocupa preferencialmente a mucosa da região do ceco do hospedeiro, entretanto em infecções intensas o verme pode atingir todo intestino grosso, o reto, e o íleo distal. Neste ambiente, o parasito vive em túneis constantemente formados na camada epitelial através da penetração da região anterior do verme. Na proximidade do verme, a movimentação e a alimentação destes causam lesões ao epitélio e à lâmina própria intestinal do hospedeiro, podendo ser observado um aumento na produção de muco pela mucosa intestinal, áreas de descamação da camada epitelial e infiltração de células mononucleares na lâmina própria. Eosinófilos são também encontrados associados à região dos esticossomos (glândulas da região esofageana) dos vermes Em infecções mais intensas, a inflamação da mucosa intestinal pode resultar em colite e apendicite, sintomas frequentemente associados à infecção per T. trichiura. O processo inflamatório pode ser particularmente intenso quando os vermes atingem o reto, sendo observado edema e intenso sangramento da mucosa local. Esta reação edematosa produz um inchaço da mucosa retal, que provavelmente é responsável por iniciar o reflexo de defecação, mesmo na ausência de fezes no reto. O esforço continuado de defecação associado a possíveis alterações nas terminações nervosas locais podem resultar em prolapso retal Extensas áreas de lesão e inflamação produzidas por um grande número de vermes também afetam a absorção de líquido, levando a um quadro de disenteria crônica, náusea e vômitos que também são frequentes em pacientes intensamente infectados Além disto, a lesão na mucosa intestinal pode gerar sangramento, sendo relatado que em casos de infecção intensa a evacuação pode ser mucossanguinolenta. A combinação das alterações observadas em pacientes intensamente infectados por T. trichiura pode resultar em sintomas sistêmicos como anemia, desnutrição e, no caso de crianças, retardamento no desenvolvimento físico e comprometimento cognitivo. A deficiência nutricional em consequência da falta de apetite também pode contribuir para a ingestão de quantidades insuficientes de ferro e agravar a anemia nas pessoas com infecção intensa Finalmente, existem relatos de infecções muito intensas resultarem na obstrução do cólon e na perfuração intestinal, entretanto, estes casos são extremamente raros DIAGNÓSTICO CLÍNICO Como a maioria dos pacientes infectados por T. trichiura são assintomáticos ou apresentam sintomatologia pouco característica, que não permite o diagnóstico específico, este deve ser confirmado com o diagnóstico laboratorial. LABORATORIAL O diagnóstico específico da presença de infecção por T. trichiura é geralmente realizado pela demonstração dos ovos do parasito nas fezes do paciente Para estudos epidemiológicos em áreas endêmicas, o método mais utilizado para o diagnóstico é o método de Kato-Katz, que permite uma avaliação qualitativa e quantitativa da infecção. IMAGEM Também tem sido relatada na literatura a possibilidade de visualizar vermes adultos de T. trichiura em exames de colonoscopia ou anoscopia, sendo importante para a confirmação de diagnóstico em alguns casos específicos TRATAMENTO I: Albendazol II: Mebendazol III: Pamoato de oxipirantel Controle de cura: 7, 14 e 21 dia após tratamento OBS: Associação de albendazol com ivermectina e dietilcarbamazina para Ascaris e Trichuris está em teste OBS: Combinação entre as drogas melhora a eficácia de tratamento PROFILAXIA Os humanos são a única fonte epidemiologicamente relevante da infecção por T. trichiura. O sucesso da transmissão destes nematódeos depende de condições ambientais, que favoreçam o desenvolvimento e a sobrevivência dos ovos no ambiente, e da inexistência de saneamento básico adequado e higiene pessoal, fatores que permitem a contaminação ambiental. Desta maneira, as medidas profiláticas para o controle da tricurose são bastante semelhantes às discutidas para o controle da infecção por A. lumbricoides. ASPECTOS EPIDEMIOLÓGICOS Importante geo-helmintíase Prevalência estimada: 604 a 795 milhões de indivíduos no mundo (junto com ascaridíase, alta prevalência – coinfecção) Transmissão: Principalmente em países de clima tropical e subtropical; No Brasil, a maior prevalência está no litoral e na Amazônia (clima quente e úmido); Incidência nas zonas urbanas maior que as rurais (aglomerações humanas e saneamento precário). Relacionado a más condições de higiene, saneamento básico, educação em saúde (crianças mais vulneráveis); agricultura MG: prevalência de 13,8% Mais comum norte, nordeste e região litorânea Alagoas (72%), Pará (68,1%)
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