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Formas de Desenvolvimento Núcleo de Educação a Distância www.unigranrio.com.br Rua Prof. José de Souza Herdy, 1.160 25 de Agosto – Duque de Caxias - RJ Reitor Arody Cordeiro Herdy Pró-Reitoria de Programas de Pós-Graduação Nara Pires Pró-Reitoria de Programas de Graduação Lívia Maria Figueiredo Lacerda Produção: Gerência de Desenho Educacional - NEAD Desenvolvimento do material: Viviane Japiassú Viana 1ª Edição Copyright © 2020, Unigranrio Nenhuma parte deste material poderá ser reproduzida, transmitida e gravada, por qualquer meio eletrônico, mecânico, por fotocópia e outros, sem a prévia autorização, por escrito, da Unigranrio. Pró-Reitoria Administrativa e Comunitária Carlos de Oliveira Varella Núcleo de Educação a Distância (NEAD) Márcia Loch Sumário Formas de Desenvolvimento Para início de conversa… .................................................................. 04 Objetivo ........................................................................................... 05 1. Só um Vencedor (Adam Smith) ............................................. 06 2. Teoria de Nash .................................................................... 12 3. Colaboração e Integração ..................................................... 17 Referências ....................................................................................... 22 Para início de conversa… A busca pelo desenvolvimento é inerente às pessoas, às comunidades e às nações. Você já parou para pensar sobre o tipo de desenvolvimento que deseja para o Brasil? E para outros países do mundo? Será que podemos falar sobre um mesmo tipo de desenvolvimento para qualquer país? Será que existe um formato ideal que se aplica a qualquer realidade mesmo diante das inúmeras particularidades de cada país e grupo social? Que aspectos devemos levar em consideração durante a definição de estratégias governamentais e políticas públicas para dar conta de tantos elementos que influenciam e são influenciados pelas regulamentações e decisões políticas? Fala-se muito sobre buscar o desenvolvimento. Mas de que desenvolvimento estamos falando? Ele alcança igualitariamente todas as nações e grupos sociais? Como essa questão vem evoluindo ao longo da história? Neste capítulo, falaremos sobre as diferentes formas de desenvolvimento e sobre como a compreensão a respeito desse aspecto foi mudando na sociedade ao longo dos acontecimentos históricos. Veremos os diferentes tipos de desenvolvimento e os elementos que eram e são atualmente considerados para avaliar a riqueza das nações. 4 Produtividade e Sustentabilidade Objetivo Desenvolver o conhecimento de negócio para ganho financeiro. 1. Só um Vencedor (Adam Smith) Segundo Hunt (2005), após o feudalismo ocorreu o mercantilismo, que serviu como um período de transição para o modo de produção capitalista. Essa fase inicial é conhecida como capitalismo comercial, pelo qual a burguesia se fortaleceu, as relações bancárias se estabeleceram e as desigualdades sociais se propagaram. Durante os séculos XVII, XVIII e XI, as tecnologias criaram novas condições de produção e as indústrias ganharam escala, o que resultou na oferta de produtos industrializados com preços baixos. Esse cenário promoveu um crescimento acelerado da procura externa pelos bens industrializados da Inglaterra, estimulando a busca pelo lucro e levando a uma corrida pelo desenvolvimento de novas tecnologias no fim do século XVIII e início do século XIX. Essa mudança de paradigma, provocou transformações radicais no modelo econômico, consolidando o capitalismo em quase todo o mundo. Nessa fase, chamada de capitalismo industrial (ou industrialismo), a concentração de lucro nas mãos de poucos dividiu as classes sociais de forma mais clara. Quem não era proprietário de terra ou burguês tornou-se trabalhador assalariado e novas relações de trabalho se estabeleceram. Dessa forma, mesmo diante dos avanços tecnológicos, essa fase do capitalismo criou instabilidades econômica e políticas que desencadearam conflitos, dentre os quais se destacam a Primeira Guerra Mundial, a Revolução Russa, além de uma grave crise econômica em 1929. O conceito de desenvolvimento econômico remete-nos à obra A riqueza das nações, publicada em 1776 pelo escocês Adam Smith, importante teórico das ciências econômicas. Na teoria do crescimento econômico por ele proposta, o produto anual per capita identifica a riqueza e o bem-estar das nações, e é determinado pela acumulação do capital decorrente da produção excedente de valor sobre o custo de produção (produtividade de trabalho “útil ou “produtivo”) e pelo número de trabalhadores empregados produtivamente com relação à população total (FRITSCH, 1996, p.8). 6 Produtividade e Sustentabilidade Na linha de pensamento desse teórico, as pessoas seriam movidas por interesses individuais, buscando “melhorar sua própria condição, através do desejo de ganho” (GANEM, 2000). Tais interesses seriam guiados por uma espécie de “mão invisível” que, em vez de conduzir ao caos, é capaz de estabelecer uma ordem social, de modo a se auto-organizar mesmo sem uma interferência ativa do estado. Isso seria possível, uma vez que os custos médios de produção reduzem à medida que se ganha escala, propiciando um aumento do lucro e ampliando as possibilidades de emprego. Com a maior parcela da população economicamente ativa, a renda da população aumentaria, resultando, em longo prazo, na redistribuição de renda entre o capital e o trabalho. Acreditava-se, por exemplo, que se uma indústria automobilística aumentasse consideravelmente o número de carros produzidos, seus custos seriam mais baixos, já que esse processo potencializaria o aproveitamento de equipamentos e mão de obra. Para aumentar a produção, seriam contratados mais funcionários, gerando renda para essa parcela da população que passaria a comprar carros, ampliando, consequentemente, o mercado consumidor. Ganem (2000) afirma que a teoria de mercado proposta por Smith representa uma das principais bases teóricas da ordem social liberal, pela qual entende-se que a economia é a essência da sociedade, de modo que o crescimento econômico representa o próprio desenvolvimento. Segundo afirma Hunt (2005, p.54), Smith acreditava que “o capitalismo representava o estágio mais alto da civilização” e que, conforme evoluísse, esse modelo seria capaz de levar a sociedade a um estágio no qual praticamente não haveria restrições e intervenções impostas pelo governo, pois seria alcançado um equilíbrio regulado pelas forças da concorrência e pela oferta e demanda. Figura 1: Cooperação para obtenção de ganhos. Fonte: Dreamstime. 7Produtividade e Sustentabilidade Durante muitos anos, adotou-se a premissa de que o Estado deveria atuar apenas no sentido de garantir que os contratos estabelecidos entre as partes fossem cumpridos, devendo ser respeitadas as liberdades individuais de escolha, uma vez que as partes eram consideradas igualitárias. Com o passar dos anos, ficou evidente que essa condição de igualdade absoluta, considerada nos ideais liberais, não era real. As relações estabelecidas, por exemplo, entre empregado e empregador ou produtor e consumidor continham desigualdades intrínsecas ao abismo de poder econômico, político e social de que cada parte dispunha. Assim, no início do século XX, o desequilíbrio social que se instaurou deixou evidente as disparidades entre as rendas dos países ricos e dos pobres e entre os diferentes setores da sociedade, provocando questionamentos sobre a capacidade do crescimento econômico, por si só, resultar em desenvolvimento (MATOS; ROVELLA, 2010). Um marco histórico dessa época foi a crise de 1929, também conhecida como Grande Depressão, período no qual uma forte recessão econômica associada à superprodução e especulação financeira levou os Estados Unidos a altas taxas de desemprego e pobreza, colocando em xeque o capitalismoe o liberalismo econômico. Foi então que o conceito de desenvolvimento começou a ser questionado e expandido até passar a incluir, também, aspectos que buscassem dar conta da complexidade inerente às relações estabelecidas em todos os níveis da sociedade, desde o interpessoal até as relações internacionais. A esse respeito, existem diferentes linhas de pensamento do caminho a ser seguido. Para alguns, conforme preconizado por Adam Smith, o Estado deveria intervir minimamente, deixando o mercado se autorregular. Para os novos movimentos que surgiam à época, é necessária a intervenção do Estado no domínio econômico, visando minimizar o desequilíbrio social que se instaurou. A Revolução Socialista, por exemplo, propunha “a ação total e plena do Estado sobre o domínio econômico” (NETO; MENDONÇA, 2010). Comentário 8 Produtividade e Sustentabilidade Na década de 1970, o modelo de desenvolvimento até então adotado foi criticado no relatório Limites do Crescimento, que alertava para o risco de esgotamento dos recursos naturais do planeta caso o crescimento econômico continuasse a empregar os mesmos padrões. Essa afirmação teve grande repercussão na Conferência das Nações Unidas sobre o Ambiente Humano, realizada em 1972 em Estocolmo (Suécia), preocupando líderes mundiais e fortalecendo os debates sobre a necessidade de um novo olhar sobre a relação da humanidade com o meio ambiente. A produção, por mais primitiva que fosse, era sempre constituída por um sistema aberto, com fluxo linear de materiais. Minerais e metais empregados, por exemplo, para a fabricação de ferramentas, moedas e armas, foram usados por séculos. Na era pré-industrial, a antroposfera poderia ser considerada em equilíbrio com os demais elementos do sistema natural, e a humanidade, considerada parte do ecossistema natural. Por esse motivo, lidar com resíduos provenientes da produção de bens e serviços sempre foi, historicamente, considerado antieconômico, principalmente porque havia espaço suficiente para descartar o pequeno volume de lixo e resíduos e não havia limitação para matérias-primas. (GIANNETTI; ALMEIDA, 2006, p.1) Na década de 1980, foi criada Comissão Mundial do Desenvolvimento e Meio Ambiente, que buscava novas formas de lidar com a questão ambiental em escala global. Esse objetivo levou a comissão a promover encontros que reuniram líderes do mundo todo para discutir o tema. Como resultado dos debates, foi lançado no final dessa década o Relatório Nosso Futuro Comum, também chamado de Relatório Brundtland, que defendia uma nova abordagem do crescimento econômico alinhada com as políticas ambientais. Diante desse cenário, foi proposto o conceito de desenvolvimento sustentável, definido como aquele que atende às necessidades do presente sem comprometer a possibilidade de as gerações futuras atenderem suas próprias necessidades. Para alcançar esse tipo de desenvolvimento, deve- se considerar os três elementos que formam o tripé da sustentabilidade: social, ambiental e econômico. Veja a Figura 2: 9Produtividade e Sustentabilidade Ambiental Social Econômico Desenvolvimento Sustentável Conservação de Energia e Água Redução de Carbono Criação de Espaços Abertos Engajamento dos Cidadãos Construção Habitacional Acessível Desenvolvimento Econômico Projetos de Capital Figura 2: Tripé da sustentabilidade: social, ambiental e econômico. Fonte: Elaborado pela autora. No início da década de 1990, mais uma conferência foi realizada, dessa vez na cidade do Rio de Janeiro. Esse evento ficou conhecido como Eco 92 ou Rio 92 e resultou em diversos documentos que firmaram compromissos entre os países participantes, levando a questão ambiental para a agenda global. Dentre os documentos produzidos, destacam-se: Agenda 21: apresenta um plano de ação detalhado para que os países signatários modifiquem seus padrões de consumo e produção visando à redução dos impactos ambientais sem deixar de atender às necessidades da humanidade. Esse documento destaca a importância da atuação na escala local, envolvendo a população e as diversas partes interessadas. Convenção da Biodiversidade: tem como objetivo a conservação da diversidade biológica, a utilização sustentável de seus componentes e a repartição justa dos benefícios dos recursos genéticos. Para isso, a convenção estabelece normas e princípios para o uso e a proteção da diversidade biológica em cada país signatário, respeitando a soberania nacional dos países. 10 Produtividade e Sustentabilidade Convenção das Mudanças Climáticas: propõe estratégias para redução do lançamento de gases de efeito estufa (GEE) na atmosfera. Como desdobramento dessa convenção, foi estabelecido, em 1997, o Protocolo de Kyoto. Convenção sobre Combate à Desertificação: estabelece diretrizes e compromissos a fim de que os países afetados por seca grave e/ou desertificação combatam esse fenômeno causador de danos econômicos e humanos à população. Declaração de Princípios sobre Florestas: reconhece que as florestas são essenciais para o desenvolvimento econômico e para a manutenção de todas as formas de vida, estabelecendo princípios sobre o manejo, conservação e desenvolvimento sustentável de todos os tipos de florestas. Declaração do Rio sobre Ambiente e Desenvolvimento: produto final da ECO-92, essa declaração reafirma a Declaração de Estocolmo de 1972 e cria novos níveis de cooperação entre os Estados e as partes interessadas, objetivando o respeito aos interesses de todos, bem como a proteção do meio ambiente, reconhecendo a natureza integral e interdependente da Terra. Carta da Terra: manifesta princípios éticos imprescindíveis para a formação de uma sociedade universal que seja justa, sustentável e pacífica. Desde então, o debate sobre o que é desenvolvimento tem sido ampliado e ganhado novas dimensões, um exemplo dessa significativa expansão é a criação do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) em contraponto ao Produto Interno Bruto Per Capita (PIB per capita). Segundo o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento – PNUD (2019), esse índice representa “uma medida resumida do progresso a longo prazo em três dimensões básicas do desenvolvimento humano: renda, educação e saúde”. 11Produtividade e Sustentabilidade No ano de 2015, Noruega, Austrália, Suíça e Dinamarca lideraram o ranking global de IDH. O Brasil ocupou a 75ª posição e o Níger ficou na última colocação, ocupando a 188ª posição (PNUD, 2019). Embora vá além da dimensão econômica, esse índice também tem suas limitações quanto à representação da realidade das regiões avaliadas. E, nesse sentido, estamos na constante busca por um modo de medir a situação dos países de forma mais adequada, de modo a comparar as diferentes realidades e debater sobre como o combate às discrepâncias sociais e econômicas entre eles pode ser feito. 2. Teoria de Nash Quando está participando de um jogo de estratégia, como é que você decide qual será a próxima jogada? Você provavelmente observa as últimas ações dos demais jogadores e tenta prever quais cartas ou peças ele precisa para ganhar, ou mesmo tenta manipulá-lo para que você tenha acesso às cartas necessárias para a sua vitória. Jogo de soma zero Em muitos desses jogos, por vezes, sua estratégia muda ao longo da partida. De uma tentativa de vencer a rodada, maximizando os seus ganhos, sua tática pode alternar para uma tentativa de impedir que outro jogador “se dê bem”, minimizando os ganhos dele. Em outros jogos, ou você ganha ou você perde, isto é, você precisa que o outro fracasse para que você vença. Só há um vencedor nesse cenário. Esse tipo de jogo foi chamado por John von Neuman de jogo de soma zero e tem como elemento básico a estratégia de competição que, no entendimento dele, é a base para o comportamento humano. Na vida em sociedade, muitas vezes, temos interesses opostos aos de outros indivíduos, de modo que nossas escolhas e ações são baseadas nessas aspirações. Para compreender comoas pessoas tomam decisões quando interagem com outros indivíduos, a Teoria dos Jogos propõe Glossário 12 Produtividade e Sustentabilidade uma compreensão lógica da situação na qual eles se inserem a partir de modelos matemáticos que estruturam fenômenos envolvendo dois ou mais atores. Analisando-se as estratégias dos atores sociais “adversários”, pode-se compreender os jogos de interesse e tomar decisões que potencializem os benefícios dos atores envolvidos. Para fazer uma escolha, os jogadores estabelecem estratégias baseadas nas estratégias dos demais jogadores. Cada jogador pode decidir entre n estratégias (colaborativas ou não colaborativas), escolhendo aquela que acredita ser a melhor para obter as recompensas desejadas diante das estratégias disponíveis para os outros jogadores. Nos jogos dinâmicos, essas decisões são sequenciais, existindo uma ordem pela qual elas são tomadas, como no jogo de damas. Já nos jogos estáticos, as decisões são tomadas simultaneamente, como no jogo “pedra, papel e tesoura”, no qual todos revelam suas escolhas ao mesmo tempo, desconhecendo a decisão tomada pelos outros jogadores. Quando os jogadores conhecem as regras do jogo e todas as recompensas possíveis, constitui-se, então, um jogo de informação completa. Caso contrário, ele é considerado de informação incompleta. Assim, considerando a ordem na qual os jogadores tomam decisões e o conhecimento que eles têm quanto às regras e recompensas envolvidas (MARQUES et al., 2018), podemos classificar os jogos como: jogos dinâmicos de informação completa; dinâmicos de informação incompleta; estáticos de informação completa; e estáticos de informação incompleta. Figura 3: Probabilidade e teoria dos jogos. Fonte: Dreamstime. 13Produtividade e Sustentabilidade Nos jogos dinâmicos de informação completa, as decisões são tomadas em sequência pelos jogadores a partir do conhecimento das regras do jogo e da matriz de recompensas, como no jogo de damas. Jogos dinâmicos de informação incompleta são aqueles nos quais as decisões são sequenciais e pelo menos um dos jogadores desconhece a matriz de recompensas. Um exemplo seria a entrada de uma nova empresa de tecnologia no mercado, que conhece os custos das demais empresas já estabelecidas no setor, mas não revela seus custos para as concorrentes. Nesse caso, a nova empresa pode ter alto ou baixo custo de produção e, dependendo da situação, pode preferir esconder ou divulgar essa informação a fim de influenciar a fixação de preços do setor. Já os jogos estáticos de informação completa envolvem decisões simultâneas tomadas quando todos os jogadores conhecem as regras do jogo e as recompensas possíveis, como no Dilema do Prisioneiro, que será descrito mais adiante. Quando as decisões são simultâneas e pelo menos um dos jogadores desconhece as recompensas possíveis, os jogos são considerados estáticos de informação incompleta. Esse cenário se apresenta no jogo “pedra, papel e tesoura”, no qual todos os jogadores revelam suas escolhas ao mesmo tempo, sem ter noção da decisão tomada pelos outros jogadores. Vitale e Silva (2017) ressaltam que, embora tenha surgido no século XVII, a teoria só se desenvolveu após a Primeira Guerra Mundial, quando os jogos se tornaram objeto de estudo científico no campo da Matemática. A partir da observação de jogos de pôquer, os matemáticos começaram a analisar o que chamaram de jogos de estratégia. Ao mapear as jogadas possíveis nesse tipo de jogo, evidenciaram que as decisões de um jogador são baseadas na estratégia que ele acredita que o jogador adversário esteja adotando, o qual, por sua vez, também faz escolhas a partir das ações que espera que os demais jogadores façam. Figura 4: Tomada de decisão no pôquer. Fonte: Dreamstime. 14 Produtividade e Sustentabilidade Para Bêrni e Fernandez (2014), ao aplicar a teoria dos jogos, não podemos qualificar as estratégias propostas como melhor ou pior que a outra, já que elas advêm da aplicação de conceitos matemáticos que avaliam números e variáveis (entes ideais) e teoremas (relações ideais). A teoria dos jogos vem sendo aplicada nos últimos anos em diversas áreas do conhecimento (Administração, Biologia, Políticas Públicas etc.), mas é no campo da Economia que esse método mais cresceu. Segundo Balestrin e Verschoore (2016), nessa área, a teoria contribui oferecendo mais subsídios às escolhas dos tomadores de decisão. Por esse motivo, tem sido amplamente estudada, obtendo, como resultado, 6 prêmios Nobel nas últimas décadas, concedidos a economistas que trabalharam com base nela (NETO; MENDONÇA, 2010). Um dos premiados foi John Nash, que revolucionou a teoria ao introduzir o elemento “cooperação” e o conceito de “equilíbrio”, afirmando que há cenários em que é melhor cooperar do que competir. O exemplo clássico utilizado para mostrar um caso como esse é o Dilema do Prisioneiro (VITALE; SILVA, 2017), que apresenta um jogo estático de informação completa no qual os jogadores tomam decisões simultâneas, seguindo um determinado objetivo diante de regras conhecidas e tendo ciência de todas as recompensas possíveis (MARQUES et al., 2018; BÊRNI, 2014). Na situação hipotética do Dilema do Prisioneiro, dois prisioneiros sob custódia da polícia, e já condenados a 2 anos de prisão pelos crimes que não cometeram juntos, são interrogados, ao mesmo tempo, em salas diferentes sobre um assalto no qual o delegado suspeita que tenham atuado como parceiros. Não tendo evidências para a condenação quanto a esse outro crime, o promotor oferece aos dois o acordo de redução da pena para 1 ano de reclusão em troca da confissão do assalto. Todavia, o promotor avisa que Figura 5: John Forbes Nash. Fonte: Wikimedia. 15Produtividade e Sustentabilidade ofereceu o mesmo acordo para o outro prisioneiro, de modo que se apenas um deles confessar, o que negar o crime terá a pena aumentada para 4 anos, mas se os dois confessarem, a sentença de ambos será de 3 anos de prisão. Podemos resumir essa situação com a matriz no Quadro 1, em que os círculos no centro dos quadrantes mostram a combinação das estratégias escolhidas pelos prisioneiros (jogadores), e, para cada um dos cenários, a cor amarela indica as recompensas do prisioneiro 1, e a cor azul, as do prisioneiro 2. Veja o Quadro 1: PRISIONEIRO 2 CONFESSA (não coopera-N) NEGA (coopera-C) PR ISI ON EIR O 1 CONFESSA (não coopera-N) Cenário 1: Rivalidade universal NN 3 anos 3 anos Cenário 2: Caroneiro NC 4 anos 1 anos NEGA (coopera-C) Cenário 3: Trouxa CN 1 anos 4 anos Cenário 4: Cooperação universal CC 2 anos 2 anos Quadro 1: Matriz de estratégias e recompensas do dilema do prisioneiro. Fonte: Elaborado pela autora. Quem nunca assistiu a uma cena semelhante à descrita no Quadro 1 em algum filme ou série policial, não é mesmo? Essa é, sem dúvidas, uma decisão difícil para cada um dos prisioneiros, visto que existem 4 cenários possíveis. A decisão individual com melhor recompensa seria negar o crime, desde que o outro prisioneiro também o negasse. Nesse caso, ambos continuariam cumprindo a pena de 2 anos (cenário 4). Contudo, diante da possibilidade de o outro prisioneiro confessar (cenários 2 e 3), a decisão menos arriscada (estratégia ótima) para cada um dos prisioneiros seria confessar, adicionando apenas 1 ano na sentença, mas sem se arriscar a aumentar a pena para 4 anos. 16 Produtividade e Sustentabilidade Esse é um exemplo de equilíbrio de Nash em que os envolvidos dão a melhor resposta possível em um cenário no qual sua escolha depende da decisão do outro indivíduo envolvido. Esse princípio foi bastante adotado na delação premiada, recurso bastante utilizado no caso da Operação Lava Jato. Ele também é colocado em prática em decisões de compra e aquisição de empresas, de forma que cada envolvido desempenha o papel de jogador, buscando a maior recompensa (retorno) possível perante a estratégia da outra empresaincluída na negociação. Assim, cabe destacar que os agentes envolvidos nos jogos de interesses podem fazer escolhas influenciadas por outros integrantes ou motivadas pelo bem-estar próximo, as quais acabam influenciando o bem coletivo (BÊRNI; FERNANDEZ, 2014). A partir das propostas de Nash, a teoria dos jogos se transforma em uma ferramenta que possibilita que o Estado exerça suas funções regulatórias de forma mais eficiente, considerando os diferentes interesses envolvidos nas atividades reguladas e evitando custos sociais a elas associados (NETO; MENDONÇA, 2010). 3. Colaboração e Integração Balestrin e Verschoore (2016) destacam que na maior parte da literatura a competição entre as empresas é a perspectiva adotada, em detrimento da estratégia de cooperação. Isso porque os autores partem do princípio da exclusão competitiva. Contudo, defendem que é possível, sim, que as organizações coexistam competindo (jogos de soma zero), mas também cooperando (jogos de soma positiva) em busca de objetivos comuns. A colaboração passa a se apresentar como uma possibilidade no setor empresarial. Para Astley e Fombrun (1993 apud BALESTRIN; VERSCHOORE, 2016) as estratégias coletivas consistem na “formulação conjunta de políticas e implementação de ações pelos membros de coletividades interorganizacionais”. E, de fato, temos observado, cada vez mais, exemplos de empresas que atuam em cooperação, buscando potencializar resultados ou minimizar 17Produtividade e Sustentabilidade perdas. Essa prática pode ser verificada no compartilhamento de recursos entre empresas, bem como na atuação por meio de parcerias e consórcios, nos quais cada uma entra com um tipo de serviço, de modo que a situação seja favorável para ambas. Entre poder público e iniciativa privada, também podemos observar esse movimento. Na área ambiental, são muitos os projetos nos quais as empresas fornecem material, mão de obra ou recursos logísticos para colaborar com a execução dos serviços prestados pelo órgão ambiental. Por vezes, essa prática visa à melhoria da imagem empresarial com a realização de campanhas associadas a sistemas de gestão ambiental e de responsabilidade social. A colaboração e o compartilhamento estão ganhando espaço, sobretudo diante de um momento em que se pontua a necessidade de repensar os padrões de consumo. Segundo Alves e Vanalle (2016), para o sucesso da colaboração entre empresas, é preciso que se estabeleça uma relação de confiança mútua na qual haja disposição para o compartilhamento de informações com a troca de dados de forma ágil. A visão estratégica das empresas parceiras deve ser compatível no médio prazo, afinal, os resultados da colaboração podem demorar para ser alcançados. A parceira deve ser coordenada de modo a garantir o alinhamento na divisão dos recursos para que os trabalhos sejam otimizados, aumentando a produtividade dos parceiros. Por fim, os objetivos da parceria devem ser reconhecidos pelos parceiros, os quais devem atuar colaborativamente, respeitando e garantindo a segurança das informações confidenciais. No setor de tecnologia, as grandes corporações têm unido forças no mundo todo para potencializar a entrada ou permanência de seus produtos no mercado. A Samsung, por exemplo, tem realizado diversas parcerias para melhorar seus produtos ou integrá-los a produtos de outras marcas (inclusive de concorrentes). A empresa divulgou, recentemente, uma parceria com a Microsoft para a integração entre Android e Windows. Assim, um novo modelo de smartphone da Samsung já virá com aplicativos da Microsoft instalados e permitirá o espelhamento de mensagens Comentário Curiosidade 18 Produtividade e Sustentabilidade do celular para o computador, assim como a realização de chamadas direto do computador. Em contrapartida, os aparelhos da marca serão vendidos nas lojas de varejo da Microsoft, nas quais os compradores obterão créditos para a assinatura de serviços associados aos seus aplicativos. Em outra parceria recente, a Samsung se uniu com a Xiaomi para desenvolver um componente que possibilita que celulares de ambas as marcas tenham as câmeras mais potentes do mercado. Outro exemplo interessante é a iniciativa da empresa chilena Triciclos, que atua na gestão de resíduos pós-consumo e conscientização de consumidores, instalando seus pontos de coleta por meio de parcerias. Varejistas e grandes lojas fornecem a infraestrutura para esses pontos, enquanto marcas de bens de consumo, como a Coca-cola e a Pepsi, financiam a operação. Nesse modelo de cooperação, enquanto a Triciclos consegue viabilizar seu negócio, as parceiras encontram formas de atender às novas exigências legais e de mercado relativas à responsabilidade pela logística reversa de embalagens. Esse exemplo está alinhado com as novas tendências colaborativas propostas pelas economias compartilhada e circular. Na economia compartilhada, pessoas e empresas dividem espaços e recursos, evitando seu subaproveitamento. Na economia circular, discute-se os padrões de consumo e busca-se novos padrões que abrangem desde o design do produto até o descarte de resíduos, de modo a minimizar o consumo de recursos naturais, reduzir poluição ambiental e reaproveitar, ao máximo, materiais e produtos. As associações e confederações que representam setores e seus interesses têm contribuído na articulação de acordos de cooperação, por meio dos quais se otimiza a logística da coleta de resíduos entre empresas concorrentes, mas que possuem as mesmas obrigações legais. O Programa Jogue Limpo foi criado em 2005 por empresas associadas ao Sindicato Nacional das Empresas Distribuidoras de Combustíveis e de Lubrificantes (Sindicom) para a coleta de embalagens de óleo lubrificante, usado em postos de combustíveis, e sua devida destinação. Atualmente, participam do programa empresas concorrentes como Petrobras, Shell e Total. Ao contratarem o serviço de forma colaborativa, os participantes economizam recursos financeiros e viabilizam uma coleta mais ágil em razão de uma maior escala na geração de resíduos. 19Produtividade e Sustentabilidade Nos últimos anos, vemos o surgimento de inúmeras iniciativas de inovação aberta e colaborativa em todos os lugares do mundo, inclusive no Brasil. Você tem uma ideia incrível para resolver um problema, mas não tem recursos ou parceiros para executá-la? Grandes corporações, ONGs e agências de fomento têm criado ambientes de inovação, convidando pessoas de toda a sociedade a contribuírem para encontrar soluções para problemas de seus processos. Essa estratégia traz mais agilidade no lançamento de novos produtos e solucionamento de problemas, pois incorpora a visão dos consumidores, bem como as demandas, os conhecimentos e a percepção da sociedade em geral. As maratonas de desenvolvimento colaborativo de soluções tecnológicas, conhecidas como hackathons, vêm se multiplicando no Brasil. De modo geral, as inscrições para esses eventos são abertas a qualquer um que deseje colaborar com integrantes de equipes multidisciplinares para propor soluções aos problemas apresentados pelos organizadores. Somente no ano de 2019, foram realizados, no Brasil, hackathons promovidas por grandes empresas (Petrobras, Uber, Globo, Radix, Shell e Microsoft), pelo poder público, que começa a incentivar essa abordagem (Prefeitura do Rio de Janeiro, por meio de seu Centro de Operações Rio – COR Rio, Prefeitura de Niterói e Prefeitura de Salvador,), instituições de pesquisa e desenvolvimento (Fundação Oswaldo Cruz – Fiocruz, Universidade de São Paulo – USP e NASA) e, até mesmo, por ONGs, como a Teto. Essa prática tem se consolidado significativamente, de forma que o BNDES, a Faperj e outros bancos e agências de fomento têm criado editais para incentivar programas de inovação aberta. Esse modelo de sistema aberto e colaborativo é uma tendência que já se manifesta no Brasil, visto que editais e chamadas para eventos de inovação vêm se multiplicandonos últimos anos. Fique de olho nas oportunidades! Quem sabe sua ideia possa ser adotada por uma grande empresa e uma porta de sucesso no empreendedorismo e no mercado de trabalho seja aberta? Vimos, nesta unidade, que as crises sociais e econômicas levaram à evolução do conceito de desenvolvimento, e que, com o tempo, as questões sociais e ambientais também passaram a integrar essa ideia. 20 Produtividade e Sustentabilidade Pudemos perceber que existem diferentes visões quanto ao nível de intervencionismo do Estado sobre o domínio econômico, e, também, que o registro histórico evidenciou a necessidade de o Estado atuar ao menos como regulador, a fim de garantir direitos essenciais aos cidadãos. Entendemos que, para desempenhar com maior eficiência e justiça suas funções regulatórias, o Estado deve ter ciência dos interesses envolvidos nos processos regulados e trabalhar no sentido de garantir que os prestadores de serviços atendam aos consumidores adequadamente. Conhecemos a teoria dos jogos e descobrimos que, diante de uma situação específica, as estratégias dos envolvidos (jogadores) podem ser influenciadas ou se basear nos interesses dos outros participantes, mas pudemos entender que, de maneira geral, busca-se a maior recompensa possível, ponderando-se os riscos associados. Descobrimos, também, que se por um lado a competição é enfatizada em alguns processos, a colaboração também tem potencial para ser implementada com ganhos reais para os envolvidos, desde que os atores e seus interesses sejam identificados. 21Produtividade e Sustentabilidade Referências ALVES, A. P. A.; VANALLE, R. M. Colaboração entre empresas concorrentes Estudo de caso no setor de auto peças. Revista ESPACIOS, v. 38, n. 13. 2017. BALESTRIN, A.; VERSCHOORE, J. Redes de cooperação empresarial: estratégias de gestão na nova economia. 2 ed. Porto Alegre: Bookman, 2016. BÊRNI, D. A.; FERNANDEZ, E. P. M. Teoria dos jogos: crenças, desejos e escolhas. 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