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91VOL. 23, N.o 1 — JANEIRO/JUNHO 2005 Prevenção em saúde Lúcio Meneses de Almeida é assistente eventual de saúde pública no Centro de Saúde de Mira (SRS de Coimbra) e no Centro Regio- nal de Saúde Pública do Centro. Submetido à apreciação: 24 de Março de 2004. Aceite para publicação: 1 de Setembro de 2004. Da prevenção primordial à prevenção quaternária LÚCIO MENESES DE ALMEIDA O autor descreve sucintamente os vários níveis de preven- ção em saúde, incluindo o mais recente: a prevenção qua- ternária. Este quinto nível de prevenção visa detectar indi- víduos em risco de sobretratamento (overmedicalisation), por forma a protegê-los do intervencionismo médico ina- propriado, além de visar capacitar os utentes enquanto consumidores de cuidados de saúde. A pertinência da prevenção quaternária resulta dos custos crescentes em saúde nos últimos quarenta anos, decorren- tes quer do envelhecimento da população, quer da inova- ção tecnológica hospitalar. O autor aborda ainda o «marketing do medo» (marketing of fear), que consiste na sobrestimação de situações patológi- cas na população em geral, bem como na «medicalização» de factores de risco, visando alargar o mercado dos consu- midores de saúde e, consequentemente, o mercado farma- cêutico. É salientada a importância da análise das decisões clínicas como forma de aumentar a qualidade do acto médico e a utilização eficiente dos métodos diagnósticos e terapêuticos. Palavras-chave: prevenção primordial; prevenção quater- nária. Introdução A medicina é tão antiga como a própria humanidade, já que desde sempre a doença e os acidentes acom- panharam o homem: de facto, e segundo o autor clás- sico Plínio, «houve povos sem médicos, mas nunca houve povos sem medicina» (Sousa, 1981). Na Grécia antiga, berço da civilização ocidental, a prática da medicina assentava, primariamente, na promoção de estilos de vida saudáveis — nomeada- mente através da «dietética» (Nutton, 1996). Consi- derava-se que os estados patológicos resultavam do desequilíbrio entre as causas da doença e as forças curativas da natureza: assim, a função do médico na Grécia antiga era auxiliar estas forças curativas a restabelecerem o estado fisiológico (saúde), promo- vendo as condições favoráveis para tal e abstendo-se de realizar acções intempestivas ou inadequadas (Sousa, 1981). Com o advento do cristianismo foram criados os primeiros hospitais — instituições devotadas ao cui- dado dos enfermos mais desfavorecidos —, estando frequentemente associados a mosteiros e igrejas (Porter, 1996). Muitas vezes, a capacidade dos hospi- tais medievais não excedia a dúzia de camas e o seu corpo «clínico» era composto por um par de religio- sos (Porter, 1996). Desde a Idade Média até à actualidade, os hospitais passaram de instituições caritativas dedicadas aos pobres e indigentes para instituições prestadoras de cuidados de saúde de ponta da globalidade da popu- 92 REVISTA PORTUGUESA DE SAÚDE PÚBLICA Prevenção em saúde lação, assumindo-se, igualmente, como centros de investigação médica (Porter, 1996). Nos últimos quarenta anos temos vindo a assistir nos países industrializados a uma «explosão de custos» (cost explosion) no sector da saúde (Zweifel e Dreyer, 1997) atribuível não só ao envelhecimento da popu- lação, mas também à inovação tecnológica hospitalar, à alteração da estrutura familiar (institucionalização dos idosos) e às maiores expectativas das populações face à saúde — traduzidas pela exigência de mais e melhores cuidados de saúde (Clewer e Perkins, 1998). Mas, se a medicina curativa terá existido desde sem- pre, considera-se que a emergência da medicina pre- ventiva ocorreu no século XVIII (Pita, 1996) com a vacinação jenneriana. Neste século surgem, igual- mente, várias obras destinadas a educar a generali- dade da população sobre saúde (Pita, 1996). Se a finalidade da medicina preventiva é melhorar a saúde dos indivíduos assintomáticos (Getz, Sigurds- son e Hetlevik, 2003), também é um facto que o número de situações ou doenças rastreáveis tem vindo a aumentar, ao ponto de se falar numa «epide- mia de riscos» (risk epidemic) (Skolbekken, 1995, citado por Getz, Sigurdsson e Hetlevik, 2003); desta forma, muitos autores referem a «medicalização» da sociedade como «efeito adverso» da medicina pre- ventiva (Verweij, 1999). Segundo a Conferência Internacional sobre a Promo- ção da Saúde, realizada em Otava (Canadá) em 1986 sob os auspícios da OMS, a saúde, mais do que um objectivo de vida, é um recurso do dia a dia. A res- ponsabilidade da promoção da saúde é comum a todos os sectores da sociedade, através da capacita- ção (empowerment) dos indivíduos e das comunida- des, da criação de ambientes favoráveis à saúde e do desenvolvimento de aptidões pessoais (pela educação para a saúde). Os progressos no conhecimento do genoma humano e os avanços da engenharia genética abriram, em finais do século XX, uma nova perspectiva à medicina humana: a medicina preditiva. Esta permite conhecer, para cada indivíduo e muito precocemente, os facto- res de risco (genómicos) que poderão ameaçar a sua vida (Sournia e Ruffie, 1986). Enquanto a medicina preventiva terá tido como con- sequência negativa a «medicalização» da sociedade, a medicina preditiva poderá resultar na estratificação da sociedade em «geneticamente aptos» e «genetica- mente inaptos». Desta forma, os desafios éticos e morais da medicina preditiva — mas também os seus ganhos potenciais — superam em muito os da medi- cina preventiva. Neste artigo são descritos sumariamente os vários níveis de prevenção em saúde, bem como as suas implicações em saúde pública. É dada especial rele- vância a um nível de prevenção recentemente des- crito e que é, simultaneamente, o nível mais elevado de prevenção em saúde: a prevenção quaternária. Pretende-se divulgar este nível de prevenção (no que diz respeito às suas definições e conceitos), acen- tuando a sua pertinência em termos de consumo de cuidados de saúde, e reflectir sobre um fenómeno já evidente na nossa sociedade que é a sua «medicaliza- ção». Níveis de prevenção em saúde Até há pouco tempo considerava-se que existiam quatro níveis de prevenção em saúde: a prevenção primordial e as «clássicas» prevenção primária, secundária e terciária. A prevenção primordial, estreitamente associada às doenças crónico-degenerativas (noncommunicable diseases — NCD), visa evitar a emergência e o esta- belecimento de estilos de vida que se sabem contri- buir para um risco acrescido de doença (Alwan, 1997). Deverá incluir políticas e programas de pro- moção de determinantes «positivos» de saúde, como a abstinência tabágica, a nutrição adequada e a prá- tica regular do exercício físico (Alwan, 1997). Assim, os conceitos de prevenção primordial e de promoção da saúde confundem-se, sendo — no entanto — complementares. Segundo Czeresnia, enquanto a prevenção visa diminuir a probabilidade da ocorrência de uma doença ou enfermidade especí- fica, a promoção da saúde visa aumentar, através de esforços intersectoriais, a saúde e o bem-estar geral (Czeresnia, 1999). Há autores que consideram que a promoção da saúde está incluída no nível primário de prevenção (Jekel, Elmore e Katz., 1999; Jamoulle, 2000; Jamoulle et al., 2002), correspondendo a um seu «subtipo» ines- pecífico (Jekel, Elmore e Katz, 1999). O nível primordial de prevenção tem um impacto notável em saúde pública. Assim, e por exemplo, no que diz respeito à prática regular do exercício físico, esta é, isoladamente, uma das actividades promotoras de saúde mais importantes (Barker, 1998), à seme- lhança da dieta — dois terços das mortes anuais nos EUA correspondem a doenças relacionadas com a alimentação (Nestle, 1998). A prevenção primária inclui o conjunto das activida- des que visam evitar ou remover a exposição de um indivíduo ou de uma população a um factor de risco ou causal antes que se desenvolva um mecanismo patológico (Jamoulle, 2000; Jamoulle et al., 2002). Inclui a imunização, que visa aumentar a resistência do hospedeiro a um determinado microorganismo.93VOL. 23, N.o 1 — JANEIRO/JUNHO 2005 Prevenção em saúde Desta forma, a finalidade deste nível de prevenção é reduzir a incidência da doença, através do controlo dos factores de risco ou causais, ou ainda reduzir o risco médio na população (Alwan, 1997). A prevenção secundária tem como finalidade a detecção de um problema de saúde num indivíduo ou numa população numa fase precoce, por forma a condicionar favoravelmente a sua evolução (Jamoulle, 2000; Jamoulle et al., 2002) — isto pres- supõe, entre outros, o conhecimento da história natu- ral da doença e a existência de um período de detec- ção precoce (incluído no período pré-clínico) suficientemente longo. É neste nível de prevenção que se enquadram os rastreios e os achados de caso (Fowler e Gray, 1983): ambos visam identificar indivíduos presumivelmente doentes mas assintomáticos relativamente à situação em estudo. Note-se que, enquanto um rastreio (screening) tem um âmbito comunitário, o achado de caso (case finding) diz respeito a indivíduos sob cuidados médi- cos (Jekel, Elmore e Katz, 1999; Last, 1995). Por outro lado, nos achados de caso, geralmente, a inicia- tiva é individual, e não dos serviços de saúde — exceptuam-se os «achados de caso activos» (active case finding), em que a iniciativa da procura dos casos é dos serviços de saúde ou dos seus profissio- nais (Last, 1995). De um modo geral, o rastreio aplica-se a doenças crónicas (Last, 1995) e que progridem para estádios progressivamente mais graves a não ser que sejam tratadas (Morrison, 1998), sendo que a sua finalidade é reduzir a mortalidade ou a morbilidade por uma determinada doença no grupo rastreado (Morrison, 1998). Já o achado de caso consiste numa detecção oportu- nista da doença ou seus factores de risco em indiví- duos que consultam o seu médico por outros proble- mas (Fowler e Gray, 1983) — aplica-se, por exemplo, àqueles indivíduos que são sujeitos a roti- nas pré-operatórias no decurso de cirurgias electivas (Jekel, Elmore e Katz, 1999). Alguns autores consideram, no entanto, que os acha- dos de caso (case finding) consistem na procura de casos e de controlos para estudos epidemiológicos (Tyler e Last, 1998). Já a prevenção terciária tem como finalidade reduzir os custos sociais e económicos dos estados de doença na população através da reabilitação e reintegração precoces e da potenciação da capacidade funcional remanescente dos indivíduos. Atendendo à associação entre incapacidade e doença crónica (Barker, 1998), a prevenção terciária implica o tratamento (e controlo) das doenças crónicas (Fowler e Gray, 1983; Alwan, 1997). Assim, o nível terciário de prevenção corresponde, basicamente, à «gestão» dos estados de doença (Fowler e Gray, 1983). Prevenção quaternária: to heal or to harm? A prática da medicina clínica resulta do equilíbrio entre a «gestão da incerteza» diagnóstica e a limita- ção dos riscos terapêuticos (Jamoulle et al., 2002). Ao contrário do direito, em que «mais vale soltar um criminoso do que prender um inocente», na medicina clínica é preferível «tratar» um são a não tratar um doente (Jamoulle et al., 2002) — daí verificar-se, muitas vezes, um excesso de intervencionismo médico (curativo ou preventivo). Em 1995, M. Jamoulle e M. Roland apresentaram em Hong-Kong um poster intitulado Quaternary prevention and the glossary of general practice/family medicine, em que propunham um novo nível de pre- venção: a prevenção quaternária (Jamoulle, 2000). Este nível de prevenção — ao qual podemos chamar «prevenção da iatrogenia», ou «prevenção da preven- ção (inapropriada)» — foi aceite pelo Comité Inter- nacional de Classificação da WONCA em 1999 (Jamoulle, 2000) — trata-se da resposta ao eterno dilema to heal or to harm? A prevenção quaternária visa «evitar ou atenuar o excesso de intervencionismo médico» associado a actos médicos desnecessários ou injustificados; por outro lado, pretende-se capacitar os utentes ao forne- cer-lhes a informação necessária e suficiente para poderem tomar decisões autónomas, sem falsas expectativas, conhecendo as vantagens e os inconve- nientes dos métodos diagnósticos ou terapêuticos propostos (Gérvas e Férnandez, 2003). Este nível mais elevado de prevenção em saúde con- siste na «detecção de indivíduos em risco de sobre- tratamento (overmedicalisation) para os proteger de novas intervenções médicas inapropriadas e sugerir- -lhes alternativas eticamente aceitáveis» (Jamoulle, 2000). Alguns autores consideram que a prevenção quaternária é sinónima de «prevenção do sofri- mento» (prevention of suffering) (MacDonald, 1991; Weinstein, 2001), correspondendo à 4.a e última fase de controlo do cancro (cancer control): a 1.a fase corresponde à prevenção primária, a 2.a fase corres- ponde à detecção e tratamento precoce das lesões neoplásicas (prevenção secundária) e a 3.a fase cor- responde ao tratamento, reabilitação e melhoria da sobrevida dos doentes cancerosos (prevenção terciá- ria) (MacDonald, 1991). Assim, a prevenção quaternária em oncologia enqua- dra-se nos cuidados paliativos, cuja finalidade é a 94 REVISTA PORTUGUESA DE SAÚDE PÚBLICA Prevenção em saúde melhoria da qualidade de vida dos doentes, prevenindo e aliviando o sofrimento dos próprios e dos seus fami- liares (OMS, 2002), mediante a detecção e tratamento (o mais precoce possível) dos sintomas relacionados com o cancro (MacDonald, 1991; Weinstein, 2001). À medida que a doença progride e a possibilidade de prolongar a vida se vai tornando menor, os cuidados de saúde devem reorientar-se no sentido de propor- cionarem progressivamente mais conforto e quali- dade de vida (Byock, 2000) — trata-se de uma abor- dagem integrada, traduzida por um continuum de cuidados, em que os cuidados paliativos se iniciam mesmo antes dos cuidados curativos e das terapêuti- cas que visam prolongar a vida se tornarem inefica- zes (MacDonald, 1998; Byock, 2000). Aparentemente, estamos perante uma perspectiva divergente da anterior (prevenção da iatrogenia); no entanto, ao reorientarem-se os cuidados de saúde no sentido de proporcionarem uma melhor qualidade de vida aos doentes incuráveis, previnem-se as interven- ções médicas desnecessárias ou inapropriadas — porque de benefício duvidoso ou de risco despropor- cionalmente elevado. De referir que a prevenção quaternária em cuidados paliativos diz respeito não só à prevenção e tra- tamento da dor (uma vez já estabelecida), mas tam- bém à prevenção e tratamento de outros sintomas e sinais, como os estados confusionais e a desnutrição (MacDonald, 1998), bem como o sofrimento psi- cossocial e espiritual (OMS, 2002). De qualquer das formas, a prevenção quaternária passa pela «análise das decisões clínicas» (clinical decision analysis) — estratégia que visa a melhoria da qualidade (e racionalidade económica) do acto médico (Weinstein e Fineberg, 1980). Para tal deve apoiar-se na epidemiologia clínica e na medicina baseada na «evidência» (evidence-based medicine) — ou, traduzindo com mais propriedade, na medicina baseada na prova (evidence = prova). Note-se que a análise das decisões clínicas — que não é mais do que uma «abordagem do processo de decisão em situações de incerteza» (Weinstein e Fineberg, 1980) — não tem por objectivo substituir o julgamento clínico, mas antes complementar e forta- lecer a decisão clínica (Weinstein e Fineberg, 1980). Esta última deve ser norteada por dois princípios fundamentais: a proporcionalidade e a precaução (primum non nocere). O «princípio da proporcionalidade» implica que os ganhos potenciais de uma qualquer intervenção devam ser ponderados face aos riscos dessa mesma interven- ção (Byock, 2000), por forma a evitar a iatrogenia (do grego iatros — médico + genesis — origem) ou a patopoiese (do grego pathos — doença + poiese — formação). Nas últimas décadas, o número de factores de risco em populações saudáveis tem vindo a aumentar na literatura médica, falando-se mesmo numa «epidemia de riscos» (risk epidemic) (Skolbekken, 1995, citado por Getz, Sigurdsson e Hetlevik, 2003); este facto, associado alimiares de intervenção cada vez mais baixos, faz com que cada vez mais indivíduos saudá- veis sejam rotulados como estando «em risco» e tenham necessidade de cuidados médicos (Skol- bekken, 1995, citado por Getz, Sigurdsson e Hetlevik, 2003) — é a «medicalização» dos factores de risco (Gøtzsche, 2002). Alguns autores têm chamado a atenção para o alega- do «patrocínio» da doença pela indústria farmacêu- tica: através de campanhas dirigidas para o público em geral, a indústria farmacêutica pretenderia «ven- der» a doença para chamar a atenção para as terapêu- ticas mais recentes (Moynihan, Heath e Henry, 2002). A estratégia usada seria o marketing do medo (marketing of fear), que se traduz pela sobrestimação de situações clínicas e factores de risco na população e pela «medicalização» de situações fisiológicas (Moynihan, Heath e Henry, 2002). De facto, nos últimos anos temos vindo a assistir a uma «dessacralização» dos clínicos: o público tor- nou-se mais activo e aceita menos passivamente a autoridade médica; secundariamente, tornou-se mais permeável a outras influências, nem sempre isentas (Moynihan, Heath e Henry, 2002). A publicidade farmacêutica, redireccionada para o público em geral, contribui para a difusão de novas categorias de doenças e para a medicalização da vida diária (Moynihan, Heath e Henry, 2002; Cathebras, 2003). Desta forma, importa promover a divulgação de fon- tes independentes de informação em saúde (Moyni- han, Heath e Henry, 2002), bem como capacitar os utentes, enquanto consumidores de saúde, relativa- mente às implicações (individuais, sociais e econó- micas) de um consumo inapropriado de cuidados de saúde. Só assim se poderão evitar as consequências da «medicalização» inapropriada, traduzidas pela «rotu- lagem» (labelling) indevida, iatrogenia e desperdício de recursos (Moynihan, Heath e Henry, 2002). Conclusões A prevenção quaternária, o nível mais elevado de prevenção em saúde, pretende evitar o excesso de intervencionismo médico através da detecção de indi- víduos em risco de sobretratamento — trata-se, pois, da prevenção da iatrogenia. Isto implica não só a prescrição criteriosa e economi- camente racional de métodos diagnósticos e terapêu- 95VOL. 23, N.o 1 — JANEIRO/JUNHO 2005 Prevenção em saúde ticos pelos clínicos, mas também a capacitação dos utentes/consumidores de cuidados de saúde, visando a procura apropriada dos cuidados de saúde e o conhecimento das vantagens e inconvenientes dos métodos diagnósticos e terapêuticos. A análise das decisões clínicas, a epidemiologia clí- nica e a medicina baseada na prova (ou na «evidên- cia») são alguns dos instrumentos que poderão auxi- liar os clínicos na tomada de decisões — quer em termos diagnósticos e terapêuticos, quer em termos de racionalidade económica. O nível quaternário de prevenção assenta em dois princípios fundamentais: o princípio da precaução (primum non nocere) e o princípio da proporcionali- dade. Através da aplicação destes princípios na prá- tica clínica pretende-se curar (to heal) sem causar dano (to harm), além da promoção de uma utilização mais criteriosa dos recursos em saúde. A prevenção quaternária implica o respeito pela autonomia do utente, o que pressupõe a possibilidade de este aceitar ou rejeitar opções terapêuticas ou pre- ventivas (uma vez devidamente informado), bem como o direito de não ser confrontado com «rastreios» oportunistas, não relacionados com o motivo que o levou a consultar o seu clínico (Getz, Sigurdsson e Hetlevik, 2003). Este nível de prevenção é particularmente pertinente no grupo etário dos idosos, atendendo à redução fisiológica da sua reserva funcional («homeoste- nose») e consequente risco acrescido de iatroge- nia — nomeadamente farmacológica (Almeida, 2004). De salientar que, muitas vezes, o excesso de «inter- vencionismo» médico resulta da pressão exercida pelos utentes sobre os clínicos e que se traduz na chamada «medicina defensiva». Ao promover a capacitação dos consumidores de saúde, a prevenção quaternária «toca» a outra extre- midade da prevenção em saúde — a prevenção pri- mordial —, parecendo, pois, encerrar o «ciclo» da prevenção. Referências bibliográficas ALMEIDA, L. M. — Envelhecimento e saúde pública : a promo- ção do «envelhecer activo». Anamnesis. 13 : 126 (2004) 34-37. ALWAN, A. — Noncommunicable diseases : a major challenge for public health in the region. Eastern Mediterranean Health Journal. 3 : 1 (1997) 6-16. BARKER, W. H. — Prevention of disability in older persons. In WALLACE, R. B., ed.lit. — Public health and preventive medicine. Stamford (Connecticut) : Appleton & Lange, 1998. 1059-1068. BYOCK, I. — Completing the continuum of cancer care : integrating life-prolongation and palliation. CA : A Cancer Journal for Clinicians. 50 : 2 (2000) 123-132. CATHEBRAS, P. — Le docteur Knock habite à Wall Street : les nouvelles cibles de l’industrie pharmaceutique. 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Geneva : World Health Organization, 2002. WORLD HEALTH ORGANIZATION. Health and Welfare Canada. Canadian Public Health Association — Ottawa Charter for Health Promotion. Ottawa (Ontario) : World Health Organization. Health and Welfare Canada. Canadian Public Health Association, 1986. ZWEIFEL, P.; DREYER, F. — Health economics. New York : Oxford University Press, 1997. Abstract FROM PRIMORDIAL TO QUATERNARY PREVENTION The author describes briefly the several identified levels of prevention including the most recent one: the quaternary pre- vention. This fifth level of prevention aims to identify patients at risk of «overmedicalisation» — in order to protect them from new medical invasion — and to empower patients/health consumers. Quaternary prevention is pertinent because of the continuing growth of health care expenditure during the last 40 years, secondary to ageing of the population and to hospitals’ technologic innovation. The author describes the so-called «marketing of fear», which consists on the over-estimation of disease and medicalisation of risk factors in order to expand markets for new products. The importance of clinical decision analysis is emphasised, as a way to improve medical practice and to promote an efficient use of diagnostic and therapeutic tools. Keywords: primordial prevention; quaternary prevention. << /ASCII85EncodePages false /AllowTransparency false /AutoPositionEPSFiles true /AutoRotatePages /All /Binding /Left /CalGrayProfile (Dot Gain 20%) /CalRGBProfile (sRGB IEC61966-2.1) /CalCMYKProfile (U.S. Web Coated \050SWOP\051 v2) /sRGBProfile (sRGB IEC61966-2.1) /CannotEmbedFontPolicy /Warning /CompatibilityLevel 1.4 /CompressObjects /Tags /CompressPages true /ConvertImagesToIndexed true /PassThroughJPEGImages true /CreateJDFFile false /CreateJobTicket false /DefaultRenderingIntent /Default /DetectBlends true /ColorConversionStrategy /LeaveColorUnchanged /DoThumbnails false /EmbedAllFonts true /EmbedJobOptions true /DSCReportingLevel 0 /EmitDSCWarnings false /EndPage -1 /ImageMemory 1048576 /LockDistillerParams false /MaxSubsetPct 100 /Optimize true /OPM 1 /ParseDSCComments true /ParseDSCCommentsForDocInfo true /PreserveCopyPage true /PreserveEPSInfo true /PreserveHalftoneInfo false /PreserveOPIComments false /PreserveOverprintSettings true /StartPage 1 /SubsetFonts true /TransferFunctionInfo /Apply /UCRandBGInfo /Preserve /UsePrologue false /ColorSettingsFile () /AlwaysEmbed [ true ] /NeverEmbed [ true ] /AntiAliasColorImages false /DownsampleColorImages true /ColorImageDownsampleType /Bicubic /ColorImageResolution 300 /ColorImageDepth -1 /ColorImageDownsampleThreshold 1.50000 /EncodeColorImages true /ColorImageFilter /DCTEncode /AutoFilterColorImages true /ColorImageAutoFilterStrategy /JPEG /ColorACSImageDict << /QFactor 0.15 /HSamples [1 1 1 1] /VSamples [1 1 1 1] >> /ColorImageDict << /QFactor 0.15 /HSamples [1 1 1 1] /VSamples [1 1 1 1] >> /JPEG2000ColorACSImageDict << /TileWidth 256 /TileHeight 256 /Quality 30 >> /JPEG2000ColorImageDict << /TileWidth 256 /TileHeight 256 /Quality 30 >> /AntiAliasGrayImages false /DownsampleGrayImages true /GrayImageDownsampleType /Bicubic /GrayImageResolution 300 /GrayImageDepth -1 /GrayImageDownsampleThreshold 1.50000 /EncodeGrayImages true /GrayImageFilter /DCTEncode /AutoFilterGrayImages true /GrayImageAutoFilterStrategy /JPEG /GrayACSImageDict << /QFactor 0.15 /HSamples [1 1 1 1] /VSamples [1 1 1 1] >> /GrayImageDict << /QFactor 0.15 /HSamples [1 1 1 1] /VSamples [1 1 1 1] >> /JPEG2000GrayACSImageDict << /TileWidth 256 /TileHeight 256 /Quality 30 >> /JPEG2000GrayImageDict << /TileWidth 256 /TileHeight 256 /Quality 30 >> /AntiAliasMonoImages false /DownsampleMonoImages true /MonoImageDownsampleType /Bicubic /MonoImageResolution 1200 /MonoImageDepth -1 /MonoImageDownsampleThreshold 1.50000 /EncodeMonoImages true /MonoImageFilter /CCITTFaxEncode /MonoImageDict << /K -1 >> /AllowPSXObjects false /PDFX1aCheck false /PDFX3Check false /PDFXCompliantPDFOnly false /PDFXNoTrimBoxError true /PDFXTrimBoxToMediaBoxOffset [ 0.00000 0.00000 0.00000 0.00000 ] /PDFXSetBleedBoxToMediaBox true /PDFXBleedBoxToTrimBoxOffset [ 0.00000 0.00000 0.00000 0.00000 ] /PDFXOutputIntentProfile () /PDFXOutputCondition () /PDFXRegistryName (http://www.color.org) /PDFXTrapped /Unknown /Description << /FRA <FEFF004f007000740069006f006e00730020007000650072006d0065007400740061006e007400200064006500200063007200e900650072002000640065007300200064006f00630075006d0065006e00740073002000500044004600200064006f007400e900730020006400270075006e00650020007200e90073006f006c007500740069006f006e002000e9006c0065007600e9006500200070006f0075007200200075006e00650020007100750061006c0069007400e90020006400270069006d007000720065007300730069006f006e00200061006d00e9006c0069006f007200e90065002e00200049006c002000650073007400200070006f0073007300690062006c0065002000640027006f00750076007200690072002000630065007300200064006f00630075006d0065006e007400730020005000440046002000640061006e00730020004100630072006f0062006100740020006500740020005200650061006400650072002c002000760065007200730069006f006e002000200035002e00300020006f007500200075006c007400e9007200690065007500720065002e> /ENU (Use these settings to create PDF documents with higher image resolution for improved printing quality. 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