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0 1 SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO ................................................................................................ 3 2 PATOLOGIAS RENAIS ................................................................................... 4 2.1 Doença renal crônica (DRC) ..................................................................... 5 2.2 Insuficiência renal aguda .......................................................................... 6 3 DIETOTERAPIA .............................................................................................. 8 4 DIETOTERAPIA NA DOENÇA RENAL CRÔNICA ......................................... 9 4.1 Avaliação nutricional ............................................................................... 10 4.2 Antropometria ......................................................................................... 11 4.3 Parâmetros laboratoriais ......................................................................... 11 4.4 Avaliação do consumo alimentar ............................................................ 12 5 DIETOTERAPIA NA DRC FASE NÃO DÍALITICA ........................................ 12 5.1 Objetivos da dietoterapia na DRC fase não díalitica .............................. 13 5.2 Proteínas e energia ................................................................................ 16 5.3 Sódio ...................................................................................................... 19 5.4 Potássio .................................................................................................. 20 5.5 Fosforo ................................................................................................... 22 6 HEMODIALISE .............................................................................................. 24 7 INTERVENÇÃO NUTRICIONAL NA DRC FASE DÍALITICA ........................ 25 7.1 Peso livre de edema (“peso seco’) ......................................................... 27 7.2 Energia ................................................................................................... 27 7.3 Proteínas ................................................................................................ 28 7.4 Sódio e líquidos ...................................................................................... 29 7.5 Potássio .................................................................................................. 30 7.6 Fósforo ................................................................................................... 31 7.7 Vitaminas e oligoelementos .................................................................... 32 2 8 LESÃO RENAL AGUDA................................................................................ 33 8.1 Antropometria ......................................................................................... 35 8.2 Índice de Massa Corporal (IMC) ............................................................. 36 8.3 Nutrição na lesão renal aguda ................................................................ 36 9 BIBLIOGRAFIA ............................................................................................. 40 3 1 INTRODUÇÃO Prezado aluno! O Grupo Educacional FAVENI, esclarece que o material virtual é semelhante ao da sala de aula presencial. Em uma sala de aula, é raro – quase improvável - um aluno se levantar, interromper a exposição, dirigir-se ao professor e fazer uma pergunta, para que seja esclarecida uma dúvida sobre o tema tratado. O comum é que esse aluno faça a pergunta em voz alta para todos ouvirem e todos ouvirão a resposta. No espaço virtual, é a mesma coisa. Não hesite em perguntar, as perguntas poderão ser direcionadas ao protocolo de atendimento que serão respondidas em tempo hábil. Os cursos à distância exigem do aluno tempo e organização. No caso da nossa disciplina é preciso ter um horário destinado à leitura do texto base e à execução das avaliações propostas. A vantagem é que poderá reservar o dia da semana e a hora que lhe convier para isso. A organização é o quesito indispensável, porque há uma sequência a ser seguida e prazos definidos para as atividades. Bons estudos! 4 2 PATOLOGIAS RENAIS Fonte: drmaurofrancajr.com Os rins são órgãos pares responsáveis por inúmeras funções que preservam a homeostasia do organismo. Dessa forma, ao ser acometido por uma patologia, o sistema renal pode comprometer o equilíbrio de todo o organismo. Das principais funções dos rins, realça-se a eliminação de resíduos, o controle dos fluidos corporais e da pressão arterial, a regulação do equilíbrio hidroeletrolítico e de ácido-base, a síntese e a regulação de hormônios. Além disso, o rim é um dos principais órgãos envolvidos no metabolismo dos nutrientes e equilíbrio nutricional do organismo. A principal função do rim é manter o equilíbrio homeostático com relação aos lí- quidos, eletrólitos e solutos orgânicos. O rim normalmente tem a capacidade de realizar esta função em uma ampla gama de flutuações dietéticas de sódio, água e vários solutos. Tal atividade é exercida pela filtração continua do sangue e pelas alterações (secreção e absorção) neste liquido filtrado. Este órgão recebe 20% do débito cardíaco, que permite a filtração de aproximadamente de 1600L/dia de sangue. Aproximadamente 180L de flu- ído (ultrafiltrado) são produzidos na filtração deste sangue, e através de processos ativos de reabsorção de certos componentes e secreção de outros, a composição deste fluído é alterada em 1,5L de urina excretados em média por dia. As doenças renais acometem milhões de pessoas em todo o mundo, estimando- se que atinja 10% da população mundial, envolvendo todas as faixas etárias. Isso torna 5 primordial a consciencialização para este fato, com o objetivo de minimização os danos de quem sofre destas patologias (MIRA, 2017). 2.1 Doença renal crônica (DRC) A lesão renal com perda progressiva de todas as funções do rim: glomerular, tu- bular e endócrina, independente do fator etiológico, é conhecida como doença renal crô- nica (DRC). Segundo a Sociedade Brasileira de Nefrologia, a DRC é classificada em seis estágios, relativos ao nível de função renal. Nessas diretrizes, a fase não-dialítica da DRC compreenderá os estágios 2 a 5, com taxas de filtração glomerular (TFG) entre 90 e 15 mL/ min/1, 73 m2 (MARTINS, 2011). Estágios da Insuficiência Renal Vários fatores podem levar a doença renal crônica e sabe-se que uma vez insta- lada ela leva a perda progressiva do funcionamento dos rins, até a necessidade de rea- lizar diálise. A fase que antecede a diálise é chamada de tratamento conservador e o seu tratamento consiste em acompanhamento com o nefrologista e com o nutricionista. Pacientes com taxa de filtração glomerular > 60 ml/minuto, geralmente não neces- sitam de orientações específicas quanto à alimentação, salvo àquelas que são preconi- zadas para se ter uma vida saudável. Todo paciente que apresente taxa de filtração glomerular < 60 ml/minuto, deve fazer um acompanhamento com profissional nutricio- nista, a fim de receber orientações e acompanhar sua evolução clínica. 6 Nessa fase, existem orientações específicas quanto à alimentação, especial- mente no que fere à qualidade da ingestão proteica, com restrição parcial de alguns alimentos ricos em fósforo e potássio (SBN, 2020). A clínica nutricional é um elemento complicado, porém efetivo, no tratamento da doença renal e deve ser feita por um nutricionista, com experiência na área. Um dos maiores desafios relacionados com a prescrição do plano alimentar para pacientes com DRC está na precisão de efetuar os cálculos referentes, principalmente, à quantidade de energia, de proteínas, bem como de sódio, de potássio e defósforo. Para tanto, o plano alimentar e o plano de cuidados nutricionais necessitam ser individualizados e adaptados a cada paciente (MIRA, 2017). 2.2 Insuficiência renal aguda A insuficiência renal aguda (IRA) é definida como a redução aguda da função renal em horas ou dias. Refere-se principalmente a diminuição do ritmo de filtração glomerular e/ou do volume urinário, porém, ocorrem também distúrbios no controle do equilíbrio hi- dro-eletrolítico e ácido-básico. Existem na literatura mais de 30 definições de IRA. A utilização de diferentes de- finições dificulta a comparação de estudos, a análise da evolução destes pacientes, bem como, a comparação de diferentes estratégias terapêuticas e de tratamentos dialíticos. Recentemente, uma rede internacional de especialistas propôs uma nova definição e classificação de IRA, a fim de uniformizar este conceito para efeitos de estudos clínicos e principalmente, prevenir e facilitar o diagnóstico desta síndrome, na tentativa de dimi- nuir a alta morbidade e mortalidade ainda encontrada nos dias atuais. A IRA não afeta apenas o metabolismo hídrico, eletrolítico e ácido-básico, mas interfere também no metabolismo de todos os macronutrientes, propiciando situ- ações pró-inflamatórias, pró-oxidativas e de hipercatabolismo. Além das conse- quências relacionadas à própria IRA, somam-se as contribuições da doença de base e suas complicações, que podem interferir na depleção nutricional do paci- ente (DRUML, 2005 apud BERBEL, 2011). Dentre as alterações metabólicas mais frequentes na IRA, estão o hipercatabo- lismo, hiperglicemia e hipertrigliceridemia. Fatores como resistência insulínica, circulação de mediadores inflamatórios, aci- dose, aumento da secreção de hormônios catabólicos e inadequada oferta de substratos 7 nutricionais estão entre as principais causas de hipercatabolismo nesses pacientes, con- tribuindo para a perda acentuada de massa magra através da ativação de catabolismo proteico muscular, neoglicogênese e alteração do metabolismo de aminoácidos vigentes nessas situações. O tratamento dialítico, necessário em muitos pacientes com IRA, também interfere de modo deletério no estado nutricional, por conduzir diretamente à perda de nutrientes pelo dialisato e interferir na homeostase proteica, conforme evidenciado por Ikizler et al. em estudo com pacientes em hemodiálise crônica. Um grupo multidisciplinar internacional (AKIN) propõe a seguinte classificação ba- seada na dosagem sérica da creatinina e no volume urinário (Tabela 1): Tabela 1 - Definição e Classificação da IRA Somente um dos critérios (Cr ou diurese) pode ser utilizado para inclusão no está- gio. Pacientes que necessitem de diálise são considerados estágio 3, independente do estágio em que se encontravam no início da terapia dialítica (SBN). A avaliação nutricional é ferramenta indispensável para a monitoração e acompa- nhamento clínico do paciente com insuficiência renal aguda (IRA). Essa síndrome é com- plexa e ocorre em uma variedade de situações, com manifestações clínicas que podem variar entre mínimas elevações na creatinina sérica até insuficiência renal com necessi- dade de diálise. Sua incidência varia de acordo com as condições clínicas dos pacientes, sendo maior em Unidades de Terapia Intensiva (20% a 40%), onde apresenta taxa de mortalidade elevada, em torno de 60%. Recentemente o termo insuficiência renal aguda 8 foi substituído por lesão renal aguda (LRA), expressando a ampliação de seu conceito e possibilitando seu diagnóstico precoce. 3 DIETOTERAPIA Fonte: laboro.edu.br O padrão alimentar sofre influência de preceitos religiosos, tabus, hábitos alimen- tares e socioculturais, incutidos no indivíduo desde a infância. Tanto na saúde quanto na doença é importante uma alimentação adequada às necessidades de cada um. A dietoterapia é uma ferramenta da saúde, e em especial do profissional nutrici- onista, que usa dos alimentos (principalmente), para o tratamento e prevenção de enfer- midades, levando ao organismo a adquirir os nutrientes necessários para a boa perfo- mace e saúde. É a parte da ciência da nutrição que se dedica às dietas especificas para cada enfermidade. Para isso, o, profissional nutricionista deve proceder à prescrição di- etética que envolve várias etapas como a anamnese alimentar, avaliação do estado nu- tricional, hipótese diagnostica nutricional, determinação da conduta alimentar, definição do nível de assistência e, posteriormente, a reabilitação nutricional (MAHAN, 2006). Uma dieta nutritiva deve ser planejada de acordo com as patologias e condições físicas do indivíduo. A orientação da pirâmide alimentar tem um enfoque um pouco mais amplo que os guias propostos anteriormente. Há uma preocupação em abordar a alimentação de forma a ensinar urna dieta global, e não apenas uma dieta básica. São levados em conta 9 as deficiências nutricionais, que podem ocorrer e os prejuízos decorrentes dos excessos alimentares. O objetivo é orientar três conceitos básicos: a variedade na seleção de ali- mentos, a proporcionalidade e a moderação. 4 DIETOTERAPIA NA DOENÇA RENAL CRÔNICA Fonte: noticiasmagazine.com A doença renal crônica e uma síndrome clínica causada pela perda lenta, progres- siva e de caráter irreversível das funções renais. Por muito tempo considerado como insuficiência renal crônica, no entanto, atualmente, após a elaboração de guias de con- dutas sobre aspectos relacionados com a doença renal crônica feita pelo National Kidney Foundation/Clinical Practice Guidelines for Chronic Kidney Disease (NKF/DOQI) reco- mendou o uso do termo doença renal Crônica (DRC) (NATIONAL KIDNEY FOUNDA- TION, 2002). De acordo com o NKF/DOQI, a DRC é caracterizada pela presença de dano renal ou redução das funções renais dentro de um período igual ou maior que três meses sem relação com qualquer outra etiologia. A presença de anormalidades estruturais e funcio- nais no rim por mais de três meses, acompanhadas ou não de uma redução da função renal, ou taxa de filtração glomerular < 60mL/min por mais de três meses, mesmo que não haja piora da função renal são critérios adotados pelo NKF/DOQI para diagnostico da DRC (NATIONAL KIDNEY FOUNDATION, 2002). 10 Doenças como hipertensão arterial mal controlada, o diabetes mellitus, a glome- rulonefrite crônica, a nefropatia túbulo-intersticial crônica (pielonefrite), os processos re- nais obstrutivos crônicos (calculose, bexiga neurogênica), o lúpus eritematoso sistêmico e as doenças hereditárias como rins policísticos e síndrome de Alport, são algumas das causas mais frequentes de DRC (DRAIBE, 2002). Qualquer que seja a causa da DRC, a consequência desta doença inclui redução progressiva das funções renais até o estágio em que será necessária a instituição de uma terapia renal substitutiva, seja ela dialise ou transplante renal. O desenvolvimento de doenças cardiovasculares também constitui um outro importante desfecho de pacien- tes com DRC, uma vez que atualmente essa é a principal causa de mortalidade nesses pacientes (SHLIPAK et al. 2005). Com a evolução da DRC ha redução das funções renais com acumulo de toxinas ou de produtos tóxicos que deveriam ser excretados na urina. Os produtos que se acu- mulam no organismo são os compostos nitrogenados como a ureia, creatinina, ácido úrico e outros, além de eletrólitos e minerais. O desenvolvimento deste quadro clínico de DRC é chamado de ureia ou síndrome urêmica. A palavra uremia é proveniente de duas palavras gregas: ouron que significa urina, e haima que quer dizer sangue. Desta forma, esta terminologia uremia significa “urina no sangue” (FOLEY et al., 2005). Associado a isso, com a perda das funções renais também se observa desenvolvimento de distúrbios no metabolismo das proteínas (acidose metabólica), carboidratos (intolerância a glicose) e lipídios(dislipidemias) (WILLIAMS, 2004). Sabe-se que os pacientes portadores de doença renal crônica estão propensos a apresentar desnutrição. São várias as causas dessa alteração do estado nutricional, uma delas a ingestão alimentar deficiente, que pode ocorrer também secundárias a várias causas. Dentre estas, destacam-se a influência da doença básica, as co-morbidades associadas, os fatores psicossociais e a anorexia urêmica (subdialise). No entanto, a ocorrência de desnutrição permanece elevada mesmo quando o paciente inicia o trata- mento dialítico. Um fator adicional, portanto, é a alteração no metabolismo dos macro- nutrientes. 4.1 Avaliação nutricional O objetivo principal da avaliação nutricional de pacientes portadores de DRC é a 11 identificação dos distúrbios nutricionais e possíveis fatores envolvidos com a finalidade de realizar uma intervenção nutricional adequada (CUPARRI et al, 2005). Para a caracterização mais autêntica do paciente é necessário a análise da ava- liação de vários marcadores nutricionais para aprimorar a precisão do diagnostico nutri- cional. Desta forma, tantos os métodos práticos (antropometria, técnicas de avaliação da composição corporal parâmetros laboratoriais e avaliação do consumo alimentar) e sub- jetivos podem ser empregados na avaliação nutricional desses pacientes. 4.2 Antropometria Dados provenientes das medidas antropométricas são estimadas para conhecer o estado nutricional na forma pratica, segura e com baixo custo. Associados a isso, pro- porciona avaliar de forma objetiva as reservas de massa magra e massa gorda. Inclui na avaliação antropométrica valores de peso, estatura, circunferência do braço e de pregas cutâneas. Particularmente nos pacientes em hemodiálise, essas medidas devem ser realiza- das após a sessão de dialise, momento no qual o paciente se encontra mais próximo do seu peso real (peso seco). As medidas de circunferência do braço e das pregas cutâneas devem ser feitas do lado contrário do acesso vascular. Para avaliar o peso de pacientes em dialise peritoneal deve-se descontar do valor obtido do volume de liquído infundido na cavidade abdominal (CUPARRI et al, 2005; NKF/KDOQI; 2000). 4.3 Parâmetros laboratoriais Os parâmetros laboratoriais envolvem mais uma etapa da avaliação do estado nu- tricional de paciente com DRC. Com a análise deles é possível conhecer as condições da reserva de proteínas viscerais (albumina, tranferrina e pré-albumina), de proteínas somáticas (creatinina sérica) e da competência imunológica. Além disso, alguns marca- dores bioquímicos, como a ureia e a creatinina plasmática e o colesterol total, podem auxiliar na interpretação dos resultados de consumo alimentar. No entanto, a DRC pode também alterar os valores laboratoriais e, desta forma, a análise dos mesmos. Assim, parâmetros bioquímicos devem ser analisados em associ- ação com os demais parâmetros (antropométricos e avaliação do consumo alimentar). Em pacientes em hemodiálise, os parâmetros bioquímicos são rotineiramente obtidos 12 pré-dialise e naqueles em dialise peritoneal, após a estabilização da dialise em determi- nada dose (GOLDSTEIN, 2002). 4.4 Avaliação do consumo alimentar Para prevenção da desnutrição e na avaliação a adequação das intervenções die- téticas é de suma importância o monitoramento do consumo alimentar tanto quantitativo como qualitativo. Para esse tipo de avaliação métodos como recordatório alimentar de 24 horas, o registro alimentar de 3 a 7 dias e o questionário de frequência alimentar são bastante utilizados. Os critérios de escolha, a forma de utilização desses métodos e suas vantagens e desvantagens para aplicação na população de pacientes com DRC são semelhante aos de outras populações. Entretanto, em função de peculiaridades do tratamento de paciente com DRC, alguns cuidados devem ser tomados, especialmente na escolha dos dias a serem avaliados. Especificamente em se tratando do consumo proteico, a utilização da geração de ureia como marcador bioquímico permite estimar uma ingestão de proteína nessa popu- lação de pacientes em qualquer fase da doença, desde de que o paciente esteja em balanço nitrogenado. A vantagem deste método é a possibilidade de se avaliar a inges- tão proteica independentemente do relato do paciente. Desta forma, pode-se verificar a adesão do paciente a quantidade de proteína prescrita. 5 DIETOTERAPIA NA DRC FASE NÃO DÍALITICA Fonte: renalcentermaceio.com 13 A desnutrição é achado comum na fase avançada da DRC não-dialítica. A natureza da desnutrição nessa fase é claramente multifatorial. Evidências indicam que a redução do apetite é fator importante que contribui para o problema. A redução espontânea da ingestão alimentar e dos parâmetros antropométricos está diretamente associada ao grau de perda da função renal. O problema ocorre, particularmente, naqueles pacientes que não recebem acompanhamento clínico e dietético regularmente (DUENHAS, 2003 apud MARTINS, 2011). Além disso, como a restrição proteica é a intervenção dietética proposta nessa fase da doença, há risco de desnutrição, caso não haja monitoramento cuidadoso da ingestão alimentar. O estado inflamatório crônico, usualmente encontrado nos pacientes nesse estágio da doença, é apontado como fator independente para a desnutrição. As citocinas próinflamatórias ativam as vias do catabolismo proteico muscular, além de inibirem o apetite. Na DRC ocorre resistência à ação de hormônios anabólicos, como insulina e hormônio do crescimento. Por outro lado, ocorre elevação de hormônios catabó- licos, como glucagon e paratormônio (CIBULKA, 2007 apud MARTINS, 2011). Essas alterações levam à combinação de inibição da síntese e aumento do cata- bolismo proteico muscular. A acidose metabólica resulta em aumento da degradação proteica e da oxidação de aminoácidos. Sua correção leva à diminuição da degradação proteica, com melhora do balanço nitrogenado. Assim, fica claro que a terapia nutricional não deve ser empregada isoladamente, sem que os outros distúrbios relacionados à doença renal sejam adequadamente trata- dos. 5.1 Objetivos da dietoterapia na DRC fase não díalitica A terapia nutricional, desde que bem planejada, praticada de forma individualizada, com acompanhamento frequente e boa adesão do paciente, possibilita a manutenção ou o restabelecimento do estado nutricional e da qualidade de vida. O efeito independente da restrição proteica sobre a progressão da DRC, que é a principal manipulação dietética nessa fase, ainda é controverso. Porém, essa intervenção é capaz de retardar a necessidade da terapia renal substitutiva (FOUQUE, 2006 apud MARTINS, 2011). 14 Além disso, há evidência consistente de que a terapia nutricional adequada nessa fase da doença contribui para controlar o acúmulo de metabólitos potencialmente tóxi- cos, ajuda no controle da hiperpotassemia e da hipertensão, reduz a proteinúria e é parte fundamental no controle dos distúrbios do metabolismo mineral ósseo. Os objetivos da terapia nutricional na DRC não-dialítica são: • manter ou restabelecer o estado nutricional; • retardar a progressão da doença renal; • minimizar o acúmulo de compostos nitrogenados tóxicos; • prevenir ou minimizar os distúrbios hidroeletrolíticos, mineral, ácido básico e hormonal. Estudos de balanço nitrogenado e de medidas do turnover proteico demonstram que pacientes com DRC na fase não-dialítica, em condições clínicas estáveis e que são submetidos à dieta com menor quantidade de proteína, são capazes de ativar mecanis- mos adaptativos. Esses possibilitam a manutenção das reservas proteicas corporais, desde que a oferta de energia seja suficiente. A quantidade recomendada é em torno de 0,6 g/kg/dia de proteína alimentar. Pelo menos, 50% dessas devem ser provenientes de fontes de alto valor biológico. Não existedefinição a respeito do grau de disfunção renal em que a diminuição na quantidade de proteína da dieta deve ser iniciada. Porém, es- tima-se que, a partir do estágio três da DRC (TFG <60 mL/min), há benefícios na restri- ção proteica. Embora exista escassez de estudos controlados, de longo prazo, e com número significativo de indivíduos estudados, a dieta muito restrita em proteína (0,3 g/kg/dia), suplementada com aminoácidos essenciais e cetoácidos, pode ser segura do ponto de vista nutricional e oferecer benefícios, como melhora dos sintomas urêmicos, do controle da pressão arterial, da acidose metabólica, da sensibilidade à insulina e dos distúrbios do metabolismo mineral ósseo. Esse tipo de dieta é mais indicado para pacientes com taxa de filtração glomerular <25 mL/min. Porém, não existem estudos comparativos e de longo prazo entre as duas modalidades de dieta. Os maiores limitantes da dieta muito pobre em proteína são a dificuldade de aderência a longo prazo, pois o indivíduo deve seguir dieta vegetariana controlada, e o custo elevado dos suplementos de aminoácidos essenciais ou cetoácidos. Apesar dos estudos metabólicos demonstrarem que 30 kcal/kg/dia é o mínimo a ser fornecido para a manutenção dos parâmetros nutricionais, há alguns estudos que sugerem que a necessidade de energia pode ser menor, particularmente nos pacientes 15 idosos ou com estilo de vida sedentário. Por outro lado, ajustes devem ser feitos para pacientes com desnutrição ou em risco nutricional, principalmente aqueles que apresen- tam doenças crônicas graves associadas (diabetes mellitus de difícil controle, insuficiên- cia cardíaca congestiva crônica, doença pulmonar obstrutiva crônica, processos inflama- tórios e/ou infecciosos crônicos, e outros). Vale ressaltar que, nesses casos, o foco prin- cipal é o aumento da oferta de energia. A hipertensão é um dos fatores de risco para o desenvolvimento e progressão da DRC, e o problema piora conforme a função renal se deteriora. Embora exista escassez de estudos comparando diferentes quantidades de sódio alimentar, recomenda-se o con- trole na ingestão do mineral. O potássio não é normalmente restringido até que haja perda significativa da fun- ção renal. Usualmente, os pacientes recebem diuréticos e, enquanto existe volume uri- nário médio de 1.000 mL/dia, o potássio não necessita de restrição na dieta. Entretanto, alguns medicamentos anti-hipertensivos, como inibidores da enzima conversora, podem elevar precocemente os níveis séricos de potássio. Esse fator indica a restrição alimentar do mineral (MARTINS, 2011). Os líquidos também não necessitam de restrição na dieta, até que ocorra perda significativa da função renal. Pelo fato de a absorção intestinal de cálcio diminuir com a progressão da DRC, pode ser necessária a suplementação do mineral, assim como da vitamina D ativa. Porém, as quantidades recomendadas são baseadas mais em consen- sos do que em estudos controlados. Também, os níveis elevados de fósforo estão ligados à progressão da DRC e ao desenvolvimento do hiperparatireoidismo secundário. Quando ocorre elevação dos ní- veis séricos de fósforo, existe indicação do controle do mineral na dieta. As necessidades de vitaminas na fase não dialítica da DRC ainda não estão bem definidas. As reservas de vitamina A estão, aparentemente, aumentadas, já nessa fase da DRC, portanto a sua suplementação não é recomendada. As necessidades de oligoele- mentos também não estão bem definidas e, provavelmente, são semelhantes às da po- pulação em geral. A suplementação de ferro pode ser necessária para alguns pacientes, especialmente quando em terapia com a eritropoietina. Principais recomendações de nutrientes para pacientes na fase não-dialítica da DRC. 16 Na fase não-dialítica da DRC, é recomendada dieta hipoproteica (0,6-0,8 g/kg/dia) ou muito hipoproteica (0,3 g/kg/dia) suplementada com aminoácidos essenciais e/ou ce- toácidos, associada à oferta adequada de energia. Na fase não-dialítica da DRC, é re- comendada restrição de sódio e de fósforo na dieta. A necessidade de restrição de po- tássio depende da função renal, e é determinada pelos níveis séricos do eletrólito. O cálcio pode necessitar de suplementação, mas depende dos níveis séricos do mineral, do fósforo e do hormônio da paratireoide (PTH). Com o uso em longo prazo de dietas hipoproteicas, é recomendada a suplementação de vitaminas hidrossolúveis, e pode ser indicada a administração da vitamina D. Uma vez que os planos alimentares prescritos na DRC pré-diálise têm, habitual- mente, baixo teor de alguns nutrientes (por exemplo proteínas) e que a desnutrição é frequente nestes doentes, é importante a monitorização periódica pelo Nutricionista, de forma a reavaliar a adequação do plano alimentar ao estado nutricional do doente. Os dados relativos à elevada mortalidade nos primeiros 90 dias de diálise, relacionada com a caquexia, reforçam a necessidade dos cuidados nutricionais pré-diálise (MIRA, 2017). 5.2 Proteínas e energia Fonte: pensenatural.com O papel das proteínas e a importância de um aporte proteico adequado na doença renal têm gerado alguma controvérsia. Alguns autores referem que o consumo excessivo de proteínas induz a hiperfiltração renal e, consequentemente, pode desencadear lesão 17 renal e DRC. Outros referem que, num indivíduo saudável, o aporte excessivo de prote- ínas típico da dieta ocidental não tem efeitos deletérios na função renal, uma vez que a hiperfiltração glomerular é uma resposta a vários estímulos fisiológicos, sendo assim um mecanismo adaptativo normal. No entanto, estes e muitos outros autores aconselham e apontam os aspetos benéficos da restrição proteica quando a lesão renal já existe, no- meadamente, no atraso da progressão da doença renal. Fouque e Laville, numa revisão sistemática de 2009, demonstraram que a redução do aporte de proteína em doentes com DRC reduz a ocorrência de falência renal em cerca de 32%, em comparação com a não restrição da proteína concluindo, portanto, que esta terapêutica deve ser incenti- vada. O papel protetor da dieta hipoproteica revela-se, entre outros aspetos, na dimi- nuição da pressão intraglomerular e da proteinúria, na atenuação do estresse oxidativo, na normalização dos lipídios séricos, e na diminuição do consumo de oxigénio como consequência da menor excreção de amónia e de fosfatos (LEN- TINE, 2004 apud MIRA, 2017). A restrição proteica é a base da intervenção nutricional da generalidade dos indiví- duos com DRC nos estádios 1 a 4. A restrição proteica deve começar precocemente e logo que a DRC seja diagnosti- cada. De um modo geral, as recomendações proteicas atuais sugerem 0,6 a 0,8 g de proteína/kg peso/dia para indivíduos com DRC em estádios entre 1 e 4. É importante ter em consideração o peso para o qual estamos a fazer os cálculos. Atualmente, é aceite pela maioria dos autores o uso do peso atual, no caso de doentes normoponderais. Nos doentes com magreza deve ser usado o peso de referência (para o cálculo da energia, o peso atual para o cálculo proteico), e no caso dos doentes com excesso ponderal recomenda-se a utilização do peso ajustado, que é obtido por meio da seguinte equação: Peso ajustado = (peso de referência – peso atual) x 0,25 + peso atual A National Kidney Foundation (NKF) recomenda a utilização do peso de referên- cia, determinado com base no percentil 50 das tabelas do National Health and Nutrition Survey II (NHANES II) (tendo em conta a idade, sexo, altura e tamanho do osso) nos doentes com percentagem de peso de referência inferior a 95% ou superior a 115%. 18 Assim, segundo a National Kidney Foundation (NKF), nos estádios 1 e 2 (TFG > 60 ml/min) são geralmente preconizados 0,7 a 0,8 g de proteína/ kg peso/dia, que deverão ser reduzidos para 0,6 g de proteína/kg peso/dia nos estádios3 e 4, mas, principalmente, quando a TFG é inferior a 25-30 ml/min. A European Society for Clinical Nutrition and Metabolism (ESPEN) recomenda 0,55 a 0,60 g de proteína/kg peso/dia nos estádios 1 a 4 da DRC. A Kidney Disease: Improving Global Outcomes recomenda uma restrição proteica de 0,8 g/kg peso/dia em adultos com ou sem diabetes com TFG < 30 ml/min/1,73 m2 (estádios 4 e 5). Sugerem ainda que os doentes com DRC em risco de progressão da doença renal não devem fazer ingestões proteicas elevadas (>1,3 g/kg/dia). A National Kidney Foundation (NKF) recomenda que pelo menos 50% das proteí- nas sejam de alto valor biológico de forma a assegurar o aporte adequado de ácidos aminados essenciais, enquanto que a European Society for Clinical Nutrition and Meta- bolism (ESPEN) recomenda que 75% das proteínas sejam de alto valor biológico, sendo as proteínas de origem animal fundamentais para atingir esse objetivo. Esta recomenda- ção da ESPEN não reúne consenso, tendo em conta que as dietas vegetarianas têm sido promovidas como uma forma de retardar a progressão da doença renal, conse- guindo manter um adequado estado nutricional dos doentes, desde que calculadas tendo em atenção os ácidos aminados limitantes. Existem vários trabalhos que comparam os efeitos da proteína animal e vegetal na função renal. Alguns estudos sugerem que dietas pobres em proteína podem aumentar o risco de desnutrição proteica, embora outros revelem que dietas ricas em proteínas vegetais não aceleram a progressão da DRC, ao contrário do que acontece com proteí- nas animais. No caso específico do síndrome nefrótico, caracterizado por proteinúria nefrótica, edemas, hipoalbuminemia e dislipidemia, as recomendações europeias proteicas refe- rem 0,8 a 1,0 g/kg peso/dia, sem reposição das perdas proteicas urinárias. Estas reco- mendações contrariam as orientações terapêuticas do passado, em que o aumento do aporte proteico era aconselhado com o objetivo de compensar as perdas proteicas uri- nárias e normalizar a albuminemia. A investigação não comprovou esses efeitos e evidenciou o risco de agrava- mento da função renal. Atualmente, considera-se que a restrição proteica diminui eficazmente a perda urinária de proteínas, pelo que a suplementação proteica nos doentes com síndrome nefrótico é, na maioria dos casos, contraproducente (TOIGO, 2000 apud MIRA, 2017). 19 A NKF, a ESPEN e a American Dietetic Association (ADA) são unânimes em termos de recomendações energéticas, sendo estas semelhantes às da população geral: 30 a 35 kcal/kg/dia, dependendo do sexo, idade e atividade física. Na presença de desnutri- ção ou peso excessivo deverão ser superiores ou inferiores de acordo com as necessi- dades individuais. De modo a concretizar estas recomendações e permitir ao doente alcançar estes objetivos, é fundamental o acompanhamento regular feito por um nutricionista que pres- creva um plano alimentar estruturado e individualizado e mantenha a vigilância regular do seu estado nutricional. Como a dieta ocidental comum no nosso país contempla ha- bitualmente cerca do dobro das proteínas recomendadas para os estádios da doença renal de 1 a 4, a adesão de forma consistente e regular à restrição proteica é, muitas das vezes, difícil por parte do doente. A implementação de uma terapêutica nutricional de baixo teor proteico requer, por isso, uma equipe especializada e dedicada, que consiga um acompanhamento regular e rigoroso, em que o envolvimento e a motivação do do- ente são fundamentais. Entende-se que na prática clínica nem sempre é conseguida uma redução proteica de acordo com o recomendado, então, num procedimento mais simples e prático, pode-se considerar como um plano hipoproteico aquele em que há redução para cerca de metade do aporte proteico individual e habitual. Em termos práti- cos, qualquer redução do aporte proteico conseguida será benéfica, mesmo que não seja a ideal ou definida empiricamente. 5.3 Sódio Fonte: hipolabor.com 20 O controle e a redução do aporte do sódio em doentes com DRC é muito impor- tante, uma vez que a hipertensão arterial é uma das principais causas de doença renal, para além do reconhecido aumento da sensibilidade ao sódio nestes doentes e seu efeito na tensão arterial. As recomendações no aporte de sódio dependem muito das características indivi- duais. De um modo geral, nos doentes com TFG inferior a 60 ml/min, hipertensos, com edemas e/ou proteinúria recomenda-se um aporte de sódio inferior a 2 g/dia (correspon- dente a um consumo de sal inferior a 5 g/dia). Nos doentes com TFG inferior a 60 ml/ min/1,73 m2 (estádios 3 e 4) sem hipertensão, edemas ou proteinúria as recomendações não são claras, mas, geralmente, apontam para valores inferiores a 2,3 g/dia de sódio (ou seja, inferiores a 5,75 g sal/dia). Na maioria dos doentes com DRC nos estádios 1 a 4, estas recomendações implicam a não adição de sal de cozinha aos alimentos. Nesses casos, o recurso a ervas aromáticas e especiarias é primordial, de forma a potenciar o sabor dos alimentos e não diminuir a ingestão alimentar, principalmente nos estádios mais avançados de doença renal, em que está agravado o risco de desnutrição. Não se pode deixar de alertar para o potencial perigo da utilização de substitutos do sal que, normalmente, são produtos com potássio na sua composição (MIRA, 2017). 5.4 Potássio Fonte: natue.com 21 Quando a doença renal agrava e a TFG diminui, o potássio é um dos eletrólitos que se acumula no sangue. O equilíbrio dos níveis de potássio deve exigir um cuidado espe- cial por parte do nutricionista, uma vez que a hipercaliemia pode causar arritmia ou mesmo enfarte do miocárdio. Dependendo da patologia responsável pela doença renal, nem sempre é necessária a restrição deste mineral na alimentação. A intervenção a este nível depende muito dos valores analíticos. Assim, é fundamental traçar um programa de monitorização regular ajustado à ingestão alimentar do doente, de forma individuali- zada e de acordo com o nível sérico deste elemento. É habitual iniciar a restrição do potássio alimentar quando a TFG é inferior a 30 ml/min/1,73 m2, ajustando o aporte de potássio para valores inferiores a 3000 mg/dia (8 a 17 mg/kg de peso/dia) (BETO, 2004 apud MIRA, 2017). O potássio está presente em quase todos os alimentos, mas é amplamente co- nhecido por estar em maior concentração nas frutas, produtos hortícolas, tubérculos, leguminosas e também em alguns alimentos de origem animal. Nesse sentido, paralela- mente ao cálculo das necessidades nutricionais e prescrição do plano alimentar deve propor-se ao doente que aplique algumas medidas fáceis que o ajudarão a remover al- gum potássio dos alimentos. A fervura dos alimentos causa a sua desmineralização e, consequentemente, di- minui o conteúdo de potássio, sódio e cálcio dos alimentos, tanto vegetais como animais. A fervura dos alimentos em duas águas com a rejeição da primeira água passados cerca de 10 minutos, vai otimizar a perda de potássio dos alimentos para cerca de metade do valor inicial. No entanto, alimentos como a batata, no final deste processo ainda apre- sentam cerca de 100 a 200 mg de potássio por 100 g de alimento, pelo que continua a ser importante controlar e adequar a ingestão dos alimentos com elevado teor de potás- sio. O método da fervura rápida (lixiviação ou emersão em água durante 1 ou 2 minutos) com a fervura em duas águas de tubérculos e hortícolas e constataram que o primeiro método é pouco eficaz na redução de potássio dos alimentos. A fritura é o que leva a menor perda de potássio, seguido do assado, do estufado e, por fim, do cozido. Comparativamente aos alimentos frescos, os alimentos desidrata- dos apresentam uma quantidade superior de potássio pela mesma quantidade de ali- mento. Desta forma, alimentos tais como fruta e hortícolas desidratadossão habitual- mente alimentos com um teor muito elevado de potássio. No que diz respeito à batata, um alimento largamente conhecido pelo seu elevado teor em potássio, foi verificado que batata velha pode apresentar o dobro da quantidade 22 de potássio na sua composição, comparativamente com a batata nova, uma vez que vai perdendo água ao longo do tempo de maturação. Estas características podem ter um impacto acentuado na alimentação dos doen- tes que necessitem de controlar o aporte de potássio. 5.5 Fosforo Fonte: tuavidasaudavel.com A alteração do metabolismo do fósforo ocorre desde o início da DRC e por isso o acompanhamento clínico e nutricional destes doentes requer também a monitorização regular deste parâmetro. O controlo do fosfato, do cálcio, da vitamina D, assim como o hormônio paratireóide (PTH) é necessário e fundamental para prevenir a doença óssea renal e a morbilidade cardiovascular. Assim, é frequentemente necessária a restrição do fosfato alimentar. É essencial ter em atenção a relação intrínseca que existe entre o aporte diário de proteína e de fósforo. Os alimentos ricos em proteína são as principais fontes de fósforo, pelo que a quantidade de fósforo ingerida é diretamente proporcional ao aporte proteico. Assim, a restrição proteica melhora o perfil analítico e metabólico dos doentes, uma vez que permite reduzir a formação de toxinas urêmicas como a ureia, os ácidos orgânicos que induzem acidose metabólica, mas também o fósforo, o que contribui para um melhor controle do metabolismo fosfo-cálcico e da doença óssea. 23 Por esse motivo, a maior parte das sociedades científicas recomendam uma tera- pêutica de redução do aporte de proteína nos estádios iniciais da DRC, como forma de também reduzir o aporte de fósforo. Mecanismo de manutenção da homeostasia do fós- foro. A prescrição nutricional de proteína deve atender ao conteúdo em fósforo das di- ferentes fontes proteicas, sua biodisponibilidade e ambiente metabólico. Uma grama de proteína tem, geralmente, 13 a 15 mg de fósforo, do qual 30 a 70% (dependendo do tipo de molécula de fósforo presente no alimento) é absorvido pelo intestino. O fósforo orgâ- nico associado às proteínas tem uma absorção menor, enquanto que o fósforo inorgâ- nico (ácido fosfórico, fosfatos, polifosfatos) dos aditivos alimentares tem uma absorção superior a 90%. Hoje em dia, a alimentação inclui inúmeros alimentos e bebidas proces- sados em que são usados aditivos e conservantes com elevado conteúdo em fósforo inorgânico. O acréscimo de fósforo proveniente dos aditivos alimentares pode atingir valores entre 700 a 800 mg/dia. Nesse contexto, uma forma simples e eficaz de reduzir a quantidade de fósforo alimentar, sem diminuir significativamente a quantidade de proteínas, é evitar o consumo de refrigerantes com fósforo na sua constitui- ção, refeições pré-cozinhadas e outros alimentos processados com aditivos com fósforo (PICCOLI, 2015 apud MIRA, 2017). Por outro lado, a absorção do fósforo orgânico das proteínas é diferente depen- dendo de a sua origem ser animal ou vegetal. O fósforo de origem animal é rapidamente hidrolisado e absorvido. Pelo contrário, o fósforo proveniente de alimentos vegetais (le- guminosas, cereais e frutos oleaginosos) tem uma menor absorção (40 a 50%), por se encontrar na forma de ácido fítico ou fitato. Como os mamíferos são desprovidos de fitases (enzimas), a biodisponibilidade do fósforo de alimentos vegetais é relativamente mais baixa (inferior a 50%). 24 6 HEMODIALISE Fonte: centeg.com Quando a TFG é inferior a 15 ml/min, o rim deixa de conseguir manter a homeos- tasia interna e, na maior parte das vezes, é necessário iniciar um tratamento de substi- tuição da função renal a curto prazo, se for essa a opção do doente. A hemodiálise exige, igualmente, uma intervenção nutricional individualizada e a monitorização regular do doente, tendo em conta as recomendações nutricionais espe- cíficas para este estádio. A intervenção nutricional tem como principal objetivo prevenir a desnutrição pro- teico-energética, situação frequente nestes doentes e que está associada ao au- mento de morbilidade e mortalidade. Nesse contexto, o estado nutricional deve ser monitorizado regularmente, nomeadamente, para avaliar a resposta à tera- pêutica e intervenção nutricional, assim como, motivar e melhorar a adesão do doente para a mesma (FOUQUE, 2007 apud MIRA, 2017). Existem ferramentas para avaliação do estado nutricional baseadas na ingestão alimentar, nos valores laboratoriais e nas alterações da composição corporal que têm sido bastante utilizadas. Em 2007, um painel de peritos selecionado pela Internacional Society of Renal Nutrition and Metabolism (ISRNM), estabeleceram uma nova nomenclatura para a des- nutrição proteico-energética nos doentes renais. A desnutrição, nesta população, nome- ada de protein-energy wasting (PEW), foi definida como um estado de diminuição das reservas proteicas e combustíveis energéticos do organismo (isto é, proteínas corporais 25 e massa gorda). Estas alterações estão associadas à diminuição da capacidade funcio- nal relacionada com o stresse metabólico. Assim, para a avaliação do estado nutricional foram estabelecidas quatro catego- rias de parâmetros: • Indicadores bioquímicos (albumina, pré-albumina e colesterol total); • Perda de massa corporal [índice de massa corporal (IMC), perda de peso em 3 e 6 meses e % de massa gorda corporal (%MG)]; • Perda de massa muscular [% de perda de massa muscular em 3 e 6 meses, redução da circunferência muscular do braço (CMB) em relação à população de referência e cre- atinina]; • Avaliação da ingestão alimentar e sua comparação com as recomendações. Os espe- cialistas da ISRNM recomendam que pelo menos um dos indicadores anteriores deva ser incluído no diagnóstico da PEW dos doentes em causa. Os indicadores bioquímicos considerados para o diagnóstico da PEW foram: concentração de albumina sérica infe- rior a 3,8 g/dL, pré-albumina sérica inferior a 30 mg/dL ou colesterol total inferior a 100 mg/100 mL. No que respeita aos scores de classificação do estado nutricional, de acordo com a NKF, a ferramenta recomendada é a Avaliação Subjetiva Global (ASG), na escala de 7 pontos. No entanto, têm sido estudados outros instrumentos, tais como o “Malnutrition Inflammation Score” (MIS) e o “Dialysis Malnutrition Score”. 7 INTERVENÇÃO NUTRICIONAL NA DRC FASE DÍALITICA Fonte:labnetwork.com 26 A intervenção nutricional no doente em hemodiálise tem como objetivos: • Fornecer proteína suficiente para compensar as perdas dialíticas de ácidos aminados essenciais e azoto, manter o balanço azotado e prevenir o excesso de acumulação de produtos tóxicos; • Fornecer energia adequada de forma a evitar o catabolismo da massa magra. Se houver necessidade de perda de peso o défice energético não deve ser superior a 250 a 500 kcal/dia; • Limitar o aporte de sódio de forma a controlar a tensão arterial, a sede, e a prevenir o edema; • Controlar a ingestão alimentar de potássio para prevenir a hipercaliemia, a ar- ritmia e diminuir o risco de morte; • Controlar a ingestão de fluídos para prevenir a hiponatremia e o ganho exces- sivo de peso interdialítico (evitar aumentos ponderais interdialítico superiores a 4 a 4,5% do peso seco); • Limitar o aporte de fósforo para controlar a hiperfosfatemia e minimizar a os- teodistrofia renal. Todos os doentes em tratamento dialítico devem ter um plano alimentar individu- alizado, ajustado às suas necessidades nutricionais (peso/peso ajustado, estatura, e si- tuação clínica) e de acordo com os hábitos, preferências pessoais e condições socioe- conômicas. Quando são calculadas as necessidades nutricionais e elaborado o plano alimentar, devem-se estabelecer prioridades, conhecer os hábitos epreferências do do- ente, individualizar a intervenção, motivar o doente, a família e/ou a equipe de suporte, promovendo a sua autonomia, através da educação alimentar. É fundamental que o pa- ciente compreenda a importância das restrições e alterações que lhe são pedidas, e que receba regularmente informação da sua eficácia. O cálculo das necessidades nutricionais é feito em função do peso pós-dialítico (peso seco) ou do peso de referência e da função residual renal. 27 7.1 Peso livre de edema (“peso seco’) A variação do peso corporal e da composição corporal em doentes em diálise limita o uso do peso atual para avaliação nutricional e para a prescrição do plano alimen- tar. A determinação do peso corporal livre de edema é difícil e pouco precisa. A seguinte equação permite calcular o peso ajustado livre de edema (PLEa = aBWef): PLEa (18) = PS (kg) + [(PR – PS) x 0,25] PLEa: Peso livre de edema ajustado | PR: Peso de referência | PS: Peso seco (livre de edema) Uma vez que o aumento de peso interdialítico, excecionalmente, pode atingir os 6 a 7 kg (ou valores superiores) em pacientes em hemodiálise, o peso livre de edema ajustado deve ser calculado para os valores pós-diálise. O peso seco é determinado pelo nefrologista e definido como o peso mais baixo (pós-diálise) que o paciente consegue tolerar e com o qual os sinais ou sintomas de hipovolemia ou hipervolemia são mínimos. 7.2 Energia De acordo com as K/DOQI de 2000 e a ADA (2004), o aporte energético recomen- dado para um paciente em hemodiálise é de 35 kcal/dia para doentes com menos de 60 anos e com peso < 120% do peso de referência. Nos doentes com mais de 60 anos, as recomendações energéticas variam de 30 a 35 kcal/kg/dia. Os estudos epidemiológicos sugerem que baixo aporte energético nestes pacientes é frequente e pode levar a um balanço azotado negativo. A EBPG, em 2007 recomendou um aporte de 30 a 40 kcal/kg PR/dia, ajustado à idade, sexo, atividade física e estado nutricional. No que respeita à distribuição da energia por macronutrientes, 30 a 35% deve ser proveniente de gordura (com < 7% VET de gordura saturada, > 10% VET de ácidos gordos polinsaturados, > 20% VET de ácidos gordos monoinsaturados e < 200 mg/dia de colesterol). Cerca de 50 a 60% do aporte energético deve ter como origem os hidratos de carbono. 28 7.3 Proteínas Fonte: belezaesaude.com As recomendações nutricionais das K/DOQI de 2000 e da ADA (2004) preconizam um aporte proteico de 1,2 g/kg/dia (com 50% de alto valor biológico) de forma a minimizar as perdas de aminoácidos e o catabolismo proteico associado à hemodiálise. Em doen- tes com doença aguda este valor deve ser aumentado para 1,2 a 1,3 g/kg/dia. De acordo com a ESPEN (2006), o aporte proteico deve ser 1,2 a 1,4 g/kg/dia (50% de alto valor biológico). A EBPG 2007 recomenda 1,1 g/kg PR/dia para doentes estáveis e 1,2 g/kg PR/dia para doentes desnutridos. A utilização de filtros de alto fluxo condiciona a que ocorra maior perda de ácidos aminados, logo, nesses casos o aporte proteico deve ser aumentado para 1,5 g/kg/dia. Nos pacientes diabéticos o aporte proteico deve ser corri- gido para valores entre 1,3 e 1,5 g/kg/dia e nos pacientes com o vírus da imunodeficiên- cia adquirida (HIV) para o intervalo entre 1,5 e 2 g/kg/dia. O modelo de cinética da ureia permite avaliar o metabolismo proteico e monitorizar a eficácia da dieta ou da adesão do paciente. O uso da taxa de catabolismo proteico (nTCP) permite auxiliar a análise longitudinal do estado nutricional do paciente e estimar o aporte de proteína. https://belezaesaude.com/ 29 7.4 Sódio e líquidos Fonte: dreamstime.com A restrição de sódio e líquidos é essencial para o controlo da pressão sanguínea, do volume extracelular e para evitar ganhos de peso excessivos entre as sessões de hemodiálise, sobretudo em pacientes anúricos ou oligúricos. Relativamente ao ganho de peso entre as sessões de diálise, e de acordo com a ADA (2002) não se recomenda um aumento de peso interdialítico superior a 2 a 5% do peso seco. A EBPG 2007 considera excesso de peso interdialítico aqueles que são superiores a 4 a 4,5% do peso seco ou 2 a 2,5 kg. 30 7.5 Potássio Fonte: corupafm.com O potássio é um mineral importante no sangue que auxilia no funcionamento ade- quado dos músculos e do coração. O excesso ou a falta de potássio no sangue podem ser perigosos. A National Kidney Foundation – Kidney Disease Outcomes Quality Iniciative (NKF K/DOQI) e a European Best Practice Guidelines (EBPG), preconizam que o valor de po- tássio sérico seja mantido nos valores laboratoriais de referência. A hipercalemia provoca alterações ao nível muscular, podendo atingir o miocárdio e aumentar o risco de parada cardíaca. A hipercalemia manifesta-se por sintomas neu- romusculares (fraqueza ou paralisia muscular dos membros inferiores, progredindo para os membros superiores e tronco) e arritmias que podem levar a paragem cardíaca. Os pacientes devem ser alertados para estes sintomas, bem como a forma de proceder caso os identifiquem. Na monitorização dos níveis de potássio no sangue, devemos ter em conta que, além do potássio ingerido através dos alimentos, existem outros fatores que podem con- tribuir para o seu aumento, especificamente, a administração de beta bloqueadores ou de inibidores da enzima de conversão da angiotensina (IECA), a hipoinsulinemia e a obstipação. 31 7.6 Fósforo Fonte: queroviverbem.com O fósforo sérico em níveis elevados, para além de contribuir para a hiperplasia da glândula da paratireóide e hiperparatireoidismo secundário e para o desenvolvimento de doença óssea, está também relacionado com distúrbios da condução do potencial elé- trico e arritmias, fibrose do miocárdio, aumento de risco de doença cardiovascular, calci- ficação vascular e calcificação de tecidos moles, inclusive do coração, dos pulmões, dos rins e das articulações. A hiperfosfatemia relaciona-se ainda com maior número de hos- pitalizações, assim como com uma maior mortalidade. Apesar de existirem diversos fatores que podem contribuir para o melhor controle do fósforo, como a utilização de quelantes de fósforo, vitamina D e a eficácia do trata- mento de hemodiálise, a adequação e quantificação do fósforo proveniente da alimenta- ção assume um papel preponderante na prevenção e tratamento da hiperfosfatemia. De acordo com as recomendações, o valor de fósforo sérico deve ser mantido nos intervalos laboratoriais de referência. Conforme previamente referido, os alimentos ricos em fósforo são geralmente tam- bém ricos em proteínas de alto valor biológico. De forma a evitar o comprometimento do aporte proteico, deve-se, por isso, privilegiar a ingestão de alimentos com uma relação fósforo/proteína mais baixa, como por exemplo, a carne de frango, de peru, de porco, a raia, o polvo e a clara de ovo. Alguns outros alimentos com teor elevado de fósforo devem ser limitados, nomeadamente: os laticínios, os alimentos pré-confeccionados, os órgãos 32 e as vísceras, as conservas e os enlatados, os fumados, as leguminosas secas, os frutos oleaginosos os alimentos integrais, as bolachas, os bolos e produtos de pastelaria, os gelados de leite e os refrigerantes. Em adição, note-se que a hemodiálise remove cerca de 400 a 800 mg de fósforo por sessão. O plano alimentar individualizado, assim como, o acompanhamento regular e a monitorização da ingestão alimentar do doente em hemodiálise pelo nutricionista, é fun- damental para o cumprimento dos objetivos nutricionais. A estrutura das unidades de hemodiálise, seja hospitalar, seja extra-hospitalar, de- verá contemplar a presença de um nutricionista na equipe multidisciplinar. Dessa forma, quando o paciente está sujeito ao tratamento de hemodiálise terá a avaliação nutricional eo acompanhamento regular feito por este profissional, e dessa forma, a possibilidade de ir vendo ajustada a sua alimentação de acordo com a situação clínica e tendo sempre em conta os seus gostos e preferências alimentares (NATIONAL KIDNEY FOUNDA- TION, 2007). 7.7 Vitaminas e oligoelementos Fonte: aminhacorrida.com Os doentes em hemodiálise têm maior risco de apresentar deficiência de vitaminas, particularmente de ácido fólico, vitaminas do complexo B e vitamina C. As causas desta deficiência relacionam-se com a ingestão alimentar deficiente associada à anorexia e com a prescrição de dietas com teores reduzidos de potássio e fósforo, que restringem 33 a ingestão de alimentos de alto valor nutricional nestes elementos, tais como fruta, pro- dutos hortícolas e produtos lácteos. O metabolismo renal alterado, síntese deficiente, a resistência à ação de vitaminas, a ingestão alimentar inadequada, absorção intestinal reduzida e a perda de vitaminas hidrossolúveis no dialisado são outras causas da carên- cia de vitaminas nesta população de doentes. 8 LESÃO RENAL AGUDA Fonte: tuasaude.com A perda aguda da função renal interfere no metabolismo de todos os macronutri- entes, propiciando situações próinflamatórias, pró-oxidativas e de hipercatabolismo. As principais alterações nutricionais no paciente com LRA são hipercatabolismo, hiperglice- mia e hipertrigliceridemia, que, somadas às contribuições da doença de base, complica- ções e necessidade de terapia renal substitutiva, podem interferir na depleção nutricional do paciente. A desnutrição em pacientes com LRA está associada a maior incidência de com- plicações, maior tempo de internação e maior mortalidade. Entretanto, existem poucos estudos na literatura avaliando o estado nutricional de pacientes com LRA. Parâmetros antropométricos como índice de massa corporal, circunferência do braço e pregas cutâ- neas são de difícil interpretação, devido à alteração no estado de hidratação desses pa- cientes. https://www.tuasaude.com/ 34 Os parâmetros bioquímicos geralmente utilizados na rotina clínica também sofrem influência de fatores não nutricionais, como prejuízo da função hepática e estado infla- matório. Embora não existam dados prospectivos sobre o comportamento dos marcado- res nutricionais, alguns autores conseguiram demonstrar associações de alguns parâ- metros com desfecho clínico. A utilização de marcadores como albumina, colesterol, pré-albumina, IGF-1, apli- cação da avaliação subjetiva global e cálculo do balanço nitrogenado parecem ser úteis como parâmetros de triagem para pior prognóstico e maior mortalidade em pacientes com LRA. Em pacientes com LRA em terapia renal substitutiva, uma oferta calórica em torno de 25 a 30 kcal/kg e oferta mínima de 1,5 g/kg/dia de proteínas é recomendada a fim de minimizar o catabolismo proteico e prevenir complicações metabólicas. IRA é definida como a redução aguda da função renal em horas ou dias. Refere- se principalmente a diminuição do ritmo de filtração glomerular e/ou do volume urinário, porém, ocorrem também distúrbios no controle do equilíbrio hidro-ele- trolítico e ácido-básico (SBN, 2007). Devido às diversas condições que podem contribuir de modo importante na redu- ção da ingestão alimentar e depleção nutricional dos pacientes com LRA, foi proposta pela ISRNM Expert Panel (International Society of Renal Nutrition and Metabolism) uma terminologia mais abrangente e adequada. Sabe-se que a depleção de tecido muscular e adiposo que caracteriza a desnutrição é consequente da baixa ou inadequada ingestão de nutrientes. Entretanto, muitas condições inerentes à doença renal também podem contribuir de modo importante a essa depleção, mesmo em vigência de uma ingestão adequada. Diante disso, considerando as diversas influências relacionadas à doença re- nal no prejuízo nutricional, a utilização do termo “protein-energy wasting” (PEW) foi con- siderada mais apropriada para a caracterização dessa situação, traduzida e utilizada na rotina clínica como depleção energético-proteica. Esse termo representa, da melhor forma, as consequências metabólicas negativas da perda aguda da função renal no es- tado nutricional. Dessa forma, o PEW é consequência das situações de desnutrição (baixa inges- tão de nutrientes), ação das toxinas urêmicas, inflamação e hipercatabolismo. Dentre as causas para esses fatores encontram-se diversos relacionados à do- ença renal, tais como o tratamento dialítico (membrana dialítica), a perda de nu- trientes por esse procedimento, os distúrbios endócrinos, a presença de comor- bidades (diabetes, doença cardiovascular, infecção, idade avançada), a anore- 35 xia, a acidose, o aumento da produção de citocinas inflamatórias, o estresse oxi- dativo, a hipervolemia, a redução da ingestão de nutrientes e as prescrições de dietas restritivas (FOUQUE, 2008 apud BERBEL, 2011) Como consequência de todos os fatores desencadeantes dessa síndrome, po- dem-se encontrar níveis reduzidos de albumina, pré-albumina e lípides, redução de peso, IMC e gordura corporal, levando a maiores taxas de hospitalização e mortalidade. A desnutrição em pacientes com LRA está acompanhada a maior incidência de complicações, maior tempo de internação e maior mortalidade. Contudo, a obtenção de um diagnóstico nutricional fidedigno é de grande dificuldade, considerando principal- mente a influência de fatores não nutricionais, como inflamação e alteração no estado de hidratação na interpretação dos marcadores disponíveis. 8.1 Antropometria A antropometria é um dos métodos de avaliação nutricional mais utilizados por ser de fácil aplicação e baixo custo. Embora medidas como circunferências do braço e do- bras cutâneas sejam utilizadas como representativas dos compartimentos corporais de tecido adiposo e muscular em diversos tipos de pacientes, seu uso em doentes críticos é muito limitado, pois parece refletir o rearranjo da água corporal total de modo mais acentuado do que modificações na composição corporal. Entretanto, em indivíduos com LRA, Fiaccadori et al. conseguiram demonstrar que pacientes com desnutrição grave prévia, conforme diagnóstico pela Avaliação Subjetiva Global (ASG), também apresen- taram marcadores antropométricos como prega cutânea tricipital e circunferência mus- cular do braço abaixo da normalidade para a população estudada, cursando com maior taxa de mortalidade. Contudo, a dificuldade na unificação dessas medidas em pacientes críticos e a interferência de fatores relacionados à alteração no estado de hidratação tornam a utili- zação desses dados pouco fidedignos como instrumentos de acompanhamento nutrici- onal (BERBEL, 2011). 36 8.2 Índice de Massa Corporal (IMC) O ganho da massa corporal está classicamente descrito como um dos principais fatores de risco para aumento de mortalidade e pior prognóstico na população geral. Contudo, entre os pacientes com LRA, a presença da epidemiologia reversa, também observada em outras patologias, como doença renal crônica, doença pulmonar obstru- tiva crônica e insuficiência cardíaca congestiva, também parece estar evidente. Nesses pacientes, maiores valores de IMC parecem conferir efeitos mais vantajosos na sobre- vida e prognóstico clínico. Estudo prospectivo analisando dados de 5.232 pacientes com LRA dialítica mostrou que pacientes com IMC entre 30 e 35 kg/m² apresentaram redução de 20% na probabilidade de sobrevida. Neste estudo, apesar da obesidade ter sido fator de risco independente para o desenvolvimento da LRA, indivíduos com IMC superior tiveram sobrevida maior quando comparados com aqueles com IMC inferior a 25 kg/m². Deve-se considerar que o IMC não é uma medida perfeita de composição corporal, por ser influenciado pela presença de edema. 8.3 Nutrição na lesão renal aguda Necessidades de macronutrientes Fonte:uol.com37 O suporte nutricional no paciente com LRA deve ser o mesmo do que outros paci- entes em situações de catabolismo, com o objetivo de atingir as necessidades ótimas de energia, proteínas e micronutrientes a fim de prevenir o PEW, preservar a massa mus- cular, melhorar a cicatrização, melhorar a função imunológica e reduzir a taxa de morta- lidade. Para atingir as necessidades nutricionais do paciente com LRA, devem ser con- siderados em primeiro lugar a severidade da doença de base, o estado nutricio- nal prévio, a presença de complicações e o tipo e intensidade de TRS. Estes fatores exercerão papel mais importante na determinação da oferta de nutrientes do que a própria LRA (CANO, 2009 apud BERBEL, 2011). Calorias A LRA por si só não acarreta aumento do gasto energético, sendo que a oferta recomendada não deve exceder 130% do gasto energético basal. Para determinação das necessidades energéticas, deve ser aplicada a calorimetria indireta. Na impossibili- dade de utilizar essa ferramenta, recomenda-se a oferta calórica de 25 a 30 kcal/kg/dia. Ofertas superiores parecem não apresentar vantagem quando analisados seus efeitos sobre o balanço nitrogenado e complicações metabólicas de pacientes com IRA em TRS. Fiaccadori et al., ao compararem indivíduos recebendo dietas com 30 kcal/kg e 40 kcal/kg, ambos em regime proteico de 1,5 g/kg/dia, mostraram que a oferta superior não apresentou vantagem sobre a melhora significante no balanço nitrogenado, além de ter contribuído para fatores negativos, como hiperglicemia, hipertrigliceridemia, maior ne- cessidade de uso de insulina e maior volume de líquido ofertado. As recomendações para lipídeos segundo as diretrizes europeias variam de 0,7 a 1,5 g/kg/dia29. Outros autores orientam a utilização em torno de 30% ou 1/3 das calorias totais não proteicas, ambos utilizando emulsão lipídica composta por triglicérides de ca- deia média e longa. Como a oxidação de ácidos graxos se encontra reduzida na LRA, os triglicérides séricos devem ser monitorados cuidadosamente, suspendendo a admi- nistração de dieta quando seus níveis excederem 400 mg/dL. Quanto aos carboidratos, 2/3 das calorias não proteicas totais ou entre 2 a 5 g/kg/dia de glicose devem ser ofertados. É importante ressaltar que pacientes com LRA em diálise peritoneal podem absorver em torno de 40% a 50% da gli- cose total prescrita no dialisato, contribuindo de modo importante na oferta de calorias de glicose, devendo ser consideradas no cálculo das necessidades to- tais (PODEL, 2000 apud BERBEL, 2011). 38 Proteínas Considerando a taxa de catabolismo proteico de pacientes com IRA em TRS com variações entre 1,4 a 1,8 g/kg, a recomendação superior a 1,5 g/kg/dia objetiva minimizar as perdas nitrogenadas desses pacientes. Fiaccadori et al. sugerem que a oferta proteica seja baseada no grau de catabolismo. Tratamento conservador - baixo catabolismo 0,8 g/kg/dia Em terapia extracorpórea - hipercatabolismo moderado 1,0 a 1,5 g/kg/dia Hemodiálise estendida ou hemodiálise contínua - hipercatabolismo grave 1,5 a 2,0 g/kg/dia Micronutrientes Fonte: vponline.com Existem poucos estudos sobre as necessidades de minerais e vitaminas em paci- entes com LRA, e a maioria deles é proveniente de pacientes com doença renal crônica. Nos pacientes com LRA, as perdas durante o procedimento dialítico estão entre as cau- sas mais importantes de depleção de micronutrientes. Estudos mostram níveis plasmá- ticos de vitamina C, tiamina e ácido fólico abaixo do normal em pacientes com LRA em TRS. Embora não existam dados prospectivos sobre o comportamento dos marcadores nutricionais, alguns autores conseguiram demonstrar associações com desfecho clínico. 39 A utilização de parâmetros como albumina, colesterol, pré-albumina, IGF-1, aplicação da ASG e cálculo do balanço nitrogenado parece ser útil como parâmetro de triagem para pior prognóstico e maior mortalidade em pacientes com LRA. Em pacientes com LRA em TRS, uma oferta calórica em torno de 25 a 30 kcal/kg e oferta mínima de 1,5 g/kg/dia de proteínas é recomendada, a fim de minimizar o catabolismo proteico e complicações metabólicas. 40 9 BIBLIOGRAFIA ALIGLERI, M. Doenças renais atingem 10% dos brasileiros. Folha de Londrina, Lon- drina, 07 abr. 2014. Disponível em: Acesso em: 15 mai. 2014. American Dietetic Association. Chronic Kidney Disease Evidence-Based Nutrition Practice Guidelines [Internet]. 2010 [cited May 27, 2016]. Available from: www. adaevi- dencelibrary.com/tmp/pq95.pdf. 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