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Aprendizagem Motora Material Teórico Responsável pelo Conteúdo: Profa. Dra. Ana Maria Forti Barela Revisão Textual: Profa. Ms. Alessandra Fabiana Cavalcanti Aquisição de habilidades motoras • Definição e avaliação de aprendizagem motora • Estágios de aprendizagem • Transferência de aprendizagem • Demonstração e instruções verbais • Feedback aumentado · Definir e distinguir os termos “aprendizagem” e “performance” e descrever diferentes métodos para avaliar aprendizagem de habilidades motoras. · Descrever as principais características e as mudanças apresentadas pelos aprendizes ao longo dos estágios de aprendizagem. · Definir o que é transferência de aprendizagem, enfatizando sua importância no contexto da aprendizagem motora. · Explicar a finalidade das instruções verbais e da demonstração e a eficácia dessas duas formas de comunicação para ensinar habilidades motoras. · Distinguir feedback intrínseco e aumentado, definir conhecimento de resultados e conhecimento de performance e apresentar os principais aspectos relacionados ao feedback aumentado para ensinar habilidades motoras. OBJETIVO DE APRENDIZADO Olá aluno(a), Nesta Unidade, vamos avançar um pouco mais nosso conhecimento na área da aprendizagem motora. Portanto, leia atentamente o conteúdo disponibilizado e o material complementar, lembrando sempre que a leitura é o momento oportuno para você registrar suas dúvidas e transmiti-las ao tutor. Bom estudo!!! ORIENTAÇÕES Aquisição de habilidades motoras UNIDADE Aquisição de habilidades motoras Contextualização Tendo em vista que na maioria das aulas o professor de educação física ensina habilidades motoras a seus alunos, é importante entender o que vem a ser aprendizagem motora, como ela pode ser verificada durante as aulas e como classificar seus alunos por meio de estágios de aprendizagem. No entanto, para ensinar qualquer habilidade motora, você, futuro professor de educação física deve saber qual a melhor maneira de transmitir informações a seus alunos sobre a habilidade a ser ensinada, como fazer as correções e como elaborar um planejamento a longo prazo para que possa otimizar ao máximo as aulas disponíveis que terá para ministrar a seus alunos. Nesta Unidade, apresentarei os principais conceitos relacionados a esses aspectos, partindo do princípio que está claro para você os conceitos apresentados anteriormente. Caso necessário, recorra às Unidades anteriores e revise os materiais apresentados. Como podemos constatar se nossos alunos aprenderam determinada habilidade motora? Será que sempre aprendemos algo totalmente novo ou é possível aproveitar algo do que foi aprendido anteriormente? Como e quando o professor deve corrigir os erros de seus alunos? Ex pl or 6 7 Defi nição e avaliação de aprendizagem motora Já foi mencionado anteriormente que a aprendizagem motora enfatiza a aquisição de habilidades motoras e o aprimoramento da performance de habilidades motoras, decorrentes de prática estruturada, sendo nosso foco predominantemente nas mudanças comportamentais que ocorrem nos aprendizes e nos experts. Sendo assim, é importante distinguir os termos performance e aprendizagem (Quadro 1). Mas por quê? Bem, se entendermos corretamente o que vem a ser aprendizagem, poderemos estabelecer as condições mais apropriadas para a aprendizagem, pois o que fazemos na prática é observar a performance de alguém e inferir se ele/ela aprendeu! Quadro 1: Principais diferenças entre performance e aprendizagem Performance Aprendizagem Comportamento observável Inferida a partir da performance Temporária Relativamente permanente Pode não ser decorrente da prática Decorrente da prática Pode ser influenciada por vários fatores: • Estado de alerta • Ansiedade • Fadiga • Condição física, etc. Não é influenciada pelos fatores que influenciam a performance Aprendizagem é uma mudança eficiente que ocorre em qualquer pessoa para executar uma habilidade, e pode ser considerada como o resultado de prática e/ ou de experiências prévias (MAGILL, 2011). Tendo em vista que aprendizagem é um processo interno (e, portanto, os professores de educação física não têm como observar diretamente esse processo), a aprendizagem deve ser inferida a partir de mudanças comportamentais observáveis (i.e., performance). Sendo assim, vamos entender aprendizagem como sendo uma melhora relativamente permanente na performance, decorrente da prática ou da experiência (MAGILL, 2011). Geralmente, podemos observar cinco características na performance do executante, à medida que a aprendizagem das habilidades progride: (1) aprimoramento, (2) consistência, (3) estabilidade, (4) persistência e (5) adaptabilidade. De modo geral, aprimoramento se refere à melhora observada na performance com o tempo de prática; consistência se refere à maior similaridade entre uma performance e outra da mesma habilidade, portanto, conforme a aprendizagem progride, a performance se torna mais consistente; estabilidade se refere à diminuição das influências de perturbações internas (por exemplo, estresse devido a uma pressão durante a performance) e externas (por exemplo, as condições ambientais) durante a performance; persistência se refere à permanência mais prolongada da melhora da performance; e adaptabilidade se refere à possibilidade de conseguir realizar a mesma habilidade em uma variedade de contextos da performance, levando-se em consideração que dificilmente realizamos uma habilidade em que o contexto 7 UNIDADE Aquisição de habilidades motoras é exatamente o mesmo em todas as repetições daquela habilidade (há sempre pelo menos alguma coisa que muda, como por exemplo, o estado emocional do executante, as características do ambiente a sua volta, etc.). Levando-se em consideração as cinco características apresentadas, imagine uma habilidade motora que você não tem proficiência ainda. Independentemente da habilidade que você imaginou, se lhe for solicitado a realizar tal habilidade várias vezes, provavelmente, você cometerá erros, levará um tempo maior para realizá- la, sua performance será variada entre as repetições (cada repetição será realizada de um jeito), se alguém conversar com você durante a execução da tarefa ou se você estiver ansioso, sua performance será prejudicada, você pode apresentar certa melhora após uma sessão de prática, porém, após alguns dias, se tiver que executar a habilidade novamente parece que voltou à “estaca zero” e, por fim, se lhe for solicitado para realizar a mesma habilidade em um contexto diferente ou mesmo uma variação da habilidade, você pode não ser bem sucedido. Todas essas constatações podem ser observadas em iniciantes. Entretanto, a prática deve favorecer aprendizagem e, consequentemente, à medida que a aprendizagem progride, todas essas características devem modificar, indicando que a aprendizagem ocorreu. Mas como podemos constatar essas características? Bem, todas essas características devem ser constatadas por meio da avaliação da performance! Há diferentes maneiras de se avaliar a performance motora, como por exemplo, por meio de registros de erros, de acertos, de tempo de execução da tarefa ao longo do período de prática, e dependendo dos aspectos que você deseja considerar, você deverá observar se há mudanças nesses registros durante o período de prática. E, mais importante, as mudanças devem indicar aprimoramento, consistência, estabilidade, persistência e adaptabilidade. Portanto, estabeleça situações que ao final da sessão de prática lhe possibilite constatar essas características. Esse método de avaliar aprendizagem pelo registro de níveis de performance com a prática é conhecido como curvas de performance (MAGILL, 2011). Após o registro da medida que você selecionou para registrar, a curva terá um formato que indicará como a aprendizagem evolui. Basicamente, podemos obter quatro tipo de curvas (Figura 1) que representam melhora da performance proporcional ao tempo deprática (curva linear, Figura 1A); melhora acentuada nas primeiras sessões de prática e, posteriormente, pouca melhora (curva negativamente acelerada, Figura 1B); pouca melhora nas primeiras sessões de prática e, posteriormente, melhora acentuada (curva positivamente acelerada, Figura 1C); e pouca melhora nas primeiras e nas últimas sessões de prática, porém uma melhora acentuada nas sessões intermediárias (curva em forma de “S”, Figura 1D). 8 9 (A) Linear Aumento proporcional com o tempo (B) Negativamente Acelerada Grande aumento inicial, menor posteriormente (C) Positivamente Acelerada Pequeno aumento inicial, maior posteriormente (D) Em Forma de S Pequeno aumento inicial e posteriormente, e melhora dramática na fase intermediária Figura 1. Formatos gerais das curvas de performance que indicam a progressão da aprendizagem ao longo do período de prática. Nota: o período de prática pode ser representado por dias, meses, horas, número de tentativas, etc. na abscissa (“eixo x”, horizontal), e a medida da performance é representada na ordenada (“eixo y”, vertical). Além das curvas de performance, há dois testes que podem ser empregados para avaliar a aprendizagem, sendo eles o teste de retenção e o teste de transferência. O teste de retenção verifica a performance das habilidades praticadas depois que tenha transcorrido um período de tempo após o término da prática. Sendo assim, é feita uma avaliação da performance motora antes de iniciar o período de prática para verificar o nível de proficiência inicial do executante. Após a avaliação inicial, há o período de prática e, assim que termina esse período de prática, é feita a mesma avaliação inicial novamente para verificar se o nível de proficiência do(a) executante melhorou logo após o período de prática (e espera-se que sim!!!!). Por fim, após um período sem que ocorra a prática da habilidade, a mesma avaliação é feita novamente para verificar se a melhora do nível de proficiência do executante foi mantida ou não. Em caso positivo, podemos inferir que ocorreu aprendizagem (lembre-se da definição de aprendizagem “...melhora relativamente permanente na performance...”). O teste de transferência envolve uma situação de avaliação em que o(a) aluno(a) deve adaptar a habilidade praticada de acordo com a demanda (ou características) da nova situação. Dessa forma, esse tipo de avaliação pode ser conduzido em um novo contexto ou em uma nova variação da habilidade em si. Por exemplo, imagine que seus alunos tenham praticado, por algum período, o arremesso de ombro em 9 UNIDADE Aquisição de habilidades motoras direção a uma parede sem qualquer demanda de precisão e a uma certa distância fixa, utilizando uma bola de tênis. Durante a avaliação, você pode solicitar aos seus alunos que arremessem a mesma bola a partir de distâncias diferentes e/ou em direção a um alvo específico, demandando precisão (novo contexto), ou você pode solicitar aos seus alunos que arremessem uma bola de tamanho diferente da bola de tênis, ou que realize o arremesso enquanto realiza simultaneamente alguns passos, ou seja, em movimento (nova variação da habilidade). Tendo em vista que a aprendizagem das habilidades motoras é inferida por meio da performance, é importante mencionar que a performance durante a prática não garante que ocorreu aprendizagem (lembrando que a performance pode ser influenciada por vários fatores, como os mencionados no Quadro 1), sendo que a performance durante a prática pode ser superestimada ou subestimada. Sendo assim, você deve ter muita cautela ao selecionar o tipo de avaliação para verificar as mudanças apresentadas por seus alunos nas cinco características gerais da performance das habilidades motoras. Estágios de aprendizagem Ao aprender novas habilidades motoras, todas as pessoas passam por estágios distintos à medida que a aprendizagem progride (MAGILL, 2011). Há diferentes modelos de estágio, entretanto, nesta Unidade abordaremos dois modelos, um proposto por Fitts e Posner (1967) e outro proposto por Gentile (1972). Antes de apresentar os dois modelos de estágios de aprendizagem, é importante mencionar que independentemente do modelo de estágios, as características da performance motora devem mudar do início da aprendizagem até o final da aprendizagem (SCHMIDT; WRISBERG, 2010). De modo geral, no início da aprendizagem, é comum, por exemplo, que o(a) aluno(a) cometa muitos erros, apresente performance inconsistente, ineficiente, imprecisa, com movimentos mais lentos durante a performance. Porém, com a prática, ele tende a diminuir o número de erros (e aumentar o número de acertos), sua performance passa a ser mais consistente, eficiente, precisa, adaptável e fluente. São as mudanças observadas que servirão como base para definir o estágio em que seus alunos se encontram. Portanto, você deve se atentar para essas mudanças comportamentais. Estágios de aprendizagem: modelo de Fitts e Posner Fitts e Posner (1967) apresentaram um modelo clássico de estágios de aprendizagem que continua sendo uma referência na nossa área. Eles propuseram que a aprendizagem de habilidades motoras envolve três estágios, denominados (1) estágio cognitivo, (2) estágio associativo e (3) estágio autônomo. Durante o primeiro estágio de aprendizagem (cognitivo), o(a) iniciante (i.e., aquele(a) que está começando a aprender uma habilidade) focaliza sua atenção nos problemas 10 11 cognitivos, tentando responder a questões do tipo “qual é meu objetivo?”, “o que fazer?”, “como fazer?”. Durante o primeiro estágio, o iniciante apresenta performance inconsistente e com muitos erros. Apesar de muitas vezes os iniciantes perceberem que estão fazendo algo errado, eles normalmente não sabem o que precisam fazer para melhorar sua performance. A transição para o segundo estágio de aprendizagem (associativo) acontece após uma quantidade de prática da performance que não é específica. A partir desse estágio, os iniciantes aprendem a associar dicas ambientais específicas aos movimentos necessários para atingir a meta da habilidade. A quantidade de erros e a variabilidade da performance diminui porque eles adquiriram os fundamentos ou os mecanismos básicos da habilidade, apesar de ainda terem que ser aprimorados. Sendo assim, esse estágio é considerado um estágio de refinamento (FITTS; POSNER, 1967), de modo que os iniciantes precisam ser mais consistentes de uma repetição da performance para a outra, diminuindo a variabilidade. A partir desse segundo estágio, os iniciantes já conseguem detectar seus próprios erros de performance. Após muita prática e experiência, que pode levar muitos anos, algumas pessoas passam para o terceiro estágio de aprendizagem (autônomo), considerado o estágio final proposto por Fitts e Posner. Nesse estágio, a habilidade se torna quase automática, de modo que os executantes não pensam conscientemente sobre as características específicas dos movimentos que fazem parte da habilidade que eles estão realizando durante a performance (justamente porque eles executam a habilidade sem pensar conscientemente). Normalmente, os executantes conseguem realizar uma outra habilidade ao mesmo tempo, como por exemplo, uma pessoa que dirige um carro e conversa com o passageiro ao seu lado ao mesmo tempo. A variabilidade da performance é muito pequena nesse estágio, de modo que as pessoas habilidosas executam as habilidades, consistentemente, bem de uma tentativa para a outra (MAGILL, 2011). Além disso, essas pessoas habilidosas conseguem detectar seus próprios erros e corrigi-los. É importante enfatizar que, de acordo com Fitts e Posner (1967), não são todas as pessoas que conseguem chegar no terceiro estágio de aprendizagem (isso mesmo, não são todos que chegam nesse estágio!). Vários fatores podem contribuir para que as pessoas cheguem no estágio autônomo, tais como qualidade das instruções e da prática e da quantidade de prática. É importante destacar que os três estágiosque compõem o modelo apresentado por Fitts e Posner devem ser entendidos como um contínuo de tempo de prática. Ou seja, à medida que as pessoas praticam determinada habilidade motora, elas passam para o próximo estágio. Entretanto, cabe ressaltar que o quanto de tempo cada pessoa ficará em cada estágio dependerá da habilidade motora que está sendo aprendida, das condições de prática e das características da pessoa que está aprendendo (diferenças individuais!!). 11 UNIDADE Aquisição de habilidades motoras A transição de um estágio para o outro não é tão evidente, mas sim gradual. Sendo assim, geralmente, é difícil detectar em que estágio o(a) aluno(a) se encontra em um momento específico. No entanto, uma coisa é certa: a diferença entre um(a) iniciante e uma pessoa habilidosa é evidente, de modo que você, enquanto professor(a) de educação física pode observar! Estágios de aprendizagem: modelo de Gentile O segundo modelo de estágios de aprendizagem que vou abordar nesta Unidade é o modelo proposto por Gentile (1972; 2000). Ao contrário de Fitts e Posner, Gentile via a aprendizagem de habilidades motoras como uma progressão ao longo de dois estágios: estágio inicial de aprendizagem e estágios finais de aprendizagem. Ela apresentou esses estágios a partir de uma perspectiva da meta do iniciante em cada estágio. Porém, antes de apresentar esses dois estágios, é importante entender o que são condições reguladoras e condições não reguladoras que ela considera em seu modelo. Condições reguladoras se referem às características do contexto ambiental que determinam as características do movimento que o(a) executante deve utilizar para atingir a meta da tarefa. Por outro lado, condições não reguladoras se referem às características do contexto ambiental que não influenciam as características do movimento que o(a) executante deve utilizar para atingir a meta da tarefa. Por exemplo, vamos supor que você tenha que arremessar uma bola para alguém. Nessa situação, as condições reguladoras podem ser o tamanho da bola, o peso da bola, a distância entre você e a pessoa para quem arremessará a bola, etc. Já as condições não reguladoras podem ser a cor da bola, o sexo (feminino ou masculino) da pessoa para quem você arremessará a bola, etc. Sendo assim, se a bola for pequena, você poderá arremessá-la com uma mão e se for muito grande, terá que utilizar as duas mãos para arremessá-la; dependendo do peso da bola e da distância entre você e a pessoa para quem você terá que arremessar a bola, você deverá aplicar mais força ou menos força. Portanto, todas essas características determinarão como os movimentos deverão ser realizados pelo(a) executante. Por outro lado, se a bola for branca, vermelha, azul, e se quem for receber a bola for do sexo masculino ou do sexo feminino, essas características não irão influenciar diretamente em como os movimentos deverão ser realizados pelo(a) executante. No estágio inicial, o(a) iniciante tem duas metas importantes para atingir: (1) adquirir o padrão de coordenação do movimento conforme as condições reguladoras e (2) discriminar as condições reguladoras e não reguladoras. Isso significa que o(a) iniciante deve (1) desenvolver características de movimento que estejam de acordo com as condições reguladoras do contexto ambiental em que a habilidade é executada; e (2) sabendo discriminar quais são as condições reguladoras de não reguladoras, voltar sua atenção para as condições reguladoras. Para atingir essas duas metas importantes, o(a) iniciante explora uma variedade de possibilidades de movimento, e por meio de tentativa e erro, ele(a) vivencia as características de movimento que combinam com os requisitos das condições 12 13 reguladoras. Tendo em vista que o(a) iniciante tem que solucionar vários problemas para determinar como atingir a meta da habilidade, esse estágio é considerado altamente cognitivo (assim como o primeiro estágio do modelo proposto por Fitts e Posner apresentado anteriormente). Ao final desse estágio, o(a) iniciante desenvolveu um padrão de coordenação que o(a) permite atingir a meta da ação, porém, ele(a) ainda não apresenta consistência para executar a habilidade, e sua performance não é eficiente (GENTILE, 2000). No segundo estágio, denominado de estágios finais, os quais sugerem a possibilidade de mais de um estágio, o(a) iniciante precisa adquirir três características gerais: adaptabilidade, consistência e eficiência. Sendo assim, a pessoa deve ser capaz de adaptar o padrão de movimento, adquirido no primeiro estágio, às demandas específicas de qualquer situação de performance que a habilidade exige, aumentar sua consistência (diminuir a variabilidade) para atingir a meta da habilidade, e aprender a executar a habilidade com o menor gasto energético. Uma característica única do segundo estágio do modelo de Gentile é que as metas do iniciante dependem do tipo de habilidade (i.e. se a habilidade motora é fechada ou aberta – lembre-se da classificação das habilidades apresentadas em outra unidade). As habilidades motoras fechadas requerem fixação do padrão básico de coordenação do movimento adquirido no estágio inicial. Isso quer dizer que o(a) iniciante deve refinar seu padrão de modo que ele(a) consiga atingir a meta da habilidade consistentemente. É preciso conseguir executar o padrão de movimento com o mínimo de esforço consciente (i.e. automaticamente) e o mínimo gasto energético. Sendo assim, a prática de uma habilidade motora fechada durante esse estágio deve oferecer aos iniciantes a oportunidade de “fixar” o padrão de coordenação de tal modo que eles consigam executar tal habilidade consistentemente. Vamos pensar, por exemplo, no lance livre no basquete. Essa habilidade é classificada como fechada, pois o arremesso é realizado sempre do mesmo local com o mesmo tipo de bola e as condições reguladoras da tarefa não mudam durante a sua execução. Consequentemente, as condições de prática do lance livre não devem variar de modo a favorecer a fixação do padrão de coordenação dos movimentos necessários para executá-lo com êxito. Por outro lado, as habilidades motoras abertas requerem diversificação do padrão básico de coordenação do movimento adquirido no estágio inicial. Uma característica importante das habilidades motoras abertas é que elas exigem que os executantes se adaptem rapidamente a mudanças contínuas nas condições reguladoras da habilidade. Com isso, o(a) iniciante deve estar sintonizado às condições reguladoras e conseguir modificar seus movimentos de acordo com as demandas da performance que mudam constantemente. Ao contrário do lance livre citado anteriormente, pense nos arremessos à cesta durante o jogo. A cada vez que o arremesso é realizado, deve-se considerar a distância entre o local de arremesso e a cesta, os jogadores que estão por perto, o tempo que se tem para arremessar, etc. Todos esses aspectos são considerados as condições reguladoras que mudam constantemente. Portanto, as condições de prática devem ser diversificadas de modo a permitir o desenvolvimento de adaptações rápidas às mudanças de contexto. 13 UNIDADE Aquisição de habilidades motoras Importante! Com base no que apresentamos até o momento nesta Unidade, é importante ressaltar que, independentemente do modelo de estágio que abordamos, durante o estágio inicial, o foco deve ser na meta da habilidade para desenvolver o padrão básico de coordenação da habilidade; e é preciso estabelecer as situações práticas que ofereçam a oportunidade para discriminar os aspectos mais relevantes da habilidade (no caso do modelo de Gentile, as características reguladoras e não reguladoras). Vale lembrar que no estágio inicial deve-se manter as características do contexto mais previsíveis possíveis, evitando que as mesmas interfiram no padrão de coordenação. Lembre-se: esse é o estágio inicial de aprendizagem!!! Durante os estágios subsequentes, devemos considerar se a habilidade queestá sendo ensinada é classificada como aberta ou fechada. No caso das habilidades fechadas, deve-se incluir na prática as características mais similares possíveis da situação real em que ela será executada. No caso das habilidades abertas, deve-se variar ao máximo as características das situações reais que as habilidades serão executadas. Trocando ideias... Transferência de aprendizagem A transferência de aprendizagem é um dos princípios de aprendizagem mais aplicados universalmente (MAGILL, 2011). No contexto educacional, esse princípio é uma parte importante do desenvolvimento do currículo e das instruções, pois ele fornece a base para organizar a sequência em que os alunos irão aprender habilidades!! No contexto esportivo, o princípio de transferência fornece base para o sequenciamento de habilidades que devem ser aprendidas, o desenvolvimento de exercícios ou de treinos a serem executados e os tipos de experiências práticas que os atletas precisam ter antes de se engajarem em um jogo ou campeonato. Mas o que é transferência de aprendizagem? Normalmente, transferência de aprendizagem é definida como sendo a influência de experiências anteriores na execução de uma habilidade em um novo contexto ou na aprendizagem de uma nova habilidade (MAGILL, 2011). Tal influência pode ser positiva, negativa ou nula (zero). A transferência positiva ocorre quando a experiência anterior facilita a performance de uma habilidade em um novo contexto ou a aprendizagem de uma nova habilidade; a transferência negativa ocorre quando a experiência anterior atrapalha ou interfere na performance de uma habilidade em um novo contexto ou a aprendizagem de uma nova habilidade; na transferência nula não ocorre qualquer transferência, indicando que a experiência anterior não tem qualquer influência na performance de uma habilidade em um novo contexto ou a aprendizagem de uma nova habilidade. A Figura 2 ilustra exemplos de cada tipo de transferência de aprendizagem. 14 15 A Lance livre Arremesso com salto B Drible no basquete Drible no handebol C Natação Andar de bicicleta Figura 2. Exemplos que ilustram transferência de aprendizagem positiva (A), negativa (B) e nula (C) Fonte: iStock/Getty Images 15 UNIDADE Aquisição de habilidades motoras Importante! Levando-se em consideração que a transferência positiva é um efeito benéfico de experiências anteriores na aprendizagem ou na performance de uma nova habilidade ou na performance de uma habilidade em um novo contexto, o(a) professor(a) deve sempre levar em consideração a similaridade dos elementos que compõem as habilidades motoras, a similaridade dos contextos ambientais em que as habilidades serão executadas, e até mesmo a similaridade do processamento cognitivo envolvido nas duas situações. Lembre-se que quanto maior a semelhança entre os componentes de duas habilidades motoras, maior será a quantidade de transferência positiva. No caso de experiências anteriores, um aumento da transferência pode ser notado quando aquele(a) que está aprendendo uma determinada habilidade teve experiência anterior em habilidades com componentes semelhantes ao da habilidade a ser aprendida. Sendo assim, um repertório motor amplo (habilidades motoras fundamentais) propiciará maior facilidade de aprendizagem de novas habilidades ou habilidades mais complexas! Importante! Aspectos que justificam a importância da transferência de aprendizagem Tendo em vista que o princípio de transferência de aprendizagem é importante, vamos apresentar alguns aspectos que justificam sua importância, sendo eles (1) o sequenciamento das habilidades a serem aprendidas, (2) os métodos de instrução e de treinamento e (3) a avaliação da eficácia das condições de prática (MAGILL, 2011). Para entender sobre o sequenciamento das habilidades a serem aprendidas, vamos considerar como exemplo o sequenciamento das habilidades matemáticas que é prático e útil. Se pensarmos nos primeiros anos escolares, a sequência específica comumente adotada pelos professores é apresentar aos seus alunos a identificação numérica, a escrita numérica, a identificação do valor numérico, adição, subtração, multiplicação e divisão. Tal sequência é adotada porque cada conceito é baseado no conceito apresentado anteriormente. Por exemplo, alguém saberá fazer a divisão somente depois de ter aprendido como fazer adição, subtração e multiplicação. Porém, será possível fazer essas operações somente após conhecer os números! Ainda, já imaginou se a divisão fosse a primeira operação dessa sequência a ser ensinada? Bem, o mesmo se aplica para as habilidades motoras em um programa de educação física ou de esportes. Onde se deve aprender a executar as habilidades que serão utilizadas antes de combiná-las no contexto real. Dessa forma, ao desenvolver um currículo escolar ou um programa de atividade física ou esporte, você deve incorporar o princípio da transferência de aprendizagem ao sequenciar as habilidades. Os seus alunos devem adquirir as habilidades básicas ou fundamentais antes de adquirirem as habilidades mais complexas que requerem o domínio das habilidades básicas (lembre-se sempre das operações matemáticas: a ordem de apresentação é muito importante!!!). O(A) professor(a) deve levar em consideração no seu planejamento como a aprendizagem de uma habilidade beneficiará a 16 17 aprendizagem de outras habilidades. Do contrário, ele(a) poderá dispender mais tempo que o necessário (e nem sempre disponível) enquanto seus alunos terão que “voltar atrás” para adquirir os pré-requisitos de habilidades básicas. Sendo assim, ao invés de ir direto a uma modalidade esportiva, trabalhe primeiramente com as habilidades básicas ou fundamentais envolvidas na referida modalidade, tais como, arremessar, receber, correr, driblar, rebater, etc. Ao tratar do segundo aspecto sobre a importância da transferência de aprendizagem, os métodos de instrução e de treinamento, podemos pensar em várias situações de ensino. Por exemplo, no início da aprendizagem de uma habilidade motora, podemos praticar partes dessa habilidade e, posteriormente, praticar a habilidade como um todo; ou então praticar a habilidade em um contexto (que não é o real), e após um período continuar a prática no contexto real: na natação, pode-se praticar alguns movimentos fora da água e depois dentro da água; aprende-se a arremessar com uma bola de tênis antes de praticar o arremesso com uma bola de handebol ou de basquete; aprende-se a sacar uma bola sem a rede e, posteriormente, o saque deve ser sobre a rede (e ainda, pode-se em um primeiro momento se posicionar próximo à rede e aumentar essa distância gradativamente até a posição que se deve sacar em uma situação real). Além desses exemplos, é importante mencionar que durante o ensino de uma habilidade específica, o(a) professor(a) deve enfatizar os aspectos semelhantes a outras habilidades aprendidas anteriormente. Com isso, havendo planejamento, o tempo pode ser melhor aproveitado, principalmente se levarmos em consideração que nem sempre estamos aprendendo algo totalmente novo. Por fim, a avaliação da eficácia das condições de prática, que é o terceiro aspecto sobre a importância da transferência de aprendizagem, serve para o professor determinar o quão eficaz ou útil foi sua rotina de prática ou o método de instrução adotado. Para isso, o teste de transferência já apresentado nesta Unidade fornecerá a melhor avaliação!!! Digamos que você ensinou aos seus alunos todas as habilidades fundamentais que são utilizadas em uma determinada modalidade esportiva, modificou o contexto ambiental do início da prática até as últimas sessões de prática e, finalmente, inscreveu seus alunos em um determinado campeonato. A performance de seus alunos durante o campeonato será a melhor forma para avaliar se sua conduta, durante todo o processo, foi eficaz ou não. Transferência bilateral Quando a transferência de aprendizagem está relacionada à aprendizagemda mesma habilidade, mas com o membro contralateral (lado oposto do nosso corpo), ela é conhecida como transferência bilateral (MAGILL, 2011). Tal fenômeno demonstra nossa capacidade de aprender uma habilidade específica mais facilmente com uma mão ou com o pé após já ter aprendido essa habilidade com a mão ou com o pé contralateral. Arremessar, rebater, sacar, chutar, são exemplos de habilidades motoras que podem ser aprendidas com um lado do corpo e depois com o lado contralateral. 17 UNIDADE Aquisição de habilidades motoras Uma das questões mais intrigantes sobre transferência bilateral é em relação à direção da transferência. Se o membro que foi utilizado primeiro para aprender uma determinada habilidade motora propicia maior ou menor quantidade de transferência para o membro contralateral, dizemos que essa transferência é assimétrica, e nesse caso, a prática deve ser sempre com um membro e depois com o outro. A visão tradicional tem sido de que há maior quantidade de transferência quando se pratica, inicialmente, com o membro preferido (MAGILL, 2011). Por outro lado, se a quantidade de transferência for similar de um membro para o outro, independentemente de qual membro foi utilizado primeiro, dizemos que essa transferência é simétrica, e nesse caso, não importa com qual membro praticar primeiro. Sabendo-se que transferência de aprendizagem ocorre entre habilidades e entre os lados do corpo, como podemos manipular esse efeito? • Organize a aprendizagem de forma que o(a) aluno(a) aprenda primeiramente as habilidades necessárias para outras situações que as exijam. • Mostre para seus alunos os aspectos similares da habilidade motora que está sendo aprendida com as que já aprenderam anteriormente. • Maximize a semelhança entre a situação de ensino e a situação real em que a habilidade motora será realizada. • Proporcione experiência adequada com a habilidade motora original, como por exemplo, jogos preparatórios antes de um campeonato. • Propicie uma variedade de exemplos ao ensinar uma habilidade ou uma situação de movimentos. • Chame atenção para as partes ou os conceitos que devem ser considerados para a transferência positiva e negativa. Ex pl or Demonstração e instruções verbais Se você quisesse instruir alguém sobre como executar uma habilidade motora, como faria isso? Provavelmente, você realizaria a habilidade, descreveria verbalmente a habilidade ou então combinaria as duas coisas. Antes de decidir sobre a forma mais adequada ou preferida, é importante ter conhecimento sobre a eficácia das diferentes formas de comunicação e qual escolher ou quando utilizar cada forma ou ambas. Sendo assim, vou apresentar para você os principais aspectos sobre essas duas formas de fornecer informações. Demonstração A demonstração é uma estratégia de instrução que estimula a aprendizagem por observação. É a aprendizagem de uma habilidade que resulta da observação direta de alguém executando uma habilidade. A demonstração é utilizada como sinônimo de modelo e de aprendizagem por observação. Modelo se refere ao uso 18 19 da demonstração como um meio para transmitir informação sobre como executar uma habilidade; e a aprendizagem por observação se refere à aprendizagem de uma habilidade pela observação de alguém que a executa (MAGILL, 2011). Tendo em vista que a informação visual é utilizada durante a observação, a demonstração de alguém habilidoso, como fotografias ou figuras que ilustram os movimentos que compõem a habilidade, filmes ou vídeos são as formas mais comuns de se apresentar informações sobre as habilidades motoras. O “modelo” deve ser alguém capaz de executar os movimentos que têm as características essenciais da habilidade e que ofereça ao observador uma imagem do estado desejado. O modelo é muito eficiente no início da aprendizagem. Entretanto, não é eficiente se: o(a) observador(a) não estiver prestando atenção ou não conseguir visualizar o modelo. Sendo assim, é importante que o(a) professor(a) chame a atenção de seus alunos antes de apresentar o modelo e se certifique de que este ofereça aos alunos a melhor visão do padrão adequado do movimento, e para tanto, deve se considerar o posicionamento do modelo em relação aos observadores. O que será que o observador percebe da demonstração? Bem, o observador percebe o padrão de coordenação da habilidade! Cabe mencionar que perceber é algo que pode ser consciente ou inconsciente. O que alguém percebe a partir da demonstração de uma habilidade não é necessariamente algo que olhou especificamente (MAGILL, 2011). Para esclarecer essa questão, observe a Figura 3. Figura 3. Ilustração que exemplifi ca a técnica do ponto de luz Fonte: Acervo da conteudista Essa figura ilustra um exemplo de um procedimento denominado “técnica do ponto de luz”, sendo utilizado para determinar a informação relativa que as pessoas usam para perceber e para identificar ações coordenadas (MAGILL, 2011). Nessa figura, marcadores refletivos foram afixados em referências anatômicas específicas de uma pessoa realizando uma determinada habilidade motora e foram filmadas (com configurações especiais, que não vem ao caso descrever aqui). A partir da imagem filmada, os observadores visualizam somente os marcadores refletivos e, normalmente, conseguem identificar qual é a habilidade motora executada. Apesar de na figura apresentada ter somente uma imagem, você provavelmente percebeu que se trata de alguém correndo, certo? Para identificar o padrão de coordenação 19 UNIDADE Aquisição de habilidades motoras (que determina a habilidade motora), o observador percebe e utiliza os aspectos invariantes do padrão do movimento coordenado para desenvolver seu próprio padrão de movimento, para então executar a habilidade. É importante notar que aspectos invariantes se referem a um conjunto único de características que define um padrão de movimento e não varia de uma performance para outra. E é isso que os observadores percebem durante a demonstração! Instruções verbais Talvez as instruções verbais sejam a forma mais utilizada nas situações de ensino para transmitir informação. Essas instruções informam sobre os aspectos fundamentais da habilidade, e podem ser utilizadas para enfatizar semelhanças entre habilidades ou sobre algo aprendido anteriormente (transferência de aprendizagem), além de poderem oferecer informações sobre sensações que o(a) aluno(a) pode vivenciar ao executar a habilidade e têm o efeito de direcionar o foco de atenção do(a) aluno(a). Há evidências de que as instruções verbais facilitam a aquisição de habilidade. Entretanto, é importante apresentar alguns fatores que devem ser considerados para tornar as instruções verbais como um meio efetivo de transmitir informação sobre a habilidade motora a ser aprendida. Tendo em vista algumas das questões sobre capacidade de atenção e de memória de curto prazo, abordadas em outra unidade, você deve levar em consideração várias características sobre as instruções que serão fornecidas aos seus alunos. Uma delas é a quantidade de instruções que será fornecida a eles. Um(a) iniciante terá dificuldade para prestar atenção em mais de uma ou de duas instruções sobre o que fazer, pois ele(a) precisará dividir sua atenção entre lembrar as instruções e executar a habilidade em si, de modo que uma quantidade mínima de instruções pode exceder os limites de capacidade de atenção dos iniciantes. Sendo assim, utilize frases simples e direta, com instruções claras, enfatizando no máximo dois conceitos principais ao mesmo tempo. Do contrário, os iniciantes terão dificuldades para lembrar e para prestar atenção. Um dos problemas associados às instruções verbais é que eles podem conter pouca ou muita informação e não fornecer aos iniciantes o que eles precisam saber para atingir a meta da habilidade. Para solucionar esse problema, os professores podem usar dicas verbais para direcionar as pessoas sobre o que fazer para executar ashabilidades. As dicas verbais devem ser curtas, compostas por frases concisas que servem para direcionar a atenção do executante para as condições reguladoras no contexto ambiental, ou servem como um aviso chave sobre os componentes de movimento das habilidades (MAGILL, 2011). Por exemplo, a dica “olhe para a bola” direciona a atenção visual enquanto a dica “flexione seu joelho” avisa sobre um componente essencial do movimento. Normalmente, essas dicas verbais são efetivas como instruções verbais para facilitar a aquisição de novas habilidades e para executar habilidades já adquiridas. 20 21 Lembre-se de que na prática, as instruções devem ser declarações curtas, relacionadas de maneira lógica aos aspectos da habilidade para que elas sejam respondidas logo em seguida. As instruções verbais podem orientar uma sequência de vários movimentos e devem ser limitadas em números. É preferível que se forneça dicas sobre os aspectos mais críticos para a execução da habilidade. Além disso, essas dicas podem ser úteis para orientar os desvios de atenção (MAGILL, 2011). Importante! Ao se comparar demonstração e instruções verbais, é importante lembrar que a demonstração é mais indicada quando a habilidade a ser aprendida requer aquisição de um novo padrão de coordenação, como por exemplo, ao aprender a sacar uma bola no voleibol, um novo passo de dança, etc. As instruções verbais, por outro lado, são mais indicadas quando a habilidade a ser aprendida requer a aquisição de uma nova característica de parâmetro de controle para um padrão de coordenação já adquirido, como por exemplo, após ter adquirido o padrão de coordenação do saque no voleibol, pode variar a direção do saque, a altura do saque, a velocidade do saque, etc. E, nesse caso, utilize instruções verbais para informar aos seus alunos como fazer. Importante! Evite fazer comentários verbais durante a demonstração e certifique-se de que o(a) observador(a) possa ver os aspectos críticos da habilidade demonstrada. Nesse caso, é útil chamar atenção com uma dica verbal imediatamente antes da demonstração. Se não puder demonstrar a habilidade por não saber executá-la muito bem, utilize outra forma de demonstração, como vídeo, fotos ou até mesmo outra pessoa que seja habilidosa. Em alguns casos, deixe que os iniciantes observem outros iniciantes, praticando a habilidade. Isso pode ajudar na demonstração e funciona bem quando há limitações de espaço e/ou de materiais disponíveis. Feedback aumentado Feedback é um termo genérico que descreve informação que as pessoas recebem sobre a performance de uma habilidade motora, sendo essa informação disponibilizada durante ou após a performance (MAGILL, 2011). Sendo assim, à medida que realizamos determinada habilidade motora, podemos ter disponível dois tipos de informação gerais sobre o resultado da nossa performance motora e sobre o que causou tal resultado. Um tipo de feedback, já abordado em outra Unidade, é o feedback intrínseco, que se refere à informação sensorial do executante, disponível naturalmente durante ou após a performance motora. O segundo tipo de feedback, que será abordado nesta Unidade, é o feedback aumentado, conhecido também como feedback extrínseco (fonte externa). 21 UNIDADE Aquisição de habilidades motoras O feedback aumentado, como o próprio nome sugere, aumenta ou suplementa a informação naturalmente disponível (ou seja, o feedback intrínseco) e é o tipo de informação que o(a) professor(a) de educação física tem controle para influenciar na aprendizagem de qualquer habilidade motora. Portanto, o feedback aumentado pode ou não ser fornecido pelo(a) professor(a), em diferentes momentos e de diferentes maneiras. Quem decide sobre essas questões é o(a) próprio(a) professor(a)! Há duas categorias de feedback aumentado: (1) conhecimento de resultados e (2) conhecimento de performance. Cada categoria envolve várias formas de apresentar o feedback aumentado, portanto, é importante entender cada uma dessas categorias. Conhecimento de resultados (CR) é a informação apresentada externamente sobre o resultado da performance de uma habilidade ou sobre se o(a) executante atingiu ou não a meta da performance. Às vezes o CR é redundante com o feedback intrínseco, como por exemplo, se o(a) executante realiza um arremesso ou chuta uma bola em direção ao gol e o CR é sobre o acerto ou erro de sua performance (i.e. se atingiu a meta da performance). Porém, há situações em que o CR não é redundante com o feedback intrínseco, como ocorre se o(a) professor(a) (ou qualquer outra fonte externa de informação) informar para o(a) executante o tempo que levou para ele(a) concluir determinada tarefa, a distância que percorreu, etc. O conhecimento de performance (CP), por outro lado, é a informação apresentada externamente sobre as características do movimento que levam ao resultado da performance. Sendo assim, CP difere de CR em termos de qual aspecto da performance a informação se refere. Se considerarmos os exemplos citados anteriormente (arremessar ou chutar uma bola), o(a) professor(a) poderia fornecer CP informando ao seu/sua aluno(a) que ele(a) não flexionou o joelho, por exemplo. Além de fornecer CP verbal, é possível oferecer CP por meio de imagens registradas durante a performance, tais como fotos, vídeos, mostrando para o(a) executante o que ele(a) fez durante a sua performance. Dessa forma, ele(a) pode observar o que de fato foi realizado. O Quadro 2 apresenta uma comparação entre CR e CP (SCHMIDT; WRISBERG, 2010). Quadro 2: Principais diferenças e semelhanças entre conhecimento de resultados (CR) e conhecimento de performance (CP) CR CP Informação sobre o resultado em termos de meta ambiental Informação sobre o padrão do movimento (coordenação) Geralmente, redundante com o feedback intrínseco Normalmente, distinto do feedback intrínseco Semelhanças Normalmente verbal Extrínseco (fonte externa de informação) Oferecido durante (habilidades contínuas) ou após (habilidades discretas) a execução da habilidade 22 23 Normalmente, os professores de educação física fornecem mais CP verbal do que CR verbal, e isso se deve ao fato de que o CP proporciona aos seus alunos mais informação para ajudá-los em relação aos aspectos dos movimentos envolvidos durante a performance da habilidade. Entretanto, um dos problemas que surge com o uso do CP verbal é determinar o conteúdo apropriado, ou seja, o que falar para o(a) aluno(a) que está praticando determinada habilidade. Tal problema surge porque as habilidades são normalmente complexas e o CP geralmente está relacionado a características específicas da performance da habilidade. O grande desafio para o(a) professor(a) é selecionar as características apropriadas da performance nas quais o CP deve se basear (MAGILL, 2011). A primeira coisa que o(a) professor(a) deve fazer é realizar uma análise da habilidade que será ensinada, com o intuito de identificar as várias partes que a compõem. A partir dessa identificação, ele(a) deve priorizar cada parte em termos de quão crítica essa parte da habilidade é para executá-la. Para determinar qual parte é mais crítica, o(a) professor(a) define qual parte da habilidade deve ser feita totalmente correta para que o(a) aluno(a) atinja a meta da habilidade. Suponhamos que para um arremesso no basquete, o componente mais crítico seja olhar para a cesta. Essa parte é a mais crítica porque mesmo se um(a) iniciante fizer todas as demais partes corretamente (o que normalmente não ocorre no início da aprendizagem), há pouquíssima chance de ele(a) arremessar precisamente a bola sem olhar para a cesta. Nesse caso, na análise da habilidade, olhar para a cesta seria a primeira prioridade e seria a primeira parte da habilidade a ser avaliada para determinar o que fornecer em termos de CP. Após determinar sobre quais aspectos da habilidade se deve fornecer CP, você precisa decidir sobre o que informar para seus alunos. Há dois tipos de CP verbal:descritivo e prescritivo. O CP descritivo simplesmente descreve os erros que o(a) aluno(a) cometeu, enquanto que o CP prescritivo, além de identificar o erro, informa para ele(a) o que fazer para corrigir tal erro. Antes de decidir sobre qual tipo de CP é melhor para facilitar a aprendizagem, é preciso verificar em qual estágio de aprendizagem o(a) aluno(a) se encontra. Se ele(a) estiver no estágio inicial, apenas apontar o erro que foi cometido não ajudará muito. O CP descritivo é útil para ajudar o(a)s alunos a melhorarem sua performance e, para tanto, é preciso que ele(a)s já tenham passado pelo estágio inicial de modo que saberá o que precisa fazer para corrigir o erro cometido. Sendo assim, o CP prescritivo é mais útil para os iniciantes, enquanto que o CP descritivo pode ser suficiente para aqueles que estiverem nos estágios mais avançados de aprendizagem. Outras questões importantes relacionadas ao uso do feedback aumentado (CR e CP) são sobre o que informar, que tipo de informação fornecer, quando informar e com que frequência informar. Sendo assim, a primeira questão que surge é: seria melhor fornecer aos seus alunos informação sobre os erros ou sobre os acertos durante a performance de uma habilidade motora? A resposta para essa questão depende se você quer corrigir ou motivar os seus alunos durante a performance. A informação sobre o erro funciona melhor para facilitar a aquisição da habilidade, uma vez que tal informação direciona os alunos a mudarem certas características da performance. Por outro lado, a informação sobre a performance correta funciona melhor para motivá-los a continuar com a performance. 23 UNIDADE Aquisição de habilidades motoras A segunda questão sobre feedback aumentado é que ele pode ser qualitativo ou quantitativo. Se o feedback aumentado envolve um valor numérico relacionado à magnitude de algumas características da performance, ele é considerado feedback aumentado quantitativo. Por outro lado, o feedback aumentado qualitativo é a informação sobre a qualidade da característica da performance sem qualquer valor numérico associado. Então, se por exemplo, alguém estiver realizando um salto à distância e você informar que ele(a) saltou 1 m à frente, você utilizou feedback aumentado quantitativo, e se você informar que o salto foi muito alto e muito curto, você utilizou feedback aumentado qualitativo. Normalmente, nos estágios iniciais de aprendizagem, o feedback aumentado qualitativo é melhor, pois ele ajuda a formar o padrão inicial de movimento. Após a aprendizagem do padrão de movimento, o feedback aumentado quantitativo pode ajudar a melhorar ou a adequar o movimento às exigências da habilidade motora, de modo a refinar o padrão de movimento. A terceira questão sobre feedback aumentado é se devemos fornecer feedback durante ou após a performance da habilidade motora. Se fornecemos feedback aumentado enquanto o(a) aluno(a) executa a habilidade, utilizamos o feedback aumentado simultâneo. Se fornecermos feedback aumentado somente quando o(a) aluno(a) termina de executar a habilidade, utilizamos o feedback aumentado terminal. Normalmente, o feedback aumentado terminal é o mais indicado na maioria das habilidades motoras. Já o feedback aumentado simultâneo pode ser indicado para as habilidades motoras contínuas ou quando o feedback intrínseco é pouco utilizado. A quarta e última questão desta Unidade sobre feedback aumentado está relacionada à frequência que ele é fornecido. Será que devemos fornecer feedback aos nossos alunos cada vez que eles realizam determinada habilidade? Provavelmente não!!! Há algumas evidências de que fornecer feedback aumentado após todas as repetições cria dependência e a performance dos alunos piora quando o feedback aumentado não está mais disponível. Sendo assim, o mais indicado é que no início da aprendizagem você forneça feedback com maior frequência e, conforme a performance dos seus alunos melhora, essa frequência diminui gradativamente. Porém, cabe ressaltar que não é recomendado ficar um longo período sem fornecer feedback aumentado, com o intuito de manter a motivação de seus alunos. Sendo assim, não forneça feedback em todas as tentativas (para evitar dependência), e evite longas sequências sem fornecer feedback para manter a motivação e garantir que o(a) aluno(a) saiba o que está fazendo. Questões que devem ser consideradas para usar feedback aumentado: É preciso fornecer feedback aumentado ou o feedback intrínseco é suficiente? No caso de ter necessidade de fornecer o feedback aumentado, • quem deveria fornecer feedback? • que tipo de feedback aumentado deve ser fornecido, CR ou CP? Nesse caso, lembre-se de considerar a classificação da habilidade motora que está sendo aprendida e o estágio de aprendizagem em que o(a) aluno(a)? • quando fornecer o feedback aumentado (terminal ou simultâneo)? • com que frequência fornecer feedback aumentado? Ex pl or 24 25 Material Complementar Indicações para saber mais sobre os assuntos abordados nesta Unidade: Livros Aprendizagem e controle motor MAGILL, R. A. Aprendizagem e controle motor. 8. ed. São Paulo: Phorte, 2011. Aprendizagem e performance motora SCHMIDT, R. A.; WRISBERG, C. A. Aprendizagem e performance motora: uma abordagem da aprendizagem baseada na situação. 4. ed. Porto Alegre: Artmed, 2010 Leitura Aprendizagem motora: tendências, perspectivas e aplicações TANI, G.; FREUDEHNHEIM, A.M.; MEIRA JÚNIOR, C.M.; CORRÊA, U.C. Aprendizagem motora: tendências, perspectivas e aplicações. Revista Paulista de Educação Física, 18: 55-72, 2004. Estrutura da prática e frequência de “feedback” extrínseco na aprendizagem de habilidades motoras TERTULIANO, I.W.; SOUZA JÚNIOR, O.P.; SILVA FILHO, A.S.; CORRÊA, U.C. Estrutura da prática e frequência de “feedback” extrínseco na aprendizagem de habilidades motoras. Revista Brasileira de Educação Física e Esporte, 22(2): 103-118, 2008. A utilização da demonstração para a aprendizagem de habilidades motoras em aulas de educação física TONELLO, M.G.M.; PELLEGRINI, A.M. A utilização da demonstração para a aprendizagem de habilidades motoras em aulas de educação física. Revista Paulista de Educação Física, 12(2): 107-114, 1998. 25 UNIDADE Aquisição de habilidades motoras Referências FITTS, P. M.; POSNER, M. I. Human performance. Belmont: Brooks/Cole, 1967. GENTILE, A. M. A working model of skill acquisition with application to teaching. Quest, 17: 3-23, 1972. GENTILE, A. M. Skill acquisition: action movement, and neuromotor processes. In: CARR, J. H.; SHEPHERD (Eds.) Movement Science: foundations for physical therapy. 2nd Ed. Rockville: Aspen, 2000, pp. 111-187. MAGILL, R. A. Aprendizagem e controle motor. 8. ed. São Paulo: Phorte, 2011. SCHMIDT, R. A.; WRISBERG, C. A. Aprendizagem e performance motora: uma abordagem da aprendizagem baseada na situação. 4. ed. Porto Alegre: Artmed, 2010. 26
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