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DESCRIÇÃO A formação do profissional do Serviço Social no contexto do modo de produção capitalista. PROPÓSITO Analisar a trajetória da profissionalização do Serviço Social, com foco no modo de produção capitalista e na racionalização da prática da assistência, como terreno de sedimentação e consolidação da profissão. OBJETIVO MÓDULO 1 Reconhecer o processo de profissionalização do Serviço Social no Brasil engendrado no modo de produção capitalista, especialmente quanto às influências europeia e americana MÓDULO 2 Distinguir as experiências das primeiras escolas de Serviço Social na América Latina e suas influências no processo de profissionalização do Serviço Social no Brasil MÓDULO 3 Identificar influência dos Estados Unidos na profissionalização do Serviço Social no Brasil pela via da atuação profissional pautada no viés psicossocial INTRODUÇÃO O Serviço Social como profissão se desenvolve e legitima a partir das demandas da sociedade capitalista, como parte integrante das estratégias desse modo de produção, que visa à opressão social e reprodução da ideologia dominante. Portanto, trata-se de uma profissão que surge de uma demanda colocada pelo capital, com intuito de regular a classe trabalhadora em formação. Para que a profissão colabore com esse intento, faz-se necessária sua legitimação e institucionalização, o que se dá por meio do aparato estatal e por recursos mobilizados pelo empresariado. Registra-se, também, a forte influência da Igreja Católica, presente no pensamento social da Igreja, que trata a questão social como questão individual, moral e requer medidas de ajustamento. Tal enfoque encontra um campo fecundo na profissão, marcando significativamente seu modo de operar. Essa caracterização inicial serve como pano de fundo para compreensão do processo de surgimento das primeiras escolas de Serviço Social na América Latina, suas características principais e contribuições para o desenvolvimento da profissão. Além disso, serve para ilustrar a fase de influência norte-americana sobre o Serviço Social, e como a proposta de desenvolvimento de comunidade e a abordagem psicossocial incidiram sobre o Serviço Social brasileiro. MÓDULO 1 Reconhecer o processo de profissionalização do Serviço Social no Brasil engendrado no modo de produção capitalista, especialmente quanto às influências europeia e americana CONSOLIDAÇÃO DO CAPITALISMO E A PRÁTICA DA ASSISTÊNCIA A origem do Serviço Social está intimamente ligada a três fatores importantes: O desenvolvimento da ajuda aos pobres (caridade e filantropia). Foto: Shutterstock.com O significativo apoio operacional e material prestado pela Igreja Católica e pelo Estado. Foto: Lidia Muhamadeeva / Shutterstock.com O surgimento do modo de produção capitalista e suas requisições de ampliação e reprodução social. Foto: Shutterstock.com O surgimento e desenvolvimento do Serviço Social como profissão está diretamente relacionado à demanda da sociedade capitalista, bem como a suas estratégias e seus mecanismos de reprodução da ideologia dominante. Por isso, a história do Serviço Social demonstra que sua institucionalização não esteve livre dos condicionantes sociais e econômicos, que materializam os conflitos iniciados na apropriação privada dos meios de produção – condição primordial do modo de produção capitalista. O AMPARO À POBREZA, DESDE A ANTIGUIDADE, CONTOU COM UMA FORTE VINCULAÇÃO DA IGREJA CATÓLICA E, AOS POUCOS, PASSOU A CONTAR COM A GRADATIVA INTERVENÇÃO DO ESTADO. No século XIX, a assistência social ainda não estava plenamente legitimada, de forma que a caridade permeava as ações dos agentes sociais. Nesse mesmo período histórico, o Estado faz suas primeiras tentativas de organização da caridade. Um exemplo disso é a primeira legislação sobre a assistência social da qual se tem notícia, chamada de Poor Law – Lei dos Pobres, na Inglaterra, em 1834. Ao tratarmos sobre a Poor Law e suas características, fica clara a vinculação entre controle e poder econômico perante o enfrentamento da questão social, fomentado pela grande mudança na forma de viver, a partir da Revolução Industrial (segunda metade do século XVIII). REVOLUÇÃO INDUSTRIAL Com a Revolução Industrial, a forma de trabalhar e produzir riquezas se deslocou das propriedades feudais, dos senhores feudais e de seus vassalos – muitos detentores de seus meios de produção em terras de outrem – para um mercado autorregulável. Nesse mercado, os objetivos eram o lucro e uma liberdade de compra e venda de mercadorias e de mão de obra. COMENTÁRIO A liberdade era bastante relativa, na medida em que a massa de trabalhadores disponíveis para vender livremente sua mão de obra, para sobreviver de seu trabalho assalariado, possuía poucas regulações e proteções. Desse modo, esses trabalhadores ficavam à mercê do livre mercado, das vagas de trabalho existentes e da remuneração definida por seus empregadores. Além disso, havia o agravante de não mais deterem seus meios de produção para o trabalho. Imagem: Shutterstock.com A Revolução Industrial consolidou essa mudança e introduziu o maquinário industrial às produções fabris. Esse fato acelerou a industrialização, gerando a diminuição de postos de trabalho e, com isso, uma grande massa de mão de obra sem ocupação, acirrando a questão social da época. Portanto, o processo coordenado da Revolução Industrial transformou profundamente a vida dos sujeitos sociais dos pontos de vista econômico, social e cultural. Inicialmente, o processo foi deflagrado na Inglaterra, em decorrência da efervescência da organização das novas formas de viver e trabalhar. Posteriormente, espraiou-se para os demais países da Europa e pelo restante dos continentes, de forma desigual e não combinada, quanto ao tempo e ao espaço. Imagem: Shutterstock.com O campo inglês foi devastado pela expropriação de terras dos pequenos camponeses, que tiveram suas culturas e habitações violentamente demolidas pelo Estado. O Estado também foi responsável por uma série de legislações e impostos que empurraram um significativo contingente popular para a pobreza e miséria. Com tudo isso, o Estado precisava assumir alguma postura no trato da questão social. Cerca de duzentos anos antes, a Rainha Elizabeth (1533-1603) já havia instituído um imposto para benemerência. No entanto, o acirramento da pobreza decorrente da implantação do modo de produção capitalista ocasionou uma revisão legal, que deu forma mais rígida à Poor Law. RAINHA ELIZABETH (1533-1603) Rainha Elizabeth (Elizabeth I ou “A Rainha Virgem”) nasceu em 1533 e faleceu em 1603. Filha de Henrique VIII e Ana Bolena – casamento que deu origem ao Protestantismo Inglês, o Anglicanismo –, governou a Inglaterra e a Irlanda de 1558 até sua morte. Por não ter se casado ou tido herdeiro, foi a última monarca da Dinastia Tudor. POOR LAW E WORKHOUSES Imagem: Wellcome Library, London / Wikimedia Commons / CC BY 4.0 javascript:void(0) A Lei dos Pobres foi a forma que o Estado britânico criou para lidar com a questão social vigente. No início, a finalidade da lei era de reprimir a mendicância e a “vagabundagem”, aliviando parcialmente a pobreza existente. Com as mudanças sociais e econômicas, a lei passa a apresentar um forte viés regulador das relações entre patrões e empregados, relacionando a pobreza às péssimas condições de vida da massa de trabalhadores na Inglaterra. AS DUAS INTERPRETAÇÕES SOBRE A LEI MANTÊM FORTES TRAÇOS TANTO DA CARIDADE CRISTà QUANTO DO VIOLENTO PRECONCEITO SOCIAL. Além disso, há um entendimento da pobreza como algo disfuncional e decorrente de uma responsabilidade individual do sujeito pela situação na qual se encontra. Imagem: Wellcome Library, London / Wikimedia Commons / CC BY 4.0 A Lei dos Pobres previa, inclusive, internação nas workhouses. Trata-se de casas correcionais, que funcionavam como mecanismo da lei para cumprir o objetivo de acabar com os pedintes profissionais. Para tanto, obrigavaa internação compulsória da camada social alijada da sociedade. Nas workhouses, eram internados homens, mulheres, crianças, doentes, desocupados e criminosos – enfim, todos aqueles que não tinham como se manter. O objetivo era atender e formar essa população nos padrões requisitados pelo sistema capitalista, em sua fase de organização, a fim de legitimar e consolidar uma nova sociedade. A Lei dos Pobres e suas formas de aplicação, portanto, dão a direção de como a assistência aos mais pobres e marginalizados vinha sendo gerida, com o traço comum da caridade revestida de coerção. CASO BRASILEIRO No Brasil, a história da assistência está ligada à caridade e filantropia. Inicialmente, tais atividades eram operacionalizadas por mecanismos da Igreja Católica e por grupos relacionados à filantropia empresarial, com pouca inserção advinda do Estado. A partir dos anos 1930, essa configuração muda, por meio de condicionantes políticos, econômicos e sociais, como veremos a seguir. Vamos aprofundar, agora, um pouco mais sobre a importância da Revolução Industrial inglesa para o surgimento do profissional de Serviço Social. ASSISTÊNCIA NO BRASIL E PROFISSIONALIZAÇÃO DO SERVIÇO SOCIAL A perspectiva de enfrentamento e da regulação da questão social assume novos contornos a partir da década de 1930. Essa época foi marcada por manifestações da questão social na vida cotidiana da sociedade brasileira e por mudanças políticas e econômicas. Tal cenário atua como campo fértil para a profissionalização do Serviço Social e o estabelecimento de uma nova lógica no trato da questão social e da assistência. É fato que a profissão surge a partir de demandas da sociedade capitalista, no entanto a Igreja Católica apresenta destaque na estruturação dessa profissão emergente no país. São provenientes da Igreja Católica: IDEÁRIO CONTEÚDOS PROCESSO DE FORMAÇÃO DOS PRIMEIROS ASSISTENTES SOCIAIS BRASILEIROS Imagem: Shutterstock.com A questão social, por isso, é vista a partir de forte influência do pensamento social da Igreja, que associa a questão social à questão moral, compreendendo-a como um conjunto de problemas de responsabilidade individual da população que os vivenciam. Nesse enfoque, desconsideram-se completamente as mazelas sociais provocadas pelas relações capitalistas. TAL VISÃO APONTA PARA O TRATO DA QUESTÃO SOCIAL POR UM ENFOQUE INDIVIDUALISTA, MORALIZADOR E PSICOLOGIZANTE, QUE ENCONTRA CONDIÇÕES EFETIVAS DE DESENVOLVIMENTO NA PROFISSÃO. CARÁTER VOCACIONAL DA PROFISSÃO No bojo de transformações sociais, econômicas e políticas no Brasil, no período entre 1930 e 1940, o Serviço Social surge como profissão. Na época, contava com o projeto de recristianização da Igreja Católica, bem como com a ação de grupos e instituições que possibilitaram tais transformações. SAIBA MAIS Durante o Estado Novo (1937-1945) Vargas visava garantir o controle social e sua legitimação, apoiado na classe operária, por meio de uma política de massa. Tal política defendia e reprimia, ao mesmo tempo, os movimentos reivindicatórios de melhores condições de vida e trabalho. Vargas adotava o modelo fascista europeu como exemplo. A versão brasileira desse modelo era mais atenuada e contava com uma legislação social protetora e uma estrutura sindical legalizada. Foto: Governo do Brasil / Galeria de Presidentes / Wikimedia Commons / Domínio Público Dessa forma, o Estado representava, por um lado, uma entidade que concedia direito potenc¬¬ial à reivindicação e à cidadania. Por outro lado, esse mesmo Estado suprimia a possibilidade real de organização política autônoma da classe trabalhadora, criando uma rede assistencial cujo aparato visa atender muito mais ao elevado nível econômico do mercado do que às necessidades da população. As décadas de 1930 e 1940 são caracterizadas por uma sociedade industrial capitalista, tanto na cidade quanto no campo: A INDUSTRIALIZAÇÃO PROCESSAVA-SE DENTRO DE UM MODELO DE MODERNIZAÇÃO CONSERVADORA, POIS ERA FAVORECIDA PELO ESTADO CORPORATIVISTA, CENTRALIZADOR E AUTORITÁRIO. ASSIM, A BURGUESIA INDUSTRIAL, ALIADA AOS GRANDES PROPRIETÁRIOS RURAIS, BUSCAVA APOIO PRINCIPALMENTE NO ESTADO PARA SEUS PROJETOS DE CLASSE E, PARA ISSO, NECESSITAVA ENCONTRAR NOVAS FORMAS DE ENFRENTAMENTO DA CHAMADA QUESTÃO SOCIAL. (PIANA, 2009, p. 88) Essa influência da Igreja Católica recai sobre a formação profissional dos primeiros assistentes sociais brasileiros, que estavam sob influência europeia, mais especificamente do modelo franco-belga. Como principais características do ideário formativo da profissão, é possível destacar os princípios messiânicos (tomismo) de salvar o corpo e a alma, centrado no objetivo de servir ao próximo. javascript:void(0) Imagem: Shutterstock.com TOMISMO O tomismo é uma doutrina da Igreja Católica baseada no pensamento de São Tomás de Aquino. Para ele, a sociedade é a união dos homens com propósito de efetuar algo comum. O Estado, segundo esse ideário, deve respeitar a Igreja, e toda forma de governo será considerada boa, desde que garanta os direitos das pessoas e o bem-estar da comunidade. O modelo franco-belga, desse modo, ficou limitado a uma formação essencialmente moral e pessoal. A profissão, nesse cenário, era enxergada como uma espécie de vocação, que requeria uma formação profissional doutrinária, para que os assistentes sociais pudessem enfrentar a realidade social com subjetividade. INSTITUIÇÕES ASSISTENCIAIS E O TECNICISMO O Serviço Social segue com uma formação profissional doutrinária em suas primeiras conformações, até a década de 1940. Nessa época, descortina-se uma série de novas requisições profissionais, apontando para uma maior profissionalização do trato com as questões sociais e com a assistência. Apesar de ser um novo ciclo, a profissão segue profundamente marcada pela sua origem católica, norteada pela: CARIDADE BENEVOLÊNCIA FILANTROPIA A diferença, portanto, reside na tomada de espaço do Estado no campo assistencial com apoio do conjunto da sociedade civil. Essa tomada foi materializada por meio da criação das grandes instituições assistenciais. Para atuar em tais instituições, o Serviço Social busca uma instrumentalização técnica, valorizando o método e desvinculando-se dos princípios neotomistas para se apoiar nos pressupostos funcionalistas da sociologia. De forma tecnicista, o Serviço Social respondia às novas exigências do mercado, ainda que não houvesse essa clareza e crítica no seio da profissão. INFLUÊNCIA EUROPEIA E NORTE- AMERICANA SOBRE O SERVIÇO SOCIAL É certo que o desenvolvimento do capitalismo no mundo e a gradativa expansão do domínio norte-americano na América Latina se encarregaram de gerar demandas no campo social. Tais demandas exigiam a superação do trabalho voluntário e apostolar dos primeiros agentes sociais. Corrobora-se, nesse contexto, a necessidade de uma formação especializada de agentes sociais, por meio dos centros de formação. Como consequência, surge o Serviço Social profissional. ESCOLAS DE SERVIÇO SOCIAL O surgimento das escolas de Serviço Social deve ser compreendido pelo surgimento de demanda de uma ação especializada e profissionalizada, também pelo movimento mais amplo de desenvolvimento do capitalismo em todo o mundo. Os países latino-americanos, de modo geral, contaram com alguma assistente social de origem europeia para a criação de suas escolas. Se isso não fosse possível, ao menos, contavam com uma escola local que tivesse a base europeia em sua formação. Nesse período, a formação europeia assume um protagonismo nas escolas da América Latina. Foto: Anton_Ivanov / Shutterstock.com Posteriormente, os Estados Unidos assumem esse protagonismo devido a dois fatores: Por um lado, pela consequente penetração norte-americana na América Latina, por questões de alianças políticas e econômicas. Por outro lado, pelos textos e visitas de professores estadunidenses ou mesmo de enviados de organismos internacionais. Otecnicismo, apontado como estratégia do Serviço Social para enfrentar as novas requisições colocadas à profissão em seu período de institucionalização, diz respeito ao forte apelo à linguagem do investimento, da técnica e do planejamento no universo profissional daquele momento. Tudo isso constitui bases importantes para a profissionalização do Serviço Social. COMENTÁRIO Apesar do esforço para superar o vínculo com a Igreja Católica, a profissão segue com uma herança conservadora advinda da Igreja. A política assistencial passa a ser gerida prioritariamente pelo Estado, sendo efetivada, direta ou indiretamente, pelas instituições do próprio aparelho estatal ou associadas ao Estado. A assistência deixa, portanto, de ser um serviço prestado exclusivamente pelas instituições assistenciais privadas, tendo como novos protagonistas o Estado e o empresariado. Essa mudança afeta não só o público atendido pelos mecanismos assistenciais, mas também as expressões da questão social. PAPEL DO EMPRESARIADO E DO ESTADO O desenvolvimento do capitalismo e a inserção da classe operária no cenário político e social da época provocam novas manifestações da questão social, expressas pela fome, pelo desemprego, pela violência, entre outras. Isso exige do Estado e do patronato ações mais efetivas e organizadas. A DEMANDA DE TRABALHO POSTA AO SERVIÇO SOCIAL NÃO SE DÁ PELA POPULAÇÃO USUÁRIA, MAS POR REQUISIÇÕES APRESENTADAS PELO EMPRESARIADO E ESTADO. As características da população atendida pela malha assistencial também passam por mudanças. Antes Uma pequena parcela da população era atendida por meio das obras assistenciais privadas. Depois Um maior número de proletários tem acesso às poucas políticas sociais criadas pelo Estado naquela ocasião. Tal mudança também altera o vínculo profissional, já que o empresariado e o Estado passam a ser os principais empregadores de Assistentes Sociais. Isso dá um contorno diferente ao exercício da profissão, uma vez que cada segmento empregador tem (em relação à prática profissional): LÓGICAS INTERESSES OBJETIVOS EXPECTATIVAS FRAGILIDADE DA CONSCIÊNCIA POLÍTICA O pensamento conservador e a influência da doutrina católica traçaram um perfil de ação para os profissionais de Serviço Social atrelado ao pensamento burguês. Sob esse olhar, eram atribuídas ao Serviço Social tarefas como amenizar conflitos, preservar a ordem vigente e promover equilíbrio nas relações sociais. Tudo isso desconsiderando as relações de desigualdade que, necessariamente, dizem respeito ao modo de produção capitalista. A profissão, portanto, possuía uma frágil consciência política, na medida em que não conseguia perceber as contradições do exercício profissional, pois centrava suas forças e seu pensamento na questão da ajuda ao próximo. Tais características profissionais facilitaram a aceitação da profissão não só pela Igreja Católica, mas também pelo Estado e pela sociedade burguesa. É PRECISO TER CLARO QUE AS PRÁTICAS ASSISTENCIAIS JÁ EXISTIAM ANTES MESMO QUE O SERVIÇO SOCIAL SE CONSOLIDASSE COMO PROFISSÃO. No entanto, tal consolidação permite o uso do seu componente técnico operativo, incorporando formas tradicionais de assistência e ação social, tais como: ESTUDO DAS NECESSIDADES INDIVIDUAIS TRIAGEM DOS PROBLEMAS “CONCESSÃO” DE AJUDA MATERIAL ACONSELHAMENTOS INSERÇÃO NO MERCADO DE TRABALHO VISITAS DOMICILIARES ENCAMINHAMENTOS AULAS DE TRABALHOS MANUAIS ORIENTAÇÕES INFORMAÇÕES SOBRE HIGIENE, ORÇAMENTO E MORAL Podemos perceber, com isso, como a história da profissão marca a categoria até a atualidade. Ainda contamos com demandas tradicionais, adaptadas aos novos tempos e cenários econômicos, políticos e sociais. INÍCIO DA INFLUÊNCIA NORTE-AMERICANA Na década de 1940, o Serviço Social brasileiro passa a ter acesso aos métodos importados dos Estados Unidos, com mais ênfase no Serviço Social de Caso e, de modo secundário, ao Serviço Social de Grupo. O enfoque das duas metodologias diz respeito à solução de problemas pessoais, de relacionamento e de socialização. Só a partir da década de 1960, o Serviço Social brasileiro amplia seu campo de atuação profissional para o chamado Desenvolvimento de Comunidade, também por influência norte- americana. Foto: Shutterstock.com VOCÊ SABIA Em sua origem, o Serviço Social era composto basicamente por frações da elite da sociedade, predominantemente feminina. Após o término da Segunda Guerra Mundial, a profissão passa a receber membros da pequena burguesia, que tinham como interesse não mais a questão vocacional religiosa, mas a possibilidade de ingresso no mercado de trabalho e a obtenção da qualificação profissional que garantiria tal acesso. RELAÇÃO ENTRE BRASIL E ESTADOS UNIDOS Imagem: Shutterstock.com O estreitamento das relações entre Brasil e Estados Unidos se solidificou na Era Vargas, mais especificamente em 1942. Isso se deu em função de um objetivo comum – fortalecer o capitalismo na América Latina, privilegiando determinados interesses econômicos e políticos e, ainda, combatendo a ameaça comunista. Embora o cerne da questão fosse econômico, a relação entre Brasil e Estados Unidos iria além dessa fronteira, implicando um processo forte de ideologização norte-americana no país. Desse modo, os Estados Unidos passaram a obter o status de grande referência de ideias e ações, no campo econômico, financeiro, cultural e, especialmente, no campo das políticas públicas. Como profissão inserida nesse contexto social, o Serviço Social é permeado por tais influências e absorve o modelo de profissão norte-americano em seus pressupostos filosóficos, teóricos e científicos. Tais pressupostos serviam como bases de resposta na atuação profissional. A ideologia dominante naquele período histórico necessita de uma intervenção técnica forte, organizada e planejada. Com isso, o Serviço Social desencadeou uma busca por recursos técnicos, a fim de superar ações filantrópicas e espontâneas: AS EXIGÊNCIAS DE TECNIFICAÇÃO DO SERVIÇO SOCIAL SÃO ATENDIDAS, MANTENDO-SE A MESMA RAZÃO INSTRUMENTAL: BUSCA-SE UMA MAIOR QUALIFICAÇÃO DOS PROCEDIMENTOS INTERVENTIVOS, UTILIZANDO-SE, INCLUSIVE, FUNDAMENTOS ADVINDOS DA PSICOLOGIA, NA EXPECTATIVA DE QUE OS PROFISSIONAIS ASSISTENTES SOCIAIS FOSSEM CAPAZES DE EXECUTAR PROGRAMAS SOCIAIS COM SOLUÇÕES CONSIDERADAS MODERNIZANTES PARA O MODELO DESENVOLVIMENTISTA ADOTADO PELO BRASIL. (PIANA, 2009, p. 92) O fazer profissional, sob esse aspecto, visa eliminar os desajustes sociais, utilizando-se de uma intervenção profissional profundamente moralizadora e psicologizante, orientada pela matriz positivista. No campo assistencial e do Serviço Social, o conservadorismo se mantém presente no universo ideológico. Nesse sentido, passa-se a conceber uma política técnico-burocrática, em um período no qual a profissão traduz sua ação por meio de uma ética vinculada à moral conservadora e dogmática, segundo a base ideológica neotomista. NEOTOMISTA Corrente filosófica surgida o século XIX com objetivo de reviver a filosofia tomista, do século XIII, a fim de lidar com os problemas sociais daquele período. Segundo a ideologia neotomista, os problemas sociais são enxergados como um conjunto de disfunções sociais, avaliados moralmente de acordo com uma concepção do que é ou não normal, de acordo com o esquema valorativo do cristianismo. javascript:void(0) ATENÇÃO Há uma clara tendência ao ajustamento social, a visualizar a questão social como advinda de desajustes individuais e de cunho psicológico. Portanto, tende-se a reduzir as demandas por direitos sociais em uma forma de adoecimento. Notem que essa esfera é completamente deslocada da discussão por efetivação de direitos sociais para ajustamento de necessidade dos usuários. Nesse mesmo contexto, o Serviço Social se profissionaliza. Sobre os primeiros profissionais, recaem tais influências, tanto em suas formações quanto no cotidiano de suas atuações profissionais. CRISE E BUSCA POROUTROS MODELOS O Serviço Social de Casos e de Grupo segue com suas abordagens individualizadas e com a predominância de ação “psicologizada” – metodologias usadas por grande parte do corpo profissional. Contudo, por volta da década de 1960, são registrados os primeiros movimentos no sentido de a categoria questionar e buscar outros modelos de intervenção profissional. Trata-se da primeira crise ideológica em alguns centros de formação profissional em Serviço Social na América Latina. Nesses espaços, passa-se a vislumbrar possibilidades voltadas à transformação da sociedade, substituindo a perspectiva desenvolvimentista presente na Era Vargas e validada pela forte influência econômica, social e política norte americana. Em um período posterior, boa parte da profissão passará a perceber a dimensão política de sua prática, buscando o rompimento com a visão funcionalista e integradora no Serviço Social. A partir daí, configuram-se as primeiras aproximações com a concepção crítica no âmbito profissional. VERIFICANDO O APRENDIZADO 1. ASSINALE A ALTERNATIVA CORRETA QUANTO ÀS CARACTERÍSTICAS PRINCIPAIS DO PROCESSO PELO QUAL PASSOU O SERVIÇO SOCIAL EM SUA PROFISSIONALIZAÇÃO: A) Manutenção de traços conservadores na atuação profissional; busca pela legitimação profissional; rompimento com o ideário da Igreja Católica, mas ainda sob influência da doutrina social da Igreja. B) Manutenção do ideário católico, expresso pela doutrina social da Igreja e reafirmação do viés apostolar e vocacional na profissão. C) Rompimento definitivo com as influências católicas, e negação do viés apostolar e da vocacional na profissão. D) Revisão crítica das formas de atuação profissional e reconhecimento do caráter político da atuação dos assistentes sociais. E) Negação das práticas conservadoras no âmbito profissional e reafirmação do viés apostolar e vocacional, próprio da doutrina social da Igreja. 2. COM RELAÇÃO ÀS INFLUÊNCIAS EUROPEIA E NORTE-AMERICANA SOBRE O SERVIÇO SOCIAL, PODEMOS INFERIR QUE: A) A principal influência europeia foi o modelo de formação franco-belga, que consistia em uma formação essencialmente crítica e combativa ao sistema vigente. Em relação à influência norte- americana, tiveram destaque o Serviço Social de Caso, Grupo e Comunidade, além dos modelos de políticas públicas, implementados no país durante a Era Vargas. B) A principal influência europeia foi o modelo de formação franco-belga, que consistia em uma formação essencialmente científica e baseada na inovação de métodos de atuação profissional. Em relação à influência norte-americana, tiveram destaque os métodos mais arcaicos e voltados para a doutrina social da Igreja. C) A principal influência europeia foi o modelo de formação franco-belga, que consistia em uma formação essencialmente moral, pessoal e vocacional. Em relação à influência norte- americana, tiveram destaque o Serviço Social de Caso, Grupo e Comunidade, além dos modelos de políticas públicas, implementados no país durante a Era Vargas. D) A principal influência europeia foi o modelo de formação franco-belga, que consistia em uma formação essencialmente contestadora e rebelde. Em relação à influência norte-americana, houve registros de poucas inovações metodológicas, sendo a mais expressiva o Serviço Social de Caso. E) A principal influência europeia foi o modelo de formação franco-belga, que consistia em uma formação essencialmente moral, pessoal e vocacional. Em relação à influência norte- americana, incipiente frente ao Serviço Social, conseguiu certo destaque tardio com o Desenvolvimento de Comunidade. GABARITO 1. Assinale a alternativa correta quanto às características principais do processo pelo qual passou o Serviço Social em sua profissionalização: A alternativa "A " está correta. Trata-se de um primeiro movimento no sentido de repensar nas formas de atuação profissional no Serviço Social, ainda sem muita profundidade e criticidade. Essas características são a base sob a qual se constituiu o Serviço Social no Brasil. 2. Com relação às influências europeia e norte-americana sobre o Serviço Social, podemos inferir que: A alternativa "C " está correta. Os dois primeiros blocos de formação profissional em Serviço Social receberam, como influência europeia, o modelo franco-belga, que era essencialmente moral e apostolar. Posteriormente, receberam a influência modelo norte-americano, fundado na sociologia americana e na perspectiva de ajustamento e atuação psicossocial. Tais movimentos foram importantes para, com a continuidade, fomentar a crítica à atuação do Serviço Social, que viria mais tarde, com os primeiros esboços do Movimento de Reconceituação na década de 1960. MÓDULO 2 Distinguir as experiências das primeiras escolas de Serviço Social na América Latina e suas influências no processo de profissionalização do Serviço Social no Brasil FORMAÇÃO DE ASSISTENTES SOCIAIS NA AMÉRICA LATINA Foto: Leonidas Santana / Shutterstock.com As bases do Serviço Social na América Latina foram constituídas, historicamente, na década de 1920. No entanto, somente alguns anos mais tarde é que o Serviço Social se constituiu como profissão, inserida na divisão social e técnica do trabalho. Até que esse processo se consolidasse, as protoformas do Serviço Social na América Latina se deram de acordo com a realidade de cada país, mas mantendo alguns traços em comum. Na maioria dos países, as ligas operárias desempenharam um papel decisivo na implantação das bases do que, mais tarde, seria assumido pelo Estado como a Previdência Social. O principal traço comum entre as realidades latino-americanas, no entanto, foi a base organizacional e doutrinária da ação social da Igreja, além da intervenção do Estado no campo assistencial: O TRABALHO ASSISTENCIAL E PATERNALISTA FOI O EIXO PRINCIPAL DESSAS PREFIGURAÇÕES DA PROFISSÃO. DESEMPENHARAM UM PAPEL SIGNIFICATIVO, NELAS, OS SETORES RELIGIOSOS – A IGREJA POSSUI UMA EXTREMA REDE DE HOSPITAIS, OBRAS DE CARIDADE, DE INSTITUIÇÕES ASSISTENCIAIS, CUJA AÇÃO ESTÁ BASICAMENTE ORIENTADA PARA MINORAR OS PROBLEMAS SOCIAIS. DENTRO DA IGREJA, O MOVIMENTO LAICO EXERCEU, EM TODOS OS PAÍSES DA AMÉRICA LATINA, UM PAPEL DESTACADO NA ORGANIZAÇÃO E DIREÇÃO DE OBRAS ASSISTENCIAIS COMPREENDIDAS DENTRO DA AÇÃO SOCIAL CATÓLICA. OS SETORES JUVENIS CUMPRIRAM UM PAPEL DESTACADO NESTE PROCESSO, SOB A TUTELA HIERÁRQUICA ECLESIÁSTICA. AO LADO DA IGREJA, OS SETORES ARISTOCRÁTICOS E OLIGÁRQUICOS DAS SOCIEDADES LATINO- AMERICANAS AGILIZARAM UMA SÉRIE DE AÇÕES SOCIAIS QUE PRETENDIAM “AJUDAR OS MAIS NECESSITADOS”, “PROTEGER A INFÂNCIA DESVALIDA”, “MINORAR OS MALES DA SOCIEDADE”. IGUALMENTE O ESTADO PÕE EM AÇÃO POLÍTICAS E MEDIDAS ASSISTENCIALISTAS E, ESPORADICAMENTE, ALGUMAS DE CARÁTER PREVENTIVO. (SANTOS, 1993, p. 182) PRIMEIRAS ESCOLAS DE SERVIÇO SOCIAL NA AMÉRICA LATINA Ao tratarmos sobre profissionalização do Serviço Social, uma dimensão que assume grande importância é a formação dos quadros de assistentes sociais. ATENÇÃO É preciso compreender, para além das formalidades de grades curriculares, as intencionalidades e os contextos sobre os quais a formação profissional se efetiva. Para isso, temos de analisar as experiências das primeiras escolas de Serviço Social na América Latina. A gestão das primeiras escolas se deu em contextos de mudanças políticas e sociais significativas no continente, nos quais a Igreja Católica desempenhou papel fundamental. Devido à importância e influência da experiência chilena sobre as demais escolas da América Latina, começaremos nossa análise por este país. CHILE Imagem: Shutterstock.com Na década de 1920, o Chile passava por um período de grandes mudanças sociais, econômicas e políticas: NA HISTÓRIA CHILENA, TODA A DÉCADA DE VINTE [1920] ESTÁ MARCADA COMO UM PERÍODO DE SEVERA CRISE INSTITUCIONAL E CONTÍNUOS PROTESTOS. A BREVE INTERRUPÇÃO DO GOVERNO ALESSANDRI, QUE CULMINA COM SUA VOLTA AO PODER, SUCEDEM DIVERSOS EVENTOS QUE ACENTUAMA INSTABILIDADE – E ALESSANDRI ABANDONOU O CARGO TRÊS MESES ANTES DA CONCLUSÃO DO SEU MANDATO. SUBSTITUIU-O EMÍLIO FIGUEIROA, QUE GOVERNOU POR POUCO TEMPO, CEDENDO LUGAR AO CORONEL IBAÑEZ, DESIGNADO PRESIDENTE A 27 DE MAIO DE 1927. CONTUDO, O REGIME, ACUADO POR UMA ONDA DE PROTESTOS E PELAS GRAVES CONSEQUÊNCIAS DA CRISE DE 1929, FOI DERRUBADO POR UM LEVANTE GERAL EM 1931. UM ÚNICO DADO PODE SERVIR COMO REFERENCIAL DO IMPACTO DA CRISE: A PRODUÇÃO DE SALITRE, PRODUTO FUNDAMENTAL DA EXPORTAÇÃO CHILENA, FOI, EM 1920, DE MAIS DE TRÊS MILHÕES DE TONELADAS; EM 1933, CAIU A POUCO MAIS DE QUATROCENTAS MIL TONELADAS. (MANRIQUE CASTRO, 1987, p. 65) O panorama apresentado mostra que, além das crises políticas expressas pelas reiteradas sucessões presidenciais, a instabilidade chilena da época diz respeito também às questões econômicas – produção e exportação. Tais questões orientaram a reorganização da base produtiva no país, que provocou, por sua vez, a alteração das relações entre as classes sociais. A organização e disciplina da classe operária chilena – de definição socialista e anarquista – merece destaque nesse processo. O cenário denota o contexto de efervescência social no qual se funda, no Chile, a primeira escola de Serviço Social, em 1925. Embora tenha ocorrido de forma semelhante em outros países da América Latina, inclusive no Brasil, a burguesia chilena foi pioneira ao institucionalizar diversas reinvindicações populares e operárias no aparato estatal e privado burguês, provocadas pelas pressões populares e da classe operária. Tal movimento figurou como fator preponderante para a profissionalização do Serviço Social naquele país. A institucionalização das demandas populares gerou uma legislação que obrigava o Estado – mas não somente ele – a responder pelos problemas relacionados à previdência social, habitação, às condições de trabalho, saúde pública, salariais, entre outras – todos objetos de reivindicações da classe operária. SAIBA MAIS A legislação promulgada em 1924 evidenciou a necessidade de adequar as entidades ligadas ao Estado, direta ou indiretamente, ao que foi definido nas leis. Tratava-se de operacionalizar o que estava preconizado nas leis, tanto do ponto de vista material, de infraestrutura, como de profissionais de formação diferenciada. Tais profissionais deveriam atender ao crescimento da intervenção estatal no campo da assistência social. ESCOLA DEL RÍO A fundação da primeira escola de Serviço Social no Chile ocorreu em 1925, por Alejandro Del Río. A escola fundada por Del Río tem sua origem mais ligada à ação estatal. Del Río era médico e concebia o Serviço Social como uma espécie de complementação do trabalho da Medicina. Com as aprovações de legislações e a consequente criação de necessidades de operacionalização das leis, Del Río, apoiado pela Junta Central de Beneficência de Santiago, visitou centros de formação acadêmica na Bélgica. Seu objetivo era conhecer os métodos e trazê-los para seu país. Foto: Autor desconhecido / Wikimedia Commons / Domínio Público ALEJANDRO DEL RÍO javascript:void(0) Alejandro del Río Soto-Aguilar (1867-1939) foi um médico renomado no Chile com uma carreira prolífica. Depois dos estudos de Higiene na Europa, tornou-se o médico social mais qualificado do seu tempo, entendido como aquele que, por meio de sua atividade médica, procurou reduzir os graves problemas derivados da questão social. Após diversos contatos, Del Río contou com o apoio de Rene Sand para apoiá-lo no intento de criar uma escola para formar profissionais destinados a complementar o trabalho do médico. No entanto, apesar de a escola de Del Río estar, em sua origem, mais vinculada à esfera estatal, não se pode desconsiderar a forte influência da Igreja Católica, nem na experiência chilena, nem nas demais escolas latino-americanas. Na constituição desses centros de estudos, recorrentemente estão conjugadas duas estratégias comuns: Estratégia 1 A iniciativa estatal. Estratégia 2 A iniciativa da Igreja Católica e de suas instituições e grupos correlacionados. TAMBÉM NÃO SE PODE EXCLUIR A INCIDÊNCIA DAS PRESSÕES ADVINDAS DOS MOVIMENTOS POPULARES E DO PROLETARIADO. No Chile, assim como em outros países, a marca da Igreja Católica em relação ao trato com a assistência esteve presente. Desde a antiguidade, a Igreja era a principal promotora das obras de caridade e difusora permanente de sua doutrina e pensamento. Portanto, nesse campo, foram constituídas as primeiras formas do Serviço Social. Embora a primeira escola de Serviço Social fundada no Chile tenha sido laica, e não católica, isso não significa que a Igreja decidiu intervir no campo social e assistencial somente após a criação dessa escola. O exercício da assistência social já tinha precedência da Igreja Católica, cuja prática se dava sob arraigada inspiração religiosa. Os agentes sociais da Igreja atuavam como um verdadeiro apostolado nas chamadas obras de misericórdia, com o vasto recurso financeiro do qual dispunham naquele período. ESCOLA ELVIRA MATTE DE CRUCHAGA A primeira escola católica de Serviço Social no Chile – escola Elvira Matte de Cruchaga – foi criada em 1929, por Miguel Cruchaga Tocornal, que foi Presidente do Senado chileno e Ministro de Relações Exteriores. Isso explica os recursos financeiros estatais e o prestígio recebidos pela escola em sua gestão. Tais recursos custeavam parte dos gastos derivados dos trabalhos acadêmicos e das obras sociais. Sob o ponto de vista da organização da escola, foi entregue à responsabilidade de Rebeca e Adriana Izquierdo. As irmãs buscaram apoio de Louise Joerissen – ex-diretora da Escola de Serviço Social Católica de Munique, Alemanha –, que esteve à frente da instituição até 1933, quando foi substituída por Rebeca Izquierdo. Foto: Ministerio de Relaciones Exteriores de Chile / Wikimedia Commons / Domínio Público. javascript:void(0) MIGUEL CRUCHAGA TOCORNAL Miguel Cruchaga Tocornal (1869-1949) foi advogado e político do Partido Conservador. Foi senador por dois mandatos nos períodos de 1937-1945 e 1945-1953. Entre outras atividades, dedicou-se à escrita, especialmente na área do Direito Internacional, e colaborou com jornais e revistas, nacionais e estrangeiras. Foi benfeitor da Sociedade de Proteção à Criança e fundador da Escola de Serviço Social da Universidade Católica, a qual deu o nome de sua esposa, Elvira Matte, por ter sido construída com doações próprias. Pouco antes de sua morte, ele foi mencionado como um possível candidato ao Prêmio Nobel da Paz. SAIBA MAIS Em 1933, a Direção da Escola ficou a cargo das irmãs Rebeca e Adriana Izquierdo Phillips. As irmãs, movidas por uma profunda sensibilidade social, realizaram seus estudos na Bélgica e na Alemanha. Rebeca e Adriana Izquierdo deixaram os cargos de diretoria da Escola de Serviço Social Elvira Matte de Cruchaga após 36 anos de trabalho ininterrupto e grandes conquistas. Em discurso de agradecimento aos serviços prestados pelas irmãs, o então deputado José Manuel Tagle disse: “Queríamos elevar nossa voz para agradecer estas altruístas senhoras. Sua ação é tão ampla e eficaz em favorecimento da comunidade e, principalmente, dos setores modestos. Elas têm trabalhado com a mais autêntica humildade, com o mais profundo patriotismo, cientes das necessidades sociais de nossa terra” (TAGLE, 1965, p. 3282-3283) A criação dessa escola apresentava diversas motivações. Entre elas, havia o interesse da Igreja em criar um centro ortodoxo para a formação de agentes sociais adequados às mudanças sofridas pela sociedade chilena. Tais profissionais deveriam responder aos estímulos práticos impostos pela luta de classes entre a burguesia e o proletariado. Outra motivação dizia respeito à intenção da Igreja em estender sua influência católica nas escolas de Serviço Social de todo o continente latino-americano, ampliando sua doutrina social e, consequentemente, seu poder como instituição. Isso explica uma dasindagações sobre o motivo de terem sido instituídas duas escolas de Serviço Social no Chile, em curto espaço de tempo, sem que houvesse uma tentativa de complementar esforços em relação à primeira escola, já fundada. INTERESSES DA IGREJA CATÓLICA A criação da escola Elvira Matte de Cruchaga se inscreve no contexto dos interesses globais da Igreja Católica, que tentava se colocar em destaque no movimento intelectual da época, a fim de recuperar seu papel na conduta moral da sociedade. Nesse sentido, a Igreja se via entre o pragmatismo burguês e o socialismo, com seu pressuposto ateu. Para não perder espaço, a Igreja redobrava sua ação nos terrenos mais diversos, investindo na formação de intelectuais alinhados com seus pensamentos e dotando-os dos meios de intervenção necessários para atuação naquele contexto. A Igreja enxergava a necessidade e a oportunidade ao se envolver com a questão social – produto da modernização capitalista – por meio da assistência social. Pode parecer uma mudança sutil, mas a Igreja começa a voltar seu olhar para outra direção, não mais às vítimas das pestes ou aos desvalidos em geral. Foto: Shutterstock.com Nesse momento, a Igreja se volta ao amparo daqueles que não suportavam as consequências de um novo modo de produção que mercantiliza a força de trabalho, que dá novos contornos à família, que promove concentrações urbanas, que modifica o papel feminino ao passo que incorpora a mulher ao mercado de trabalho e à relação de assalariamento, que origina novas doenças, entre outras questões atualizadas. No projeto da nova escola católica, a Igreja tentava responder, de forma complementar e não antagônica, à escola que já havia sido fundada por Del Río. Inclusive, as duas escolas compartilhavam uma base doutrinária comum. Entre outros aspectos, compartilhavam da influência belga, mas guardavam suas diferenças e particularidades ainda assim. Uma dessas diferenças dizia respeito à concepção do fazer profissional: ESCOLA DE DEL RÍO ESCOLA ELVIRA MATTE DE CRUCHAGA ESCOLA DE DEL RÍO Havia a compreensão do Serviço Social como profissão apêndice da área médica. Nesse sentido, apesar da influência católica, o marco da prática profissional acabava muito delimitado ao caráter complementar à profissão médica. ESCOLA ELVIRA MATTE DE CRUCHAGA O campo de atuação do Serviço Social era enxergado de modo mais amplo, com relação à atuação frente às múltiplas expressões da questão social. Com isso, sempre era mantido o horizonte da ação profissional vocacional, de forte cariz católico e preocupado com a satisfação das questões materiais, morais e relacionadas ao bem comum e ao amor ao próximo. A criação da escola Elvira Matte de Cruchaga, portanto, obedeceu a uma dupla racionalidade. Responder às demandas que uma sociedade em mutação impunha à Igreja e aos seus intelectuais. Exercer o papel de divulgadora internacional do Serviço Social católico. Sob aspecto da divulgação internacional, a Escola Elvira Matte de Cruchaga foi um projeto destinado à organização do laicato, no sentido da formação para a assistência social plenamente em acordo com a lógica da religião católica. Tal ação social era acompanhada por treinamentos, propiciados fundamentalmente pela Igreja Católica, por intermédio dos seus primeiros centros de formação. A EXPERIÊNCIA DE FORMAÇÃO DAS VISITADORAS SOCIAIS NESSES CENTROS CONSTITUIU EMBRIÃO DA FORMAÇÃO TÉCNICA MAIS ESPECIALIZADA EM SERVIÇO SOCIAL. IMPORTÂNCIA DAS VISITADORAS SOCIAIS NO PROCESSO DE PROFISSIONALIZAÇÃO PROCESSO DE FORMAÇÃO PELA ESCOLA ELVIRA MATTE DE CRUCHAGA A Escola Elvira Matte de Cruchaga foi criada com objetivos claramente definidos em relação ao ideário da Igreja Católica no contexto das desigualdades produzidas pelo modo de produção capitalista. Do ponto de vista do Serviço Social, a escola investia em um sólido processo de formação profissional, pautado em dois fatores combinados: OS ANTECEDENTES DA CANDIDATA A FORMAÇÃO OFERECIDA PELO CURSO A escola primava pela ligação das ex-alunas com o centro de estudo, como estratégia de manutenção de vínculos. A escola apresentava rigorosos requisitos para admissão de suas alunas, tais como idade (ter entre 21 e 34 anos), atestado médico de boa saúde, bons antecedentes, recomendação paroquial e bom rendimento escolar em ciências humanas. Portanto, a seleção se baseava em critérios elitistas, de forma que somente as jovens mulheres de famílias abastadas conseguiam preencher os requisitos. VOCÊ SABIA O plano de estudo foi fundamentado duração com três anos, entre cursos teóricos e atividades práticas. O plano era apoiado nos princípios do Papa Pio XI, que se referia à relação entre a escola e a Igreja, apregoando que todo ensino e toda organização, bem como professores, programas, livros e demais atividades, estejam dirigidas pelo espírito cristão. Os problemas relacionados às péssimas condições de saúde da população faziam com que houvesse ênfase nas disciplinas relativas à saúde. Tais problemas eram derivados das condições insalubres resultantes do reordenamento capitalista sobre a economia e a sociedade, aliado à influência de formação europeia, que já aproximava o Serviço Social e a Enfermagem. Foto: Shutterstock.com ESCRITÓRIO CENTRAL DE SERVIÇO SOCIAL Em 1936, a escola criou o Escritório Central de Serviço Social, realizando um importante trabalho de mapeamento das demandas sociais atendidas. Nas áreas rurais e urbanas, a incidência dos problemas era diferente. No entanto, identificou-se que os problemas de ordem médica e higiênica, somados aos econômicos, apontavam para a origem das limitações salariais, ligadas às relações capitalistas de produção. As práticas realizadas no Escritório permitiam um aprendizado profissional que logo seria levado ao terreno de trabalho nas instituições sociais. As finalidades principais do escritório eram: 1 Desenvolver e estabelecer o Serviço Social no país (Chile), por meio da aplicabilidade de novas técnicas do trabalho da ajuda e da educação das classes operárias, abrindo a oportunidade de aproveitamento de seu serviço especializado às instituições que não dispunham de um Serviço Social próprio e independente. Disponibilizar uma formação prática aos estudantes, de acordo com os planos escolares, sob o rígido controle da escola. 2 3 Estudar, sistematicamente, as condições sociais de diferentes grupos e promover a melhoria da situação das classes necessitadas, indicando medidas específicas ou gerais, e propondo leis ou regulamentos. RESUMINDO Com o Escritório, a escola visava contribuir ativamente para a educação da classe operária, bem como para o desenvolvimento e prestígio do Serviço Social como profissão, articulando o interesse em ampliar o mercado de trabalho da profissão. INTERFACE ENTRE A ESCOLA E O ESTADO A Escola Elvira Matte de Cruchaga se diferencia em relação às formas anteriores de assistência social, na medida em que reconhece o papel mediador do Estado para normatizar as relações entre capital e trabalho. Dessa maneira, as visitadoras sociais adquiriram conhecimento e proximidade com os problemas sociais da época – fator que as legitimava a sugerir leis e regulamentos no campo assistencial. Há, na perspectiva dessa escola, um esforço para conquistar uma função no interior das relações entre as classes, propondo soluções aos problemas, em interface direta com o Estado e por intermédio privilegiado da atuação das visitadoras sociais. VOCÊ SABIA O governo chileno, em 1935, solicitou à escola que estudasse a situação salarial, a fim de que fossem introduzidas mudanças pertinentes. O trabalho em questão foi realizado pelas visitadoras sociais e suas conclusões foram bem acolhidas pelo aparato estatal. As visitadoras, com isso, adquiriram respeito e credibilidade em seu fazer profissional. Nos anos mais duros da crise chilena, a escola recebeu do governo a tarefa de organizar a assistência a milhares de desempregados, sempre contandocom o apoio dos mecanismos da Igreja Católica. ENCONTROS COM EX-ALUNAS DA ESCOLA A escola zelava pela realização de encontros periódicos com suas ex-alunas, as chamadas Semanas, que costumavam ocorrer uma vez ao ano. Eram espaços de compartilhamento de experiências de trabalho, propostas de novos métodos de ação e reforço do idealismo e espírito religioso das alunas egressas. Os conferencistas convidados para essas jornadas, normalmente, eram profissionais que ocupavam importantes cargos em instituições que demandavam o trabalho das visitadoras. Em geral, eram convidados que causavam impacto na categoria, fosse pelo notório saber, pela autoridade ou pelo peso dos cargos. CENÁRIO INTERNACIONAL Consolidada a importância, a legitimação e o prestígio das visitadoras sociais no país de origem, a Escola Elvira Matte de Cruchaga também se dedicou a investir em sua influência internacional. Desde seus primeiros anos de funcionamento, a escola já contava com a filiação junto à União Católica Internacional de Serviço Social (UCISS), com sede em Bruxelas. A UCISS TINHA COMO OBJETIVO DIFUNDIR O SERVIÇO SOCIAL CATÓLICO, E A ESCOLA ELVIRA MATTE DE CRUCHAGA ERA UM CENTRO PRIVILEGIADO DE SUAS OPERAÇÕES. A UCISS deu à escola a missão de fomentar o Serviço Social católico na América Latina. Inicialmente, isso se seu com o envio de cartas e prospectos aos países sobre a instituição de ensino. SAIBA MAIS “Na Europa, a atenção social tornou-se mais urgente, com o término da Primeira Guerra Mundial (1914-1917), pois o volume de vítimas do conflito estimulou a abertura de escolas e técnicas de socorro adequadas. A primeira organização internacional privada de Serviço Social foi a União Católica Internacional de Serviço Social (UCISS), com sede em Bruxelas (1925), cujos programas educacionais tiveram notável influência nas Escolas de Serviço Social” (CARILLO; SANCHEZ, 2018, p. 325). Imagem: Shutterstock.com Com a continuação, a ação de fomento do Serviço Social católico na América Latina rendeu os frutos esperados, e a formação em rede influenciou a constituição de escolas de Serviço Social em vários países, como Uruguai, Peru, Argentina, Cuba, Brasil e Venezuela. De dez escolas latino-americanas de Serviço Social, oito eram escolas católicas, o que apontava o êxito do projeto da Igreja. CONTRIBUIÇÃO DA ESCOLA ELVIRA MATTE DE CRUCHAGA Sem dúvida, a Escola Elvira Matte de Cruchaga foi uma instituição pioneira, que serviu como modelo a outros centros de formação, com destaque para a experiência das visitadoras sociais. Nesse sentido, contribuiu em larga escala para oferecer um campo propício para o Serviço Social, mesmo que se moldando às exigências históricas impostas pela sua vinculação com os poderes estatal e religioso. A atividade da escola pôs em jogo duas frentes: Uma frente abnegada e de incondicional entrega para reduzir as resultantes sociais do capitalismo. Outra frente relativa à sua sistemática dedicação para servir à gama de estratégias para a qual fora criada – operar seu plano de estudos, as práticas profissionais, o Escritório Central de Serviço Social, as relações internacionais e a instrumentalização de sua ideologia. A escola, em si, não pode ser considerada um paradigma para a profissão. No entanto, indiscutivelmente, ela contribuiu para respostas ao seu tempo e marcou o processo de profissionalização do Serviço Social na América Latina. Vamos entender um pouco mais por que o Chile é tão importante para a formação do Serviço Social. VERIFICANDO O APRENDIZADO 1. SOBRE O CONTEXTO HISTÓRICO EM QUE SE DEU A FORMAÇÃO DAS DUAS PRIMEIRAS ESCOLAS DE SERVIÇO SOCIAL NO CHILE, PODEMOS AFIRMAR QUE: A) Era de um cenário pós-guerra, fato que justificava a emergência do Serviço Social para atuação junto à população pauperizada. B) Era de grandes mudanças decorrentes da adaptação ao novo modo de produção capitalista, sob os aspectos sociais, econômicos e políticos, gerando demandas sociais relacionadas a esse novo modo de produzir. C) Era de forte influência da Igreja Católica, que era a responsável sozinha por toda a malha assistencial que atendia à população desassistida. D) Era de regime autoritário e ditatorial, o que fez com que o Serviço Social fosse instituído como profissão para atender à massa pauperizada da população, com objetivo de conter revoltas sociais. E) Dizia respeito a uma intenção de mudança de regime de governo, na transição de capitalismo para socialismo – fato que possibilitou a criação de políticas sociais voltadas à preservação da qualidade de vida da população e a ampliação do mercado de trabalho dos assistentes sociais. 2. QUAL ASSERTIVA EXPRESSA A IMPORTÂNCIA DA EXPERIÊNCIA FORMATIVA DAS VISITADORAS SOCIAIS? A) As visitadoras sociais realizavam práticas de caridade junto à população chilena e, por essa razão, angariaram a simpatia da população, do governo chileno e da Igreja Católica. B) As visitadoras sociais desenvolveram métodos de trabalho e pesquisa em seu campo de atuação profissional, aprofundando o conhecimento sobre a realidade social na qual intervinham, o que lhes conferiu legitimidade e prestígio perante a população e o aparato religioso e estatal. C) As visitadoras sociais desenvolveram métodos de trabalho e pesquisa em seu campo de atuação profissional, pautadas em inovações teóricas norte-americanas, impressionando o governo chileno. D) As visitadoras sociais desenvolveram métodos de trabalho e pesquisa em seu campo de atuação profissional, promovendo a organização da classe trabalhadora e canalizando as reivindicações da sociedade para o aparato estatal. E) As visitadoras sociais desenvolveram métodos de trabalho e pesquisa em seu campo de atuação profissional, que resultaram no rompimento definitivo com a doutrina social da Igreja e com os fundamentos da Escola Elvira Matte de Cruchaga, agradando sobremaneira o então governo chileno. GABARITO 1. Sobre o contexto histórico em que se deu a formação das duas primeiras escolas de Serviço Social no Chile, podemos afirmar que: A alternativa "B " está correta. A realidade social chilena daquele contexto histórico se configurou como um campo fecundo, para que as demandas geradas como espécies de sequelas do capitalismo sobre a classe trabalhadora pudessem servir como matéria-prima, a fim de que as escolas de Serviço Social trabalhassem seu conteúdo teórico e prático. 2. Qual assertiva expressa a importância da experiência formativa das visitadoras sociais? A alternativa "B " está correta. A partir da criação do Escritório Central de Serviço Social e com o sólido investimento acadêmico da Escola Elvira Matte de Cruchaga, a estratégia proposta para as visitadoras sociais obteve grande êxito, servindo como modelo para outras localidades e constituindo uma forma anterior ao formato institucionalizado de assistentes sociais, como se tem após a inserção da profissão na divisão social e técnica do trabalho. MÓDULO 3 Identificar influência dos Estados Unidos na profissionalização do Serviço Social no Brasil pela via da atuação profissional pautada no viés psicossocial CONTEXTO DO SERVIÇO SOCIAL BRASILEIRO O processo de desenvolvimento da profissão, que se deu entre 1947 e 1961, recebeu uma forte influência do Serviço Social norte-americano. Esse período foi denominado de metodologismo e desenvolvimentismo. Para analisar essa parte da história do Serviço Social, não podemos deixar de considerar o contexto social e econômico, sobre os quais os acontecimentos relacionados à profissão se deram. ERA VARGAS A partir da década de 1940, o capitalismo industrial no Brasil se sedimenta com bases mais definidas. Por meio da adoção de políticas econômicas e financeiras, o Estado fomenta os polos industriais, com objetivo de organizar o mercado interno e tornar o mercado internacional um campo sólido e rentável. O BRASIL VIVIA A ERA VARGAS. Devemos destacar, portanto, a neutralização das reivindicações popularese sindicais, na medida em que o Estado Novo incorporava demandas de diversos setores da sociedade e lhes “concedia”, sob forma de leis e políticas sociais, combinadas à repressão da ditadura varguista. A POLÍTICA DO ESTADO NOVO Foi claramente gestada para responder às necessidades do processo de industrialização e de enquadramento da população urbana. A expansão desse setor é diretamente proporcional à intensificação da exploração da força de trabalho. Considerando a realidade brasileira, por tratar-se de um país populoso e de grandes dimensões territoriais, a massa de trabalhadores disponíveis favorece a exploração intensa na qual o modo de produção capitalista precisa para se reproduzir. javascript:void(0) Dito de outra maneira: TRATA-SE DE ENFRENTAR O PROCESSO DE PAUPERIZAÇÃO DO CONTINGENTE DA CLASSE TRABALHADORA URBANA, COMO FORMA INDISPENSÁVEL À GARANTIA DOS NÍVEIS DE PRODUTIVIDADE DO TRABALHO (REPRODUÇÃO DA FORÇA DE TRABALHO), NECESSÁRIOS À EXPANSÃO DO CAPITAL NAQUELE MOMENTO. (ANDRADE, 2008, p. 270) Foto: Yan Victor de Brito / Wikimedia Commons / CC 4.0 O Estado Novo se apoia, portanto, na classe trabalhadora, a fim de se legitimar e garantir o controle social, por meio das políticas sociais de massa, que protegem e reprimem, ao mesmo tempo, os movimentos reivindicatórios. Como exemplos, temos as legislações sociais, sindicais e as instituições assistenciais – todas ações decorrentes de estabelecimento de alianças entre Estado e empresariado. Como resultado dessas alianças, foram criados a LBA (Legião Brasileira da Assistência) e o SENAI (Serviço Social de Aprendizagem Industrial), em 1942, e o SESI (Serviço Social da Indústria) e o SENAC (Serviço Social de Aprendizagem Comercial), em 1946. ATENÇÃO Importante conferir o Decreto-Lei nº 4.830, de 15 de outubro de 1942 acerca dessa Associação. ROMPIMENTO COM O APOSTOLADO VOCACIONAL CATÓLICO As grandes instituições assistenciais brasileiras e a profissionalização do Serviço Social ocorrem simultaneamente na década de 1940. Sob o ponto de vista da profissão, foi um marco no qual o Serviço Social pode romper o estreito quadro de sua origem no bloco católico. Como efeito, instaurou-se como categoria assalariada, inserida no mercado de trabalho, aberto a partir das grandes instituições assistenciais, em sua maioria advindas do aparato estatal ou paraestatal. Para responder às novas demandas, no entanto, foi necessário que a categoria profissional buscasse conhecimentos teóricos e técnicos considerados mais adequados às requisições colocadas ao Serviço Social. Para tanto, era necessário romper com a forma anterior da atuação profissional, própria das pioneiras do Serviço Social e oriunda do apostolado social. Naquele momento, atuação profissional passava pela centralidade do mandado institucional, respaldado pelo que estava preconizado nas leis, regulações e políticas sociais. javascript:void(0); FOI NO PROCESSO DE EMERGÊNCIA DAS CLASSES SOCIAIS – PROLETARIADO E BURGUESIA NACIONAL – QUE O SERVIÇO SOCIAL SE DESENVOLVEU E LEGITIMOU COMO PROFISSÃO. OS ASSISTENTES SOCIAIS APARECERAM COMO UMA CATEGORIA DE ASSALARIADOS, DIRETA OU INDIRETAMENTE, VINCULADOS AO ESTADO, DEVIDO À IMPLEMENTAÇÃO DE SUAS POLÍTICAS SOCIAIS, VIA ENTIDADES SINDICAIS E ASSISTENCIAIS. (ANDRADE, 2008, p. 271) Vemos que os padrões de eficácia do Serviço Social do período doutrinário, baseado em parâmetros morais e conservadores, tornam-se pouco eficiente frente aos novos tempos e às novas requisições. SER UM BOM CRISTÃO, COM INTENÇÕES DE SOLIDARIEDADE E AMOR AO PRÓXIMO, TORNAVA A AÇÃO PROFISSIONAL PRECÁRIA DIANTE DO NOVO CONTEXTO SOCIAL EXPERIMENTADO. No contraponto, a expectativa em relação à atuação de assistentes sociais era pautada em rentabilidade e investimentos, apoiados em conhecimentos mais sistematizados sobre a realidade e os procedimentos adequados à intervenção profissional. A isso equivale a grande preocupação com os métodos e as técnicas, administrativos e burocráticos, da forma exigida pelas entidades assistenciais. SERVIÇO SOCIAL E A INFLUÊNCIA NORTE- AMERICANA Vamos relembrar alguns fatos históricos mundiais para compreender a passagem da atuação profissional orientada pela doutrina social da Igreja Católica para a fase desenvolvimentista. Tais fatos explicam muitos dos rebatimentos sofridos no Brasil e, mais especificamente, no Serviço Social. GUERRA FRIA No Brasil, o então presidente Getúlio Vargas estreitou relações econômicas e políticas com os EUA, com uma bandeira comum – a expansão mundial do capitalismo e o combate ao comunismo. No cenário mundial, com o fim da Segunda Guerra, a luta travada entre grandes potências – como a Alemanha, França, Inglaterra, Japão e EUA – provocou o enfraquecimento de algumas delas. Isso garantiu a supremacia norte-americana, que passou a ter a expansão colonial dos países latino-americanos como área de interesse. Foto: CPDOC/ GV / Wikimedia Commons / Domínio Público Getúlio Vargas (esquerda) e Franklin Delano Roosevelt (direita), Rio de Janeiro, 1936. O único país forte o suficiente para se lançar em uma ofensiva pós-guerra era os Estados Unidos, visto que Inglaterra, Alemanha e França sofriam duros reflexos em suas economias e vidas humanas, decorrentes das perdas econômicas e dos conflitos armados. O mesmo panorama se deu com a União Soviética, que sofreu um enorme abalo em suas cidades e na economia, além das perdas populacionais decorrentes da guerra. Apesar desse cenário, o embate entre capitalismo e comunismo seguia firme, até que os EUA desencadearam a chamada Guerra Fria, compreendida como luta ideológica entre o comunismo e capitalismo, reacendendo a questão armamentista. A Guerra Fria viabilizou, para os EUA, a reabertura de grandes indústrias, aquecendo o mercado de trabalho e a economia americana. Além disso, criou-se um campo propício para o Plano Marshall consolidar o capitalismo, a partir da política de empréstimos aos países europeus, como França e Itália. Imagem: Shutterstock.com Definida a questão perante a Europa, os EUA se voltaram para a América Latina. Até 1945, a situação internacional brasileira não estava definida por completo. Contudo, o final da Segunda Guerra foi decisivo para conduzir nações no sentido da redemocratização, com a vitória dos países aliados e a derrota do nazifascismo. Foto: Governo do Brasil / Wikimedia Commons / Domínio Público LEGITIMAÇÃO DO CAPITALISMO Não era mais possível sustentar a ditadura varguista com esse ambiente, o que culminou com novas eleições e a chegada do Presidente Dutra ao poder, em 1946. No mesmo ano, uma nova constituição foi promulgada, deixando de fora a questão terra e, por conseguinte, a necessidade de uma reforma agrária foi totalmente desconsiderada. O Brasil ingressava, simultaneamente, em uma fase de crescimento industrial, estimulado pelos EUA e favorecido pela privação do abastecimento e pelo mercado externo. Esses fatos colaboraram para o surgimento de uma nova burguesia industrial no Brasil. A INDUSTRIALIZAÇÃO FORA FAVORECIDA COM A POLARIZAÇÃO ENTRE SOCIALISMO E CAPITALISMO, TENDO SIDO O CAPITALISMO COROADO COMO POSIÇÃO IDEOLÓGICA PREDOMINANTE. Com o sucesso e a pujança propiciados pela industrialização no Brasil, o capitalismo foi visto como algo necessário para o desenvolvimento e modernização da sociedade. Como consequência, eclodiu o agravamento da questão social em suas múltiplas expressões. A via socialista, na época, era enxergada apenas como restrição às liberdades humanas e aos direitos individuais, além de parecer atentar contra o “direito da Igreja da família”. Esse fato assumia um vulto de rejeição ainda maior no interior de uma profissão ainda muito marcada pela doutrina social da Igreja. A estratégia foi, então, a de aproximar os princípios democráticos com o pensamento cristão. Imagem: Shutterstock.com Desse modo, o Serviço Social compatibilizou a ideologia católica com a legitimação do capitalismo, aproveitandoas condições propícias à institucionalização da profissão. BUSCA POR BASE TEÓRICO-CIENTÍFICA A partir de 1945, é registrada a preocupação da categoria profissional com a elaboração de uma teoria própria, centrada em critérios científicos e técnicos, capaz de imprimir ações eficazes na execução do fazer profissional. Foto: loc / Wikimedia Commons / CC0 1.0 Outro fator relevante, decorrente da relação próxima e amistosa entre Brasil e EUA, foi o sistema de bolsas de estudo para assistentes sociais brasileiros, cujo marco se deu no Congresso Interamericano de Serviço Social, realizado em 1941, em Atlantic City (EUA). O evento aproximou as principais escolas de Serviço Social do Brasil aos grandes centros de formação em Serviço Social norte-americanos. A partir do sistema de bolsas, ficou marcado o período de influência norte-americana sobre a profissão e sobre a formação profissional, devido à alteração nos currículos de nossas escolas. COMENTÁRIO É importante lembrar que a supremacia norte-americana não se refletia apenas no cenário econômico e político, mas também no cultural, constituindo-se como fonte de referência de modelos e ações de sucesso, inclusive no campo do bem-estar social. Tal situação contribuiu muito para que o Serviço Social brasileiro buscasse seu suporte teórico-científico em bases norte-americanas. SERVIÇO SOCIAL DE CASO, GRUPO E COMUNIDADE O Serviço Social, atualmente, faz a crítica ao conservadorismo e a suas fragilidades teóricas, constitutivas daquele momento de profissionalização. No entanto, não podemos negar a importância do esforço relativo à teorização e atribuição de caráter mais científico e sistematizado, tanto à formação quanto às ações profissionais. O reconhecimento às pioneiras do Serviço Social e às primeiras autoras vem desse esforço, pela contribuição prestada no avanço da profissão, embora devamos analisar criticamente esse legado. Mary Richmond, por exemplo, foi a primeira a escrever e tematizar sobre assistência social, caridade, filantropia e Serviço Social. Em sua obra, datada de 1917, a autora buscou, entre outros objetivos, secularizar a profissão e oferecer bases técnicas e métodos de trabalho que possibilitassem que a categoria profissional reconhecesse como válida e própria. Foto: May Wright Sewall / Wikimedia Commons / Domínio Público MARY RICHMOND javascript:void(0) Mary Richmond (1861-1928) foi uma das pioneiras no serviço social norte-americano. Ela teve a ideia de transformar esse trabalho em um trabalho formal. Criou técnicas, sistemas, conteúdos e teorias de serviço social inclinados para a formação de uma disciplina. Por outro lado, revolucionou completamente a ideia de fazer serviço social e a maneira como os mais necessitados eram ajudados. Ela tentou aplicar uma estratégia que atacasse o problema na raiz, procurando as causas da pobreza para eliminá-la. A questão da secularização aqui tratada consiste em tornar leigo aquilo que tem caráter religioso. No caso do Serviço Social, isso significava romper com o viés central do apostolado vocacional católico do fazer profissional para encaminhar outro tipo de prática, dotada de conceitos técnicos e científicos. SOCIOLOGIA NORTE-AMERICANA As ideias de Richmond eram baseadas em uma concepção funcional de sociedade, elaborada pela Sociologia norte-americana. No Serviço Social brasileiro, isso é absorvido pela categoria, O SERVIÇO SOCIAL MANTÉM SEU CARÁTER TÉCNICO-INSTRUMENTAL VOLTADO PARA UMA AÇÃO EDUCATIVA E ORGANIZATIVA ENTRE O PROLETARIADO URBANO, ARTICULANDO – NA JUSTIFICATIVA DESTA AÇÃO – O DISCURSO HUMANISTA, CALCADO NA FILOSOFIA ARISTOTÉLICO-TOMISTA, AOS PRINCÍPIOS DA TEORIA DA MODERNIZAÇÃO PRESENTE NAS CIÊNCIAS SOCIAIS. ESSE ARRANJO TEÓRICO- DOUTRINÁRIO OFERECE AO PROFISSIONAL UM SUPORTE TÉCNICO-CIENTÍFICO, AO MESMO TEMPO EM QUE PRESERVA O CARÁTER DE UMA PROFISSÃO “ESPECIAL”, VOLTADA PARA OS ELEVADOS IDEAIS DE “SERVIÇO AO HOMEM”. (IAMAMOTO, 1994, p. 21) A Sociologia figurava, portanto, como um dos suportes teóricos para o Serviço Social, explicando a desigualdade social a partir da estratificação social. Essa visão desconsiderava os problemas sociais imbrincados na lógica do sistema capitalista de produção. A sociologia americana se ocupa de abordar, naquele contexto, o âmbito dos indivíduos, grupos ou instituições em desajuste, a partir das desigualdades existentes, em uma clara perspectiva de adequação dos sujeitos e de individualização dos problemas. Para efetivar esse intento, à luz dos novos tempos que a categoria profissional vivia, foi preciso adequar não só procedimentos metodológicos, mas também referenciais teóricos que os sustentassem. INDIVIDUALIZAÇÃO DOS PROBLEMAS Para adequação e não para resolução efetiva das questões trazidas pelos sujeitos, visto que tal resolução era de responsabilidade deles, causadores de tais disfunções. No âmbito institucional, o agente profissional, no caso o assistente social, será responsável pelo trabalho junto aos sujeitos sociais para que eles, em uma situação conflituosa, voltem à sua posição no sistema definido. De acordo com a perspectiva funcionalista, “a proposta institucional é colocar o conflito no conjunto da estrutura social aceitável, adequando o usuário aos seus recursos” (ANDRADE, 2008, p. 276). javascript:void(0) RESUMINDO A teoria diz respeito, portanto, a uma construção intelectual que proporciona explicações aproximadas da realidade e supõe um padrão de elaboração, chamado de método. Dessa forma, no caso teoria social, cada teoria é um método de abordar o real; é o caminho teórico que se utiliza para explicar o ser social. NATURALIZAÇÃO DOS FENÔMENOS SOCIAIS Trazendo esses conceitos para o Serviço Social daquele momento, de primeiro suporte teórico e metodológico, fundamentado na matriz positivista, temos uma apreensão da realidade manipuladora, instrumental e imediata do ser social. Trata-se de abordar as relações sociais dos indivíduos no plano de suas vivências imediatas, como fatos que se apresentam em sua objetividade e no seu caráter imediatista, uma espécie de “é assim porque é assim e pronto”. Muito superficialmente, trata-se da naturalização dos fenômenos sociais. ATENÇÃO Essa perspectiva restringe a visão teórica ao âmbito do verificável, da experimentação e da fragmentação. As mudanças são, na verdade, reformas da realidade, com intuito de preservar a ordem estabelecida, de ajustar. A partir de 1945, o Serviço Social latino-americano se apoiou nas técnicas funcionalistas advindas da Sociologia norte-americana para instrumentalizar sua intervenção profissional, sendo essa a principal influência da hegemonia dos EUA sobre a profissão. A EXPRESSÃO MÁXIMA DE TAL INSTRUMENTALIZAÇÃO SE DEU PELAS TEORIAS DE CASO, GRUPO E COMUNIDADE. SERVIÇO SOCIAL DE CASO O Serviço Social de Caso ou Casework centrava sua ação e preocupação na personalidade do cliente, buscando conseguir mudanças no indivíduo. Tais mudanças se dariam a partir de novas atividades e novos comportamentos que o ajustassem ao meio social e fizessem com que ele cumprisse o seu papel no sistema vigente. As autoras de destaque nesse campo eram Mary Richmond, Gordon Hamilton e Porter Lee. O Serviço Social de Casos se caracteriza pelo objetivo de fornecer serviços básicos práticos e de aconselhamento, de tal modo que seja desenvolvida a capacidade psicológica do cliente, e ele seja levado a se utilizar dos serviços existentes para atender a seus problemas (HAMILTON, 1958, p. 38). Foto: Shutterstock.com O Serviço Social, a fim de racionalizar a ação profissional, buscava na: Sociologia O apoio necessário à questão do meio social e da personalidade, com conceitos de família e estrutura socioeconômica. Psicologia Os insumos teóricos que pudessem explicar melhor o comportamento dos indivíduos e contribuir na implementação de um plano de tratamento, que passava pelas etapas de sugestão, treinamento, aconselhamento, educação e reeducação.Para isso, a informação e a observação eram superestimadas. O método clínico é centrado no indivíduo e apresentava, como etapas de processo de trabalho, o estudo, o diagnóstico e os tratamentos. Acreditava-se que isso possibilitava um olhar e uma intervenção de cunho psicossocial. SERVIÇO SOCIAL DE GRUPO O Serviço Social de Grupo passou a ser incorporado à grade curricular das escolas de Serviço Social brasileiras em 1947. Um dos nomes de maior expressão no Serviço Social de Grupos era o de Gisela Konopka, além de outros, como Grace Coyle, Gertrude Wilson, Gladys Ryland. GISELA KONOPKA Um método que ajuda os indivíduos a aumentarem o seu funcionamento social, por meio de objetivas experiências de grupo, e a enfrentarem, de modo mais eficaz, os seus problemas pessoais, de grupo ou de comunidade. Trata-se de uma prática que visa diminuir o sofrimento e melhorar o funcionamento pessoal e social de seus membros, por meio de uma específica e controlada intervenção de grupo, com a ajuda de um profissional (KONOPKA, 1979, p. 33-45). Konopka definia o Serviço Social de Grupo como um método do Serviço Social que ajuda os sujeitos a aumentarem seu funcionamento social por meio de experiências de grupo, constituindo-se em uma prática que visa minimizar o sofrimento, melhorar o funcionamento social por meio de uma intervenção grupal específica e controlada pela ajuda profissional especializada. javascript:void(0) O Serviço Social de Grupo tem uma base forte assentada nos movimentos de autoajuda norte- americanos. O enfoque dado ao trabalho desenvolvido com os grupos era terapêutico e disciplinador, usando a força do grupo no sentido do ajuste do indivíduo disfuncional, adequando-o. Isso era feito, no entanto, sem rever questões sociais mais profundas, reafirmando que o problema está no homem, e não na ordem social vigente. DESENVOLVIMENTO DE COMUNIDADE O Desenvolvimento de Comunidade também figurava como um método com características semelhantes aos dois processos anteriormente citados. Mantinha o objetivo do ajustamento social do sujeito, ao mesmo tempo em que realizava um trabalho assistencial. VOCÊ SABIA Durante as décadas de 1950 e o início de 1960, o Serviço Social incorpora, por influência norte-americana, a política desenvolvimentista no ensino. Essa política enfatizava a aceleração econômica, incentivada pela industrialização e modernização em curso no mundo e capitaneada pelos EUA. Era destinada, ao Serviço Social, a missão de contribuir para o aprimoramento do ser humano, apesar de o país conviver com o subdesenvolvimento, o que representava uma contradição. O Desenvolvimento de Comunidade foi, dessa forma, uma estratégia lançada para garantir a prosperidade, o progresso social e a hegemonia ideológica norte-americana, intimamente ligada ao capitalismo e à sua busca por preservar o mundo livre de ideologias não democráticas. Partindo do pressuposto de que as populações subdesenvolvidas teriam maior propensão ao comunismo, urgia a pauta desenvolvimentista nos países latino-americanos. Durante a década de 1950, a ONU (Organização das Nações Unidas) empenha-se em sistematizar e divulgar o Desenvolvimento de Comunidade, como medida para solucionar o complexo problema da integração de esforços da população aos planos nacionais e regionais de desenvolvimento. A OEA (Organização dos Estados Americanos), aderindo às recomendações da ONU, define uma política de assistência técnica e cooperação norte-americana para as Américas, e cria uma unidade responsável pela divulgação e pelo impulso desses programas na América Latina. Com relação ao Serviço Social, a ONU se ocupa em realizar três pesquisas de caráter internacional sobre a formação dos assistentes sociais, nos níveis auxiliar, de graduação e pós- graduação. DESENVOLVIMENTO DE COMUNIDADE NO BRASIL A preocupação do Serviço Social brasileiro com o Desenvolvimento de Comunidade reside em se incorporar a um movimento de âmbito internacional, deflagrado oficialmente pelas Nações Unidas e validado por diversos órgãos interessados na disseminação da ideologia e do modo de produção capitalista, em especial o Estado. Aos poucos, a ação do Serviço Social vai incorporando essas concepções e ações, ao passo que o próprio Estado brasileiro reconhece, no método de Serviço Social de Comunidade, uma significativa potencialidade para o desenvolvimento nacional, conforme fora discutido no II Congresso de Serviço Social Brasileiro. O assistente social passa a figurar como uma espécie de líder indireto da comunidade, estimulador da mudança social, promovida com uma pseudoparticipação popular. Observando a categoria profissional em períodos, compreendemos que, apesar da forte influência teórica norte-americana, os profissionais começaram a procurar uma literatura que privilegiasse a análise dos fatos sociais da realidade brasileira. Empreenderam esses esforços já um pouco mais apartados dos objetivos propostos pela primeira geração de profissionais, que se articulava em torno do ideário social cristão. ATENÇÃO O foco dessa segunda geração profissional era buscar formas de responder à realidade social latino-americana. Na década de 1960, essa parcela da profissão irá viver um período da história nacional marcada pela ditadura militar. Ao mesmo tempo, há uma primeira aproximação com uma revisão crítica no interior da categoria profissional, que se constituirá, mais tarde, no Movimento de Reconceituação. Agora, iremos aprofundar na influência das técnicas funcionalistas na formação do assistente social. VERIFICANDO O APRENDIZADO 1. EM RELAÇÃO À SECULARIZAÇÃO DA PRÁTICA PROFISSIONAL EM SERVIÇO SOCIAL, É CORRETO AFIRMAR QUE: A) O esforço norte-americano em teorizar sobre o Serviço Social, cujo nome de maior expressão foi de Gisela Konopka, contribuiu significativamente para desvinculação, em certa medida, da prática apostolar de influência católica para uma prática mais profissional e assentada em pressupostos teóricos e metodológicos. B) O esforço franco-belga em teorizar sobre o Serviço Social, cujo nome de maior expressão foi de Mary Richmond, contribuiu significativamente para desvinculação, em certa medida, da prática apostolar de influência católica para uma prática mais profissional e assentada em pressupostos teórico e metodológicos. C) O esforço norte-americano em teorizar sobre o Serviço Social, cujo nome de maior expressão foi de Mary Richmond, contribuiu significativamente para desvinculação, em certa medida, da prática apostolar de influência católica para uma prática mais profissional e assentada em pressupostos teóricos e metodológicos. D) Na verdade, não houve uma tentativa de secularização da profissão efetivamente, tanto que, desde o processo de profissionalização do Serviço Social até a contemporaneidade, a influência católica se mantém inalterada e presente no cotidiano dos assistentes sociais. E) Foram os autores nacionais em Serviço Social os responsáveis pela secularização da profissão – como Marilda Iamamoto, Raul de Carvalho e José Paulo Netto –, na medida em que dedicaram estudos que pudessem discutir com a categoria profissional a necessidade de romper com as práticas voluntaristas de assistência social, fomentadas pela Igreja Católica. 2. QUAL A IMPORTÂNCIA DOS ORGANISMOS INTERNACIONAIS NA DIFUSÃO DO DISCURSO HEGEMÔNICO NORTE-AMERICANO? A) Organismos como a ONU e OEA atuaram na sistematização e divulgação de estratégias de consolidação do capitalismo, industrialização e desenvolvimento na América Latina. B) Não houve registro de atuação de organismos internacionais, como a ONU e OEA, no sentido de empreender estratégias de consolidação do capitalismo na América Latina. C) O discurso hegemônico norte-americano não apontava no sentido da consolidação do capitalismo na América Latina, e os organismos internacionais, portanto, não serviram a essa finalidade. D) ONU e OEA difundiram o discurso hegemônico norte-americano apenas no que dizia
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