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Implicações terapêutica na terapia sistémica

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Implicações da evolução na compreensão e operacionalização do funcionamento dos sistemas e das terapias
Interfaces entre o ciclo de vida da família e do terapeuta
A combinação entre os ciclos de vida da família e do terapeuta é definida por Simon (1995) como ajuste, o qual não inclui uma ação ou uma conotação de valor, simplesmente acontece, não sendo linear. O ajuste muda de acordo com a experiência de vida do terapeuta e também a cada família atendida, podendo ser influenciado por uma série de fatores, tais como: estilo pessoal, conhecimento, carisma e desembaraço do terapeuta, os quais podem interferir e favorecer uma mudança em sistemas disfuncionais (Simon, 1995). 
O conceito de ajuste de Simon (1995) se relaciona ao conceito familiar de ligação ou união de Minuchin (1980), pois este se refere à conexão essencial do terapeuta com a família. Para esse último autor, o terapeuta se une ao sistema familiar do paciente e então utiliza a si mesmo para transformá-lo. Destarte, dois conceitos são fundamentais para descrever esse processo: a união e a acomodação. 
A união diz respeito à própria presença do terapeuta, que por si só é significativa, pois a família se organiza em relação a ele. Já a acomodação refere-se ao próprio ajuste do terapeuta à família, com vistas a alcançar sua união com ela. Nesse sentido, a mudança ocorre através do processo de associação do terapeuta à família e da reestruturação desta. 
Assim, o terapeuta sistémico deve ser considerado como um membro-agente e reagente do sistema terapêutico, pois enfatiza os aspectos de sua personalidade e de sua experiência para se vincular à família. Frente a tal compreensão, os ciclos de vida da família e do terapeuta podem se combinar de três maneiras principais, de acordo com Simon (1995):
 1) o terapeuta ainda não experienciou o estágio do ciclo de vida da família; 
2) o terapeuta está experienciando o mesmo estágio do ciclo de vida da família; e, por fim, 3) o terapeuta já passou pelo estágio do ciclo de vida da família. 
Um terapeuta jovem que ainda não experienciou o estágio do ciclo de vida da família pode se ajustar a uma família mais velha através das lembranças de sua própria infância e adolescência. 
Em geral, o subsistema fraterno gosta desses terapeutas, mas seu rapport pode ter limitações com o subsistema parental (Simon, 1995). Pode haver uma identificação com os filhos, no sentido de se posicionar a favor destes, sem considerar o ponto de vista dos pais. 
Também é possível ocorrer de o terapeuta estar vivenciando em sua família situação semelhante a que recebe para atendimento, como, por exemplo, estar enfrentando o divórcio entre os pais e receber um casal de meia-idade prestes a se separar. Tais situações podem acionar emoções difíceis de o terapeuta manejar e é possível que alguma manifestação reativa em relação à família seja observada (Simon, 1995). Contudo, tais aspectos não se constituem em um fator negativo para a carreira do terapeuta. Pelo contrário, uma boa resolução dos eventos traumáticos ou a autodiferenciação, conforme Bowen (1978), pode levar a uma empatia e a entendimento valiosos para o paciente. 
Nesse mesmo sentido, Simon (1995) aponta que o desenvolvimento desses recursos nos terapeutas possa ser uma dádiva da experiência de supervisão clínica, além de consistir em uma questão de treinamento.
A segunda combinação possível é o terapeuta estar no mesmo estágio do ciclo de vida da família, o que pode proporcionar a este, em função de sua própria experiência pessoal, a não patologização das questões problemáticas vivencíadas pela família (Simon, 1995). Todavia, também pode ser difícil para o terapeuta manejar a carga emocional que implica acompanhar uma família que esteja vivendo situações de vida semelhantes as suas. 
É possível que o terapeuta não consiga considerar questões importantes de serem discutidas ou se comporte de forma reativa à família, podendo até mesmo desprezá-la. No entanto, estar vivenciando o mesmo momento do ciclo de vida familiar pode levar o terapeuta a estabelecer um entendimento e empatia valiosos com a família, através do sentimento de estarem compartilhando experiências de vida (Simon, 1995). Por fim, pode acontecer de o terapeuta já ter passado pelo estágio do ciclo de vida da família que está em atendimento. 
De acordo com Simon (1995), o ajuste com as famílias se torna mais fácil à medida que se envelhece, porque o terapeuta que já passou pelas dificuldades atuais da família que atende pode acolhê-la e compreendê-la. Contudo, não quer dizer que um terapeuta mais jovem não consiga desempenhar bem seu papel quando no atendimento com famílias em estágios mais avançados que o seu, mas certamente o ajuste e as estratégias utilizadas no processo terapêutico serão diferentes. Por outro lado, também pode acontecer de o terapeuta ter tido dificuldades de superar seus problemas em algum momento de seu ciclo de vida e ao entrar em contato com a família, reviver seus traumas, travando o processo terapêutico por meio de sentimentos de autodefesa, distanciamento ou condescendência. Ainda pode acontecer de o terapeuta parecer sábio demais, o que pode levar a família a abandonar seus próprios recursos e tentar imitar os do terapeuta, formando uma fusão (Simon, 1995). 
Conforme mencionado, quando acontece de os ciclos de vida da família e do terapeuta não se ajustarem bem, há algumas sugestões que podem ser úteis. A principal recomendação é o estudo rigoroso da família de origem do terapeuta (Bowen, 1978; Osório 2002b; Simon, 1995; Valle, 2002). Bowen (1978) aponta que o estudo da própria família tem como objetivo compreender a rede de regras e expectativas familiares sobre as quais cada um de nós foi socializado. Assim, o terapeuta poderá discriminar suas próprias imagos familiares e se autoconhecer para melhor auxiliar no processo de discriminação e de individuação dos membros da família que acompanha (Valle, 2002). Esse autoconhecimento já deveria ocorrer no processo de formação profissional através do trabalho do self do terapeuta, em que há a possibilidade de este entrar em contato com suas vivências familiares que podem interferir em sua prática profissional.
Vários são os autores que enfatizaram a importância do trabalho com os aspectos da personalidade do terapeuta, indicando a capacidade de usar a si mesmo como instrumento da terapia e como agente de mudança para a família (Andolfi & Ângelo, 1988; Bumberry & Whitaker, 1990; David & Erickson, 1990; Elkaim, 1988; Festa, 2007; Prosky, 1996; Rober, 2005). 
Inicialmente, é necessário que o terapeuta desenvolva a capacidade de integrar a sua vida e incluir suas próprias circunstâncias sociais e culturais em seus atendimentos. Para Festa (2007), o terapeuta conecta continuamente na relação terapêutica seus próprios sofrimentos e possibilidades de cura . ou tratamento, o que remete a pensar sobre a autorrevelação. A técnica de autorrevelação exige dos terapeutas um elevado nível de autoconhecimento e disciplina (Omylinska-Thurston & James, 2011). Portanto, é necessário que o seu uso seja bem pensado, bem como indica-se a necessidade do desenvolvimento pessoal contínuo do terapeuta (Roncari, 2011). Para Elkaim (1990) e Festa (2007) a terapia, assim como qualquer outra situação na vida, é autorreferencial, não sendo possível a neutralidade no processo terapêutico. 
Da mesma forma, Andolfi e Ângelo (1988) destacam: "É necessário ao terapeuta transferir o baricentro da própria competência e se permitir entrar na relação sem se ancorar em posições estáticas, baseadas mais na abstração que na participação da construção emotiva do cenário terapêutico" (p. 60). É preciso que o terapeuta acolha a sua própria humanidade e tenha oportunidade de ressignificar suas experiências para que consiga manter a reciprocidade em um processo terapêutico familiar (Colombo, 2009). Castiel (1996) corrobora a discussão, destacando que o terapeuta precisa ter certa flexibilidade que lhe permita construir um repertório de emoções capaz de conectar-lhe com a diversidadede sentimentos e a singularidade das pessoas.
 É importante que ele assuma suas vulnerabilidades e se sensibilize com a família, permitindo-se surpreender-se, misturar-se e separar-se dela quando se fizer necessário. Além do estudo da própria família de origem do terapeuta e da construção da relação terapêutica, Simon (1995) também destacou a postura que o terapeuta assume diante da família, indicando que este não deve se colocar na posição de especialista ou colocar os membros da família como tal. Tampouco é adequado assumir uma postura submissa, quando se é muito jovem ou arrogante quando já se é mais velho (Simon, 1995). Tal cuidado é necessário porque a idade do terapeuta e a sua experiência de vida podem influenciar na credibilidade da família para com ele, bem como no alcance e poder das suas estratégias de intervenção (Andolfi, 1996; Bowen, 1978; Osório 2002b; Rober, 2005; Simon, 1995; Valle, 2002). Nesse mesmo sentido, Osório (2002b) aponta que o terapeuta, que ocupa o papel de centralizador e que possui dificuldades em lidar com a pluralidade das expectativas humanas, estaria desqualificando os pacientes e desconsiderando seu direito ao livre arbítrio e ao questionamento crítico propostos pelo setting clínico. Portanto, o processo terapêutico deve abarcar as responsabilidades de todos os envolvidos, terapeutas e pacientes, com seus diferentes saberes e compromissos (Colombo, 2009). Também é importante escolher o modelo terapêutico a ser seguido, porque cada um deles enfatiza posições diferentes do terapeuta diante da família. Simon (1995) aponta que o modelo Boweniano, por exemplo, ressalta a postura de um terapeuta neutro que opera através da pesquisa do sistema familiar, enquanto que a terapia estrutural requer um posicionamento mais carismático. Em geral, a escolha pelo modelo ocorre de acordo com a proposta do curso formador, mas a sua limitação pode ser compensada também pelo apoio do supervisor (Simon, 1995). Além disso, a integração de modelos e teorias tem sido cada vez mais incentivada entre os centros formadores, pois se acredita que aqueles que são capazes de apreciar mais de uma visão de mundo, podem alternar entre perspectivas diferentes, ampliando suas opções para ajudar aos seus pacientes (Safran, 2002, ln Prado, 2002). 
A supervisão também se torna fundamental na formação e prática do terapeuta, pois o manejo clínico será influenciado pelo sistema família+terapeuta+supervisor (Osório, 2002a; 2002b; Simon, 1995; Valle, 2002). Essa deve ser escolhida não apenas com base na experiência clínica do supervisor, mas também visando complementar a experiência de vida do supervisionado (Osório, 2002a; 2002b; Simon, 1995; Valle, 2002). Para Simon (1995), tal influência, em geral, é positiva porque reequilibra situações em que o ajuste entre terapeuta e família é improdutivo ou disfuncional. Ele enfatiza que "ver o mundo clínico através dos olhos de outras pessoas é como viver partes do ciclo de vida que o destino resolveu não nos conceder pessoalmente" (p. 104 ). 
A rede de trabalho também é destacada como um importante aspecto para estabelecer um bom ajuste entre o terapeuta e a família, visto que a supervisão está limitada a uma sessão periódica e a um número de casos necessariamente restritos (Simon, 1995). A interação entre colegas terapeutas de diferentes idades, gêneros, etnias e orientação sexual pode ser experienciada como outro tipo de supervisão (David & Erickson, 1990, simon, 1995). 
Colombo (2009) refere que a experiência do outro pode ser considerada como uma coautoria na construção de si mesmo. Ela acredita que o "ser terapeuta" consiste em uma construção conjunta de sua própria história e da escuta de diferentes interlocutores através da experiência exterior. Em suma, ser terapeuta pressupõe formação teórica e prática, além de um processo de dar-se conta da interferência de suas próprias experiências e história de vida no processo de mudança da família por ele atendida. Tais aspectos têm implicações importantes para a formação de especialistas em terapia familiar sistêmica, bem como para a vivência da terapia individual e de supervisão. 
Conforme Grandesso (2000), o sistema terapêutico está apoiado em torno dos princípios de imprevisibilidade e incerteza, da impossibilidade de um conhecimento objetivo e da autorreferência. Constantemente, o terapeuta se depara com diferentes histórias de vidas. Cada família atendida traz consigo uma nuance que se entrelaça com a pessoa do terapeuta e forma um novo sistema. Caso, em algum momento, o terapeuta não se der conta de sua vulnerabilidade e emoção, ele poderá se distanciar de sua voz interna e se desconectar do seu próprio self terapêutico. Quando isso acontece, corre-se o risco de ele perder sua condição íntegra e espontânea na relação com a família, que é imprescindível para um real encontro humano (Colombo, 2009).
Referências 
Andolfi, M. & Ângelo, C. (1988). Tempo e mito em psicoterapia familiar. Porto Alegre: Artes Médicas. Andolfi, M. (1996). A linguagem do encontro terapêutico. Porto Alegre: Artmed. 
Bowen, M. (1978). Family therapy in clinical practice. New York: 
Jason Aronson. Bumberry, W., & Whitaker, C. A. (1990). Dançando com a família. Porto Alegre: Artes Médicas. Carbone, A (2007, dezembro). Terapia familiar sistêmica: Breve histórico, origem e desenvolvimento da terapia familiar. Revista de Psicologia Catharsís. Disponível em: http://www.revistapsicologia.com.br/materias/ hoje/terapia F amiliarSistemica. htm Carter, B., & McGoldrick, M. (1995). As mudanças no ciclo de vida familiar: Uma estrutura para a terapia familiar. ln B. Carter & M. MacGoldrick (Orgs.). As mudanças no ciclo de vida famílíar (pp. 7-29). Porto Alegre: Artes Médicas.

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