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POLÍTICA DE SAÚDE E PROTEÇÃO SOCIAL NO BRASIL Thalyta Mabel Nobre Barbosa Thalyta M abel Nobre Barbosa Política de Saúde e Proteção Social no Brasil Fundação Biblioteca Nacional ISBN 978-65-5821-075-7 9 786558 210757 Código Logístico I000355 Política de Saúde e Proteção Social no Brasil Thalyta Mabel Nobre Barbosa IESDE BRASIL 2021 Todos os direitos reservados. IESDE BRASIL S/A. Al. Dr. Carlos de Carvalho, 1.482. CEP: 80730-200 Batel – Curitiba – PR 0800 708 88 88 – www.iesde.com.br © 2021 – IESDE BRASIL S/A. É proibida a reprodução, mesmo parcial, por qualquer processo, sem autorização por escrito da autora e do detentor dos direitos autorais. Projeto de capa: IESDE BRASIL S/A. CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO NA PUBLICAÇÃO SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ B213p Barbosa, Thalyta Mabel Nobre Política de saúde e proteção social no Brasil / Thalyta Mabel Nobre Barbosa. - 1. ed. - Curitiba [PR] : IESDE, 2021. 96 p. : il. Inclui bibliografia ISBN 978-65-5821-075-7 1. Sistema Único de Saúde (Brasil). 2. Política de saúde - Brasil. 3. Saú- de pública - Brasil. I. Título. 21-74655 CDD: 362.10981 CDU: 614(81) Thalyta Mabel Nobre Barbosa Mestre e graduada em Serviço Social pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN). Possui experiência como docente na graduação e pós- graduação, tanto em instituições públicas quanto privadas, nas disciplinas de Fundamentos Teórico- Metodológicos do Serviço Social, Pesquisa Social e Serviço Social, Previdência Social e Serviço Social e Metodologia Científica. Atua como autora de e-books nas áreas de Serviço Social, Metodologia Científica e Educação a Distância. Desempenha as funções de design educacional e de consultoria educacional na elaboração, gestão, implementação e validação de materiais didáticos para educação a distância. Agora é possível acessar os vídeos do livro por meio de QR codes (códigos de barras) presentes no início de cada seção de capítulo. Acesse os vídeos automaticamente, direcionando a câmera fotográ�ca de seu smartphone ou tablet para o QR code. Em alguns dispositivos é necessário ter instalado um leitor de QR code, que pode ser adquirido gratuitamente em lojas de aplicativos. Vídeos em QR code! SUMÁRIO 1 Formulação e implantação de políticas de saúde 9 1.1 Contextualizando a política pública 10 1.2 Etapas para a formulação de uma política pública 18 1.3 Implementação e avaliação de políticas públicas 23 2 História das políticas públicas de saúde no Brasil 29 2.1 Da colonização ao império 29 2.2 A Primeira República (1889-1930) 33 2.3 A Era Vargas (1930-1945) 37 2.4 A República Populista (1945-1964) 40 2.5 A Ditadura Militar (1964-1980) 44 2.6 A década de 1980: o SUS e a Constituição Federal 47 2.7 De 1990 à atualidade 51 3 Modelos assistenciais em saúde 59 3.1 Modelos assistenciais no mundo 59 3.2 Modelos assistenciais em saúde no Brasil 65 3.3 Desafios e perspectivas 71 4 Regulação em saúde 78 4.1 Etapas de regulação 79 4.2 Os instrumentos de regulação em saúde 83 4.3 Níveis de complexidade e formas de liberação dos procedimentos 86 Resolução das atividades 92 Agora é possível acessar os vídeos do livro por meio de QR codes (códigos de barras) presentes no início de cada seção de capítulo. Acesse os vídeos automaticamente, direcionando a câmera fotográ�ca de seu smartphone ou tablet para o QR code. Em alguns dispositivos é necessário ter instalado um leitor de QR code, que pode ser adquirido gratuitamente em lojas de aplicativos. Vídeos em QR code! O ato de planejar e de desenvolver um material didático consiste em um momento complexo de tomadas de decisões. Nessa perspectiva, organizar um conjunto de conhecimentos sobre um determinado assunto, especificamente, sobre a política de saúde no Brasil, requer de nós a elaboração de conceitos e exemplos, de modo a articular tanto saberes empíricos quanto teóricos. Assim, estabeleceremos significados entre saberes e experiências que estão em constante processo de transformação. Então, ao organizarmos este livro, vimo-nos diante de uma infinidade de conceitos e informações, os quais gostaríamos de apresentá-los no decorrer desta obra. Dessa forma, fizemos escolhas a fim de lhe apresentar os principais pontos sobre a política de saúde com vistas a auxiliar o seu aprendizado nessa temática. Tendo explicado alguns aspectos importantes, é essencial que seja dito que incluímos seções, trechos dialógicos e inquietações com a finalidade de aproximar você do conteúdo. É válido mencionar que a política de saúde é um assunto abordado de maneira corriqueira em nosso cotidiano, e ela se torna relevante por ser uma garantia que está presente em nossa Constituição Federal de 1988. As considerações introdutórias referentes à importância da saúde, enquanto política pública, expuseram alguns desafios que são enfrentados para a materialização desse direito em nossa sociedade. Para que apresentássemos o conteúdo, tivemos o amparo da legislação e de obras voltadas a essa temática. Visando a elencar os principais pontos abordados, destacaremos, no Capítulo 1, os conceitos e a importância da política pública para a sociedade, com ênfase na construção da agenda política, da formulação e da implementação da política pública. No Capítulo 2, apresentaremos a história da saúde pública em nosso país, desde a sua fundação, como colônia portuguesa, até o século XX, quando ganhou complexidade e, com o passar APRESENTAÇÃOVídeo 8 Fundamentos de alfabetização e letramento das décadas, tornou-se uma política pública e direito de todos. Por último, debruçaremo-nos sobre a contemporaneidade e os desafios impostos pela Pandemia de Covid-19. Já no Capítulo 3, analisaremos as transformações pelas quais passaram os modelos assistenciais da área de Saúde no Ocidente, desde a Idade Média até a atualidade. Para isso, voltamo-nos aos modelos de saúde que se estabeleceram historicamente, com o intuito de compreender as mudanças e a evolução do sistema de saúde que temos. Por fim, no Capítulo 4, traremos a importância do Sistema Único de Saúde (SUS), as suas ações e como se organizam os seus três campos de ação, bem como seus instrumentos e níveis de complexidade. Partindo desses aportes, acreditamos que o estudo da política de saúde no Brasil é fundamental para que possamos visualizar os direitos dos cidadãos, os quais são garantidos em nossa Constituição Federal, além de compreender a área do fazer profissional e o objeto de trabalho do Serviço Social. Dessa forma, você perceberá a importância dos profissionais da área, no papel de agentes mediadores para o acesso às políticas públicas em nossa sociedade. Formulação e implantação de políticas de saúde 9 1 Formulação e implantação de políticas de saúde A área de estudo das políticas públicas é de extrema relevância para todos os cidadãos brasileiros. Atos cotidianos, como o acesso aos bene- fícios da previdência social, aos programas de transferência de renda e até mesmo a participação nas campanhas de vacinação, são exemplos de políticas públicas às quais temos acesso. Note que as políticas públicas estão presentes em diversos espaços do nosso cotidiano. No entanto, embora possa parecer algo simples, falar de política pública é uma tarefa difícil, devido, sobretudo, à complexidade de estabelecermos uma única definição para esse conceito. Neste capítulo, apresentaremos a importância das políticas públicas para a sociedade, dando ênfase à construção da agenda política, da for- mulação e da implementação da política pública. Para tanto, traremos alguns conceitos importantes da área da socio- logia, como política, Estado e governo, para que possamos entender o contexto no qual se encontram inseridas as políticas públicas em nosso país. Identificaremos também as diferenças entre as políticas públicas, sociais, de Estado e as de governo.Ainda, aprenderemos sobre o exercí- cio profissional do assistente social na esfera das políticas públicas e nos espaços sócio-ocupacionais. O nosso estudo terá como base a Constituição Federal de 1988, que consagra os elementos constitutivos do Estado e apresenta os direitos e os deveres fundamentais de cada cidadão. Neste capítulo, você terá a oportunidade de se debruçar sobre uma temática essencial ao fazer profissional e ao objeto de trabalho do Serviço Social e compreenderá a importância dos profissionais dessa área como agentes mediadores para o acesso às políticas públicas em nossa sociedade. 10 Política de Saúde e Proteção Social no Brasil 1.1 Contextualizando a política pública Vídeo Ao abordar as políticas públicas em saúde, é necessário compreen- dermos o significado de política e de políticas públicas. Além disso, pre- cisamos entender os contextos históricos, políticos e sociais em que elas estão inseridas. Sabemos que as sociedades humanas não são estáticas e que suas realidades sempre foram objeto de estudo dos cientistas ao longo do tempo. Nesse sentido, é fundamental que percebamos que as ações dos indivíduos em sociedade são influenciadas pelos diversos aconte- cimentos históricos que, por mais que pareçam distantes, no que se refere ao tempo, influenciam de maneira decisiva a vida cotidiana. É nessa esteira que surgem os intelectuais, filósofos, teóricos e cien- tistas sociais que auxiliam o desenvolvimento da ciência e nos fornecem elementos para a interpretação e o entendimento do mundo e da rea- lidade social. Todavia, no que diz respeito especificamente às políticas públicas, quando esses intelectuais e teóricos iniciaram os seus estudos? No Brasil, os estudos sobre o tema datam apenas do fim dos anos 1970, com a publicação de trabalhos sobre a formação e a história das policies 1 , analisando criticamente a política e as suas relações com a ci- dadania, a cultura política e o financiamento estatal. Porém, os estudos sobre a política e o papel do Estado já existiam. Tanto política quanto política pública são termos que estão presen- tes nos telejornais, nas redes sociais e até mesmo nas conversas entre amigos. Certamente, você já debateu essas temáticas com alguém. En- tão, quando falamos em política, qual palavra vem à sua mente? Alguns mencionam política partidária e governo, outros associam à forma pejorativa com que os nossos representantes políticos fazem política, associando a palavra política à politicagem, desvirtuando o seu conceito. Há também uma tendência de não se interessar por política ou de se conversar a respeito apenas em época de eleições. Sk yP ic s St ud io /S hu tte rs to ck • Compreender o conceito de políticas públicas. • Conhecer a estrutura de uma política pública. Objetivos de aprendizagem Políticas no sentido con- creto do termo e exem- plificado pelos programas políticos. 1 Formulação e implantação de políticas de saúde 11 A verdade é que a maioria das pessoas tem uma interpretação equi- vocada sobre o significado de política. No entanto, ela está em nosso cotidiano quando, por exemplo, é necessária uma organização para a resolução de um problema político para o bem comum, ou seja, para o bem da sociedade. Já ao ouvirem o termo políticas públicas, as pessoas relacionam imediatamente com o governo. Ao falarmos em políticas públicas, devemos pensar no governo e no Estado em ação. Isso significa que todas as atividades partem do Estado e são executadas pelo governo. A Figura 1 sistematiza a relação existente entre o Estado, o governo e as políticas públicas. Figura 1 Relação entre o Estado, o governo e as políticas públicas Am m us /S hu tte rs to ck Estado Governo Políticas públicas Administrado por um grupo político Ações e decisões tomadas pelo governo Fonte: Elaborada pela autora. Política, Estado, governo, políticas públicas; afinal, qual o significado desses termos e como eles se inter-relacionam? Vamos lá! A palavra política é originada de pólis (politikós), que significa cidade (urbano, civil, público). O termo política tem origem na Grécia Antiga e expandiu-se por meio da obra de Aristóteles, intitulada Política. Confor- me Dias e Matos (2012, p. 1), “na perspectiva clássica, o termo política é habitualmente empregado para indicar a atividade ou conjunto de atividades que tem de algum modo, como referência, o Estado”. É importante ressaltarmos que definir política em um único concei- to é muito difícil, pois envolve variações de perspectiva, cultura e in- tenções. A política, compreendida como atividade ou práxis humana, relaciona-se de maneira direta ao poder. Nessa perspectiva, o poder político se refere ao poder de um ser humano sobre outro, que pode ser expresso na relação entre governantes e governados, soberano e súdi- tos, Estado e cidadãos, entre autoridade e obediência (BOBBIO, 1998). A sua finalidade ou o seu fim não pode ser resumido em um úni- co aspecto, já que os fins da política são tantos quantas forem as me- E você, como se posiciona a esse respeito? Qual a importância da política? Você já parou para pensar como as políticas públicas afetam a sua vida? Para refletir 12 Política de Saúde e Proteção Social no Brasil tas e os objetivos que um grupo se propõe a atingir em determinado momento histórico (BOBBIO, 1998). Dessa forma, as relações políticas nunca são neutras, por expressarem concepções diferentes sobre a ideia de indivíduo, mundo e sociedade. É na relação entre o Estado e a sociedade que encontramos a ma- terialização da política. Assim, quando buscamos entender a política, é essencial compreendermos essa relação. Nela, duas categorias que mencionamos anteriormente são importantes – Estado e governo –, as quais estudaremos a partir de agora. A palavra Estado deriva do grego polis, que significa cidade-Estado. Ao longo da história, a instituição Estado passou por várias modifica- ções e adquiriu diversos conceitos, apenas na Modernidade tendo ob- tido o conceito que conhecemos na atualidade. Há uma infinidade de conceitos para Estado; de modo geral, pode- mos dizer que consiste na organização política e jurídica de uma so- ciedade, e que é constituído pelo povo, território e por um governo soberano. São esses os elementos essenciais para a existência do Esta- do, conforme ilustrado na figura a seguir. Figura 2 Elementos constitutivos do Estado Estado Povo Território Soberania Governo Conjunto humano de uma ordem estatal sujeito às mesmas leis. Área pertencente ao Estado onde sua ordem jurídica é validada e exercida. Poder do Estado manifestado por meio das leis. Grupo ou indivíduo que assume o controle do Estado por determinado período. Am m us /S hu tte rs to ck Fonte: Elaborada pela autora. No caso brasileiro, esses elementos, a organização e a estrutura do Estado estão presentes na Constituição Federal de 1988, mais preci- samente no seu artigo 1º: “a República Federativa do Brasil, formada Formulação e implantação de políticas de saúde 13 pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito” (BRASIL, 1988). No que se refere aos fins imediatos do Estado, podemos listar a segurança, a justiça e o bem-estar social e econômico do grupo social que representa. A garantia desses fins ocorre por meio de suas funções legislativa, executiva e judiciária. • Função legislativa: corresponde à elaboração de leis. • Função executiva ou administrativa: responsável pela execu- ção das leis e satisfação das necessidades coletivas. • Função judiciária: garante a resolução de conflitos e a punição da violação das leis. Conforme as funções apresentadas, percebemos que o Estado é composto de instituições e poderes que têm por finalidade regular e or- ganizar o funcionamento de uma sociedade (órgãos legislativos, tribu- nais, exército etc.). Essa finalidade é refletida em leis, projetos e ações. O grupo ouindivíduo que assume o controle do Estado por determi- nado período com um conjunto de programas e projetos que parte da sociedade (políticos, técnicos, organismos da sociedade civil e outros) propõe é denominado governo. Esse conjunto de programas e projetos configura a sua orientação política (HÖFLING, 2001). No Brasil, atualmente, o Estado é governado de maneira democrá- tica. Vejamos na figura a seguir a representação do processo democrá- tico em nosso país. Figura 3 Processo democrático no Brasil Am m us /S hu tte rs to ck Fonte: Elaborada pela autora. Democracia Conjunto mínimo de regras, leis e instituições para governantes e governados. É um regime político e um modo de convivência. Por isso, envolve atitudes, comportamentos e uma concepção moral. Envolve participação da sociedade civil. Os governantes devem representar efetivamente os eleitores. Princípios Igualdade e liberdade. Procedimentos Império da lei, divisão de poderes, participação popular, obrigação dos governantes de prestar contas de sua ação etc. Resultados Extensão da cidadania, objetivo dos gastos públicos, diminuição das desigualdades etc. 14 Política de Saúde e Proteção Social no Brasil Na esfera desse processo democrático e com a participação dos mais diversos atores sociais, é fundamental que você saiba que o Estado tem como princípio e primeira de suas ações promover a digni- dade para as pessoas por meio do acesso às suas necessidades bási- cas. Para isso, tem-se as três esferas de poder, relacionadas às funções que já mencionamos. Afinal, como as políticas públicas estão inseridas nesse contexto? É no interior do Estado que as políticas públicas são criadas, pen- sadas e estruturadas. O Estado nem sempre existiu, seu nascimento é produto da divisão social do trabalho. No interior de uma democracia, a definição das políticas públicas está relacionada a um processo deci- sório que envolve conflitos de interesse. Em outras palavras, a sociedade é composta de diversos grupos e segmentos políticos; cada um com as suas ideias, ideologias e visões de mundo. São esses grupos que estão a todo momento debatendo como o Estado e o governo devem agir no que se refere às políticas públicas. Podemos dizer, então, que a política pública é originária de um conflito de interesse. Qual é o conceito de políticas públicas? Como vimos, o conceito de política é bastante amplo. Para abordar as ações de organização e administração da nossa sociedade, é neces- sário utilizarmos o termo políticas públicas. Portanto, nesse aspecto, relacionamos políticas públicas a uma concepção mais administrativa da política. Podemos dizer que a política pública diz respeito a um conjunto de projetos e programas de atividades governamentais que “passam, assim, a serem constituídas a partir das contribuições e da interação entre diversos atores num espaço sociopolítico, com regras e dinâmi- cas próprias” (AMORIN; BOULLOSA, 2013, p. 62). Perceba que as políticas públicas correspondem às soluções espe- cíficas que têm por finalidade atender às necessidades da sociedade. A política pública, portanto, é aquilo que o governo decide executar; materializada em um programa que beneficia um bairro ou na parti- cipação de um indivíduo em um programa de redistribuição de renda, por exemplo. Por isso, é extremamente importante para nós, cidadãos, uma vez que interfere diretamente em nossas vidas. A legislação brasileira não apresenta um conceito estabelecido de política pública. Também na esfera governamental, que é responsável pela for- mulação, implementação, monitoramento e execu- ção, há uma imprecisão conceitual a respeito da expressão políticas públi- cas (HERINGER, 2018). Importante Formulação e implantação de políticas de saúde 15 Na literatura, a assertiva que melhor sintetiza o conceito das polí- ticas públicas é o de Teixeira (2002, p. 2), que afirma que as políticas públicas consistem em diferentes diretrizes, princípios norteadores de ação do poder público; re- gras e procedimentos para as relações entre poder público e so- ciedade, mediações entre atores da sociedade e do Estado. São, nesse caso, explicitadas, sistematizadas ou formuladas em do- cumentos (leis, programas, linhas de financiamento), orientam ações que normalmente envolvem aplicações de recursos públi- cos. Nem sempre, porém, há compatibilidade entre as interven- ções e declarações de vontade e as ações desenvolvidas. Como exemplo de política pública na área da saúde, temos o Siste- ma Único de Saúde (SUS), que tem a finalidade de oferecer cuidados de saúde à população brasileira. A Constituição Federal de 1988, mais pre- cisamente no artigo 196, afirma que “a saúde é direito de todos e de- ver do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação” (BRASIL, 1988). Como podemos observar, a saúde torna-se um direito de toda a po- pulação, sendo dever do Estado garantir o acesso ao sistema de saúde por meio de um sistema de saúde público, organizado, gerenciado e financiado com recursos públicos. O artigo Sistema Único de Saúde (SUS) aos 30 anos, de autoria de Jairnilson Silva Paim, apresenta estudos e perguntas sobre o SUS e seus 30 anos. O autor nos fornece uma análise dos aspectos positivos, dos obstáculos e das ameaças, entre outros pontos importantes, no decorrer desses anos de instituição. Vale muito a pena a leitura na íntegra e uma boa reflexão. Acesso em: 20 out. 2021. https://www.scielo.br/j/csc/a/Qg7SJFjWPjvdQjvnRzxS6Mg/?lang=pt&format=pdf Artigo Ao longo da existência do SUS, foram elaboradas diversas políticas nacionais, entre elas a de Atenção Básica e o Programa Saúde da Família. Embora possamos nos referir à saúde como política pública, pode- mos considerar que o direito à saúde, expresso na Constituição Fede- ral, e o SUS compreendem um conjunto integrado de políticas públicas específicas que objetivam a promoção da saúde. Dessa forma, são de- 16 Política de Saúde e Proteção Social no Brasil senvolvidas políticas de saúde destinadas aos diversos grupos popula- cionais, como indígenas, crianças, mulheres e homens. No fim do século XX, tivemos uma forte desregulamentação do pa- pel do Estado, o que ocasionou grande vulnerabilidade do país diante do capital e o esgotamento do Estado de bem-estar social apoiados na ideologia neoliberal. Nesse cenário, tivemos modificações das políticas públicas e políticas sociais. Afinal, o que são as políticas sociais e qual a sua relação com as políticas públicas? Vamos iniciar o debate sobre as políticas sociais e as políticas públicas, que são termos confundidos não só pelo senso comum, mas também por acadêmicos e profissionais. Ao longo desta seção, já conceituamos políticas públicas e vi- mos que não há uma uniformidade referente ao seu conceito. Para Clementino (2011), as pessoas têm dificuldade em diferenciar essas po- líticas, sendo tema de estudo de vários estudiosos das ciências sociais. As políticas sociais emergem das relações sociais ou da sociedade, mas ainda não têm um significado preciso. Já o termo políticas públicas é mais utilizado em todas as esferas – pública, privada ou terceiro setor –, e é facilmente confundido com políticas sociais. Note que as políticas públicas são muito mais amplas, enquanto as sociais são uma área im- portante das políticas públicas. A política social é uma modalidade de política pública. As políticas públicas estão asseguradas na Constituição Federal de 1988, como dever do Estado e direito assegurado a todos os cidadãos brasileiros, e se materializam em programas de Estado. Figura 4 Exemplos de políticas sociais Fonte: Elaborada pela autora. Políticas sociais Saúde Previdência Social Educação Assistência Social Am mu s/ Sh utt ers toc k Entre essas políticas, temos a saúde, a edu- cação, aAssistência Social e a Previdência Social, conforme apresentamos na Figura 4. Portanto, na Constituição Federal, foi regula- mentada e instruída a participação popular re- presentando organizações na criação de políticas sociais, monitorando as ações realizadas relati- vas à participação popular nos vários níveis de proteção social. Formulação e implantação de políticas de saúde 17 Para finalizar essa discussão sobre os conceitos das políticas públi- cas e políticas sociais, apresentamos uma citação de Souza (2006, p. 25), que afirma que as políticas públicas e as sociais “são campos multidis- ciplinares, e seu foco está nas explicações sobre a natureza da política pública e seus processos”. Agora, temos o seguinte questionamento: de que forma as políticas sociais se estabelecem como políticas públicas? Elas se estabelecem como políticas públicas por meio das pensões de governo, dos benefícios sociais, do seguro-desemprego, da Lei de Cotas, dos programas de transferência de renda etc. Contudo, como ocorre a participação popular? Saiba que a participação popular é de total relevância para que possamos ter a afirmação da democracia. Dessa forma, os cida- dãos estão aptos para avaliar as execuções e ações dos poderes públi- co e privado. A gestão dessa política deve ser ágil e flexível de modo a permitir a participação social no âmbito do controle social. Assim, se coloca à disposição da sociedade ações democráticas e descentraliza- das que fortalecem a participação popular. Podemos exemplificar a participação popular com a política pública de Assistência Social, que tem os conselhos como controle social. Os conse- lhos são instâncias deliberativas de caráter permanente e são paritários, constituídos por 50% de representantes do governo e 50% pela socie- dade civil organizada, usuários do Sistema Único de Assistência Social (SUAS), organização dos serviços dos trabalhadores da área. A finalidade dos conselhos é fiscalizar e deliberar a execução dos serviços que são prestados à população por meio das políticas públicas. Logo, as políticas públicas devem permanecer na agenda do governo, e não apenas com o propósito de finalidade de oportunidade política. Nesse cenário apresentado, temos a profissão de Serviço Social, que se debruça nos estudos das políticas sociais em uma perspectiva micro, dando ênfase aos programas de governo. Nessa esfera, a particularida- de do Serviço Social ocorre no enfrentamento às múltiplas expressões da questão social. O Serviço Social é uma das profissões mais relacionadas às políti- cas públicas, pois é aquela que tem a competência de gerenciamento das políticas públicas e sociais com o objetivo de solucionar e amenizar as situações de vulnerabilidade social. Ou seja, a profissão de Serviço As políticas sociais nos re- metem aos direitos sociais assegurados na Constitui- ção de 1988. Sugerimos a leitura do Capítulo II da Constituição, que trata especificamente dos di- reitos sociais. No entanto, é importante termos em mente que eles permeiam diversos artigos do texto constitucional. Disponível em: http://www. planalto.gov.br/ccivil_03/ constituicao/constituicao.htm. Acesso em: 21 out. 2021. Leitura http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm 18 Política de Saúde e Proteção Social no Brasil Social atua no desenvolvimento das ações das políticas sociais, tendo como responsabilidade compreender a sua aplicabilidade como possi- bilidade de enfrentamento aos desafios contemporâneos no contexto no qual estamos inseridos. Assim, estudar e compreender a importância das políticas públicas e políticas sociais é de suma relevância para a sua formação profissio- nal, pois lhe dará a oportunidade de refletir, identificar as compe- tências profissionais e mergulhar nos desafios impostos ao exercício profissional. 1.2 Etapas para a formulação de uma política pública Vídeo Políticas públicas é termo multidisciplinar e está estruturado na so- ciedade de diferentes formas. Então, ao abordar as políticas públicas, é importante compreendermos o que significa público e, consequen- temente, as relações e diferenças entre o público e privado. Vamos lá! De acordo com Santos (2012, p. 4), “público é tudo aquilo que não pertence a um indivíduo ou grupo em particular, mas, antes, é pro- priedade de toda a coletividade”. Ainda segundo o autor, é importante diferenciar o que são políticas de Estado e políticas de governo. Estas referem-se a planos, programas e ações elaboradas e desenvolvidas para vigorar durante o mandato de determinado governo ou represen- tante político de um partido; muitas vezes, estão associadas aos proje- tos eleitorais como instrumentos de propaganda política. Já as políticas de Estado são planos, programas e ações que não se limitam a determinado governo ou mandato político. Elas apresentam objetivos a longo prazo, iniciam-se sempre como política de governo, porém são incorporadas à estrutura do Estado, ultrapassando as tran- sições entre governos. No âmbito governamental, são caracterizadas pelas áreas de atua- ção, como a política de educação, saúde, assistência social, entre outras. Devem ser geradas na esfera do Estado e ter como objetivo atender às necessidades de toda a sociedade ou parte dela, sempre com foco no bem comum. Identificar as etapas para a formulação de uma política pública. Objetivo de aprendizagem Formulação e implantação de políticas de saúde 19 Nosso foco será o conteúdo das políticas públicas de saúde, a forma com que elas têm sido desenhadas nas últimas décadas, seus avan- ços e desafios. No entanto, sem deixar de contextualizá-las para com- preensão dos meandros que as permeiam. Como mencionamos, há alguns modelos explicativos de formulação e análise de políticas públicas, desenvolvidos para possibilitar o melhor entendimento do porquê e como os governos fazem ou deixam de fa- zer determinadas políticas públicas. Apresentaremos aqui apenas os principais, de acordo com o quadro a seguir. Quadro 1 Modelos de formulação e análise de políticas públicas Tipo da política pública Cada tipo de política pública encontra diferentes for-mas de apoio e rejeição (LOWI, 1972). Incrementalismo Os recursos governamentais para um programa ou po- lítica pública não partem do zero, mas de decisões in- crementais que desconsideram mudanças políticas nos programas governamentais (LINDBLOM, 1979; CAIDEN; WILDAVSKY, 1980; WILDAVSKY, 1992). Ciclo da política pública Política pública como um ciclo deliberativo formado por vários estágios. Modelo garbage can (lata de lixo) Escolhas de políticas públicas são feitas como se as al- ternativas estivessem na lata de lixo. Coalizão de defesa A política pública deve ser concebida como um conjun- to de subsistemas relativamente estáveis que se articu- lam em prol dos recursos de cada política pública. Arenas sociais Política pública como uma iniciativa dos empreendedo-res políticos. Modelo do equilíbrio interrompido Política pública caracterizada pela alternância entre lon- gos períodos de estabilidade e instabilidade que geram mudanças nas políticas anteriores. Modelos influenciados pelo gerencialismo públi- co e pelo ajuste fiscal A eficiência passou a ser vista como o principal objetivo de qualquer política pública. Fonte: Adaptado de Souza, 2007. Com base no Quadro 1 e de acordo com Souza (2007, p. 80) sobre as políticas públicas, podemos afirmar: 20 Política de Saúde e Proteção Social no Brasil • A política pública permite distinguir entre o que o governo pre- tende fazer e o que, de fato, faz. • A política pública é abrangente e não se limita a leis e regras. • A política pública é uma ação intencional, com objetivos a serem alcançados. • A política pública, embora tenha impactos a curto prazo, é uma política de longo prazo. • A política pública envolveprocessos subsequentes após sua deci- são e proposição, ou seja, implica também implementação, exe- cução e avaliação. • Estudos sobre política pública propriamente dita focalizam pro- cessos, atores e a construção de regras, distinguindo-se dos estu- dos sobre política social, cujo foco está nas consequências e nos resultados da política. • A política pública envolve vários atores e níveis de decisão, em- bora seja materializada nos governos, e não necessariamente se restringe a participantes formais, já que os informais são tam- bém importantes. Ademais, de acordo com a citação anterior, podemos inferir que as políticas públicas integram a própria política, a sociedade e as institui- ções. Dessa forma, concluímos que a política pública visa corrigir o pro- blema identificado por meio das instituições que irão implementá-la. Já Capella (2007) apresenta e discute modelos teóricos que au- xiliam na compreensão do processo de formulação de políticas públicas, privilegiando em suas análises a formação da agenda de políticas governamentais. Em seus estudos, avalia como um proble- ma é levado para a agenda governamental e, assim, transformado em política pública. No entanto, em virtude da complexidade de questões que se apresentam, nem todas elas se transformarão em políticas públicas. Ou seja, apenas alguns desses problemas farão parte da agenda governamental em um momento. É válido ressaltarmos que nem todas as questões percebidas são identificadas como problemas e entram na agenda governamental para serem políticas públicas. Entretanto, quando essas questões têm da- dos quantitativos atrelados a elas, demonstrando a existência de uma situação concreta, passam a demandar a atenção do Poder Público. Por que alguns problemas que vemos em nossa sociedade recebem maior atenção do que outros? Formulação e implantação de políticas de saúde 21 A resposta é a seguinte: alguns atores sociais são influentes na defi- nição da agenda governamental. Um deles é o presidente da república e os indivíduos nomeados por ele como ministros e secretários. Outro grupo é o Poder Legislativo, uma vez que, além de exercer grande in- fluência sobre a agenda, dispõe de recursos e autoridade legal para a produção de leis. Atrelado ao legislativo, temos os partidos políticos, por meio dos seus programas de governo. Não esquecendo também da mídia, que é considerada um instrumento na formulação da agenda, da opinião pública e dos atores invisíveis, como acadêmicos, pesquisa- dores e consultores da temática. A elaboração das políticas se dá em três etapas, são elas: formula- ção, implementação e avaliação, ilustradas na figura a seguir. Figura 5 Etapas do processo de elaboração de políticas públicas Fonte: Dagnino et al., 2002, p. 203. Identificação do problema e conversão Avaliação Implementação Formulação Descrição dos objetivos e estratégias da ação governamental Formulação da ação, alternativas e resultados esperados Uma política pública exige um ciclo que se inicia com o problema e termina com a sua avaliação e, se não mais necessária, sua extinção. O ciclo de políticas públicas é composto das etapas a seguir. 22 Política de Saúde e Proteção Social no Brasil Figura 6 Ciclo de políticas públicas Problema Agenda Formulação Tomada de decisão ImplementaçãoMonitoramento Avaliação Abert/Shutterstock Fonte: Elaborada pela autora. Note que toda política pública parte de um problema ou neces- sidade pública que afeta o bem comum ou de um grupo. Os pro- blemas que demandam políticas públicas são originários de crises ou de indicadores de necessidades de ações. A partir daí, temos o surgimento da agenda. Mas como uma ideia entra no processo político? A agenda está ligada ao que o governo e a sociedade estão or- ganizados para enfrentar e faz parte de um planejamento. Ela é constituída por temáticas que chamam a atenção do governo e da sociedade civil. Essa agenda é classificada em três tipos: não governamental (temáticas relevantes para a opinião pública, mas que não são para o governo), governamental (problemas e te- máticas que chamam a atenção do governo e de autoridades) e Formulação e implantação de políticas de saúde 23 agenda de decisão (lista dos problemas a serem decididos) (SILVA; MELO, 2000). Após a apresentação dessas demandas, o governo, criador das políticas, selecionará o que será atendido. Ou seja, esses interesses da sociedade precisam ser reconhecidos por autoridades dos três poderes – Executivo, Legislativo e Judiciário. Essa ideia se transforma em uma política pública em um pro- cesso chamado de formulação, etapa da definição dos objetivos e das estratégias de ação governamental com a finalidade de tornar uma temática em política pública. A formulação envolve, portanto, o processo decisório e as relações entre o executivo e o legislativo; este tem um papel fundamental na formulação de políticas públi- cas, sobretudo dentro da produção da base legal da produção de leis que sairão do papel e entrarão em execução. Na sequência, temos a implementação das políticas públicas que, já formuladas e com recurso orçamentário, são executadas. Vamos estudar sobre a implementação na seção a seguir. 1.3 Implementação e avaliação de políticas públicas Vídeo As políticas públicas são implementadas na sociedade de di- ferentes formas, de acordo com os objetivos e as necessidades. Vários autores estudaram os conceitos das políticas públicas e identificaram os impactos, os atores sociais envolvidos, as soluções e para quem elas se destinam. Esses estudos deram origem à tipo- logia das políticas públicas, que foram agrupadas conforme as suas características semelhantes. Essa tipologia serve como guia para embasar as análises sobre a política pública, para realizar comparações, refletir sobre a rea- lidade, analisá-la e, dessa forma, ter elementos para interferir na realidade. Os tipos de políticas públicas são: distributivas, redistributivas, regulatórias e constitutivas. Vejamos as definições no Quadro 2. Compreender como as políticas públicas são implementadas. Objetivo de aprendizagem 24 Política de Saúde e Proteção Social no Brasil Quadro 2 Tipologia das políticas públicas Tipo Característica Exemplo Políticas distributivas Políticas públicas que visam distri- buir recursos e serviços que privile- giam determinados grupos sociais ou regiões em detrimento do todo. Políticas de afirmação (cotas raciais ou bolsas estudantis destinadas a grupos específicos). Políticas redistributivas Políticas públicas que privilegiam maior número de pessoas, que re- distribui bens, serviços ou recursos à população. As chamadas políticas sociais universais. Sistema tributário, siste- ma previdenciário, política de financiamento educa- cional. Políticas regulatórias Políticas públicas que estabelecem regras para padrões de comporta- mento e tomam a forma de leis. Regulações do trânsito, Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB). Políticas constitutivas Políticas públicas que estabelecem as “regras do jogo”, por quem e quando as políticas públicas podem ser criadas. A distribuição de respon- sabilidade entre municí- pios, estados e governo federal. Fonte: Elaborado pela autora com base em Teixeira, 2002. O estudo das políticas públicas existentes no Brasil proporciona a compreensão das ações governamentais e da estrutura das políticas pú- blicas e como elas atingem a vida cotidiana dos cidadãos e da sociedade. Figura 7 Tipos de políticas públicas Fonte: Elaborada pela autora. Políticas públicas Políticas educacionais Políticas ambientais Políticas de saúde Políticas de segurança pública ss Am mu s/S hu tte rsto ck Formulação e implantação de políticas de saúde 25 Os atores presentes nas políticas públicas, como mostra Caldas (2008), podem ser divididos em públicos e privados. Os públicos podem ser de caráter estatal ou não estatal, enquanto os privados es- tão ligados às organizaçõessociais, à imprensa e às empresas privadas, entre outros setores. Inicialmente, na fase de percepção e definição do problema, este pode ser identificado por qualquer um dos atores das políticas pú- blicas. Após a sua identificação e definição, tem-se a sua inserção na agenda política. A partir daí é que, possivelmente, ele será definido como assunto de teor político e público. A fase de agenda configura-se por uma análise preliminar, como já explicamos, que definirá a inserção do problema como pauta política e administrativa ou o deslocamento para data posterior (FREY, 2000). No que tange à fase de elaboração de programas e decisão, há a escolha da melhor alternativa para a solução do problema (FREY, 2000; SARAVIA, 2006). A implementação pode ser definida como “aquela em que regras, rotinas e processos sociais são convertidos de intenções em ações.” (SECCHI, 2013, p. 55). Nessa fase, há a concretização e a análise dos aspectos e das alternativas implantadas. Já para Menicucci e Gontijo (2017), o sucesso da implementação está associado à convergência entre os agentes implementadores em torno dos objetivos da política. As políticas públicas são dinâmicas e se alteram de acordo com os contextos históricos, a agenda governamental e a pressão da socie- dade. Com relação à implementação da reforma da política de saúde no Brasil, é válido mencionarmos que ela foi definida na Constituição Federal de 1988, e ainda hoje está em processo de formulação. Um exemplo evidente dessa dinâmica são os programas de saúde relacio- nados ao SUS, que são criados, extintos e reformulados. Podemos inferir que os processos de política de saúde vigentes se distanciam da concepção de implementação dos seus formuladores iniciais. Ainda, é importante mencionarmos que temos, nessa imple- mentação e formulação, a lógica pública e a privada. A primeira viabili- zada pelo SUS; e a segunda na perspectiva de ampliação da cobertura dos planos e seguros saúde. Temos, portanto, um sistema de saúde dual em nossa sociedade. 26 Política de Saúde e Proteção Social no Brasil Todo plano e projeto devem ser monitorados e avaliados. Monitora- dos com relação aos objetivos e às metas a serem alcançados, ou seja, tudo o que foi planejado está sendo desenvolvido como previsto? Esse é o momento de identificar imprevistos e corrigi-los para que os resul- tados esperados sejam alcançados. A etapa da avaliação deve ser um processo durante todas as fases do ciclo, analisando todas as mudanças e impactos na sociedade pelas ações e posturas adotadas e os resultados alcançados. A fase de avaliação e eventual correção é descrita por Raeder (2014, p. 135) como aquela que pode estar “embasada por diagnósticos que verifiquem os impactos das ações empreendidas, fornecendo aos exe- cutores das ações recursos informacionais preciosos para formação de quadros ou ajustes de rotas nos projetos”. É importante sabermos que essa fase fornece elementos essenciais para avaliar a eficácia da política na sociedade. Ademais, cabe a esta a responsabilidade de dar início a um novo ciclo, o qual estará voltado para a resolução de problemas que ainda não foram resolvidos. A expectativa é que essa fase indique uma solução para as questões ou pendências persistentes que a política pública almejava resolver. Por fim, as políticas públicas não devem ser pensadas e planeja- das apenas por um governo, mas serem construídas em um processo democrático, garantindo as necessidades da grande maioria, principal- mente dos que mais precisam, garantindo o bem comum. Assim, compreendermos o que é política e políticas públicas é ne- cessário para uma atuação cidadã crítica, ativa e participativa em todos os setores da sociedade. CONSIDERAÇÕES FINAIS Neste capítulo, realizamos uma apresentação dos mais diversos con- ceitos sobre política pública. Vimos que não há uma conformidade entre os estudiosos no que se refere às políticas públicas. Para o entendimento do significado e da importância das políticas pú- blicas, fez-se necessário relembrarmos alguns conceitos das ciências so- ciais, como política, governo e Estado. Você deve ter percebido que as políticas públicas e as sociais são dis- tintas, mas se entrecruzam em alguns momentos. Para isso, identifica- Formulação e implantação de políticas de saúde 27 mos artigos na Constituição Federal que tratam dos direitos sociais e dos elementos constitutivos do Estado. Para concluir, abordamos os mais di- versos aspectos relativos à formulação e à implementação das políticas públicas. É válido mencionarmos que apresentamos a relação do Serviço Social com as políticas públicas e as sociais. Por fim, saiba que você adquiriu co- nhecimentos sobre uma temática essencial para a sua formação de modo a desenvolver as suas competências profissionais. Esperamos que você tenha compreendido a importância das políticas públicas para a sociedade brasileira. ATIVIDADES Atividade 1 Os conceitos de Estado e de governo são diferentes, assim como as formas de se fazer política de cada uma dessas esferas. Com base nas informações anteriores, diferencie política de Estado e política de governo. Atividade 2 Vários autores estudam os conceitos de políticas públicas, os atores sociais envolvidos e as soluções para a sua materialização. Diante disso, pontue a importância de estudarmos as políticas públicas brasileiras. Atividade 3 Ao longo deste capítulo, vimos que conceituar política pública é uma tarefa difícil, pois vários autores a conceituaram e a estu- daram ao longo dos anos. Além disso, há diversos modelos de análise, formulação e tipologias. Diante do que foi estudado neste capítulo, conceitue política pública e relacione a importância de termos informações sobre ela como profissionais do Serviço Social. REFERÊNCIAS AMORIN, S.; BOULLOSA, R. O estudo dos instrumentos de políticas públicas: uma agenda em aberto para experiências de migração de escala. Amazônia, Organizações e Sustentabilidade, Belém, v. 2, n. 1, p. 59-69, jan./jun. 2013. Disponível em: http://revistas. unama.br/index.php/aos/article/download/52/pdf. Acesso em: 20 out. 2021. BOBBIO, N. Dicionário de política. Brasília: Ed. UnB, 1998. http://revistas.unama.br/index.php/aos/article/download/52/pdf http://revistas.unama.br/index.php/aos/article/download/52/pdf 28 Política de Saúde e Proteção Social no Brasil BRASIL. Constituição Federal (1988). Diário Oficial da União, Poder Legislativo, Brasília, DF, 5 out. 1988. 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Construção histórica essa marcada por profundas desigualdades sociais e econômicas e por ra- cismo estrutural, que se perpetuam até a atualidade. Além disso, não podemos dissociar a evolução da saúde enquanto política pública das determinações do capitalismo a nível mundial. Em contraponto a essa herança e contexto, surge, na época da rede- mocratização do país, o Movimento da Reforma Sanitária, que contribuiu de maneira bastante significativa para que tivéssemos a efetivação do Sistema Único de Saúde (SUS), tão conhecido por nós. Nas páginas seguintes, apresentaremos, de maneira linear, a história da saúde pública em nosso país, desde a sua fundação, como Colônia portuguesa, passando pelo seu desenvolvimento, com a instauração da República, e avançando sobre o século XX, quando a saúde brasileira ganhou complexidade e, com o passar das décadas, tornou-se política pública e direito de todos. Por fim, nos debruçaremos sobre a contempo- raneidade e os desafios impostos pela Pandemia de Covid-19. 2.1 Da colonização ao império Vídeo Para que possamos caracterizar as atividades de saúde pública no período compreendido entre a colonização e o império, é essencial que façamos um resgate histórico da chegada dos portugueses em terras brasileiras. Porém, esse resgate partirá de uma perspectiva crítica e de uma análise dos acontecimentos, já que somos todos conhecedores da nossa história. Sabemos que a efetiva colonização do atual território brasileiro por parte da Coroa portuguesa foi uma tanto quanto tardia, levando em consideração que a esquadra de Cabral aportou na costa da atual Conhecer as atividades de saúde pública da coloniza- ção ao império. Objetivo de aprendizagem 30 Política de Saúde e Proteção Social no Brasil Bahia, em 1500, e que a real ocupação das terras ocorreu somente após a criação da vila de São Vicente, em 1532. Os historiadores nos contam que esse hiato se deve aos outros inte- resses imediatos de Portugal, que estariam direcionados ao comércio de especiarias com as Índias – que englobava os territórios ultramari- nos portugueses no sul da Ásia – e ao fato de não ter encontrado o tão esperado ouro nas terras brasileiras. De qualquer maneira, mesmo antes de um estabelecimento mais estruturado, diversas expedições lusitanas percorreram a costa bra- sileira entre 1500 e 1632, praticando a conhecida exploração de pau-brasil. Essa árvore, tão cobiçada pela qualidade da sua madeira e da sua tinta, representou o primeiro grande assalto ao bioma da então enorme Mata Atlântica e aos corpos dos povos originários, chamados pelos europeus, equivocadamente, de índios. Os acordos entre os portugueses e os povos que viviam no litoral da Terra de Santa Cruz se deram na forma de escambo: um “contrato”, em que os europeus pagavam pelo trabalho dos nativos com objetos, geralmente feitos de metais. Para os povos como os Tupinambás, que não manipulavam o ferro, eram ferramentas valiosas um facão, um machado e uma faca. Por outro lado, se o contato entre europeus e indígenas, por muitas vezes, foi pacífico e profícuo para ambas as partes, expôs, por outro lado, as comunidades nativas da América a uma série de enfermida- des desconhecidas. Entretanto, nem por isso os conquistadores fica- ram imunes a doenças inéditas no Velho Mundo. Como bem destacou Oliveira (2012, p. 32), com a chegada dos portugueses à Terra de Santa Cruz, um mundo novo e desafiante se formava em relação às enfermi- dades. Aqui, juntaram-se à malária, doença tropical, até então desconhecida para os europeus, aquelas trazidas pelos coloniza- dores, como peste bubônica, cólera e varíola e, posteriormente, com a chegada dos africanos, a filariose e a febre amarela. Um cenário preocupante foi-se desenhando, pois era frágil o conhe- cimento acerca da transmissão e do controle ou tratamento dessas novas doenças. Não foi somente a diversidade de doenças que resultou do conta- to entre esses povos desconhecidos. Uma infinidade de tratamentos, decorrente tanto da cultura indígena quanto da cultura conquistadora, História das políticas públicas de saúde no Brasil 31 emerge como possibilidade de salvação para as chagas inusitadas a que todos estavam expostos. Como agentes de saúde não oficiais, podemos destacar os padres jesuítas, membros da Companhia de Jesus. Com o claro objetivo de ca- tequizar os nativos do Novo Mundo, criaram diversas missões jesuíti- cas, que se espalharam pela região amazônica, pelo Pantanal e pelos Campos do Sul. Nas missões – verdadeiros centros doutrinadores –, a atenção à saúde, pela parte dos jesuítas, foi intensa, bem como o seu aprendizado de ervas e de plantas medicinais com os indígenas. A única política do Estado ultramarino português voltada à saúde foi a criação do cargo de cirurgião-mor das províncias – o que parece ter surti- do pouco efeito. Os povos que aqui viviam estabeleceram as suas pró- prias alternativas e estratégias de sobrevivência, lançando-se aosfeitiços, às rezas e às ervas medicinais dos pajés, e, ainda, às sangrias dos práti- cos e dos barbeiros que vinham da metrópole, os quais, normalmente, faziam as vezes dos inexistentes dentistas (OLIVEIRA, 2012). Após o início do cultivo da cana-de-açúcar, foi introduzida a mão de obra dos nativos de origem africana, arrancados de seus países e de suas famílias, obrigados a mudar de nome, de religião e de língua na frente dos feitores, e subjugados a um regime de trabalho extenuante, a um terrível regime alimentar e a duros castigos corporais. Além de todas as penas físicas e psicológicas, os africanos escravizados costu- mavam ser acometidos por sérios problemas respiratórios, devido à manutenção de fogueiras acesas no interior de suas moradias – as senzalas –, que eram desprovidas de janelas. É válido mencionar que, ainda no período colonial, tivemos a cria- ção das Santas Casas de Misericórdia, em 1543, as quais foram imple- mentadas em diversos estados do Brasil, com a missão de tratar e dar sustento aos enfermos e inválidos, como também de cuidar dos recém-nascidos que passaram a ser abandonados na instituição. Elas tinham um caráter beneficente e podem ser consideradas as primeiras formas de proteção social em nosso país. Já no século XVII, uma grave epidemia de sarampo assustou os mo- radores da Colônia, que teve sua população reduzida drasticamente. Nesse sentido, o Governo-Geral estabeleceu uma série de medidas, nas vilas litorâneas, na tentativa de conter a doença. As cidades portuá- rias passaram por alguns cuidados de saneamento e de proteção: os 32 Política de Saúde e Proteção Social no Brasil viajantes eram submetidos a quarentenas, e a qualidade dos gêneros alimentícios passou a ter certo tipo de controle, a fim de mitigar as mo- léstias (BAPTISTA, 2007). A situação da saúde no Brasil era tão precária que, no ano em que estourou a Revolução Francesa (1789), existiam, na capital da Colônia – o Rio de Janeiro –, apenas quatro médicos profissionais, os quais atendiam a pacientes de diversas cidades da região e de outras pro- víncias, como São Paulo. Nesse contexto, os boticários acabavam por prescrever medicamentos e receitar tratamentos, como acontece até os dias de hoje em alguns recantos do país, em que muitos farmacêuti- cos suprem a demanda por médicos (POLIGNANO, 2015). Esse cenário de escassez de médicos era fruto da ausência de polí- ticas educacionais, o que obrigava os filhos das elites a rumarem para a Europa, a fim de realizarem seus estudos, geralmente em Coimbra e Paris. Esse contexto só foi alterado com os abalos da revolução que assolava o Velho Mundo e, sobretudo, após a invasão napoleônica a Portugal, que fez com que a família real se refugiasse na Colônia. Assim, em 1808, ao chegar ao Brasil, acompanhado de mais de 10 mil súditos, Dom João VI promoveu uma série de transformações, para que a Colônia se parecesse mais com Lisboa. Nesse sentido, o Rio de Janeiro, que passou a ser a primeira capital de um reino europeu fora da Europa, sofreu uma profunda reconfiguração urba- nística e cultural. Um jardim botânico foi criado para compilar a natureza de diversos continentes, ao passo que uma missão artística francesa, lidera- da por Jean-Baptiste Debret, foi incumbida de de- senvolver as artes em solo brasileiro. As ruas do centro da capital foram calçadas e re- ceberam iluminação a gás. Começou a se desenhar alguma preocupação mais concreta com o sanea- mento e a limpeza das ruas, que sofriam com um grave problema: os dejetos das famílias. Por costume ancestral, os excrementos familiares eram lançados dos penicos pelas janelas, o que gerava, inclusive, inúmeras brigas entre os vizinhos. Diversas vilas Figura 1 Retrato de Dom João VI, de Jean-Baptiste Debret. M us eu N ac io na l d e Be la s Ar te s/ W ik im ed ia C om m on s História das políticas públicas de saúde no Brasil 33 se preocuparam em regular esse costume, exigindo que as dejeções fossem armazenadas em potes grandes – conhecidos como onças –, para, posteriormente, serem esvaziados nos córregos e nas praias. Não sem razão, houve um grande desinteresse pelas praias até os anos 1920, visto que esses espaços eram tidos como verdadeiros lixões. Em 1808, foram fundados, na Bahia, o Colégio Médico-Cirúrgico, no Real Hospital Militar da Cidade de Salvador e, no Rio de Janeiro, a Escola de Cirurgia do Rio de Janeiro, anexa ao Real Hospital, e a Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro, por intervenção do médico pernambucano Correia Picanço (POLIGNANO, 2015). Certamente, o impacto da vinda da família real foi percebido na saúde dos fluminenses, além de transformar a cultura, a economia e o cenário urbanístico local. Era uma modernização há muito alme- jada e tornava mais concreto o acesso a bens que a humanidade vinha desenvolvendo. As primeiras iniciativas em saúde pública em nosso país datam da chegada da família real, como a criação da Junta Central de Higiene Pública e a Inspetoria de Saúde dos Portos, em que a assistência em saúde estava relacionada ao desenvolvimento de medidas de atenção aos doentes graves, como as internações. É importante ressaltar que as medidas para a melhoria da saúde da população nessa época não eram vistas exatamente como um direito, mas como atenção às exigências internacionais, já que a disseminação de doenças, em território brasileiro, prejudicava as relações de exportação. 2.2 A Primeira República (1889-1930) Vídeo O fim do século XIX trouxe ventos de mudança ao Brasil. O acordo das elites com o Império terminou com a assinatura da Lei Áurea, em 1888, contrariando o interesse das classes dominantes, que exigiam uma indenização pelos “bens” perdidos do Estado. Não por menos, um ano depois, D. Pedro II seguia rumo ao seu exílio na França, e o país ingressava, pelas mãos dos militares, no moderno regime republicano. Os ideais dos grupos políticos que encabeçaram a República vislumbravam a ordem e o progresso, lema da corrente filosófica positivista de Augusto Comte. Para os positivistas locais, como Rui Conhecer as principais ati- vidades de saúde ocorri- das na Primeira República. Objetivo de aprendizagem 34 Política de Saúde e Proteção Social no Brasil Barbosa, que desenharam o novo modelo político do país, os bacha- réis e os intelectuais deveriam conduzir a vida pública, já que possuíam as ferramentas necessárias para modernizar o país de acordo com os moldes da ciência. Pelo lado político, não foi bem isso que se sucedeu: o país caiu em disputas políticas alimentadas pelo coronelismo, como foi o caso da Revolução Federalista (1893-1895), verdadeira guerra civil no sul do país, que culminou em banhos de sangue e expôs as tensões entre os grupos políticos que disputavam o poder. Serviu, ainda, para de- monstrar o profundo abismo entre as elites urbanas do Sudeste e os povos excluídos e esquecidos, massacrados nos vergonhosos e desu- manos ataques da Guerra de Canudos (1896-1897) no Nordeste e da Guerra do Contestado (1912-1916) no Sul. Nesses conflitos, milhares de brasileiros descendentes de indígenas e de africanos, que não eram reconhecidos como parte da nação, foram exterminados. Nesse mesmo contexto, entre 1880 e 1920, o Estado brasileiro fi- nanciou a vinda de italianos, alemães, chineses e japoneses, que rece- biam terras e alguma estrutura para iniciar suas vidas nos trópicos – o que nunca aconteceu com indígenas e africanos, nutrindo o claro interesse de branqueamento da população. Consequentemente, o fluxo migratório de europeus e de asiáticos acelerou a difusão de doenças como varíola, malária, febre amarela, peste bubônica e, até mesmo, gripe espanhola. Como forma de combater esse cenário epidêmico, que assolou di- versas cidades litorâneas do país no início do século XX, Oswaldo Cruz foi alçado à função de diretor do Departamento Federal de Saúde Pú- blica, nomeado pelo Presidente Rodrigues Alves, no ano de 1903. Essa indicação foi uma formade reconhecimento das ações de Cruz no Instituto Soroterápico Federal, o qual, em 1918, foi re- batizado de Instituto Oswaldo Cruz. À frente do departamento federal, Oswaldo Cruz foi o idealizador do modelo de intervenções conhecido como campanhista ou sanitarista 1 de combate à febre amarela, executado por um exército de 1.500 agentes, e da vacinação compulsória contra a varíola, em 1904, que, em conjunto com uma Reforma Sanitária no centro do Rio de Janeiro, arrancou os Auguste Comte (1798-1857), filósofo francês fundador do po- sitivismo, acreditava que é importante o conheci- mento da realidade para entender o resultado das nossas ações e, a partir daí, melhorar a realidade. Saiba mais Figura 2 Oswaldo Cruz Lu fer om /W ikim edi a C omm ons Modelo assistencial em saúde caracterizado por campanhas sanitárias para combater epide- mias, implementação de programas de vacinação obrigatórias, desinfecção de espaços públicos e outras ações. 1 História das políticas públicas de saúde no Brasil 35 cortiços das áreas centrais e invadiu as casas da população mais pobre, vacinando os cariocas à força com ajuda policial. A reação popular tomou a forma da conhecida Revolta da Vacina, quando a capital federal ficou em estado de motim, entre 10 e 16 de novembro de 1904, com diversas ações do povo contra os aparelhos do Estado. Figura 3 Bonde tombado pela população no Rio de Janeiro, em 12 de novembro de 1904. El D es ca m is ad o/ W ik im ed ia C om m on s De acordo com Polignano (2015, p. 5), apesar das arbitrariedades e dos abusos cometidos, o modelo campanhista obteve importantes vitórias no controle das doenças epidêmicas, conseguindo inclusive erradicar a febre amarela da cidade do Rio de Janeiro, o que fortaleceu o modelo proposto e o tornou hegemônico como proposta de intervenção na área da saúde coletiva durante décadas. Nesse sentido, podemos dizer que esse modelo marca o nascimento da saúde pública no Brasil. Nos anos 1920, Carlos Chagas se apresentou como su- cessor de Oswaldo Cruz, aprimorando o modelo campa- nhista a ponto de romper o seu caráter fiscal e policial, de modo a empreender ações publicitárias e de educação sa- nitária. Essas ações foram estendidas para regiões do inte- rior do país, com a promoção de ações de saneamento rural e a formação de profissionais para atuar em saúde pública. O documentário Oswaldo Cruz: Projeto Memória 2003, especialmente produzido para o Projeto Memória, conta a história do sanitarista Oswaldo Cruz e da sua luta por melhores condições de saúde para todos. O documentário é uma junção de recursos grá- ficos modernos e cenas com atores e imagens da época. É uma obra que prende a nossa atenção tanto pelo conteúdo quanto pela quantidade de recursos utilizada. Direção: Silvio Tendler. Brasil: Caradecão Filmes; Caliban Produções Cinematográficas, 2003. Disponível em: http://oswaldocruz. fiocruz.br/index.php/videos/ oswaldo-cruz-projeto- memoria-2003. Acesso em: 16 nov. 2021. Documentário Figura 4 Carlos Chagas J. Pinto/Wikimedia Com m ons http://oswaldocruz.fiocruz.br/index.php/videos/oswaldo-cruz-projeto-memoria-2003 http://oswaldocruz.fiocruz.br/index.php/videos/oswaldo-cruz-projeto-memoria-2003 http://oswaldocruz.fiocruz.br/index.php/videos/oswaldo-cruz-projeto-memoria-2003 http://oswaldocruz.fiocruz.br/index.php/videos/oswaldo-cruz-projeto-memoria-2003 36 Política de Saúde e Proteção Social no Brasil Para Carlos Chagas, a pesquisa era importante para a formação profissional dos médicos e a ciência tinha o papel essencial de reve- lar os problemas de saúde pública e os caminhos para enfrentá-los. Além disso, ele descobriu uma doença tropical que carrega o seu nome, chamada de doença de chagas, da qual também identificou o vetor de transmissão – marcos importantíssimos para a história da ciência e da saúde em nosso país. Outra importante ação do período aconteceu em março de 1926, quando o governo do Rio de Janeiro atribuiu a denominação Ana Neri à Escola de Enfermeiras do Departamento Nacional de Saúde Pública, que passou a pertencer à Universidade do Brasil de Ensino Superior. Todas essas estratégias tiveram um caráter efetivo e cumpriram a parte da saúde na política de um Estado capitalista agroexportador, que passava a contar com um corpo de exigências sanitárias interna- cionais. Vale dizer que, até o início dos anos 1960, predominou o mode- lo campanhista/sanitarista no país. Durante a República Velha, houve, ainda, a aprovação do Decreto n. 4.682/1923, conhecido como Lei Eloy Chaves e considerado o marco inicial da Previdência Social no país. Inicialmente, instituiu caixas de aposentadoria e de pensão (CAP) aos ferroviários – categoria com forte respaldo social, uma vez que era responsável por 95% do trans- porte terrestre no país (BRASIL, 1923). De acordo com Oliveira e Teixeira (1985), em 1930, o sistema abrangia 47 caixas, com 142.464 segurados ativos, 8.006 aposentados e 7.013 pensionistas. No artigo 9° da Lei Eloy Chaves, estavam previstos os seguintes benefícios (BRASIL, 1923): • socorros médicos em caso de doença do segurado e/ou de membro de sua família com o qual coabitasse e compartilhasse as despesas; • medicamentos obtidos por preço controlado pelo conselho de administração; • aposentadoria; • pensão para herdeiros no caso de morte de titular do seguro previdenciário. No seu artigo 2º, o decreto destaca que: são considerados empregados, para os fins da presente lei, não só os que prestarem os seus serviços mediante ordena- do mensal, como os operários diaristas, de qualquer natureza, OT AV IO 19 81 /W ik im ed ia C om m on s Ana Neri é considerada a pioneira da enfermagem no Brasil. Suas ações se deram na Guerra do Paraguai, em hospitais nos quais, por vezes, falta- vam materiais e não havia higiene. Mesmo assim, o seu trabalho era dedicado e reconhecido por todos. Além disso, com recursos próprios, montou uma enfermaria modelo na capital do Paraguai para atender aos doentes. Condecorada por Dom Pedro II, faleceu em 20 de maio de 1880. Em sua ho- menagem, comemora-se o dia do enfermeiro em 20 de maio. Biografia História das políticas públicas de saúde no Brasil 37 que executem serviço de caráter permanente. Parágrafo único. Consideram-se empregados ou operários permanentes os que tenham mais de seis meses de serviços contínuos em uma mesma empresa. (BRASIL, 1923) O decreto obrigava, no artigo 27, as CAP a arcar com a assistência aos acidentados no trabalho, o que era um grande avanço em um país que desconhecia direitos trabalhistas universais e que expunha a clas- se trabalhadora aos mandos e aos desmandos dos patrões, com jor- nadas laborais de mais de 12 horas diárias, regimes que não previam férias e ausência de garantias de licenças de tratamento de saúde. Dada a exposição sobre a importância dessa lei, é válido ressaltar um aspecto importante: alguns estudiosos da área afirmam que as pri- meiras políticas de proteção social no Brasil foram as CAP constituídas pela Lei Eloy Chaves de 1923, mas não é bem assim, afinal tivemos as Santas Casas de Misericórdia. Esse é um erro que vem sendo reprodu- zido ao longo dos anos. É fundamental que você compreenda que, durante todo o período tratado nesta seção, as ações governamentais em saúde eram princi- palmente voltadas para as epidemias e iniciativas de saneamento. Não havia programas de saúde pública em nosso país. As iniciativas governamentais relacionadas à saúde não eram vistas como direito e bem-estar, e sim como exigências internacionais. Então, a história da política de saúde, como também de outras políticas de proteção social, é marcada pelos interesses do mercado em detrimento dos interesses da população. A divulgação intitulada 70 anos de Previdência Social: Lei Eloy Chaves, publica- do pelo Ministério do Trabalho e da Previdência Social em 1965, retrata quem foi Eloy Chaves e como era formadaa Lei de Caixas de Aposentado- rias e Pensões, trazendo na íntegra o Decreto n. 4.682, de 1923. Disponível em: http://www2.anfip. org.br/publicacoes/livros/includes/ livros/arqs-pdfs/70_anos_de_ previdencia_socal.PDF. Acesso em: 18 set. 2021. Livro 2.3 A Era Vargas (1930-1945) Vídeo Getúlio Vargas assume o poder, de assalto, em 1930, com a ajuda dos militares, expondo a crise que se estabelecia entre as diferentes elites regionais do país – as quais, até então, equilibravam-se sobre um modelo político conhecido como política dos governadores. Nesse grande acordo, as elites regionais se conectavam com o eleitorado dos sertões por intermédio dos coronéis, que submetiam as popula- ções ao voto de cabresto, engendrando um modelo eleitoral autori- tário e corrompido. Conhecer as atividades de saúde ocorridas na Era Vargas com a CLT e o nascimento da Previdência Social. Objetivo de aprendizagem 38 Política de Saúde e Proteção Social no Brasil Figura 5 Getúlio Vargas, ao centro, vestido como militar, durante os eventos da Revolução de 1930. Cl ar o Ja ns so n/ W ik im ed ia C om m on s No contexto internacional, o conflito ideológico aflorado pela Revolução Russa (1917), o grave desastre humanitário instalado pela Grande Guerra (1914-1918) e o colapso econômico decorrente da Crise de 1929 foram fatores externos que obrigaram o país a realizar rearranjos políticos e econômicos, que se afloraram na figura de Vargas. Assim, os cafeicultores paulistas, que detinham grande capital econômico, foram obrigados a redirecionar seus investimentos para a indústria interna, que apresentava alguma demanda devido à que- da na produção externa nos tempos de guerra. Com isso, fábricas de roupas, chapéus, bengalas, velas, lampiões e louças nasceram nas maiores cidades do Sudeste. No pós-guerra, um novo fluxo de imigrantes chegou ao país, os quais foram empregados, muitas vezes, pelas fábricas que surgiram no Rio de Janeiro e na capital paulista. É importante destacar que os povos afro-brasileiros não foram escolhidos como empregados ideais da indústria que se desenvolvia, sendo direcionados à informalidade e à favelização – esta que dava seus primeiros sinais nos anos 1930, fruto das políticas higienistas 2 em curso desde meados de 1920. Por outro lado, os imigrantes trouxeram, na bagagem, os ideais revolucionários que se difundiam entre os trabalhadores europeus. Dessa maneira, em 1917, o Rio de Janeiro assistiu à primeira grande greve de industriais, que expunha maus tratos, jornadas extenuantes, baixos salários e ausência de direitos. O movimento higienista ti- nha por objetivo a defesa da saúde pública e o ensi- no de novos hábitos de higiene. Seus defensores afirmavam que não ha- veria progresso da nação sem indivíduos saudáveis e produtivos. 2 História das políticas públicas de saúde no Brasil 39 Nesse sentido, como forma de afastar a sombra do comunismo, Getúlio Vargas implementou uma forte campanha nacionalista e antico- munista, com o objetivo de afastar o risco de insurreições revolucioná- rias. Conjuntamente, aproximou-se dos trabalhadores, com a criação do Ministério do Trabalho, em 1930, de modo a atrair os principais líderes sindicais, em uma clara estratégia de controlar o movimento sindical. Na esteira do estado de bem-estar social, foi criado, ainda, em 1930, o Ministério da Educação e Saúde Pública, desintegrando as atividades do Departamento Nacional de Saúde Pública (vinculado ao Ministério da Justiça), pulverizando as ações de saúde e concedendo maiores orçamento e pessoal dedicado ao novo órgão (POLIGNANO, 2015). Em 1932, foi criada a Carteira de Trabalho e Previdência Social, um marco na questão dos direitos trabalhistas. Apesar de estar restrito aos trabalhadores urbanos, o documento passou a registrar os contratos entre funcionários e patrões, garantindo direitos que até então eram desconhecidos no Brasil, a saber: salário mínimo, férias e 13° salário. Fo- ram criadas, também, a Justiça do Trabalho, em 1939, durante o Estado Novo, e a Consolidação das Leis, aprovada simbolicamente em 1° de maio de 1943. Não à toa, Vargas se tornou conhecido pelos brasileiros como pai dos pobres. Vejamos alguns investimentos realizados na saúde pública, em 1941, com a instituição da reforma Barros Barreto: • instituição de órgãos normativos e supletivos destinados a orientar a assistência sanitária e hospitalar; • criação de órgãos executivos de ação direta contra as endemias mais importantes (malária, febre amarela, peste); • fortalecimento do Instituto Oswaldo Cruz, como referência na- cional; descentralização das atividades normativas e executivas por 8 regiões sanitárias; • destaque aos programas de abastecimento de água e construção de esgotos, no âmbito da saúde pública; • atenção aos problemas das doenças degenerativas e mentais com a criação de serviços especializados de âmbito nacional (Instituto Nacional do Câncer). (POLIGNANO, 2015, p. 11-12) Ainda, nesse período, tivemos a criação do Sistema S, composto por várias instituições que realizavam ações voltadas à educação profissio- nal e à oferta de serviços de saúde para os trabalhadores e seus fami- liares. Note que havia uma relação entre trabalho, saúde e previdência. O filme Olga retrata a vida da alemã Olga Benário, companheira de Luís Carlos Prestes, um dos principais líderes do Partido Comunista Brasileiro (PCB). Também apresenta o período da Intentona Comunista, movimento liderado pela Aliança Nacional Libertadora e contrário ao governo Vargas. É um bom filme para explorar um pouco mais o período. Direção: Jayme Monjardim. Brasil: Globo Filmes, 2004. Filme 40 Política de Saúde e Proteção Social no Brasil Por fim, é importante perceber que a estrutura do Estado não ga- rantia a saúde como direito para o cidadão brasileiro. 2.4 A República Populista (1945-1964) Vídeo Entre os anos 1937 e 1945, esteve em curso o Estado Novo, período caracterizado pela ditadura varguista, pela suspensão de direitos e por muita perseguição política, sobretudo a comunistas. Os delírios de ameaça comunista de Vargas, que levaram à ditadura, foram expostos, mais tarde, pelo Plano Cohen, que era uma farsa criada dentro do exército brasileiro a respeito de um suposto projeto comunista para tomar o poder no Brasil (ALBUQUERQUE JR., 2021). Nesse período, podemos considerar que tivemos uma ampliação do Estado brasileiro, com a ideologia desenvolvimentista de Vargas, que propunha a intervenção do Estado na sociedade e na eco- nomia, objetivando uma melhoria nos indicadores sociais e um crescimento econômico. Em 1945, novamente, o cenário político externo influenciou a histó- ria brasileira. Com a derrota do eixo nazifascista, tornou-se insustentá- vel a manutenção de um regime autoritário que flertava com o movimento integralista brasileiro de forte orientação fascista. Assim, em 1945, foi eleito presidente da República, pelo Partido So- cial Democrático (PSD), o general Eurico Gaspar Dutra, antigo ministro de guerra de Vargas, que teve papel decisivo na sua deposição. As mar- cas do governo Dutra foram a aproximação política com os Estados Unidos, em um contexto internacional no qual se desenhava a Guerra Fria – conflito ideológico entre EUA e URSS –, e o plano Salte, que visava desenvolver as áreas de saúde, alimentação, transporte e energia. Objetivamente, na área da saúde, Dutra criou o Serviço de Assistência Médica Domiciliar e de Urgência (SAMDU) – mantido por todos os institutos e por todas as caixas remanescentes 3 –, que, na prática, foi um protótipo do atual Samu. Por influência de sua espo- sa, fundou a reconhecida Maternidade Carmela Dutra, na cidade de Florianópolis, ativa até a atualidade. Em 1946, o governo publicou uma nova Constituição. De acordo com Castro e Lazzari (2020), essa nova norma prescrevia sobre a Previ- dência no capítulo referente aos direitos sociais, o qual apresentava a Conhecer as atividades
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