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A EDUCAÇÃO FÍSICA NA POLÍTICA EDUCACIONAL DO BRASIL PÓS-64 Editora da Universidade Estadual de Maringá Reitor: Prof. Dr. Gilberto Cezar Pavanelli Vice-Reitor: Prof. Dr. Angelo Priori Pró-Reitora de Pesquisa e Pós-Graduação: Profa Dra Alice Eiko Murakami Diretor de Pesquisa e Pós-Graduação: Profa Dra Maria Helena Ambrosio Dias Coordenador Editorial: Profa Dra Ruth Izumi Setoguti CONSELHO EDITORIAL Prof. Dr. Antonio Belincanta, Prof. Dr. Benedito Prado Dias Filho, Prof. Dr. Edson Carlos Romualdo, Prof. Dr. Eduardo Augusto Tomanik, Prof. Dr. Edvard Elias de Souza Filho, Profa. Dra. Hilka Pelizza Vier Machado, Prof. Dr. José Carlos de Sousa, Prof. Dr. Luiz Antonio de Souza, Prof. Dr. Lupércio Antonio Pereira, Prof. Dr. Neio Lucio Peres Gualda. Secretária: Maria José de Melo Vandresen. DA L V A MA R I M BE L T R A M I A EDUCAÇÃO FÍSICA NA POLÍTICA EDUCACIONAL DO BRASIL PÓS-64 Maringá 2006 Editora da Universidade Estadual de Maringá Reitor: Prof. Dr. Gilberto Cezar Pavanelli Vice-Reitor: Prof. Dr. Angelo Priori Pró-Reitora de Pesquisa e Pós-Graduação: Profa Dra Alice Eiko Murakami Diretor de Pesquisa e Pós-Graduação: Profa Dra Maria Helena Ambrosio Dias Coordenador Editorial: Profa Dra Ruth Izumi Setoguti CONSELHO EDITORIAL Prof. Dr. Antonio Belincanta, Prof. Dr. Benedito Prado Dias Filho, Prof. Dr. Edson Carlos Romualdo, Prof. Dr. Eduardo Augusto Tomanik, Prof. Dr. Edvard Elias de Souza Filho, Profa. Dra. Hilka Pelizza Vier Machado, Prof. Dr. José Carlos de Sousa, Prof. Dr. Luiz Antonio de Souza, Prof. Dr. Lupércio Antonio Pereira, Prof. Dr. Neio Lucio Peres Gualda. Secretária: Maria José de Melo Vandresen. DA L V A MA R I M BE L T R A M I A EDUCAÇÃO FÍSICA NA POLÍTICA EDUCACIONAL DO BRASIL PÓS-64 Maringá 2006 Divisão de Editoração Marcos Kazuyoshi Sassaka Marcos Cipriano da Silva Luciano Wilian da Silva Livraria Eduem Paulo Bento da Silva Solange Marly Oshima Norberto Pereira da Silva Revisão de Língua Portuguesa Clarice Zamonaro Cortez Capa – arte final Luciano Wilian da Silva Marcos Kazuyoshi Sassaka Projeto gráfico e Editoração Marcos Cipriano da Silva Normalização Biblioteca Central - UEM Fonte Goudy Old Style Tiragem 500 exemplares Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) Biblioteca Central – UEM, Maringá B453e Beltrami, Dalva Marim A educação física na política educacional do Brasil pós-64 / Dalva Marim Beltrami. – Maringá, PR : Eduem, 2006. 146 p. ISBN 85-7628-012-04 1. Educação física - Brasil. 2. Educação física - Política educacional - Brasil - Pós-64. 2. Educação - Educação física. 3. Educação física - História. 4. Professor - Formação profissional. Título. CDD 21.ed.796.07 Copyright 2006 para a autora Todos os direitos reservados. Proibida a reprodução, mesmo parcial, por qualquer processo mecânico, eletrônico, reprográfico etc., sem a autorização, por escrito, da autora. Todos os direitos reservados desta edição 2006 para Eduem. Endereço para correspondência: Eduem - Editora da Universidade Estadual de Maringá Av. Colombo, 5790 - Campus Universitário, 87020-900 - Maringá-Paraná-Brasil Fone: (0XX44) 3261-4527/Fax: (0XX44) 3261-4109 Site: http://www.eduem.uem.br - E-mail: eduem@uem.br À Professora Doutora Maria Izabel de Souza Lopes que, sempre como amiga e permanentemente como profissional, acompanhou e orientou os meus passos nos últimos anos, particularmente neste trabalho. Divisão de Editoração Marcos Kazuyoshi Sassaka Marcos Cipriano da Silva Luciano Wilian da Silva Livraria Eduem Paulo Bento da Silva Solange Marly Oshima Norberto Pereira da Silva Revisão de Língua Portuguesa Clarice Zamonaro Cortez Capa – arte final Luciano Wilian da Silva Marcos Kazuyoshi Sassaka Projeto gráfico e Editoração Marcos Cipriano da Silva Normalização Biblioteca Central - UEM Fonte Goudy Old Style Tiragem 500 exemplares Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) Biblioteca Central – UEM, Maringá B453e Beltrami, Dalva Marim A educação física na política educacional do Brasil pós-64 / Dalva Marim Beltrami. – Maringá, PR : Eduem, 2006. 146 p. ISBN 85-7628-012-04 1. Educação física - Brasil. 2. Educação física - Política educacional - Brasil - Pós-64. 2. Educação - Educação física. 3. Educação física - História. 4. Professor - Formação profissional. Título. CDD 21.ed.796.07 Copyright 2006 para a autora Todos os direitos reservados. Proibida a reprodução, mesmo parcial, por qualquer processo mecânico, eletrônico, reprográfico etc., sem a autorização, por escrito, da autora. Todos os direitos reservados desta edição 2006 para Eduem. Endereço para correspondência: Eduem - Editora da Universidade Estadual de Maringá Av. Colombo, 5790 - Campus Universitário, 87020-900 - Maringá-Paraná-Brasil Fone: (0XX44) 3261-4527/Fax: (0XX44) 3261-4109 Site: http://www.eduem.uem.br - E-mail: eduem@uem.br À Professora Doutora Maria Izabel de Souza Lopes que, sempre como amiga e permanentemente como profissional, acompanhou e orientou os meus passos nos últimos anos, particularmente neste trabalho. S U M Á R I O PREFÁCIO ............................................................................................ 9 INTRODUÇÃO ...................................................................................... 11 1 O MOMENTO DA IMPLANTAÇÃO DA EDUCAÇÃO FÍSICA NO SISTEMA DE ENSINO NOS ANOS 60 ...................................................................... 21 O contexto político-econômico forja o novo campo da Educação Física .............................................................................................. 24 O contexto político-educacional abre espaço para a Educação Física no sistema escolar ................................................................ 31 2 A EDUCAÇÃO FÍSICA E O NOVO HOMEM BRASILEIRO PÓS-64 .............. 43 As controvérsias sobre a aplicação do artigo 22 da Lei de Diretrizes e Bases ........................................................................... 48 S U M Á R I O PREFÁCIO ............................................................................................ 9 INTRODUÇÃO ...................................................................................... 11 1 O MOMENTO DA IMPLANTAÇÃO DA EDUCAÇÃO FÍSICA NO SISTEMA DE ENSINO NOS ANOS 60 ...................................................................... 21 O contexto político-econômico forja o novo campo da Educação Física .............................................................................................. 24 O contexto político-educacional abre espaço para a Educação Física no sistema escolar ................................................................ 31 2 A EDUCAÇÃO FÍSICA E O NOVO HOMEM BRASILEIRO PÓS-64 .............. 43 As controvérsias sobre a aplicação do artigo 22 da Lei de Diretrizes e Bases ........................................................................... 48 3 A EDUCAÇÃO FÍSICA, A IDENTIDADE PROFISSIONAL E O MERCADO DE TRABALHO ...................................................................................... 97 A nova formação do Professor de Educação Física e a expansão dos cursos superiores ..................................................................... 109 A inserção do profissional de Educação Física no sistema de ensino .............................................................................................123 4 CONCLUSÃO ........................................................................................ 129 5 REFÊRENCIAS ....................................................................................... 137 P R E F Á C I O Este livro é, em certa medida, um substrato de um tempo de vi- da profissional dedicado à Educação Física Escolar. Durante quase a totalidade do tempo em que trabalhei na rede escolar pública minis- trei aulas no curso noturno. Os alunos dos cursos noturnos são aqueles que trabalham durante o dia ou aqueles que por conta de suas idades já não podiam freqüentar o curso regular nos períodos diurnos. Educação Física para a maior parte deles era quase uma tortura, pois, na maioria das vezes, as aulas eram ministradas aos sábados à tarde e quase sempre a má vontade imperava já que as aulas eram obrigatórias para eles, salvo exceções. Não foi preciso muito esforço para entender porque eles não gostavam. No enten- dimento deles, a escola e os professores de Educação Física estavam roubando seus preciosos tempos fora do trabalho e fora da escola, a liberdade de disporem dessas horas como lhes aprouvessem. Como era possível, na escola, uma atividade curricular ser obrigató- ria e ao mesmo tempo dispensável para os alunos, principalmente para os freqüentadores dos cursos noturnos? Não se tratava de uma opção já que as justificativas para a solicitação da “dispensa” para freqüentar as 3 A EDUCAÇÃO FÍSICA, A IDENTIDADE PROFISSIONAL E O MERCADO DE TRABALHO ...................................................................................... 97 A nova formação do Professor de Educação Física e a expansão dos cursos superiores ..................................................................... 109 A inserção do profissional de Educação Física no sistema de ensino ............................................................................................. 123 4 CONCLUSÃO ........................................................................................ 129 5 REFÊRENCIAS ....................................................................................... 137 P R E F Á C I O Este livro é, em certa medida, um substrato de um tempo de vi- da profissional dedicado à Educação Física Escolar. Durante quase a totalidade do tempo em que trabalhei na rede escolar pública minis- trei aulas no curso noturno. Os alunos dos cursos noturnos são aqueles que trabalham durante o dia ou aqueles que por conta de suas idades já não podiam freqüentar o curso regular nos períodos diurnos. Educação Física para a maior parte deles era quase uma tortura, pois, na maioria das vezes, as aulas eram ministradas aos sábados à tarde e quase sempre a má vontade imperava já que as aulas eram obrigatórias para eles, salvo exceções. Não foi preciso muito esforço para entender porque eles não gostavam. No enten- dimento deles, a escola e os professores de Educação Física estavam roubando seus preciosos tempos fora do trabalho e fora da escola, a liberdade de disporem dessas horas como lhes aprouvessem. Como era possível, na escola, uma atividade curricular ser obrigató- ria e ao mesmo tempo dispensável para os alunos, principalmente para os freqüentadores dos cursos noturnos? Não se tratava de uma opção já que as justificativas para a solicitação da “dispensa” para freqüentar as A E D U C A Ç Ã O F Í S I C A N A P O L Í T I C A E D U C A C I O N A L D O B R A S I L P Ó S -64 10 aulas de Educação Física, tida por muitos como uma “conquista”, precedia uma condição discriminatória e excludente – ter 18 anos ou mais, ser mãe, por trabalhar, ou ser portador de deficiência. Para mim, qualquer situação, legal ou não, que discrimine um aluno de exercer uma atividade da grade curricular constitui uma violação do direito à educação escolar plena. Ainda hoje a educação física escolar é um tema intensamente discu- tido. A prática da Educação Física permanece ainda descolada da forma- ção escolar embora as políticas educacionais a respeito, planos e projetos afirmem o contrário. Teorias e pesquisas enriquecem a relevância e os limites da Educação Física escolar. Mas ainda falta muito para atingirmos o ideal proclamado pela unidade da formação intelectual e corporal. Eis um problema recorrente: o que é Educação Física e a quem ela serve? Convido a todos para essa reflexão e quero deixar neste livro a minha contribuição. Penso que a Educação Física é uma atividade que coopera para preservar o patrimônio corporal dos indivíduos vivos de qualquer idade, sexo e condição social. Nessa condição temos que garantir, até porque eticamente é nossa obrigação, que também os menos favorecidos tenham tanto acesso a essa atividade quanto necessitam da água para satisfazer a sua sede. Nosso papel, privilegiado por nossa formação, é o de deter o co- nhecimento, as técnicas, os métodos e as estratégias que devemos repassar aos futuros profissionais e à população com a qual traba- lhamos. Como estudiosos e cientistas nessa área devemos avançar a investigação científica e tecnológica para aprimorar e difundir conhecimento, técnicas, métodos e estratégias para preservar e aprimorar o patrimônio corporal humano. Desse modo estaremos colaborando efetivamente para a qualidade de vida. É possível que no Brasil a introdução da Educação Física no currícu- lo escolar pós-64 como disciplina ou atividade obrigatória tenha um vício de origem. Mas superado o vício é preciso seguir em frente. É o que este livro procura resgatar embora não com a intenção de esgotar o tema, mas de tê-lo como registro histórico e mantê-lo em discussão. I N T R O D U Ç Ã O Encontramos, hoje, no campo da Educação Física, dificuldade em definir a atuação e caracterizar o perfil do profissional desse campo do conhecimento. Essa situação não só cria problemas para estabelecer uma política de Educação Física para o País, mas tam- bém revela uma tenuidade na concepção educativa de sua prática e, conseqüentemente, na formação de seus profissionais. A extensão da obrigatoriedade da prática de Educação Física em todos os níveis do Ensino Superior, imposta pelo Decreto-Lei nº 705 de 25 de julho de 1969, provocou uma profunda alteração na difu- são da Educação Física no Brasil. O Conselho Federal de Educação (CFE), até a promulgação daquele decreto-lei, resistiu à idéia da implantação obrigatória da Educação Física na grade curricular dos antigos cursos primário e médio nos moldes propostos pela Divisão de Educação Física (DEF) do MEC. De acordo com o artigo 22 da Lei nº 4024 de 20 de dezembro de 1961, previa-se a prática da Educação Física no sistema escolar até a idade de 18 anos. Era necessário regulamentar essa prática e esse papel coube, ao CFE, que A E D U C A Ç Ã O F Í S I C A N A P O L Í T I C A E D U C A C I O N A L D O B R A S I L P Ó S -64 10 aulas de Educação Física, tida por muitos como uma “conquista”, precedia uma condição discriminatória e excludente – ter 18 anos ou mais, ser mãe, por trabalhar, ou ser portador de deficiência. Para mim, qualquer situação, legal ou não, que discrimine um aluno de exercer uma atividade da grade curricular constitui uma violação do direito à educação escolar plena. Ainda hoje a educação física escolar é um tema intensamente discu- tido. A prática da Educação Física permanece ainda descolada da forma- ção escolar embora as políticas educacionais a respeito, planos e projetos afirmem o contrário. Teorias e pesquisas enriquecem a relevância e os limites da Educação Física escolar. Mas ainda falta muito para atingirmos o ideal proclamado pela unidade da formação intelectual e corporal. Eis um problema recorrente: o que é Educação Física e a quem ela serve? Convido a todos para essa reflexão e quero deixar neste livro a minha contribuição. Penso que a Educação Física é uma atividade que coopera para preservar o patrimônio corporal dos indivíduos vivos dequalquer idade, sexo e condição social. Nessa condição temos que garantir, até porque eticamente é nossa obrigação, que também os menos favorecidos tenham tanto acesso a essa atividade quanto necessitam da água para satisfazer a sua sede. Nosso papel, privilegiado por nossa formação, é o de deter o co- nhecimento, as técnicas, os métodos e as estratégias que devemos repassar aos futuros profissionais e à população com a qual traba- lhamos. Como estudiosos e cientistas nessa área devemos avançar a investigação científica e tecnológica para aprimorar e difundir conhecimento, técnicas, métodos e estratégias para preservar e aprimorar o patrimônio corporal humano. Desse modo estaremos colaborando efetivamente para a qualidade de vida. É possível que no Brasil a introdução da Educação Física no currícu- lo escolar pós-64 como disciplina ou atividade obrigatória tenha um vício de origem. Mas superado o vício é preciso seguir em frente. É o que este livro procura resgatar embora não com a intenção de esgotar o tema, mas de tê-lo como registro histórico e mantê-lo em discussão. I N T R O D U Ç Ã O Encontramos, hoje, no campo da Educação Física, dificuldade em definir a atuação e caracterizar o perfil do profissional desse campo do conhecimento. Essa situação não só cria problemas para estabelecer uma política de Educação Física para o País, mas tam- bém revela uma tenuidade na concepção educativa de sua prática e, conseqüentemente, na formação de seus profissionais. A extensão da obrigatoriedade da prática de Educação Física em todos os níveis do Ensino Superior, imposta pelo Decreto-Lei nº 705 de 25 de julho de 1969, provocou uma profunda alteração na difu- são da Educação Física no Brasil. O Conselho Federal de Educação (CFE), até a promulgação daquele decreto-lei, resistiu à idéia da implantação obrigatória da Educação Física na grade curricular dos antigos cursos primário e médio nos moldes propostos pela Divisão de Educação Física (DEF) do MEC. De acordo com o artigo 22 da Lei nº 4024 de 20 de dezembro de 1961, previa-se a prática da Educação Física no sistema escolar até a idade de 18 anos. Era necessário regulamentar essa prática e esse papel coube, ao CFE, que A E D U C A Ç Ã O F Í S I C A N A P O L Í T I C A E D U C A C I O N A L D O B R A S I L P Ó S -64 12 não tinha claro como fazê-lo adequadamente, pois questionava a eficiência de tal atividade na escola a partir apenas de um número determinado de aulas, principal exigência da DEF. A vigência do Ato Institucional nº 5, desde 13 de dezembro de 1968, permitiu que o chefe do executivo promulgasse o decreto-lei citado contemplan- do, dessa forma, as aspirações de grupos aliados. Os propósitos dos ideólogos da Educação Física nesse momento fundavam-se, de um lado, por um projeto eugênico brasileiro e, de outro, por um forte sentimento corporativo profissional. Ao menos era isso que aparentava. A promulgação da Lei nº 5692, de 11 de agosto de 1971, e do Decreto Federal nº 69.450, de 1º de novembro do mesmo ano, somados à Lei nº 5540 em vigor desde 28 de no- vembro de 1968, constituíram a base legal para a consolidação da Educação Física no plano institucional. Em 1969, foi realizado um diagnóstico de Educação Físi- ca/Desportos no Brasil envolvendo o Centro Nacional de Recursos Humanos do Instituto de Pesquisas Econômico-Social Aplicadas (CNRH-IPEA) do Ministério do Planejamento e a Divisão de Edu- cação Física do Ministério de Educação e Cultura (DEF-MEC), o qual teve por objetivo dar fundamento “científico” à nova política de Educação Física no Brasil (COSTA, 1971). Se no plano oficial havia, como afirmou Arlindo Lopes Corrêa, Secretário-Executivo do CNRH-IPEA, uma preocupação “no sentido de aperfeiçoar o homem brasileiro” (CORRÊA apud COSTA, 1971, p. 7) tornou-se necessário entender quem seria o homem brasileiro a ser aperfeiçoado pela nova política de Educação Física. No entanto, o Decreto nº. 69.450 de novembro de 1971, que regulamentou a prática da Educação Física em todos os níveis de ensino, previu exceções quanto ao cumprimento dessa obrigatoriedade para alguns segmentos sociais. Configurou-se uma incoerência? Ou, na verdade, configurou-se uma discriminação? É possível afirmar que se trata de um processo seletivo e de caráter excludente semelhante ao que ocorre no sistema de ensino como um todo, mas que, no caso da Educação Física, a exclusão é institucionalizada. Curioso notar que o I N T R O D U Ç Ã O 13 relator do parecer favorável que constituiu o decreto citado tenha sido o Sr. Arlindo Lopes Corrêa, membro do CFE e nessa oportu- nidade na qualidade de representante do Ministério do Planejamen- to e Coordenação Geral, conforme consta no Diário Oficial da União de 25 de junho de 1970. As exceções, como se revelaram na prática, puseram em dúvida, ao menos para a autora deste trabalho, a relevância da Educação Física para o homem e particularmente quanto a sua prática na escola pública, instituição na qual trabalhava e na universidade, onde hoje atua como docente de um curso superior de Educação Física e nas atividades de Práticas Desportivas. Diante das filas de matrícula em todos os níveis de ensino, pode-se observar não só a quantidade de alunos que solicitam dispensa das aulas de Educação Física, mas também e principalmente, com que prazeres o fazem ou, muitas vezes, com que angústia, quando não conseguem enquadrar- se nas normas que lhes dariam a condição de “dispensado”. Coube aqui a questão: qual o objetivo da Educação Física? Qual o com- promisso do professor de Educação Física nessas Instituições de Ensino? O compromisso é com a lei ou com o aluno? Se for com a lei, há um certo caráter de dispensabilidade do professor e da Edu- cação Física como ato educativo; se for com o aluno, é urgente repensar essa ação que está restringida por uma legalidade discutível. Essa situação é percebida quando, ao realizar-se na prática, ela discrimina. É necessário recuperar os fundamentos que dão origem a essa discriminação, ou melhor, a essa exclusão. Essa contradição está pouco presente nas discussões dos profis- sionais da área. Alguns levantamentos feitos nesse sentido apontam razões de ordem pessoal do aluno, tais como falta de tempo, inabili- dade para qualquer esporte, praticante em clubes, desinteresse, ou, razões de ordem material, tais como falta de equipamento adequado na instituição de ensino, instalações impróprias ou totalmente ocupadas ou de uso restritivo. Mas conclusões dessa natureza não levam a lugar nenhum a não ser a generalizações e a abstrações bem a gosto de pesquisas positivistas. A E D U C A Ç Ã O F Í S I C A N A P O L Í T I C A E D U C A C I O N A L D O B R A S I L P Ó S -64 12 não tinha claro como fazê-lo adequadamente, pois questionava a eficiência de tal atividade na escola a partir apenas de um número determinado de aulas, principal exigência da DEF. A vigência do Ato Institucional nº 5, desde 13 de dezembro de 1968, permitiu que o chefe do executivo promulgasse o decreto-lei citado contemplan- do, dessa forma, as aspirações de grupos aliados. Os propósitos dos ideólogos da Educação Física nesse momento fundavam-se, de um lado, por um projeto eugênico brasileiro e, de outro, por um forte sentimento corporativo profissional. Ao menos era isso que aparentava. A promulgação da Lei nº 5692, de 11 de agosto de 1971, e do Decreto Federal nº 69.450, de 1º de novembro do mesmo ano, somados à Lei nº 5540 em vigor desde 28 de no- vembro de 1968, constituíram a base legal para a consolidação da Educação Física no plano institucional. Em 1969, foi realizado um diagnóstico de Educação Físi- ca/Desportos no Brasil envolvendo o Centro Nacional de Recursos Humanos do Instituto de Pesquisas Econômico-Social Aplicadas (CNRH-IPEA) do Ministério do Planejamento e a Divisão de Edu- cação Física do Ministério de Educação e Cultura (DEF-MEC), o qual teve por objetivo dar fundamento“científico” à nova política de Educação Física no Brasil (COSTA, 1971). Se no plano oficial havia, como afirmou Arlindo Lopes Corrêa, Secretário-Executivo do CNRH-IPEA, uma preocupação “no sentido de aperfeiçoar o homem brasileiro” (CORRÊA apud COSTA, 1971, p. 7) tornou-se necessário entender quem seria o homem brasileiro a ser aperfeiçoado pela nova política de Educação Física. No entanto, o Decreto nº. 69.450 de novembro de 1971, que regulamentou a prática da Educação Física em todos os níveis de ensino, previu exceções quanto ao cumprimento dessa obrigatoriedade para alguns segmentos sociais. Configurou-se uma incoerência? Ou, na verdade, configurou-se uma discriminação? É possível afirmar que se trata de um processo seletivo e de caráter excludente semelhante ao que ocorre no sistema de ensino como um todo, mas que, no caso da Educação Física, a exclusão é institucionalizada. Curioso notar que o I N T R O D U Ç Ã O 13 relator do parecer favorável que constituiu o decreto citado tenha sido o Sr. Arlindo Lopes Corrêa, membro do CFE e nessa oportu- nidade na qualidade de representante do Ministério do Planejamen- to e Coordenação Geral, conforme consta no Diário Oficial da União de 25 de junho de 1970. As exceções, como se revelaram na prática, puseram em dúvida, ao menos para a autora deste trabalho, a relevância da Educação Física para o homem e particularmente quanto a sua prática na escola pública, instituição na qual trabalhava e na universidade, onde hoje atua como docente de um curso superior de Educação Física e nas atividades de Práticas Desportivas. Diante das filas de matrícula em todos os níveis de ensino, pode-se observar não só a quantidade de alunos que solicitam dispensa das aulas de Educação Física, mas também e principalmente, com que prazeres o fazem ou, muitas vezes, com que angústia, quando não conseguem enquadrar- se nas normas que lhes dariam a condição de “dispensado”. Coube aqui a questão: qual o objetivo da Educação Física? Qual o com- promisso do professor de Educação Física nessas Instituições de Ensino? O compromisso é com a lei ou com o aluno? Se for com a lei, há um certo caráter de dispensabilidade do professor e da Edu- cação Física como ato educativo; se for com o aluno, é urgente repensar essa ação que está restringida por uma legalidade discutível. Essa situação é percebida quando, ao realizar-se na prática, ela discrimina. É necessário recuperar os fundamentos que dão origem a essa discriminação, ou melhor, a essa exclusão. Essa contradição está pouco presente nas discussões dos profis- sionais da área. Alguns levantamentos feitos nesse sentido apontam razões de ordem pessoal do aluno, tais como falta de tempo, inabili- dade para qualquer esporte, praticante em clubes, desinteresse, ou, razões de ordem material, tais como falta de equipamento adequado na instituição de ensino, instalações impróprias ou totalmente ocupadas ou de uso restritivo. Mas conclusões dessa natureza não levam a lugar nenhum a não ser a generalizações e a abstrações bem a gosto de pesquisas positivistas. A E D U C A Ç Ã O F Í S I C A N A P O L Í T I C A E D U C A C I O N A L D O B R A S I L P Ó S -64 14 O projeto, “Primeiros Passos da Educação Física”, realizado pela autora deste trabalho no curso supletivo 1º. grau noturno de uma escola pública de Maringá, nos anos de 1985 e 1986, mostrou a necessidade de repensar a prática da Educação Física a partir de uma realidade concreta e não de uma realidade abstraída. Durante o desenvolvimento do projeto, sentiu-se que, com a mesma intensida- de com que os alunos aderiam aos trabalhos recebia-se a rejeição dos professores da escola, inclusive de muitos dos de Educação Física. Foi um trabalho não considerado científico no congresso do Colégio Brasileiro de Ciências do Esporte em setembro de 1985, mas acata- do pelo congresso anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência em julho de 1986. Tudo isso levou a autora a repensar a formação do profissional dessa área e os pressupostos teórico- metodológicos colocados para a Educação Física. Essa questão, objeto de intensos debates entre os profissionais de Educação Física, se manifesta no fim da década de 70 e atravessa toda a década de 80. Questiona-se sobre o papel do professor de Educação Física enquanto educador e as discussões que se seguem sobre o tema provocam debates acirrados entre as concepções tecni- cistas e biologista e uma nova concepção da Educação Física, cha- mada de “humanista”. Entretanto, em que pese esse movimento, verifica-se que houve pouca correspondência no âmbito da formação dos novos profissio- nais de Educação Física. As propostas pedagógicas dos cursos de graduação refletem ainda idéias e práticas predominantemente conservadoras. Por isso as questões que ficam são: o que se propu- nha ao professor de Educação Física no Brasil e principalmente no período militar? Por que propostas inovadoras não conseguem inviabilizar propostas conservadoras? Para responder tais questões, percebeu-se a necessidade de com- preender os motivos que levaram à implantação da prática de Edu- cação Física no sistema escolar e às motivações da obrigatoriedade imposta pela promulgação do Decreto-Lei nº 705/69. Concomitan- temente, a dificuldade de compreender a atuação e o perfil do I N T R O D U Ç Ã O 15 profissional de Educação Física, nesse processo, levou à necessidade de recuperar a historicidade de seu papel em determinado momento da realidade brasileira. Assim, o objetivo deste trabalho é procurar elucidar o papel atribuído ao profissional da Educação Física em suas relações com o Estado e com o mercado de trabalho na primei- ra década do Regime Militar, a partir do ideário da Educação Física para esse momento e detectar perspectivas de redefinição desse campo de ação e de seus profissionais. A Educação Física moderna é um fenômeno originário do século XIX. Ela se apoiou, principalmente, nas ciências físicas e biológicas e com base nesses campos do conhecimento que se procurou construir um corpo de teoria e métodos. Em seguida, a Educação Física tomou emprestadas explicações da Psicologia. Só mais recentemente tornou-se alvo de estudos da Filosofia, da História, da Sociologia e da Antropolo- gia. Mesmo dentro desses campos do conhecimento as abordagens sobre Educação Física são diversificadas porque acompanham as dife- rentes abordagens teóricas desses campos. Segundo Jacques Rouyer (1977), as teorias de Educação Física são abstratas e ensejam sempre “um corpo são ao serviço do espírito, com caráter progressista” (ROUYER, 1977, p. 190). Segundo este mesmo autor, a Educação Física já não pode mais se limitar aos estudos da fisiologia e da anatomia, embora permaneçam como relevantes. Ela integra uma atividade de aprendizagem e de aquisição necessárias às práticas da vida real. Mas predomina ainda uma concepção que não ultrapassa o individualismo e o biologismo psicológico. Na prática, a Educação Física para as massas, baseada nessas concepções leva a uma atividade militarizada ou “ao desenvolvimento físico mínimo exigido pela produção moderna” (ROUYER, 1977, p. 191). Tais concepções acabam por se traduzir em sistemas teóricos oficiais e institucionaliza- dos. Neste sentido, essas teorias desconsideram o movimento da histó- ria e da vida social. A defesa de uma Educação Física integral, expressão bastante u- tilizada nas teorias e nas políticas de Educação Física no Brasil, contém uma concepção reduzida do sujeito social à medida que se A E D U C A Ç Ã O F Í S I C A N A P O L Í T I C A E D U C A C I O N A L D O B R A S I L P Ó S -64 14 O projeto, “Primeiros Passos da Educação Física”, realizado pela autora deste trabalho no curso supletivo 1º. grau noturno de uma escola pública de Maringá, nos anos de 1985 e 1986, mostrou a necessidade de repensar a prática da Educação Física a partir de uma realidade concreta e não de uma realidadeabstraída. Durante o desenvolvimento do projeto, sentiu-se que, com a mesma intensida- de com que os alunos aderiam aos trabalhos recebia-se a rejeição dos professores da escola, inclusive de muitos dos de Educação Física. Foi um trabalho não considerado científico no congresso do Colégio Brasileiro de Ciências do Esporte em setembro de 1985, mas acata- do pelo congresso anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência em julho de 1986. Tudo isso levou a autora a repensar a formação do profissional dessa área e os pressupostos teórico- metodológicos colocados para a Educação Física. Essa questão, objeto de intensos debates entre os profissionais de Educação Física, se manifesta no fim da década de 70 e atravessa toda a década de 80. Questiona-se sobre o papel do professor de Educação Física enquanto educador e as discussões que se seguem sobre o tema provocam debates acirrados entre as concepções tecni- cistas e biologista e uma nova concepção da Educação Física, cha- mada de “humanista”. Entretanto, em que pese esse movimento, verifica-se que houve pouca correspondência no âmbito da formação dos novos profissio- nais de Educação Física. As propostas pedagógicas dos cursos de graduação refletem ainda idéias e práticas predominantemente conservadoras. Por isso as questões que ficam são: o que se propu- nha ao professor de Educação Física no Brasil e principalmente no período militar? Por que propostas inovadoras não conseguem inviabilizar propostas conservadoras? Para responder tais questões, percebeu-se a necessidade de com- preender os motivos que levaram à implantação da prática de Edu- cação Física no sistema escolar e às motivações da obrigatoriedade imposta pela promulgação do Decreto-Lei nº 705/69. Concomitan- temente, a dificuldade de compreender a atuação e o perfil do I N T R O D U Ç Ã O 15 profissional de Educação Física, nesse processo, levou à necessidade de recuperar a historicidade de seu papel em determinado momento da realidade brasileira. Assim, o objetivo deste trabalho é procurar elucidar o papel atribuído ao profissional da Educação Física em suas relações com o Estado e com o mercado de trabalho na primei- ra década do Regime Militar, a partir do ideário da Educação Física para esse momento e detectar perspectivas de redefinição desse campo de ação e de seus profissionais. A Educação Física moderna é um fenômeno originário do século XIX. Ela se apoiou, principalmente, nas ciências físicas e biológicas e com base nesses campos do conhecimento que se procurou construir um corpo de teoria e métodos. Em seguida, a Educação Física tomou emprestadas explicações da Psicologia. Só mais recentemente tornou-se alvo de estudos da Filosofia, da História, da Sociologia e da Antropolo- gia. Mesmo dentro desses campos do conhecimento as abordagens sobre Educação Física são diversificadas porque acompanham as dife- rentes abordagens teóricas desses campos. Segundo Jacques Rouyer (1977), as teorias de Educação Física são abstratas e ensejam sempre “um corpo são ao serviço do espírito, com caráter progressista” (ROUYER, 1977, p. 190). Segundo este mesmo autor, a Educação Física já não pode mais se limitar aos estudos da fisiologia e da anatomia, embora permaneçam como relevantes. Ela integra uma atividade de aprendizagem e de aquisição necessárias às práticas da vida real. Mas predomina ainda uma concepção que não ultrapassa o individualismo e o biologismo psicológico. Na prática, a Educação Física para as massas, baseada nessas concepções leva a uma atividade militarizada ou “ao desenvolvimento físico mínimo exigido pela produção moderna” (ROUYER, 1977, p. 191). Tais concepções acabam por se traduzir em sistemas teóricos oficiais e institucionaliza- dos. Neste sentido, essas teorias desconsideram o movimento da histó- ria e da vida social. A defesa de uma Educação Física integral, expressão bastante u- tilizada nas teorias e nas políticas de Educação Física no Brasil, contém uma concepção reduzida do sujeito social à medida que se A E D U C A Ç Ã O F Í S I C A N A P O L Í T I C A E D U C A C I O N A L D O B R A S I L P Ó S -64 16 baseia em uma unidade corpo-espírito e abstrai as relações sociais. Não há uma essência da Educação Física porque “a natureza especí- fica de uma Educação Física não se pode definir senão em relação à totalidade da Educação concebida no seu conjunto” (ROUYER, 1977, p. 191). Com isso, se quer dizer que não há uma separação entre atividade intelectual e atividade física. Ambas são forjadas historicamente. A separação das mesmas só ocorre em uma socieda- de cuja divisão do trabalho separa os que têm a função de pensar dos que têm a função de fazer. Ora, nesse caso a habilidade física estaria se desenvolvendo nos sujeitos sociais por necessidades materiais e independentes da mediação de agentes qualificados. Quando a mediação existe, é preciso entender as suas razões. Na sociedade capitalista, a divisão do trabalho exige habilidades físicas para a força de traba- lho. O capitalismo moderno estimula tais habilidades para além da esfera do trabalho. Dessa forma, tais habilidades compreendi- das como um campo de ensinamento próprio encontram na Educação através da Educação Física a forma de sistematizar a aprendizagem daquelas. A sociedade capitalista criou condições para o surgimento ou redefinição de instituições que se dinamizam em seu interior. A escola, como uma dessas instituições, torna-se adequada ao novo ensinamento. Entretanto, a sociedade capitalista também gera suas contradições e por essa razão surgem diferentes concepções e práti- cas de Educação Física mas todas elas produtos das condições histó- ricas que as engendraram. Lucien Goldmann (1972) mostra a necessidade de vincular a história das idéias com a história dos fatos econômicos e sociais. Mostra também que as ciências históricas implicam um estudo da ação consciente ou inconsciente do homem diante das condições subjetivas e objetivas da realidade social. Não sendo a consciência mais do que um aspecto real mas parcial da atividade humana, o estudo histórico não tem o direito de limitar-se I N T R O D U Ç Ã O 17 aos fenômenos conscientes, devendo vincular as intenções conscientes dos agentes da história à significação objetiva de seu comportamento e de suas ações (GOLDMANN, 1972, p. 27). Na análise dialética, apanha-se o todo. A realidade é construída teórica e praticamente. A pesquisa permite descobrir e reconstituir a realidade pensada. A contradição, e não a identidade, é o funda- mento principal dessa análise. Na história da sociedade [...] prevalece o fim consciente, refletido e desejado! Homens dotados de consciências, agindo com reflexão ou paixão e visando fins determinados. [...] Acima dos motivos pessoais e ideais, que aparentemente dirigem as ações dos homens e sua história, ficam as causas históricas, mais ou menos ocultas e mais ou menos inconscientes, que se transformam naqueles motivos no cérebro dos homens que agem. Por conseguinte, as forças motrizes da história refletem dois tipos de componentes dinâmicos. Os motivos pessoais e ideais, que parecem ser decisivos, apenas possuem uma importância secundária para o resultado final, qualquer que seja a importância deles para o estudo histórico. As causas materiais, que se ocultam por trás daqueles motivos, é que são verdadeiramente forças determinantes e permitem explicar, através das ações e das relações dos homens entre si, os acontecimentos e o curso do processo histórico (MARX, 1984, p. 137). Essa citação aponta para indicadores que foram considerados para resgatar a origem e o desenvolvimento do ideário e das práticas de Educação Física, em determinado momento da história brasileira. Motivos pessoais e ideais revelaram as causas materiais imbricadas em seus propósitos sobre a Educação Física. Foi preciso cumprir duas etapas para a realização deste livro: a etapa da investigação, queimplicou o levantamento bibliográfico e a identificação de documentação primária e secundária, e a etapa da exposição, que constituiu o modo de explicitação do objeto estuda- do contido na presente redação. O levantamento bibliográfico e posterior seleção de textos per- mitiram selecionar aqueles que foram citados neste trabalho e, A E D U C A Ç Ã O F Í S I C A N A P O L Í T I C A E D U C A C I O N A L D O B R A S I L P Ó S -64 16 baseia em uma unidade corpo-espírito e abstrai as relações sociais. Não há uma essência da Educação Física porque “a natureza especí- fica de uma Educação Física não se pode definir senão em relação à totalidade da Educação concebida no seu conjunto” (ROUYER, 1977, p. 191). Com isso, se quer dizer que não há uma separação entre atividade intelectual e atividade física. Ambas são forjadas historicamente. A separação das mesmas só ocorre em uma socieda- de cuja divisão do trabalho separa os que têm a função de pensar dos que têm a função de fazer. Ora, nesse caso a habilidade física estaria se desenvolvendo nos sujeitos sociais por necessidades materiais e independentes da mediação de agentes qualificados. Quando a mediação existe, é preciso entender as suas razões. Na sociedade capitalista, a divisão do trabalho exige habilidades físicas para a força de traba- lho. O capitalismo moderno estimula tais habilidades para além da esfera do trabalho. Dessa forma, tais habilidades compreendi- das como um campo de ensinamento próprio encontram na Educação através da Educação Física a forma de sistematizar a aprendizagem daquelas. A sociedade capitalista criou condições para o surgimento ou redefinição de instituições que se dinamizam em seu interior. A escola, como uma dessas instituições, torna-se adequada ao novo ensinamento. Entretanto, a sociedade capitalista também gera suas contradições e por essa razão surgem diferentes concepções e práti- cas de Educação Física mas todas elas produtos das condições histó- ricas que as engendraram. Lucien Goldmann (1972) mostra a necessidade de vincular a história das idéias com a história dos fatos econômicos e sociais. Mostra também que as ciências históricas implicam um estudo da ação consciente ou inconsciente do homem diante das condições subjetivas e objetivas da realidade social. Não sendo a consciência mais do que um aspecto real mas parcial da atividade humana, o estudo histórico não tem o direito de limitar-se I N T R O D U Ç Ã O 17 aos fenômenos conscientes, devendo vincular as intenções conscientes dos agentes da história à significação objetiva de seu comportamento e de suas ações (GOLDMANN, 1972, p. 27). Na análise dialética, apanha-se o todo. A realidade é construída teórica e praticamente. A pesquisa permite descobrir e reconstituir a realidade pensada. A contradição, e não a identidade, é o funda- mento principal dessa análise. Na história da sociedade [...] prevalece o fim consciente, refletido e desejado! Homens dotados de consciências, agindo com reflexão ou paixão e visando fins determinados. [...] Acima dos motivos pessoais e ideais, que aparentemente dirigem as ações dos homens e sua história, ficam as causas históricas, mais ou menos ocultas e mais ou menos inconscientes, que se transformam naqueles motivos no cérebro dos homens que agem. Por conseguinte, as forças motrizes da história refletem dois tipos de componentes dinâmicos. Os motivos pessoais e ideais, que parecem ser decisivos, apenas possuem uma importância secundária para o resultado final, qualquer que seja a importância deles para o estudo histórico. As causas materiais, que se ocultam por trás daqueles motivos, é que são verdadeiramente forças determinantes e permitem explicar, através das ações e das relações dos homens entre si, os acontecimentos e o curso do processo histórico (MARX, 1984, p. 137). Essa citação aponta para indicadores que foram considerados para resgatar a origem e o desenvolvimento do ideário e das práticas de Educação Física, em determinado momento da história brasileira. Motivos pessoais e ideais revelaram as causas materiais imbricadas em seus propósitos sobre a Educação Física. Foi preciso cumprir duas etapas para a realização deste livro: a etapa da investigação, que implicou o levantamento bibliográfico e a identificação de documentação primária e secundária, e a etapa da exposição, que constituiu o modo de explicitação do objeto estuda- do contido na presente redação. O levantamento bibliográfico e posterior seleção de textos per- mitiram selecionar aqueles que foram citados neste trabalho e, A E D U C A Ç Ã O F Í S I C A N A P O L Í T I C A E D U C A C I O N A L D O B R A S I L P Ó S -64 18 portanto, utilizados como fontes; aqueles que se constituíram nos fundamentos históricos, teóricos e metodológicos deste trabalho e compõem a bibliografia anexa; aqueles cujas temáticas específicas serviram para esclarecer problemas periféricos; e, finalmente, aqueles que foram abandonados durante a pesquisa. As fontes documentais foram mais trabalhosas e demandaram um tempo bastante grande do pesquisador. Nem sempre suas indicações eram precisas, o que obrigava a recorrer às fontes indi- retas para que fossem encontrados os documentos originais. Re- correu-se, muitas vezes, a arquivos particulares para obtenção de registros mais precisos. Mesmo determinados dados quantitativos, que poderiam ter sido úteis nesta pesquisa, não foram encontrados nos organismos oficiais. Outros registros pouco conservados difi- cultaram um estudo sobre eles. Após tudo ter sido levantado, nas condições possíveis - fosse pelas fontes, fosse pelas limitações do pesquisador - procedeu-se à necessária confrontação dos dados e registros para assegurar a validade histórica de seus conteúdos e proceder à análise sobre os mesmos. Este livro é divido em três capítulos. O primeiro contempla o contexto político-econômico do período que permitiu forjar o novo campo da Educação Física; as questões políticas e econômicas que provocaram novas divisões do trabalho, possibilitando ampliar a atuação do profissional de Educação Física em determinado campo de trabalho; e o contexto político-educacional, que deu espaço para a Educação Física ser desenvolvida no sistema escolar, possibilitando condições para a atuação desse profissional. O segundo capítulo expõe os intensos debates que se travaram na instância jurídica sobre a forma de aplicação do artigo 22 da LDB de 1961 e que culminaram na promulgação de um instrumento arbitrário e autoritário destituído de fundamentos científicos, mas permeado de razões políticas e ideológicas. Traz, também, as novas razões da Educação Física nas diferentes frentes em que atuou, adequando-se ao modelo econômico-político vigente. Há uma exposição sobre o entendimento que os profissionais da Educação I N T R O D U Ç Ã O 19 Física tinham de sua atuação para poder dar conta de solucionar as deficiências físicas da população brasileira antes do Decreto-Lei nº. 705/69 e dos “desvios” políticos dos jovens após essa norma. A prática concreta vai demonstrar a exclusão dos segmentos subalter- nizados e a eugenia do mundo natural vai dar lugar à eugenia do mundo do trabalho. O terceiro capítulo expõe o processo de expansão do recruta- mento e da formação dos novos profissionais da Educação Física com o alinhamento das diretrizes do regime militar assentados nas reformas educacionais em discussão. Expõe também como esse novo profissional passa a ser assimilado no sistema escolar, revelando a expectativa que se tem sobre o seu papel. Finalmente, retornou-se ao ponto de partida agora com o obje- to pensado. As contradições reveladas neste trabalho apontam para uma certa positividade da Educação Física. Esta poderá ser apre- endida na relação contraditória entre sua identidade social e negação social. A E D U C A Ç Ã O F Í S I C A N A P O L Í T I C A E D U C A C I O N A L D OB R A S I L P Ó S -64 18 portanto, utilizados como fontes; aqueles que se constituíram nos fundamentos históricos, teóricos e metodológicos deste trabalho e compõem a bibliografia anexa; aqueles cujas temáticas específicas serviram para esclarecer problemas periféricos; e, finalmente, aqueles que foram abandonados durante a pesquisa. As fontes documentais foram mais trabalhosas e demandaram um tempo bastante grande do pesquisador. Nem sempre suas indicações eram precisas, o que obrigava a recorrer às fontes indi- retas para que fossem encontrados os documentos originais. Re- correu-se, muitas vezes, a arquivos particulares para obtenção de registros mais precisos. Mesmo determinados dados quantitativos, que poderiam ter sido úteis nesta pesquisa, não foram encontrados nos organismos oficiais. Outros registros pouco conservados difi- cultaram um estudo sobre eles. Após tudo ter sido levantado, nas condições possíveis - fosse pelas fontes, fosse pelas limitações do pesquisador - procedeu-se à necessária confrontação dos dados e registros para assegurar a validade histórica de seus conteúdos e proceder à análise sobre os mesmos. Este livro é divido em três capítulos. O primeiro contempla o contexto político-econômico do período que permitiu forjar o novo campo da Educação Física; as questões políticas e econômicas que provocaram novas divisões do trabalho, possibilitando ampliar a atuação do profissional de Educação Física em determinado campo de trabalho; e o contexto político-educacional, que deu espaço para a Educação Física ser desenvolvida no sistema escolar, possibilitando condições para a atuação desse profissional. O segundo capítulo expõe os intensos debates que se travaram na instância jurídica sobre a forma de aplicação do artigo 22 da LDB de 1961 e que culminaram na promulgação de um instrumento arbitrário e autoritário destituído de fundamentos científicos, mas permeado de razões políticas e ideológicas. Traz, também, as novas razões da Educação Física nas diferentes frentes em que atuou, adequando-se ao modelo econômico-político vigente. Há uma exposição sobre o entendimento que os profissionais da Educação I N T R O D U Ç Ã O 19 Física tinham de sua atuação para poder dar conta de solucionar as deficiências físicas da população brasileira antes do Decreto-Lei nº. 705/69 e dos “desvios” políticos dos jovens após essa norma. A prática concreta vai demonstrar a exclusão dos segmentos subalter- nizados e a eugenia do mundo natural vai dar lugar à eugenia do mundo do trabalho. O terceiro capítulo expõe o processo de expansão do recruta- mento e da formação dos novos profissionais da Educação Física com o alinhamento das diretrizes do regime militar assentados nas reformas educacionais em discussão. Expõe também como esse novo profissional passa a ser assimilado no sistema escolar, revelando a expectativa que se tem sobre o seu papel. Finalmente, retornou-se ao ponto de partida agora com o obje- to pensado. As contradições reveladas neste trabalho apontam para uma certa positividade da Educação Física. Esta poderá ser apre- endida na relação contraditória entre sua identidade social e negação social. 1 O M O M E N T O D A I M P L A N T A Ç Ã O D A E D U C A Ç Ã O F Í S I C A N O S I S T E M A D E E N S I N O N O S A N O S 6 0 A compreensão da finalidade da Educação Física no Brasil nos anos 60, no âmbito do sistema escolar, deve ser apreendida no estudo dos fatos econômicos e sociais e nas idéias dessa época. A emergência do setor industrial como hegemônico carrega uma herança dos momentos anteriores (Movimento de 30, Estado Novo, Modelo de substituição das importações), provocando um confronto de interesses diversos, tais como a resistência às mudanças sociais no mundo latifundiário; os grupos ligados à política de internacionali- zação do capital que buscavam o poder político por ser este indis- pensável para sua reprodução, e a burguesia nacional, que preferia se 1 O M O M E N T O D A I M P L A N T A Ç Ã O D A E D U C A Ç Ã O F Í S I C A N O S I S T E M A D E E N S I N O N O S A N O S 6 0 A compreensão da finalidade da Educação Física no Brasil nos anos 60, no âmbito do sistema escolar, deve ser apreendida no estudo dos fatos econômicos e sociais e nas idéias dessa época. A emergência do setor industrial como hegemônico carrega uma herança dos momentos anteriores (Movimento de 30, Estado Novo, Modelo de substituição das importações), provocando um confronto de interesses diversos, tais como a resistência às mudanças sociais no mundo latifundiário; os grupos ligados à política de internacionali- zação do capital que buscavam o poder político por ser este indis- pensável para sua reprodução, e a burguesia nacional, que preferia se A E D U C A Ç Ã O F Í S I C A N A P O L Í T I C A E D U C A C I O N A L D O B R A S I L P Ó S -64 22 aliar à burguesia internacional a fazer concessões à nova força de trabalho industrial. Esse confronto estava posto em uma sociedade em que o movi- mento operário ainda era vulnerável, o campo estava iniciando a organização dos trabalhadores através das ligas camponesas, o estrato médio da população era saturado pela propaganda anticomunista, a Aliança para o Progresso difundia a ideologia contra a Revolução Cubana e financiava programas de hostilidade contra o governo do Presidente João Goulart e os intelectuais comprometidos com as classes dominantes atuavam como formadores da opinião pública nos meios de comunicação, nas escolas, nas igrejas, nas organizações do tipo Instituto de Pesquisas e Estudos Sociais (IPES) e Instituto Brasileiro de Ação Democrática (IBAD). O golpe militar de 1964 vem dar uma direção para esses confli- tos, não só impedindo, mas eliminando o movimento progressista e minando suas resistências ao longo dos anos posteriores. Assim, a implantação do regime militar não foi apenas mais um golpe latino- americano, mas foi decorrente de uma articulação política interna e externa objetivando colocar o Brasil alinhado aos interesses interna- cionais do capitalismo e aliado dos Estados Unidos na guerra fria em combate à ideologia socialista. Os anos 60 são também marcados por fatos significativos no campo da Educação. No período que antecedeu o golpe militar, o país vivia uma significativa experiência de Educação Popular expres- sa em diversos projetos. Dentre eles, houve o Movimento de Cultura Popular, cuja maior experiência ocorreu através do modelo de alfabetização de Paulo Freire; a Campanha de “Pé no chão também se aprende a ler”, desenvolvida pelo governo de Natal-RN; Movi- mento de Educação de Base difundido pela ala progressista da Igreja Católica e a criação dos Centros Populares de Cultura organizados pela União Nacional dos Estudantes (UNE). Esta última também liderava, junto com docentes universitários, o movimento pelo ensino público e gratuito no final dos anos 50 e posteriormente levantou a bandeira por reformas no ensino universitário. Ainda no 1 – O M O M E N T O D A I M P L A N T A Ç Ã O D A E D U C A Ç Ã O F Í S I C A . . . 23 início da década de 60, ocorreu a aprovação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Esta não ocorreu sem um intenso debate entre os defensores do ensino privado e os defensores do ensino público. A LDB contemplou as duas correntes e o ensino brasileiro foi organizado tanto pelo poder público como pelo poder privado, com vantagens para o último, que mais se desenvolveu nos anos seguintes. A LDB surge no momento da nova internacionaliza- ção do mercado e revela sua contradição porque faz a proclamação da Educação como direito e dever de todos, mas não considera a profunda desigualdade social existente, o que, na prática significa, que nem todos poderão ir à escola. O golpe de estado de 1964, cujos desdobramentos provocaram profundas mudanças no conjunto das relações sociais noBrasil, afetou significativamente a Educação e o sistema escolar, dando novos rumos à LDB em vigor. Ver-se-á como o pensamento nortea- dor que levou ao golpe militar e à mudança do modelo econômico- social no país contribuiu para evidenciar um certo pensamento e uma certa prática da Educação Física brasileira. À primeira vista, acreditou-se que a proposta da Educação Fí- sica, surgida no período em estudo, foi produto do autoritarismo do Regime Militar. Entretanto, tal proposta, ao receber o aval das organizações da categoria de professores de Educação Física e de grande parte dos docentes dessa área nas instituições de ensino superior, revelou o que estava embutido e que agora se permitia desvendar: consolidou-se, claramente, nesse momento uma identidade profissional e criou-se um campo de trabalho regula- mentado e exclusivo. É na relação entre o Estado autoritário, organismos da esfera cultural, mormente da Educação, e a infra-estrutura econômica que a Educação Física, por seus agentes, realiza sua mediação. Após o golpe, estava em implantação não só a nova estrutura po- lítico-econômica e social do país como também o processo de for- mação do homem adequado à nova estrutura. Tal estrutura baseada no sistema capitalista de produção, e, no caso brasileiro, no capita- A E D U C A Ç Ã O F Í S I C A N A P O L Í T I C A E D U C A C I O N A L D O B R A S I L P Ó S -64 22 aliar à burguesia internacional a fazer concessões à nova força de trabalho industrial. Esse confronto estava posto em uma sociedade em que o movi- mento operário ainda era vulnerável, o campo estava iniciando a organização dos trabalhadores através das ligas camponesas, o estrato médio da população era saturado pela propaganda anticomunista, a Aliança para o Progresso difundia a ideologia contra a Revolução Cubana e financiava programas de hostilidade contra o governo do Presidente João Goulart e os intelectuais comprometidos com as classes dominantes atuavam como formadores da opinião pública nos meios de comunicação, nas escolas, nas igrejas, nas organizações do tipo Instituto de Pesquisas e Estudos Sociais (IPES) e Instituto Brasileiro de Ação Democrática (IBAD). O golpe militar de 1964 vem dar uma direção para esses confli- tos, não só impedindo, mas eliminando o movimento progressista e minando suas resistências ao longo dos anos posteriores. Assim, a implantação do regime militar não foi apenas mais um golpe latino- americano, mas foi decorrente de uma articulação política interna e externa objetivando colocar o Brasil alinhado aos interesses interna- cionais do capitalismo e aliado dos Estados Unidos na guerra fria em combate à ideologia socialista. Os anos 60 são também marcados por fatos significativos no campo da Educação. No período que antecedeu o golpe militar, o país vivia uma significativa experiência de Educação Popular expres- sa em diversos projetos. Dentre eles, houve o Movimento de Cultura Popular, cuja maior experiência ocorreu através do modelo de alfabetização de Paulo Freire; a Campanha de “Pé no chão também se aprende a ler”, desenvolvida pelo governo de Natal-RN; Movi- mento de Educação de Base difundido pela ala progressista da Igreja Católica e a criação dos Centros Populares de Cultura organizados pela União Nacional dos Estudantes (UNE). Esta última também liderava, junto com docentes universitários, o movimento pelo ensino público e gratuito no final dos anos 50 e posteriormente levantou a bandeira por reformas no ensino universitário. Ainda no 1 – O M O M E N T O D A I M P L A N T A Ç Ã O D A E D U C A Ç Ã O F Í S I C A . . . 23 início da década de 60, ocorreu a aprovação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Esta não ocorreu sem um intenso debate entre os defensores do ensino privado e os defensores do ensino público. A LDB contemplou as duas correntes e o ensino brasileiro foi organizado tanto pelo poder público como pelo poder privado, com vantagens para o último, que mais se desenvolveu nos anos seguintes. A LDB surge no momento da nova internacionaliza- ção do mercado e revela sua contradição porque faz a proclamação da Educação como direito e dever de todos, mas não considera a profunda desigualdade social existente, o que, na prática significa, que nem todos poderão ir à escola. O golpe de estado de 1964, cujos desdobramentos provocaram profundas mudanças no conjunto das relações sociais no Brasil, afetou significativamente a Educação e o sistema escolar, dando novos rumos à LDB em vigor. Ver-se-á como o pensamento nortea- dor que levou ao golpe militar e à mudança do modelo econômico- social no país contribuiu para evidenciar um certo pensamento e uma certa prática da Educação Física brasileira. À primeira vista, acreditou-se que a proposta da Educação Fí- sica, surgida no período em estudo, foi produto do autoritarismo do Regime Militar. Entretanto, tal proposta, ao receber o aval das organizações da categoria de professores de Educação Física e de grande parte dos docentes dessa área nas instituições de ensino superior, revelou o que estava embutido e que agora se permitia desvendar: consolidou-se, claramente, nesse momento uma identidade profissional e criou-se um campo de trabalho regula- mentado e exclusivo. É na relação entre o Estado autoritário, organismos da esfera cultural, mormente da Educação, e a infra-estrutura econômica que a Educação Física, por seus agentes, realiza sua mediação. Após o golpe, estava em implantação não só a nova estrutura po- lítico-econômica e social do país como também o processo de for- mação do homem adequado à nova estrutura. Tal estrutura baseada no sistema capitalista de produção, e, no caso brasileiro, no capita- A E D U C A Ç Ã O F Í S I C A N A P O L Í T I C A E D U C A C I O N A L D O B R A S I L P Ó S -64 24 lismo associado e dependente, o homem pensado concretamente seria forjado na dinâmica dessas novas relações sociais. Aqui a Educação Física também dará a sua contribuição. Nesse capítulo, procurar-se-á demonstrar como o contexto dos anos 60 gerou as condições que permitiram à Educação Física cumprir um novo papel e contribuir na formação do homem neces- sário ao novo momento político e econômico. Certos requisitos atribuídos à força de trabalho do momento pós-64, tais como a destreza, disciplina, competição e ufanismo nacional, encontram na Educação Física uma colaboradora importante no campo da educa- ção formal. O c o n t e x t o p o l í t i c o - e c o n ô m i c o f o r j a o n o v o c a m p o d a E d u c a ç ã o F í s i c a Com a tese de “50 anos em 5”, Juscelino Kubistcheck de Olivei- ra, presidente da República no período 1956-1961, pôs em marcha o modelo nacional-desenvolvimentista no Brasil na década de cin- qüenta. O país abria as portas para o capital multinacional aliando- se ao capital nacional e ao capital de Estado, originando uma forma de capitalismo associado-dependente para impulsionar a economia. Tal avanço ocorria em meio a um processo político democratizante sob um governo de tipo populista. Essa combinação, aos olhos dos segmentos mais conservadores, era um impedimento à ordem econômica externa, pois estavam preocupados em assegurar tranqüi- lidade aos investidores do exterior. Os segmentos mais progressistas, entretanto, não aceitavam os propósitos dos investidores estrangei- ros e seus aliados nacionais e exigiam mudanças nas esferas social, cultural e econômica. Nesta última, a luta centrava-se na necessidade de melhorar a distribuição de rendas. No entanto, o golpe de 64 não pode ser creditado apenas como uma resposta às investidas democráticas dos partidos, dos movimen- tos sociais e sindicais progressistas da época. Era forte a tese de que a sociedade civil era frágil e mesmo incompetente para decidir sobre 1 – O M O M E N T O D A I M P L A N T A Ç Ã O D A E D U C A Ç Ã O F Í S I C A . . . 25 seu próprio destino. Além disso,era visível o medo que os conserva- dores tinham do avanço do movimento comunista. Para eles, as reivindicações populares e o avanço dos movimentos progressistas - muitas vezes, também entendidos como comunistas - levariam o país ao caos. Com essas teses, os setores mais conservadores ganharam adeptos envolvendo correntes políticas, intelectuais, setores da igreja etc. A idéia central era a de que, sendo a sociedade civil amorfa, era necessário que fosse tutelada por sua elite, por um Estado forte. Não por acaso o Instituto de Pesquisas e Estudos Sociais (IPES), criado em 1961 por empresários paulistas e cariocas para desenvolver o pensamento de sustentação da economia moderna, ou seja, o da inter- nacionalização do capital nacional associado colabora com o golpe de Estado aplicado ao país em 1964, cuja data oficial é de 31 de março, apesar do mesmo haver ocorrido em 1º. de abril. Passa a exercer um papel fundamental no período pós-64, elaborando o novo pensamento das bases empresariais e da função do Estado, inclusive formulando diretrizes educacionais que seriam levadas a efeito a partir de l968. O objetivo foi o de colocar o Brasil em sintonia com o mundo capitalista moderno, privatizando a acumulação de riqueza e sociali- zando os custos para o conjunto da população, fossem estes sociais ou econômicos, ou ambos. A associação, de capitais nacional e estrangeiro, só seria bem vinda se os ganhos para seus investidores fossem garantidos, ainda que o preço a pagar fosse, a médio e longo prazo, o aviltamento das condições de vida da maioria da população, principalmente das camadas subalternas. Estas, portanto, deveriam permanecer caladas e se submeter aos programas destinados a elas no campo do mercado de trabalho, de educação, de saúde, de habi- tação e de lazer, maquiados pela ideologia da ascensão social e do estilo de vida modernizante. O que ocorreu em abril de 1964 não foi um golpe militar conspirativo, mas sim o resultado de uma campanha política, ideológica e militar traçada pela elite orgânica centrada no complexo Ipes/Ibad. Tal campanha culminou em abril de 1964 com a ação militar, que se fez necessária para derrubar o Executivo e conter daí para frente a participação da massa (DREIFUSS, 1981, p. 230). A E D U C A Ç Ã O F Í S I C A N A P O L Í T I C A E D U C A C I O N A L D O B R A S I L P Ó S -64 24 lismo associado e dependente, o homem pensado concretamente seria forjado na dinâmica dessas novas relações sociais. Aqui a Educação Física também dará a sua contribuição. Nesse capítulo, procurar-se-á demonstrar como o contexto dos anos 60 gerou as condições que permitiram à Educação Física cumprir um novo papel e contribuir na formação do homem neces- sário ao novo momento político e econômico. Certos requisitos atribuídos à força de trabalho do momento pós-64, tais como a destreza, disciplina, competição e ufanismo nacional, encontram na Educação Física uma colaboradora importante no campo da educa- ção formal. O c o n t e x t o p o l í t i c o - e c o n ô m i c o f o r j a o n o v o c a m p o d a E d u c a ç ã o F í s i c a Com a tese de “50 anos em 5”, Juscelino Kubistcheck de Olivei- ra, presidente da República no período 1956-1961, pôs em marcha o modelo nacional-desenvolvimentista no Brasil na década de cin- qüenta. O país abria as portas para o capital multinacional aliando- se ao capital nacional e ao capital de Estado, originando uma forma de capitalismo associado-dependente para impulsionar a economia. Tal avanço ocorria em meio a um processo político democratizante sob um governo de tipo populista. Essa combinação, aos olhos dos segmentos mais conservadores, era um impedimento à ordem econômica externa, pois estavam preocupados em assegurar tranqüi- lidade aos investidores do exterior. Os segmentos mais progressistas, entretanto, não aceitavam os propósitos dos investidores estrangei- ros e seus aliados nacionais e exigiam mudanças nas esferas social, cultural e econômica. Nesta última, a luta centrava-se na necessidade de melhorar a distribuição de rendas. No entanto, o golpe de 64 não pode ser creditado apenas como uma resposta às investidas democráticas dos partidos, dos movimen- tos sociais e sindicais progressistas da época. Era forte a tese de que a sociedade civil era frágil e mesmo incompetente para decidir sobre 1 – O M O M E N T O D A I M P L A N T A Ç Ã O D A E D U C A Ç Ã O F Í S I C A . . . 25 seu próprio destino. Além disso, era visível o medo que os conserva- dores tinham do avanço do movimento comunista. Para eles, as reivindicações populares e o avanço dos movimentos progressistas - muitas vezes, também entendidos como comunistas - levariam o país ao caos. Com essas teses, os setores mais conservadores ganharam adeptos envolvendo correntes políticas, intelectuais, setores da igreja etc. A idéia central era a de que, sendo a sociedade civil amorfa, era necessário que fosse tutelada por sua elite, por um Estado forte. Não por acaso o Instituto de Pesquisas e Estudos Sociais (IPES), criado em 1961 por empresários paulistas e cariocas para desenvolver o pensamento de sustentação da economia moderna, ou seja, o da inter- nacionalização do capital nacional associado colabora com o golpe de Estado aplicado ao país em 1964, cuja data oficial é de 31 de março, apesar do mesmo haver ocorrido em 1º. de abril. Passa a exercer um papel fundamental no período pós-64, elaborando o novo pensamento das bases empresariais e da função do Estado, inclusive formulando diretrizes educacionais que seriam levadas a efeito a partir de l968. O objetivo foi o de colocar o Brasil em sintonia com o mundo capitalista moderno, privatizando a acumulação de riqueza e sociali- zando os custos para o conjunto da população, fossem estes sociais ou econômicos, ou ambos. A associação, de capitais nacional e estrangeiro, só seria bem vinda se os ganhos para seus investidores fossem garantidos, ainda que o preço a pagar fosse, a médio e longo prazo, o aviltamento das condições de vida da maioria da população, principalmente das camadas subalternas. Estas, portanto, deveriam permanecer caladas e se submeter aos programas destinados a elas no campo do mercado de trabalho, de educação, de saúde, de habi- tação e de lazer, maquiados pela ideologia da ascensão social e do estilo de vida modernizante. O que ocorreu em abril de 1964 não foi um golpe militar conspirativo, mas sim o resultado de uma campanha política, ideológica e militar traçada pela elite orgânica centrada no complexo Ipes/Ibad. Tal campanha culminou em abril de 1964 com a ação militar, que se fez necessária para derrubar o Executivo e conter daí para frente a participação da massa (DREIFUSS, 1981, p. 230). A E D U C A Ç Ã O F Í S I C A N A P O L Í T I C A E D U C A C I O N A L D O B R A S I L P Ó S -64 26 O que o complexo Ipes/Ibad representou no âmbito civil das classes dominantes e suas aliadas, a Escola Superior de Guerra – ESG representou no âmbito do Estado, elaborando o pensamento do “Desenvolvimento com Segurança” e legalizando o uso da força; consolidando, assim, uma rede civil-militar que institucionalizou e disseminou a Doutrina de Segurança Nacional e Desenvolvimento Econômico. O Ipes, Oculto debaixo da aparência de organização de caráter educativo, coordenava larga campanha política, ideológica e militar, contrária ao governo do país (VIEIRA, 1987, p.150). A criação e manutenção de tais organismos revelam a importân- cia dada à produção de idéias e à elaboração de planejamento por parte das classes proprietárias e dos segmentos militares. Em 25 anos de existência, puderam construir uma teoria contendo elementos ideológicos e diretrizes para programas governamentais. Essas dire- trizes implicavam infiltrar ideologias, coletar informações e planejar intervenções naqueles programas. A questão da Segurança Nacional foi um propósito do governo norte-americanopara manter sob seu controle os países do conti- nente no contexto da Guerra Fria. Daí que a ideologia da Segurança Nacional se configurou um facilitador do desenvolvimento de um capitalismo associado e dependente no Brasil. Foi uma decisão política para o país com significativas perdas para seu desenvolvi- mento autônomo e para as reivindicações das massas. Segundo Alves (1987, p. 26) Em sua variante teórica brasileira, a Doutrina de Segurança Nacional e Desenvolvimento constitui um corpo orgânico de pensamento que inclui uma teoria de guerra, uma teoria de revolução e subversão interna, uma teoria do papel do Brasil na política mundial, e um modelo específico de desenvolvimento econômico associado- dependente. 1 – O M O M E N T O D A I M P L A N T A Ç Ã O D A E D U C A Ç Ã O F Í S I C A . . . 27 A existência de ideologias divergentes no Brasil, ou seja, ideologia de cunho socialista opondo-se a ideologia de cunho capitalista alimen- tava a idéia de segurança nacional por parte dos defensores da segun- da. Portanto, a idéia de segurança alinhava-se a um certo modelo econômico, garantindo o desenvolvimento deste. Segurança significa- va manter a estabilidade institucional contra os interesses de outras classes ou segmentos sociais discordantes da nova proposta. Significa- va, portanto, controlar, suprimir ou substituir organismos, tais como partidos, organizações, sindicatos ou outras formas estruturadas na sociedade civil. O modelo econômico em implantação exigia um Estado forte e centralizador, no qual o desenvolvimento econômico ao pressupor o desenvolvimento social pretendia fazê-lo sem que houvesse vozes divergentes. O investidor estrangeiro procurava retorno rápido e garantido. Isso significava que o desenvolvimento econômico deve- ria vir acompanhado de uma intensa concentração de renda, provo- cando um desnível social crescente. Era preciso combinar segurança e estabilidade das instituições políticas e das instituições econômicas e jurídicas com o controle das insatisfações populares. A consolidação da internacionalização da sociedade brasileira pelas políticas pós-64 define uma correlação de forças sociais em que predominam os setores do capital estrangeiro, do grande capital nacional associado ao exterior e do capital estatal. Isso significa que essas forças comandam a política nas várias áreas da sociedade, inclusive em relação ao lugar que devem ocupar as classes subordinadas (KAWAMURA, 1990, p. 60). Para Ianni (1984), a ditadura militar instaurada significou a as- censão da burguesia financeira monopolista e do Estado sobre as classes subordinadas, sobre os cidadãos e sobre a sociedade civil como um todo. Sob o poder estatal ocorreu uma ampla expansão da empresa privada, impulsionando a produção da mais-valia e intensi- ficando a acumulação de capital. O poder estatal confunde-se com a A E D U C A Ç Ã O F Í S I C A N A P O L Í T I C A E D U C A C I O N A L D O B R A S I L P Ó S -64 26 O que o complexo Ipes/Ibad representou no âmbito civil das classes dominantes e suas aliadas, a Escola Superior de Guerra – ESG representou no âmbito do Estado, elaborando o pensamento do “Desenvolvimento com Segurança” e legalizando o uso da força; consolidando, assim, uma rede civil-militar que institucionalizou e disseminou a Doutrina de Segurança Nacional e Desenvolvimento Econômico. O Ipes, Oculto debaixo da aparência de organização de caráter educativo, coordenava larga campanha política, ideológica e militar, contrária ao governo do país (VIEIRA, 1987, p.150). A criação e manutenção de tais organismos revelam a importân- cia dada à produção de idéias e à elaboração de planejamento por parte das classes proprietárias e dos segmentos militares. Em 25 anos de existência, puderam construir uma teoria contendo elementos ideológicos e diretrizes para programas governamentais. Essas dire- trizes implicavam infiltrar ideologias, coletar informações e planejar intervenções naqueles programas. A questão da Segurança Nacional foi um propósito do governo norte-americano para manter sob seu controle os países do conti- nente no contexto da Guerra Fria. Daí que a ideologia da Segurança Nacional se configurou um facilitador do desenvolvimento de um capitalismo associado e dependente no Brasil. Foi uma decisão política para o país com significativas perdas para seu desenvolvi- mento autônomo e para as reivindicações das massas. Segundo Alves (1987, p. 26) Em sua variante teórica brasileira, a Doutrina de Segurança Nacional e Desenvolvimento constitui um corpo orgânico de pensamento que inclui uma teoria de guerra, uma teoria de revolução e subversão interna, uma teoria do papel do Brasil na política mundial, e um modelo específico de desenvolvimento econômico associado- dependente. 1 – O M O M E N T O D A I M P L A N T A Ç Ã O D A E D U C A Ç Ã O F Í S I C A . . . 27 A existência de ideologias divergentes no Brasil, ou seja, ideologia de cunho socialista opondo-se a ideologia de cunho capitalista alimen- tava a idéia de segurança nacional por parte dos defensores da segun- da. Portanto, a idéia de segurança alinhava-se a um certo modelo econômico, garantindo o desenvolvimento deste. Segurança significa- va manter a estabilidade institucional contra os interesses de outras classes ou segmentos sociais discordantes da nova proposta. Significa- va, portanto, controlar, suprimir ou substituir organismos, tais como partidos, organizações, sindicatos ou outras formas estruturadas na sociedade civil. O modelo econômico em implantação exigia um Estado forte e centralizador, no qual o desenvolvimento econômico ao pressupor o desenvolvimento social pretendia fazê-lo sem que houvesse vozes divergentes. O investidor estrangeiro procurava retorno rápido e garantido. Isso significava que o desenvolvimento econômico deve- ria vir acompanhado de uma intensa concentração de renda, provo- cando um desnível social crescente. Era preciso combinar segurança e estabilidade das instituições políticas e das instituições econômicas e jurídicas com o controle das insatisfações populares. A consolidação da internacionalização da sociedade brasileira pelas políticas pós-64 define uma correlação de forças sociais em que predominam os setores do capital estrangeiro, do grande capital nacional associado ao exterior e do capital estatal. Isso significa que essas forças comandam a política nas várias áreas da sociedade, inclusive em relação ao lugar que devem ocupar as classes subordinadas (KAWAMURA, 1990, p. 60). Para Ianni (1984), a ditadura militar instaurada significou a as- censão da burguesia financeira monopolista e do Estado sobre as classes subordinadas, sobre os cidadãos e sobre a sociedade civil como um todo. Sob o poder estatal ocorreu uma ampla expansão da empresa privada, impulsionando a produção da mais-valia e intensi- ficando a acumulação de capital. O poder estatal confunde-se com a A E D U C A Ç Ã O F Í S I C A N A P O L Í T I C A E D U C A C I O N A L D O B R A S I L P Ó S -64 28 economia política. O povo passa a ser tutelado na exclusão do direito ao exercício pleno da cidadania. Tudo isso indica a anulação da cidadania. Sob várias formas, por meio do golpe de Estado, da manipulação dos partidos, da falsificação de resultados eleitorais, da manipulação das estatísticas, de todas as formas de violência, os governantes e os seus associados anulam também a cidadania. Na prática, criam-se diversas classes de cidadãos: analfabetos e alfabetizados; homens e mulheres, urbanos e rurais; brancos, índios e negros; impolutos e subversivos; militares e paisanos; burgueses e operários. Ao estabelecer que a sociedade é frágil ou amorfa, os governantes, muitos intelectuais, as frações de classes representados nos blocos de poder estabelecem, ao mesmo tempo, que o povo, o cidadão, precisa ser tutelado. Para reduzir, ou anular, ainda mais a cidadania de cada um e todos,