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BOTÂNICA SISTEMÁTICA Ronei Tiago Stein Taxonomia e o Código Internacional de Nomenclatura Botânica Objetivos de aprendizagem Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados: Distinguir o estudo da taxonomia das demais áreas das ciências biológicas. Reconhecer a importância do Código Internacional de Nomenclatura Botânica. Identificar critérios de designação da nomenclatura botânica. Introdução Os sistemas botânicos utilizam nomes científicos latinizados. Cada táxon (por exemplo, espécie, gênero, família) tem um nome que é utilizado em todo o mundo. A utilização de nomes científicos é fundamental para uma comunicação eficiente e acurada sobre plantas em um contexto global. Contudo, os nomes científicos devem seguir princípios e regras, os quais estão contidos no Código Internacional de Nomenclatura Botâ- nica (ICBN). Esse código reconhece sete categorias principais: reino, filo, classe, ordem, família, gênero e espécie. Neste capítulo, vamos estudar a importância do ICBN e aprender quais são as regras, os cuidados e os critérios na nomenclatura botânica. Taxonomia e outras ciências biológicas Na taxonomia, grupos de organismos são descritos e nomes científi cos lhes são designados. O nome de um táxon nos dá acesso à informação disponível sobre ele. Por isso, é fundamental que todos os grupos de plantas tenham um nome que sirva de referencial. Isso é muito importante em nível de espécie, uma hierarquia taxonômica de especial utilidade para a humanidade (JUDD et al., 2009). De acordo Evert e Eichhorn (2016), a taxonomia é a disciplina responsável pela classificação dos organismos, permitindo o intercâmbio de informações entre as áreas da biologia. Bravo e Calor (2016) descrevem que a classificação é uma parte importante da taxonomia. Se o taxônomo nomeia os táxons (por exemplo, as espécies), paralelamente, ele os organiza em um sistema, levando em consideração seus diferentes níveis de abrangência. A taxonomia pode ser comparada a uma biblioteca. Bravo e Calor (2016) descrevem que, se os livros fossem colocados um ao lado do outro, sem critério de organização ou ordenamento, as pessoas teriam muita dificuldade em encontrar determinado exemplar. Quanto maior o acervo de livros, maior seria a dificuldade. Por isso, as bi- bliotecas ordenam os exemplares com base em algum tipo de critério, portanto, uma classificação. Assim, as bibliotecas, geralmente, ordenam seus livros por área, como física, matemática, biologia, medicina, agronomia, história, filosofia, etc. A taxonomia visa fazer praticamente o mesmo, porém, com as plantas, classificando-as por categorias, que são: reino, filo, classe, ordem, família, gênero e espécies (Figura 1). Assim, é importante seguir algumas regras para que essa classificação possa ocorrer. Figura 1. Comparação entre a organização de uma biblioteca e a organização feita por meio da taxonomia. Fonte: Rawpixel.com/Shutterstock.com. Taxonomia e o Código Internacional de Nomenclatura Botânica2 De maneira bastante simples, Bravo e Calor (2016) descrevem que a taxo- nomia é a área mais fundamental dos estudos da diversidade biológica, pois é a responsável pela nomenclatura dos seres vivos. Em um mundo sem conhe- cimento taxonômico, a comunicação sobre a biodiversidade seria impossível. Uma espécie só existe de maneira formal para a ciência quando recebe um nome, ainda que ela possa estar presente na natureza independentemente da nossa capacidade de identificá-la. As espécies nomeadas pela taxonomia, além de constituírem as unida- des fundamentais de estudos acadêmicos de zoologia e botânica e de serem fundamentais para trabalhos em genética e ecologia, também podem servir para fins práticos. Propostas para o estabelecimento de áreas prioritárias para conservação, práticas de manejo e controle de pragas agrícolas e estudos fo- renses também se apoiam fortemente no conhecimento taxonômico (BRAVO; CALOR, 2016). Apesar de seu desenvolvimento rápido, a ecologia pode ser considerada uma “ciência relativamente jovem”, pois ainda não existe uma fundamentação teórica totalmente rígida (PINTO-COELHO, 2007). A biologia se divide em diversas outras áreas, cada uma especializada no estudo específico de algo. Taxonomia: estudo que ordena e classifica os seres vivos. Biotecnologia: estudo da tecnologia com base na biologia. Biologia celular (ou citologia): estudo da células. Biologia evolutiva: estudo da evolução das espécies. Biologia sistêmica: estudo das interações entre os sistemas biológicos. Biologia da conservação: estudo da biodiversidade e da preservação das espécies. Botânica: estudo das plantas e das algas. Ecologia: ramo da biologia que estuda as interações entre os seres vivos e o meio onde vivem. Etologia: estudo do comportamento dos animais. Fisiologia: estudo das funções físicas, bioquímicas e mecânicas dos animais e vegetais. Genética: estudo dos genes e da hereditariedade. Microbiologia: estudo dos microrganismos. Zoologia: estudo dos animais vertebrados e invertebrados. Entre essas ciências, a ecologia merece especial atenção, pois diversas outras áreas estão relacionadas a ela ou dependem dela de algumas forma, conforme pode ser observado na Figura 2. 3Taxonomia e o Código Internacional de Nomenclatura Botânica Figura 2. Interação entre a ecologia e outras ciências. Ciências que fornecem ferramentas para o estudo ecológico e ciências nas quais o conhecimento ecológico pode ser aplicado. Fonte: Pinto-Coelho (2007, p. 13). De maneira geral, a ecologia procura responder a três perguntas básicas: 1. Onde estão os organismos? 2. Em quantos indivíduos ocorrem os organismos? 3. Por que os organismos lá estão (ou não estão)? Dentro de um sistema padronizado de classificação e nomenclatura, passou a ser possível armazenar, resgatar e relacionar informações acumuladas em diferentes épocas e partes do mundo. Desde a sua criação, o sistema de Lineu tem sofrido diversas modificações, e atualmente é composto por um conjunto Taxonomia e o Código Internacional de Nomenclatura Botânica4 de princípios e regras complexo organizado por uma comissão e publicado na forma de códigos. O naturalista, médico e professor Karl von Linée (1707–1778), cujo nome em português é Lineu, foi um naturalista sueco que lançou as bases do sistema atual de classifica- ção biológica. Lineu inaugurou um novo campo de estudo nas ciências naturais, a taxonomia. Código Internacional de Nomenclatura Botânica Todo ser vivo é conhecido por determinado nome, porém, esse nome não é dado de forma aleatória, mas respeitando um conjunto de normas e regras existente para cada grupo. Tratando-se da botânica, esse conjunto é conhecido por Código Internacional de Nomenclatura Botânica, ou pela sigla ICBN (AMABIS; MARTHO, 1997). A data de 1 de maio de 1753 foi adotada como o dia oficial do início da publicação dos nomes para os diferentes grupos taxonômicos. Cada nome está associado a um tipo nomenclatural, ou seja, ligado a um espécime tipo (holótipo). Esse espécime encontra-se arquivado em um herbário para referên- cia futura, caso surja alguma dúvida quanto à nomenclatura de uma espécie ou no caso de ser necessário rever a organização de um grupo taxonômico (ALMEIDA, 2017). De acordo com Fonseca e Vieira ([2015]), os herbários consistem em cole- ções botânicas onde são reunidas e ordenadas diferentes espécies de vegetais para promover o estudo científico. As coleções podem ser de plantas vivas ou mortas, devidamente armazenadas. Seguindo a tendência atual, há coleções botânicas virtuais de floras locais, regionais ou nacionais. Elas são compostas por fotos de plantas inteiras ou de ramos com flores e frutos, de grãos de pólen ou, ainda, por informações sobre sequências de DNA. Cada coleção recebe um nome e sua existência em determinada instituição, que pode ser de estudo ou pesquisa, com finalidades bem estabelecidas, requerendo um espaçofísico, dedicação do corpo de pesquisadores associados e gasto financeiro para sua correta manutenção. 5Taxonomia e o Código Internacional de Nomenclatura Botânica Os herbários têm como objetivo principal possibilitar e manter a comunicação científica entre os taxonomistas do mundo (JUDD et al., 2009). Fonseca e Vieira ([2015]) descrevem que as informações adquiridas são passadas por meio do intercâmbio entre herbários, que envolve permutas, empréstimos ou doações de espécimes, visando à sua identifica- ção por taxonomistas especialistas vinculados aos acervos. Dessa forma, os espécimes são corretamente identificados, aumentando a importância científica da coleção e permitindo o reconhecimento de floras locais, regionais, nacionais ou internacionais. O ICBN é atualizado a cada quatro anos, em congressos internacionais de botânica, e organizado com respeito aos princípios, regras e recomendações. Após a realização de um congresso internacional de botânica, o código é reedi- tado com as respectivas mudanças propostas. O ICBN reconhece sete categorias principais: reino, filo, classe, ordem, família, gênero e espécies (Figura 3). Figura 3. Esquema da ordem de classificação taxonômica. Fonte: alinabel/Shutterstock.com. Reino Filo Classe Ordem Família Gênero Espécie Taxonomia e o Código Internacional de Nomenclatura Botânica6 Contudo, o ICBN permite que outras categorias adicionais sejam inter- caladas. Essas categorias adicionadas utilizam os prefixos super- (acima) e sub- (abaixo). As categorias mais utilizadas, com seus sufixos padronizados, estão listadas no Quadro 1. Fonte: Adaptado de Judd et al. (2009). Categoria Sufixo padrão Reino Filo (ou Divisão) Subfilo (ou Subdivisão) Classe Subclasse Superordem Ordem Subordem Superfamília Família Subfamília Tribo Subtribo Gênero Espécie bionta phyta phtinha opsida idae anae ales ineae ariae aceae oideae eae ineae Nenhum; escrito em itálico, letra inicial maiúscula Nenhum; nome genérico e específico em itálico Quadro 1. Hierarquia das categorias taxonômicas aceitas pelo ICBN As categorias acima do gênero têm terminações (sufixos) padronizadas. As categorias de uma classificação são construções da mente humana, com significado relativo, e não absoluto, enquanto os taxa (grupos monofiléticos de organismos) são os produtos da evolução e, assim, representam entidades reais. Por esse motivo, alguns taxonomistas têm proposto a eliminação das categorias (JUDD et al., 2009). 7Taxonomia e o Código Internacional de Nomenclatura Botânica Os princípios e regras para construir e utilizar nomes científicos estão contidos no ICBN. Os nomes das espécies são compostos por duas palavras (ou seja, são binomiais). Os nomes de gêneros, famílias e outros taxa superiores são uninomiais (compostos por uma única palavra) e são palavras no plural (JUDD et al., 2009). Critérios de designação da nomenclatura botânica O nome de uma espécie é um binômio, ou seja, nome composto por duas pa- lavras. A primeira palavra, com a primeira letra sempre escrita em maiúscula, corresponde à categoria taxonômica superior, o gênero, enquanto a segunda palavra, escrita em minúsculas, corresponde ao nome ou epíteto específi co, geralmente, um caracterizador da espécie (BRAVO; CALOR, 2016). Araújo e Bossolan (2006) descrevem, de forma resumida, as regras em relação à nomenclatura binomial que devem ser seguidas/respeitadas. Os nomes devem ser em latim ou latinizados. O nome da espécie é sempre duplo (nomenclatura binomial). Os nomes devem ser escritos em itálico quando impressos e grifados quando manuscritos. O nome deve ser uninominal para gênero, binominal para espécie e trinominal para subespécie, ou seja, o homem pertence ao Gênero Homo, à Espécie Homo sapiens, e à Subespécie Homo sapiens sapiens. A primeira letra do gênero deve ser grafada em maiúscula, e espécie e subespécie, em letras minúsculas. Por exemplo: Auracaria angustfolia (pinheiro-do-paraná). O nome do autor é colocado sem qualquer pontuação, acompanhado por uma vírgula e o nome que foi publicado pela primeira vez (Canis Familiares L. 1758). O sufixo idae é utilizado para designar família em zoologia, e o sufixo aceae, em botânica. O nome dado em primeiro lugar deve ter prioridade em relação aos outros. Taxonomia e o Código Internacional de Nomenclatura Botânica8 Caso o gênero de um organismo tenha mudado devido a erros na pri- meira denominação, pode-se escrever o gênero antigo entre parênteses depois do novo gênero e antes da espécie. Também pode se escrever após a designação específica (com a nova denominação genérica) o nome do primeiro autor e a data entre parênteses, seguida do novo autor e da nova data fora do parênteses. Por exemplo: Ancylostoma (Agehylostoma) Duodenale ou Ancylostmoma Duodenale (Dublin, 1843) Creplin, 1845. Uma das principais regras da nomenclatura binomial é destacar o nome científico dos seres vivos no texto, escrevendo-o em itálico (inclinado) ou grifando-o. Além disso, a primeira letra do nome do gênero deve ser sempre maiúscula, e o nome da espécie, em letra minúscula. Judd et al. (2009) complementam essas regras apresentando os princípios nomenclaturais. Os autores apresentam seis princípios. 1. A nomenclatura botânica é independente da zoológica: os códigos de nomenclaturas botânica e zoológica têm princípios similares, po- rém, existem muitas diferenças específicas. Um dos resultados dessa independência dos códigos é que, eventualmente, uma planta e um animal poderão ter o mesmo nome. No entanto, essas duplicações são fortemente desencorajadas. 2. A aplicação de nomes para grupos taxonômicos é regida por meio de tipos nomenclaturais: quando uma nova espécie ou um novo táxon infraespecífico é descrito, o autor deve designar determinado espécime como tipo. Esse espécime, depositado em um herbário para eventuais estudos, é o holótipo. Assim, o nome de uma espécie nova está ligado a esse espécime em particular, que ilustra e representa aquilo que o autor tinha em mente quando descreveu o novo táxon. Duplicatas do holótipo em outros herbários, ou seja, partes da mesma planta ou indivíduos da mesma população que foram coletados ao mesmo tempo e no mesmo local que o holótipo, são denominados isótipos. 9Taxonomia e o Código Internacional de Nomenclatura Botânica Holótipo: único espécime de determinada espécie ou táxon infraespecífico designado como tipo pelo autor do nome do táxon; ou único exemplar designado pelo autor como tipo ou holótipo. O espécime portador do nome. Isótipo: espécime duplicado do holótipo, uma parte do mesmo indivíduo ou da mesma coleta que constitui o holótipo. 3. A nomenclatura dos grupos taxonômicos baseia-se no princípio de prioridade de publicação: o nome correto de um táxon é o primeiro nome publicado de acordo com as regras de nomenclatura botânica. 4. Cada táxon deve ter apenas um único nome correto, exceto em casos especificados: alguns nomes muito utilizados não são os primeiros nomes validamente publicados para os respectivos taxa. 5. Os nomes científicos são em latim ou latinizados, independentemente da sua origem: a utilização do latim para os nomes científicos origina-se no uso dessa língua como forma de comunicação global durante a Idade Média. O uso do latim facilita muito a comunicação entre sistematas de diversas culturas e linguagens. 6. As regras de nomenclatura são retroativas, exceto quando expressamente indicado: o ICBN é um sistema de regras e convenções a serem seguidas, mas que não necessariamente tem uma base biológica. Diferentes espécies podem pertencer ao mesmo gênero. Por exemplo, cachorros (das mais diferentes raças) pertencem ao Gênero Canis, da mesma forma que raposas, coiotes, lobos, chacais, entre outros. Entretanto, seus nomes científicos são diferentes: Cachorro: Canis lupus familiaris Lobo: Canis lupus Coiote: Canis latrans Diferentes espécies de fungos podem também ter múltiplosnomes científicos, dependendo do seu ciclo de vida e do modo de reprodução (que pode ser sexuada ou assexuada). Taxonomia e o Código Internacional de Nomenclatura Botânica10 Requisitos para nomear uma espécie nova Judd et al. (2009) mencionam que o ICBN resume os passos necessários para descrever um táxon recentemente descoberto, garantindo que o nome seja publi- cado de forma válida. Para isso, existem alguns passos, como os listados a seguir. As espécies devem ser nomeadas em latim ou latinizadas, em formato binomial, e não se deve duplicar outro nome que já existe. A categoria do nome deve ser claramente indicada. Um espécime tipo deve ser designado. A espécie deve ser descrita em latim ou em outra língua, acompanhada por uma breve diagnose em latim (uma enumeração dos atributos da espécie ou uma comparação com espécies similares) ou ligada a alguma referência em que conste uma descrição em latim. Todas essas informações devem ser validamente publicadas, ou seja, devem ser apresentadas em uma publicação que esteja disponível para outros botânicos, como revistas ou livros. ALMEIDA, S. Código internacional de nomenclatura botânica. Knoow.net, [s. l.], 16 jun. 2017. Disponível em: http://knoow.net/ciencterravida/biologia/codigo-internacional- -nomenclatura-botanica/. Acesso em: 11 maio 2019. AMABIS, J. M.; MARTHO, G. R. Fundamentos da biologia moderna. 2. ed. São Paulo: Moderna, 1997. ARAÚJO, A. P. U. de; BOSSOLAN, N. R. S. Noções de taxonomia e classificação: introdução à zoologia. [S. l.]: Instituto de Física de São Carlos, 2006. (Biologia II). Disponível em: http:// biologia.ifsc.usp.br/bio2/apostila/bio2_apostila_zoo_01.pdf. Acesso em: 11 maio 2019. BRAVO, F.; CALOR, A. R. (org.). Conhecendo os artrópodes do semiárido. São Paulo: Métis Produção Editorial, 2016. EVERT, R. F.; EICHHORN, S. E. Biologia vegetal. 8. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2016. FONSECA, R. S.; VIEIRA, M. F. Coleções botânicas: com enfoque em herbário. Viçosa, MG: UFV: CEAD, [2015]. Disponível em: https://www2.cead.ufv.br/serieconhecimento/ wp-content/uploads/2015/11/colecoes-botanicas-1.pdf. Acesso em: 11 maio 2019. JUDD, W. S. et al. Sistemática vegetal: um enfoque filogenético. 3. ed. Porto Alegre: Artmed, 2009. PINTO-COELHO, R. M. Fundamentos em ecologia. Porto Alegre: Artmed, 2007. 11Taxonomia e o Código Internacional de Nomenclatura Botânica
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