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Terapêutica – Andrade (cap 6) PREVENÇÃO E CONTROLE DA DOR Intervenções cirúrgicas mais complexas justifica-se o uso de analgésicos de ação periférica ou centro e antiinflamatórios, com objetivo de prevenir hiperalgesia e controlar o edema pós-operatório. MECANISMO DA DOR INFLAMATÓRIA: Nociceptores: receptores sensoriais da dor. Nociceptores envolvidos no processo da dor inflamatória são polimodais (sensíveis a diferentes estímulos) e de alto limiar de excitabilidade. Alodinia: nociceptores sensíveis a estímulos que normalmente não causam dor. Hiperalgesia: - Nociceptores mais sensíveis aos estímulos que causam dor. (maior sensibilidade frente à menor estímulo) - É decorrente de 2 eventos bioquímicos: (1) maior entrada de íons cálcio nos nociceptores; (2) estimulação da adenilato ciclase no tecido neuronal = aumento de AMPc (monofosfato de adenosina cíclico). - Consequentemente são gerados impulsos nervosos que chegam ao SNC, amplificando e mantendo a sensação dolorosa. - Os eventos bioquímicos ocorrem frente à síntese contínua de autacoides originários das células envolvidas nos processos inflamatórios. - Autacoides: prostagrandina; leucotrienos; e outros (cascata do ácido araquidônico). PRODUTOS DO METABOLISMO DO ÁCIDO ARAQUIDÔNICO: O ácido araquidônico é derivado do ácido linoleico, proveniente da dieta, que após a ingestão é esterificado em fosfolipídios das membranas celulares. Lesão tecidual = resposta inflamatória -> ativação da enzima fosfolipase A2 que atuará nos fosfolipídios das membranas das células envolvidas no processo inflamatório, liberando ácido araquidônico no citosol. Ácido araquidônico é instável e sofre ação de 2 sistemas enzimáticos: cicloxigenase e 5-lipoxigenase – produzindo assim os autacoides responsáveis pelo estado de hiperalgesia. VIA CICLOXIGENASE (COX): Através da enzima cicloxigenase, o ácido araquidônico irá gerar substâncias que produzem diferentes efeitos em função do tipo celular envolvido. Isoformas da COX = COX-1; COX-2; questiona-se Cox-3 nos tecidos do SNC. COX-1: - Encontrada em grande quantidade nas plaquetas, nos rins e na mucosa gástrica, na forma de enzima constitutiva (sempre presente). - Prostaglandinas são geradas de forma lente e estão envolvidas com processos fisiológicos, como a proteção da mucosa gástrica, regulação da função renal e agregação plaquetária. - Ou seja, pela ação de COX-1 as prostaglandinas são produzidas em condições normais. COX-2: - Presente em pequenas quantidades nos tecidos. Sua concentração aumenta em 80x após estímulo inflamatório – cicloxigenase pró-inflamatória. Dependendo do tipo celular e da enzima envolvida (COX-1 ou COX-2), o ác. araquidônico irá produzir metabólitos ativos com efeitos diferentes. Exemplos: Céls. Injuridas no local da inflamação = produção de prostaglandinas; céls endoteliais = prostaciclina; plaquetas = tromboxanas (agregação plaquetária). Com exceção das trombonaxas, todas as substâncias produzidas causam hiperalgesia. Prostaglandinas: promovem aumento na permeabilidade vascular, gerando edema. E potencializa os efeitos de outros autacoides, como a histamina e bradicinina. A lesão tecidual também irá sinalizar para que células fagocitárias (macrófagos e neutrófilos) produzam mais prostaglandinas diretamente no local inflamado, estimulando a liberação de outras substâncias também com propriedades pró-inflamatórias, como IL-1 e fator ativador de plaquetas (PAF). VIA DA 5-LIPOXIGENASE (LOX): Via de metabolização de ác. araquidônico produzindo autacoides denominados leucotrienos (LT). O leucotrieno B4 (LTB4) está envolvido no processo de hiperalgesia e também é um potente agente quimiotático para neutrófilos. LTB4 atrai os neutrófilos e outras células de defesa para o sítio inflamado, as quais fagocitam e neutralizam corpos estranhos. (pode gerar mais lesão tecidual) LTC4 + LTD4 + LTE4 = constituem a susbstância de reação lenta da anafilaxia (SRS-A). PARTICIPAÇÃO DOS NEUTRÓFILOS NO PROCESSO DE HIPERALGESIA: São as principais células efetoras da resposta inflamatória aguda. Lesão tecidual -> migração e acúmulo dessas células no local injuriado = participação direta na nocicepção. Quando neutrófilos produzem substâncias pró-inflamatórias em altas quantidades o processo inflamatório pode se tornar agressivo e destrutivo. REGIMES ANALGÉSICOS: FÁRMACOS QUE INIBEM A SÍNTESE DE CICLOXIGENASE (COX): São os anti-inflamatórios não esteroides (AINEs). Substância-padrão: Ácido acetilsalicílico (AAS) – possui atividade analgésica e antitérmica quando empregado em doses de 500-650mg, em adultos. Para obter ação anti-inflamatória são necessários 4-5g diários. Em pequenas doses, 40-100mg, inibe a ação plaquetária, sendo empregado na prevenção ou reincidência de fenômenos tromboembólicos, em portadores de doenças do SCV. A potência anti-inflamatória dos AINES varia de acordo com sua meia-vida plasmática e com a dose empregada. Perfil de efeitos adversos variáveis devido sua função sob COX-1. Indometacina – um dos primeiros aines comercializados; inibe igualmente COX-1 e COX-2 = boa eficácia anti- inflamatória, porém efeitos adversos inaceitáveis (principalmente por tempo prolongado). Inibidores seletivos de COX-2: - coxibes – efeitos adversos = já que COX-2 também possui papel importante em alguns processos fisiológicos, como regulação renal da excreção de sal através da renina, a homeostasia da pressão arterial e o controle da agregação plaquetária pelo endotélio vascular. - Por inibirem a síntese de prostaglandinas, os coxibes reduzem uma das defesas preliminares do endotélio vascular contra a hipertensão, a aterosclerose e a agregação plaquetária, além de promoverem um desequilíbrio a favor da vasoconstrição. = Uso crônico dos coxibes pode aumentar o risco de eventos cardiovasculares como infarto, AVE, hipertensão arterial e falência cardíaca. - DEVE SER EVITADO EM PACIENTES COM: Hipertensão arterial, doença cardíaca isquêmica ou com história de AVE. QUANDO E COMO EMPREGAR OS AINEs: Regime mais eficaz: analgesia preventiva – introduzido imediatamente após a lesão tecidual, porém antes do início da sensação dolorosa (ou seja, adm no final do procedimento, paciente ainda sob efeito da AL. Seguida das doses de manutenção). USO EM CRIANÇAS: Ibuprofeno é o único AINE aprovado para uso em crianças. DURAÇÃO DO TRATAMENTO COM AINE: 47 a 72h. PRECAUÇÕES E CONTRAINDICAÇÕES DOS AINEs: Ação analgésica e anti-inflamatória dos inibidores seletivos de Cox não não é superior aos não seletivos. O uso de coxibes (celecoxibe e etoricoxibe, no Brasil) deve ser considerado apenas para pacientes com risco aumentado de sangramento gastrintestinal, mas sem risco simultâneo de doença cardiovascular. Coxibes não é seguro para menores de 18 anos. Usa-se menor dose efetiva pelo menor tempo necessário. É contraindicado o uso de inibidores seletivos da COX-2 em pacientes que fazem uso contínuo de antiagregantes plaquetários, como aspirina ou clopidogrel. Piroxicam e ibuprofeno x varfarina – potencializa o efeito anticoagulante. Uso concomitante dos AINEs com anti-hipertensivos pode precipitar elevação brusca da PA – AINEs provocam retenção de Na e água -> redução da filtração glomerular -> aumento da PA. Deve-se evitar prescrição de inibidores da COX em pacientes com história de infarto do miocárdio, angina ou stents nas artérias coronárias – risco aumentado de trombose, especialmente em idosos. PARACETAMOL: Também é classificado como inibidor de cicloxigenase, apesar de quase não apresentar atividade anti- inflamatória (fraco inibidor de COX-1 e COX-2). Efeito analgésico atribuído a uma ação direta no SNC, pela ativação das vias serotoninérgicas descendentes. FÁRMACOS QUE INIBEM A AÇÃO DA FOSFOLIPASE A2:Corticosteroides. Modificações químicas na molécula da cortisona geraram vários análogos sintéticos, que diferem entre si pela potência relativa anti-inflamatória, pela equivalência entre as doses, pela atividade mineralocorticoide (retenção relativa de íons sódio), pelos efeitos colaterais indesejáveis e pela duração de ação, com base em suas meias-vidas plasmáticas e teciduais. MECANISMO DE AÇÃO DOS CORTICOSTEROIDES: Ação inibitória da enzima fosfolipase A2 – após a lesão tecidual, a inativação da enzima A2 reduz a disponibilidade de ácido araquidônico liberado das membranas celulares que participam da resposta inflamatória. Redução de ácido araquidônico = prejuízo na ação enzimática da COX e da 5-lipoxigenase = menor produção de prostaglandinas e leucotrienos. A ação dos corticosteroides é conseguida de maneira indireta. Primeiramente ocorre indução da síntese de lipocortinas, que inibem a fosfolipase A2 e, consequentemente, a síntese de substância pró-inflamatórias. Todo esse processo demanda tempo, pois o corticosteroide deverá atravessar a membrana citoplasmática das células-alvo e ligar-se a receptores específicos no citosol. Em seguida, o complexo corticosteroide-receptor migra para o interior do núcleo da célula-alvo, onde se ligará a sítios aceptores nos cromossomos para criar um RNAm. A maioria dos efeitos anti-inflamatórios só ocorrem após ~ 1 a 2h. Outro mecanismo anti-inflamatório é o controle da migração de neutrófilos – resulta na menor produção de mediadores hipernociceptivos, minimizando a dor inflamatória. USO DOS CORTICOSTEROIDES NA ODONTOLOGIA: Indicado para prevenir hiperalgesia e controlar edema inflamatório. Dexametasona ou betametasona são os fármacos de escolha, pela maior potência anti-inflamatória e duração de ação. Regime mais adequado: analgesia preemptiva – introduzido antes da lesão tecidual. - Dose – adultos: dexametasona 4 a 8mg administrada 1hantes do início da intervenção. - Dose – crianças: Solução oral “gotas” de betametasona 0,5mg/mL – 1 gota/kg, dose única, 1h antes do procedimento. VANTAGENS DO USO DOS CORTICOSTEROIDES EM RELAÇÃO AOS AINEs: Uso de corticosteroides de forma crônica (tempo prolongado): efeitos adversos como disseminação de infecções; retardo nos processos de cicatrização e reparação óssea. Quando empregado em dose única pré-op ou por tempo restrito: - Não produzem efeitos adversos clinicamente significativos. - Não interferem nos mecanismos de hemostasia, ao contrário de alguns AINEs, que pela ação antiagregante plaquetária aumentam o risco de hemorragia pós-op. (ex AAS) - Reduzem a síntese dos leucotrienos C4, D4 e E4, que constituem a substância de reação lenda da anafilaxia (SRS-A), liberada em muitas das reações alérgicas. Ao contrário, a ação inibitória dos AINEs na via COX, de forma exclusiva, desvia o metabolismo do ácido araquidônico para via 5-lipoxigenase, acarretando em maior produção de SRS-A e, por conseguinte, reações de hipersensibilidade. - Uso clínico de longa data – início da década de 50 = efeitos adversos mais conhecidos que AINES, como os coxibes. - São mais seguros no emprego em gestantes ou lactantes, bem como em pacientes hipertensos, diabéticos, nefropatas ou hepatopatas, com a doença controlada. - Relação custo/benefício menor quando se usa corticosteroides. USO COM PRECAUÇÃO E CONTRAINDICAÇÕES DOS CORTICOSTERÓIDES: Contraindicações absolutas: portadores de doenças fúngicas sistêmicas, herpes simples ocular, doenças psicóticas, tuberculose ativa ou os que apresentam história de alergia aos fármacos deste grupo. Corticosteroides podem interferir na homeostase do eixo hipotálamo-hipófise-adrenal (HHA) – Cortisol endógeno é produzido pelo córtex adrenal de forme constante, obedecendo ao ritmo circadiano -> maior nível de cortisol por volta das 8h, por esse motivo quando utiliza-se analgesia preemptiva, a cirurgia deve ser agendada preferencialmente para o período da manhã, permitindo somação dos efeitos anti-inflamatórios da dose suprafisiológica + cortisol endógeno; além de porporcionar menor interferência no eixo HHA. FÁRMACOS QUE DEPRIMEM A ATIVIDADE DOS NOCICEPTORES: Quando os nociceptores já se encontram sensibilizados pela ação das prostaglandinas e de outros autacoides, os corticosteroides não mostram tanta eficácia como na prevenção da hiperalgesia. Dor já instalada => emprego de fármacos que deprimem diretamente a atividade dos nociceptores – conseguem diminuir o estado de hiperalgesia persistente. Isso é conseguido por meio do bloqueio da entrada de cálcio e da diminuição dos níveis de AMPc nos nociceptores. Substância-padrão: dipirona. Controle da dor leve a moderada. Fármaco que bloqueia diretamente a sensibilização dos nociceptores: diclofenaco. Age de 2 formas: (1) prevenindo a sensibilização dos nociceptores (pela inibição da COX-2); (2) deprimindo sua atividade após estarem sensibilizados. USO CLÍNICO DOS ANALGÉSICOS: Analgésicos mais utilizados na clínica odontológica: dipirona e paracetamol. Como alternativa, pode-se optar pelo ibuprofeno que em doses menores (200mg, em adultos) tem ação analgésica similar á dipirona, sem exercer quase nenhuma atividade anti-inflamatória. Duração: ~ 24 a 48h. CONSIDERAÇÕES SOBRE O USO DA DIPIRONA: Eficaz e seguro para uso odontológico. Por via IM ou IV, deve ser administrada com cautela em pacientes com condições circulatórias instáveis (PA sistólica < 100mmHg). Redução da PA. Deve ser evitado nos 3 primeiros meses e nas últimas 6 semanas da gestação e, mesmo fora desses períodos, somente administrar em gestantes em casos de extrema necessidade. Contraindicada em pacientes com hipersensibilidade aos derivados da pirazolonam, pelo risco de alergia cruzada, ou para portadores de doenças metabólicas como porfiria hepática ou deficiência congênita da glicose- 6-fosfato-desidrogenase. Evita-se em pacientes com história de anemia ou leucopenia, embora o risco de agranulocitose e anemia aplástica é 1:1.000.000. CONSIDETAÇÕES SOBRE O USO DO PARACETAMOL: Analgésico seguro para uso em gestantes e lactantes. Pode causar danos ao fígado. Dose máxima diária, em adultos, reduzida de 4g para 3,35g. Deve-se evitar ingestão concomitante com álcool ou outras substâncias hepatotóxicas, como estolato de eritromicina. Contraindicado para pacientes que fazem uso contínuo de varfarina. Contraindicado para pacientes com história de alergia ao medicamento ou alergia à sulfitos em caso de solução oral “gotas” (presença de metassulfito de sódio na composição). CONSIDERAÇÕES SOBRE O USO DO IBUPROFENO: Contraindicado para pacientes com história de gastrite ou úlcera péptica, HA ou doença renal. Evitar em pacientes com história de hipersensibilidade ao AAS, pelo risco potencial de alergia cruzada. Além dos analgésicos supracitados, podem ser utilizados em casos de dor os analgésicos opióides – ação central (SNC). No Brasil, estão disponíveis para uso clínico: codeína (comercializada em associação com o paracetamol) e o tramadol – Ambos indicados para dor moderada a intensa, que não respondem ao tratamento com outros analgésicos. Efeitos adversos: náuses e constipação intestinal, vômito, alterações de humor, sonolência e depressão respiratória. Cautela: idosos, debilitados, insuficiência hepática ou renal, hipertropia prostática e portadores de repressão respiratória. Cloridrato de tramadol: - Potência analgésica 5 a 10x menor do que a morfina; Liga-se a receptores opioides “mi” e inibem a recaptação da noraepinefrina e da serotonia. - Atua da mesma forma que as endorfinas e as encefalinas, ativando, com suas moléculas, receptores em células nervosas, o que leva à diminuição da dor. - Inicio de ação: 1h dose de 50mg. - Não é indicado para menores de 16 anos.
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