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Livros Proféticos Professor Esp. Felipe Fernandes Reitor Prof. Ms. Gilmar de Oliveira Diretor de Ensino Prof. Ms. Daniel de Lima Diretor Financeiro Prof. Eduardo Luiz Campano Santini Diretor Administrativo Prof. Ms. Renato Valença Correia Secretário Acadêmico Tiago Pereira da Silva Coord. de Ensino, Pesquisa e Extensão - CONPEX Prof. Dr. Hudson Sérgio de Souza Coordenação Adjunta de Ensino Profa. Dra. Nelma Sgarbosa Roman de Araújo Coordenação Adjunta de Pesquisa Prof. Dr. Flávio Ricardo Guilherme Coordenação Adjunta de Extensão Prof. Esp. Heider Jeferson Gonçalves Coordenador NEAD - Núcleo de Educação à Distância Prof. Me. Jorge Luiz Garcia Van Dal Web Designer Thiago Azenha Revisão Textual Kauê Berto Projeto Gráfico, Design e Diagramação Carlos Eduardo Firmino de Oliveira 2021 by Editora Edufatecie Copyright do Texto C 2021 Os autores Copyright C Edição 2021 Editora Edufatecie O conteúdo dos artigos e seus dados em sua forma, correçao e confiabilidade são de responsabilidade exclusiva dos autores e não representam necessariamente a posição oficial da Editora Edufatecie. Permi- tidoo download da obra e o compartilhamento desde que sejam atribuídos créditos aos autores, mas sem a possibilidade de alterá-la de nenhuma forma ou utilizá-la para fins comerciais. Dados Internacionais de Catalogação na Publicação - CIP F363L Fernandes, Felipe Livros proféticos / Felipe Fernandes. Paranavaí: EduFatecie, 2022. 85 p. : il. Color. 1. Bíblia. A.T. Profetas - Introduções. 2. Teologia. 3. Profetas. 4. Hermenêutica - Religião. I. Centro Universitário Unifatecie. II. Núcleo de Educação a Distância. III. Título. CDD: 23 ed. 223.06 Catalogação na publicação: Zineide Pereira dos Santos – CRB 9/1577 UNIFATECIE Unidade 1 Rua Getúlio Vargas, 333 Centro, Paranavaí, PR (44) 3045-9898 UNIFATECIE Unidade 2 Rua Cândido Bertier Fortes, 2178, Centro, Paranavaí, PR (44) 3045-9898 UNIFATECIE Unidade 3 Rodovia BR - 376, KM 102, nº 1000 - Chácara Jaraguá , Paranavaí, PR (44) 3045-9898 www.unifatecie.edu.br/site As imagens utilizadas neste livro foram obtidas a partir do site Shutterstock. AUTOR Professor Carlos Felipe Fernandes ● É formado no Bacharelado em Teologia pela Unicesumar (2013); ● Pós graduado em Liderança Pastoral pela Faculdade Teológica Sul Americana – Londrina Pr (2016); ● Pós-graduado em Docência no Ensino Superior e Tecnologias Educacionais e Inovação pela Unicesumar (2019); ● Professor Mediador no curso de Graduação em Teologia na Unicesumar – EAD (2020); ● Atualmente é Orientador dos cursos de pós-graduação das áreas de Educação e de Teologia da Unicesumar – EAD. CURRÍCULO LATTES: http://lattes.cnpq.br/1466605796030805 APRESENTAÇÃO DO MATERIAL Olá acadêmico (a), seja bem vindo (a) Iniciamos aqui a nossa disciplina “Livros Proféticos”, neste livro e em nossas aulas vamos imergir em contextos sociais dos mais diferentes do Oriente Antigo no período bíblico, iremos compreender o ministério profético, suas nuances e características especiais nos textos bíblicos. Nesta jornada, iremos perpassar em especial os livros do Antigo Testamento. Poderemos observar no decorrer como o ministério dos profetas se desenvolveu e quais foram principais precursores em diferentes épocas no enredo veterotestamentário. Diferente do que estamos habituados a ouvir sobre os profetas, o profetismo teve importante papel, não somente no campo religioso, mas foi muito relevante nos campos políticos e sociais nas sociedades as quais estavam inseridos. Estudar essa temática é um convite à imersão em culturas diversas bem como a embates entre povo e monarquia, que mostram como era importante o papel dos profetas nos diferentes contextos aos quais estavam inseridos. Neste material vamos estudar os principais períodos e marcos históricos dos profetas bíblicos suas mensagens e sua vida e abnegação em obediência as ordens e profecias dadas por Deus para o povo. Então pegue seu livro e vamos embarcar nessa maravilhosa viagem rumo ao conhecimento! SUMÁRIO UNIDADE I ...................................................................................................... 3 Profetas e Profetismo Bíblico UNIDADE II ................................................................................................... 26 Profetismo do 8° Século UNIDADE III .................................................................................................. 47 Profetismo do Século 7° e 6° Século UNIDADE IV .................................................................................................. 66 Profetismo do 6° e 5° Século 3 Plano de Estudo: ● Introdução aos profetas; ● Definindo os tipos de profetas; ● Formas de Profetismo; ● Cultura e sociedade no oriente do antigo testamento; ● O Reino de Israel. . Objetivos da Aprendizagem: ● Conceituar quem eram os profetas, seus livros, suas mensagens e contextos sociais que estavam inseridos; ● Compreender os tipos de profetas e as mensagens especificas em cada período e contexto; ● Estabelecer a importância da mensagem profética nos campos da religião, política e sociedade dos períodos aos quais os profetas estavam inseridos. UNIDADE I Profetas e Profetismo Bíblico Professor Esp. Felipe Fernandes 4UNIDADE I Profetas e Profetismo Bíblico INTRODUÇÃO Dentre as diversas áreas do saber no estudo teológico, a teologia bíblica contempla a clivagem dos estudos sobre os profetas e o profetismo. Em nosso objeto de análise desta feita, teremos como recorte o profetismo, em especial, no Antigo Testamento. Nesta unidade introdutória ao nosso material de estudos vamos conhecer quem eram os profetas, seu ministério e suas peculiaridades. Uma análise mais aprofundada do ministério destes grandes homens de Deus, de fato, merece a continuidade da pesquisa acadêmica. Mas nessa unidade, você leitor, será convidado a viajar ao mundo contextual do Oriente Antigo e vamos descobrir juntos os caminhos que formaram e forjaram os profetas a serem fiéis à mensagem recebida por Deus, bem como a transmiti-la com coragem e ousadia a todos: da monarquia aos plebeus, dos ricos aos pobres, aos Filhos de Deus e aos pagãos, a sacerdotes de divindades pagãs, a profetas vendidos e aos falsos profetas. Tudo em nome da verdade de Deus e sua vontade ao povo. Falei aos profetas, e multipliquei a visão; e pelo ministério dos profetas propus símiles (Oséias 12:10) 5UNIDADE I Profetas e Profetismo Bíblico 1. INTRODUÇÃO AOS PROFETAS Devemos iniciar nossa abordagem desconstruindo a ideia de que os profetas atuavam apenas dentro da abrangência do período bíblico. Existem diversos registros históricos de profetas e formas de profetismo anteriores aos relatos veterotestamentários. Desta forma, o termo “profeta” não é oriundo de Israel, mas do antigo mundo da Bíblia, que podemos nominar como o “Antigo Oriente Próximo”. De fato, com a ampla leitura dos textos sagrados da Bíblia, o uso do termo profeta ficou comumente relacionado exclusivamente ao enredo bíblico, mas que tiveram atuação na vida em sociedade dos mesmos períodos no Antigo Testamento. No entanto, quando fazemos a clivagem (recorte) da nossa análise da profecia bíblica no Antigo Testamento, temos seus matizes próprios, características peculiares que exalam a verdade do Deus de Israel. Os profetas comprometidos em proferir as verdades de Deus mesmo que suas vidas fossem colocadas em risco, dada à seriedade dos juízos e acusações que profetizavam. Isso com ousadia e intrepidez, com as quais as elites não estavam habituadas a lidar e nem estavam dispostas a dialogar e compreender. Neste contexto, alguns dos profetas do período escreveram suas mensagens proféticas, outros não registraram, e desta forma tiveram suas profecias contadas poroutros escritores através da tradição oral, muito recorrente nas primeiras culturas da Bíblia. A profecia bíblica no Antigo Testamento valeu-se dos mais variados gêneros literários como poesias, figuras de linguagens, simbolismos proféticos e outros diversos. 6UNIDADE I Profetas e Profetismo Bíblico Houve também neste período, profetas que estavam profetizando por interesses políticos, outros por proeminência nas regiões onde viviam, e também profetas que profetizavam por ascensão social. No entanto, havia profetas que iniciaram profetizando as verdades de Deus (Javé) e corromperam a posteriori. Em oposição a estes, tinham os profetas que estavam cabalmente firmados em profetizar somente o que Javé ordenara com coragem, para confrontar uma monarquia organizada e impiedosa, que era seu opositor, e que priorizava e protegia os mais abastados da sociedade, cuidavam de suas festas e reuniões com seus capatázios, em detrimento aos pobres e injustiçados. Estes últimos, por sua vez, sofriam as injustiças por meio de impostos duramente cobrados, que aumentavam drasticamente as desigualdades sociais, conduzindo a sociedade à miséria sem piedade alguma. Neste momento, as profecias contra a monarquia seguiam expondo mazelas sociais e o desagravo de Deus diante do cenário exposto passou a inserir os profetas diretamente nas questões sociais, bem como, nas questões espirituais às quais o povo também padecia, pois o relacionamento do povo com Deus a essa altura estava olvidado (esquecido). Os profetas, agora muito mais inseridos em diferentes classes sociais - no exército, entre sacerdotes, juízes e latifundiários, e principalmente, com o povo oprimido e desesperançado, - passam a ter forte atuação utilizando Javé e seus juízos como arma para que esta realidade instalada sofresse mudanças. Para alguns profetas, como Jeremias, por exemplo, o embate com a monarquia e suas ofensas aos pobres são confrontadas com fortes denúncias das injustiças notadas na vida do povo comum, denúncias estas muito corajosas e audaciosas contra os poderes e instituições ligadas à monarquia, principalmente quando ressaltamos que a coragem não era um ponto forte no início do chamamento deste profeta (Jr 1:7-8). Mesmo assim, diante do cenário repleto de desumanidades que o profeta contemplava, Javé o encoraja ao confronto e ele profetiza contra a monarquia e as instituições estabelecidas. Para os profetas bíblicos, seu comprometimento com Deus e suas profecias estavam firmadas na fidelidade à entrega da mensagem verdadeira. A vocação dos verdadeiros profetas não contemplava vínculos com grupos ligados às monarquias para abrandamento de suas mensagens proféticas, principalmente as mensagens proféticas que vaticinavam juízo ante às opressões causadas pelas desigualdades. O compromisso do profeta antes de qualquer apontamento era com sua vocação e com os desígnios de Deus para sua vida; estavam prontos a colocar suas vidas e suas reputações, se preciso fosse, em favor de Deus. Existia um compromisso verdadeiro do profeta com a Palavra de Deus e com o Deus da Palavra. 7UNIDADE I Profetas e Profetismo Bíblico 2. DEFININDO OS TIPOS DE PROFETAS Nas leituras veterotestamentárias, o ministério profético se apresenta com diversas nuances, com contextos e objetivos diferentes em suas profecias. Assim, podemos notar o quanto a profecia bíblica torna-se um fenômeno diversificado. Ao estudarmos a profecia podemos dividi-la em três grupos de profecias em todo o Israel, sendo: Um primeiro grupo que denominamos “profetas do templo e da corte” (Natã em Gade, pertencentes à corte de Davi). Um segundo grupo, com profecias mais críticas e também mais distantes da corte e do templo (Elias e Eliseu) e, por fim, um terceiro grupo ao qual nosso material trará um enfoque maior, os “profetas radicais”, que visavam ao embate com a monarquia e à denúncia das mazelas sociais causadas pelo Estado (Amós, Isaías, Jeremias, entre outros). A profecia, mesmo em tempos e ambientes distintos, sempre apontava a verdade de Javé e sua atenção para com os erros causados por lideranças e poderes que, de alguma forma, feriam seu povo e os afastavam da comunhão cúltica com Javé. Geralmente em contextos semelhantes a estes, Deus levantava os profetas em oposição a estas crises. No entanto, o termo profetas aplicado nas Escrituras perpassa por diferentes terminologias. Destas, três descreveremos pormenorizadamente, destacando que as terminologias de cada título profético remetem aos atributos e objetivos do profeta. Assim sendo, os três títulos são: ro´eh, hozeh e nab’. Há um quarto termo que aparece também com frequência no enredo bíblico; ´ish´elohim, “homem de Deus”. 8UNIDADE I Profetas e Profetismo Bíblico Os dois títulos Ro´eh e Hozeh, de forma bem objetiva, apontam para a ideia de vidente (Heb. hozeh: “aquele que vê”) que se relaciona na língua hebraica ao termo hazon (Heb. hazon: “visão”), ao qual temos uma aproximação com o texto do profeta Isaias 1:1, como veremos: “Profecia (Heb. hazon: “visão”) de Isaías, filho de Amós, a respeito de Judá e Jerusalém no tempo de Ozias, de Joatão, de Acaz e de Ezequias, rei de Judá” (ISAIAS 1:1, Bíblia Jerusalém). Para muitos pesquisadores bíblicos, o ministério profético estava diretamente rela- cionado à vidência dos profetas, suas visões sobre os juízos futuros, bem como as verdades de Javé a eles reveladas previamente, tendo assim a figura do profeta como um vidente, aspecto preponderante, até mesmo quando apresentamos a relação com exemplos de profetas arábicos ou também com o profetismo além do cânon bíblico. Isto nota-se também nos profetas do Antigo Oriente Médio, na cidade de Mari por exemplo, como veremos a diante em nosso livro. A relação do profeta com o termo hozeh (“aquele que vê”) também pode ser assemelhada aos nômades patriarcas e no caso de Balaão (Números 22:24). O termo ro´eh, por sua vez, tem uma definição próxima ao termo hozeh. Quando o termo hozeh designa “aquele que vê” está vinculando-o à vidência, à revelação de algum fato. Assim o termo ro´eh, remete-nos a expressão de alguém que pode então penetrar o futuro e revelá-lo (Dt 18:21-22), como destaca o Isaltino Gomes Coelho Filho ao exemplificar o termo ro´eh “alguém que vê” ao chamado de Jeremias (Jeremias 1:11-12): Nem sempre o termo está associado com vidência. Algumas vezes é uma interpretação dos eventos ou a compreensão de algo mais profundo numa visão comum. Jeremias vê um oleiro fazendo um vaso e compreende a relação entre Iahweh e Israel (18.1-4). Vê uma vara de amendoeira florescendo (1.11- 12) e faz um trocadilho: ele vê uma amendoeira. (shaqed) que soa parecido com vigilante. (shoqed). A amendoeira floresce quando capta o aumento da umidade do ar. Está pronta para lançar as folhas, novamente. Ela vigia, ela shoqed o ar. Assim Deus está shoqed com sua palavra. Ninguém veria isso, mas o profeta vê. Ele vê uma panela fervendo, na parte norte (1.13-15). Estava vazando. Ele vê a ira de Deus fervendo e pelo norte, de onde vem um inimigo. Não tem sentido algum para o homem comum, mas tem para ele. O profeta vê o que os outros não vêem. Chamaríamos isso, hoje, de discernimento. Lá estão os homens a brincar com o pecado, a sociedade a relaxar seu padrão de conduta, a moralidade baixar assustadoramente (COELHO FILHO, 2004, p.03) Estes profetas são dotados de um poder sobrenatural e por isso podem também ser chamados na bíblia de ´ish’elohim, ou “homem de Deus” (ex. Moisés e Samuel: Dt 33.1; 1 Sm 9.1-10,16). Outra aparição do uso dessa palavra (ro’eh) está em Amós 7.12, no qual Amazias chama Amós de ro’eh: Vai-te, ó vidente (ro’eh), foge para a terra de Judá, e ali come o teu pão, e ali profetiza. 9UNIDADE I Profetas e Profetismo Bíblico Outra terminologia hebraica utilizada para distinguir os fenômenos proféticos é o uso do termo Nabi’ remetendo à prática da vidência profética. AntonioGunnenweg, teólogo protestante holandês e professor do Antigo Testamento, um dos melhores nas referências para pesquisa em teologia do A.T., relaciona o uso do termo nabi’ a sua raiz em língua hebraica nb’ (“chamar”) neste caso o vocábulo “chamar” no enredo veterotestamentário. Para o professor José Luis Sicre, dividia-se o mesmo termo em outras três formas de atuação profética, como vemos a seguir: “O verbo demonstrativo de nabi’, que se emprega em nifal e hitpael, às vezes com sentidos bem diferentes: (1) “ficar frenético”, (2)“dançar ritualmente”, [..] (3) “profetizar”, “cantar” ” (SICRE, 1996, p. 87). Seguindo a abordagem de Sicre, essas formas frenéticas, danças e cantos proféticos, são ações denominadas de profecia em delírio extático, “estar fora de si”, ou seja, em alguns momentos no ato da entrega das profecias os nabi’ eles entravam nesta espécie de ação transcendente para exercer seu ministério. Outra característica relevante é que os profetas nabi’, ao contrário dos grupos mencionados anteriormente em nosso material, podem aparecer no texto bíblico em ações em grupo e reunidos em grupos de profetas nabi’ (1Sm 10.10-13; 19.18 2Rs 2.15; 4.38; 6.1; 13.11; 2Rs 2.3.5; Ml 3.5). No entanto, relacionar ou definir estritamente que os profetas nabi’ atuavam apenas como profetas extáticos ou tinham como características únicas a atuação em grupos pode ser um erro, pois o termo nabi’ pode ser aplicado também a profetas de atuação individual, provavelmente com uma relação ao termo nabû com possibilidades de aplicação conjunta às palavras “chamar”, “anunciar”, “nomear”. Como nos estudos na língua hebraica os agentes passivos e ativos da ação interferem nas possibilidades de interpretação e com o uso dos termos, não há como afirmar se estes tem sentido no passivo ou ativo nas ações proféticas. Desta forma, considerando que o hebraico exprime a ação de profetizar no passivo (no sentido de que o profeta recebe e depois transmite a profecia), sugerimos então que o termo nabi’ relaciona-se a quem sofre a ação que Deus lhes impunha (ordem de profetizar), e consequentemente, a ação do profeta e sua profecia não dependia da sua iniciativa ou de quaisquer iniciativas humanas, mas dependia exclusivamente da ação divina. Assim, etimologicamente, nabi’ significaria alguém “chamado”, “convocado” para uma missão concreta. Desta forma, em síntese, devemos manter sempre em mente que os profetas foram anunciadores da(s) Palavra(s) de Deus, pois de alguma forma recebiam de forma passiva 10UNIDADE I Profetas e Profetismo Bíblico a mensagem do próprio Deus e a compartilhavam para que os rumos futuros das nações, dos povos e das monarquias fossem alinhados aos planos de Deus e sua soberania. O profeta em suas diferentes formas de atuação é o “alguém que vê” os rumos da história (lembre-se: esse é o significado de ro´eh) e também é um nabi’, ou seja, alguém que profetiza/proclama a Palavra de Deus. Outro termo utilizado também nas escrituras remete aos profetas na relação de mentores, aos quais comumente praticavam uma espécie de relação mestre-discípulo. O termo neste caso é o beney há-nebi’im ou Filhos dos profetas. Estes filhos dos profetas, eram crianças e adolescentes entregues aos profetas e inseridos nas comunidades de profetas, poderiam ficar por longos períodos ou apenas curtas temporadas junto ao seu profeta-mentor. Os locais aos quais esses filhos de profetas se agregavam aos profetas eram variáveis, podendo ser em cavernas, matas ou casas, com mobília e estilo de vida bem modestos afastando-se na maior parte do tempo da vida em sociedade comum (1Rs 20.41; 2Rs 2.23). Por fim, outro título profético atribuído nas Escrituras é o ‘ish há-elohim (Homem de Deus) vide os textos bíblicos sugeridos (1Rs 17, 18; 13.1,11; 20.28; 2Rs 1.9-18; 4.7; Jz 13.6.8; 2Cr 25.7,9), título esse concedido dada a comunhão íntima e profunda com Javé. Esse tipo de título atribuído estava muito mais relacionado à forma como os pertencentes da comunidade dos profetas viam os profetas e as pessoas da sociedade comum aos quais os profetas tinham suas relações sociais. O termo ‘ish há-elohim aparece 76 vezes no Antigo Testamento e quase na metade das vezes é aplicado a Eliseu. O ‘ish há-elohim é mostrado como uma pessoa de confiança de Deus e as pessoas veem isso na sua vida devotada. 11UNIDADE I Profetas e Profetismo Bíblico 3. FORMAS DE PROFETISMO Existem diversos relatos de profetas e profetismos na história e em especial no Antigo Oriente Médio, esse fenômeno religioso se fazia presente em diversas culturas e também não se constituiu um fenômeno exclusivo do Javismo (Religião de Javé). Relatos apontam que desde a antiga Assíria havia tipos de profecias estáticas, exercidas por sacerdotisas no templo de Ishtar. Já quando se trata de relatos equivalentes no Egito, não existe certa evidência histórica sobre o aparecimento de profetas. Nas regiões de Canaã há registros de profetas e profetismo, mas desta feita muito mais pelos relatos bíblicos do que por relatos e pesquisas extrabíblicas (SCHOKEL, 1991). Notamos isso especialmente no relato de 1º Reis 18 e 1º Reis 19:26-29. Os cananeus, por exemplo, faziam uso de árvores sagradas, (vide o carvalho de Moré, em Gênesis 12.6 - Moreh, em hebraico, significa - mestre), além de sonhos e a interpretação dos voos dos pássaros. Em especial, em nosso material faremos um recorte das pesquisas no tema que remetem a cidade de Mari, antiga cidade da Mesopotâmia (atualmente Tel Hariri), que foi uma antiga cidade-estado semítica da Síria e um dos sítios arqueológicos mais importantes na Mesopotâmia atualmente. Foram através de pesquisas de cartas de profetas da cidade que relações estabelecidas entre as profecias israelitas e profecias no Oriente Próximo Antigo foram observadas, em especial na correlação fenomenológica que pode se estabelecer entre ambas. 12UNIDADE I Profetas e Profetismo Bíblico Embora essa correlação tenha sido feita, neste caso ainda se trata de um vasto campo de pesquisa para poder estabelecer relações diretas entre os profetismos de Mari com quaisquer relações com o profetismo israelita ou com seus profetas. Mas em certo ponto as cartas encontradas na cidade de Mari, mencionam as tipologias de oráculos, emissários e proclamadores em nome de outro “divino”, com mensagens de alerta e juízos vindouros, isso antes de qualquer relato bíblico. Em Mari e em suas cartas, um dos oráculos mencionados é chamado de Apilu / Apiltu, que pode ser um correspondente na forma participal do verbo “responder”. Essa designação leva-nos a entender que os profetas apilus eram homens que davam respostas das divindades às perguntas que os homens faziam. No texto abaixo, apresentado por Fohrer, remete a uma destas respostas: Fala ao meu senhor: Assim (diz) Mukannishum, teu servo: eu tinha oferecido os sacrifícios a Dagan pela vida de meu senhor. O respondente de Dagan de Tutal ergueu-se; assim falou ele, a saber: Babilônia, estás ainda disposta? Eu te conduzirei para a armadilha... As casas / famílias dos sete parceiros e quaisquer que (sejam) suas possessões eu porei nas mãos de Zimrilim (FOHRER, 1982, p. 279). Nas cartas, vários títulos proféticos mencionados em Mari relacionam-se com o período de Zimrilim, rei daquela cidade por volta de 1700 a.C. Os profetas apilus comporiam uma classe de homens e mulheres que recebiam alguma ordem da divindade, mantinham relação cúltica com os templos das divindades existentes. Relatos apontam também para manifestações extáticas (extasiados) com experiências diversas, com presságios futuros e visões e também as cartas remetem a profetas apilus que tinham visões. As relações destes tipos de profetas (apilus) com os profetas bíblicos está apenas no campo de análise dos fenômenos dentro dos tipos de profetismo. A diferença é de simples compreensão, para os profetas bíblicos todos os outros profetascomo nas cartas de Mari eram considerados falsos deuses, os profetas bíblicos profetizavam apenas no nome de um Deus, o verdadeiro Deus de Israel. Os profetas vinculados às divindades pagãs, por vezes se diferenciavam da sua forma de atuação e rituais utilizados em seus atos proféticos, como por exemplo, o uso recorrente da lecanomância (leitura do futuro pela figura do azeite derramado numa taça sagrada), a hepatoscopia (a leitura do futuro pelos riscos do fígado de animais sacrificados aos ídolos). Esses dois rituais são exemplos de atuação profética no paganismo. No enredo bíblico temos o exemplo dos cananeus, que consultavam as árvores sagradas como oráculo. No profetismo pagão destaca-se também a relação profeta/ poder, onde as profecias estavam muito mais atreladas a orientação das monarquias em futuras batalhas bélicas, declarando-se (os profetas) a favor ou não à entrada do rei em determinada pugna com outra nação, a firmar alianças político/comerciais com outras nações ou a decisões complexas a serem tomadas, como aconteceu em Gênesis 41,8, com adivinhadores e os sábios de Faraó. 13UNIDADE I Profetas e Profetismo Bíblico Por fim, ressalta-se que a diferença fenomenológica nas ações dos profetas pagãos para com os profetas Javistas, não se caracteriza o movimento profético como exclusivo ao período bíblico do Oriente Médio, mas que de fato profetismos diferentes são registrados em textos extrabíblicos e históricos como nas cartas de Mari. Cabe-nos então saber discernir e diferenciar os profetas e profetismos, isso porque nas Escrituras temos relatos de profetas Javistas (profetas que creem exclusivamente em Javé) com os de profetas pagãos dentro do mesmo escrito, merecendo então essa análise de leitura e pesquisa. Concluímos assim que o profetismo não pertencia exclusivamente aos textos veterotestamentários e cada profeta bíblico atendia especificamente a um termo sobre sua forma e atuação profética. Esses profetas compunham um advento registrado na história como um todo, isso citado nesta unidade nos registros nas cartas de Mari. 14UNIDADE I Profetas e Profetismo Bíblico 4. CULTURA E SOCIEDADE NO ORIENTE DO ANTIGO TESTAMENTO Toda análise textual da Bíblia requer do estudante a compreensão e prática de um método de análise dos objetos em pesquisa. Dentro dos estudos na Teologia Bíblica diversos métodos foram observados, analisados, adaptados ou até mesmo rejeitados pelos estudiosos desta área na teologia em diversos tempos da história. Fato é que sempre existirá a necessidade de um método para qualquer análise de textos bíblicos que fundamente os resultados esperados, seja nas análises de períodos ou fatos bíblicos, assim o método hermenêutico é muito importante e não pode ser ignorado. A ausência de um método hermenêutico pode conduzir o estudante/pesquisador a equívocos severos, ainda mais em leituras que exigem tanto, como as leituras no Antigo Testamento, principalmente nos profetismos. Não respeitar o método escolhido e empregado na análise, pode conduzir a deduções nos textos que não existem e que não perpassaram o crivo de outras áreas do saber, relacionadas com a teologia como arqueologia, história, línguas e outras ciências do saber, trazendo sérios danos aos estudos. Por esses e outros motivos os métodos são tão fundamentais. Na teologia bíblica, muitos métodos são usados nas análises literárias, culturais e linguísticas dos textos: Método Histórico-Crítico, Método Histórico-Crítico-Social, Método His- tórico-Gramatical, Método Hermenêutico Contextual, Método Sêmio-Discursivo entre outros Nos textos do Antigo Testamento a compreensão das nuances de contextos, sejam eles históricos ou culturais, se fazem de muita relevância, pois nos textos do Antigo Testamento, mudanças de contextos acontecem entre os textos, justamente pela abrangência histórica entre os livros desta parte da Bíblia. 15UNIDADE I Profetas e Profetismo Bíblico Existem questões culturais e gramáticas que se diferem, por exemplo, dos textos do Pentateuco para o livro dos Salmos, isso também ocorre nas leituras dos profetas e em suas estruturas literárias. Temos então, profetas diferentes, em tempos diferentes e em contextos diferentes, profetizando as verdades de Deus com objetivos diferentes. Assim, levar em conta os contextos de cada profeta torna-se um fator imprescindível para a continuação do nosso estudo e veremos isso nas unidades posteriores em nosso livro. As leituras hermenêuticas contextuais nestes casos são de grande valia para poder ampliar as percepções da profecia e mensurar os efeitos das profecias. A hermenêutica contextual é uma vertente do método histórico-gramatical. Esta proposta se distingue pelo maior cuidado na análise dos contextos do texto bíblico e da época da leitura, algo muito relevante em nossas análises nas próximas unidades, onde iremos abordar a formação sociocultural de alguns dos profetas bíblicos. Nesta vertente, a leitura e pressupostos da ação profética são vistos sob diversos prismas, não apenas o viés teológico da ação dos profetas, mas também os efeitos sociais e fatores socioculturais que a mensagem a ser entregue poderia causar. Outro fator a ser ponderado nestes casos são os fatores linguísticos e a escrita dos textos de cada profeta, haja vista, como mencionamos anteriormente, os profetas tinham formas de escrita que se diferenciavam, bem como, elementos socioculturais que interferiam diretamente na escrita e direcionamento das mensagens proféticas. Esta informação pode ser confirmada pelo fato de que os profetas habitualmente no início de seus escritos se situarem ante aos ambientes que direcionariam suas profecias (escritos), colocando-se dentro de um plano histórico, como afirma Hans Walter Wolff: “Os profetas são habitualmente introduzidos no começo de seus escritos, e identificados pela data e local da atividade. A pessoa histórica do profeta assume importância fundamental para a transmissão de sua mensagem” (WOLFF, 2003, p.74-75). Este fato é facilmente notado nas leituras proféticas na Bíblia, por exemplo: “A palavra de Amós”, “a visão de Isaías” ou “a palavra do Senhor que veio a Oséias”: essas são algumas formas dos profetas se identificarem no plano contextual da sociedade de seu tempo. Outra forma é situando-se na história como, por exemplo: “No ano que morreu o Rei Uzias (Is 6:1)” neste caso que exemplificamos o Rei Uzias, o profeta apresenta dados importante sobre seu lugar histórico, pois Uzias foi o 10º rei de Judá e teria começado a reinar por volta de 829 a.C até 778 a.C desta forma Isaías coloca sua profecia num plano histórico e insere-se como participante deste período para a história da nação. 16UNIDADE I Profetas e Profetismo Bíblico Neste tipo de inclusão na história o profeta consequentemente assume e/ou de- monstra a relevância de seu ministério, de sua mensagem. Não apenas no campo da reli- gião da época, mas de alguma forma o profeta tenta inserir a sua profecia como elemento relevante da vida e sociedade de seu tempo. Por estes e outros motivos que a leitura dos textos proféticos exige no hermeneuta uma percepção mais contextual da vida, obra e mensagem do profeta. Não proceder desta forma é empobrecer a profecia, que por algu- mas vezes custou a vida dos profetas, para que chegasse ao nosso tempo e pudéssemos estudá-las com mais profundidade. No Antigo Oriente próximo, a vida cotidiana perpassava por diversos estilos, como os peregrinos, nômades, sedentários (oposto de nômades), clã fechados, clãs abertos e etc. Formas de vida tão diferentes também estavam vinculadas a ambientes bem diferentes. A vida nestes períodos tinha ambientes variados, mesmo assim a mensagem dos profetas procura em certa medida atender a totalidade da vida, o andar, o comer, o viver, a fé, as opressões sofridas pelo povo causadas pelas monarquias, julgamentos, questões agrárias, manejo daterra, orientações de guerras, o pensar, o escrever entre outras muitas questões. Os profetas em suas mensagens visavam se fazer ouvidos e com as suas mensagens nas mais variadas circunstâncias, como forma de que suas profecias fossem vivas e trouxessem vida e esperança na vida. Neste momento, convido a cada um para ler com atenção o texto de Isaías 28,23-29, em que apresentaremos a amplitude dos objetivos do profeta com a profecia: Inclinai os ouvidos, e ouvi a minha voz; atendei bem e ouvi o meu discurso. Porventura lavra todo o dia o lavrador, para semear? Ou abre e desterroa todo o dia a sua terra? Não é antes assim: quando já tem nivelado a sua superfície, então espalha nela ervilhaca, e semeia cominho; ou lança nela do melhor trigo, ou cevada escolhida, ou centeio, cada qual no seu lugar? O seu Deus o ensina, e o instrui acerca do que há de fazer. Porque a ervilhaca não se trilha com trilho, nem sobre o cominho passa roda de carro; mas com uma vara se sacode a ervilhaca, e o cominho com um pau. O trigo é esmiuçado, mas não se trilha continuamente, nem se esmiúça com as rodas do seu carro, nem se quebra com os seus cavaleiros. Até isto procede do Senhor dos Exércitos; porque é maravilhoso em conselho e grande em obra (Isaías 28:23-29, BÍBLIA, 2002). Nota-se então que o profeta, em sua mensagem, deixa claro sua instrução de forma didática aos ouvintes de sua mensagem, um poema didático (Wolff, 2003). Fica clara a relação proposta pelo profeta de relacionar a mensagem ao contexto bucólico ao qual a maioria de seus ouvintes estava habituada (plantas, cultivar, colher). A profecia neste ponto fica relacionada ao contexto para a compressão da mesma, isso é leitura contextual da profecia pelo profeta e deve ser feita pelo estudante/pesquisador. Em um segundo plano, evidencia que a linguagem bucólica rural é utilizada para apontar o plano de Iahweh na nação e nos tempos, apresentando a ação divina no plano da história (Deus cuida da história: começo/plantio, meio/cultivo e fim/colheita). 17UNIDADE I Profetas e Profetismo Bíblico Lembramos ainda que o uso da figura bucólica rural era comum aos ensinos sapienciais do judaísmo primitivo, como vemos no livro de Quohelet, ou Eclesiastes. Por fim, o profeta (Isaías) deixa claro em sua mensagem profética a bondade de Deus em conceder conselhos, “profecias pelos profetas”, para que o povo não erre ou transgrida suas leis, sendo a obediência aos “conselhos proféticos” um caminho mais seguro ao povo. Este texto em análise, é uma breve apresentação de como a profecia não pode ser observada apenas polo seu caráter religioso ou espiritual, mas que os profetas se muniam de diversas ferramentas para que suas mensagens proféticas pudessem ser vividas e memorizadas pelo povo. Na hermenêutica profética o estudante deve sempre levar em consideração que a mensagem profética bíblica está relacionada em duas vias: a mensagem divina e os protestos ao Estado/Monarquia. Isso porque os Estados israelita e judaíta abandonaram os princípios ordenados por Javé, ocasionando assim desequilíbrio social e opressão ao povo. Soma-se a este cenário o fato de que esses governantes firmaram alianças com povos aos quais não deveriam firmar e prestaram cultos a falsas divindades, fato amplamente condenado por Javé. Podemos notar como as mensagens proféticas se relacionavam diretamente às opressões do Estado em diversos profetas, como por exemplo, Samuel que, em especial no oitavo capítulo de seu primeiro livro, direciona a profecia a uma crítica às ações da monarquia e sua forma de governo (1 Sm 8: 11-17). Os profetas Gade e Natã, que estavam vinculados à monarquia criticam algumas ações do Estado em detrimento ao povo. Aías, o silonita, é outro caso semelhante e apoia uma conspiração contra o Rei Salomão por seu modelo de governo econômico. Elias se levanta contra Acabe, filho de Onri, que iniciou seu reinado no 38º ano de Asa, rei de Judá e casou-se com Jezabel. O profeta condena as ações governamentais e as direções espirituais do governo e sofre forte oposição por profetizar contra Acabe. Outro aspecto a ser destacado nestas e em outras relações entre a mensagem profética e o Estado pode ser notado nos textos iniciais dos livros proféticos, onde, como vimos anteriormente, o profeta se situa na história social para compartilhar sua mensagem profética (Is 1:1; Jr 1:1; Ez 1:2s; Am 1:1; Mq 1:1; Sf 1:1; Ag 1:1; Zc 1:1). As denúncias propostas pelos profetas condenam as ações do Estado e suas opressões e o rompimento pelo povo e pelo Estado da aliança feita com Javé. Nos estudos, diferir essas ações é muito importante, como também notar em que aspectos a profecia é uma crítica estatal, um alerta espiritual ou ambas. Se por um lado, o povo e a monarquia seguiam obstinados em seus pecados, por outro clamavam a Deus ação mediante as opressões que sofriam. 18UNIDADE I Profetas e Profetismo Bíblico Uma relação de interesse mútuo entre monarquia e povo com olhos nos cuidados divinos: de fato, uma relação “interesseira” com Javé. Neste contexto, Deus envia profetas seguidamente, que elevam suas mensagens visando o rompimento de um ciclo pecaminoso (no âmbito espiritual de suas profecias), bem como o rompimento da opressão dos agentes de poder e cultos a falsos deuses. Esse conteúdo das mensagens dos profetas aparece e podem ser facilmente notados em Isaías, Jeremias, Lamentações, Ezequiel e Daniel. A complexidade da profecia eleva então, o profeta, a uma condição de persona digna de apreço em nossos estudos, pois se apresentam hábeis em suas atuações e percepções do rumo de sua sociedade (não considerando neste aspecto as profecias messiânicas). Assim, para lermos os profetas é indispensável compreendê-los em suas incompatibilidades com a dominação monárquica e o afastamento do verdadeiro Deus. O profeta por vezes atuava solitariamente, pois não estava comprometido com a política monárquica e seus desmandos. Mas para poder permanecer fiel ao chamado divino e à verdade a ser profetizada, permanecia firme e isolado até mesmo de seus semelháveis, alimentando o forte interesse de mudar a situação espiritual (primeiro plano) e social (em segundo plano) da realidade em que o povo estava inserido, mostrando disposição em pagar o caro preço pela verdade. 19UNIDADE I Profetas e Profetismo Bíblico 5. O REINO DE ISRAEL Neste tópico, vamos apresentar de forma resumida a situação política, econômica, social e religiosa do Reino do Norte. O Reino de Israel se caracteriza ao longo de sua história no período bíblico por grandes instabilidades do governo, sendo que o trono foi tomado a força três vezes (GUSSO, 2003). A estabilidade dentro das estruturas de poder foi conseguida apenas entre os anos de 885 a 874 a.C., a partir do reinado de Omri, com um governo sólido que conseguiu manter Israel com propriedade econômica e políticas internas de paz. Mais à frente, Davi e Salomão remodelam este modelo de governo ampliando com uma relação mais amena com o Reino do Sul (Judá), fato consolidado no reinado de Acabe, ao qual as relações internacionais do Reino do Norte foram se firmando. Essa política interna e externa que perdurava desde Omri, termina em Jeú, com um governo autoritário ao qual promove brigas e assassinatos internos dentro do Reino. Os efeitos do governo violento de Jeú são devastadores a Israel, que acaba por ser invadida por vizinhos mais agressivos, causando mortes e instabilidade social e religiosa entre o povo. É então em Jeroboão II que a nação ganha novos rumos e o cenário hostil sofre mudança, com o Reino gozando de uma prosperidade sem igual (GUSSO, 2003). Por fim, com a invasão dos Assírios esse período de prosperidade e paz termina. No campo social, os israelitas se viram em meio aos jogos políticos, sendo jogados de um lado a outro. Períodos prósperos, tão logo seguidos de massacres em massa e guerras perdidas, o que fez tambémque este povo desenvolvesse forte habilidade na administração e experiência em confrontos bélicos, mesmo ante as derrotas sofridas por nações circunvizinhas. 20UNIDADE I Profetas e Profetismo Bíblico O livro do Reis parece mostrar mais claramente que a situação do povo não era das melhores. No reinado de Jeroboão II o comércio volta a ter protagonismo, principalmente pelo comércio com os Fenícios, mas com o fim da monarquia encabeçada por Jeroboão a crise novamente se instala, guerras e invasões voltam a acontecer e como forma de reagir a estas situações e manter o exército armado, os impostos são acrescidos, gerando necessidades em uma população que passa a ser explorada por classes superiores e pessoas mais ricas. No período, esta situação social é denunciada pelo profeta Amós, com duras críticas às castas superiores e à monarquia ostentadora que oprimia o povo. De fato, a mensagem de Amós teve ênfase na justiça social. No campo religioso, Israel padecia ante aos conflitos políticos que geravam confusão no campo religioso, com práticas e cultos aos falsos deuses e abandonando o culto a Javé. O ponto mais complexo da crise religiosa foi no período do reinado de Acabe, casado com Jezabel, a qual conseguiu introduzir o culto a Baal em Israel. Divindade herdada de seus pais, o culto a Baal virou o culto estatal e a religião oficial da monarquia. Acabe mantém o culto a Javé como religião civil oficial, apenas nominalmente, pois a religião de Javé correu sérios riscos de ser exterminada do Reino do Norte. Levanta-se então Elias, que confronta o povo e a monarquia pela quebra da aliança com Javé, profetizando o juízo, caso não houvesse restauração do culto. Elias conclama o povo a derribar altares e abandonar o culto pagão, ascendendo à ira de Jezabel e complicando a situação religiosa entre povo e monarquia. Mas com o apoio do povo, Jeú obtém sucesso em um empreendimento de golpe de estado e toma o governo de Israel, tirando das esferas de poder todos que tinham vínculos com Jezabel e seus desmandos, destruindo o templo de Baal e matando todos os profetas, sacerdotes e sacerdotisas do templo pagão. A ação de Jeú restaura o culto a Javé, mas raízes permanecem no povo e o sincretismo passa a coabitar entre o povo, fato condenado posteriormente pelos profetas Amós e Oséias. Os profetas destes períodos foram: Aías, Elias, Eliseu, Micaías, Jonas, Amós, Oséias e Odede. 21UNIDADE I Profetas e Profetismo Bíblico 6. O REINO DE JUDÁ Neste tópico vamos apresentar de forma resumida a situação política, econômica, social e religiosa do Reino do Sul. Na divisão dos reinos o reino de Judá termina relativamente como um reino fraco, o que a vistas da política externa, fez com que outros reinos desejassem invadir Judá e ampliar seus territórios de domínio e assim exercer maior poder. Susac, Rei do Egito, que articulou politicamente a cisão dos reinos, utilizou de suas informações privilegiadas e empreendeu contra Judá, invadindo-a e saqueando. Calcula-se que mais de 150 localidades do reino foram atingidas neste ataque ao Reino do Sul (GUSSO, 2003). Essa vulnerabilidade era cada vez mais exposta, o que fez que Judá sofresse ataque por muito tempo em sua história, como os ataques da Síria, Assíria, Egito e Babilônia. A relação com os seus coirmãos do Reino do Norte não era das fraternais e sofria também com as instabilidades do Reino do Norte, também sentidas de alguma forma no Reino do Sul. Mas Judá parecia aprender com erros do Reino do Norte e administrava as crises de forma mais tranquila internamente (GUSSO, 2003). As dinastias não tiveram sucesso no Reino do Norte, o que acarretava pontos positivos e negativos. Positivos quando apontamos que os governantes eram atentos ao povo e evitavam conflitos diretos para não perder seu poder. Negativos, pois não produziam políticas de médio e longo prazo por medo de terem seus mandatos interrompidos por uma revolução social e consequentemente uma troca no poder. Entretanto, no reino do Sul, as dinastias foram quebradas apenas uma vez, e por pouco tempo, quando Atália, esposa estrangeira de Jeorão, assumiu o trono após a morte de Acazias, seu filho, e sem sucessão hereditária ao trono, fazendo que ela assumisse o posto mais alto da nação. 22UNIDADE I Profetas e Profetismo Bíblico Mesmo mais fraco que o Reino do Norte na parte econômica, Judá era mais estável, mesmo quando oprimida por impostos pesados dos reinos vizinhos, que obtiveram êxito em suas invasões comprando assim sua “liberdade”. No reinado de Uzias (791-740 a.C.) a economia local cresce, focada inicialmente na agricultura e cultivo de animais. Poços de água são cavados em postos estratégicos junto com torres de proteção a produção agrícola. Uzias lutou e reconquistou usinas de cobre e ferro em Elate e estabeleceu acordos comerciais com o Egito e com a Arábia. Socialmente, a disposição de renda e trabalho manteve a população saudável, bem alimentada e as divisões de classes menos discrepantes. Mas com o abandono do culto a Javé no reinado de Acabe, o cenário equilibrado sofre mudanças e faz com que Isaías e Miquéias profetizem relacionando a situação social à crise religiosa. SAIBA MAIS Atualmente, existe de forma corriqueira uma crise de compreensão sobre a profecia bíblica que permeia diversas comunidades de fé, gerando nestes casos afirmações equivocadas e interpretações desprendidas de um método de interpretação coerente das Escrituras. Conhecer a profecia e o profeta, mas principalmente o contexto em que o profeta emitia sua denúncia, é fundamental para uma boa hermenêutica bíblica. Os profetas não se esconderam ou eximiram-se de pronunciar a verdade de Deus nos contextos históricos e sociais controversos e opressores em que viviam. Mas, pelo contrário, profetizaram contra as mazelas sociais e a favor do reestabelecimento da religião verdadeira em Javé. Assim, quanto melhor a forma de leitura do conteúdo literário profético, melhor serão os impactos em uma espiritualidade bíblica, promovendo mudanças em nossos contextos sociais. Fonte: O autor (2021). 23UNIDADE I Profetas e Profetismo Bíblico REFLITA O verdadeiro profeta anunciava a ruína do poder estatal e religioso, devido ao detrimento moral e espiritual desses (Jr 7; 27-28; cf. 1Rs 22). Os verdadeiros profetas não estavam comprometidos com a política estatal, mas com a Palavra de Deus. Por isso, considerando o fato de que os Estados judaíta e israelita abandonaram os princípios do verdadeiro Deus, os profetas anunciaram sem reservas a destruição desses estados por inimigos. Fonte: PETERLEVITZ, Luciano R. Introdução ao Profetismo. Revista Theos – Revista de Reflexão Teológica da Faculdade Teológica Batista de Campina. Campinas: 5ª Edição, v. 4, n. 1 - Junho de 2008. ISSN: 1908-0215. 24UNIDADE I Profetas e Profetismo Bíblico CONSIDERAÇÕES FINAIS Chegamos ao final deste nosso primeiro encontro com a mensagem dos profetas e o profetismo no Antigo Oriente. Neste início, conhecemos a importância de um método que analise a profecia dentro de um contexto mais amplo e não apenas com leituras voltadas a percepção espiritual da mensagem profética. Vimos também os nomes que caracterizavam os profetas e características do profetismo individual dentro dos termos nas línguas originais. Prosseguimos então olhando os profetas e suas denúncias contra a monarquia e opressão ao povo, conhecemos também as realidades políticas, sociais e religiosas de Judá e Israel. A partir destas compreensões seguiremos avante, agora conhecendo um pouco mais afundo cada profeta e sua mensagem. Vamos lá? 25UNIDADE I Profetas e Profetismo Bíblico MATERIAL COMPLEMENTAR LIVRO Título: Teologia do Antigo Testamento Autor: Paul R. House. Editora: Vida acadêmica. Sinopse: Neste material encontramos uma abordagem muito completa e detalhada de fatores extrabíblicos que muito colaboram nas pesquisas em textos do AntigoTestamento, sendo um material indispensável aos estudantes de Teologia. FILME/VÍDEO Título: Israel, a terra do Deus da promessa. Ano: 2018. Sinopse: Toda a história de Israel é revisitada e analisada pela perspectiva dos dias atuais de dez renomados escritores israelenses. Conflitos, religião, amor, diferenças e controvérsias: tudo é explorado por algumas das mentes mais interessantes do país. 26 Plano de Estudo: ● O profeta Amós; ● O profeta Oséias; ● O profeta Isaias; ● Os profetas Miquéias e Jonas. Objetivos da Aprendizagem: ● Contextualizar o aluno dentro dos períodos históricos da Bíblia; ● Abordar o profeta em sua vida, obra e missão; ● Estabelecer a importância da mensagem profética nos campos da religião, política e sociedade dos períodos aos quais os profetas estavam inseridos. UNIDADE II Profetismo do 8° Século Professor Esp. Felipe Fernandes 27UNIDADE I Profetas e Profetismo Bíblico 27UNIDADE II Profetismo do 8° Século INTRODUÇÃO Olá acadêmico (a), Iniciamos aqui nossa segunda unidade de estudos de nossa apostila, aqui começa nossa imersão na vida, obra e missão dos profetas bíblicos. Nesta unidade vamos conhecer nomes importantes da bíblia como Amós, Oséias, Isaías, Miquéias e Jonas. Veremos que cada um destes profetas se tem seu destaque e merece muito de nossa dedicação nos estudos, pois foram relevantes em seu tempo e sua mensagem profética tem verdades que perduram até hoje, com colaborações importantes na vivência da fé e da pesquisa acadêmica. Conhecer e aprofundar-se nestes nomes pode elevar sua hermenêutica bíblica inserindo a você leitor dentro da mensagem e do contexto da mensagem do profeta. O convite está feito... Vamos mergulhar no mundo que viveram estes profetas. Então conheçamos, e prossigamos em conhecer ao Senhor; a sua saída, como a alva, é certa; e ele a nós virá como a chuva, como chuva serôdia que rega a terra. (Oséias 6:3) (BIBLIA JERUSALÉM, 2002). 28UNIDADE I Profetas e Profetismo Bíblico 28UNIDADE II Profetismo do 8° Século 1. O PROFETA AMÓS Sobre a biografia de Amós existem poucos dados sobre sua vida antes da profecia com poucas informações históricas sobre ele, neste caso apenas conhecemos seu lugar de origem, Técua, uma cidade pequena e importante localizada a dezessete quilômetros de Jerusalém e mesmo pregando no Reino do Norte, Amós era judeu. Também sua profissão o apresenta como alguém do campo, um pastor (noqued), vaqueiro (bôqer) e plantador de sicômoros (um tipo de figo). Algumas pesquisas apontam Amós como um homem do campo, mas com posses consideráveis e um viajante inteligente no comercio de animais e de suas colheitas, caracterizando como um homem viajado e experiente em sua região, estes aspectos tornam sua mensagem mais relevante como veremos a seguir. O profeta não alimentava relação com grupos de profetas anteriores e sua vocação profética é levantada de forma independente. Logo de início em nossos estudos, precisamos estabelecer uma visão panorâmica da época do profeta Amós. Inicialmente no século VIII, os profetas de Israel de grande eminência inauguram o período conhecido como dos “profetas escritores”, isso pelo fato de terem agora suas profecias escritas em registros literários, apenas este fato já nos aponta a importância do profeta Amós em seu tempo. A partir de Amós outros profetas também passam a ter tal reconhecimento de sua mensagem profética, desta forma cada vez a profecia destes homens a estabelecia relações mais profundas com sua sociedade provando que suas mensagens vaticinadas causaram impressões importantes em seus ouvintes. 29UNIDADE I Profetas e Profetismo Bíblico 29UNIDADE II Profetismo do 8° Século O primeiro grande diferencial da profecia de Amós que difere de seus pares anteriores a ele se dá pelo fato de que Amós não se enquadraria no grupo de profetas reformistas, mas o que eram esses profetas reformistas? Os profetas reformistas anteriores a Amós entregavam suas mensagens profetas com moderação contra a monarquia e os poderosos de seu tempo, crendo em uma espécie de reforma “mudança” dentro da corte através das suas profecias. Estes profetas admitiam falhas nas estruturas de poder, mas criam na solução de problemas mesmo que não abandonassem essas estruturas (GUSSO, 2003). Em Amós, esse prisma e objeto da mensagem mudam, e o profeta então passa a advertir a todos, inclusive poderosos de que essas estruturas de poder estão deterioradas, apodrecidas e que não havia restauração ou “reforma”, o apontamento do profeta é uma ruptura completa da estrutura uma volta urgente a Deus e sua verdade bem como o arrependimento genuíno, caso contrário, Deus não perdoaria o seu povo e nem voltaria a agir em favor deles. Essa ruptura no molde da mensagem profética anterior, a Amós teria sido o motivo pelo qual a profecia do profeta em menção seria escrita, como forma de que quando a desgraça acontecesse, ninguém pudesse dizer que Deus não tinha anunciado (SICRE, 1992). Outro indicativo é que os profetas posteriores a Amós também desejassem manter seus escritos por dois motivos: prova e contraprova de que Deus havia avisado anteriormente seu povo e por Deus ordenar a seus oráculos que registrassem as ordenanças de Deus os seus profetas. Neste sentido, a literalidade iniciada em Amós causará impactos fortíssimos ao povo por rememorar as palavras de Deus e aos profetas de suas responsabilidades além de seu tempo. Neste período (século VIII) mais profetas de relevância comunicam sua profecia e ganham notoriedade no enredo bíblico sendo eles: Oséias, Isaías e Miqueias. Para podermos contextualizar a profecia de Amós no âmbito social é preciso atenção, pois embora junto a outros profetas (Oséias, Isaías e Miqueias) as estruturas sociais são muito parecidas, os problemas sociais também, mas o olhar e o enfoque da profecia de cada um deles muda e ressalto mesmo em contextos sociais parecidos. Em Amós, a riqueza do Estado era reduzida por meio do trabalho dos mais pobres, mas este não era o problema para Amós, já que o fato se dava na opressão e nos soldos injustos ante o muito trabalho do povo. A supremacia poderosa extraia dos mais pobres sua força de trabalho ao extremo, sem a remuneração que lhes permitissem no mínimo a subsistência básica em quanto por outro lado os ricos cada vez mais ricos usufruíam de luxos ignorando as situações de extrema pobreza do povo. Por este motivo Amós divide a população de Samaria em dois grupos: os “oprimidos” e os que “entesouram” (Am 3.9-12). 30UNIDADE I Profetas e Profetismo Bíblico 30UNIDADE II Profetismo do 8° Século A cidade Samaria está em um caos de opressão tão discrepante que Amós faz um convite a seus inimigos mais severos a retornarem a Samaria e contemplarem o tamanho desgraça como destaca Sicre (1992): Só um público especializado na matéria (em destruir Samaria) é capaz de entende-la. Por isso Amós começa convidando os filisteus (Azoto) e os egípcios. Para os israelitas esses dois povos são inimigos tradicionais, protótipo de opressores. Os egípcios escravizaram Israel antes do êxodo; os filisteus, quando se estabeleceram em Canaã. A este público, perito em infligir opressão, Amós faz o convite de contemplar o espetáculo da opressão (SICRE, 1992, p. 361). Por este motivo, como mencionamos na unidade I, que a leitura do contexto agrega muito a compreensão de sua profecia, leiamos agora o texto de Amós capitulo três os versículos nove e dez: Proclamai este oráculo nos palácios de Azot, nos palácios do Egito. Clamai: Juntai-vos nos montes da Samaria, e vede quantas desordens há nessa cidade, quanta violência se pratica no seu seio! São sabem fazer o que é reto - oráculo do Senhor - amontoam em seus palácios “o fruto” de suas violências e de seus roubos (Amós 3: 9-10, Bíblia, Versão Católica, 2002 ). Amós usa então termos muito severos para expressar à situação vivida dada as diferenças sociais explícitas na cidadeele as apresenta como mehûmot rabbôt, ou seja, grande terror, semelhante ao de guerra. Mas esse cenário apresentado pelo profeta difere- se muito caso um visitante casual entrasse em Samaria, pois ele veria uma cidade em construção, um grande canteiro de obras luxuosas e portentosas. O luxo esbanjador das grandes famílias era facilmente notado trazendo então uma imagem de cidade prospera e feliz, mas isso não passa pelos olhos do profeta, vejamos: Oráculo do Senhor: Por causa do triplo e do quádruplo crime de Israel, não mudarei meu decreto. Porque vendem o justo por dinheiro, e o pobre por um par de sandálias, porque esmagam no pó da terra a cabeça do pobre, e trans- viam os pequenos, porque o filho e o pai dormem com a mesma jovem, o que é uma profanação do meu santo nome, porque se estendem ao pé de cada altar sobre vestes recebidas em penhor, e bebem no templo do seu Deus o vinho dos que foram multados (Amós 2:6-8, Bíblia, Versão Católica, 2002 ). Por fim, é neste caos que Amós se levante para profetizar contra a injustiça notória praticada ao povo e a exploração dos mais ricos por dinheiro, mas Amós aponta que Deus vê e agirá diante desta situação. O fim da mensagem de Amós é o consolo do céu ao povo que tanto foi oprimido, mas com a certeza que Deus viu seu sofrimento, enviou seu profeta e agira em favor dos seus, castigando severamente quem não atendeu a voz de Deus. 31UNIDADE I Profetas e Profetismo Bíblico 31UNIDADE II Profetismo do 8° Século 2. O PROFETA OSÉIAS Sobre a biografia de Oséias não existem informações concretas de seu lugar de nascimento a história não apresenta sem sua data natalícia nem sua data terminal. Temos informações de seu pai (Beeri) e de sua esposa (Gomer). O nome Oséias de acordo com Gardner (2012) significa em hebraico “ajuda” ou “salvação”, ele então é o único personagem com um nome que faz referência ao termo salvação no Antigo Testamento. A árvore genealógica com raízes em Oséias se ramifica em seus três filhos, que assim como Oséias recebem nome com forte apego simbólico sendo: Jezrael (Deus semeia), Lo-Ruama (que significa Sem Compaixão) e Lo-Ami (que significa Não-povo-meu). O casamento de Oséias inicialmente é um fato inesperado, uma ordem de Deus para que o profeta tomasse para si, Gomer como esposa mesmo sendo ela uma prostituta, fato esse que também ganha possibilidades de interpretação dado aos simbolismos que envolvem a vida do profeta. Logo no início de seu texto, Gomer engana ao profeta. Posterior a este fato, o profeta recebe outra mensagem de Deus que lhe pede que tome outra mulher agora e que o profeta cometesse um ato de adultério com ela, fato que foi consumado, então o profeta lhe pede uma espécie de celibato e segredo de seu ato (Oséias 3). Nestes itens alguns autores diferem, pois creditam a Gomer a posição de meretriz, mas seus atos são frutos de uma relação conturbada com o profeta, que levaram atraiçoes mutuas. No entanto, Sicre (1992) defende que “essa experiência trágica no casamento serviu a Oséias para compreender a relação entre Deus e seu povo”. 32UNIDADE I Profetas e Profetismo Bíblico 32UNIDADE II Profetismo do 8° Século A mensagem de Oséias tem relações próximas como vimos no tópico anterior, no que tange a profecia e sociedade, com um enredo literário dos profetas voltados a uma posição de Deus ante as mazelas sociais as quais o povo estava sendo submetido pelos poderosos opressores (KESSLER, 2009). Oséias também tem um olhar diferente ao culto religioso e sua profecia também contempla críticas ao culto, que os olhos de Oséias era um culto superficial e falso (WOLFF, 2003) somado a rituais a outras divindades que não seriam o Deus verdadeiro. O culto a Baal instituído por Jeroboão I quando as tribos do Norte e do Sul haviam se separado, já havia se tornado em uma espécie de culto cultural, ou prática cultural do período Jeroboão I, que colocará em evidencia imagens de ouro maciço (bezerros) fazia com que o povo lhes prestasse adoração. Outra modalidade de culto errôneo notado por Oséias se dava nas relações bélicas firmadas entre Israel, Egito e Assíria, essa aliança tinha como resultado a manutenção do exército Israelita (defasado) fazendo com que o culto e práticas e egípcios e assírios fossem aceitas com uma certa normalidade, dividindo ainda mais o culto com Javé. Aliança tríplice entre essas nações conduzem o povo de Israel a um erro com consequências penosas diante de Deus, como desta Luis Sicre: (...) os israelitas correm perigo ao procurar salvação fora de Deus nas alianças com Egito e Assíria, grandes potencias militares que podem proporcionar cavalos, carros e soldados. [...] O povo corre atrás deles esquecendo a Javé (SICRE, 1992, p. 256). Diante do erro descomunal do povo em sua relação com Deus, Oséias divide em sua profecia-texto sua pregação em três etapas. A primeira apontando pequenos juízos de Deus para que seu povo retorne a lei e ao relacionamento estabelecido e esperado por Deus, um relacionamento de exclusividade. Nesta primeira, o povo se concertava, mas tão logo retornavam aos erros originais e perdiam as bênçãos da obediência a profecia e ao profeta (Os 2:9,7; 10-14), assemelhando-se a figura de um casal onde o marido/Deus perdoa sua esposa/povo. Num segundo momento de sua pregação, em forma de poesia, a mensagem do profeta muda a figura de Deus/esposo para Deus/pai e Israel sendo seu filho. Nesta parte Israel/filho se afasta do Deus/pai e prefere os amigos/ Egito-Assíria abandonando seus ensinamentos, um protótipo de filho rebelde, pois Israel chega a pedir auxílio a Baal ante suas batalhas. Na última etapa de sua pregação, também em poema, Oséias inicia com uma exortação, pedindo que o povo se arrependesse e voltasse tão logo a Deus e seus preceitos, abandonando os ídolos e falsos deuses já estabelecidos na forma de culto cultural na nação, como resultado deste arrependimento da nação Deus a curaria, perdoaria e a amaria novamente. 33UNIDADE I Profetas e Profetismo Bíblico 33UNIDADE II Profetismo do 8° Século Essas mensagens situam-se no período final do reinado de Jeroboão II, sua mensagem profética entra em ação logo após o exílio de Amós no reino do Norte. Uma crise política se estabelece data a alternância na ocupação do trono, Zacaria filho Jeroboão é morto assinado por Selum, que logo em seguida é assinado por Manaém (2 ª Rs 15:8- 16) (BIBLIA JERUSALÉM, 2002). Manaém tem um início de reinado prospero, mas com a ascensão de Teglat-Falasar III ao trono da Assíria, Manaém é rendido e tem que comprar sua liberdade ao pagar mil pesos de prata (2ª Rs 15:19-20) (BIBLIA JERUSALÉM, 2002). Manaém para resolver o déficit em suas contas aumenta impostos inclusive aos mais ricos e sofre forte pressão no trono (GUNNEWEG, 2005). O filho de Manaém, Facéias, assume o trono no lugar de seu pai, mas dois anos após sua ascensão ao trono ele é morto. Diante de batalhas perdidas aos exércitos de Damasco, então Teglat-Falasar III intervém, ajuda a Judá e deporta judeus a Assíria. O povo, agora rendido ante a um opressor mais poderosa, fica sem reação e a profecia ganha tons cinzentos quando a esse quadro somasse o culto a Baal e o povo literalmente afastado de Deus. Assim concluímos que a mensagem do profeta Oséias foi uma mensagem profética entregue ao povo em diferentes formas e linguagens, sempre com Deus ansiando de seu povo a compreensão de sua mensagem de forma completa. O profeta atende a ordem de Deus e entrega por completo sua mensagem tanto para os juízos como para as bênçãos advindas da obediência, mas de fato, o povo de coração corrompido e endurecido se afastou da verdade de Javé e colheu as consequências deste abandono aos preceitos divinos, sofrendo a duras pagas as consequências de sua obstinação em seguir seus próprios conselhos. 34UNIDADE I Profetas e Profetismo Bíblico 34UNIDADE II Profetismo do 8° Século 3. O PROFETAISAIAS Neste tópico abordaremos um dos profetas de mais proeminência nos escritos veterotestamentários, Isaias. Não existem dados concretos de pesquisa quanto ao seu nascimento e educação, mas provavelmente o profeta Isaias tenha nascido e foi educado em Jerusalém (GARDNER, 2012). Seu pai chamava-se Amós, mas não podemos afirmar uma relação entre o profeta Amós de Técua (SHOKEL e SICRE, 1988 ) o restante de sua genealogia segue ainda desconhecida, no entanto, existem suposições de uma relação parental com o Rei Uzias (791 a 740 a.C.) isso pelo fato de o profeta ter acesso a corte e assuntos a ela relacionada que pessoas comuns não poderiam acessar. Um reforço a esta tese se dá pela forma de escrita e literalidade, pois o profeta Isaias tinha consciência história de seus escritos e que apontam para valorosa formação acadêmica. Sobre a literalidade do profeta Isaias, destaca-se as diferentes formas de escrita utilizadas em seu livro e a forma compreensível em que comunicava os oráculos de Deus a seu povo. A forma da escrita do livro é esplêndida e rompe em partes com os modelos literários do Antigo Testamento até Isaias, para Paul Gardner a escrita de Isaias é “incomparável em sua expressão literária” isso pelo uso de seus artifícios retóricos e imagens literárias. Esses artifícios retóricos se dão pela facilidade que o profeta tinha de escrever utilizando linguagens de guerras, conflitos sociais e vida rural. Somasse a essas ricas características um vocabulário muito polido do profeta em sua escrita, fator que reforça a tese anterior de um vínculo parental mesmo que distante com a monarquia. 35UNIDADE I Profetas e Profetismo Bíblico 35UNIDADE II Profetismo do 8° Século Por fim em sua literalidade aspectos devem ser levados em consideração na hermenêutica das profecias vaticinadas por Isaias como: Personificação da criação (sol, lua, montanhas, arvores...) ele também faz uso de expressões apocalípticas, metáforas, sarcasmo, aliterações, jogos de palavras, assonâncias e usa até zombarias em seus escritos (Is 14:4-23). Quando falamos do uso destes recursos na língua hebraica um desenho do profeta como pregador também começa a surgir, e Isaias ganha o caráter de um pregador exímio e talentoso, Isaias pregava não para oferecer às respostas as crises de seu tempo e sociedade, mas propunha questionamentos, elemento diferencial a ser destacado como orador. Isaias como pregador e profeta mostrava-se em seus escritos também como um servo temente, piedoso e devotado e sua vocação profética. O chamado de Isaias acontece com ele ainda muito jovem, neste período Isaias desfrutava de uma “piedade juvenil”, ou seja, estava próximo de Deus e sabia que seu chamado estando alinhado a este relacionamento íntimo certamente lhe trazia grande segurança e convicção. Quatro pilares são estabelecidos tanto na profecia como em sua vida devocional, são eles: a) A santidade de Deus; b) a consciência do pecado (individual e coletivo); c) a necessidade de um juízo (castigo) e por fim d) a esperança de salvação em Deus. Isaias casou-se ainda jovem, mas relatos convictos de que era sua esposa ainda merecem ser mais apurados, mas deste relacionamento Isaias tem dois filhos Sear Yasub (“Um resto há de voltar”) e Maher Salal Has Baz (“Pronto para o saque, preparado para o butim”) (SICRE, 1992), esses nomes também reafirmam a devoção completa a Deus pelo profeta. Sobre a família e genealogia de Isaias não temos informações ou fontes confiáveis para tal, às informações também vagam quanto a data de sua morte. A profecia de Isaias no enredo de livro e transmitida pelos copistas da época, colo- cam Isaias profetizando em três períodos durante o texto, sendo: no reinado de Joatão, no reinado de Acaz e no período de minoridade e maioridade de Ezequiel. Em uma proposta de síntese da mensagem do profeta Isaias, podemos dividi-la em dois períodos, sendo um período mais voltado aos problemas sociais de seu povo e outro com sua profecia voltada a questões mais políticas a partir do ano 734 (SICRE, 1992). Em suas ações proféticas o caráter de denúncia do profeta se dá em partes por influência do profeta Amós, mesmo estando em estados diferentes (Norte e Sul), mas mantendo-se o mesmo viés de crítica, em que apontavam principalmente as classes dominantes e as injustiças sociais que causavam. 36UNIDADE I Profetas e Profetismo Bíblico 36UNIDADE II Profetismo do 8° Século Suas mensagens em oposição a estes fatos alimentavam no profeta a esperança de mudança de comportamento dos opressores: “Cessai de praticar o mal, aprendei a fazer o bem” (Is 1:17) a mentalidade profética de Isaias vislumbrava essa mudança por parte dos opressores. Somando-se a isso a experiência pessoal do profeta ao “ver o trono” é um fato marcante no desenvolvimento de sua profecia, e ver como um homem pecador, impuro no meio de um povo impuro traz para o profeta uma responsabilidade na mudança do cenário ao qual estava inserido e um clamor a obediência primeiramente a Deus, como em sua vocação e também em sua mensagem profética. A mensagem do profeta Isaías deste modo mesclou repreensões e anúncios de maldições pela infidelidade do povo, com conforto e esperança pela restauração futura. Desse modo, o profeta Isaías pregou sobre a importância da fidelidade ao Senhor. Essa mudança proposta pelo profeta em sua mensagem estabelece em Isaias uma nova forma de modus vivendi do povo com Deus, no texto de Isaias fica notório que a conversão a mudança de erros cometidos no passado está diretamente atrelada a uma relação integra e correta com Deus, para o profeta então, Deus não espera palavras de fidelidade e cultos fiéis, mas espera obediência integral por parte dos seus causando assim mudanças na sua vida cotidiana, isso seriam frutos de uma conversão a Deus por meio da mensagem profética. Isaias também em sua profecia é alimentado de um messianismo, fato que por algum tempo de forma corriqueira era chamado de profeta messiânico, isso pelo fato de sua mensagem ter forte apego a vinda de um Messias que reestabeleceria a verdade de Deus e sua justiça entre o povo. Muitas de suas mensagens com foco em seu tempo apontavam apara um futuro próximo e que foram cumpridos no ministério de Jesus (cf. Is 53:4-6; 2Co 1:15; Hb 9:26 ) (BIBLIA JERUSALÉM, 2002). Outro aspecto que podemos incluir a estes fatos se dá ao fato que Isaías apresentou Jesus como “o Servo” que traria justiça as nações, que restabeleceria a aliança, iluminaria os gentios (no sentido de prover salvação a eles), expiaria o pecado de seu povo e, finalmente, ressuscitaria dos mortos (Is 42:1-7; 49:1-7; 52:13-53:12) (BIBLIA JERUSALÉM, 2002). Essa percepção da vinda do Messias prometido, fizeram com que o profeta Isaias fosse o profeta mais mencionado no Novo Testamento, principalmente quando as pautas direcionavam a pessoa de Jesus e as profecias que se cumpriram com perfeição sobre o Messias no Antigo Testamento. Sobre a morte do profeta, alguns historiadores apontam que Isaías morreu durante o reinado do rei Manassés. Se for esse o caso, por este motivo, o nome de Manassés não consta na relação de reis em Isaías 1:1 porque talvez o profeta Isaías já não desempenhasse mais nenhuma atividade profética neste período. A tradição também afirma que o profeta Isaías sofreu martírio sendo serrado ao meio por ordem do próprio Manassés, mas não há muitas evidencias a esse respeito. 37UNIDADE I Profetas e Profetismo Bíblico 37UNIDADE II Profetismo do 8° Século Caso de fato tenha ocorrido isso com o profeta, então talvez o escritor do livro de Hebreus tenha mencionado seu martírio na galeria dos heróis da fé (Hb 11:37) (BIBLIA JERUSALÉM, 2002). Por fim, o livro de Isaias está repleto de mensagens proféticas ao seu povo com vistas ao futuro, isto também pelo fato do livro de Isaias conter dois blocos de textos apocalípticos (Cap. 24-27 e 33-35). A formaçãoabalizada do profeta, sua forma rebuscada de escrita, seu vínculo com a monarquia, sua habilidade como pregador, sua percepção e crítica social, sua responsabilidade com sua vocação, sua sinceridade de condição diante de Deus, sua autoridade, sua audácia, suas convicções e fidelidade a Deus de fato atribuem ao profeta características que de fato o elevam de categoria nos textos bíblicos e de forma mais que merecida. Nesta pequena amostragem da vida e obra do profeta as páginas deveriam exceder-se mais, nossas laudas são poucas, mas que permaneça em nós leitores o desejo pela pesquisa do profeta Isaias. 38UNIDADE I Profetas e Profetismo Bíblico 38UNIDADE II Profetismo do 8° Século 4. OS PROFETAS MIQUÉIAS E JONAS 4.1 Miquéias Neste momento apresentaremos uma síntese sobre a vida e obra do profeta Miquéias. Nascido em Moreset, aldeia próxima a Judá, a cerca de 35 quilômetros, o profeta teve sua formação em um ambiente bucólico/rural vivenciando as experiências e sabedoria destes, mas também vivendo conjuntamente com suas agruras e opressões, principalmente advindas de latifundiários (SICRE, 1992). Poucas informações apontam para qual seria a profissão do profeta e suas condições sociais, mas certamente seria um homem embainhado de simplicidade e dado ao trabalho pesado. Em seu ministério, como afirma Wollf (2003) o profeta desempenha um importante papel, sendo já um ancião (zaqen) Miqueias parece ter se cansado das injustiças que presenciou ao longo de sua vida e que a incomodarão com tais fatos o levantassem como profeta de Deus. Seu ministério foi desenvolvido entre os reinados de Joatão, Acaz e Exequias, alinhando-se em alguns aspectos a mensagem do profeta Isaias, isso entre os períodos de 740-698 a.C. (SICRE, 1992). Durante esses reinados, ao levantar sua denúncia profética Miquéias foi muito incisivo contra os opressores dos moradores rurais, com veementes ameaças contra latifundiários que exploravam os trabalhadores rurais o ambiente em que Miqueias viveu era marcado por latifúndio, altos impostos, aldeias saqueadas, roubos, tra¬balhos forçados e prostituição. A mensagem do profeta em aspectos literários, ou seja, sua escrita está basicamente nos capítulos inicias de seu texto, mais especialmente nos capítulos 2 e 3, onde o profeta de fato é apresentado como um forte promotor de justiça contra as invasões e apropriações das casas dos camponeses. 39UNIDADE I Profetas e Profetismo Bíblico 39UNIDADE II Profetismo do 8° Século A narrativa nos coloca como leitores do livro de Miquéias em um ambiente tenebroso, onde os mais fracos, sem condições de qualquer residência ou defesa perdem tudo de forma autoritária. Ao abrirmos o livro do profeta Miqueias, deparamo-nos com fortes denúncias e julgamentos severos contra as autoridades do seu tempo. À luz de seu sofrimento o profeta acredita que Deus não compactua com a realidade notada de injustiça social. Como vemos abaixo: Escutem bem, chefes de Jacó, governantes da casa de Israel! Por acaso, não é obrigação de vocês conhecer o direito? Inimigos do bem e amantes do mal, vocês arrancam a pele das pessoas e a carne de seus ossos. Vocês são gente que devora a carne do meu povo e arranca suas peles; quebra seus ossos e os faz em pedaços, como um cozido no caldeirão. Depois, vocês gritarão a Javé, mas ele não responderá. Nesse tempo, ele esconderá o rosto, por causa da maldade que vocês praticaram (Mq 3:1-4). Concluímos então que o profeta Miqueias elabora uma espécie de “Teologia da Opressão” onde os opressores serão julgados de forma severa pelo próprio e Deus e verão em vida as consequências de seus atos injustos e por outro lado os oprimidos serão assistidos pelo próprio Deus e libertos da opressão e injustiça de seus opositores. Quanto à morte de Miqueias as informações não são concretas, mas o profeta encerra sua carreira com uma mensagem de forte embate contra as injustiças ao povo de Deus. 4.2 Jonas O profeta Jonas identificado como “filho de Amitai” no início de seu livro, era natural da vila de Gate-Hefer, uma região cosmopolita e com diferentes culturas coabitando na vila, fato que pode ter sido preponderante no envio de Jonas Nínive. O nome Jonas tem o significado em hebraico de “pomba”, esse significado pode ser dado por seu país considerarem Jonas uma criança dócil e pacífica, mas também um contraponto a vocação dele como profeta ao enviar uma dura mensagem contra os Nínivitas. A época de Elias já havia passado e seu sucessor, Eliseu, tinha morrido durante o reinado do pai de Jeroboão II. Embora Jeová tivesse usado esses homens para eliminar a adoração de Baal, Israel estava se desviando novamente (HOUSE, 2005). O país estava mais uma vez sob o poder de um rei que “fazia o que era mau aos olhos de Jeová” (2 Reis 14:24). A ida a Nínive é a peça chave do quebra cabeça da compreensão da vocação profética de Jonas. A cidade era capital do reino da Assíria, na margem esquerda do rio Tigre, na antiga Mesopotâmia, Nínive, cujo nome significava “bela” (também de dimensões territoriais extensas). Jonas então é enviado a Nínive para converter o seu povo e, assim evitar a sua destruição (Jonas 3:1-10). Mais tarde, é o profeta Naum que descreve a ruína de Nínive, que parece ter sucedido por volta de 612 (a.C). 40UNIDADE I Profetas e Profetismo Bíblico 40UNIDADE II Profetismo do 8° Século Os Assírios, tradicionalmente tidos como um povo conquistador e cruel foram construtores de uma civilização que deixou marcas importantes no mundo antigo, visíveis nas suas cidades, como Nínive, Assur e Nimrud. Decaíram a partir do século VII a. C., depois de mais de quinze séculos de conquistas e esplendor. A ida de Jonas a Nínive, cidade fundada por Oannes, por uma ordem divina, em uma leitura inicial pode apresentar-nos características de desobediência e covardia por parte do profeta, mas também é inegável notar que Jonas teve papel muito importante na história de Israel e na expansão do reinado de Jeroboão II (782 a 753 a.C.) (GARNER, 2012). Ao que é notado as palavras do profeta Jonas serviram de grande incentivo as investidas progressistas e expansivas de Jeroboão II e a recuperação de territórios que estavam em domínio dos sírios trouxe de volta parte da glória de Israel como nos dias de Davi e Salomão. Embora fatos históricos se assemelham ao livro e são apresentados pelo profeta Jonas, alguns teólogos caracterizam o livro como uma alegoria, uma parábola destinada a ensinar algumas lições, como por exemplo que Deus é o senhor de todas as nações. (GARNER, 2012, p. 372). Este fato é confrontado por outros historiadores que apontam Jesus reafirmando a historicidade Jonas ao afirmar que ele ficou três dias no ventre do grande peixe (Cf. Mt.12:40) (BIBLIA JERUSALÉM, 2002), o Cristo entendia a história de Jonas como um fato real e que no período do Novo Testamento a narrativa era considerada historicamente verídica. O profeta mesmo podendo contemplar os efeitos da sua mensagem ficou desapontado com o ato de “certa maneira” misericordioso de Deus ao ver que seus ouvintes se arrependeram como vemos abaixo no texto de seu livro: E Deus viu as obras deles, como se converteram do seu mau caminho; e Deus se arrependeu do mal que tinha anunciado lhes faria, e não o fez. Mas isso desagradou extremamente a Jonas, e ele ficou irado. E orou ao Senhor, e disse: Ah! Senhor! Não foi esta minha palavra, estando ainda na minha terra? Por isso é que me preveni, fugindo para Társis, pois sabia que és Deus compassivo e misericordioso, longânimo e grande em benignidade, e que te arrependes do mal (Jn 3:10 e 4:1-2) (BIBLIA JERUSALÉM, 2002). Esta sensação de fracasso de Jonas foi para Deus um sucesso na missão do envio do profeta, haja vista, é notada a conversão de uma cidade pagã ao arrependimento e volta às leis e desígnios de Deus, reafirmando o fato de que Deus é um Senhor de amor, e o amor um de seus atributos
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