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História Moderna Genese da Idade Moderna: Do bloqueio do Bósforo à aventura Atlantica Material Teórico Responsável pelo Conteúdo: Prof. Dr. Edgar da Silva Gomes Revisão Textual: Prof. Ms. Claudio Brites 5 • Introdução • O Ocaso do Império Romano do Oriente: A Queda de Constantinopla (1453) • As grandes navegações: descobrimento do novo mundo Procure ler, com atenção, o conteúdo disponibilizado, lembre-se que ele é a base para as questões e avaliações. Para saber mais sobre o assunto leia o material complementar. Não esqueça: a leitura é um momento oportuno para registrar suas dúvidas, por isso não deixe de registrá-las e transmiti-las ao professor-tutor. Para que a sua aprendizagem ocorra em um ambiente mais interativo possível, na pasta de atividades, você também encontrará a atividade de sistematização, o fórum de discussão. · Nesta unidade vamos aprender um pouco mais sobre alguns temas importantes para a reflexão sobre a História Moderna. Trata-se dos temas fundantes da Idade Moderna e que vão auxiliá-lo na compreensão do desenvolvimento desse período (sempre) em movimento, e que busca através de novos recortes e abordagens aprimorar e compreender a história que nos foi legada pelos nossos antepassados em suas relações políticas, econômicas e sociais. Genese da Idade Moderna: Do bloqueio do Bósforo à aventura Atlantica • A Inglaterra invade o Novo Mundo 6 Unidade: Genese da Idade Moderna: Do bloqueio do Bósforo à aventura Atlantica Contextualização Para nos contextualizarmos com o assunto desta unidade, refletiremos sobre um passado tão presente por meio de uma entrevista sobre o filme Fetih 1453, que levanta o debate sobre o neo-otomanismo, e da letra da música do compositor Taiguara, Descoberta da América. Reflexões sobre o passado com elementos do presente. 1) Sobre Fetih 1453. Trailer: http://www.youtube.com/watch?v=5HoR9_VdAXc Artigo sobre o filme: http://veja.abril.com.br/noticia/celebridades/filme-sobre-tomada-de-constantinopla- reaviva-debate-sobre-neo-otomanismo 2) Música do compositor Taiguara: Descoberta da América. http://musica.com.br/artistas/taiguara/m/descoberta-da-america/letra.html http://veja.abril.com.br/noticia/celebridades/filme-sobre-tomada-de-constantinopla-reaviva-debate-sobre-neo-otomanismo http://veja.abril.com.br/noticia/celebridades/filme-sobre-tomada-de-constantinopla-reaviva-debate-sobre-neo-otomanismo http://musica.com.br/artistas/taiguara/m/descoberta-da-america/letra.html 7 Introdução Os intelectuais medievais tinham se interessado mais pela teologia, filosofia e lógica do que pelas ciências naturais ou exatas de ordem prática, que podiam transformar o ritmo da vida que levavam as sociedades. Não costumavam questionar empiricamente os dados recebidos da antiguidade clássica, deixados, por exemplo, por gregos como Claudio Galeno (129-217 a.C.), um importante médico e filósofo da antiguidade, ou Aristarco de Samos (310-230 a.C.), astrônomo e matemático precursor da teoria heliocêntrica. Os cálculos de Aristarco, no século III a.C., dos tamanhos relativos da Terra, Sol e Lua, a partir de uma cópia grega do século X. Fonte: Wikimedia Commons Nos séculos XIV e XV, a Europa viveu debaixo de grandes convulsões político-sociais que dizimaram grande parte da população de países como a Inglaterra, França, Itália, Portugal, entre outros. Os principais motivos foram a Guerra dos Cem Anos (1137-1453), entre Inglaterra e França, e a Peste Negra1 , que provocou a escassez de mão-de-obra nos campos e o esfacelamento da economia feudal em grande parte da Europa. As provações da Peste Negra, a fome e as guerras provocaram transformações econômicas e sociais, e não podiam de deixar de agir sobre a forma de pensar do homem. Mentes perspicazes como as de Tomás de Aquino e Duns Escoto, pais da escolástica, não se detiveram sobre as ciências naturais, isso coube aos humanistas do renascimento, mais racionalistas e menos adeptos das teorias sobrenaturais que explicavam o homem e a sociedade medieval. O renascimento, evento localizado no ocaso da baixa Idade Média e nos primeiros séculos da Idade Moderna, transformou a visão que o homem tinha do mundo e revolucionou as ciências política, econômica e natural. Surgiu, ainda, a imprensa, descoberta que possibilitou que se propagassem as novas ideias com maior velocidade. 1 A pandemia de peste bubônica, popularmente conhecida como Peste Negra, que assolou a Europa no século XIV, matou aproximadamente 75 milhões de pessoas 8 Unidade: Genese da Idade Moderna: Do bloqueio do Bósforo à aventura Atlantica A queda do Império Romano do Oriente em 1453 é o marco simbólico desse novo período da história – mesmo que questionada por uma parcela considerável dos cientistas sociais. Esse evento convulsionou por algum tempo a política e a economia da Europa Ocidental, ao fechar as rotas comerciais por terra e mar entre a Europa e a Ásia; mas também impulsionou a busca de novas alternativas para se atingir o norte da África, a Índia e a China. Nessa busca, Portugal e Espanha saíram na frente, aperfeiçoaram equipamentos de navegação, “descobriram” a América e criaram novas rotas comerciais que impulsionaram a retomada econômica da Europa. Enquanto o Império turco-otomano fazia sombra política e econômica para grande parte da Europa, a península Ibérica se tornou potência econômica por mais de dois séculos e refez boa parte dos contornos do mapa do mundo conhecido até o século XV. A Idade Moderna também ficou marcada como uma época de revolução social, onde a base se assenta na substituição do modo de produção feudal pelo modo de produção capitalista. Esse processo se firmou na Idade Contemporânea com a revolução industrial inglesa, no início do século XIX, sem, porém, findar completamente com o modo de vida feudal, que ainda persistiu na Rússia até a revolução de 1917. Com isso, fica exposto o seguinte: a cronologia ocidental está relacionada apenas com os processos históricos marcadamente eurocêntricos, e sob estas bases vamos estudar a História Moderna. O Ocaso do Império Romano do Oriente: A Queda de Constantinopla (1453) Construída no século IV por Constantino, Constantinopla foi uma das cidades mais importantes do mundo. Localizada no estreito do Bósforo, ligava o mar Negro ao mar de Mármara e marcava o limite dos continentes asiático e europeu. Esse estreito funcionava como uma ponte para as rotas comerciais por terra entre Europa e Ásia, além de ser o principal porto nas rotas marítimas entre o mar Negro e o mar Mediterrâneo. O império romano do Oriente (bizantino), por mais de dois séculos antes de sua queda, havia se fragmentado internamente em divisões políticas, sociais e religiosas. Foi saqueado inclusive pelos cristãos cruzados, durante a quarta cruzada, no ano de 1204. A cidade foi incendiada e saqueada por pelo menos três dias por cristãos do ocidente ligados à Roma e ao papa. O Império bizantino também esteve em litígio com os turcos seljúcidas e os húngaros durante o século XIII. No alvorecer do século XV, o Império Bizantino não era mais um império, mas somente uma cidade: Constantinopla. Ela estava decadente, com um conjunto de alguns territórios na Grécia, ainda existia porque a dinastia paleóloga, de imperadores bizantinos, havia reconhecido a supremacia de facto do sultão otomano. As muralhas intransponíveis de outrora foram vencidas pelos turcos-otomanos, colocando fim a existência de um dos mais antigos e longevos impérios da história. No ano de 1453, os otomanos subjugaram o Império Bizantino com a tomada da cidade de Constantinopla. Sob o controle de Maomé II, o Império Turco-otomano inaugurou uma nova era na região do Bósforo, fazendo frente política e econômica ao poderio Europeu durante pelo menos três séculos. 9 Siege of Constantinople. Domínio público – pintura de 1499. O mais antigo mapa sobrevivente de Constantinopla (1422), feito pelo cartógrafo florentino Cristóvão Buondelmonti.Fonte: Wikimedia Commons Cronologia dos acontecimentos Com a morte de seu irmão João VIII Paleólogo, Constantino XI assumiu o trono no ano de 1449. Ele era uma pessoa popular, lutara na resistência bizantina no Peloponeso frente ao exército otomano; no entanto, ele seguia a linha de pensamento de seu pai, Manuel II Paleólogo, na conciliação das igrejas cristãs do oriente e do ocidente, gerando a desconfiança do império turco-otomano governado pelo sultão Murad II, que via em tal acordo uma ameaça de intervenção das potencias na região. O clero bizantino também resistia à aproximação das duas igrejas, separadas desde o cisma de 1054. Maomé II, com a morte de seu pai, o sultão Murad II, assume seu lugar no ano de 1451. A princípio, Maomé II prometera a seu pai não violar o território bizantino. Constantino XI, seguro de sua popularidade junto aos súditos bizantinos, não tratou com o mesmo respeito o novo mandatário otomano. Maomé II ignorou a promessa que havia feito a seu pai e resolveu atacar Constantinopla – algumas fontes citam que essa decisão se deu pelo ultraje de ter recebido a informação de que Constantino XI resolvera cobrar anuidade para manutenção de um príncipe otomano que residia em seus domínios2 . Maomé II decidiu atacar Constantinopla, o cerco começou oficialmente no dia 6 de abril de 1453, com o disparo do primeiro tiro de um grande canhão em direção ao vale do Rio Lico. A muralha até então imbatível começou a ruir em menos de uma semana, pois ela não fora construída para suportar ataques com canhões. O ataque otomano se restringiu apenas em uma frente, o que colaborou para que o tempo e a mão-de-obra dos bizantinos fossem suficientes para que suportassem o cerco. O exército otomano evitou atacar por terra, tendo em vista que as muralhas eram reforçadas por torres com canhões e artilheiros – o que poderia debilitar a sua frota, que não era grande. 2 RUNCIMAN. James C. S. 1453: The Fall of Constantinople: 1453, London: Cambridge University Press, 1965; PERTUSI, Agostino (Dir.). La Caduta di Costantinopoli I: Le testimonianze dei contemporanei. Milano: Mondadori, 1997. 10 Unidade: Genese da Idade Moderna: Do bloqueio do Bósforo à aventura Atlantica O exército bizantino obteve duas vitórias no início do cerco. A primeira ocorreu no dia 12 de abril, diante do almirante otomano, nascido na Bulgária, Suleimã Baltoghlu. Em seu tempo, os búlgaros eram súditos do sultão otomano. Suleimã foi atacado quando tentava penetrar no Chifre de Ouro, pequeno estuário que divide o lado europeu de Constantinopla. A segunda derrota otomana foi seis dias mais tarde, quando o sultão Maomé II tentou atacar pelo vale do rio Lico a muralha danificada pelos canhões e foi derrotado por um pequeno contingente de bizantinos sob o comando do militar do veneziano Giovanni Giustiniani Longo. O contra-ataque de Maomé II veio no dia 22 de abril ao norte de Pera, quando ordenou que construíssem uma estrada de rolagem para que suas galés fossem puxadas por terra, contornando a barreira que lhes foi imposta pelos bizantinos. Com suas galés reposicionadas, os bizantinos, que se espreitavam durante a noite para os reparos das muralhas, não puderam mais executar esse trabalho sob a vigilância constante dos inimigos. Sem opção, os bizantinos foram obrigados a contra-atacar. No dia 28, tentaram um ataque através do chifre de ouro, mas foram descobertos e executados. No dia 28 de maio, houve silêncio no campo de batalha. Essa pausa foi ordenada pelo sultão, para que fosse preparado o ataque final. Na madrugada do dia 29 de maio de 1453, Maomé II voltou a atacar pelo vale do rio Lico. Os soldados bizantinos, sob o comando de Giustiniani, resistiram por poucas horas até que finalmente foram vencidos pelos turcos-otomanos. Após dias de ataques, os canhões do sultão conseguiram abrir uma grande fenda na muralha. Na tentativa de consertá-la, Constantino XI comandou pessoalmente seus homens, tentando retardar a invasão do inimigo – os janízaros, elite do exército otomano, escalavam as muralhas da cidade. Preocupados com o ataque pelo vale do Lico, os bizantinos se descuidaram do setor noroeste, por onde finalmente a cidade foi tomada. O comandante Giustiniani ferido foi levado para seu navio, seus soldados sem liderança lutaram desordenadamente contra um bem preparado exército de turcos-otomanos. Se é lenda ou verdade, no momento final dessa batalha, conta-se que o Imperador Constantino XI levantou sua espada e partiu para o combate, e nunca mais foi visto. A Expansão do Império Turco-Otomano O Império Turco-Otomano começou sua expansão rumo ao Ocidente no final do século XIII, chegando às portas da Europa no Século XV (1299-1453). O território dos turcos-otomanos abrangeu boa parte do Oriente Médio, do sudeste da Europa e do norte da África. Nos séculos XV e XVI, era uma das maiores potências do mundo. Seu anoitecer se dá na segunda década do século XX, ao final da Primeira Guerra Mundial. O território mais importante por eles conquistado é hoje a República da Turquia, capital do antigo Império Bizantino. No início do século XV, o Império otomano controlava diversas regiões da Mesopotâmia, que incluía as proximidades do rio Danúbio e Eufrates. 11 O império otomano não encontra paralelos na Europa. Segundo Green, “[...] era um despotismo militar trazido por uma série sultões competentes da Ásia Menor para Constantinopla, e daí até as portas de Viena [...]. Mas os turcos não eram bárbaros”3 . A constatação de Green refere-se ao modo como os otomanos geriam seus negócios de estado e sua diplomacia – além da cultura e da arte, que desenvolveram ao longo dos séculos e que até hoje podemos encontrar, não apenas na atual Turquia, mas em países como a Espanha, que teve parte de seus territórios ocupados pelos mulçumanos. O império otomano se expandiu com sucesso durante os séculos XVI e XVII. Maomé II, ao se apoderar de Constantinopla no ano de 1453, assumiu mais um dentre os títulos nobiliárquicos que possuía, o de Imperador Romano (Kaisar-i-Rum). Maomé II era um homem culto, preservou os monumentos da capital do território anexado ao seu império, manteve relações diplomáticas com as cidades-estado italianas, poupou Atenas e assimilou o cerimonial da corte bizantina. O seu reinado foi marcado principalmente pela captura de Constantinopla. Apesar de viverem sob o domínio mulçumano, os bizantinos foram tratados com bastante tolerância, estabeleceu-se com isso uma comunidade religiosa autônoma. O antigo patriarca de Constantinopla exerceu, inclusive, funções administrativas na cidade subjugada. Na Europa, os mulçumanos, do Califado Omíada, liderados pelo general Tárique, tomou parte da península ibérica ao vencer o último rei dos Visigodos, Rodrigo. Os mouros dominaram parte da península por aproximadamente oito séculos (711-1492). Os mouros foram expulsos da península Ibérica pelos reis católicos, Fernando e Isabel da Espanha, no ano de 1492. No mesmo ano do jugo de Constantinopla, Maomé II conquistou também pequenas monarquias e cidades Bizantinas da Anatólia, dos Balcãs e da Criméia. As sucessivas campanhas militares bem sucedidas nessa região fez com que os trucos-otomanos fossem respeitados diante das potencias europeias, conferindo-lhes o reconhecimento de império emergente. No entanto, o avanço de Maomé II em direção ao coração da Europa foi freado na região onde se encontra a República da Sérvia, na cidade de Belgrado, conhecido como Cerco de Nándorfehérvár, em 1456, acabando com o sonho de Maomé II de conquistar a Hungria. Ao tomar Constantinopla dos cristãos no ano de 1453, o Império mulçumano tinha se apoderado de um importante entroncamento comercial entre a Europa e a Ásia – a região do Bósforo. Esse império, produto do Oriente Médio e adepto das rotas comerciais e militares terrestres, tornou-se uma potência marítima ao aproveitar os bem equipados estaleiros existentes em Constantinopla e a experiência dos carpinteirosgregos e italianos que lhes prestavam serviço na construção de enormes galeras. E assim, “[...] o império otomano, diferente embora na religião, na raça e na cultura, nem por isso era menos uma parte da Europa”4. 3 GREEN, Vivian Hubert Howard. Renascimento e Reforma. Lisboa: D. Quixote, 1984. p. 401. 4 GREEN, Vivian Hubert Howard. Renascimento e Reforma. Lisboa: D. Quixote, 1984. p. 403. Na Europa, os mulçumanos, do Califado Omíada, liderados pelo general Tárique, tomou parte da península ibérica ao vencer o último rei dos Visigodos, Rodrigo. Os mouros dominaram parte da península por aproximadamente oito séculos (711-1492). Os mouros foram expulsos da península Ibérica pelos reis católicos, Fernando e Isabel da Espanha, no ano de 1492. 12 Unidade: Genese da Idade Moderna: Do bloqueio do Bósforo à aventura Atlantica As especiarias que chegavam do Oriente – como a seda, a porcelana, pimenta do reino, o chá, entre outros – eram cobiçadas havia muito tempo pelos europeus, e foram dominadas neste período quase que exclusivamente pela burguesia das cidades-estado italianas. As especiarias que chegavam do Oriente – como a seda, a porcelana, pimenta do reino, o chá, entre outros – eram cobiçadas havia muito tempo pelos europeus, e foram dominadas neste período quase que exclusivamente pela burguesia das cidades-estado italianas. As rotas das especiarias, geradas pelas mercadorias provenientes da Ásia, remontam da antiguidade greco-romana e interligavam diversos povos ao longo do tempo, foram dominadas por mercadores tanto do Norte da África quanto pelos mercadores do Oriente Médio. Até meados do século XV, o comércio com o Oriente se fez por meio de rotas marítimo-terrestres, pelo estreito do Bósforo, em galés e caravanas, até chegar aos entrepostos comerciais do Ocidente, entre os quais se destacavam Constantinopla e Alexandria. A partir dessas regiões, o comércio passava a ser controlado por burgueses de algumas cidades italianas, como Florença, Gênova e Veneza, entre outras. Diplomacia Turco-Otomana A política externa dos turco-otomanos assentou-se mais nas conveniências do momento do que na diplomacia de fato. A Agressão do império turco-otomano aos europeus e persas foi muito mais uma reação às pressões sofridas por alianças estrangeiras que ameaçavam seus domínios do que uma pré-disposição a invadir a Europa – salvo o ímpeto inicial de expansão para o sudeste do continente. Os temas que dominaram a política externa turca foram quatro: “a hostilidade dos Persas; a aliança com a França; o comércio e a guerra com Veneza; e a oposição aos Habsburgos na Europa Oriental e no Mediterrâneo. Estes temas andavam muitas vezes intimamente relacionados entre si”5. No final do século XV, Veneza ainda dominava um território considerável de ilhas no mar Egeu e sua política mudou de frequentemente em relação aos turcos. A prosperidade de Veneza e dos portos da Arábia tinha sido afetada com a abertura do rico mercado de especiarias pelos portugueses; dependente que era do comércio do Levante no Mediterrâneo para seu abastecimento de cereais, Veneza mantinha boas relações diplomáticas com os turcos, mas se sentia ameaçada com seu crescente poderio naval e a intimidação a suas ilhas. 5 GREEN, Vivian Hubert Howard. Renascimento e Reforma. Lisboa: D. Quixote, 1984. p. 407. 13 As importantes rotas comerciais terrestres (vermelho) e marítimas (azul) bloqueadas pelo Império Otomano em 1453, após a queda de Constantinopla. Entre atritos com as cidades-estado italianas e o bloqueio da maior parte do comércio entre a Ásia e a Europa, o Império turco-otomano impulsionou, indiretamente, a busca de novas rotas marítimas para abastecer o mercado europeu. A descoberta de novas rotas pelos países ibéricos, além de novas especiarias, revelou um novo mundo “inabitado”, que “necessitava” ser colonizado. Há divergências quanto ao marco que inaugurou a idade Moderna, se foi a queda de Constantinopla (1453) ou a descoberta do Novo Mundo (1492), mas é inegável que a queda de Constantinopla no ano de 1453 favoreceu a descoberta de novas rotas marítimas para o Oriente e, consequentemente, a chegada dos ibéricos na América. Eles não foram os primeiros, mas foram os ibéricos que começaram a explorar o continente de forma sistemática, implantando a colonização europeia na América. As grandes navegações: descobrimento do novo mundo Onde a verdade é possuída por prazer. No leito impuro onde se larga e se abandona, A flor humana, renascida pra sofrer. (...) Janela aberta pro mesmo sol Que nos desperta prum novo amor O céu te oferta o futuro Que o som liberta do escuro Pra descoberta do que é teu... Descoberta da América (Taiguara) Eu vejo o mundo como um grande quarto escuro, No crepúsculo do século XV, a maioria dos europeus ainda estava confinada em sua península, navegavam seus mares, margeando seus litorais e não ousavam se arriscar nos oceanos desconhecidos. A aventura coube em primeira mão aos portugueses, instigados pela lenda do Prestes João, um soberano cristão do Oriente que detinha as funções de patriarca e rei. Essa lenda instigou gerações de soberanos portugueses, que tinham como mote ideológico a cristianização dos territórios africanos e dos espaços ocupados na península ibérica pelos mouros. Na realidade, o que interessava aos soberanos portugueses era dominar os portos de Tanger, no Marrocos, e o de Ceuta, no estreito de Gibraltar, entreposto para se atingir a Ásia – já que o estreito do Bósforo era dominado por árabes e italianos e, nesse contexto, contava com o avanço do império turco-otomano em direção ao entroncamento da Ásia com a Europa, fato que culminaria com a tomada de Constantinopla no ano de 1453. Os portugueses avançaram para o oriente via costa africana, atingiram o Cabo Verde no ano de 1445 e o Cabo da Boa Esperança no ano de 1488. O argumento de surpreender pela retaguarda e expulsar os mouros da península ibérica com o auxílio do mítico Prestes João já 14 Unidade: Genese da Idade Moderna: Do bloqueio do Bósforo à aventura Atlantica não estava mais fazendo sentido. No ano de 1492, o reino de Espanha, além de ter expulsado os últimos mouros da península, após a queda de Granada, também se lançavam à aventura marítima, ao financiar a empreitada de Cristóvão Colombo, que errando sua rota atingiu a América. O objetivo era encontrar uma nova rota para a Ásia. Os reis católicos da península ibérica deram a largada para a colonização do Novo Mundo. Essa aventura foi perseguida posteriormente pelos ingleses, franceses e holandeses. Em destaque, o mundo que os europeus conheciam até o séc. XV Fonte: Thinkstock/Getty Images No afã de cristianizar, os ibéricos realizaram outros feitos, como, por exemplo: descobriram novas rotas marítimas e reabasteceram o velho continente de ouro e prata. A busca por metais preciosos teve como causa a transição do sistema de produção feudal para a economia capitalista. Na Europa do século XIV-XV, ou mesmo antes, se acentuou as transformações do modo de vida e de produção econômico-cultural. Na transição feudal-burguesa, houve falta de metais preciosos para comercialização dos produtos trazidos da Ásia e uma nova mentalidade se formou. Com a Peste Negra sob controle, a população voltou a crescer impulsionando o desenvolvimento da economia europeia. Houve aumento da produção de mercadorias destinadas ao comércio e, com isso, a necessidade de metais preciosos para se adquirir produtos de luxo e de especiarias oriundas da Ásia. Os mercadores empreendiam viagens cada vez mais longas para negociar produtos raros na Europa, que consequentemente eram muito mais caros que os produtos europeus. Desde o século XIV viajantes como Marco Polo narravam suas aventuras e viagens e despertavam o interesse de aventureiros e da burguesia nascente, ávida por lucrar com as viagens. Metalismo, ou bulionismo, é a prática mercantilista de juntar o máximo de metais preciosos, os quais representam a ideiade riqueza do país. O principal país metalista foi a Espanha. Como consequência negativa, após acumular grande riqueza, não investiu no desenvolvimento de novas tecnologias para a agricultura e a indústria, e cedeu o espaço no mundo contemporâneo para os países que se industrializaram a partir do século XVIII. 15 Metalismo, ou bulionismo, é a prática mercantilista de juntar o máximo de metais preciosos, os quais representam a ideia de riqueza do país. O principal país metalista foi a Espanha. Como consequência negativa, após acumular grande riqueza, não investiu no desenvolvimento de novas tecnologias para a agricultura e a indústria, e cedeu o espaço no mundo contemporâneo para os países que se industrializaram a partir do século XVIII. As grandes navegações estão relacionadas para além do renascimento comercial europeu da baixa idade média. Outros fatores foram muito importantes para sua expansão, como a formação dos Estados Nacionais – neste caso com a primazia de Portugal e a ascensão burguesa. Medidas como a unificação tarifaria e monetária foram capazes de ampliar os negócios da burguesia e fortalecer economicamente a coroa, e moldaram a fisionomia dos estados modernos. Com a revolução de Avis em 1385, a monarquia portuguesa se associou a nascente burguesia mercantil, consolidando-se como um Estado nacional no século XIV. Italianos e árabes dominavam o comércio com o oriente. Visando superar a dependência com esses dois atravessadores, a coroa portuguesa, apoiada e financiada pelos burgueses, lançou-se ao mar, favorecida pelo aperfeiçoamento das técnicas de navegação incentivadas pelo príncipe Dom Henrique (1394-1460). Após a reconquista dos territórios portugueses ocupados pelos mouros, Portugal se viu ainda impelido a derrotar corsários que singravam suas águas, impedindo a navegação mercantil. Coube a D. Henrique o importante papel nos descobrimentos: [...] os descobrimentos marítimos do século XV devem considerar-se o resultado de reconversão de uma acção militar e depredadora numa atividade de exploração cientifica, mudança que se deve a uma opção pessoal do infante D. Henrique6. As condições internas criaram a oportunidade para a expansão marítima em Portugal, essa expansão correspondia aos anseios de todas as classes sociais da contraditória sociedade portuguesa. Para o povo, a expansão marítima representou a oportunidade de emigração em busca de conseguir uma vida melhor, pois a mudança social ocorrida nos últimos tempos com a progressiva mudança do sistema feudal para o sistema burguês mercantilista não transformara suas vidas, apenas modificara a forma de opressão. Para clérigos e nobres, desde a formação de Portugal no século XII, havia um compromisso com o rei e o Estado pontifício de aliar expansão e cristianização. Esse compromisso de servir a Deus e servir ao Rei teve como objetivo o merecimento das recompensas mundanas pela burguesia, como: comendas, capitanias, cargos administrativos – que, no quadro que se encontrava a metrópole, ficava cada vez mais difícil de conseguir, pois dentro de um território reduzido como é o português, a desproporção entre os recursos que aumentavam devagar e a necessidade da população que crescia depressa estava causando atritos entre as classes sociais. Com os descobrimentos, a nação vai tornar-se consumidora de bens produzidos fora dela e de riquezas proporcionadas pela exploração das colônias ultramarinas. Portugal passou a sobreviver do que estava fora de seus domínios territoriais, tornando “um Estado onde todos os planos e projectos foram efêmeros e provisórios e nunca excederam o tempo de uma geração”7. Enquanto Portugal despontava para a expansão marítima, a Espanha ainda estava envolvida com as guerras de longa duração contra os mouros que ocupavam parte do território da península ibérica desde o século VIII. Com o fim da chamada Guerra de Reconquista, os espanhóis se 6 SARAIVA, José Hermano. História Concisa de Portugal. 24. ed. Mem Martins: Europa-América, 2007. p. 136. 7 SARAIVA, José Hermano. História Concisa de Portugal. 24 ed. Mem Martins: Europa-América, 2007. p. 137. 16 Unidade: Genese da Idade Moderna: Do bloqueio do Bósforo à aventura Atlantica inseriram na disputa pela expansão de seus territórios para o além mar. O navegador genovês Cristóvão Colombo apresentou aos reis católicos de Espanha um projeto ambicioso, o qual decidiram financiar – era a expedição marítima que pretendia atingir o Oriente navegando pelo Ocidente. Esse financiamento permitiu aos reis católicos espanhóis a façanha de chegar à América, até então, localidade inexistente nos mapas do mundo conhecido, até o século XV, o que lhes possibilitou a exploração econômica do novo continente. Esse descobrimento abriu rivalidade com a coroa portuguesa. Os monarcas buscaram assinar tratados definindo as regiões a serem exploradas por seus reinos. No ano de 1493, a bula Inter cætera do papa Alexandre VI estabeleceu que as terras descobertas por Cristóvão Colombo no ano anterior pertenciam aos reis católicos espanhóis, e aos reis católicos portugueses ficava assegurada a região da Costa Africana, a uma distância de 100 léguas de Cabo Verde. Com o descontentamento do monarca português, no ano de 1494, esse acordo foi revisto e se estabeleceu um novo meridiano de 370 léguas das ilhas de Cabo Verde. Esse novo meridiano permitiu que os portugueses chegassem ao sul do continente americano. No ano de 1500, o navegador português Pedro Alvares Cabral anunciou para a corte portuguesa o descobrimento de novas terras ao sul do Atlântico, essas terras descobertas deram origem à exploração do território onde é hoje o Brasil. Curiosidade! Área total do planeta 510,3 milhões km² Área das terras emersas 149,67 milhões km² Área dos mares e oceanos 360,63 milhões km² Área do Oceano Pacífico* 179,25 milhões km² Área do Oceano Atlântico** 106,46 milhões km² Área do Oceano Índico*** 74,92 milhões km² Área total da Europa 10 180 000 km² Área total da União Europeia 4 324 782 km² Área total da América 42 189 120 km² * incluindo Mar da China Meridional, Mar de Ojtsk, Mar de Bering, Mar do Japão, Mar da China Oriental e Mar Amarelo ** incluindo Oceano Ártico, Mar do Caribe, Mar do Norte, Mar Mediterrâneo, Mar da Noruega, Golfo do México, Baia de Hudson, Mar da Groenlândia, Mar Negro e Mar Báltico *** incluindo Mar da Arábia, Golfo de Bengala e Mar Vermelho http://www.cfh.ufsc.br/~pduarte/dadosterra.html; http://pt.wikipedia.org/wiki/Continente Essas descobertas e a concessão papal feita aos reis católicos provocaram novas insatisfações. Como o de países como a Inglaterra, Holanda e França, que ao longo do século XVI questionaram o monopólio ibérico realizando invasões ao continente, praticando pirataria e estabelecendo colônias. As descobertas dos países ibéricos provocaram a mudança de eixo da economia mundial com a exploração de metais preciosos e produtos como a madeira, além de recursos alimentares desconhecidos dos europeus. Estava assim inaugurada uma nova aventura, para além da economia e da política. Os europeus não estavam sós na face da terra, um novo modo de vida, uma nova cultura os desafiava, as faces da terra se alargavam aos olhos dos europeus, 17 As viagens dos Vikings nos séculos X e XI e as colônias acidentais na Groenlândia e no noroeste continental não tiveram quaisquer impactos generalizados na visão europeia do mundo e nem sequer na daqueles povos navegadores do alto mar.8 Foi somente com as grandes navegações em busca de rotas mercantis para abastecer o mercado europeu a partir do século XV que a face da terra se modificou definitivamente. As bulas papais concedidas aos reis católicos derivavam do costume do representante da igreja de arrogar-se o direito divino de decidir na terra o que considerasse de propriedade divina, como, por exemplo, os mares. No século XVII, algumas teses foram debatidas por juristas, a favor ou contra, da liberdade dosmares para todos os reinos em favor da exploração comercial. Hugo Grotius escreveu a tese Mare Liberum, enquanto o português Frei Serafim de Freitas assegurava o direito papal de decidir sobre essa questão, escrevendo a tese Mare Clausum. Ler: GROTIUS, H. O direito da guerra e da paz. Ijuí: Unijuí, 2004. MEREA, P. Os jurisconsultos portugueses e a doutrina do Mare clausum. Novos Estudos da História do Direito, Coimbra: s/e, 1937. As bulas papais concedidas aos reis católicos derivavam do costume do representante da igreja de arrogar-se o direito divino de decidir na terra o que considerasse de propriedade divina, como, por exemplo, os mares. No século XVII, algumas teses foram debatidas por juristas, a favor ou contra, da liberdade dos mares para todos os reinos em favor da exploração comercial. Hugo Grotius escreveu a tese Mare Liberum, enquanto o português Frei Serafim de Freitas assegurava o direito papal de decidir sobre essa questão, escrevendo a tese Mare Clausum. Ler: GROTIUS, H. O direito da guerra e da paz. Ijuí: Unijuí, 2004. MEREA, P. Os jurisconsultos portugueses e a doutrina do Mare clausum. Novos Estudos da História do Direito, Coimbra: s/e, 1937. O genovês Cristóvão Colombo explorou a serviço dos monarcas espanhóis9 as ilhas dianteiras da zona central da barreira continental do oceano atlântico, nos anos de 1492 e 1493, achando que tinha atingido o continente asiático pelo ocidente, mais propriamente o Japão ou China. Por volta de 1497, o florentino Giovanni Caboto, a serviço de D. Henrique VII da Inglaterra, navegou a costa setentrional do novo continente, descobrindo a ilha Cape Breton, na região da Nova Escócia (Canadá). A incursão de Caboto não teve grandes repercussões no mundo europeu. A primeira incursão de Colombo na zona tropical do novo mundo seguiu-se a de terras mais vastas apenas no ano de 1498. Em 1492, na convicção de que havia chegado ao oriente, generalizou o termo de “índias” para sua descoberta e seus habitantes os denominou “índios” – nome adotado pela coroa espanhola e divulgado para toda Europa, os habitantes do novo mundo ficariam conhecidos assim. Cristóvão Colombo, no decurso da terceira viagem em julho de 1498, perante a grandiosidade do Delta do Orinoco, deparou-se com correntes de água doce que só poderiam provir de uma massa continental; a isso se acrescia as informações de alguns habitantes das terras descobertas sobre a existência de vasta porção de terra firme e grande quantidade de ouro10. Segundo Darcy Ribeiro, “Para os que chegavam, o mundo em que entravam era a arena dos seus ganhos, em ouro e glória. Para os índios, nus na praia, o mundo era um luxo de se viver [...] se defrontaram pasmos de se verem tal como eram [...] a selvageria e a civilização”11. 8 AMARAL, Ilídio. Sobre descobertas europeias do novo mundo e primeiros contatos humanos nos século XV e XVI. Porto: FLUP, 2004. p. 143. 9 Utilizo a denominação Espanha para facilitar a compreensão, pois as bases para a unificação da Espanha como a conhecemos hoje se deu com a união dos monarcas católicos Fernando de Aragão e Isabel de Castela no século XV. 10 AMARAL, Ilídio. Sobre descobertas europeias do novo mundo e primeiros contatos humanos nos séculos XV e XVI. Porto: FLUP, 2004. 11 RIBEIRO, Darcy. O povo brasileiro: a formação e o sentido do Brasil. São Paulo: Cia. das Letras, 1999. p.44-45. 18 Unidade: Genese da Idade Moderna: Do bloqueio do Bósforo à aventura Atlantica A expansão marítimo-comercial da península ibérica trazia consigo um compromisso ideológico: a cristianização dos pagãos. Segundo Amaral, Vasco da Gama, ao chegar na Índia, destacou um emissário para fazer os primeiros contatos com os habitantes locais e, ao ser interrogado sobre os motivos que o trouxeram, por dois mouros em castelhano, surpreendeu-os com a sua resposta: “cristãos e ouro”, ou seja, a aventura ibérica buscava “dilatar o reino da fé católica aos espaços indianos e extrair deles produtos altamente rendosos nos mercados europeus”12. Essa cruzada religiosa não rendeu a Cristóvão Colombo a tão sonhada riqueza em ouro e prata, nem a Pedro Alvares Cabral, que encontrou o pau-brasil com um valor muito inferior a madeira de aloé; ou especiarias, sedas e escravos que rendiam valores muito mais elevados no mercado europeu. Mas suas descobertas ainda renderiam muita riqueza aos reis católicos com a exploração intensiva dos territórios ultramarinos, que causariam mudanças profundas nas sociedades indígenas que habitavam o continente antes da chegada dos europeus. A Inglaterra invade o Novo Mundo A empresa marítimo-colonial inglesa começou bem mais tarde que a da península ibérica no século XV. Primeiro porque, enquanto a península ibérica se lançou nas grandes navegações, a Inglaterra estava saindo de um longo conflito com a França, a Guerra dos Cem Anos (1337- 1453). Mal saída de uma guerra longa e desgastante, entrou em outro conflito, dessa vez interno, na Guerra das Duas Rosas (1455-1485) – entre as famílias York, simbolizadas pela rosa branca, e Lancaster, que usavam uma rosa vermelha como símbolo. Esses conflitos causaram duas importantes reformulações políticas na sociedade inglesa: a primeira fez com que os ingleses se unissem e se afastassem do continente, essa atitude passou a ser conhecida como “esplêndido isolamento”; segundo, esses conflitos enfraqueceram a nobreza e fizeram surgir uma dinastia forte e centralizadora, os Tudor (1485-1603) – eles se tornaram a primeira dinastia absolutista da Inglaterra. No século XVI, o nacionalismo se fortaleceu no país. No século XVII, a Inglaterra estava em transformação. Havia um esgotamento no campo por conta do crescimento da população, causando um êxodo rural. A era Tudor havia proporcionado uma revolução agrícola e trouxe progresso para as manufaturas, mas agora as cidades estavam lotadas de pobres. Sob a dinastia Stuart os ingleses reviveram o fantasma das guerras. Então, estourou a Guerra Civil e a Revolução Puritana, Carlos I foi julgado e morto sob a liderança de Cromwell, que tinha um recado implícito aos soberanos ingleses: “os reis devem servir a nação e não o contrário”. A vida inglesa e a europeia estavam mais difíceis no início do século XVIII. Havia abundância de ouro e prata na Espanha. O ouro e a prata retirados da América e despejados na Europa empurravam para cima os preços dos produtos de primeira necessidade. A população mais 12 AMARAL, Ilídio. Sobre descobertas europeias do novo mundo e primeiros contatos humanos nos séculos XV e XVI. Porto: FLUP, 2004. p. 149. 19 pobre foi atingida e com isso ocorreram agitações sociais pela Europa. Todas essas dificuldades estimularam os ingleses a busca, como fizeram os portugueses, por uma vida melhor através da imigração. Mas a Inglaterra não tinha nenhum projeto colonial sistematizado para a América, após anos de pirataria roubando ouro e prata das embarcações espanholas, a imaginação dos ingleses que estavam passando por dificuldades nas ilhas britânicas não resistiu a ideia de se ter uma vida melhor fora da Inglaterra. Os ingleses não foram os primeiros a chegarem à América do Norte. Verrazano, a pedido do rei francês, já havia incursionado ao norte; também Ponce de Leon tinha feito o reconhecimento do território a pedido do monarca espanhol. A permissão para colonizar a América do Norte, ignorando as pretensões de outras coroas, partiu da soberana Elizabeth I no ano de 1584, que doou a Walter Raleight, “terras, territórios e regiões por descobrir e possuir [...]. A cédula de doação a sir Walter assumia um tom que iniciava um verdadeiro processo de colonização”13. Esse processo, no final do século XVI, não diferia do projeto ibérico para a colonização do novo mundo, onde um nobre assumia as responsabilidades por um pedaço de terra sem excluir o quinhão de riquezas produzida nas colônias que cabia à coroa. Wikimedia Commons LEGENDA = As 13 colônias americanas antes da independência, 1775. 13 PURD, Sean;Fernandes, Luiz Estevam; MORAIS, Marcus Vinicius; KARNAL, Leandro. História dos Estados Unidos. São Paulo: Contexto, 2012, p. 40. 20 Unidade: Genese da Idade Moderna: Do bloqueio do Bósforo à aventura Atlantica Fonte: Thinkstock / Getty Images O descobrimento do Novo Mundo rompeu com antigas tradições culturais e científicas arraigadas no pensamento judaico-cristão. A natureza humana não se fundamentava mais nas genealogias bíblicas, o mundo não se resumia mais ao curto-circuito das certezas europeias. Se foi difícil compreender o outro, foi bem mais fácil enxergar o que esse outro possuía para rapidamente dilapidá-lo em nome do soberano europeu. O Novo Mundo estava “vazio”, era preciso colonizá-lo, “outros tempos viriam de exploração intensiva dos territórios, com mudanças profundas das suas sociedades indígenas. Toda a América estava destinada a ser recriada pelo europeu”. O objetivo dos europeus durante dois séculos foi atingir a Ásia e explorar suas riquezas – China, Japão e Índia produziam grande parte do que se consumiu na Europa dos séculos XIV e XVI –, mas os europeus desejavam mais que isso. Com o objetivo de derrotar o Islã a fim de haver na terra apenas uma fé e uma civilização, os europeus pretendiam cristianizar os asiáticos e civilizá-los à moda europeia, para com sua ajuda assaltarem os mulçumanos pela retaguarda e esmagá-los. O sonho europeu de transformar totalmente a Ásia foi frustrado, ao passo que na América conseguiram conquistar, explorar, evangelizar e europeizar, em grande parte, seus habitantes mais vulneráveis a gana homogeneizante dos europeus. Os europeus conseguiram saquear a Ásia apenas pelas bordas, enquanto que a América foi dilapidada por séculos, abastecendo suas metrópoles e, consequentemente, todos os países com os quais elas comerciavam. 21 Material Complementar Leia” os filmes de forma crítica, lembre-se que, mesmo os documentários, são obras de ficção e carregam em si intenções e ideologias de quem os produziu, assim como a própria história que nos foi deixada como legado pelos nossos antepassados. Segundo o professor Darcy Viglus, especialista em Metodologia de Ensino, A utilização do filme como recurso didático deve facilitar a aprendizagem, fazendo com que o aluno encontre uma nova maneira de pensar e entender a história, uma opção interessante e motivadora, que não seja meramente ilustrativa e nem substitua o professor, mas, que seja um momento crítico e reflexivo de aprofundamento da história. Um momento como diria Almeida (1994), de alfabetização midiática. 1) Filme: 1492 – A Conquista do Paraíso 2) Documentário: Construindo um Império - Bizâncio - History Channel » Link do documentário: http://www.youtube.com/watch?v=xdvm1qyfYi0 3) Jogo eletrônico: animação sobre a queda de Constantinopla » Link do Jogo: http://www.youtube.com/watch?v=17lSbpOO7U8 http://www.youtube.com/watch?v=xdvm1qyfYi0 http://www.youtube.com/watch?v=17lSbpOO7U8 22 Unidade: Genese da Idade Moderna: Do bloqueio do Bósforo à aventura Atlantica Referências ALBUQUERQUE, Luiz de. Mare Clausum: dicionário de História dos Descobrimentos Portugueses. v. 2. Alfragide: Caminho, 1994. p. 685-686. AMARAL, Ilídio. Sobre descobertas europeias do novo mundo e primeiros contatos humanos nos séculos XV e XVI. Porto: FLUP, 2004. BOORSTIN, Daniel. Os descobridores. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1989. BOXER, Charles R. O império marítimo português: 1415-1815. São Paulo: Cia das Letras, 2002. COOK. Michael. 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