Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
A Arte do Morrer- Visóos Phurais A Negação da Morte Rooserelt M. S. Cassorla Psicanalista, Membro Efetivo e Didata da Sociedade Brasileira de Psicanálise de S. Paulo; Profesor Titular Colaborador da Faculdade de Ciências Médicas da UNI- CAMP (Depto. de Psicologia Medica e Psiquiatria) Os maiores misterios que assolam o ser humano se referem às suas origens, a seu napel no mundo e à sua hnitude. Para tentar explicar e compreender esses mistérios, a humanidade vem buscando respostas, utilizando conhecimentos filosóficos, cientifhcos e religiosos. NO entanto, por mais que se pense e se investigue, o ser humano sabe, em seu intimo, que esses conhecimentos em pouco o ajudam frente à imensidão do que não se sabe. Dentre esses misterios, certamente a morte é o mais terrorihco, porque im- plica no desaparecimento, aniquilação do ser. O terror de tornar-se não-existente (pelo menos como forma de vida conhecida) persegue todos os seres humanos e a ansiedade de aniquilamento é descrita, pela psicanálise, como o terror primordial, terror esse que já faz parte do individuo ao nascer. A mente humana tem a capacidade de transtormar sensações e experiéncias em fatos mentais, que podem ser registrados, representados e simbolizados, constituindo- se o pensamento. No entanto, ela não tem condições de representar e pensar o não- existente. Esse não-existente apenas emerge através de sentimentos terroríicos, sinali- zadores da impotência e desespero frente aos mistérios relacionados àfinitude. Isto éa própria tomada de consciência da idéia de finitude é, em si, terrorihca. O ser humano se defronta com a idéia do Nada, do deixar de ser, ea impossibilidade de representar esse Nada é desesperante. Ainda queoprocesso do morrer possa ser, em parte, imaginado e representado, isso nao será possível com a morte, sua consequência hinal. O fato de não poder saber-se o que ocorre quando a morte chega e, ao mesmo tempo, sentir-se terror com sua proximi- dade, acrescenta ao ser humano outro tipo de sofrimento, o de não-saber. O não-saber éé VIvenciado também como terroríhco, um vazio que nos mostra que, ao nada sabermos, nada podemos fazer. E essa ansiedade que nos impulsiona a buscar respostas e soluções que possam, de alguma forma, preencher algo desse vazio assustador. Uma tática será transpor a experiência da morte para aquilo que a antecede, isto é, o processo de morrer For vezes sobreviventes relatam experiências e vivências que se estendem num espec tro que vai desde o terror até visões alentadoras de paz e tranquilidade, passando pela Inditerença. A tendência a valorizar experiências boas (com indicios da existência de Outra vida em seguida à morte) pode ser tanto o resultado da necessidade humana de desacreditara não-exist�ncia como do estudo de relatos de algumas pessoas que viven- Ciaram situações desse tipo. Ora, se o Nada é insuportável, a mente tem que usar estratégias Dai timento insuportável deixe de o ser. Essas estratégias säo conhecidasee de defesa, artificios mentais inconscientes utilizados para evitar que fatos, iddi cmos ou sentimentos penosOS sejam vivenciados. Na negaçao eles não são coneia são postos de lado. Em outras palavras, a mente procura nao tomar conhecir realidade (interna e/ou externa) ou a detorma a tal ponto que ela deixe de Existem várias formas de negação da realidade, velé reprimido ou recalcado - isto é, é expulso da consciéncia más persiste no in ciente-ateé outras em que o fato sequer é considerado pela mente, transformado e em seguida expulso. Essa expuls�o pode incluir, ao mesnm tempo, tunçoes mentais que tiveram contato com o fato. O paradoxo do suicídio esse sen- asias não são considerados ou nhecimento da incomod. , desde aquelas em que o fato sagradá ste no incons ado. Outras vezes o fato é acolhido nes Estudaremos essas estratégias mentais a partir do estudo do suicídio, que nos defronta com um paradoxo: por que o ser humano que vive aterrorizado pela consciên- cia de sua hnitude pode buscar, conscientemente, a morte? Comportamentos variados que levam a morte, muitas vezes, são sentidos como sedutores em certos individuos: uso de álcool e drogas, velocidade e perigo, colocar-se em situações arriscadas, sexo sem cuidados, riscos à saúde e à vida (CASSORLA, 1998 A:2005; CASSORLA & SMEKE, 1985). Em alguns casos, esses comportamentos são fruto da necessidade do ser humano negar sua fragilidade, imaginando-se tão poderoso que pode desahar a morte e derrotá-la. Essa atração pela morte se torna ainda mais mis- teriosa quando nos defrontamos com comportamentos manifestamente suicidas. No entanto, adiada ou não, a morte virá em algum momento, já que estamos programados internamente para morrer. Fatores externos apenas poderão acelerá-la. Quando pensamos em pessoas torturadas por motivos politicos, ou em pa- cientes que sentem dores fisicas terríveis, não é dificil imaginarmos que eles vivenciam sofrimentos que podem ser sentidos como insuportáveis. Esses sotrimentos indicam a proximidade do aniquilamento. Seja o sofrimento inicial vivenciado no corpo ou na mente será esta última (por ser o instrumento que permite a vivência) que experienciarà as ansiedades de desintegração do ser, loucura inominável que precedeo aniquilamen to. Mesmo que funções corporais persistam, elas não poderão ser vivenciados por uma mente que já não existe. O fato dessas pessoas, por vezes, buscarem a morte através do suicidio nos obrigaa pensar que, na verdade, não éa morte (aniquilamento) que elas procuram, mas sim u fuga do sorimento insuportável. E esse mesmo sofrimento que, em última instan assola os pacientes psicóticos, melancólicos ou aqueles que não suportam as vivencas reais ou imaginarias de injustiça, rejeição, fracasso, culpa, etc. Em outras palavias, suicida sente que sua mente está sendo destruída e que, por isso, ele deixará de exist (ou de perceber-se) como ser vivo. Isto é, transformar-se-á em Nada. E, o suicida se n para escapar desse sofrimento insuportável. Ida apos a morte rais mostram como os mecanismos de defesa transtormam o sofrimento terrivel que assola O est chido das fantasias inconscientes que acompanham as idéias e atos suicidas nos individuo ONada em Tudo. Isto e, cria-se a certeza de que após a morte não existem ne Taades ou desejos. A satistação e o preenchimento das necessidades é total, Logo, icte sofrimento. Istoé,o Nada eo não-saber sobre o Nada ésubstituido pela cren ae.azendo parte do Tudo não há que preocupar-se com o Nada. midades do Nada. Um dos mais importantes é transformar, em Evidentenmente o ludo tampouco consegue ser representado mentalmente, mas nodem criar-se aproximaçoes, o que não é possível em relação ao Nada. A mais interes sante, nte. identihcada em todos os tempos e culturas, é a de que após a morte se irá para um tro mundo (ou se terà outra vida), um lugar em que todas as necessidades são satis outro feitas. Esse tipo de fantasia coincide com a idéia de Paraíso que, com poucas'variaçoes, faz parte de todos os SIstemas religiosos. Nesse Paraíso, existe a perfeição absoluta eo individuo une-se a Deus, fazendo parte de uma totalidade perfeita, o Tudo. Esta fantasia nos remete, portanto, à crença de que a vida continua após a morte logo o ser humano e, de alguma torma, considerado imortal. Estudos históricos e antro- pológicos nos mostram formas como essa crença se manifesta. Em muitas culturas os mortos eram enterrados juntamente com alimentos e objetos pessoais que seriam úteis no caminho para o outro mundo. Conhecemos em detalhes os rituais do Egito antigo, onde as pirämides e os cuidados para evitar a profanação de tumbas (certamente por pessoas imunes a essas crenças) mostram sua importáncia. Em culturas como a antiga Ur o rei morto era acompanhado por um séquito de servidores que iriam servi-lo no outro mundo. No tenómeno do suttee,presente na India, mesmo durante o dominio ingl�s, a viúva era enterrada junto com o marido. O mesmo ocorria com o senhor feudal japon�s e seus vassalos. Nas Novas Hébridas uma criança era enterrada junto com sua mae ou outro adulto, que cuidaria dela no outro mundo. Nas ilhas Salomão, somente a esposa favorita tinha o privilégio de acompanhar seu marido após a morte Entre as religiões atuais, o Paraíso dos judeuse cristãos difere daquele imaginado por grupos islåmicos, onde os heróis terão a disponibilidade de prazeres imensos, similares aos terrestres. Esta crença é associada aos suicídios, por eles praticados, com o intuito de eliminar seus inimigos. A oposição ao Paraíso, porvezes, é o lnterno, onde também a Vida continua - ainda que seja uma vida cheia de castigos. Hà poucOs anos ocoreu uma epidemia de suicídio em vários países em consequencia da crença que a proximidade do cometa Halley indicaria o fim do mundo. Os suicidas seriam levados pelo cometa para outro mundo e sua outra vida, curiosamente, não dispensava que tossem levados documentos e cartöes de crédito. Epossivel que a origem da fantasia de Paraiso se relacione ao que se supoe que ocor d Vida intra-uterina, onde todas as necessidades seriam preenchidas. Assim, muitas es, a fantasia de morte é vista como uma volta ao ütero materna Essa fantasia se am Pud para a idéia de volta à mãe-terra. As idéias de reencarnaçao, de algumas crenças, nplicam também na idéia de imortalidade, ainda que com peculiaridades especihcas 273 POSSIvel que o nascimento, por colocar o indivíduo em contato brusco com faltas e necessidades, se assemelhe a dea de Interna que logo será substituid provisório-0 seio materna O trabalho de tornar-se human contato adequado com a realdade e, se possivel, transformá-la r grau de saide mental, isto e de condigOes de usutruira vida, como mer dade vivendo na Terra, que não e Paraiso nem Inferna A fantasia de vida continuando apos a morte, sem necessidades e sofin constinui no oposto da aniquilaçãa Não somente ocome negação da mo se toma sedutora. Entre os antgos crnstaos, o martino teve que ser proibido nels ja que a morte passou a ser buscada pelos heis que acreditavam numa oute ea mundo melhor As religióes, em geral, consideram errado o suicidia No enta Cruzadas, a morte heróica era aprovada pela igreja, da mesma torma que ocome atual mente com os islamitas em relação aos terronistas suicidas Fditora Comenns que logo será substituido por um Paraisa s, isto é, poder entrar em vamente, indic ana condiçóes de usutruir a vda, como membro dahuman nas Culpa, projeção e fantasia de punição Aculpa é um componente essencial dos sentimentos vivenciados pelo paciente me lancolica Frequentemente ele se sente responsavel pelas desgraças do mundo e de sua famlia e acredita que o melhor seria morrer, condenando-se à morte. Seu suicidio pu- nitvo o faz imaginar-se num sofrimento etermo, penitencial, em mundos infermais Na verdade, o melancólico se mata èm função dessas fantastas, mas tambëm para fugir do terror do aniquilamento. Outra possibilidade e que busque, em outro mundo, pessoas mortas que o abandonaram Naverdade, fantasias contraditórias fazem parte do univer so mental de todos os seres humanos. e A ideia de que a morte é uma punição ocorme, também. no intimo da maioria dos seres humanos. Punição justa, se a pessoa se imagina culpada ou pecadora. Mas, injusta seo individuo não se contorma com a realidade ou supõe que sua morte é causada por numagos, humanos ou divinos. Na verdade, existe uma tantasia universal de que a morte è causada por algo extema Isto é, a morte viria sempre de fora e há que procurar os responsáveis por ela. Duran te as epidemias de peste na Europa da ldade Média, a lgreja escolheu os judeus como culpados.As populações desesperadas, que estavam perdendo até num Deus protetot podiam projetar seu terror nos inimigos judeus, dos quais se livravam e isso era etetuato em autos-de-fé, isto é, rituais vingativos em que se contirmavam as crenças dissenmat das pela lgreja. Na verdade, os seres humanos constantemente necessitam de immgd ou bodes expiatórios, onde podem projetar toda a destrutividade propria, que cess torma é negada Esses aspectos se manifestam na idéia de feitiço, mau-olhado, quebranto, mve Qutros sentimentos que atloram em situações de desespero, desesperança e nad Sl E comum, no estudo das culturas e dos individuos, encontrarmos crenças em e bons que protegem e deuses maus, demônios, que fazem sofrer. Hå que manter ses bons com sacrificios. Em certas épocas havia sacrificios humanos que pos mente, foram substituidos por animais. Seus residuos se mantem nos ntuais e das várias religioes, onde o hel se submete, pede perdão ou tenta acalmar os deu médicos e prohssionais de saúde sabem come é difi il f terior çoes s A Arte do Morrer- Visöes Phurais pacientes deixem de atribuir sua doença a pecados, culpas ou puniçao, Se isso se man tem, o paciente pode deixar dle lular pela vida, acreditando que sua doença (ou mesmo a morte) e merecida Dessa lomma, dependendo da forma como o individuo lida com suas fantasias, a re ligiao pode tanto consolar as pessoas como fazé los sentirem se culpadas e dignas de puniçdo Comumente a lorma como a proximidade da morte será vivenciada depen dera da interaçao entre as crenças religiosas introjetadas durante a vida do individuo e a intensidade e qualidade dos mecanismos projetivos utilizados Omecanismo projcço (ou, em lorma mais estrita, identificaçao projetiva) se const tui numa negaçao porque a responsabilidade pelo mal, pela destruição, pela morte, e colocada lora do individuo Está nos outros, inimigos (e há que eliminá los) ou com 0 deuses e demonios e hå que amansá los. Por vezes, a projeção violenta leva à barbae e sao elimmados grupos inteiros, responsabilizados e culpados pelo mal, como attua mente pensam os fundamentalistas cristãos e os fundamentalistas islämicos, cada um imaginando que o mundo hicará melhor coma eiminação dos outros. Quando uma criança é morta num seqüestro, quando balas perdidas atingem ino centes, quando vivemos a violência quotidiana, não é possivel negar que a morte esta em nossa frente, para aquém dos jonais e da TV.Ocorre medo, horror, indignação, mas em seguida a vida continua, como se nada tivesse acontecido. Exceto para as vitimas que Viverao traumas permanentes. Na melhor das hipóteses busca-se um culpado, negando- se que esse culpado apenas é parte de um fenômeno extremamente complexo. ESsa convIvéncia continua com a violência ea anestesia da sociedade em relação a ela retlete o fato de que vivemos numa sociedade em que a vida tem pouquissimo valor, em que a destrutividade e a morte adquiriram tal poder justamente porque esse poder é negado. Até há pouco, a miséria, o desrespeito humano, a falta de cidadania, era problema dos "outros, daqueles (embora maioria) que viviam nas mais precárias condiçoes de vida. As pessoas economicamente privilegiadas passaram a esconder-se em condomínios, viver com seguranças, etc. A negação da viol�ncia se associa à fantasia de imunidade, quase de imortalidade. Quando a violência se manitesta a ameaça de morte é combatida através de inva- soes de favelas, chacinas, esquadrões de morte, morticinios em prisões, etc. Matéria pri ma proplcia para manter a negaçao de que a violencia e a morte estao dentro de nós,e que se o individuo e a sociedade nao se transtormarem profundamente, a morte preco- ce continuará presente, impedindo que a vida se desenvolva. Até que a morte, que faz parte da vida, chegue com naturalidade Morre mais gente no Brasil, em um ano, do que nas guerras do lraque e do Vietnà. Aliás, as guerras mostram comoa seduçao eanegaçao da morte se aproximanm. Os sol dados são seduzidos com fantasias de vitória, de heroísmo, sempre manipulados por interessesdos quais não se dao conta, e vao morrer matando os inimigos. Somente há pouco tempo, jovens tëm se recusado a servir os exercitos, nos EUAeem Israel, questio- nando a guerra. Antes, eles seriam simplesmente fuzilados: hoje já podem ser compre endidos. Há vitórias da vida sobre a morte A guerra das Malvinas toi uma guerra suicida, em que jovens argentinos foram sedu- zidos a tomarem terras onde moram cidadaoS de outra cultura, hå gerações, para desviar 275 Editora Comennus sua mente da ditadura sob a qual viviam. Fra cato que se tratava de soicidie micdio de uma parte da sociedade por outra. A negangalo da morte subjazia Alas, nas guemas sempre parece que serd o o t orto, nunca nós eperene no ser humano Todos estamos progn a0enas aceleram o que ja esta programado Quan ou h hudo is outro que sera moOrto, nunca nós Esta idéia rrer. Fatores exterOs como nimigos, aciden tes, catastrofes naturais, guerras, etc, apenls ale ttcttoyue ja esti programa do atribuimos a morte apenas a fatores extetnos g s que a morte vem, en nstäncia, de dentro do ser humano Fantasia de vingança Outra fantasia identificada em pacientes surciclas inica que, ao matar-se, o ine duo se imagina vingando-se do mundo, das outas pessoas que nao teriam suprido necessidades, que nao o compreeniera, Yue opontan Suficientemente ou o maltrataram. Nestas situaçoes o suicicla nao se veC morto, mas se imagina vendo frimento dos demais, produto de sua vinganga. Vals immportante que a morte seric marcas que ele deixará nos sobreviventes. Nestas situaçóes, é evidente que o indiviauo idou com sua destrutividade através de dois caminhos: 1. parte se vofta contra ele nesto, mas sem ter muita consciência do fato; 2. parte é projetada identihcativamente nos demais, vítimas do ódio do suici. da, fazendo com eles se sintam responsaveis por sua morte. Essa retaliação, se assumida (introjetada) pelo sobrevivente pode torna-lo culpado, por vezes tao culpado que fica mais vulnerável a doenças psicossomaticas e mentais, podendo ate desenvolver quadros psicoticos e suicidio. A destrutividade do suicida explica porque, muitas vezes, a sociedade se defende re- taliando o paciente. Em várias épocas e culturas o corpo do suicida era ultrajado e sua fa milia punida. Na Inglaterra, mesmo no hnal do sèculo passado enhava-se uma madeira no coração do cadaver Na ldade Media, em certos lugares, o corpo era desnmembrado. Os rituais religiosos são negados mesmo em religioes atuais. Rituais podem ser etetuados para evitar o componente vingativo do suicida. As orações atuais substituem os antigos sacriticios de animais, que amainariam o espiri- to raivoso liberado pelo suicida. Entre os antigos chineses alguns soldados se matavam no campo de batalha, antes que ela ocorresse. Seus espíritos destrutivos atingiriam 0s inimigos. Em algumas culturas antigas, quando uma pessoa se matava, a sociedade se vingava matando aquelas pessoas que ele responsabilizara. A sociedade atual convive com situações similares. Bilhetes suicidas culpam ou desculpam determinadas pessoas pelo ato. A incompreensão que certas pessoas qe tentam suicidio recebem em pronto-socorros, sendo hostilizadas e ridicularizadas pol equipes de saüde despreparadas indicam que estas equipes captam o compo agressivo e por vezes manipulativo do ato, ignorando sua complexidade e o tato u opaciente está, de alguma forma, pedindo ajuda. A fantasia de vingança pode ser identificada pelos profissionais de saúde, em pa tes que parece que desejam continuar doentes ou mesmo morrer para cuipaic VIngarem de seus parentes ou pessoas próximas. Esses pacientes demandam u suas ue o so- ds s ente acien ou se abor A Arte de Morrer- Visöes Plurais dagem especial, muitas vezes necessitando-se da ajuda do profissional de saúde mental edo psicoterapeuta Fantasia de re-encontro e tuga do sofrimento No luto patologico ena melancolia, assim como em todos os seres humanos, ident ficamos tambem a tantasia de re-encontro com pessoas queridas falecidas. Esta fantasia está associada a vida em outro mundo sem sofrimento, onde todos se reunirão a LDeus ao Tudo. Ela e mais visivel em crianças, que desejam morrer para encontrar-se com sua mãe ou outro parente talecido, facilitando a ocorrència de doenças e acidentes com cunho suicida. Sabemos que a chance de morte de um viúvo no primeiro ano após o talecimento de sua esp0sa e maior que a da população geral e é evidente que situaçoes de luto, em algumas pessoas, as tazem desistir de continuar vivas O prohssional de saúde deverá identificar constelações emocionais desse tipo, em que lutos patologicos predispõeme mantêm doenças que aparecem principalmente no corpo. Voltemos ao suicida. Como vimos, ele não quer viver nem morrer. Na verdade, ele quer fugir, escapar de um sotrimento imenso. Ninguém sabe o que é a morte. Apenas se sabe o que é uma vida internal, insuportável. E dessa vida que o suicida toge. J� vimos as situaçóes de tortura ou sofrimento insuportável que vém de tora. Quando esse so- trimento vem de dentro, estamos frente à ameaça de loucura, que pode decomer tanto de'sofrimento mental como da incapacidade de suportar sofrimento corporal truto de doenças graves, invalidez, desesperança em relação à sua qualidade de vida, proximida de da morte. Cada paciente lidará em formas peculiares, melhores ou piores, com esse sotrimento e ameaça de morte, e elas dependerão de suas caracteristicas emocionais e da compreensão e apoio recebido por familiares, amigos e equipe de saúde. As fantasias estudadas em pacientes suicidas são as mesmas que fazem parte do uni verso mental de qualquer ser humano e que se tornam mais evidentes em situações cri- ticas. Elas nos mostram como nos detendemos da insuportável idéia de que Nada existe para além da vida Essas detesas nos tazem compreender, também, porque comumente vivemos a vida como se fôssemos imortais. Quando a idéia da morte emerge, ela é rapi damente afastada, como algo distante no tempo ou no espaço, ou então negada. Mas, seria possível viver tendo-se consciència permanente de nossa finitude? Na verdade, quem se deixa dominar pelo pensamento constante de morte vive sua vida de forma infernal, e está próximo da loucura Dessa forma, Somos obrigados a supor que uma certa negação faz parte do poder viver Há fortes indicios, por outro lado, de que a religiosidade faz parte do mais intimo dos seres humanos. No entanto a negação pode ser exagerada, como vimos acima, impedindo o diag nóstico precoce, dihcultando o tratamento e eventualmente impedindo umamorte dig na (CASSORLA, 1998B; KOVACS, 2002). Talvez o individuo sábio seja aquele que consegue viver ciente de sua mortalidade, e por isso mesmo0 pode aproveitar a vida ao máximo, de forma serena. Oeu sua hesmo e em pessoas tivos variados incuin pwmas Se se sentiu mconscientemente culpado, por npotencia, a escolha prohssionat pode constituir se em Sesuas fantasias de eparaçao forem exageradas, tendendo no sabera lhdar com a realidade. Fle nao aceitará que a mort iracasande d cada vez que nao a consegue evitar. Na verdade. ni 10 Vida e indo sua de reparação sadia endo à onipotència, o médico parte da vida e se verá raro que o prohs o-se sional de saude tambem acredhte que a morte e causada por enças, esquecer 1aneira que doença e morte lazem parte da vida eque a doença apenas contribui para a m omo se morre. O medico para evitar a sensaçaao de Iracasso, poderá envolver-se que tenta, desesperadamente, manter Vivos pacientes em que nada ma Çoes em r feito Outras vezes, ele se atastari do paciente de mau prognostico que acaba sendo abando. 50as nada Esse abandono é similar ao que ocorre, em nossa sociedade, em relação a pessos tico A presença desses individuos dificultaria a manutenção dos mecanism ção da morte, incduindo a morte própria do médico O próprio sistema hospital mau prognós de nega dasas, invalidose pacientes com doenças cronicas, principalmente com r essa negaça0 Anegação do sofrimento e da morte se articula, sociedade atual, que preza oprazer imediato, a rapidezeo consumo e se guia pelo sur hcial e técnico, em detrimento do pensar e sentir em profundidade. Com isso se nees complexidade do ser humano e sua propria humanidade. Anecessidade de retornar à visão do que e serhumano, do paciente como pessoa-a Medicina da Pessoa (PERESTRELLO, 2006) -vem sendo denunciada há algum tem- po A humanização do atendimento levando em conta fatores psicossociais tem sido um objetivo cada vez mais valorizado pelos prohssionais de saúde e, em particular, pelas equipes de cuidados paliativos. Isso tem ocorrido também em função da descrençae cansaço com aaplicação exacerbada da tecnologia em detrimento da relação humana predispondo a sofrimentos desnecessários por parte dos pacientes e trustração nos pro- fhssionais de saúde. A necessidade de lidar com os aspectos psicológicos do paciente e da equipe, para que se perceba a realidade e se trabalhem perdas e lutos, se associa a ndispensavel elaboraç�o dos lutos por parte dos sobreviventes, condição basica para que possam retomar suas vidas em forma criativa. também, Com as características sda super O educador e a morte Nao nos deteremos neste tema, objeto de outros capitulos deste livrO, que it anecessidade do Ser Humano defrontar-se, desde criança, com a realidauc uma torma tal que ela não se torne assustadora. Se a negaçao da percepção da morte é compreensível, precisammos c CiOsamente e em profundidade como ela se articula em cada inaivia a compreensao passa a ser uma valjosa arma para entrarmos em co morte de minu n cada individuo. Dessa fom om seu tun 278 A Arte do Morrer- Visöes Plurais ionamento mental. Captamos como a mente do paciente funciona a partir dos sen- timentos que ele nos desperta. Dessa forma, o auto-conhecimento do profissional de educação se constitui tambem num recurso importante. Ao lidarmos com a negação da morte não podemos deixar de lembrar que o Ser Humano deve ser respeitado em relação aos mecanismos psicológicos que é capaz de usar. Também deve ser respeitado em relação a suas crenças, sem as quais muitas ve zes a vida se torna intoleravel. No entanto, ao mesmo tempo, ele deve ter um espaço relacional onde possa colocar suas dúvidas, seus medos e ansiedades. A possibilidade de ser ouvido e compreendido, comumente, permite que o individuo possa organizar sua mente de forma que suas ansiedades se tornem suportáveis e utilizáveis para me Ihorar sua qualidade de vida e de morte. E isso que fazem equipes de saúde que lidam com pacientes nas proximidades da morte (KOVACS, 2002; CASSORLA, 2006). Es- sas equipes, por sua vez, podenm ser preparadas para lidar com seus pacientes através de processos educativos como os grupos Balint (CASSORLA, 1994), onde säo discutidas situações clinicas, em grupo, coma coordenação de um psicanalista preparado. Finalmente, como profhssionais de educação temos o dever de tentar compreender Os motivos que têm estimulado a negação da morte em nossa sociedade. Para descobrir meios para que ela não se torne exagerada, acarretando sofrimentos desnecessários. Bibliografia CASSORLA, RMS. Dificuldades no lidar com aspectos emocionais na prática médica: estudo com médi- cos no início de grupos Balint. Rev. ABP-APAL 16(1): 18-24, 1994. CASSORLA, RMS (Org). Do suicidio: estudos brasileiros. Campinas:Papirus, 1998 A, 2. ed. CASSORLA, RMS (Org). Da morte: estudos brasileiros. Campinas:Papirus, 1998B, 2.ed. CASSORLA, RMS. O que é suicidio. S.Paulo: Editora Brasiliense (Colari CASSORLA, RMS. Amorter om
Compartilhar