Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
Gleice Nunes - @amedicadofuturo Equilíbrio ácido-base O que é um ácido e o que é uma base? O íon hidrogênio é um próton único livre, e moléculas ou substâncias que podem liberar um íon hidrogênio são chamados de ácido, assim como o HCl, que se ioniza e se dissocia em H+ e Cl-. A base é uma substância que consegue receber esse H+, por exemplo: HCO3- + H+ → H2CO3. O nosso corpo precisa controlar muito bem a concentração de H+, porque todo funcionamento do nosso organismo é diretamente influenciado pela concentração de H+, como as enzimas, proteínas transportadoras, canais iônicos, entre outros. A concentração plasmática de H+ é de aproximadamente 0,00004 mEq/L = pH 7,4. O pH é inversamente relacionado com a concentração de H+, pH baixo quer dizer que tem muito H+ e pH alto quer dizer que tem pouco H+. Quando o pH está muito baixo, nós temos a situação de acidose, que gera uma depressão no SNC, dentre outras complicações. Quando o pH está alto, temos uma alcalose, que causa uma hiperexcitação do SNC. O pH no nosso corpo tem que se manter estável, tanto a acidose quanto a alcalose podem gerar complicações e podem levar até a morte. Mas de onde vem e para onde vai o H+? Nós temos entrada e saída de H+, que podem vir tanto da dieta como do próprio metabolismo. Aí, nós temos que eliminar esse excesso de H+ tanto pela ventilação (na forma de CO2 e água), como pela urina. A ingestão e produção de ácidos devem ser equilibradas pela excreção de ácido. A maior fonte de ácido é a produção diária de CO2 durante a respiração celular aeróbia. 3 sistemas no nosso corpo regulam H+ para evitar a acidose e a alcalose 1. Sistema tampão químico nos líquidos corporais 2. Centro respiratório 3. Rins Sistema tampão Um tampão é uma substância que consome ou libera um H+ e tenta estabilizar o pH, ele minimiza as variações do pH, mas ele não consegue controlar muito bem essa mudança. Porém, se não tivéssemos esse tampão, uma pequena mudança de ácido ou base no nosso organismo já causaria grande mudança no pH. Os tampões são encontrados no plasma sanguíneo e dentro das células. São a primeira linha de defesa contra as mudanças do pH. Sistema tampão do bicarbonato É uma solução com dois ingredientes: um ácido fraco (o ácido carbônico – H2CO3) e uma base (o bicarbonato – HCO3-). Ácido carbônico (H2CO3): produto da reação entre o CO2 + H2O. O ácido carbônico é um ácido fraco que rapidamente se dissocia em H+ e HCO-3. Após a reação, o H2CO3 liberou um H+. O segundo componente é o bicarbonato, quando a base recebe o H+, ele faz o caminho inverso dessa reação, então forma o ácido carbônico. Se nós juntarmos as reações desde a formação do ácido carbônico, aparece a Gleice Nunes - @amedicadofuturo seguinte forma: Essa reação pode se deslocar tanto para direita como para esquerda. Se por algum motivo aumentar a concentração de H+ no nosso corpo, de alguma fonte metabólica, como por exemplo o lactato, nós teremos um aumento da concentração de HCO3- que vai tamponar o H+, e eles vão formar o ácido carbônico. O HCO3- vai ser utilizado para tamponar o excesso de H+, e o ácido carbônico vai se dissociar em CO2 e água, aí essa reação vai estar novamente equilibrada, pois se um lado dela aumentou, o outro lado também vai aumentar. As proteínas também podem atuar como um tampão, como a hemoglobina, ela pode se ligar a um H+ e assim diminuir a concentração de H+ no plasma. O sistema tampão nos líquidos corporais é a primeira linha de defesa, assim que ocorre desequilíbrio no pH, eles são os primeiros a agir. Mas eles não são tão suficientes porque eles não acrescentam ou eliminam o H+, então precisamos de uma segunda linha de defesa, que é a respiração. Respiração É a segunda linha de defesa contra as mudanças do pH, que é a nossa ventilação, pois nós conseguimos eliminar o CO2 pelos pulmões. Quando aumentamos muito a nossa ventilação, nós eliminamos muito CO2 e diminuímos a concentração de CO2 sanguínea. E se nós diminuímos muito a ventilação, nós não eliminamos o CO2 e aumentamos a concentração dele no sangue. Se a formação de CO2 no metabolismo aumenta, ↑ PCO2, ↑ ventilação, ↓ PCO2. Alterações na ventilação pulmonar ou na produção de CO2 afetam diretamente a pressão de CO2 no nosso sangue. Quando a concentração de CO2 aumenta, a concentração de ácido carbônico também aumenta, nosso pH vai diminuir. Veja que quando nós temos um pH de 7,4, temos uma ventilação alveolar normal, porém se aumentarmos a concentração de H+, ou seja, diminuir o pH do sangue, nós vamos aumentar a ventilação para tentar eliminar o CO2, para eliminar o H+ em excesso. Nosso sistema respiratório funciona como um feedback negativo, se ocorre aumento da concentração de H+, nossa ventilação aumenta e coloca o CO2 para fora, e assim a gente diminui a pressão de CO2 no nosso plasma; e se a PCO2 diminui, o H+ também diminui, e como era o H+ que estava desencadeando a ventilação, a ventilação vai diminuir e vai voltar ao normal. Se nós tivermos mudança no pH, primeiro temos o sistema tampão – que age imediatamente – e depois a respiração, e a respiração é capaz de equilibrar o pH dentro de 3 a 12 minutos após essa mudança inicial. E aí nós temos a terceira linha de defesa, que é o controle renal. Controle renal Os rins fazem o controle do ácido e da base do nosso corpo porque eles podem excretar urina ácida ou urina básica. A excreção de urina ácida reduz a quantidade de H+ no nosso plasma e a excreção de urina básica reduz a quantidade de base. Quando acontece a alcalose – diminuição da concentração de H+ no nosso plasma – os nossos rins não reabsorvem o bicarbonato que é filtrado lá no glomérulo, então a gente excreta o excesso de bicarbonato. Como o bicarbonato tampona o H+, se a gente diminui o bicarbonato, a gente aumenta a concentração de H+ nos nossos líquidos extracelulares e nós vamos reverter a alcalose. Quando estamos em acidose, os rins reabsorvem esse bicarbonato e se precisar eles produzem até um pouco mais de bicarbonato. Como o bicarbonato tampona o H+, se a gente Gleice Nunes - @amedicadofuturo reabsorver mais bicarbonato, a gente tampona o H+ e diminui a concentração no nosso sangue. Os rins fazem o controle da concentração de H+ por 3 mecanismos: secretar H+, reabsorver bicarbonato ou até mesmo produzir mais bicarbonato. Aproximadamente 80 a 90% do bicarbonato é reabsorvido nos túbulos proximais, o restante é reabsorvido nos túbulos distais e nos ductos coletores. Para cada HCO3- reabsorvido, um H+ é secretado. As células epiteliais do túbulo proximal – que é onde ocorre a reabsorção de maior parte do bicarbonato – secreta o H+ através de uma proteína chamada proteína trocadora de Na/H, ela troca um sódio por um hidrogênio. Esse é o mecanismo de contratransporte sódio/hidrogênio. Todo esse processo começa com o CO2 dentro das células tubulares, ele pode chegar nessa célula por difusão ou pode ser formado pelo metabolismo. Dentro da célula tubular existe uma enzima chamada de anidrase carbônica, que combina o CO2 com o H2O e forma o acido carbônico, que logo depois se dissocia em HCO3- e H+. Esse H+ é que vai para proteína trocadora de sódio hidrogênio que secreta o H+ e reabsorve o sódio em troca. Nós reabsorvemos ou secretamos sódio pelos rins para controlar o volume do líquido corporal e a pressão arterial. Além do H+, nós temos a formação de HCO3- que se move através da membrana para o líquido intersticial renal e para o sangue. Novamente, para cada reabsorção de um íon HCO3-, um íon H+ é secretado. O bicarbonato não passa pela membrana entre a célula e o lúmen tubular, então o HCO3- que é filtrado pelos glomérulos não pode ser reabsorvido diretamente. Ele é reabsorvido só depois que ele se combinacom H+ para formar H2CO3 e depois de se dissociar em CO2 e H2O. CO2 consegue se difundir pela membrana onde ele se recombina com H2O pela enzima anidrase carbônica gerando nova molécula de H2CO3 dentro das células. Sob condições normais, a secreção de H+ é de aproximadamente 4.400 miliequivalente/litro/dia, a filtração do HCO3- é de aproximadamente 4.320 miliequivalente/litro/dia. As quantidades desses íons nos túbulos são muito parecidas e eles se combinam para formar CO2 e água. E essa equivalência entre o H+ e o HCO3- é chamada de titulação. A gente viu que tá faltando 80 miliequivalente/litro/dia, e esse H+ que tá faltando é excretado pela urina, que retira do corpo ácidos não voláteis, ou seja, aqueles ácidos que não podem ser excretados pela respiração. Para excretar esses 80 miliequivalente/litro/dia, na urina, nós precisaríamos de aproximadamente 2.600 litros de urina por dia, para excretar esses íons H+ se eles estivessem livres na solução. E a gente sabe que é impossível produzir esse volume de urina. A gente precisa de ajuda de mais 2 componentes: o fosfato e a amônia. Quando todo o HCO3- menos tiver sido reabsorvido e não estiver mais disponível para combinar com H+, lembre-se que a gente tinha HCO3- no lúmen tubular, então qualquer excesso de H+ pode se combinar com o NaHPO4-, que é o fosfato com o sódio, para formar o NaH2PO4, que será excretado como um sal de sódio. Outro sistema tampão no líquido tubular é composto pelo íon amônio, o NH4+, que é sintetizado a partir da glutamina que vem do metabolismo de aminoácidos no fígado. A glutamina é metabolizada e forma 2NH4+ e 2HCO3-. O NH4+ é secretado para o lúmen tubular fazendo uma troca com o sódio, que é reabsorvido. E o HCO3- é transportado através da membrana e é captado pelos capilares peritubulares. Assim, para cada molécula de glutamina metabolizada no túbulo proximal, 2 Gleice Nunes - @amedicadofuturo NH4+ são excretados na urina e 2HCO3- são reabsorvidos no sangue. O H+ secretado pela membrana tubular para o lúmen também se combina com a amônia, o NH3, para formar o NH4+ que será excretado. Então, o excesso de H+ vai para a urina, onde vai ser tamponado pelo fosfato ou pela amônia. O mecanismo pelo qual os rins corrigem a acidose ou a alcalose é a titulação incompleta do H+ em relação ao HCO3-, levando um ou outro para urina para ser excretado e eliminado do plasma sanguíneo. As duas primeiras linhas de defesa do nosso corpo evitam que os níveis de H+ oscilem muito no plasma sanguíneo, até que a terceira linha de defesa, uma mais lenta, que são os rins, consigam colocar para fora o ácido ou a base. Embora a resposta renal seja um pouco mais lenta, ela é o controle mais potente do equilíbrio ácido básico do nosso corpo. Desequilíbrios ácido básico Podem ocorrer de origem respiratória ou metabólica. Isso ocorre quando as três linhas de defesa falham em manter a homeostase do pH. Os desequilíbrios são primariamente classificados pelo pH, se o pH estiver muito baixo temos uma acidose; se estiver muito alto temos uma alcalose. A ventilação influencia no pH, pois mudanças na ventilação alteração a PCO2. Se nós tivermos uma acidose ou alcalose com uma alteração primária no CO2, essa alteração será de origem respiratória; Se a alteração primaria for no HCO3-, essa alteração terá uma origem metabólica. Tanto a acidose quanto a alcalose podem ter origem respiratória e metabólica. Na acidose sempre ocorre diminuição do pH, ou seja, aumento de íons H+ e na alcalose ocorre o contrário, aumento de pH e diminuição de íons H+. Acidose respiratória Linha 1 da tabela. Se eu tiver muito H+, pH é baixo, ou seja, acidose. Na acidose tem aumento da PCO2. Então a acidose é respiratória, pois o que está causando o problema é a respiração. Veja que nós temos um aumento primário no CO2, que vai deslocar a equação para a direita, como o corpo está em acidose, ocorre um aumento do bicarbonato para tentar compensar. Veja que após identificar se existe a acidose ou alcalose, nós vamos buscar o que explica isso. Nesse exemplo, o aumento do HCO3- gera uma alcalose, então, como isso não faz sentido, é só uma compensação para o desequilíbrio primário. Acidose metabólica Segunda linha: muito H+, pH baixo, acidose. Mas vejam que agora a PCO2 está normal ou até diminuída, e isso não faz sentido, mas se olharmos o bicarbonato, faz sentido ele estar baixo, pois o aumento na concentração de H+ consome e diminui o tampão e desloca a equação para a esquerda. Alcalose respiratória terceira linha, pouco H+ e pH alto, pouco bicarbonato justifica a acidose? Não, mas a PCO2 está baixa, justifica então o baixo H+, pois desloca a equação para a esquerda, diminui o H+ e o HCO3- no plasma, então a alcalose é de origem respiratória. Gleice Nunes - @amedicadofuturo Alcalose metabólica Pouco H+, então o pH está alto. A PCO2 normal ou alta justifica alcalose? Não, CO2 aumentaria o H+, mas a alta quantidade de bicarbonato sim justifica, então a alcalose é metabólica. Mecanismos que geram esses desequilíbrios Acidose respiratória Na acidose respiratória nós temos a retenção de CO2, que pode ser ocasionada por alguns motivos como: - hipoventilação (quando eu respiro muito devagar) - depressão ventilatória (causada por álcool ou drogas) - aumento da resistência nas vias aéreas (como na asma) - distúrbios de troca gasosa (como ocorre na DPOC, fibrose, pneumonia grave) A acidose respiratória envolve uma disfunção na eliminação do CO2. O mecanismo compensatório renal é tentar aumentar os níveis de bicarbonato no plasma. Acidose metabólica Ocorre quando a ingestão e produção de H+ excedem a excreção de H+ renal, isso pode acontecer por alguns motivos: - aumento dos produtos decorrentes da produção de energia - cetoacidose (ocorre na degradação excessiva de gorduras) - diabetes (dificuldade em utilizar a glicose como fonte de energia) - substâncias ingeridas (como a aspirina) - insuficiência renal - diarreia (é a causa mais comum e mais frequente de acidose metabólica, pois há uma perda de grandes quantidades de bicarbonato de sódio nas fezes, isso pode ser fatal, principalmente em crianças) As compensações da acidose respiratória incluem a hiperventilação (para tentar diminuir a PCO2) e também uma compensação renal (aumento da reabsorção do bicarbonato) As alcaloses são menos comuns do que as condições de acidoses... Alcalose respiratória - hiperventilação (diminui a PCO2) - ventilação mecânica excessiva - crises de ansiedade A resposta compensatória da diminuição da PCO2 na alcalose respiratória é a diminuição dos níveis de bicarbonato do plasma, com maior excreção de HCO3- renal. Alcalose metabólica - excesso de vômito - ingestão excessiva de antiácidos - diuréticos maior reabsorção de Na+ que é acoplada à secreção de H+ A compensação da alcalose metabólica é a diminuição da ventilação, para tentar aumentar a PCO2 e também maior excreção de HCO3- para tentar compensar o acúmulo inicial de bicarbonato. Para acontecer alguma compensação renal de algum desequilíbrio, o desequilíbrio primário respiratório deve ser crônico, porque diferente da respiração que o mecanismo responde em alguns minutos, o mecanismo renal é mais lento, demora até dias para ocorrer.
Compartilhar