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A INTERFERENCIA DA IMAGEM NO COMPORTAMENTO

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A INTERFERÊNCIA DA IMAGEM NO COMPORTAMENTO 
Susana Vieira 
UFSC, Departamento de Expressão Gráfica 
Vieira.su@gmail.com 
Diego Spagnuelo 
UFSC, Departamento de Expressão Gráfica 
di.spagnuelo@gmail.com 
Richard Perassi 
UFSC, Departamento de Expressão Gráfica 
Richard.perassi@uol.com.br 
 
Resumo 
Este artigo analisa, segundo a semiótica de Peirce, as manifestações e as 
interferências possibilitadas pelo Design sobre a propaganda vinculada às carteiras de 
cigarros vendidas no Brasil, investigando a influência de tais imagens sobre seus 
consumidores. Para tanto, trabalhou-se com as três categorias universais peircianas e 
com a tricotomia: Ícone, Índice, Símbolo. Buscou-se investigar e compreender o 
processo cognitivo gerado pelas imagens presentes na campanha de redução ao 
consumo de cigarro, com base nos aspectos da cultura, desencadeados pelos 
aparatos sensoriais humanos. Além disso, pretende-se averiguar sob o ponto de vista 
da Semiótica a eficácia comunicativa da campanha nacional anti-fumo do Ministério da 
Saúde com o INCA, no que tange à definição dos signos (imagem, cor, texto, conceito) 
propostos e estruturados pelo Design. 
 
Palavras-chave: semiótica, cigarro, propaganda, comportamento. 
Abstract/resumen 
This article analyzes, according to Peirce’s semiotics, manifestations and interferences 
made possible by Design on advertising linked to cigarette packs sold in Brazil, 
investigating the influence of such images on its consumers. For this purpose, the 
universal categories of Peirce and trichotomy: Icon, Index, and Symbol were 
approached. Were investigated and understood the cognitive processes present in the 
images generated by the campaign to reduce cigarette consumption, based on aspects 
of culture, triggered by the human sensory apparatus. In order to determine the point of 
view of semiotics communicative effectiveness of national anti-smoking campaign 
proposed by the Ministry of Health in partnership with INCA, regarding the definition of 
signs (images, colors, text, and concepts) proposed and structured by Design. 
 
Keywords: semiotics, cigarrette, advertising, behavior. 
 
 
1 Introdução 
Diariamente indivíduos são alvo de campanhas que estimulam o consumo de bens 
diversos, desde alimentos e bebidas, até objetos do vestuário, cosméticos e aparatos 
eletrônicos. Em termos gerais, cada um dos conjuntos de expressões (imagens, luzes, 
textos, sons ou mesmo cheiros) que constituem um projeto comunicacional, atendem a 
um público específico, suscitando sensações, questionamentos e reflexões 
relacionadas ao seu contexto de vida e cultura, ainda que sua eficiência possa em 
muitos casos ser questionada. Em oposição a esse tipo de comunicação, encontram-
se as campanhas de cunho educativo ou mesmo proibitivo, cuja função seria evocar 
na consciência dos usuários de determinado produto os seus malefícios. Por exemplo: 
o consumo de alimentos chamado fast-food; o consumo exagerado de álcool e dos 
perigos provocados por sua combinação com a direção; a utilização de drogas ilícitas; 
a prática de bullying nas escolas; o uso do cigarro; entre outros. 
O presente artigo tem como objetivo compreender o modo como o Design, por 
meio de sua atuação focada na composição da forma, reflete sobre os artefatos da 
propaganda, tomando como objeto de estudo as imagens da campanha de redução ao 
consumo de cigarros, aplicada às embalagens do produto. Para tanto, pretende-se 
observar a influência que estas podem causar no comportamento de seus usuários, 
com base na Teoria Semiótica proposta por Charles Sanders Peirce (1839-1914). 
Por Semiótica entende-se a ciência que estuda “os signos e os processos 
significativos na natureza e na cultura” (NOTH, 1995, p.17), possibilitando, até certo 
ponto, a análise e identificação de valores codificados e comunicados pelos objetos. É 
a ciência que investiga os fenômenos e como podem ser comunicados e 
compreendidos. A partir da Semiótica torna-se possível formar um panorama lógico a 
respeito de como as imagens são percebidas e interpretadas por indivíduos e de que 
modo, cada uma das partes que as constituem favorecem as reflexões gerais a seu 
respeito. 
Este artigo apresenta uma análise das imagens vinculadas às embalagens de 
cigarro comercializadas no Brasil objetivando avaliar os reflexos causados por sua 
divulgação nos seus consumidores diretos. Considerando que cada produto na sua 
configuração apresenta uma capacidade de comunicação, algo estritamente 
relacionado às “suas qualidades e características, ao seu modo de produção, ao que 
serve, para quem se dirige” (NIEMEYER, 2009, p.21), não é possível ignorar a relação 
comunicativa existente entre o produto e o consumidor. Porém pode-se dizer que as 
sensações, interpretações e o comportamento das pessoas podem ser modificados na 
medida em que o objeto (as imagens vinculadas às carteiras de cigarro) significa. 
 
 
Deste modo, as imagens vinculadas às carteiras de cigarro comunicam por meio 
de um processo de codificação influenciado pela maneira como se estrutura a forma, 
atuando, portanto, como símbolo. Assim geram informação, com base no contexto 
cultural dos indivíduos, concedendo ao mundo e ao objeto um significado e uma 
função e permitindo que as relações entre o homem e o objeto/mundo se transformem. 
2 Apresentação do objeto de estudo 
De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), no mundo existem 1,3 bilhão 
de usuários de produtos derivados do tabaco. Nos países, em desenvolvimento, desta 
soma, 48% correspondem ao total da população masculina e 7% ao total da 
população feminina. No cenário brasileiro, pesquisas conduzidas pelo Ministério da 
Saúde e pelo Instituto Nacional de Câncer (INCA) apontam que 18,8% da população 
do país é fumante (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2012). 
Entre os produtos derivados do tabaco, destacam-se os cigarros manufaturados e 
os provenientes de processos industriais. Os primeiros são feitos a partir de uma 
pequena porção de tabaco seco e moído, enrolada manualmente em papel fino ou 
palha de milho; os segundos são produzidos em escala industrial, sem contato 
manual, podendo contar com um sistema de filtragem de fibras de celulose e outros 
ingredientes. No processo de industrialização, o tabaco utilizado na produção dos 
cigarros é submetido a diversos tratamentos, os quais introduzem doses significativas 
de substâncias cancerígenas ativadas principalmente durante a combustão do 
produto. 
Segundo a OMS, o número de mortes anuais causadas pelo uso de tabaco é de 
4,9 milhões, podendo atingir, por volta do ano 2030, a taxa de 10 milhões de mortes 
anuais, se mantidas as tendências de crescimento do produto no mundo (INCA, 2012). 
Ciente do crescimento do consumo de produtos derivados de tabaco, no Brasil e, 
dos reflexos negativos à saúde provocados pelo fumo, o Ministério da Saúde em 
parceria com o INCA vem desenvolvendo campanhas midiáticas (rádio, televisão, 
cartazes, outdoors). Estas são de abrangência regional e nacional com o intuito de 
conscientizar fumantes ativos e passivos dos riscos provocados pelo tabaco. 
A campanha (Fig.1), veiculada em caráter obrigatório nas embalagens de cigarro 
comercializadas em território nacional, consiste essencialmente no emprego de fotos e 
de alertas. Tal manifestação ocupa uma das faces da carteira de cigarros e emprega 
teor sensacionalista em sua abordagem, na intenção de despertar a atenção dos 
usuários – e também de seus usuários em potencial – para os riscos do fumo. Os 
alertas textuais vão de encontro às fotos e partem da afirmação de que são 
advertências de cunho oficial, provindas do Ministério da Saúde brasileiro. 
 
 
 
Figura 1: Imagens da campanha de redução ao consumo decigarros 
As composições fotográficas que constituem a campanha de redução ao consumo 
de cigarros, no âmbito nacional, são o objeto de estudo deste artigo, que investiga e 
interpreta, a partir da semiótica de Peirce, a influência exercida nos indivíduos. 
3 Teoria semiótica de Peirce 
De acordo com Santaella (2007), a Semiótica pode ser compreendida como a ciência 
geral de todas as linguagens. Tais linguagens, os signos, compreendem não apenas 
as manifestações pertinentes à língua, mas também os intrincados meios utilizados 
pelos seres humanos para criar relações de comunicação. Assim, imagens, sinais, 
esquemas, gráficos, luzes, objetos, sons, gestos, cheiros – tudo o que se faz perceber 
por intermédio da visão, do olfato, da audição, do paladar e do tato – pode ser utilizado 
pelos indivíduos para estabelecer a comunicação. Encontra-se nesse contexto 
composta pelo aparato comunicativo e pela significação nos seres humanos a 
essência da linguagem, a qual se estende, inclusive, à linguagem dos surdos-mudos e 
aos códigos de culinária, por exemplo, passando ainda por linguagens ditas inumanas, 
como a binária, utilizada pelas máquinas e computadores e à dos sinais da natureza, 
os quais podem ser sentidos e interpretados pelo homem (SANTAELLA, 2007). 
Partindo-se das linguagens possíveis, a Semiótica propõe um exame aos modos 
de constituição de todo e qualquer fenômeno como agente gerador de significação e 
sentido. A palavra grega phaneron, da qual deriva o termo fenômeno, pode ser 
traduzida como a totalidade de coisas capazes de aparecer à percepção e à mente 
humanas (SANTAELLA, 2002), o que constitui o objeto de estudo da Fenomenologia, 
um ramo científico cuja "função é apresentar as categorias formais e universais dos 
modos como os fenômenos são apreendidos pela mente" (SANTAELLA, 2002, p.7). 
Conhecido como um dos mais importantes fundadores da Semiótica Geral (NÖTH, 
1995, p.60), o filósofo, cientista e matemático americano Peirce, interessado pelos 
 
 
estudos da Lógica, um ramo por ele considerado pertencente ao da teoria dos signos, 
dedicou os últimos trinta anos de sua vida aos estudos da Semiótica, a qual entendia 
como um sistema lógico, abrangente de toda e qualquer produção, realização e 
expressão humana. Peirce empreendeu estudos aprofundados nas mais diversas 
vertentes do conhecimento humano presentes em sua época, contribuindo 
especialmente para a Fenomenologia, ciência que permeava toda sua Semiótica. 
 Segundo Peirce (1999) semiótica considera a existência de três elementos 
formais em todos os fenômenos percebidos. Juntos compõem as Três Categorias 
Universais de Peirce, nomeadas: Primeiridade, Secundidade e Terceiridade. 
Na Primeiridade compreende-se "tudo o que estiver relacionado ao acaso, à 
possibilidade, à qualidade, ao sentimento, à originalidade, à liberdade, à mônada" 
(SANTAELLA, 2002, p.7). É também caracterizada como a categoria abrangente do 
conjunto de sensações imediatas percebidas em um fenômeno. É a natureza própria 
daquilo que se observa – que se sente –, tal como é, sem relação com outras coisas 
no mundo. Reflete uma percepção imediata, livre, não reflexiva, de qualidade ainda 
não distinguida (NOTH, 1995). De maneira ampla, pode ser entendida como a 
categoria das sensações incutidas no sujeito e apenas nele. 
A Secundidade é iniciada quando a um primeiro fenômeno é atribuída relação com 
um segundo fenômeno. Segundo Noth (1995, p.63-64), pode ser entendida como "a 
categoria da comparação, da ação, do fato, da realidade e da experiência no tempo e 
no espaço". Enquanto a Primeiridade se associa à ideia de independência, a 
Secundidade reflete o oposto, caracterizando ainda aspectos como: dualidade, 
surpresa e dúvida. É compreendida, amplamente, como a categoria dos indícios, das 
indagações, das sensações que se expressam no mundo (PEIRCE, 1999). 
A relação triádica se consolida nos fenômenos com a Terceiridade. É a relação 
estabelecida entre um segundo fenômeno e um terceiro. De acordo com Noth (1995, 
p.63-64), a Terceiridade ”é a categoria da mediação, do hábito, da memória, da 
continuidade, da síntese, da comunicação, da representação, da semiose e dos 
signos". Reflete os efeitos fenomenológicos provocados sobre um indivíduo. Está 
relacionada ao pensamento, às reflexões estabelecidas tanto com os conhecimentos e 
entendimentos de um indivíduo, quanto com os preceitos estabelecidos pelo contexto 
que o cerca e especialmente pela cultura em que se encontra inserido (PEIRCE, 
1999). 
Este trabalho se fundamenta na teoria semiótica de Peirce para embasar a análise 
de uma imagem constituinte da campanha anti-fumo brasileira. Partindo-se da 
Primeiridade, da Secundidade e da Terceiridade, pretende-se investigar como os 
signos utilizados na citada campanha se manifestam nos âmbitos da sensação, dos 
 
 
indícios e da cultura, a fim de compreender a efetividade, positiva ou negativa, de tal 
intervenção nas embalagens destes produtos. 
4 Análise semiótica 
A análise semiótica foi desenvolvida com base nas categorias universais de Peirce, 
apresentadas no item anterior. Utilizaram-se nesta análise as três categorias 
fenomenológicas do signo: Primeiridade, Secundidade e Terceiridade, fazendo-se uso 
também da tricotomia (dos níveis de classificação sígnica): ícone, índice e símbolo. 
Assim, ao observar a imagem da Fig. 2, o objeto de estudo a ser analisado, tem-
se imediatamente a Primeridade, determinada pelo conjunto de sensações que 
propõem qualidades como as sensações de mancha, horror, variação cromática, 
profundidade, afastamento, angústia, clausura, complexidade, dualidade, 
aprisionamento e conformidade. Em seguida, antes mesmo de uma percepção 
consciente, está-se relacionando o observado com o que se apresenta no mundo, pois 
a Secundidade é a consequência da visão sobre os elementos que a cultura 
(Terceiridade) denominada como: variação luminosa, índice de superfície 
tridimensional, índice de cartaz, índice de mulher, índice de velho, índice de novo. 
 
Figura 2: Horror: imagem da campanha anti-fumo. 
Quando o observador passa a interpretar a imagem e seus componentes, significa 
que está na Terceiridade, onde o reflexo das sensações é estabelecido no âmbito da 
Primeiridade, associando-se, por exemplo, às sensações de mancha, memória e 
cultura de um indivíduo. Além disso, no âmbito da Secundidade, as sensações 
percebidas pelo individuo apresentam indícios no mundo resultantes das percepções 
externas à mente. A partir das manifestações icônica e indicial da imagem em estudo, 
estabelecem-se as relações com as situações vividas e a cultura individual. A 
composição analisada, assim, passa a ser compreendida também como uma projeção 
luminosa amparada pela superfície plana e transparente da tela de um computador. 
Tal projeção está intimamente relacionada, na materialidade, com a composição 
comunicacional presente nos maços de cigarro, impressa em papel. 
 
 
As sensações percebidas pela mente são combinadas com aspectos e nomes 
propostos pela cultura, passando a representar: 
1. Um retângulo preto na vertical compondo o fundo. 
2. Uma composição fotográfica retangular, centralizada sobre o fundo, 
apresentando à direita do observador a metade esquerda de um rosto humano com 
traços arredondados e textura lisa e tonalidade uniforme. À esquerda do observador 
percebe-se uma outra forma retangular limitando a metade direita de um rosto humano 
com traços arredondados e textura irregular e povoada por diversos agrupamentos 
cromáticos que variam entre o marrom e o roxo. Enquanto a forma que remete a um 
olho posicionada no lado direito da imagem apresenta coloração castanha ao centro e 
brancaao redor, o olho visto no lado esquerdo da imagem apresenta coloração 
castanha coberta por uma mancha central branca e um entorno amarelo e 
avermelhado. No lado direito da imagem, a área escura e longilínea refere-se aos 
cabelos, contando com coloração castanha enquanto a área referente aos cabelos no 
lado esquerdo apresenta fios cinzentos e brancos, ainda que a predominância seja 
também do tom castanho. Na extrema esquerda da composição fotográfica há o que 
por associação julgam-se ser dedos tocando a forma retangular posicionada no lado 
esquerdo da imagem. Todo esse conjunto encontra-se situado sobre um fundo cinza 
claro. 
3. Na parte superior da imagem analisada, em alinhamento central, há signos 
brancos cuja associação com os conhecimentos da língua portuguesa permitem 
compreender tratar-se da palavra “HORROR” composta unicamente em letras 
maiúsculas. 
4. Na parte inferior da imagem, também em posicionamento central, podem-se 
observar signos brancos estruturados e organizados de modo tal que, por meio dos 
conhecimentos em língua portuguesa, geram a leitura: “O Ministério da Saúde adverte/ 
Este produto causa envelhecimento precoce da pele/ Pare de fumar/ Disque Saúde/ 
0800 61 1997”. 
5. Do lado esquerdo dos três últimos conjuntos de palavras, junto ao limite inferior 
da imagem analisada, há um círculo vermelho coberto por outro círculo, dessa vez 
branco. Um retângulo ligeiramente comprido e fino, branco, amarelo e cinza, encontra-
se localizado no centro dos dois círculos e está sobreposto por uma linha na diagonal 
que se inicia de baixo, na esquerda, e vai até a parte de cima, na direita. Na parte 
voltada para cima, a linha na diagonal apresenta um pequeno trecho descontinuado. 
Na parte voltada para baixo a linha é levemente arredondada. 
A totalidade destes elementos, na Primeiridade, com base na cultura e por 
analogia, é interpretada como constituinte da campanha anti-fumo presente no verso 
 
 
dos maços de cigarro. Os rostos observados na composição fotográfica se associam, 
por semelhança, aos de uma mulher e, pelas variações de textura e tonalidade, pode-
se considerar a face presente no lado direito jovem e a face presente no lado 
esquerdo velha. O rosto envelhecido, devido à composição, que está enclausurada em 
um retângulo com volume, é lida como pertencente a um objeto, a um maço de 
cigarros segurado pela mão no lado esquerdo da composição. Culturalmente, os 
textos presentes na imagem analisada dizem respeito às recomendações do Ministério 
da Saúde ao consumo do fumo e a composição simbólica na linha inferior da 
composição diz respeito ao signo de proibido fumar. 
 Pode-se, assim, relacionar a composição analisada a uma das imagens 
comunicacionais presentes nos maços de cigarro com o objetivo de estimular a 
redução do fumo, pelos elementos formais que a constituem: (1) Fundo preto; (2) 
Título em caixa alta na parte superior; (3) Composição fotográfica; (4) Recomendações 
do Ministério da Saúde na parte inferior. 
Reconhece-se a figura humana e, especificamente, feminina na composição pela 
relação estabelecida entre esta e os elementos biologicamente presentes nas 
mulheres da espécie Homo sapiens: (1) Pele livre de pelos e barba; (2) Olhos com 
parte central pigmentada e entorno branco; (3) Nariz projetado para fora e com 
narinas; (4) Boca com lábios; (5) Cabelos compridos; (6) Traços arredondados. 
Na terceridade tem-se a imagem de uma mulher segurando uma carteira de 
cigarros sobre seu rosto. Nesta carteira de cigarros é apresentada a mesma mulher 
após alguns anos, com a pele envelhecida e manchada devido o uso de cigarros. 
Acompanhando esse conjunto de imagens estão os textos: “Horror”, acima da 
imagem; e, “O Ministério da Saúde adverte/ Este produto causa envelhecimento 
precoce da pele/ Pare de fumar/ Disque Saúde/ 0800 61 1997”, abaixo da imagem. Os 
textos complementam a ideia que se quer passar com as imagens (conscientizar 
aqueles que fazem uso do cigarro a pararem de fumar, acentuando pelo texto o 
significado, a mensagem da imagem). Assim, pode-se dizer que a imagem disposta 
dessa forma é um símbolo de campanha contra o tabagismo. 
No entanto, a interpretação das imagens nas carteiras de cigarro não se esgota 
neste estudo, pois as relações semióticas são continuamente refeitas e dependem, 
refletem e referenciam o contexto, o histórico de vida do sujeito que observa. Ou seja, 
o observador ao manter-se observando a imagem, voltará a ter novas sensações, que 
poderão levá-lo a fazer relações com o mundo externo e consequentemente o farão 
interpretar, criando novas ideias acerca do observado (da imagem), que serão 
denominadas de acordo com os códigos culturais. 
 
 
Ao se analisar a imagem, relaciona-se o ícone e o índice à interpretação 
simbólica. No nível icônico, as sensações de horror, profundidade, afastamento, 
angústia, clausura, dualidade, aprisionamento sentidas diante da imagem 
(primeridade), provêm do interior de cada observador, que será afetado, influenciado 
por essas sensações, possibilitando mudanças na forma de agir e pensar 
(Terceiridade). A composição visual dos textos acrescida da imagem do rosto da 
mulher, expressando a dualidade entre o velho e o novo, além da sensação de 
angústia (Primeridade), por exemplo, podem remeter também a algo externo ao 
sujeito, ao físico, ao aparente, ao índice de mulher (Secundidade), possibilitando o 
surgimento do símbolo de envelhecimento precoce (Terceiridade). 
A interpretação do símbolo depende, não só, do repertório de vida do observador, 
mas também da forma como se configuram os elementos e características 
componentes da imagem estudada. Deve-se considerar a maneira como estão 
dispostos os elementos, qual a relação entre eles, pois, ao fim, valores serão 
comunicados. Ou seja, embora, o cigarro prejudique a saúde, no Brasil a sua venda é 
legal. Mas, a fim de diminuir os efeitos maléficos deste produto, que causa além de 
prejuízo individual, prejuízo coletivo nacional, devido à quantidade de doenças 
desencadeadas pelo cigarro, o que cria uma necessidade governamental de 
investimento em saúde. A campanha contra o fumo é uma alternativa positiva, embora 
remetam a sensações negativas, como: sofrimento, angústia, clausura, afastamento. 
Tal campanha está vinculada aos produtos, ou seja, toda vez que se compra uma 
carteira de cigarros, no seu verso há uma das imagens da campanha anti-fumo. 
Assim, pretende-se transmitir, diretamente, mas não só, ao grupo de fumantes a que 
consequências podem-se chegar com o hábito de fumar, pois quanto mais o cigarro é 
consumido, mais divulgada é a propaganda. Desse modo, ao interpretar a imagem, o 
observador pode compreender e entender quanto mal aquele produto o faz e tomar a 
decisão de parar de fumar. 
Pode-se afirmar que um conjunto de símbolos de imagens direcionadas para uma 
mesma campanha, como no caso da campanha contra o consumo de cigarros, assim 
como outros conjuntos de signos, quando criados com uma mesma finalidade, por 
uma mesma origem, buscam seguir e apresentar um mesmo estilo gráfico. 
5 Reflexos da campanha de redução do consumo de cigarros 
A comercialização das carteiras de cigarro no Brasil só é permitida com a inclusão, na 
sua embalagem, de uma das imagens de conscientização desenvolvidas pelo 
Ministério da Saúde. Tais imagens apresentam um mesmo padrão: fundo preto, 
 
 
sobreposto por texto na cor branca servindo para enfatizar o sentido pretendido com 
as fotografias, as quais representam os danos ocasionados pelo consumo de cigarros. 
A campanha contra o fumo, vinculada ao próprio produto é uma estratégia 
importante para combater os danos causados pelo consumo de cigarros, poispossibilita um contato direto das peças comunicacionais com seu público-alvo no 
momento da compra e também uma relação que se estende para o cotidiano de uso 
quando o consumidor utiliza o produto e se depara com as imagens a ele associadas. 
No Brasil, o cigarro nada mais é que um produto de consumo cuja embalagem traz 
estampada expressas recomendações para que não seja consumido; qualquer 
propaganda comercial com enfoque na apologia ao cigarro e ao fumo é proibida. Não 
há muito tempo, porém, a imagem do cigarro era associada à liberdade, segurança, 
saúde, independência, poder. Hoje, na essência, a imagem do produto deve despertar 
sensações negativas, demonstrando os malefícios de seu consumo nos seres 
humanos. 
Assim, um aspecto crucial da campanha anti-fumo é a insistência sobre os valores 
daquilo que é desejável e do sucesso social. Ou seja, a propaganda apresenta o fumo 
não somente como um potencial agente de morte, mas também como algo que afeta 
as prestações na vida publica cotidiana, onde os sujeitos “têm” que ser bonitos ou 
sexualmente ativos (veja-se o anuncio sobre a impotência). 
Apesar de caracterizarem um conjunto de peças com o objetivo comum de 
conscientizar os consumidores a respeito das consequências do uso dos cigarros, as 
imagens comunicacionais propostas pelo Ministério da Saúde representam cada uma 
delas um diferente traço simbólico, estritamente embasado nas construções icônicas, 
tornando-as individuais em sua efetividade. Assim, não é incomum observar usuários 
do sexo masculino recusando-se a comprar um maço de cigarro cuja embalagem 
traga impressa a mensagem "Impotência/ O uso deste produto diminui, dificulta ou 
impede a ereção". Do mesmo modo, há mulheres que evitam os produtos com a 
mensagem "Vítima deste produto/ Este produto intoxica a mãe e o bebê, causando 
parto prematuro e morte". Tais mensagens têm caráter intimamente impactante. 
Relacionando a imagem de malefício presente em um maço de cigarro em específico 
com o malefício real, os usuários atribuem diferentes "culpas" a diferentes produtos. 
No caso específico da mensagem: "Horror/ Este produto causa envelhecimento 
precoce da pele", observa-se um teor essencialmente simbólico, pois parte de 
compreensões possíveis somente a partir de conhecimentos prévios e relacionados à 
cultura. A ideia do recorte de imagem da mulher velha sobre a mulher jovem como 
uma lente que espelha o futuro próximo, a associação de velhice com algo a ser 
postergado ou até mesmo evitado, etc. O conjunto imagem e texto investe no conceito 
 
 
de que o fumo acelera o processo de envelhecimento natural da pele. A escolha da 
imagem da mulher é, nesse caso, acertada, haja vista a noção consolidada de que o 
público feminino seja fortemente adepto dos assuntos que dizem respeito aos 
cuidados com o corpo e a pele, o que pode, porém, gerar atitudes semelhantes às 
tomadas pelos homens que evitam a mensagem sobre impotência sexual. 
Por outro lado, a peça "Horror" pode ser interpretada de maneira banalizada, 
inevitável, tendo em vista que todo e qualquer ser humano está sujeito ao 
envelhecimento. Assim, se todos os seres humanos ficarão um dia com a aparência 
velha, não haverá razão para, em um primeiro momento, resguardar-se de um produto 
cujo malefício seja acelerar esse processo natural. 
Observa-se que as leituras embutidas nas imagens e nos textos comunicacionais 
dos produtos em geral podem ser utilizadas tanto para alertar, quanto para induzir 
comportamentos, atitudes, escolhas e ações. O caso das antigas propagandas de 
cigarro, por exemplo, evidencia tal raciocínio. As mensagens preconizavam o uso do 
produto, ainda que este causasse males ao usuário. Nas imagens utilizadas surgem 
figuras maternas (bebês conversando com suas mães), acolhedoras e simpáticas 
(Papai Noel como uma figura de carne e osso, degustando seu cigarro), elegantes e 
refinadas (mulheres materializando os preceitos vigentes da moda) ou mesmo 
selvagens e viris (o cowboy símbolo da marca Marlboro), associadas a situações 
positivas de prazer e independência (Fig.3). 
 
Figura 3: Imagens vinculadas às carteiras de cigarro, na campanha anti-fumo. 
6 Conclusão 
Este artigo investigou as imagens utilizadas na campanha de redução ao consumo de 
cigarro no Brasil vinculadas às embalagens do produto e a influência que estas podem 
causar no comportamento de seus usuários. A análise semiótica, desenvolvida 
segundo estudos de Peirce, apresentou pontos relevantes, corroborando que as 
diferentes imagens componentes da campanha suscitam diferentes interpretações e 
sensações, como horror, nojo, medo, colaborando para a modificação dos hábitos de 
consumo do produto no país. 
 
 
Pode-se considerar que o processo cognitivo, estudado segundo a Semiótica, 
mostra-se importante, principalmente pela necessidade de se acompanhar os efeitos 
que a comunicação expressa, seja no âmbito visual, tátil, olfativo, degustativo ou 
sonoro. A cultura está em constante mudança e por isso a interpretação sobre coisas 
e aspectos presentes no mundo também muda, assim é necessário manter análises 
periódicas e identificação dos valores codificados, possibilitando a alteração dos 
signos para gerar novos símbolos e significados, segundo a natureza e a cultura. 
Ainda que possa gerar distintos pesos de relevância em seus usuários, a 
campanha anti-tabagista é eficaz no que diz respeito a levantar discussões sobre o 
tema. As mensagens reforçam os malefícios causados pelo uso de cigarros, alertando 
para as consequências provocadas. De maneira global, a campanha parte de duas 
fontes de expressividade principais, primeiramente por meio da imagem, o primeiro 
contato do observador e depois pela leitura do texto, que sintetiza e reforça a ideia 
expressa nas fotos. A escolha por diversas imagens para a campanha em vez de 
apenas uma, demonstra que os agentes responsáveis por sua criação e divulgação 
compreendem a diversidade cultural em que seus usuários se veem inseridos, mesmo 
que isso signifique enfraquecer a mensagem principal, diluindo seu conteúdo em 
diferentes abordagens individuais. 
Por fim, espera-se que esse estudo contribua para a compreensão da 
necessidade de se acompanhar campanhas publicitárias, propagandas, entre outros 
para se alcançar da forma cada vez mais proveitosa resultados na sociedade e nos 
indivíduos que a compõe. 
Referências 
INCA. Instituto Nacional de Câncer. Tabagismo no mundo. Disponível em: 
<http://www.inca.gov.br/tabagismo/>. Acesso em: 16 de setembro de 2012. 
MINISTÉRIO DA SAÚDE. Tabagismo. Disponível em: 
<http://portal.saude.gov.br/portal/saude/visualizar_texto.cfm?idtxt=29479>. Acesso em: 
16 de setembro de 2012. 
NIEMEYER, Lucy. Elementos de semiótica aplicados ao design. Rio de Janeiro: 
2AB, 2009. 
NÖTH, Winfried. Panorama da Semiótica: de Platão a Peirce. São Paulo: 
Annablume, 1995. 
PEIRCE, Charles S. Semiótica. São Paulo: Perspectiva, 1999. 
SANTAELLA, Lucia. O que é Semiótica. São Paulo: Brasiliense, 2007. 
SANTAELLA, Lucia. Semiótica aplicada. Ed. Thomson, São Paulo: 2002.

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