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FILOSOFIA CONTEMPORÂNEA Gabriel Victor Rocha Pinezi Filosofia e desafios contemporâneos Objetivos de aprendizagem Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados: Descrever a influência das mídias digitais nas mobilizações sociais. Identificar a produção de fake news e sua disseminação digital sob a perspectiva filosófica. Avaliar a adoção de posturas sustentáveis frente à aceleração do desenvolvimento tecnológico. Introdução Neste capítulo, você vai aprender um pouco sobre como a filosofia pode servir para entender os problemas sociais da nossa época. Você vai focar em duas questões bastante delicadas do nosso cotidiano: os efeitos das mídias digitais sobre a sociedade e os dilemas éticos suscitados pelo desenvolvimento da tecnologia. Certamente, esses dois assuntos se tocam, na medida em que, como mostraram Adorno e Horkheimer (1985) na Dialética do Esclarecimento, os meios de comunicação são produto de uma sociedade que produz tecnologia com o interesse de expandir o seu poder sobre a natureza e sobre o ser humano. Isso quer dizer que, se por um lado, podemos nos comunicar de forma cada vez mais rápida e eficiente, por outro, esse poder coloca em questão a nossa responsabilidade perante os nossos semelhantes e a natureza. Afinal, o clichê às vezes está correto: grandes poderes trazem grandes responsabilidades. A maioria das pessoas utiliza meios de comunicação poderosos como a internet seguindo interesses pessoais específicos, sem necessariamente refletir sobre os seus efeitos sociais mais amplos. Neste capítulo, focado em questões sobre ética e tecnologia, você vai descobrir como a filosofia, desde Platão, no século IV a.C., já pensava nesses problemas, que são tão antigos quanto a própria humanidade. A filosofia e as mídias digitais Quando a internet começou a se popularizar, na década de 1990, houve um intenso esforço por parte dos intelectuais de todo o mundo para entender quais seriam os seus efeitos sociais. Alguns otimistas julgaram que ela contribuiria para tornar a nossa sociedade mais democrática; outros — mais realistas — chamavam a atenção para os problemas sociais que poderiam ser causados pela facilidade com que as informações poderiam ser disseminadas de forma irresponsável ou mal-intencionada. Porém, esse debate entre otimistas e pes- simistas não era exatamente novo. Toda vez que uma mídia nova surge, os fi lósofos se perguntam quais serão as suas consequências. No século IV a.C., Platão já se preocupava com os efeitos negativos que a escrita causaria numa sociedade como a grega, na qual as informações circulavam apenas oralmente. Entretanto, foram a filosofia e a sociologia do início do século XX que mais se empenharam em entender as mudanças causadas pelo aprimoramento técnico dos meios de comunicação. Era bastante evidente para os estudiosos que o surgimento dos mass media causariam um impacto direto, não apenas na vida cotidiana de cada indivíduo, mas também no destino político das nações. Entre os problemas que conduziram aos questionamentos filosóficos sobre os meios de comunicação de massa destacam-se o uso da propaganda massificada por regimes autoritários (nazifascismo, estalinismo, Estado Novo, etc.), o surgimento da cultura de massas (cinema, rádio, televisão, propaganda, etc.) e a influência das mídias sobre a educação e o comportamento dos cidadãos. Como na maior parte dos casos de surgimento de novas tecnologias, a história dos meios de comunicação de massa começa com boas intenções. Com o intuito de facilitar a publicação de livros, Gutenberg inventou, no século XV, a imprensa de tipos fundidos. Com essa máquina, cada vez mais pessoas passaram a ter acesso ao conhecimento e à informação. Antes de Gutenberg, a maior parte dos livros eram produzidos a mão. Assim, era preciso muito tempo e empenho para produzir cópias de um mesmo texto e, por isso, o acesso ao conhecimento ficava restrito a uma parte reduzida da população — notadamente, o clero e a nobreza. A possibilidade de produzir textos de modo mais rápido e eficiente au- mentou o número de leitores e escritores. A demanda por entretenimento e informação gerou uma nova indústria: editoras e jornais foram crescendo, escritores e jornalistas foram se profissionalizando, e os periódicos — que antes eram mensais ou semanais — tornaram-se diários. Com isso, o interesse pela expansão do público consumidor de informação acabou contribuindo com a consolidação de uma população letrada: saber ler e escrever deixou de ser Filosofia e desafios contemporâneos2 um privilégio, tornando-se um direito de todos. Assim foi se consolidando o conjunto de meios de comunicação a que hoje chamamos de “imprensa”, em referência à máquina inventada por Gutenberg. No início do século XX, o rádio tornou mais fácil ainda o acesso da po- pulação à informação. Com um simples aparelho na sala, era possível ouvir direta e instantaneamente em sua casa as palavras de ordem do líder de sua nação. Isso ainda apresentava uma série de vantagens em relação ao texto impresso: a linguagem oral não exige que os ouvintes sejam alfabetizados (o que significa que todos, sem exceção, podem ser informados); as ondas de rádio AM viajam longas distâncias com muita rapidez, fazendo com que as informações cheguem quase instantaneamente de um lugar a outro; por fim, todas as pessoas podem se informar ao mesmo tempo, não dependendo do atraso característico do jornal impresso (que só podia ser comprado de manhã). As mesmas vantagens se aplicam à televisão, que a partir da segunda metade do século XX passou a fazer parte do cotidiano do homem moderno — sendo ainda um dos principais meios de entretenimento no mundo. Em maior ou menor medida, o desenvolvimento das tecnologias de co- municação buscou reduzir ao mínimo os limites físicos que o ser humano experimenta, simplesmente por ser feito de carne e osso. Ignorando os limites do tempo, as informações são cada vez mais instantâneas; ignorando os limites do espaço, são cada vez mais ubíquas. Assim, o nosso poder sobre a natureza aumentou, na medida em que a tecnologia nos torna capazes de realizar aquilo que o nosso corpo não pode fazer por conta própria. Mídias digitais e mobilizações sociais No topo dessa cadeia evolutiva da tecnologia está a internet. Se antes se demorava semanas ou até meses para enviar uma carta a um local distante, hoje podemos conversar com qualquer pessoa do mundo em tempo real, desde que tenhamos acesso à rede num computador com microfone e câmera. E isso ainda é só um pouco do que a internet é capaz, já que hoje praticamente todas as nossas formas de comunicação dependem, em maior ou menor medida, das mídias digitais. Se, por um lado, as tecnologias dão cada vez mais poder de comunicação à humanidade, por outro, nada garante que esse poder seja bem utilizado. Desde que nasceram, os meios de comunicação de massa tiveram efeitos diretos sobre as mobilizações sociais — sabemos o quanto Hitler se valeu dos mass media para fazer propaganda do regime nazista, sob a orientação do seu ministro da propaganda Joseph Goebbels. No Brasil, Getúlio Vargas 3Filosofia e desafios contemporâneos criou a “Hora do Brasil” com intenção parecida, ajudando a manter a ditadura do Estado Novo por 15 anos. Tamanho foi o sucesso das propagandas nazi- fascistas sobre a população que os primeiros estudiosos do fenômeno criaram uma teoria “hipodérmica” da comunicação, conhecida também como teoria da bala mágica, que pressupunha um efeito quase hipnótico da mídia sobre a população. Hoje sabemos que os meios não têm esse poder absoluto sobre as ações dos indivíduos. No entanto, sabemos também que o seu poder de sugestão não é pequeno. Com a consolidação da internet como grande mídia do século XXI, as mobilizações sociais ganharam novo escopo. O sociólogo francês Pierre Levy, em seu livro Cibercultura (1999), acreditava que a grande vantagem da internet em relação aopassado estava no seu caráter interativo. Isso significa que a internet é diferente das mídias dos séculos anteriores por não supor um consumidor passivo. Enquanto no modelo da imprensa, da tevê e do rádio os jornalistas e produtores decidem os conteúdos que serão veiculados, na internet cada consumidor torna-se também um possível produtor. Qualquer um pode publicar os seus escritos em um blog, escrever comentários numa notícia, compartilhar uma opinião no Facebook, divulgar um vídeo pessoal no YouTube. O otimismo de Levy (1999) o levou a dizer que isso tornaria a sociedade mais democrática. A internet, fundada em práticas de troca generosas e desinteressadas, encarnaria assim os próprios ideais da Revolução Francesa: liberdade, igualdade e fraternidade. Infelizmente, a inocência de Levy (1999) não dava conta de explicar toda a realidade. Embora tenha havido experiências positivas em torno desse novo uso das mídias digitais — como as revoltas no mundo árabe, que levaram à deposição de uma ditadura —, nem todas as mobilizações sociais organizadas por meio digital têm caráter democrático. Algumas inclusive têm tido um caráter bastante autoritário, lembrando os tempos do nazifascismo — isto é, expressam o desrespeito à diversidade e à livre discussão de ideias. Antes mesmo da existência da internet, o filósofo italiano Umberto Eco (2015) chamou atenção para como a polarização do debate sobre as mídias sociais prejudicava uma análise mais sensata sobre o assunto. Em seu famoso texto Apocalípticos e Integrados, Eco (2015) chamou de “apocalípticos” aqueles que exageravam ao considerar apenas o caráter alienante dos meios de comunicação, e de “integrados” aqueles que viam a vantagem dos mass media para o desenvolvimento das sociedades democráticas. Filosofia e desafios contemporâneos4 Fake news O fi lósofo Marshall McLuhan (1974) previu, em meados do século XX, que o progresso das tecnologias de informação nos tornaria cidadãos de uma “aldeia global”. A sua ideia era que todos os habitantes do mundo — agora podendo se comunicar com facilidade — compartilhariam os seus costumes e as suas ideias, como os cidadãos de uma pequena aldeia. Hoje, depois que a internet tornou real essa profecia de McLuhan (1974), vivemos num mundo globalizado. Mesmo morando numa cidade pequena, distante dos grandes centros, nunca estamos completamente isolados: as nossas ações aqui têm consequências diretas sobre os habitantes de lá. O impacto disso sobre a cultura foi gigantesco: não só os hábitos das po- pulações de diferentes países tornaram-se bastante parecidos, como também os gostos e as ideias. Já nem percebemos mais o quanto muitos dos nossos hábitos cotidianos tiveram origem em lugares distantes. Por exemplo, o gesto simples de cantar parabéns no dia do aniversário, diante de um bolo com algumas velas acesas, e depois fazer um pedido ao apagá-las parece natural no Brasil, mas é na verdade um costume surgido nos Estados Unidos, que já faz parte do repertório cultural de vários países do mundo — inclusive no Oriente. Nesse sentido, uma das maiores preocupações da filosofia atualmente tem sido entender de que forma esse processo de homogeneização da cultura tem nos afetado. Hoje, devido ao poder de comunicação das mídias digitais, a filosofia tem se preocupado cada vez mais com os dilemas que envolvem a livre circulação de ideias. Se, por um lado, é desejável defender o direito à liberdade de expressão conquistado pelos iluministas, por outro, a produção desenfreada e irresponsável de conteúdos tem entrado diretamente em conflito com o projeto de uma sociedade democrática. Não conseguimos ainda encon- trar um equilíbrio entre o global e o local, e muitas vezes a mera vontade de exprimir um sentimento ou uma ideia numa mídia social pode descambar para a violência, o autoritarismo e a negação sistemática das opiniões diferentes. Nesse sentido, a tarefa de problematizar a nossa posição como disseminadores de informação tornou-se urgente. Se quisermos de fato viver harmoniosamente em sociedade, precisamos refletir criticamente sobre a nossa responsabilidade como habitantes dessa “aldeia global”. Um dos fenômenos que mais tem entrado em conflito com os interesses das sociedades democráticas é a disseminação de notícias falsas na internet. Conhecidos globalmente pelo termo inglês fake news, tais textos podem ser definidos como notícias fabricadas ou inventadas por pessoas que têm algum interesse na sua divulgação. Esses textos mantêm o mesmo formato visual 5Filosofia e desafios contemporâneos e a mesma estrutura formal dos textos jornalísticos, mas não são produto de um processo jornalístico de apuração e verificação. Antes da internet, não existiam tantos canais diferentes para se buscar a informação como há hoje. Lia-se o jornal, assistia-se à tevê ou ouvia-se o rádio; nesses meios, a informação era produzida por jornalistas capacitados para apurar a veracidade dos fatos. Os jornais impressos tinham interesse em vender notícias confiáveis e imparciais, da mesma forma que um comerciante numa loja quer vender um produto de qualidade para manter os seus clientes. Desse modo, criou-se uma confiança muito grande nos meios de comunicação de massa: algo era considerado verdadeiro se estivesse publicado no jornal, e tudo o que estava no jornal podia ser considerado verdadeiro — foi daí que surgiu a expressão “preto-no-branco”, que usamos até hoje para indicar confiança e veracidade. Na era da internet, o monopólio dessas empresas de comunicação foi desestabilizado. Com a possibilidade de produzir informações mais baratas, surgiram empresas que flexibilizaram os critérios de apuração das infor- mações. A concorrência entre os antigos meios e a internet fez com que o investimento em produção de notícias diminuísse e, com isso, perdeu-se boa parte da credibilidade que a população tinha nelas. Além disso, a facilidade e a velocidade do aceso à informação fez com que houvesse cada vez menos tempo para apurar um fato ou refletir sobre um acontecimento. O critério jornalístico de que a melhor notícia é a mais imediata fez com que os textos da internet prezassem mais pela velocidade com que a informação chega às pessoas do que com a qualidade da apuração. Assim, naturalmente, com menor tempo gasto para a produção da notícia, a sua confiabilidade também é menor. Embora as fake news tenham aparecido com mais intensidade atualmente, elas não são uma novidade da era da internet. Na verdade, os historiadores dos meios de comunicação sabem muito bem que a maior parte dos jornais nasceu em nome de interesses políticos bastante precisos. O próprio Platão disse, ainda na Grécia Antiga, que uma mentira contada por um rei seria útil, desde que servisse aos interesses da cidade. Foi só no final do século XIX que surgiu o critério da objetividade no jornalismo, justamente para combater o excesso de notícias falsas. O que é próprio da internet, então? Os estudiosos têm mostrado que o maior problema das atuais fake news é a velocidade com que uma notícia falsa é compartilhada. Uma pesquisa norte-americana constatou que entre 9% e 15% dos usuários do Twitter são bots, isto é, contas falsas. Constatou-se que a maior parte deles produz conteúdo extremista ou politicamente radical, feito Filosofia e desafios contemporâneos6 para ser rapidamente compartilhado. Há também fortes evidências de que as eleições de 2016 nos Estados Unidos foram influenciadas por essa prática. Quantas vezes, antes de apertar o botão “compartilhar”, você de fato se perguntou se a notícia é verdadeira? Ou se a fonte é confiável? Ou ainda se o jornal que se responsabiliza pela notícia é uma empresa socialmente res- ponsável? São raras as pessoas que se preocupam com isso. O preocupante é que são essas notícias falsas, criadas por pessoas com interesses eticamente duvidosos, que têm conduzido o debate de ideias. Por isso, as fake news têm sido um desafio para a filosofiacontemporânea, especialmente aquela preocupada com a política e com a ética. Ao que parece, estamos habitando um mundo em que os critérios para o que é verdadeiro ou falso estão se alterando — e esse é, em larga medida, o problema fundamental da filosofia desde Platão. Sustentabilidade e desenvolvimento tecnológico Desde a primeira Revolução Industrial, no século XVIII, o desenvolvimento tecnológico acelerado e globalizado trouxe consigo uma série de problemas. No que diz respeito à relação entre o homem e a natureza, a exploração dos bens naturais muitas vezes levou à destruição irreparável de partes do planeta. No plano da economia, o sistema de distribuição de riquezas capitalista inten- sifi cou a desigualdade social, criando os problemas que hoje experimentamos na vida urbana. Quanto à cultura, a globalização intensifi cou confl itos étnicos e raciais, que levaram à perseguição de minorias em nome de um projeto pretensamente civilizatório. O filósofo alemão Martin Heidegger (2001), em sua famosa conferência sobre A questão da técnica, já apontava na década de 1940 para os dilemas éticos em torno da forma predatória com que o homem moderno se relacionava com a natureza. Heidegger (2001) dizia que o homem moderno, em sua soberba vontade de poder, via a natureza não como sua “morada”, mas como algo a ser desafiado, domado, possuído, estocado. Em vez de ver-se como membro e parte da natureza, o homem se colocava como seu opositor; enquanto a técnica dos antigos buscava extrair o sustento do homem, a técnica moderna visa acumular energia e poder. Para explicar o seu raciocínio, Heidegger (2001) compara um moinho hidráulico com uma hidrelétrica moderna. O moinho, com o intuito de moer o trigo, extrai as forças da água sem alterar o curso do rio; a hidrelétrica, com o intuito de acumular energia e produzir mais riquezas, destrói o ambiente, adequando-o à vontade humana. Assim, Heidegger (2001) afirma que, para 7Filosofia e desafios contemporâneos o homem moderno, não é a hidrelétrica que está no rio, mas é o rio que está na hidrelétrica. O que isso quer dizer? Tudo se passa, para nós, como se fosse óbvio que o rio está ali para ser explorado. A técnica moderna vê a natureza simplesmente como algo ao nosso serviço, à nossa disposição; nós escravizamos a natureza, esquecendo que é graças a ela que somos livres. Aquilo que parecia uma ideia inovadora na época de Heidegger (2001) tornou-se, a partir das décadas de 1970 e 1980, um dos principais debates sobre o desenvolvimento tecnológico. Foi nessa época que se começou a dar importância cada vez maior ao conceito de sustentabilidade. É provável que você já tenha ouvido esse conceito. Ele indica uma nova forma de o homem se relacionar com o seu ambiente, de modo a evitar os erros cometidos pelo consumismo desenfreado dos séculos XIX e XX. Em 1987, o Relatório de Brundtlande, também conhecido como Nosso futuro comum, apresentou ao mundo a conclusão de que os padrões de consumo atuais eram incompatíveis com a manutenção do meio ambiente. Assim, esse documento definiu o de- senvolvimento sustentável como aquele que satisfaz as necessidades de uma geração sem colocar as necessidades das outras em risco. Os quatro requisitos para uma ação humana sustentável são: ser ecologicamente correta; ser economicamente viável; ser socialmente justa; ser culturalmente diversa. É por conta dessa reflexão que hoje a maior parte dos países tem buscado conter o aspecto predatório do desenvolvimento tecnológico. Na verdade, a ciência agora busca soluções mais inteligentes para manter o nosso modo de vida sem afetar negativamente o meio ambiente e até mesmo o meio social. A busca por fontes de energia renováveis tem sido uma das linhas de frente desse debate. Levando em conta que grande parte da energia consumida do mundo tem origem em combustíveis não renováveis (como o petróleo), se a ciência não encontrar outras saídas, haverá um momento em que o atual modo de vida será impossibilitado. Entretanto, a sustentabilidade não tem a ver somente com o meio ambiente, como a maioria das pessoas pensam. As ações sustentáveis também visam a Filosofia e desafios contemporâneos8 um desenvolvimento social e econômico mais igualitário, que crie condições de vida melhores para as gerações futuras — e isso envolve pensar na saúde, na segurança e na educação daqueles que ainda estão por nascer. Não basta apenas salvar espécies em risco de extinção, diminuir a emissão de gás carbônico ou cuidar para que não se esgotem as nossas fontes de energia: é preciso também pensar nas interações humanas e nas instituições que criam o ambiente da vida social. Isso envolve pensar questões mais “humanas”, como a violência urbana, a criminalidade, os direitos fundamentais do homem, a igualdade social, as condições de trabalho, a urbanização, a higiene, a vacinação... enfim, tudo aquilo que, a partir da interação entre o homem e a natureza e entre o homem e a sociedade, gera um “hábitat” ou um “ambiente”. Heidegger (2001) lembra que os gregos antigos chamavam de ethos o “hábito” de alguém, o seu modo de ser, de agir, de pensar — isto é, de “habi- tar” o mundo. A palavra ética, que deriva de ethos, é a parte da filosofia que reflete sobre os modos como nós podemos habitar a Terra. Portanto, podemos dizer que um mundo sustentável é também um mundo ético, e é por isso que a sustentabilidade é uma questão filosófica tão urgente. Leia o texto Trajetória da sustentabilidade: do ambiental ao social, do social ao econômico, de Elimar Pinheiro Nascimento, para aprofundar os seus conhecimentos sobre a história do conceito de sustentabilidade. https://goo.gl/7r3hks ADORNO, T.; HORKHEIMER, M. A dialética do esclarecimento. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1985. HEIDEGGER, M. A questão da técnica. In: HEIDEGGER, M. Ensaios e conferências. Petró- polis: Vozes, 2001. p. 11-38. LEVY, P. Cibercultura. São Paulo: Editora 34, 1999. McLUHAN, M. Os meios de comunicação como extensão do homem. São Paulo: Cultrix, 1974. 9Filosofia e desafios contemporâneos Leituras recomendadas ADORNO, T. Propaganda fascista e anti-semitismo. 1946. Disponível em: <https://nu- pese.fe.ufg.br/up/208/o/Theodor_Adorno_-_Propaganda_fascista_e_anti-semi- tismo___1946__.htm?1349568169>. Acesso em: 30 out. 2018. BRASIL. Ministério do Meio Ambiente. Secretaria de Políticas para o Desenvolvimento Sustentável. Ética e sustentabilidade. Brasília: [2010]. (Caderno de Debate e Sustentabili- dade: Agenda 21). Disponível em: <http://www.mma.gov.br/estruturas/agenda21/_ar- quivos/CadernodeDebates10.pdf>. Acesso em: 30 out. 2018. ECO, U. Apocalípticos e integrados. São Paulo: Perspectiva, 2015. LAZER, D. et al. The Science of fake news: addressing fake news requires a multidisci- plinary front. Science, v. 359, n. 6380, p. 1094-1096, March 2018. Disponível em: <http:// vermontcomplexsystems.org/share/papershredder/lazer2018a.pdf>. Acesso em: 30 out. 2018. MIKHAILOVA, I. Sustentabilidade: evolução dos conceitos teóricos e os problemas da mensuração prática. Revista Economia e Desenvolvimento, Santa Maria, n. 16, 2004. Dispo- nível em: <https://periodicos.ufsm.br/eed/article/view/3442>. Acesso em: 30 out. 2018. NASCIMENTO, E. P. Trajetória da sustentabilidade: do ambiental ao social, do social ao econômico. Estudos Avançados, v. 26, n. 74, 2012. Disponível em: <http://www.scielo. br/pdf/ea/v26n74/a05v26n74.pdf>. Acesso em: 30 out. 2018. Filosofia e desafios contemporâneos10 Conteúdo:
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