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EDUARDO DE OLIVEIRA A PEQUENA CIDADE DE ELÍSIO MEDRADO-BA E SUA INSERÇÃO NA REDE URBANA. LONDRINA 2010 EDUARDO DE OLIVEIRA A PEQUENA CIDADE DE ELÍSIO MEDRADO-BA E SUA INSERÇÃO NA REDE URBANA. Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Departamento de Geociências da Universidade Estadual de Londrina, para obtenção do título de bacharel em Geografia. Orientador: Prof. Dr. Claudio Roberto Bragueto LONDRINA 2010 EDUARDO DE OLIVEIRA A PEQUENA CIDADE DE ELÍSIO MEDRADO-BA E SUA INSERÇÃO NA REDE URBANA. Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Departamento de Geociências da Universidade Estadual de Londrina, para obtenção do título de bacharel em Geografia. COMISSÃO EXAMINADORA ____________________________________ Prof. Dr. Claudio Roberto Bragueto Universidade Estadual de Londrina ____________________________________ Profª. Me. Rosely Maria de Lima Universidade Estadual de Londrina ____________________________________ Profª. Drª Márcia Siqueira de Carvalho Universidade Estadual de Londrina Londrina, _____de ___________de _____. DEDICO ESTA CONQUISTA A MINHA FAMÍLIA, OS QUAIS AMO MAIS QUE TUDO: MINHA ESPOSA, MEUS PAIS E IRMÃOS. AGRADECIMENTOS A meu pai (Severino), minha mãe (Alice) exemplos de amor e dedicação; À minha esposa, Adenildes, pelo carinho, paciência, apoio, amizade e amor; e que soube segurar as “pontas” enquanto eu realizava uma e outra tarefa, alheio aos “afazeres” familiares, estando sempre do meu lado em todos os momentos. Te amo!!!; A meus irmãos, Carlos e Lusimara pelo carinho; Aos meus sogros Aristides e Maria Alice por todo auxílio e apoio durante esta caminhada; Aos meus cunhados, cunhadas e sobrinhos, especialmente ao meu sobrinho Cleison pela ajuda e prontidão no decorrer da pesquisa; A Dilê e Rosangela Martins pela amizade e apoio, sempre que necessário e pelo estímulo para superar as dificuldades; A minha amiga Meire Cristina da Silva pela amizade que conquistamos durante esta etapa de nossas vidas; Ao Padre Gilberto Vaz Sampaio por ter deixado uma grande contribuição teórica da região (in memorian); Ao meu orientador Prof. Dr. Claudio Roberto Bragueto pela sua disponibilidade e apoio ao longo do trabalho; À professora Tania Maria Fresca, pois foi a partir de suas primeiras orientações que ampliei minha visão quanto ao universo da temática; A todos os professores do curso de Geografia da UEL, que são parte ativa deste trabalho; A todas as pessoas de Elísio Medrado que me permitiram entrevistá-las e que me deram valiosas informações para a elaboração deste trabalho; Enfim, agradeço a todos que diretamente e indiretamente contribuíram para esta minha conquista. No meio da dificuldade encontra-se a oportunidade. Albert Einstein OLIVEIRA, Euardo de. A pequena cidade de Elísio Medrado-BA e sua inserção na rede urbana. 2010. 118 f.Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em Geografia) – Universidade Estadual de Londrina, Londrina, 2010. RESUMO Analisa a dinâmica funcional da cidade de Elísio Medrado- BA e sua inserção na rede urbana regional. Além disso, identifica a gênese do município e as mudanças que ocorreram ao longo de sua história. Para a coleta das informações utiliza-se pesquisa de campo, entrevistas abrangendo a população tanto rural como urbana. Faz uma análise teórica mostrando o que é uma rede urbana e o conceito de pequena cidade dentro do conceito hierárquico. Dentro da análise histórica, constata que o município apresenta três pequenos núcleos urbanos que se formaram em períodos e contextos econômicos diferentes. Inicialmente o município era habitado por nativos da região, com a penetração dos bandeirantes no Recôncavo Sul surgiu um primeiro povoado que chegou a ser sede de município, atualmente é apenas distrito do município denominado Monte Cruzeiro. No ponto sul do município surgiu outro povoado na segunda metade do século XIX em decorrência da estrada de ferro que cortava a região, atualmente é um pequeno povoado conhecido como Souza Peixoto. Já, no início do século XX surge o povoado que é hoje a sede do município. Atualmente o município encontra-se na área periférica da rede urbana regional, apresentando um baixo desenvolvimento, cuja população não tem acesso a trabalho, poucos são empregados públicos, muitos vivem da aposentadoria e da agricultura de baixa capitalização. Em decorrência desses fatores os jovens do município migram para outras cidades em busca de melhores condições de vida. Assim, esse trabalho faz uma análise geral dos aspectos históricos, econômicos e geográfico do município, desde as primeiras ocupações até a atualidade, buscando entender as problemáticas econômica e social em que passa o município e finalmente são sugeridas algumas alternativas de melhoria social e econômica para a população local. Palavras-chave: Rede urbana, cidade pequena, Elísio Medrado. LISTA DE ILUSTRAÇÕES Figura 1 – Mapa com a localização do município de Elísio Medrado .................................. 14 Figura 1a – Mapa com a localização dos povoados do município de Elísio Medrado ......... 35 Figura 2 – Fazenda Estiva ..................................................................................................... 38 Figura 3 – Casas antigas e novas – lado a lado ..................................................................... 40 Figura 4 – Casas antigas e novas – lado a lado .................................................................... 40 Figura 5 – Casas antigas e novas – lado a lado .................................................................... 40 Figura 6 – Casas antigas e novas – lado a lado .................................................................... 40 Figura 7 – Plantação de uva ................................................................................................. 41 Figura 8 – Produção artesanal de vinho ............................................................................... 41 Figura 9 – Produção artesanal de vinho .............................................................................. 41 Figura 10 – Vista da Igreja de Monte Cruzeiro (Nossa Senhora de Sant’Ana) .................... 42 Figura 11 – Aspecto interno da Igreja de Monte Cruzeiro (Nossa Senhora de Sant’Ana) ........................................................................................................................... 43 Figura 12 – Aspecto interno da Igreja de Monte Cruzeiro (Nossa Senhora de Sant’Ana) .......................................................................................................................... 43 Figura 13 – Aspecto interno da Igreja de Monte Cruzeiro (Nossa Senhora de Sant’Ana) .......................................................................................................................... 43 Figura 14 – Aspecto interno da Igreja de Monte Cruzeiro (Nossa Senhora de Sant’Ana) ........................................................................................................................... 43 Figura 15 – Povoado de Souza Peixoto................................................................................. 44 Figura 16 – Igreja do Povoado de Souza Peixoto (São Francisco do Cajueiro) ................... 45 Figura 17 – Aspecto das construções: antiga e mais recente ................................................45 Figura 18 – Aspecto das construções: antiga e mais recente ................................................ 45 Figura 19 – Aspecto das construções: antiga e mais recente ................................................ 45 Figura 20 – Aspecto das construções: antiga e mais recente ................................................ 45 Figura 21 – Construção antiga passando por transformação na atualidade .......................... 46 Figura 22 – Construção antiga passando por transformação na atualidade ......................... 46 Figura 23 – Plantação de mandioca ...................................................................................... 46 Figura 24 – Residência e casa comercial do Sr. Vitorino Peixoto ....................................... 48 Figura 25 – Residência e casa comercial do Sr. Vitorino Peixoto ....................................... 48 Figura 26 – Casa Santana em destaque – residência e casa comercial do Sr. Vitorino Peixoto ............................................................................................................... 48 Figura 27 – Residência no Lagedo Batista ........................................................................... 49 Figura 28 – Cesta do Povo – proximidade do local de início da feira do município de Elísio Medrado, no ano de 1928 ........................................................................................... 50 Figura 28a – Quadro evolutivo mostrando a qual município pertenceu o território do atual município de Elísio Medrado......................................................................................... 52 Figura 29 – Construção antiga feita de adobe ...................................................................... 53 Figura 30 – Construção antiga feita de adobe ...................................................................... 53 Figura 31 – Construções antigas que servem como moradia e comércio ............................. 54 Figura 32 – Construções antigas que servem como moradia e comércio ............................ 54 Figura 33 – Carros estacionados na calçada e na rua, devido à ausência de garagem, e uma das casas com um melhor padrão arquitetônico contendo garagem .............................. 54 Figura 34 – Carros estacionados na calçada e na rua, devido à ausência de garagem, e uma das casas com um melhor padrão arquitetônico contendo garagem ............................. 54 Figura 35 – Serviço de moto táxi oferecido a população do município de Elísio Medrado . 55 Figura 36 – Casas populares ................................................................................................. 57 Figura 37 – Casas populares ................................................................................................. 58 Figura 38 – Calçamento com paralelepipedo ....................................................................... 59 Figura 39 – Comércio da área central do município de Elísio Medrado ............................. 59 Figura 40 – Comércio da área central do município de Elísio Medrado ............................. 60 Figura 41 – Comércio da área central do município de Elísio Medrado ............................ 60 Figura 42 – Comércio da área central do município de Elísio Medrado ............................ 61 Figura 43 – Comércio da área central do município de Elísio Medrado ............................. 61 Figura 44 – Comércio da área central do município de Elísio Medrado ............................ 62 Figura 45 – Comércio da área central do município de Elísio Medrado ............................ 62 Figura 46 – Comércio da área central do município de Elísio Medrado ............................ 63 Figura 47 – Mapa da Região Econômica do Recôncavo Sul da Bahia ................................ 67 Figura 48 – Estrutura viária da Região de Amargosa Bahia - 1960 ..................................... 71 Figura 49 – Fazenda Estiva do Sr. Kamal Elílio Chaoul ...................................................... 72 Figura 50 – Árvores de Flamboyants e ao fundo a Serra da Jibóia (Fazenda Estiva) .......... 73 Figura 51 – Fazenda do povoado Limoeiro do ano de 1912 ................................................ 74 Figura 52 – Decoração artística na parede interna da fazenda do povoado Limoeiro do ano de 1912, e piso de lajota feito de barro cozido ...................................................................... 74 Figura 53 – Decoração artística na parede interna da fazenda do povoado Limoeiro do ano de 1912, e piso de lajota feito de barro cozido ..................................................................... 74 Figura 54 – Fazenda Rio Vermelho ..................................................................................... 75 Figura 55 – Equipamento para moagem da cana pertencente à Fazenda Rio Vermelho ...... 76 Figura 56 – Regiôes Econômicas do estado da Bahia e seu desenvolvimento .................... 80 Figura 57 – Preparo do terreno de forma manual para plantio de mandioca ....................... 89 Figura 58 – Feira de roupas .................................................................................................. 93 Figura 59 – Cesta do Povo (portas e janelas na cor azul) – local próximo de onde se iniciou a feira do município de Elísio Medrado no ano de 1928.......................................................94 Figura 60 – Centro de Abastecimento Governador César Borges onde acontece a feira do munícípio de Elísio Medrado ...........................................................................................94 Figura 61 – Feirante do município de Elísio Medrado, transportando suas mercadorias no lombo de um jegue............................................................................................................95 Figura 62 – Barraca de um dos feirantes expondo seus produtos aos consumidores da Feira.......................................................................................................................................95 Figura 63 – Barraca de um dos feirantes expondo seus produtos aos consumidores da feira .......................................................................................................................................96 Figura 64 – Barraca de um dos feirantes expondo seus produtos aos consumidores da feira .......................................................................................................................................96 Figura 65 – Vista de algumas barracas dos diversos feirantes da feira expondo seus produtos aos consumidores....................................................................................................97 Figura 66 – Transporte oferecido aos moradores da zona rural, trazendo a população do campo para consumir produtos da feira............................................................................98 Figura 67 – Sorteio de brindes, realizado no dia 31 de dezembro de 2009........................100 Figura 68 – Mercado Municipal.........................................................................................100 Figura 69 – Produtor expondo seus produtos na rua..........................................................101 Figura 70 – Potencialidades econômicas de alguns municípios do Recôncavo Sul...........104 LISTA DE TABELAS Tabela 1 – Frota de veículos em 2009................................................................................... 55 Tabela 2 – Movimentação financeira da empresa Estrada de Ferro de Nazaré/1931-1969 (em réis, entre 1931-1945; 1946-1969, em cruzeiros............................................................. 70 Tabela 3 – Rendimento médio mensal da população economicamente ativa: 1980 e 2000.. 82 Tabela 4 – Estrutura fundiária do município de Elísio Medrado - 2006 ...............................83 Tabela 5 – População Urbana e Rural nos períodos de 1970 a 2000 .................................... 83 Tabela 6 – Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB) - 2009 ........................ 85 LISTA DE QUADROS Quadro 1 – Linhas de ônibus intermunicipal ....................................................................... 64 Quadro 2 – Dados geográficos do município de Elísio Medrado ........................................ 81 LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS CEL. - Coronel D. - Dona EMTRAM – Empresa de Transportes Macaubense Ltda. IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística IDEB – Índice de Desenvolvimento da Educação Básica PE. - Padre SIDRA – Sistema IBGE de Recuperação Automática SPC – Sistema de Proteção ao Crédito SR. - Senhor SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................. 14 2 A REDE URBANA E PEQUENAS CIDADES................................................................ 18 2.1 REDE URBANA NA VISÃO DE ROBERTO LOBATO CORRÊA................................ 18 2.1.1 A Hierarquia Urbana ...................................................................................................... 20 2.2 PEQUENAS CIDADES: POR QUE ESTUDÁ-LAS? ..................................................... 24 2.2.1 Breve Considerações Sobre a Urbanização Brasileira e Pequenas Cidades................... 26 2.2.2 Pequenas Cidades: Seu Papel na Rede Urbana .............................................................. 28 3 A HISTÓRIA DE ELÍSIO MEDRADO ........................................................................... 34 3.1 SURGIMENTO DO POVOADO DE MONTE CRUZEIRO ........................................... 35 3.2 SURGIMENTO DO POVOADO DE SOUZA PEIXOTO............................................... 43 3.3 SURGIMENTO DO POVOADO PARAÍSO ................................................................... 47 3.4 MARCAS DO PASSADO E ALGUMAS CARACTERÍSTICAS ATUAIS DO MUNICÍPIO ..................................................................................................................... 53 3.4.1 Presença de Escravidão no Município............................................................................ 65 3.4.2. O Cultivo do Café.......................................................................................................... 66 4 FORMAÇÃO DA REDE URBANA E O MUNICÍPIO DE ELÍSIO MEDRADO. ..... 67 4.1 INÍCIO DA FORMAÇÃO DA REDE URBANA E/OU O MUNICÍPIO DE ELÍSIO MEDRADO ............................................................................................................... 68 4.2 A REDE URBANA E A DINÂMICA FUNCIONAL DE ELÍSIO MEDRADO NA ATUALIDADE ................................................................................................................ 79 4.2.1 Alguns Dados Econômicos e Sociais de Elísio Medrado............................................... 80 4.2.2 A Problemática dos Comerciantes Locais ...................................................................... 90 4.2.3 A Feira Semanal ............................................................................................................. 93 4.3 UM OLHAR GEOGRÁFICO SOBRE O MUNICÍPIO DE ELÍSIO MEDRADO: ALGUMAS SUGESTÕES.................................................................101 CONSIDERAÇÕES FINAIS...............................................................................................108 REFERÊNCIAS....................................................................................................................110 APÊNDICES.........................................................................................................................113 APÊNDICE A – Entrevista aplicada com os comerciantes do município de Elísio Medrado.......................................................................................................................114 APÊNDICE B – Entrevista aplicada com os feirantes do município de Elísio Medrado........................................................................................................................115 APÊNDICE C – Entrevista aplicada com os moradores da área urbana e rural do município de Elísio Medrado..................................................................................................116 APÊNDICE D – Relação das pessoas entrevistadas...............................................................117 14 1 INTRODUÇÃO Nas últimas décadas o mundo tem passado por muitas mudanças no âmbito social e econômico. A acirrada competição produtiva, comercial e financeira em escala global cria dificuldades para algumas regiões se adequarem às novas transformações. A Geografia enquanto ciência que estuda a organização e as interações no espaço geográfico, passa a desempenhar um relevante papel neste cenário atual, sobretudo, na busca da compreensão das relações existentes entre o desenvolvimento regional e o local. Neste contexto o Recôncavo Sul da Bahia, que no início da colonização brasileira era uma importante região exportadora de açúcar e posteriormente de café, é objeto de estudo deste trabalho dando ênfase para o município de Elísio Medrado (figura 1). Figura 1: Mapa com a localização do Município de Elísio Medrado. Fonte: MENEZES (2008, p. 16). Adaptação: Eduardo de Oliveira, 2010. 15 Tem como objetivo analisar a dinâmica funcional do município de Elísio Medrado e sua inserção na rede urbana regional. E como objetivos específicos a pesquisa buscou: Identificar a gênese do município; Verificar as mudanças que ocorreram e que estão ocorrendo ao longo dos anos neste município em função das demandas diárias de trabalho, sociais e econômicas; Compreender sua importância na rede urbana regional, analisando a influência deste em outros municípios da região. Em outras palavras, procura-se compreender os fatores que estão levando o município a um declínio de suas atividades econômicas já que a população local não tem acesso a emprego, poucos são os empregos gerados pela Prefeitura, e muitos vivem de aposentadoria e da agricultura de baixa capitalização. Com esta pesquisa foi possível descobrir as causas do fraco desenvolvimento municipal. Um fato que chama a atenção é a ausência de agentes produtores do espaço, visto que a cidade não tem promotor imobiliário, o grande capitalista, latifundiário, agente industrial, existindo apenas intervenção do Estado que pouco interfere na produção espacial urbana. A produção espacial por parte do Estado, se dá apenas com a construção de algumas casas populares que começaram a surgir a partir da última década. A negociação de imóveis ocorre de boca a boca, onde o comprador e o vendedor negociam diretamente. Em decorrência do pouco desenvolvimento do município muitos jovens se deslocam principalmente para Salvador para trabalhar no comércio de alguém conhecido e posteriormente deixa de ser comerciário e passa a ser comerciante; montando o seu pequeno comércio, geralmente ligados a alimentação (minimercado, padaria, lanchonete, açougue, entre outros). Percebe-se que a saída desses jovens faz com que a população local reduza, ficando apenas os mais velhos. Outro fato relevante, que ocorre no município, é que os moradores se deslocam até as cidades como Amargosa e Santo Antônio de Jesus para fazer feiras e comprar produtos como eletrodomésticos, serviços entre outros, mesmo que muitos destes produtos sejam vendidos no comércio local, porém este não oferece as variedades encontradas nestes dois municípios. Estes fatores citados, anteriormente, deixam o município ainda mais empobrecido, pois sai a mão-de-obra jovem e o dinheiro que poderia circular na cidade vaipara os demais municípios. 16 Este estudo pode servir de base para o desenvolvimento de um planejamento urbano, ajudando na tomada de rumos para seu desenvolvimento, visto que a administração atual se mostra interessada em conhecer o resultado do trabalho. Outro fator de interesse pela pesquisa é de cunho pessoal, pois minha esposa nasceu neste município onde também nos casamos e onde vive muitos familiares, que despertaram em mim a curiosidade de fazer tal pesquisa, por perceber que o município não tem um trabalho semelhante. Com base em uma metodologia que parte da teoria para a prática, foi analisada a área de estudo com leitura mais aprofundada sobre o tema, para facilitar a compreensão dos fatos observados em atividade de campo. Toda análise realizada foi feita através de pesquisa de campo (entrevistas, observação em torno do município e da região) e coleta de dados na Prefeitura do Município de Elísio Medrado, IBGE., biblioteca, entre outros. Todas as informações obtidas foram analisadas. No decorrer de todo este trabalho, além do reconhecimento da área e levantamento cartográfico, foi discutida a parte teórica que serviu de base para a redação do presente trabalho. Inicialmente foi feito um levantamento bibliográfico sobre o município e a área em estudo, além das teorias da Geografia Urbana com ênfase em Rede Urbana e pequenas cidades. Após o levantamento bibliográfico procedeu-se a elaboração de fechamentos e resumos. Como já se tinha conhecimento prévio da localidade, não houve necessidade de um reconhecimento de campo para elaboração de uma entrevista. Após a tabulação dos dados coletados pelas entrevistas, que foram feitas tanto com os comerciantes, quanto a população local, os mesmos foram analisados com base nas teorias estudadas. Finalmente foi montado o trabalho final, tendo como base os dados obtidos e o referencial teórico. Assim, este trabalho se subdivide em: Capítulo 2 é discutido o tema a rede urbana e pequenas cidades, pois para se entender a dinâmica funcional de um município faz-se necessário entender a rede urbana e sua hierarquia neste contexto. Também fez-se uma discussão sobre as pequenas cidades, mostrando sua importância dentro do espaço geográfico, visto que aparentemente são cidades com pouca dinâmica econômica, mas tem sua importância dentro da rede urbana, tanto como fornecedora de mão-de-obra, matéria-prima, ou alimentos, bem como consumidora final de produtos industrializados. 17 Já no capítulo 3, é feita uma reconstrução histórica do município desde a sua gênese de formação até a situação atual, destacando aspectos geográficos e históricos. Como o município não conta com muito material bibliográfico para pesquisa, foi preciso buscar informações junto à comunidade local através de entrevistas, além de observações dos aspectos arquitetônicos e históricos. Mas uma obra não publicada escrita pelo padre Gilberto Vaz Sampaio ajudou muito nesta pesquisa, que junto à comunidade pode-se constatar a veracidade dos fatos relatados em seu trabalho, que certamente não foi publicado devido ao seu falecimento, na fase de correção gramatical. O capítulo 4 aborda a formação da Rede Urbana e/ou o município de Elísío Medrado desde o seu início até a fase atual, buscando caracterizar o município dentro do espaço regional econômico do Recôncavo Sul da Bahia. Com base no resultado dessa pesquisa, sugere-se algumas atividades que podem ser desenvolvidas no município para melhorar a qualidade de vida da população local. Embora sejam sugestões simples e que não demandam de muito recurso financeiro, eles necessitam de um grande empenho da população junto ao poder público local para que tais atividades se tornem viáveis a médio e longo prazo. Assim, esta monografia será mais um dos poucos trabalhos bibliográficos sobre o município que poderá servir de base para novos estudos. 18 2 A REDE URBANA E PEQUENAS CIDADES 2.1 REDE URBANA NA VISÃO DE ROBERTO LOBATO CORRÊA Para se entender a dinâmica funcional do município de Elísio Medrado, se faz necessário entender a rede urbana. Mas o que seria uma rede urbana? Entre vários autores e as definições que estes dão ao tema, o que Corrêa descreve parece mais claro para se entender como Elísio Medrado está inserido nesta rede. Para Corrêa (1994, p. 293) [...] a rede urbana, é um produto social, historicamente contextualizado, cujo papel crucial é o de, através de interações sociais espacializadas, articular toda a sociedade numa dada porção do espaço, garantindo a sua existência e reprodução. Em forma resumida, rede urbana é uma rede de relações que permite a sociedade manter suas relações sociais e econômicas, através da rede de transporte, comunicação, entre outras. Para Corrêa (1989a, p. 5), a gênese da rede urbana começa no século XVI com início do capitalismo. Mas foi a partir de mudanças sociais, ocorridas principalmente na segunda metade do século XX, que os estudos sobre rede urbana têm se intensificado no âmbito da Geografia. É através da crescente rede de comunicação e transporte que vários lugares passaram a estar interligados, estabelecendo uma economia global. Entre os anos de 1920 a 1950 os estudos sobre rede urbana começavam a se propagar. “É deste período que aparecem, entre outras, as proposições de Christaller e de Maark Gefferson” (CORRÊA, 1989a, p. 9). Mas no Brasil, só a partir de 1955 que se iniciam os estudos sobre rede urbana, pois após a Segunda Guerra Mundial ocorreu o processo de aceleração urbana. Os geógrafos e outros cientistas sociais têm abordado o tema a partir de diferentes vias: “[...] à diferenciação das cidades em termo de suas funções, dimensões básicas de variação, relações entre tamanho demográfico e desenvolvimento, hierarquia urbana, e relações entre cidade e região” (CORRÊA, 1989a, p. 10). 19 Dentro da classificação funcional, Corrêa (1989a, p. 10) coloca que “esta abordagem tem como pressuposto a existência de diferenças entre as cidades no que se refere às funções”. Conhecendo a função principal da cidade se torna mais fácil compreender a organização espacial. Mas para definir a função básica da cidade é preciso que o geógrafo tenha bastante cuidado com relação as técnicas estatísticas, pois elas podem não revelar a realidade das cidades. Como exemplo “os dados do Censo Demográfico são incapazes de revelar algumas funções importantes das cidades brasileiras, como aquelas ligadas à drenagem da renda fundiária” (CORRÊA, 1989a, p. 12). Características como: o ritmo de crescimento da população, a estrutura etária, a escolaridade, a proporção de homens e mulheres na idade ativa, as taxas de desemprego e a renda per capita podem variar dependendo das funções que desempenham (CAPEL apud CORRÊA, 1989a, p. 13). Foi com o estudo de Moser e Scott, em 1961, que se iniciou a procura sistemática das dimensões básicas de variação dos sistemas urbanos (CORRÊA, 1989a, p. 13). Vários estudos relativos a diversos países foram realizados com o objetivo de descobrir através da prática as dimensões básicas de variações como também sua estabilidade ao longo do tempo e a existência de dimensões universais de variações. Nesses estudos foram descobertas várias dimensões básicas de variáveis, entre elas estão às referentes ao tamanho, especialização funcional, características sociais e crescimento demográfico (CORRÊA, 1989a, p. 14). No Brasil, entre os anos de 1970 a 1977, devido a muitos geógrafos usaram as técnicas quantitativas e modelos de desenvolvimento regional, além do envolvimento do sistema de planejamento, isso fez com que as abordagens sobre rede urbana tenham sido marcadas, nessa época, pelo uso da dimensão básica de variações. Esses estudos revelaram alguns tipos de centro que “[...] em sua espacialização,definem regiões que foram interpretadas segundo as proposições de Friedmann: regiões centrais, principal e secundária, e regiões periféricas” (CORRÊA, 1989a, p. 14). Corrêa (1989a, p. 14-15), coloca que “[...] o estudo de Fredrich e Davidovich, mais recente, está baseado em três dimensões de variação do sistema urbano: estrutura sócioeconômica, ritmos de crescimento e formas de concentração espacial urbana”1. Na abordagem de tamanho e desenvolvimento, Corrêa (1989a, p. 15) coloca que, a rede urbana é considerada um todo, estabelecendo uma relação entre o tamanho das 1 FREDERICH, Olga M. B. L. & DAVIDOVICH, Fany. A configuração espacial do sistema urbano brasileiro como expressão no território da divisão social do trabalho. Revista Brasileira de Geografia, 44 (4), 1982. 20 cidades de uma rede urbana e certos aspectos da vida econômica e social. Ao se relacionar tamanho e desenvolvimento é preciso considerar o dinamismo econômico e social, levando em conta todo conjunto de cidades. O discurso dos modernistas, com relação ao tamanho e desenvolvimento das cidades, é que há um processo de difusão estabelecendo um equilibro entre a rede hierárquica, ou seja, as mudanças econômicas são disseminadas do seguinte modo: “(a) das metrópoles da core área para as metrópoles da periferia; (b) dos centros de mais alta hierarquia para os de mais baixa, num padrão de ‘difusão hierárquica’; (c) dos centros urbanos para as suas áreas de influência” (CORRÊA, 1989a, p. 18-19). Os estudiosos tradicionalistas contrapõem as ideias modernistas argumentando que as condições históricas das cidades são diferentes sendo “[...] necessário que haja uma política explicita e dirigida para se conter o crescimento exagerado da grande cidade, a ‘inchação’ das grandes metrópoles primazes” (CORRÊA, 1989a, p. 19). Com o aparecimento das idéias de descentralização, criando os pólos de desenvolvimento e a “[...] ação do Estado visando um desenvolvimento que seria equilibrado tanto no plano social como espacial [...]” (CORRÊA, 1989a, p. 19), passou-se a incluir a rede urbana. Com o desenvolvimento capitalista as diferenças entre as cidades aumentam, com isso os estudiosos incluem a temática hierarquia urbana. Segundo Corrêa (1989a, p. 20), foi “[...] a partir da expropriação dos meios de produção e de vida de enorme parcela da população, e a industrialização levam à expansão da oferta de produtos industriais e de serviços”. Com esta oferta de produtos e serviços surgiu um espaço de modo desigual criado pelo sistema capitalista, criando assim a hierarquia urbana. 2.1.1 A Hierarquia Urbana A hierarquia urbana é um dos assuntos mais estudados pelos pesquisadores que se dedicam a estudar a rede urbana. Esses estudos se originam dos questionamentos a respeito do número, tamanho e distribuição das cidades, procurando entender a natureza da rede, a teoria das localidades centrais. “Os numerosos estudos, teóricos e empíricos, procuram, em realidade, compreender a natureza da rede urbana segundo um ângulo específico que é o da hierarquia de seus centros” (CORRÊA, 1989a, p. 20). 21 Os estudos de Christaller discutidos por Corrêa (1989a, p. 21-32) apontam que há aglomerações urbanas de todos os tamanhos e que “[...] existem princípios gerais que regulam o número, tamanho e distribuição dos núcleos de povoamento: grandes, médias e pequenas cidades, e ainda minúsculos núcleos semi-rurais, todos são considerados como localidades centrais” (CORRÊA, 1989a, p. 21). Ou seja, todas as localidades são dotadas de funções centrais, com atividades de bens e serviços destinados para uma população externa, formando, assim, a organização de um sistema hierárquico de cidades. Com isso “a centralidade de um núcleo, por outro lado, refere-se ao seu grau de importância a partir de suas funções centrais: maior o número delas, maior a sua região de influência, maior a população externa atendida pela localidade central, e maior a sua centralidade” (CORRÊA, 1989a, p. 21). Com esses modelos de Christaller foi possível o desenvolvimento teórico a respeito das configurações espaciais da rede urbana em geral e não apenas da rede de lugares centrais. Esses estudos se originaram através dos questionamentos “[...] a respeito do número, tamanho e distribuição das cidades, procurando compreender a natureza da rede, a teoria das localidades centrais” (RODRIGUES; SILVA, 2007, p. 59). Ou seja, cidade como Elísio Medrado sofre influência de centros maiores como Amargosa, Santo Antônio de Jesus, entre outros. Sendo que sua população se desloca em busca de bens e serviços que o município de Elísio Medrado não oferece, ou até mesmo para abastecer o mercado local que, por sua vez, dentro de uma hierarquia urbana exercem influência nos povoados rurais. Esse sistema hierárquico da rede forma “uma região homogênea e desenvolvida economicamente, havendo, portanto, uma hierarquia caracterizada de níveis estratificados de localidades centrais, nos quais os centros de mesmo nível hierárquico [...]” (RODRIGUES; SILVA, 2007, p. 60) atuam de maneira semelhante no que diz respeito à oferta de bens e serviços, tamanho da área de atuação e o número populacional. Fresca (2009, p. 44) coloca que a rede urbana apresenta uma diversidade de centros urbanos que vão desde aqueles com nível de centralidade muito fraco e cuja área de influência é bastante reduzida com alguns municípios em seu entorno, até aqueles com nível forte, muito forte ou máximo, dependendo da escala de análise e da complexidade da rede urbana em estudo. 22 Nessa perspectiva o município em estudo (Elísio Medrado) pode ser considerado como área de influência bastante reduzida, visto que o processo de produção, circulação e consumo é baixo se comparado a outras cidades da região. É importante ressaltar que num processo de globalização e consequentemente da modernização da produção, centros com influências reduzidas “estão à espera de terem suas potencialidades valorizadas pela incidência de outros processos, que gerarão outras singularidades” (FRESCA, 2009, p. 45). Na discussão feita por Corrêa (1989a, p. 21) sobre a teoria de Christaller, ele coloca que a rede urbana tem um alcance espacial máximo, este é referente à área determinada por um raio a partir da localidade central que faz com que os consumidores se desloquem para essa localidade central com o objetivo de obter bens e serviços, já no alcance espacial mínimo são englobados “[...] o número mínimo de consumidores que são suficientes para que uma atividade comercial ou de serviços, uma função central, possa economicamente se instalar” (CORRÊA, 1989a, p. 21). No alcance espacial mínimo são ofertados produtos e serviços que são consumidos quase que diariamente pela população local, nesse caso entram os produtos de primeira necessidade como os produtos alimentícios, higiênicos, entre outros. É o que se percebe no comércio de Elísio Medrado, visto que são vendidos em sua maioria produtos de primeira necessidade, pois para o consumidor dificultaria sua saída quase que diariamente para outros centros urbanos. Já produtos como eletrodomésticos são oferecidos em pequena quantidade, sem opção de escolha e geralmente com preços elevados, isso faz com que a população se desloque para centros como Santo Antônio de Jesus que oferece mais opções de escolha e preços mais baixos. No conceito de Christaller, discutido por Corrêa (1989a, p. 21-32), pode ser considerado que quanto maior for o nível hierárquico que uma cidade alcança, maior são as opções de bens e serviços oferecidos aos consumidores, sejam de mínimo ou máximo alcance. Já para Santos (1989, p. 152), nos países subdesenvolvidos as redes têm pouco desenvolvimento, onde “observa-se que asredes lineares ou em espinha de peixe ocorrem com freqüência, enquanto que as transversais são bastante raras [...]” (SANTOS, 1989, p. 152). Contudo, com as melhorias nos meios de transporte e telecomunicações o tempo e a distância entre os centros têm diminuído consideravelmente, revelando assim, mudanças significativas na rede urbana. Embora com toda essa evolução tecnológica permitindo diversas relações virtuais, por outro lado ainda existem necessidades básicas como 23 serviço de saúde, educação, serviços especializados para o campo em muitas localidades brasileiras; demonstrando com isso que há uma hierarquia presente, sendo que os pequenos núcleos são dominados por uma cidade mais equipada. Vale lembrar que as atividades de comércio e de serviços são processos sociais que contribuem para a produção do espaço urbano definido por Corrêa (1989b, p. 9) como “[...] fragmentado e articulado, reflexo e condicionante social, um conjunto de símbolos e campo de lutas. É assim a própria sociedade em uma de suas dimensões, aquela mais aparente, materializada nas formas espaciais.” Assim sendo, o espaço urbano é formado de símbolos que variam de acordo com a cultura da sociedade, período da história, faixa etária da população, atividades econômicas desenvolvidas entre outras. Não existe um conceito de cidade que abranja “[...] as diferentes origens, formas, funções e estruturas resultantes do trabalho da sociedade acumulado ao longo do tempo nos distintos espaços urbanos da superfície terrestre” (RODRIGUES; SILVA, 2007, p. 50). Pois toda cidade tem seu dinamismo próprio e sofre mutações ao longo do processo histórico, bem como a própria sociedade que elas abrigam e que a produzem. Por isso, analisar o espaço urbano a partir da instalação das redes “pressupõe a necessidade de organização e ordenamento de determinado espaço visando atender a fins e interesses específicos, sejam eles engendrados por agentes econômicos, políticos ou sociais” (RODRIGUES; SILVA, 2007, p. 50). As inovações fizeram com que as sociedades estejam cada vez mais interligadas formando as redes. “Com a ferrovia, a rodovia, a telegrafia, a telefonia e finalmente a teleinformática, a redução do lapso do tempo permitiu instalar uma ponte entre lugares distantes: doravante eles serão virtualmente aproximados” (DIAS, 1995, p. 141). Todas essas inovações facilitaram a circulação de mercadorias, pessoas e informações e consequentemente interligando os lugares de forma hierárquica. Assim, a organização do espaço em redes tem como função principal facilitar a comunicação e a circulação de bens e pessoas entre um lugar e outro do espaço, isso é possível observar em todas as escalas de análise, desde o local ao global. É através dessas funções, interligadas entre as cidades, como comércio, bancos, indústrias, serviços, transportes, armazenagem, educação, saúde, que a rede urbana é uma condição para a divisão territorial do trabalho. “É via rede urbana que o mundo pode tornar-se simultânea e desigualmente dividido e integrado” (CORRÊA, 1989a, p. 49-50). Nesse contexto global observa-se que é através das metrópoles que são tomadas as decisões, são feitos os maiores investimentos e inovações, criando desta forma 24 constantes desigualdades. Portanto “[...] a rede urbana dos países subdesenvolvidos constitui- se, em parte, na extensão de uma ampla rede urbana com sede nos denominados países centrais, em metrópoles mundiais como New York, Londres, Tóquio e Paris” (CORRÊA, 1989a, p. 50). Sendo assim o Brasil dentro de uma escala global se situa na base periférica da hierarquia. Mas vale lembrar que diante das múltiplas realidades brasileiras, onde a materialização do meio técnico científico se faz apresentar com maior ou menor intensidade, é necessário enfatizar que a análise geográfica varia de lugar para lugar, de acordo com sua realidade sócio-econômica e política, sendo que existem cidades estagnadas e outras com dinamismo muito grande dependendo de vários fatores sócio-econômicos. Outro aspecto a ser considerado, refere-se à distribuição de bens, serviços e infra-estruturas que ainda são precárias ao se afastar dos centros maiores, distanciando em quantidade e qualidade as funções desempenhadas. Com isso esses núcleos distantes dos centros maiores ficam estagnados tendo remotas chances de desenvolvimento. Mas vale lembrar que esses pequenos núcleos desempenham um papel importante dentro da rede urbana, sejam como consumidores dos produtos oriundos dos centros maiores, seja como fornecedores de matéria prima e até mesmo mão-de-obra barata. No ítem a seguir, será feita uma discussão sobre pequenas cidades mostrando os vários conceitos existentes, sua importância dentro da rede urbana bem como os problemas existentes. Visto que esse trabalho tem como lugar de estudo o município de Elísio Medrado, que dentro dos argumentos discutidos por autores como Milton Santos e Roberto Lobato Corrêa o espaço urbano deste município apresenta características de uma pequena cidade. 2.2 PEQUENAS CIDADES: POR QUE ESTUDÁ-LAS? Na década de 1970, com o êxodo rural, muitas pequenas cidades tiveram sua população em declívio, pois grande parte desses municípios tinham maior parte da população concentrada no campo. Posteriormente, o declínio populacional no campo foi esvaziando, também os numerosos e pequenos núcleos urbanos sob o aspecto funcional, promovendo uma outra mobilidade oriunda das pequenas cidades 25 estagnadas em direção, sobretudo, a centros maiores (ENDLICH, 2006, p. 24). Com isso, percebe-se que uma cidade por menor que seja, ela estará sempre articulada em uma rede hierárquica, onde a população está sempre em constante movimento buscando sempre melhores condições de vida. É comum a presença de vários problemas nas grandes cidades brasileiras, aquelas que estão no topo da rede urbana, que no processo migratório regional são as mais procuradas, onde essa população que se desloca enfrenta problemas como: pobreza, violência, poluição, desemprego, entre outros. No entanto, vale lembrar que as pequenas cidades apresentam outros tantos problemas como: falta de hospitais, universidades, transportes, entre outros. Outro tipo de migrante responsável, em parte, pelo “crescimento demográfico dos centros urbanos intermediários compõem-se de fluxos humanos, hora procedentes de cidades maiores, constituindo um contingente em busca de tranqüilidade e qualidade de vida” (ENDLICH, 2006, p. 29). Esses são disputados, várias são as ofertas de serviços e habitação. Já o grupo procedente de pequenas cidades é rejeitado pela população local, pois não tem alto poder aquisitivo. Pelo contrário, necessitam de ajuda financeira do Estado para ter as mínimas condições de vida. Porém, é essa população rejeitada que vai suprir as necessidades de falta de mão-de-obra não especializada, como faxineira e serviços ligados a construção civil. Se por um lado essa população oriunda de pequenas cidades traz incômodo para a população urbana já estabelecida nos centros médios e grandes, é ela que compõe grande parte dos trabalhadores da construção civil, serviços gerais, entre outros. Grande parte das pequenas cidades brasileiras tem a atividade agrícola formada por pequenas propriedades, tendo como mão-de-obra a própria família. Com a mecanização, principalmente na Região Sul, o pequeno produtor deixa de ter importância no cenário agrário brasileiro. Esse fenômeno causa a decadência dessas cidades, sendo que não possui outras atividades econômicas para incentivar os moradores a permanecerem no próprio município, tornando assim geradores de mão-de-obra não especializada para as médias e grandes cidades. Como não existem centros educacionais como faculdades e universidades e mesmo cursos técnicos, essa populaçãodas pequenas cidades não tem condições mínimas de se especializarem em determinada área, restando apenas ficar no campo produzindo para vender seus produtos, a preços irrisórios, para atravessadores ou na feira livre do próprio 26 município. Outra opção para essa população é migrar para centros urbanos maiores em busca de um serviço braçal. Por isso não contemplar as pequenas cidades é esquecer uma parte da realidade urbana. Não se deixa apenas de estudar uma parte concreta da espacialidade brasileira, como também essa falta de estudo compromete uma compreensão mais ampla da rede urbana, até mesmo das questões tratadas num domínio dos centros urbanos maiores, bem como das possibilidades de intervenção (ENDLICH, 2006, p. 31). Assim sendo, o município em estudo enfrenta os mesmos problemas de outros pequenos núcleos brasileiros, ou seja, a falta de infra-estrutura, emprego, entre outros. 2.2.1 Breve Considerações Sobre a Urbanização Brasileira e Pequenas Cidades Por volta do século XVI, o processo de urbanização teve início com as primeiras aglomerações próximo ao litoral, que tinha como principal função a ligação entre a Metrópole e a Colônia (ASSUNÇÃO; MELO; SOARES, 2010, p. 2). No decorrer da história econômica da sociedade brasileira, novos povoamentos foram surgindo em outras áreas do território, impulsionando a urbanização de outras localidades. Mas vale lembrar que esses novos povoamentos surgiram, em grande parte, em decorrência de ciclos econômicos cujo objetivo esteve sempre voltado para o mercado externo. Dentro desta sucessão de ciclos se destacam os engenhos de cana-de-açúcar, tendo como mão-de-obra o escravo que desencadearam vários povoados. Com a abolição da escravatura entraram em decadência. É importante ressaltar que esses agentes sociais dominantes – os fazendeiros – tiveram importância considerável na formação de núcleos urbanos no período colonial. Como coloca Deffontaines (apud ASSUNÇÃO; MELO; SOARES, 2010, p. 3) pela iniciativa de um fazendeiro ou um grupo de fazendeiros vizinhos que faz doação do território, ele o constitui em patrimônio, patrimônio oferecido à igreja ou antes a um santo, ao qual será dedicado o novo núcleo e do qual ele levará o nome. 27 Esses patrimônios tiveram seu ponto de partida para se tornarem cidades com o passar dos anos. Além disso, destaca-se nesse período a formação de núcleos nos caminhos das tropas pela constituição de ponto de pouso que, com o passar do tempo, foram transformando-se em cidades. Com o desenvolvimento industrial do século XX, o processo de urbanização tornou-se mais complexo, compondo-se de novos agentes, conteúdos e articulação de forma mais complexa. A implantação das ferrovias e outros incrementos na infra-estrutura foram de grande importância para o desenvolvimento industrial e consequentemente à formação de muitas cidades, pois as mesmas possibilitavam uma maior articulação entre outros povoados ou cidades da região em que estas ferrovias interligavam. Apesar de todo este dinamismo e surgimento de várias cidades no decorrer dos ciclos do “ouro, cana-de-açúcar, café, entre outros”, até meados do século XX, “o Brasil ainda contava com a maior parte de sua população residindo no meio rural” (ASSUNÇÃO; MELO; SOARES, 2010, p. 4). Após a segunda metade do século XX, a população rural começou a deixar o campo e “as cidades, sobretudo, aquelas onde havia algum tipo de desenvolvimento industrial, passaram a crescer imensamente” (ASSUNÇÃO; MELO; SOARES, 2010, p. 4). Esse crescimento trouxe, consequentemente, vários problemas sociais nas grandes e médias cidades e no outro extremo, encontram-se, em maior número, as pequenas cidades que estagnaram ou entraram em decadência. Elas estão inseridas [...] em graus menores na economia globalizada, atendendo as necessidades primárias da sua população, com ou sem crescimento demográfico; outras enfrentam sérios problemas para reter sua população, sobretudo, as pessoas jovens, e acabam tendo fortes dependências de transferência de verbas públicas (MELO apud ASSUNÇÃO; MELO; SOARES, 2010, p. 5). Dentro desta perspectiva faz-se necessário o estudo sobre as pequenas cidades, para entender-se o processo da urbanização brasileira. 28 2.2.2 Pequenas Cidades: Seu Papel na Rede Urbana Na discussão sobre pequena cidade e o seu papel na rede urbana brasileira, é preciso entender o que é considerado uma pequena cidade. Muitos autores usam denominações diferentes: Milton Santos (1982) usa o termo cidade local, já Corrêa (1989a) prefere chamar de pequeno núcleo. Por isso, alguns estudos sobre o conceito de pequena cidade podem variar. Segundo Ferreira (2010, p. 2), o IBGE estabelece como critério o número de habitantes, sendo que até 100 mil habitantes, pequena cidade, de 100 mil a 500 mil, cidade média, acima de 500 mil, cidade grande. Ainda segundo a autora (2010, p. 1), o IBGE diz que das 5.507 cidades brasileiras, 4.646 estavam na categoria pequena e tinham com menos de 100 mil habitantes. Com essa predominância, é importante que em um estudo se tenha a compreensão do papel das pequenas cidades, dentro da rede local, regional e até mesmo nacional. Percebe-se com esses dados do IBGE que no Brasil há cidades com idade, tamanho, contexto e formações diferentes. Porém a maioria é pequena cidade. Já os pequenos municípios brasileiros ocupam grandes extensões do território, embora não contenham grande proporção da população. “Quase sempre compõem áreas pouco densas, o que oferece condições para que constituam cidades confortáveis à vida das populações” (MOURA, 2009, p. 18). Segundo a contagem da população, feita pelo IBGE em 2007, dos 5.565 municípios brasileiros, 78% têm menos que 25 mil habitantes, ocupando uma área de 59,9% e abriga apenas 22,3% da população (MOURA, 2009, p. 18). Sobre estes dados Moura (2009, p. 35) esclarece que os dados analisados demonstraram que os pequenos municípios constituem uma parcela significativa do território nacional e estadual voltada à produção agropecuária, que abrigam elevado contingente da população, e que têm importante papel na inserção do País e do Estado na divisão social do trabalho. Mas para a pesquisadora é importante tomar alguns cuidados para não cair na generalização, pois o Brasil tem uma grande extensão territorial com formações culturais, econômicas e sociais distintas e uma cidade com poucos habitantes pode ter uma dinâmica maior que outra com mais habitantes. 29 É claro que se uma cidade tem um bom dinamismo certamente atrairá mais habitantes. Como mostra Corrêa (1989a, p. 15) “[...] o tamanho das cidades aparece então como uma expressão do desenvolvimento”. Ou seja, segundo o autor, se uma cidade tem poucos habitantes é porque tem pouco desenvolvimento. Mas vale frisar que Elísio Medrado, cidade em estudo deste trabalho, se comparada com outra com o número de habitantes semelhante, localizada no Sul do Brasil, certamente as cidades do Sul têm um melhor desenvolvimento econômico e tecnológico. Milton Santos afirma que a pequena cidade é cidade local com “[...] aglomeração capaz de responder às necessidades vitais mínimas, reais ou criadas de toda uma população, função esta que implica uma vida de relações” (SANTOS, 1982, p. 71). Ainda refletindo sobre as pequenas cidades, (SANTOS, 1981, p. 15) afirma que “as estatísticas internacionais estabelecem um marco de 20.000 habitantes para esse tipo de cidade [...]”. “Só a partir de um certo estágio de desenvolvimento e dinamismo é que a cidade se define” (SANTOS, 1981, p. 15). Nesse contexto o autor deixa claro que além do número de habitantes é preciso compreender o dinamismo que a cidade tem dentro de uma rede urbana. Para Santos (1981, p. 15), a cidadezinha constituia célula-máter que atende às necessidades de uma população; tais necessidades variam em função da densidade demográfica, das comunicações e da economia da região, bem como do comportamento sócio-econômico de seus habitantes. Porém, cada pequena cidade se constitui um caso específico, levando sempre em consideração sua função principal, seja na área de serviços, agricultura, pecuária, entre outros. Milton Santos (1982, p. 71) define as pequenas cidades como cidades locais que para ele “é a dimensão mínima a partir da qual as aglomerações deixam de servir às necessidades inadiáveis da população com verdadeira <<especialização do espaço>>”. Com isso, Milton Santos usa a denominação de cidade local, para não cair na classificação de pequena cidade que utilizam número populacional, e para ele seria “[...] incorrer no perigo de uma generalização perigosa”. (SANTOS, 1982, p. 69). Com isso, percebe-se que não há um consenso na definição de pequenas cidades, mas considerando os argumentos estudados, pode-se identificar como pequena cidade aquela que tem baixo estágio de desenvolvimento, com baixo dinamismo social, 30 econômico e cultural. Geralmente essas cidades são pacatas, com alguns comércios e serviços locais capaz apenas de oferecer tão somente condições mínimas vitais para seus habitantes. Mas é importante ressaltar que, com a globalização, essas cidades pacatas estão deixando de existir, pois cada vez mais a poluição, violência, fome vão se alastrando nos pequenos núcleos urbanos do interior. Para Santos (1982, p. 74), “a cidade local facilita o acesso da população aos bens e serviços, embora isto se faça a um preço mais elevado que nos centros de nível superior”. Ela vai estar sempre na periferia da rede urbana, com isso os habitantes estarão sempre tendo problemas tanto como produtor, como consumidor, pois seus produtos são vendidos a preços irrisórios e os que não são produzidos no município são comercializados com altos preços. Corrêa (1989a, p. 59) afirma que “o atacadista coletor, da pequena cidade encravada em plena zona rural, tem uma margem de lucro ao vender a produção ao atacadista reexpedidor ou a uma usina de beneficiamento localizada em uma cidade regional.” Com isso, os produtores destas cidades vendem seus produtos para os intermediários, estes asseguram uma parte do lucro da produção e o produtor que tem as despesas para produzir, além da mão- de-obra, não consegue um preço justo. Sendo assim, o lucro fica para os intermediários e industriais. Nessa cadeia de comercialização os pequenos núcleos pagam preços elevados pelos produtos industrializados e recebem preços baixos pelos produtos cultivados. Com isso “as cidades locais desempenham um importante papel junto às zonas de produção primária, às quais permitem um consumo mais próximo daquele do resto da população do país, provocando, como feedback, a expansão da economia urbana”. (SANTOS, 1982, p. 74). São as pequenas cidades que fazem articulação entre a população rural e as outras cidades mais desenvolvidas, permitindo o acesso desta população a outros bens e serviços, além da comercialização dos produtos do campo, mesmo conseguindo apenas preços irrisórios. A cidade, por menor que seja, desempenha um papel importante dentro de um espaço, mesmo que seja como consumidora ou criadora de mão-de-obra não especializada e até mesmo como produtora de alimento para consumo interno do país. Mesmo para toda cidade que tenha sua gênese num pequeno núcleo, que se estagnou, entrou em decadência ou evoluiu até tornar-se uma metrópole. Daí a importância de se entender a pequena cidade e reconstruir a sua história. Dentro desse contexto histórico é possível entender porque há cidades centenárias menos dinâmicas que outras com algumas décadas de emancipação, mas mesmo 31 com pouco dinamismo, em alguns dias da semana a cidade passa a ser centro de encontro e comércio, como as feiras que acontecem semanalmente em muitas pequenas cidades. Como afirma Corrêa (1989a, p. 35), alguns “[...] núcleos de povoamento, pequenos, via de regra semi-rurais [...]” de uma a duas vezes por semana transformam-se em centros comerciais, mas os demais dias voltam a ser pacato com a maioria da população voltada para a atividade primária. Nos dias de mercado o pequeno núcleo transforma-se em um centro de mercado. Vendedores dos mais variados produtos, artesões e prestadores de diversos serviços amanhecem no centro com suas mercadorias e instrumento de trabalho (CORRÊA, 1989a, p.35). Geralmente, essas pessoas, vendem seus produtos em várias cidades da região em dias alternados, outros vêm da zona rural, de onde vão ao comércio local vender seus produtos colhidos no campo e comprar outros bens que não produzem. Usa-se como meio de transporte animais como cavalo, burro, carroça ou transporte público como caminhão ou ônibus. Nesses centros de comércio das pequenas cidades “são ainda os dias em que as pessoas se encontram, sabem das novidades e vários eventos sociais, culturais e políticos se realizam” (CORRÊA, 1989a, p. 35). “[...] Mesmo pequenos núcleos organizam-se para a vivência coletiva e, ao seu modo, para a política e para a cidadania.” (MOURA, 2009, p. 17). Vale lembrar que, embora os pequenos municípios estejam em nível de subordinação, não significa que estão à margem desse processo hierárquico. Mas “os pequenos municípios têm uma dinâmica de crescimento bastante reduzida” (MOURA, 2009, p. 22). Muitos deles perdem população e não atraem novos moradores pela falta de atrativos. Somando a essa estagnação dos pequenos municípios, ocorreu “o processo de desmembramento de novos pequenos municípios” (MOURA, 2009, p. 24). Porém, característica comum nas pequenas cidades é ser receptora de indústrias rejeitadas nas cidades maiores. Como coloca Corrêa (1989a, p. 65) “as pequenas cidades, e às vezes o próprio campo, transformam-se em locais de implantações de indústrias poluentes que não podem, por força de interesses urbanos, permanecer na grande cidade”. Essas empresas se localizam em lugares pequenos e não desenvolvidos devido a pouca fiscalização das leis ambientais, além de encontrar mão-de-obra barata, o que constitui mais lucro para essas empresas. Partindo do ponto de vista de que toda cidade nasce pequena e que, qualquer que seja o núcleo urbano ela estará sempre interligada a uma rede urbana no mundo 32 globalizado, vale lembrar que “aos pequenos municípios é fundamental o apoio e fortalecimento das atividades existentes, como também o adensamento das cadeias produtivas” (MOURA, 2009, p. 36). Com isso, percebe-se a necessidade cada vez maior de planejamento voltado para esses pequenos núcleos. Alves et al (2008, p. 2) argumenta que mesmo diante da grande importância do planejamento urbano nas pequenas cidades, verifica-se que há uma maior dificuldade em realizar medidas públicas de organização do espaço, isso devido à falta de obrigatoriedade desse mecanismo para municípios com população inferior a 20 mil habitantes. Aliado a essa não obrigatoriedade está à falta de comprometimento dos políticos locais que, muitos deles têm baixa escolaridade, dificultando dessa forma a contratação de uma equipe preparada para fazer um bom planejamento urbano voltado à área ambiental e social, oferecendo uma melhor qualidade de vida aos seus habitantes. Com isso, é preciso entender que “a urbanização como processo, e a cidade, forma concretizada desse processo, marcam tão profundamente a civilização contemporânea, que é muitas vezes difícil pensar que em algum período da História as cidades não existiam, ou tiveram um papel insignificante” (SPOSITO, 1989, p. 11). Para entender a cidade pequena, sua organização espacial, é preciso voltar a origem do povoamento, descobrindo sua gênese, ainda que de forma sintética. Desta forma,o espaço concretizado em cidade é história e [...] nesta perspectiva, a cidade de hoje, é o resultado cumulativo de todas as outras cidades de antes, transformadas destruídas, reconstruídas, enfim produzidas pelas transformações sociais ocorridas através dos tempos, engendradas pelas relações que promovem estas transformações (SPOSITO, 1989, p. 11). Dessa forma, no decorrer desse trabalho serão descritos e analisados todos os acontecimentos julgados importantes, ocorridos no decorrer da história do município em estudo, para a partir daí compreender a dinâmica atual do município. Vale lembrar que como o município tem sua base rural é preferível estudar o município como um todo não separando o rural do urbano, pois “[...] a delimitação do urbano de muitos municípios é apenas uma lei que identifica um núcleo em um território ainda preso à base produtiva e ao modo de vida rural” (MOURA, 2009, p. 16). Sendo assim, “ toda a nossa história é a história de um povo agrícola, é a história de uma sociedade de lavradores e pastores. É no campo que se forma a 33 nossa raça e se elaboram as forças íntimas de nossa civilização” (OLIVEIRA VIANNA apud SANTOS, 2008a, p.19). 34 3 A HISTÓRIA DE ELÍSIO MEDRADO Esta reconstrução histórica é necessária dentro deste trabalho, pois através dela é possível compreender os signos existentes na espacialidade do município, signos que trazem um significado histórico e cultural de um passado mais remoto. É através da compreensão da história, que se torna possível compreender muitos fatos presentes na atualidade. Como argumenta Lins (2007, p. 34), que “[...] em uma perspectiva regional é necessário uma reconstrução histórica para entender traços do momento atual”. Oficialmente, a gênese de Elísio Medrado ocorre no início do século XX, nos primeiros anos de 1900, quando a cidade era chamada de Paraíso. No entanto, antes desse fato, já havia uma ocupação desse espaço. Primeiro por indígenas, depois no período da colonização no século XVI, por intermédio dos bandeirantes que penetravam à região. O mais conhecido foi Gabriel Soares, que construira “[...] uma fortaleza para se proteger dos ferozes índios Cariris e Sabujás que povoaram o território e para armazenar mantimentos, armas e munições” (ELÍSIO MEDRADO, [2009?], p. 22). Foi ainda no Brasil colonial que surgiu o primeiro povoado dentro do domínio do atual município de Elísio Medrado: onde hoje é o atual distrito do município denominado de Monte Cruzeiro (figura 1a), outrora foi chamado de Jibóia, chegando por duas vezes ser sede de município. Outro povoado que surgiu antes do povoado Paraíso foi São Francisco do Cajueiro (figura 1a), posteriormente Acaju e atualmente povoado de Souza Peixoto, este teve seu início do povoamento nas imediações da estação ferroviária da localidade. E, no início do século XX, formou-se outro povoado denominado de Paraíso (figura 1a), que hoje é a sede do município. 35 Figura 1a: Mapa com a localização dos povoados do município de Elísio Medrado. Fonte: IBGE (2009, p. 1). Adaptação: Eduardo de Oliveira, 2010. 3.1 SURGIMENTO DO POVOADO DE MONTE CRUZEIRO Fazer uma contextualização histórica do município em estudo faz-se necessário nessa abordagem sobre a dinâmica funcional, visto que é através de vários períodos da história que o espaço geográfico vai se concretizando e se transformando. Por isso, o momento passado está morto como ‘tempo’, não porém como ‘espaço’; o momento passado já não é nem voltará a ser, mas sua objetivação não equivale totalmente ao passado, uma vez que está sempre aqui e participa da vida atual como forma indispensável à realização social” (SANTOS, 1986, p. 10). Sendo assim, o tempo passado se foi, mas o espaço concretizado no passado continua no presente, cristalizado como objeto geográfico indispensável para o geógrafo entender o espaço atual. Elísio Medrado foi emancipado em 20 de julho de 1962, desmembrando-se de Santa Terezinha, com isso aparentemente é um núcleo recente, mas a sua gênese histórica é 36 bem mais antiga. A cidade fica a 224 km de Salvador. Essa distância da capital baiana demonstra que não fica tão distante dos primeiros núcleos fundados pelos portugueses. Esse fato facilitou a penetração dos aventureiros pelo interior, chegando às terras onde hoje fica o município de Elísio Medrado. A região era inicialmente habitada por indígenas Cariris e Sabujás, mas aventureiros bandeirantes, chefiados por Gabriel Soares de Souza, penetraram na região na segunda metade do século XVI com o objetivo de “[...] construir uma fortaleza na região para se proteger dos índios Cariris e Sabujás e para armazenar mantimentos e munições” (PEDREIRA apud SANTOS, 2003, p. 12). “O seu objetivo era localizar as minas descobertas por seu irmão de nome João, que lhe deixara roteiro delas” (SANTA TEREZINHA, 1958, p. 291). A fortaleza plantada por Gabriel Soares de Souza “[...] foi nas imediações da localidade de Pedra Branca” (SAMPAIO, [200-], p. 2). Vale lembrar que Pedra Branca é um povoado pertencente ao município de Santa Terezinha que faz limite ao atual município de Elísio Medrado. Pela proximidade da região pode-se concluir que Gabriel Soares de Souza e sua bandeira foram os primeiros brancos a pisarem na região. Com o crescimento populacional no Recôncavo Baiano surgiram muitos problemas, entre eles lutas com os indígenas, assassinatos e roubos. O rei de Portugal autorizou o Governador da província, Dom João de Lencastro que criasse vilas e povoados para que houvesse justiça para atender a população. Uma das vilas criadas foi a de Vila de Nossa Senhora do Rosário do Porto da Cachoeira fundada em 1698, “[...] que tinha por termo uma grande área que ia do Rio Subaúna ao Rio Inhambupe, cortando direto pela praia e daí até intestar com o Rio Real. Nessa área surgiu, 3 séculos e meio depois, o município de Elísio Medrado” (SAMPAIO, [200-], p. 2 ). Evidências mostram que o atual município de Elísio Medrado começou a ser povoado pelo lado norte, onde fica o atual município de Santa Terezinha. Sendo que ao leste estende-se a Serra do Guariru, hoje conhecida por Serra da Jibóia. Ali habitavam os povos indígenas que, segundo a literatura pesquisada, entraram em vários confrontos com os colonizadores dificultando a penetração em direção a Serra do Guariru. Como afirma Sampaio ([200-], p. 3), “a paz em que viviam foi interrompida quando a civilização foi adentrando, quando os colonos, já no primeiro século da colonização, sonhando com a existência de minas de ouro e de prata [...]”. Com isso, o leito do Rio Paraguaçu foi seguido para que os aventureiros alcançassem o sertão, evitando as densas matas da Serra do Guariru (atual serra da Jibóia). 37 Nessa região houveram diversas lutas entre colonos e indígenas, o rei de Portugal buscou solucionar o problema e os tranquilizar colocando os jesuítas para catequizar os indígenas da região. No ano de 1667 chega o primeiro jesuíta para assumir a missão e “o local escolhido para a implantação do Aldeamento foi o sopé da Serra do Guariru, local fértil, ameno, e onde, na ocasião se concentrava maior número de Índios que ali buscavam refúgio” (SAMPAIO, [200-], p. 5). Nesse aldeamento foram construídas igreja, escola, casas para os indígenas, para os padres, para o juiz de paz-diretor, para o comandante da guarda e para toda a tropa. Com essas informações é possível afirmar que o município de Elísio Medrado teve seu primeiro povoado com base nas missões religiosas e o local escolhido está nas proximidades do atual distrito de Elísio Medrado chamado de Monte Cruzeiro. “A apenas alguns quilômetros de Pedra Branca, bem ao pé da Serra, encontravam-se duas aldeias, a de Caranguejo e a da Jibóia também aos cuidados dos educadores” (SAMPAIO, [200-], p. 5).Jibóia foi o povoado que deu origem ao atual distrito de Monte Cruzeiro. Esses indígenas catequizados por jesuítas tornaram-se úteis ao ponto de servir como guarnecedores de estradas, além dos “fazendeiros e autoridades da região exploravam a mão-de-obra barata dos índios” (SAMPAIO, [200-], p. 5). Os jesuítas não aceitavam esse tipo de exploração feita aos povos indígenas e “os governantes passaram a perseguir os Jesuítas. A luta passa também a seguir nas povoações de Jibóia e Caranguejo” (SAMPAIO, [200-], p. 6). A partir de 1720 suas terras passaram a ser invadidas pelos colonos que buscavam cultivar cana-de-açúcar, fumo e criar gado e com a formação religiosa dos indígenas aos poucos eles foram ingressando na cultura dos colonos. Com a chegada dos negros para trabalhar na lavoura de cana-de-açúcar, a região foi sendo ocupada cada vez mais por fazendeiros que buscavam fixar-se nas terras férteis. Com os castigos severos dos fazendeiros muitos negros fugiram para o Aldeamento localizado ao pé da Serra da Jibóia. “A tradição revela ter havido na região conhecida por Palmeira, a pequena distância de Pedra Branca, um Quilombo, no futuro município de Elísio Medrado” (SAMPAIO, [200-], p. 7). Com isso no século XIX quase toda população da região de Monte Cruzeiro já era descendente de escravos ou indígenas. Nas imediações de Monte Cruzeiro, Distrito de Elísio Medrado, encontra-se a fazenda Estiva (figura 2) pertencendo atualmente ao proprietário Kamal Elílio Chaoul. Nela há evidências de escravidão no passado. Relatos de moradores da localidade e netos de 38 escravos afirmam que seus antepassados trabalhavam na fazenda e eram castigados severamente, muitos chegavam a ser mortos e sepultados no fundo da fazenda. Figura 2: Fazenda Estiva. Autor: Eduardo de Oliveira, 2010. O povoado de Jibóia, que atualmente pertence ao município de Elísio Medrado, conhecido atualmente como Monte Cruzeiro, devido ao seu desenvolvimento, no dia 17 de janeiro de 1834 passou a ser sede municipal, porém “Jibóia teve vida efêmera, pois através da Lei Provincial nº 07 de 02 de Maio de 1835, foi extinto, passando a ser anexado ao de Cachoeira” (SAMPAIO, [200-], p. 19). Porém continuava como Freguesia, que era “a principal divisão eclesiástica e abrangia várias Capelas, além do Vigário, várias autoridades constituídas, sendo a mais destacada o Juiz de Paz” (SAMPAIO, [200-], p. 20). Este povoado que pertence ao atual município de Elísio Medrado, em 03 de agosto de 1892 passou a ser sede do município de Tapera. No dia 05 de abril de 1893 ocorre a solenidade onde é “[...] empossado como seu Intendente o Cel. Ápio Vaz Medrado” (SAMPAIO, [200-], p. 37). A partir desta data a povoação que antes era chamada de Jibóia, passa a ser a sede do município de Tapera e em 1º de agosto de 1899 através da Lei estadual nº 321 passa a ser intitulado de Monte Cruzeiro. No ano de 1908 a freguesia de Monte Cruzeiro já se destacava entre as mais importantes do estado. Mas desde a data em que Tapera deixou de ser sede do município proporcionou fortes revoltas dos líderes políticos da povoação. “Não mais suportando a 39 humilhação, os líderes de Tapera lutam por retornar a sede para a sua povoação” (SAMPAIO, [200-], p. 42). Esses líderes políticos marcaram um encontro com Macionílio Souza, que era famoso líder político e chefe de jagunços no sertão da Bahia. No dia 02 de fevereiro de 1920, o Pe. Gustavo Adolfo Marinho das Neves, que era Presidente da Câmara de Monte Cruzeiro, além de ser senador do Estado, e dominava a política do município, celebrava a festa de Nossa Senhora de Brotas de Milagres, quando o povoado de Milagres é cercado pela tropa de jagunços sob o comando de Macionílio Souza (SAMPAIO, [200-], p. 43). “Macionílio se dirige ao Padre e lhe apresenta documento através do qual a sede do município deixará de ser Monte Cruzeiro (Jibóia), passando para o povoado de Tapera” (SAMPAIO, [200-], p. 43). Temendo sofrer violência por parte do chefe dos jagunços o padre não teve alternativa e assinou o documento. Com isso, no dia 29 de julho de 1921, Tapera passou a ser novamente sede do município. No Diário Oficial do Estado da Bahia, do ano de 1923 (apud SAMPAIO, [200-], p. 46), o município de Monte Cruzeiro é descrito como [...] Município, na sua maior extensão territorial, possuidor de um clima salubérrimo, cuja sede é a Vila de Tapera, admirável sanatório, onde rara e perfunctoriamente se registra um óbito, está situada entre os municípios de Amargosa, São Miguel e Castro Alves. Sua área se aproxima de 108 quilômetros de extensão, cujo terreno adapta-se, com ótimos resultados, à agricultura e à pecuária . Completa ainda que o município de Monte Cruzeiro, no ano de 1923, tinha cerca de 350 fazendas que se dedicavam à pecuária com a criação de gado bovino, suíno, caprino, ovino e eqüino, além da prática da agricultura que era destinada à cultura do fumo, mandioca, café, aipim, milho, feijão e cana-de-açúcar. A exportação de café, fumo em folha e em rolo, cereais, gado em geral, peles, couros, etc., é considerável. Existem vários curtumes e salgadeiras, aparelhos modernos para descascar café, destiladores, engenhocas para o fabrico de açúcar e raspadura, etc (O DIÁRIO OFICIAL DO ESTADO DA BAHIA apud SAMPAIO, [200-], p. 46). Com essas informações percebe-se que o município de Monte Cruzeiro era dominado por um poder religioso, porém o poder político sobressaia na tomada de decisões do município, beneficiando sempre um grupo de interessados, geralmente quem tinha maior poder aquisitivo. Nas entrevistas com os moradores do atual povoado de Monte Cruzeiro, hoje 40 pertencente ao município de Elísio Medrado, os entrevistados comentaram se lembrar quando a vila era sede de município com prefeitura, escolas e cartório funcionando na localidade. Hoje o povoado possui construções antigas, do início do século XX, e atuais (figuras 3 a 6) pequenos proprietários de terra, que cultivam principalmente a uva (figura 7) e alguns produzem vinhos de forma artesanal (figuras 8 e 9). Figuras 3 e 4: Casas antigas e novas - lado à lado. Autor: Eduardo de Oliveira, 2010. Figuras 5 e 6: Casas antigas e novas – lado à lado. Autor: Eduardo de Oliveira, 20010. 41 Figura 7: Plantação de uva. Autor: Eduardo de Oliveira, 2010. Figuras 8 e 9: Produção artesanal de vinho. Autor: Eduardo de Oliveira, 2010. No povoado ainda se encontra uma antiga igreja do século XIX (figuras 10 a 14), que segundo moradores foi tombada pelo Patrimônio Histórico da Bahia. É uma obra bem rudimentar, nas paredes foram usadas adobes2 na sua construção e se encontra bem deteriorada devido a má conservação. Percebe-se que ali se concentrava o poder religioso da região no século XIX. Moradores mais antigos relatam que havia várias fazendas com 2 Espécie de tijolos usados nas construções antigas da região, feito manualmente com barro amassado e depois exposto ao sol para secar. 42 engenho de cana-de-açúcar na região. Porém, muitas delas foram demolidas pelos atuais donos, restando apenas a fazenda Estiva situada nas proximidades do povoado. Nos levantamentos de campo, feitos através de observações nas construções, entrevistas, conclui-se que esse povoado pertencente ao atual município de Elísio Medrado é o mais antigo do município, sendo possível afirmar que a região foi colonizada pelo lado norte do município, onde predominavam as grandes fazendas com o cultivo da cana-de-açúcar e engenhos tendo como mão-de-obra a escravatura de negros e índios. Já na primeira metade do século XX predominavam as fazendas de café na região. Atualmente, com a decadência dessas fazendas, predominam os pequenos produtores que em grande parte
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