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Antropologia Filosófica e Sociológica

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AntropologiA FilosóFicA 
e sociológicA
2012
Prof. Arnildo Pommer
Copyright © UNIASSELVI 2012
Elaboração:
Prof. Arnildo Pommer
Revisão, Diagramação e Produção:
Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI
Ficha catalográfica elaborada na fonte pela Biblioteca Dante Alighieri 
UNIASSELVI – Indaial.
 301.81
 P787aPommer, Arildo
 Antropologia filosófica e sociológica / Arildo Pommer. Indaial : 
 Uniasselvi, 2012.
 
 256 p. : il
 
 ISBN 978-85-7830- 640-3
 1. Antropologia - Civilização. 2. Antropologia - Filosofia – 
 Sociologia.
 I. Centro Universitário Leonardo da Vinci.
 
III
ApresentAção
Antropologia Filosófica e Sociológica, no contexto cientificista 
contemporâneo, é uma disciplina preparada especialmente para que 
você tenha uma compreensão introdutória deste vasto campo da reflexão 
contemporânea: o que é o humano. Ou seja, o que é o anthropos, de um ponto 
de vista filosófico e sociológico. 
Eu não pretendo afirmar de modo categórico que o anthropos (o ser 
humano de modo genérico) seja isto ou aquilo, pois aquele que tem uma 
pretensão destas pode cometer os erros mais elementares e expressar meras 
opiniões sem qualquer sustentação filosófica ou científica. O que eu pretendo 
é apenas, a partir de uma ampla bibliografia adequada, sugerir roteiros de 
estudo mais específicos, razão pela qual, desde a introdução do Tópico 1, 
convido você, caro(a) acadêmico(a) a realizar uma viagem, uma excursão, 
para a descoberta do país do anthropos.
Escrevo na primeira pessoa do singular por três motivos: 1) porque 
sou um indivíduo real, existente e me dirijo a você que também é uma pessoal 
real, existente e, portanto não somos nem eu e nem você um “nós” sem 
identidade; 2) porque assumo a responsabilidade pela autoria dos acertos 
e dos eventuais erros dos textos apresentados neste Caderno de Estudos; 
3) porque faço alguns comentários de autoria própria e, consequentemente, 
assumo as possibilidades de método e de crítica que eles implicam. Mas 
método e crítica em sentido estrito, isto é, a partir de pressupostos já 
consagrados na tradição do pensamento ocidental como, por exemplo, na 
definição da própria palavra crítica.
A palavra crítica é muito utilizada no senso comum e em trabalhos 
acadêmicos. Mas, quase sempre como se significasse falar bem ou mal de 
algum feito, fato ou pessoa, porém, isso é apenas a manifestação de uma 
opinião sobre algo ou alguém, podendo ser uma opinião perversa ou 
inocente, porém quase sempre no interior de um discurso cujo escopo é a 
retórica de convencimento. A palavra crítica é originária da língua grega e 
indica a capacidade de discernir, separar, decidir e julgar. Na sua etimologia, 
também se encontra a origem da expressão crise que significa ato ou fato em 
julgamento, em avaliação radical.
 
No senso comum, que é o conhecimento prático do dia a dia, o termo 
crise é utilizado, no entanto, para expressar que os negócios ou os casamentos 
vão mal, mas eu a utilizo em sentido mais próximo de sua origem etimológica: 
superar uma crise é criticar, é perguntar pelas causas de um determinado 
problema e não apenas falar bem ou mal de suas consequências.
IV
Assim sendo, criticar é alcançar qualquer assunto pela sua raiz, separá-
lo em partes, analisá-lo, julgá-lo a partir de um critério racional e publicamente 
justificável quando se trata de questões políticas e de pessoas, ou através de 
método pertinente quando se trata de questões filosóficas ou científicas. 
O método, porém, não dispensa a necessidade de demonstração e de 
justificação. Jamais se faz crítica apenas com opiniões. Jamais um problema 
é superado apenas com retóricas de convencimento. E este é o suposto deste 
meu texto: buscar no desvelamento do que se oculta por detrás do uso de 
alguns métodos de investigação científicos ou filosóficos, por intermédio de 
argumentos racionais publicamente justificáveis. Ou seja, de argumentos 
que possam ser justificados diante de outras racionalidades, aquilo que se 
apresenta como verdadeiro. Porém, não pretendo afirmar nada como certo e 
verdadeiro a priori, isto é, por antecipação ou preconceito. 
Mesmo assim, quem escreve ou fala corre riscos, porque uma 
justificação meramente operativa de pouco serve. Uma eventual justificação 
meramente operativa apenas indica um modo de operar, de intervir no mundo 
e por isso subverte ou esconde o principal: a transcendência do anthropos. 
Transcendência não quer dizer que nossas ações, ideais, anseios ou atividades 
estejam a ocorrer fora do tempo (história) e fora do espaço (lugar), mas que o 
anthropos é mais do que um ser (algo que existe) que trabalha, estuda, reproduz, 
come, dorme e excreta ou algo que possa ter uma essência qualquer.
O problema está em saber o que seja este algo mais, sem cair na 
tentação de aludir ao que se chama de essência do humano. Também não se 
trata de uma perspectiva escatológica, isto é, de um tratado dos fins últimos 
do anthropos. Trata-se tão somente de deixar registrado que tanto de um 
ponto de vista biopsíquico, quanto cultural e social o anthropos tem uma vida, 
cujo valor não pode ser negligenciado por nenhum sistema econômico ou 
administrativo.
A contingência do existir, num mundo, no qual facilmente os 
sistemas são privilegiados em detrimento da vida não pode ofuscar o nosso 
discernimento. Os sistemas precisam funcionar, é claro. Imagine o sistema 
de distribuição de energia elétrica entrar em colapso, por exemplo. A maioria 
das pessoas diria que o fim do mundo estaria próximo. Mas o funcionamento 
dos sistemas, de todos eles, não pode se sobrepor ao anthropos, não pode se 
sobrepor ao político, que é a forma como os muitos seres humanos cuidam 
da própria vida e da vida dos outros. 
Não se trata apenas de que a vida humana seja mais complexa do 
que o mais complexo dos sistemas, isso é retórica, discurso falacioso. A vida 
tem valor em si, não havendo, portanto, um sistema ou uma hierarquia de 
valores capaz de determinar o seu valor de fora para dentro. Isto é, nenhuma 
taxionomia é válida para quantificar ou qualificar o valor da vida humana 
num eventual sistema de classificações.
V
O cientificismo contemporâneo tende exageradamente a criar 
modelos classificatórios e valorativos, a partir de uma taxionomia necessária 
ao mundo das coisas, mas não ao mundo humano de um ponto de vista 
econômico, social e cultural. O que não se pode imaginar é a aplicação de 
modelos classificatórios de valor para determinar o valor da vida humana. 
No entanto, todos os dias nós lemos, vemos e ouvimos mais ou menos o 
seguinte: as classes sociais A, B, C, D, E formam uma pirâmide social 
injusta, com a predominância das classes A e B sobre as demais, as que 
constituem a maioria, a base da pirâmide. Ou seja, o valor da vida do 
anthropos foi transformado em valores numéricos quantificáveis, tendo como 
parâmetro de mensuração, de ser medido, a sua renda ou o que ele pode 
comprar e, principalmente, pagar. 
Daí se conclui que a pirâmide social é injusta. O que pretendo mostrar 
nesta disciplina, a partir de sua ementa (que é o seu programa básico), é como 
o ocultamento do valor da vida pode decorrer de métodos e modelos de 
investigação filosóficos e científicos comprometidos com taxionomias, com 
modelos classificatórios, transportados do mundo das coisas para o mundo 
da vida humana, causando a sua alienação à ideologia dominante em voga 
num determinado momento histórico.
Por último, quero destacar que pretendo utilizar uma linguagem 
acessível, mas quando isto não for possível, apresentarei sinônimos e 
exemplos. Espero que a leitura não fique truncada, mas considerando que os 
termos técnicos precisam ser esclarecidos farei algumas notas, semprecom 
a finalidade de facilitar a sua compreensão. Mesmo assim, se ainda houver 
dificuldade com alguns termos, sugiro o recurso dos dicionários. Eles são 
ótimos, aliás, não se pode escrever profissionalmente sem estar munido de 
bons dicionários. 
Prof. Arnildo Pommer
VI
Você já me conhece das outras disciplinas? Não? É calouro? Enfim, tanto para 
você que está chegando agora à UNIASSELVI quanto para você que já é veterano, há 
novidades em nosso material.
Na Educação a Distância, o livro impresso, entregue a todos os acadêmicos desde 2005, é 
o material base da disciplina. A partir de 2017, nossos livros estão de visual novo, com um 
formato mais prático, que cabe na bolsa e facilita a leitura. 
O conteúdo continua na íntegra, mas a estrutura interna foi aperfeiçoada com nova 
diagramação no texto, aproveitando ao máximo o espaço da página, o que também 
contribui para diminuir a extração de árvores para produção de folhas de papel, por exemplo.
Assim, a UNIASSELVI, preocupando-se com o impacto de nossas ações sobre o ambiente, 
apresenta também este livro no formato digital. Assim, você, acadêmico, tem a possibilidade 
de estudá-lo com versatilidade nas telas do celular, tablet ou computador. 
 
Eu mesmo, UNI, ganhei um novo layout, você me verá frequentemente e surgirei para 
apresentar dicas de vídeos e outras fontes de conhecimento que complementam o assunto 
em questão. 
Todos esses ajustes foram pensados a partir de relatos que recebemos nas pesquisas 
institucionais sobre os materiais impressos, para que você, nossa maior prioridade, possa 
continuar seus estudos com um material de qualidade.
Aproveito o momento para convidá-lo para um bate-papo sobre o Exame Nacional de 
Desempenho de Estudantes – ENADE. 
 
Bons estudos!
NOTA
VII
VIII
IX
UNIDADE 1 – É POSSÍVEL ENTENDER O SER HUMANO? ..................................................... 1
TÓPICO 1 – ANTROPOLOGIA: DEFINIÇÃO PRELIMINAR DOS TERMOS........................ 3
1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................................... 3
2 ANTROPOLOGIA FILOSÓFICA .................................................................................................... 4
3 ANTROPOLOGIA CIENTÍFICA ..................................................................................................... 8
4 ANTROPOLOGIA SOCIOLÓGICA ............................................................................................... 9
5 ANTROPOLOGIA CULTURAL ......................................................................................................12
6 A CIÊNCIA E O CIENTIFICISMO ..................................................................................................14
RESUMO DO TÓPICO 1......................................................................................................................19
AUTOATIVIDADE ...............................................................................................................................20
TÓPICO 2 – EXISTE UMA NATUREZA HUMANA? ....................................................................21
1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................21
2 EXPLICAÇÃO RELIGIOSA ..............................................................................................................22
3 EXPLICAÇÃO FILOSÓFICA ............................................................................................................29
4 EXPLICAÇÃO DA SOCIOLOGIA ..................................................................................................34
5 EXPLICAÇÃO CIENTÍFICA ............................................................................................................36
RESUMO DO TÓPICO 2......................................................................................................................41
AUTOATIVIDADE ...............................................................................................................................42
TÓPICO 3 – AS DIVERSAS IDADES DO HOMEM ......................................................................43
1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................43
2 DO NADA AO SER ............................................................................................................................44
3 O HOMEM NO MUNDO ANTIGO ...............................................................................................54
4 O HOMEM NO MUNDO MEDIEVAL ..........................................................................................64
5 O HOMEM MODERNO....................................................................................................................71
6 O HOMEM CONTEMPORÂNEO ...................................................................................................81
LEITURA COMPLEMENTAR .............................................................................................................84
RESUMO DO TÓPICO 3......................................................................................................................86
AUTOATIVIDADE ...............................................................................................................................88
UNIDADE 2 – O HOMEM ENQUANTO SUJEITO E OBJETO DE ESTUDO ..........................89
TÓPICO 1 – AS DIVERSAS ANTROPOLOGIAS...........................................................................91
1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................91
2 E NASCE A ANTROPOLOGIA CIENTÍFICA ..............................................................................93
3 OS OBJETOS E MÉTODOS DA ANTROPOLOGIA CIENTÍFICA .........................................101
4 OS OBJETOS E OS MÉTODOS DA ANTROPOLOGIA FILOSÓFICA .................................110
5 OS OBJETOS E OS MÉTODOS DA ANTROPOLOGIA SOCIAL ...........................................120
RESUMO DO TÓPICO 1......................................................................................................................127
AUTOATIVIDADE ...............................................................................................................................128
sumário
X
TÓPICO 2 – ANTROPOLOGIA CULTURAL ................................................................................. 129
1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................................. 129
2 PARA UM CONCEITO DE CULTURA ......................................................................................... 130
3 CARACTERÍSTICAS DA ANTROPOLOGIA CULTURAL ...................................................... 134
4 A PARTE E O TODO NA ANTROPOLOGIA CULTURAL ...................................................... 142
5 OS MITOS, AS LENDAS E AS ARTES ......................................................................................... 146
RESUMO DO TÓPICO 2..................................................................................................................... 153
AUTOATIVIDADE .............................................................................................................................. 154
TÓPICO 3 – O QUE O HOMEM É?................................................................................................... 155
1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................................. 155
2 TODO HOMEM É UM FILÓSOFO? .............................................................................................. 156
3 O HOMEMÉ UM SER CULTURAL? ............................................................................................. 158
4 O HOMEM É UM SER SOCIAL? ................................................................................................... 163
5 O HOMEM É UM SER BIOLÓGICO? ........................................................................................... 168
6 O HOMO FABER COMO EMBLEMA DO CONCEITO MODERNO DE HOMEM ............ 172
LEITURA COMPLEMENTAR ............................................................................................................ 181
RESUMO DO TÓPICO 3..................................................................................................................... 184
AUTOATIVIDADE .............................................................................................................................. 185
UNIDADE 3 – O SER SE DIZ DE VÁRIOS MODOS: O HUMANO TAMBÉM ..................... 187
TÓPICO 1 – OS MODOS DE SER DO HUMANO ........................................................................ 189
1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................................. 189
2 A ONTOLOGIA OU O ESTUDO DO SER (DAQUILO QUE EXISTE) .................................. 190
3 O SER ALMA OU PSYCHÊ ............................................................................................................. 198
4 O SER DO CORPO, DA RAZÃO E DA VONTADE ................................................................... 203
5 O SER DO LIVRE .............................................................................................................................. 211
6 O SER DO AMOR, DO BEM E DO MAL ..................................................................................... 215
RESUMO DO TÓPICO 1..................................................................................................................... 218
AUTOATIVIDADE .............................................................................................................................. 219
TÓPICO 2 – OS MODOS DE SER DO TEMPO HUMANO ........................................................ 221
1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................................. 221
2 O SER DO TEMPO ............................................................................................................................ 221
3 O SER DA FINITUDE ....................................................................................................................... 224
4 O SER DA MORTE ............................................................................................................................ 225
RESUMO DO TÓPICO 2..................................................................................................................... 229
AUTOATIVIDADE .............................................................................................................................. 230
TÓPICO 3 – O SER DO HOMEM DITO EM RELAÇÃO ............................................................. 231
1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................................. 231
2 A RELIGIOSIDADE .......................................................................................................................... 231
3 A NATUREZA ..................................................................................................................................... 238
4 A TÉCNICA E A TECNOLOGIA .................................................................................................... 240
5 AS FORMAS DE COMUNICAÇÃO CONTEMPORÂNEAS ................................................... 242
LEITURA COMPLEMENTAR ............................................................................................................ 245
RESUMO DO TÓPICO 3..................................................................................................................... 248
AUTOATIVIDADE .............................................................................................................................. 249
REFERÊNCIAS ...................................................................................................................................... 251
1
 
UNIDADE 1
É POSSÍVEL ENTENDER O SER 
HUMANO?
OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
PLANO DE ESTUDOS
A partir desta unidade, você será capaz de:
• entender os objetivos e conteúdos desta disciplina para, a partir deles, de-
senvolver a sua própria capacidade de compreender a si e aos outros no 
mundo;
• perceber identidades e diferenças com as quais convivemos enquanto se-
res humanos dotados de: razão, sentimentos, crenças e capacidade de agir 
individual e coletivamente;
• refletir sobre como filósofos, antropólogos e sociólogos pensam, trabalham 
e comunicam o resultado de seus pensamentos e trabalhos aos outros;
• descobrir que a atividade de todos nós, professores e estudantes, terá va-
lor (ético) somente se for desenvolvida com os outros e não apenas para os 
outros, ou ainda pior, contra os outros.
O Livro Didático desta disciplina está dividido em três unidades. Cada 
unidade está dividida em tópicos e cada tópico em itens, visando facilitar 
a separação dos assuntos. No final de cada tópico, você encontrará o seu 
respectivo resumo e autoatividade. Os resumos e as autoatividades têm a 
finalidade de ajudar a você a fixar os conhecimentos aqui expostos. Haverá, 
igualmente, a indicação de filmes para você assistir a eles e discuti-los com 
os colegas, bem como a indicação de leitura para quem quiser se aprofundar 
em determinado tema. No final das três unidades, apresento a bibliografia 
completa utilizada. Assim, comecemos pela Unidade 1.
TÓPICO 1 – ANTROPOLOGIA: DEFINIÇÃO PRELIMINAR DOS TERMOS
TÓPICO 2 – EXISTE UMA NATUREZA HUMANA?
 
TÓPICO 3 – AS DIVERSAS IDADES DO HOMEM
2
3
TÓPICO 1
UNIDADE 1
ANTROPOLOGIA: DEFINIÇÃO PRELIMINAR DOS TERMOS
1 INTRODUÇÃO
Prezado(a) acadêmico(a)!
Para que você entenda com facilidade o que eu escrevo, vou escrever como se 
tivesse contando a história de uma viagem. Melhor, vou deixar a história por conta 
da sua inteligência e imaginação. Além disso, para ganhar tempo e não tirar o prazer 
de descobrir o que lhe interessa, vou contar como se faz uma viagem ao mundo de 
um saber que nos é muito caro: o saber sobre os seres humanos, para conhecer o que 
já se aprendeu e escreveu, historicamente, sobre nós mesmos. Vou tentar explicar 
como se estivesse falando, como se planeja e se organiza uma viagem. 
Portanto, eu apresento um roteiro e você escolhe a história, ou seja, o 
ponto de partida e o de chegada. Explicarei, na Unidade 2, que a este roteiro 
denominamos método. É claro que não há método sem conteúdo. Logo, o roteiro 
que estou apresentando terá algumas alternativas previamente determinadas, 
mas você continua livre para inventar outro roteiro.
A nossa viagem começa justamente pelas definições preliminares. Aliás, 
elas sempre são preliminares, isto é, toda definição é necessariamente anterior a 
qualquer caminho a ser percorrido. Mas, fato curioso, somente quem já percorreu 
o caminho pode saber o que é anterior ao depois. 
Por isso, a definição não consegue antecipar a experiência do percurso, do 
trajeto a ser percorrido. Não consegue antecipar o prazer da chegada ao destino. 
Mas, por que então definir os termos de modo preliminar? Porque é preciso que 
tenhamos uma direção, um rumo, ou seja, precisamos conhecer com antecedência 
o dia e o ponto de partida, o ponto de chegada e os objetivos da viagem. 
Programar o GPS é o primeiro passo, o primeiro movimento, mas para 
sabermos se o GPS é dos bons, é preciso iniciar e concluir a viagem. Pois somenteassim você terá a experiência da viagem. A sua experiência será muito mais rica, 
porque você adicionou ao meu roteiro a história de sua escolha, que por sinal é a 
história da sua vida. 
A nossa disciplina denomina-se Antropologia Filosófica e Sociológica, no 
contexto cientificista contemporâneo. Portanto, o primeiro termo a ser definido é 
Antropologia, a partir da pergunta inicial desta unidade: é possível entender o 
ser humano? 
UNIDADE 1 | É POSSÍVEL ENTENDER O SER HUMANO?
4
Trata-se de uma pergunta feita propositadamente com duplo sentido. 
Ou seja, seria entender ou explicar que é o humano? O duplo sentido também 
está nas respostas possíveis: a resposta do senso comum, isto é, aquela que não 
precisamos definir, pois a conhecemos na prática e sempre a expressamos deste 
modo: “eu não consigo entender você”. 
Com este tipo de resposta não vamos nos preocupar, porque ela é comum 
a todos e, por ser comum a todos, é por todos conhecida. Todos operam com ela 
nas suas relações pessoais. O que interessa aqui é o outro sentido ou significado: 
entender o ser humano de um ponto de vista filosófico, científico e sociológico. 
Isto é, de um ponto de vista teórico e prático.
Assim, teremos o senso comum como ponto de partida e a totalidade da 
práxis humana como ponto de chegada. Isto é, não abandonamos ou desprezamos 
o nosso conhecimento operativo do dia a dia, pois dele precisamos para agir no 
mundo, mas acrescentamos à nossa experiência outro, mais rico e profundo, o 
chamado conhecimento científico.
 
Esta viagem vale o preço da passagem, porque não cansa, dá prazer e 
alimenta o nosso precioso ser humano com aquela palavra bonita que escrevi 
acima: a totalidade da práxis humana, que é na verdade o casamento perfeito 
entre teoria e prática, historicamente festejado por todos.
NOTA
É importante que você perceba desde agora, que o conhecimento meramente 
operativo, meww632289056wsmo o mais completo conhecimento filosófico ou científico, 
não dá conta de toda a complexidade da vida humana.
2 ANTROPOLOGIA FILOSÓFICA
Muitos são os autores que definem a Antropologia Filosófica, e é bom 
que seja assim, pois nada é mais útil na Filosofia e nas Ciências Humanas do 
que a discussão pública dos seus fundamentos. É isso mesmo, na Filosofia e nas 
Ciências Humanas é preciso que se discuta muito, mas sempre a partir de critérios 
publicamente justificáveis. Isto significa o seguinte: a Filosofia e as Ciências 
Humanas precisam ser praticadas com os outros. Essa afirmação ou assertiva, 
fazer com os outros, virou jargão publicitário, mas nem por isso ela perdeu a sua 
importância no âmbito do estudo das coisas humanas.
Isto ocorre porque cada autor ou pensador, quando publica um livro, 
mesmo que ele o faça com a intenção explícita de convencer os outros de sua 
verdade, todos nós sabemos que se trata da verdade na perspectiva ou visão de 
uma pessoa, por mais sábia que ela seja. 
TÓPICO 1 | ANTROPOLOGIA: DEFINIÇÃO PRELIMINAR DOS TERMOS
5
Consequentemente, as suas ideias, tendo sido publicadas, estão sujeitas 
à crítica, e são as críticas que fazem com que possa ocorrer a revisão de pontos 
de vista equivocados, pois ninguém é infalível. Ao ser criticado, o autor terá a 
oportunidade de justificar o que escreveu, e assim sucessivamente. 
É por isso que muitas vezes ouvimos o seguinte: nem os filósofos se 
entendem. Esta expressão do senso comum apresenta um problema, porque 
o que ocorre é exatamente o contrário. É porque os filósofos, antropólogos, 
historiadores e outros pensadores se entendem que eles discutem. Se eles não se 
entendessem, a discussão seria impossível e o conhecimento ou deixaria de ser 
produzido ou se tornaria um dogma, uma religião, não uma ciência.
Diante do exposto, passo a definir Antropologia. De acordo com 
Castoriadis (1992, p. 83), “dizer que vamos falar do ser humano significa que 
nos ocuparemos da antropologia. [...]. Antropologia é o logos que diz respeito ao 
antropos, ou seja, o discurso que diz respeito ao ser humano”.
FIGURA 1 – CORNÉLIUS CASTORIADIS (1922-1997)
FONTE: Disponível em: <pt.www.wikipédia.org/11/11/2012>. 
Acesso em: 20 out. 2012
Cornelius Castoriadis é um filósofo contemporâneo que nasceu na Grécia, 
por isso tomamos as suas explicações etimológicas como referência. Ele explica 
a diferença entre os termos anthropos e homem em várias línguas, como segue:
[...] em grego se diz antropos, que é muito diferente de anere [homem] 
e gounet [mulher], como em latim se dizia homo, que é outra coisa que 
vir [homem] e femina [mulher], Homo [e] antropos é o ser genérico, o 
ser humano. Mas, infelizmente, em francês, inglês e português, se diz 
homem, tanto para o ser genérico, quanto para o ser masculino. [...] 
Antropologia, pois, discurso sobre o homem, reflexão, interrogação, 
que dizem respeito àquilo que é o homem. (CASTORIADIS, 1992, p. 83).
O resumo citado indica a origem da palavra antropologia, que provém da 
junção de duas palavras gregas: anthropos e logos. Anthropos significa homem 
enquanto espécie humana, o que inclui, obviamente, mulheres e crianças. Logos 
UNIDADE 1 | É POSSÍVEL ENTENDER O SER HUMANO?
6
significa discurso racional organizado, dentre muitos outros sentidos. De onde 
se conclui que a Antropologia é uma ciência que procura apresentar um discurso 
coerente sobre a espécie humana historicamente constituída. 
O outro termo que é necessário definir é a expressão Filosofia, pois se 
trata de explicar o que é Antropologia Filosófica. Escolhi, para tanto, uma 
citação simples e resumida, mas que atende a esta finalidade e permite que 
eu faça algumas observações etimológicas que são de grande valia quando se 
quer entender alguma coisa a partir de sua origem ou quando se pretende ter 
instrumentos de análise do que podemos ou não levar a sério, no que diz respeito 
às publicações tanto na internet quanto nos livros. 
Por isso, utilizo uma citação extraída da Wikipédia:
Filosofia (do grego Φιλοσοφία, literalmente «amor à sabedoria») é 
o estudo de problemas fundamentais relacionados à existência, ao 
conhecimento, à verdade, aos valores morais e estéticos, à mente e à 
linguagem. Ao abordar esses problemas, a filosofia se distingue da 
mitologia e da religião por sua ênfase em argumentos racionais; por outro 
lado, diferencia-se das pesquisas científicas por geralmente não recorrer 
a procedimentos empíricos em suas investigações. Entre seus métodos 
estão a argumentação lógica, a análise conceptual, as experiências de 
pensamento e outros métodos a priori. (WIKIPÉDIA, 2012).
Trata-se, como afirmei acima, de uma definição simples, mas ela também 
é bastante concisa. A Filosofia é um campo de conhecimento específico: não é 
mitologia, não é religião e se utiliza de argumentos racionais. 
Mesmo utilizando-se exclusivamente de argumentos racionais, ela 
também não é ciência nos moldes das demais Ciências Humanas e da Natureza. 
Isso quer dizer que ela não tem, por exemplo, como provar matematicamente o 
que afirma, porque não é uma ciência exata. Mas pode criar muitos problemas 
no âmbito desta importante disciplina, quando o filósofo for capaz de fazer as 
perguntas certas aos cientistas. 
Como Filosofia, não tem como provar o que afirma, ela precisa justificar 
os seus argumentos a partir da linguagem mesmo. Isto é, aquilo que ela explica 
não pode ir além da compreensão humana.
A Filosofia limita-se ao que é humano. Por outro lado, a Teologia, embora 
também se utilize de um discurso racional, não precisa justificar o que afirma, 
pois ela trata de crenças religiosas, da existência de divindades e de um plano que 
não é o humano, racional e temporal, mas daquilo que não estaria ao alcance do 
humano e que seria anistórico, quer dizer, fora do tempo histórico.
Apresento, agora, o comentário etimológico ou mesmo filológico, isto é, 
de onde vêm aspalavras e o que significam. Você leu na citação que Filosofia 
significa “literalmente amor à sabedoria”.
TÓPICO 1 | ANTROPOLOGIA: DEFINIÇÃO PRELIMINAR DOS TERMOS
7
FIGURA 2 – EROS. DEUS DO AMOR DA MITOLOGIA GREGA
FONTE: Disponível em: <portalsaofrancisco.com.br>. Acesso em: 
20 out. 2012.
Eu prefiro utilizar outra expressão, embora a expressão “amor à sabedoria” 
possa ser utilizada em sentido figurado para definir o que vem a ser a palavra 
Filosofia. 
Eu prefiro utilizar a palavra amizade (philia) em vez de amor, porque amizade 
é uma palavra que está mais próxima etimologicamente de philos. Ser amigo do saber é 
estar envolvido amistosamente com ele sem ficar cego, diante das forças poderosas de 
Eros, o deus do amor da mitologia grega. 
Isto é, o amor, às vezes, nos deixa cegos, a amizade não, pois amigo é aquele 
que, quando for preciso, abre os nossos olhos com a força de sua crítica. A tradução de 
philos por amor não pode ser considerada literal, pois philia, que significa literalmente 
amizade, é o primeiro termo na composição da palavra Filosofia. Amor traduz-se por 
Eros. E nós não temos como saber com certeza qual é o grau de exatidão do que os 
filólogos chamam de estabelecimento dos textos gregos. 
NOTA
Os filósofos gregos não escreviam de próprio punho, pois naquela época não era 
costume um homem culto escrever, por isso eles ditavam os seus textos para os escravos. Não 
havia livros como nós os conhecemos. Muitos textos estão perdidos para sempre e outros podem, 
eventualmente, ser ainda encontrados por intermédio da pesquisa arqueológica. Os textos que nós 
conhecemos são o resultado de estabelecimentos tardios, muitos dos quais no século XIX, isto é, 
mais de dois mil anos depois de sua composição. E estes estabelecimentos, ou seja, agrupamento 
de textos, tradução e atribuição de autoria, podem estar profundamente impregnados de crença 
religiosa, daí, por exemplo, utilizar-se “amor” em vez de “amizade” na tradução, pois o termo amor 
aproximaria mais os filósofos ditos pagãos à doutrina cristã. Philia é uma palavra marcada pela 
política grega, por isso não era e nem é muito apreciada pelas doutrinas religiosas. As doutrinas 
religiosas herdeiras da tradição abraâmica seguem mais a perspectiva política monárquica, ao 
contrário das tradições grega e romana do período anterior à nossa era, ou seja, a. C.
UNIDADE 1 | É POSSÍVEL ENTENDER O SER HUMANO?
8
A partir da concepção de que Antropologia é a disciplina que estuda a espécie 
humana em sua práxis fundante e a Filosofia como o estudo das preocupações 
existenciais humanas, conclui-se que a Antropologia Filosófica é o estudo filosófico 
daquilo que pertence à espécie humana. Portanto, não é uma interpretação científica e 
nem teológica, mas uma interpretação humana das coisas humanas, cujos resultados 
são expressos de modo racional e precisam ser justificados. 
3 ANTROPOLOGIA CIENTÍFICA
A definição de Antropologia é a mesma do item anterior. Porém, a 
adjetivação (científica) feita é que precisa ser explicitada. Assim como afirmei que 
muitos autores escreveram e escrevem sobre a Antropologia Filosófica, também 
da Antropologia Científica se pode afirmar o mesmo: muitos escritores investem 
tempo e energia para mostrar que os seus argumentos são verdadeiros. Porém, 
ao contrário da Antropologia Filosófica, a Antropologia dita científica primeiro 
precisou ser reconhecida como ciência.
 
A Filosofia, como já foi visto, não é ciência e, por isso, não precisa provar 
os seus argumentos, mas justificá-los. Isso significa que não se pode escrever 
qualquer coisa e afirmar que esta coisa qualquer seja filosófica. Muito pelo 
contrário, a Filosofia também tem métodos de investigação e normas muito 
rígidas de exposição argumentativa.
FIGURA 3 – PLATÃO. FILÓSOFO GREGO (428/27-348/7 
A.C.)
FONTE: Disponível em: <pt.wikipedia.org/wiki/
Platão/12/11/2012>. Acesso em: 20 out. 2012.
A Filosofia é uma disciplina que existe há pelo menos dois mil e 
quinhentos anos. E neste período passou por várias modificações. Alcançou 
seu ponto mais alto com Platão e Aristóteles no século IV a. C., entrando 
posteriormente em declínio, tendo sido, inclusive, declarada, por teólogos 
cristãos, escrava da Teologia. 
TÓPICO 1 | ANTROPOLOGIA: DEFINIÇÃO PRELIMINAR DOS TERMOS
9
Ela começou a libertar-se da Teologia a partir do Renascimento, sendo 
hoje uma disciplina autônoma e consolidada, muito embora seja severamente 
criticada tanto por cientistas quanto por instituições ou pessoas que defendem 
alguma doutrina esotérica.
 
Os cientistas que criticam a Filosofia, normalmente, são aqueles que não 
a compreendem, e os esotéricos são aqueles que ganham dinheiro explorando a 
credulidade ingênua de pessoas que, por um motivo ou outro, não conseguiram 
formar opinião crítica própria.
A Antropologia é uma ciência recente e precisou provar primeiro que é 
uma ciência e, depois, que as suas afirmações eram ou são científicas. Trata-se, 
portanto, de uma tarefa gigantesca enfrentada pelos antropólogos. 
Talvez seja por isso, que a Antropologia apresente ainda alguns problemas 
de método, de objeto e de estatuto epistemológico. 
Para que você não se assuste com este palavreado técnico, eu explico: 
método é o como se faz uma pesquisa, o objeto é o tema, assunto a ser estudado, 
pesquisado, e estatuto epistemológico diz do tipo de ciência que a Antropologia 
quer ser. Pois episteme, em grego, significa ciência, e logos, como já vimos, discurso 
racionalmente organizado. Da junção de episteme e logos advém epistemologia, 
que significa, portanto, o discurso, a explicação que se tem da ciência.
Destarte, a antropologia científica enquanto ciência deve ter um método 
de investigação e um objeto bem definidos. Além de tudo, precisa provar as suas 
afirmações através de argumentos racionais. E isso significa utilizar argumentos não 
contraditórios, da mesma maneira que as outras ciências o fazem, a fim de estabelecer 
certas leis gerais que permitam a compreensão do homem em sua práxis fundante.
4 ANTROPOLOGIA SOCIOLÓGICA
Aqui se torna necessário retomar o título de nossa disciplina, antes de 
avançar a definição de Antropologia Sociológica, pois me parece necessário 
estabelecer um critério de abordagem do problema. 
UNI
Explico: vou retomar o título da disciplina porque nele se encontra algo muito 
importante para discutir, antes de explicar o que podemos entender por Antropologia 
Sociológica.
UNIDADE 1 | É POSSÍVEL ENTENDER O SER HUMANO?
10
 É que o título apresenta a conjunção e: Antropologia Filosófica e 
Sociológica no contexto cientificista contemporâneo. A conjunção e entre os 
termos que implicam Filosofia e Sociologia pode sugerir que estejamos tratando 
de tudo e nada ao mesmo tempo, sem um critério de pretensão de verdade e sem 
um método de análise, mas não é bem assim.
Ao discutir a questão da universidade contemporânea, Paulo R. Schneider 
(2001, p. 223-242) afirma que “a linguagem humana oferece uma possibilidade de 
explicar as coisas de modo compreensível e claro, sendo necessário, para tanto, 
apenas a decisão de assim o fazer”.
 
Ele explica isso a partir dos dois tipos de genitivo que estão presentes 
na linguagem: o genitivo subjetivo e o genitivo objetivo. “O genitivo subjetivo 
indica a posse de algo que alguém afirma” (2002, p. 234). Ocorre que a posse não é 
critério de qualificação filosófica e ou científica, “pelo fato de não se constituir em 
descrição de estudo, pesquisa e extensão, enfim, em interesse na continuidade da 
argumentação crítico-analítica, dialética e hermenêutico-dialógica entre pontos 
de vista diversos”. (SCHNEIDER, 2002, p. 234). 
O que está contido no genitivo subjetivo é que as coisas devem ser deixadas 
como estão, pois o sujeito que detém a posse de um determinado saber ou objeto 
é do que possui o seusenhor em termos absolutos. 
Quanto ao genitivo objetivo a questão se inverte, pois:
o genitivo objetivo nomeia em seu segundo termo o objeto necessário 
e constituído por todos os métodos [mencionados no caso do genitivo 
subjetivo], enquanto que o primeiro [termo] assume o ponto de vista a 
partir do qual se constitui a objetividade, que um determinado ponto 
de vista instaura como possibilidade de interlocução o interesse por, 
o estudo sobre, a tematização a partir de uma perspectiva, que só se 
alcança pelo diálogo, pela escuta, pergunta e resposta. (SCHNEIDER, 
2002, p. 235). 
“Esta perspectiva implica a utilização de métodos e critérios de verdade 
contra a banalização, contra o diletantismo e contra absurdos semânticos possíveis 
no âmbito do genitivo subjetivo”. (SCHNEIDER, 2002, p. 236).
O terceiro aspecto deste problema da delimitação do lugar de onde se 
situam professores, alunos, pesquisadores, enquanto sujeitos que apreendem um 
objeto de estudo, é o caso da conjunção e, presente no título da nossa disciplina. 
Ainda de acordo com Schneider, títulos que utilizam a conjunção e podem 
induzir a equívocos:
A conjunção é a própria possibilidade do universo superposto, ou 
contraposto, ou gradualizado, ou a pretensão de tudo e nada ao mesmo 
tempo. A conjunção não consegue explicitar a clareza da perspectiva 
de análise, aliás, nunca nomeada, nem constituir objetividade capaz de 
interlocução pelos métodos instaurados para esse fim. (2002, p. 236).
TÓPICO 1 | ANTROPOLOGIA: DEFINIÇÃO PRELIMINAR DOS TERMOS
11
UNI
Caro(a) acadêmico(a)! Fui obrigado a utilizar estes conceitos técnicos um pouco 
mais complexos para mostrar que a nossa disciplina não apresenta os problemas acima 
mencionados, embora utilize a conjunção e no seu título.
 Não os apresenta porque métodos e objetos estão definidos e a conjunção 
aqui utilizada diz somente de que se trata de dois aspectos de um mesmo 
problema: o estudo do homem (anthropos) de um ponto de vista filosófico e de 
um ponto de vista sociológico. No caso, o homem é sujeito e objeto de estudo. 
Isto é, somos estudantes e estudados ao mesmo tempo, tanto de um ponto de 
vista filosófico, quanto de um ponto de vista sociológico. 
Relativamente ao caso de sermos sujeito e objeto ao mesmo tempo, não 
quer dizer que todos sejamos antropólogos em sentido estrito, mas que existem 
antropólogos (sujeitos da ação de estudar) os quais, necessariamente, pertencem 
à espécie humana e que estudam humanos (objetos da ação de estudar).
UNI
Estas questões, por serem técnicas e complexas, são explicadas na Unidade 2, 
com mais detalhes.
Não se trata, igualmente, de misturar as perspectivas filosófica e 
sociológica de tal sorte que tenhamos “tudo e nada ao mesmo tempo”. No nosso 
caso, a antropologia será estudada do ponto de vista filosófico e sociológico, 
sem descuidar, portanto, daquilo que é próprio da Filosofia e nem daquilo que é 
próprio da Sociologia. É por esta razão que separamos todos os tópicos e itens de 
acordo com a especificidade de método e objeto de cada aspecto da Antropologia 
a ser estudado. 
De um ponto de vista científico, os antropólogos dividem a sua disciplina 
em vários campos específicos, como a Antropologia Cultural, Biológica e Social. 
Os filósofos estudam a Antropologia de um ponto de vista filosófico. A diferença 
entre a Antropologia Científica e a Filosófica é a de que, no primeiro caso, é 
necessário e indispensável que os antropólogos realizem minuciosa pesquisa de 
campo, isto é, façam a coleta de materiais, de dados sobre práticas e costumes, ou 
seja, obtenham o máximo de dados empíricos. 
UNIDADE 1 | É POSSÍVEL ENTENDER O SER HUMANO?
12
5 ANTROPOLOGIA CULTURAL
Este campo da Antropologia foi desenvolvido mais especificamente nos 
Estados Unidos e, por isso, sofre influência do modo de pensar americano. Porém, 
para o nosso interesse, visto que já definimos Antropologia, parece importante 
definir razoavelmente o que significa cultura. 
UNI
Caro(a) acadêmico(a)! Para tanto, vou proceder do mesmo modo que nas 
definições anteriores, vou citar uma definição simples e preliminar, a fim de utilizá-la para 
realizar os meus comentários.
Cultura (do latim colere, que significa cultivar) é um conceito de várias 
acepções, sendo a mais corrente a definição genérica formulada por Edward 
B. Tylor, segundo a qual cultura é “aquele todo complexo que inclui o 
conhecimento, as crenças, a arte, a moral, a lei, os costumes e todos os outros 
hábitos e aptidões adquiridos pelo homem como membro da sociedade”. 
Em Roma, na língua latina, seu antepassado etimológico tinha o 
sentido de “agricultura” (significado que a palavra mantém ainda hoje em 
determinados contextos), como empregado por Varrão, por exemplo. Cultura 
é também associada, comumente, a altas formas de manifestação artística e/
No segundo caso, a pesquisa de campo não é necessária, porque a Filosofia 
trabalha com conceitos e não com dados empíricos.
Esta diferença é muito importante. No campo da Antropologia Social é 
necessária a pesquisa das relações sociais que se estabelecem no interior de uma 
determinada sociedade. No caso da Antropologia Filosófica, trabalhamos com 
os conceitos ou com as conclusões das outras ciências, perguntando sobre o seu 
valor de verdade.
 
Assim sendo, no nosso caso, no fundo iremos realizar uma abordagem 
filosófica do sociológico, porque a Antropologia Filosófica não tem como fazer 
pesquisa de campo. 
Não quer dizer, contudo, que o filósofo possa abandonar ou distanciar-se 
da realidade. E, assim fazendo, a partir de algum absoluto metafísico deduzir 
consequências logicamente necessárias, as quais poderão ser corretas de acordo 
com a lógica formal, mas erradas quanto ao seu conteúdo.
TÓPICO 1 | ANTROPOLOGIA: DEFINIÇÃO PRELIMINAR DOS TERMOS
13
ou técnica da humanidade, como a música erudita europeia (o termo alemão 
“Kultur” – cultura – se aproxima mais desta definição). 
Definições de cultura foram realizadas por Ralph Linton, Leslie White, 
Clifford Geertz, Franz Boas, Malinowski e outros cientistas sociais. Em um 
estudo aprofundado, Alfred Kroeber e Clyde Kluckhohn encontraram pelo 
menos 167 definições diferentes para o termo cultura. Por ter sido fortemente 
associada ao conceito de civilização no século XVIII, a cultura muitas vezes se 
confunde com noções de: desenvolvimento, educação, bons costumes, etiqueta 
e comportamentos de elite. 
Essa confusão entre cultura e civilização foi comum, sobretudo, na 
França e na Inglaterra dos séculos XVIII e XIX, onde cultura se referia a um 
ideal [da classe dominante]. Ela possibilitou o surgimento da dicotomia (e, 
eventualmente, hierarquização) entre “cultura erudita” e “cultura popular”, 
melhor representada nos textos de Matthew Arnold, ainda fortemente presente 
no imaginário das sociedades ocidentais.
FONTE: Disponível em: <pt.wikipedia.org/>. Acesso em: 20 jul. 2012.
Como se observa, as definições de cultura oferecem um prato cheio para 
ser degustado lentamente. Sim, porque quando estamos viajando precisamos 
parar em algum ponto para nos alimentarmos. Por certo, estas definições estão 
marcadas profundamente por posições ideológicas as mais diversas, e não cabe 
aqui desvendá-las. Porém, como se observa, quase todas as definições foram 
escritas por antropólogos, o que indica que estamos bem próximos do nosso 
campo de estudo.
Consequentemente, vou comentar apenas o que considero o cerne da 
questão. Ou seja, a definição primeira de cultura: “aquele todo complexo que 
inclui o conhecimento, as crenças, a arte, a moral, a lei, os costumes e todos os 
outros hábitos e aptidões adquiridos pelo homem como membro da sociedade”, 
formulada por Edward B. Tylor. A primeira parte de sua definição pode ser aceita 
tranquilamente, isto é, a noção de todo complexo de conhecimento: crenças, arte,moral, leis, costumes e hábitos. A segunda parte é que apresenta problemas. 
O autor afirma que tudo isso foi “adquirido pelo homem como membro 
da sociedade”. A não ser que haja problemas de tradução, o que é pouco provável, 
não se trata de mera aquisição que os seres humanos fizeram como membros da 
sociedade humana, pois isso supõe situar a cultura e a sociedade como exteriores 
e anteriores ao humano.
UNIDADE 1 | É POSSÍVEL ENTENDER O SER HUMANO?
14
UNI
Explico: a cultura e a sociedade são produções exclusivamente humanas, são 
criações humanas, isto é, nem a cultura e nem a sociedade estavam prontas antes que o 
trabalho humano as fizesse existir. É claro que todos os dias nascem crianças dentro de 
culturas e sociedades existentes e, para elas, é como se tudo já estivesse pronto. Mas isto que 
para a criança parece estar pronto foi historicamente produzido por todas as pessoas, que já 
existiram há pelo menos quatro milhões de anos!
De qualquer modo, a Antropologia Cultural que, muitas vezes, se confunde 
com a Antropologia Social, trata dos fenômenos culturais das sociedades humanas 
como um todo. É isso que pretendemos explicar na Unidade 2, no Tópico 2.
6 A CIÊNCIA E O CIENTIFICISMO
Este assunto é bastante adequado para que se possa perceber o lugar do 
Anthropos no mundo contemporâneo. A cultura humana é produto do trabalho 
humano. Portanto, aquilo que produzimos social e culturalmente é de nossa 
inteira responsabilidade. 
Mas você pode se perguntar: o que eu tenho a ver com o fato de o presidente 
Harry S. Truman ter ordenado um ataque com bombas nucleares contra as cidades 
japonesas de Nagasaki e Hiroshima em 1945? Enquanto indivíduo isolado, você 
não pode ser responsabilizado pelo que já aconteceu e nem por muita coisa que 
irá ainda acontecer, assim como não somos responsáveis pelos erros de nossos 
pais e avós, por exemplo.
No entanto, somos herdeiros de tudo o que aconteceu para o bem e para o 
mal. Isto é, o bem e o mal são produtos humanos e não dois princípios absolutos que 
governam o mundo, como postulava o profeta persa Maniqueus (216–276 d. C.). 
Nesse sentido, todos nós somos responsáveis, porque somos herdeiros da 
nossa cultura. Podemos, contudo, criticá-la e modificá-la, bem como responsabilizar 
as pessoas que praticam atos monstruosos ou mesmo pequenos delitos, mas é 
muito mais fácil perceber os pequenos delitos do que criticar os atos monstruosos. 
Os pequenos delitos estão mais perto de nós e são mais visíveis e perceptíveis. 
NOTA
No item 2.5 explicarei com mais detalhes e a partir da ciência, que as noções de bem 
e mal têm implicações mais complexas.
TÓPICO 1 | ANTROPOLOGIA: DEFINIÇÃO PRELIMINAR DOS TERMOS
15
O que isso tem a ver com ciência e cientificismo? A bomba nuclear é um 
típico produto da ciência mais avançada do mundo. No entanto, ela, assim como 
outros produtos da ciência, serviu para a destruição em massa. Isso também é 
mais fácil de perceber. O que não é fácil perceber é o bem que a ciência produz. 
UNI
Outra coisa difícil é encontrar uma definição satisfatória de ciência, razão pela 
qual vou tentar escrever uma definição razoável.
Como a maioria de nossas palavras tem origem no grego e no latim, a 
palavra ciência também. Pelo lado grego é episteme, que significa experiência, de 
onde vem epistemologia, discurso sobre a ciência. Pelo latim, scientia, palavra 
mais próxima nossa. 
A ciência é uma atividade racional, meticulosa e metódica, que busca 
compreender como a natureza das coisas funciona e o que se pode fazer com 
esse funcionamento. Portanto, é uma atividade e um trabalho. A ciência pretende 
conhecer uma determinada realidade por intermédio de um método, o qual 
precisa ser adequado ao objeto, que é a realidade que se quer conhecer. 
Como tudo, a ciência também teve um desenvolvimento, nem sempre 
linear e cumulativo, mas no conjunto, o acúmulo de conhecimentos científicos 
permite que os cientistas conheçam cada vez mais realidades. Ou seja, cada 
vez mais a natureza das coisas, tanto do ponto de vista particular quanto geral. 
Praticamente não há nada que não possa ser investigado, o que não quer dizer que 
não haja nada que não possa ser conhecido. Há muita coisa que desconhecemos.
As ciências se dividem em Ciências Humanas e Ciências da Natureza. Além 
destas modalidades científicas, existe a Filosofia, que não pode ser qualificada 
como ciência, mesmo que, por vezes, ela seja incluída entre as Ciências Humanas. 
Aliás, hoje a Filosofia virou o alvo preferido da maioria das pessoas que quer falar 
mal de alguma coisa: a culpa sempre é dos filósofos e da Filosofia, mesmo que 
não saibam o que seja a Filosofia. 
Por outro lado, compreender o que seja um cientista parece mais fácil. 
E até poderíamos brincar com a definição: o cientista é o que faz ciência. Na 
verdade, o cientista não “faz ciência” no sentido de fabricá-la. Ele investiga 
teorias, métodos, produz equipamentos para as experimentações, faz 
experimentações e assim por diante.
 
O conjunto destas atividades é de fato um “fazer científico” que depende 
exclusivamente do trabalho humano, dos cientistas e dos não cientistas. É claro, 
UNIDADE 1 | É POSSÍVEL ENTENDER O SER HUMANO?
16
pois o trabalho é sempre uma atividade social, muito embora a capacidade e a 
decisão de se tornar cientista sejam individuais. 
Mesmo assim, um cientista não é nenhum gênio maluco que trabalha 
isolado. Ao contrário, os cientistas, hoje em dia, trabalham em ampla conexão e 
discussão uns com os outros. Ciência, na verdade, é apenas uma palavra como 
muitas outras. Ela somente ganha significado a partir da atividade de cientistas.
UNI
Acredito que, em relação às definições de ciência e de cientista, não haja muita 
discussão.
 O contrário ocorre no campo do cientificismo ou cientismo. Aí o bicho 
pega, pois, no afã de combater dogmas metafísicos e o idealismo romântico, muitos 
cientistas que seguiam o método empirista passaram a criticar com certa veemência 
também os filósofos e os cientistas sociais.
 De modo idêntico, alguns cientistas, digamos, mais especulativos, 
também foram criticados. Desse modo, acabou sendo criada a convicção de que 
a única ciência possível era aquela que primasse pela experimentação empírica, 
conforme a citação a seguir: 
Cientificismo ou cientismo é um termo forjado na França durante 
a segunda metade do século XIX (scientisme) para designar a escola de 
pensamento que aceita apenas a ciência empiricamente verificável como fonte 
de explicação de tudo o que existe. 
Assim, o termo tem sido aplicado para descrever a visão de que as 
ciências formais e naturais têm primazia sobre outros campos de pesquisa, 
tais como: as ciências sociais ou humanas. Além de seu significado original, 
a palavra também é usada muitas vezes como um termo pejorativo contra 
explicações racionais dadas pelas ciências empíricas, com destaque para as 
ciências naturais, a fim de tentar desacreditar explicações científicas plenamente 
válidas que contrastam com argumentos de caráter filosófico, religioso, mítico, 
espiritual, humanístico ou pseudocientífico. 
FONTE: Disponível em: <pt.wikipédia.org>. Acesso em: 20 jul. 2012.
Como você acabou de ler, este é um tema que precisa ser tratado com 
cuidado devido à sua complexidade, relativamente à ética e à própria noção de 
ciência. Não se trata, pois, de questionar as crenças individuais, mas de colocar as 
coisas em seus devidos lugares. 
TÓPICO 1 | ANTROPOLOGIA: DEFINIÇÃO PRELIMINAR DOS TERMOS
17
UNI
Explico: de acordo com a definição de ciência acima apresentada, não se pode 
misturar as coisas. Existem fenômenos que são passíveis de tratamento científico e existem 
crenças que não podem ser estudadas cientificamente nem filosoficamente.
Isto é, dar à Ciência o que é da Ciência, dar à Filosofia o que é da Filosofiae dar à Teologia o que é da Teologia. 
 O que pode ser estudado tanto científica quanto filosoficamente é tão 
somente a existência de crenças religiosas ou não. Mas nem sempre o conteúdo 
das crenças pode ser explicado de modo científico ou filosófico. A crença de que 
a Ciência livraria todas as pessoas de todos os males é ilusória. 
Estudar esta ilusão é algo complexo, mesmo no campo da antropologia. 
Estudar a existência da crença de que a Ciência pode livrar a humanidade de todos 
os males é factível do ponto de vista da Filosofia e da Ciência, mas não do ponto de 
vista da Teologia, pois a Teologia trata da crença na existência de divindades.
Como você está percebendo, o cientificismo não é um campo do 
conhecimento, uma disciplina científica, mas é um posicionamento ideológico 
frente à ciência. Só admitir como ciência aquilo que é empiricamente verificável é 
Tão ideológico quanto dizer o contrário. É claro que a possibilidade de verificação 
empírica, isto é, de fazer experiências para inferir leis gerais, é uma postura 
epistemológica importante, mas quem verifica o quê? Nos folhetins novelescos e 
na publicidade, ouvimos com frequência alusão a pesquisas científicas em sentido 
nitidamente depreciativo, tanto da inteligência das pessoas em geral, quanto da 
dos cientistas. 
Por exemplo, vidas passadas são pesquisadas pela Psicologia para provar 
que o amor eterno existe. Ora, a licença para inventar fábulas é facultada ao 
escritor de novelas, ao romancista e ao poeta. Porém, mesmo com esta licença 
não é moralmente aceitável que um escritor desqualifique o estatuto de ciência 
da psicologia. 
Por que em vez de um psicólogo ele não põe como personagem 
simplesmente um iluminado qualquer? Se nas novelas a coisa é grave, imagine 
na publicidade, quando ouvimos a clássica afirmação: “Cientistas provam” 
que a casca da árvore da vida cura reumatismo e mais uma dúzia de doenças. 
Tome chá de casca da árvore da vida, três vezes por dia e adeus hemorroidas! 
Ora, quem são estes pretensos cientistas? Ninguém jamais saberá. Portanto, 
afirmações como estas são pejorativas, isto é, desqualificam a ciência, mesmo que 
não intencionalmente. 
UNIDADE 1 | É POSSÍVEL ENTENDER O SER HUMANO?
18
Os exemplos acima são tirados do dia a dia. Eles são apenas um ponto 
de partida para que se possa pensar sobre este tema. A ciência é uma atividade 
que envolve questões econômicas, políticas, éticas e sociais. Nosso mundo seria 
impensável sem ela. Mesmo assim, não se pode afirmar que a ciência possa 
explicar ou resolver tudo.
 
O mundo humano é mais complexo do que a própria ciência. Por isso 
mesmo, não podemos fazer afirmações que não possam ser justificadas, como, por 
exemplo, colocar no mesmo nível argumentativo ou ontológico coisas diferentes, 
como afirmar que existem duas teorias capazes de explicar a origem do mundo e 
a existência dos humanos na Terra.
A evolução e o criacionismo. A primeira é uma teoria científica que até 
pode falhar em muitos aspectos, mas é a teoria de que a ciência dispõe. A segunda 
hipótese é uma doutrina religiosa que afirma a criação do mundo a partir do 
nada, na qual as pessoas podem acreditar ou não. A primeira precisa ser estudada 
e levada a sério, até para que possa ser criticada, pois não podemos criticar aquilo 
que não conhecemos.
 
A segunda possibilidade implica em crença religiosa e depende da 
liberdade de cada um nela acreditar ou não. A atitude de criticar o que não se 
conhece é a mesma do que a de dizer de um livro o seguinte: não o li e não gostei, 
ou não li o livro porque não gosto dele. O exemplo do livro não lido é típico da 
atitude do cientificismo contemporâneo.
19
Neste tópico você viu que:
• Que o nosso ponto de partida foi a definição de todos os termos constituintes 
do nome de nossa disciplina, a partir da pergunta: É possível entender o ser 
humano? Na resposta, fomos do senso comum ao conhecimento científico ou 
filosófico. Não abandonamos o conhecimento operativo do dia a dia, pois dele 
precisamos para agir no mundo.
• Que a Antropologia estuda a espécie humana em sua práxis fundante e a 
Filosofia, o estudo das preocupações existenciais humanas. Conclusão: a 
Antropologia Filosófica é o estudo filosófico daquilo que pertence à espécie 
humana, não sendo interpretação científica ou teológica, mas interpretação 
humana das coisas humanas, cujos resultados são expressos de modo racional 
e precisam ser justificados.
• Que a Antropologia Científica deve ter um método de investigação e um objeto 
bem definidos. Ela precisa provar as suas afirmações através de argumentos 
racionais, não contraditórios, da mesma maneira que as outras ciências o 
fazem, a fim de estabelecer certas leis gerais que permitam a compreensão do 
homem em sua práxis fundante.
• Que a Antropologia Social precisa fazer pesquisa de campo das relações sociais 
que se estabelecem no interior de uma determinada sociedade; que no caso da 
Antropologia Filosófica trabalhamos com conceitos ou conclusões das outras 
ciências, perguntando sobre o seu valor de verdade. No fundo se faz uma 
abordagem filosófica do sociológico. O Filósofo não pode, porém, abandonar 
a realidade. Não pode partir de algum absoluto metafísico e deduzir dele 
consequências logicamente necessárias, pois elas poderão ser formalmente 
corretas, mas erradas quanto ao seu conteúdo.
• Que a Antropologia Cultural, que, muitas vezes, se confunde com a Antropologia 
Social, trata dos fenômenos culturais das sociedades humanas como um todo.
• Que a Ciência é uma atividade racional, meticulosa, metódica e busca compreender 
como a natureza das coisas funciona e o que se pode fazer com esse funcionamento. 
É uma atividade, um trabalho, portanto. O cientificismo é uma postura ideológica 
frente a ciência que a supõe como a única detentora da verdade.
RESUMO DO TÓPICO 1
20
A partir das definições preliminares, quais são as diferenças entre os 
vários campos temáticos das antropologias filosófica e científica?
AUTOATIVIDADE
21
TÓPICO 2
EXISTE UMA NATUREZA HUMANA?
UNIDADE 1
1 INTRODUÇÃO
Neste tópico vou responder à pergunta formulada, a partir de vários 
pontos de vista. Isto não implica que eu não tenha uma posição filosófica e/ou 
científica a respeito, mas por questões didáticas é melhor mostrar algumas das 
posições existentes. 
No meu modo de entender, a questão da existência ou não de uma natureza 
humana é relevante para que possamos entender o lugar dos seres humanos no 
mundo contemporâneo. 
Por aludir a lugar, é bom lembrar que o antropólogo francês Marc Augé 
publicou em Paris, em 1992, um livro denominado “Não lugares: introdução a 
uma antropologia da supermodernidade”, traduzido para o português em 1994, 
que trata do próximo e do distante, do lugar antropológico e da complicada 
questão dos que vão dos lugares aos não lugares e destes aos mais diversos 
lugares. Mas, o que este livro tem a ver com a existência ou não de uma natureza 
humana? Em princípio, muito pouco, mas se pensarmos que o não lugar é o lugar 
da impessoalidade e da não sociabilidade, teremos, com certeza, um ponto de 
tangência muito forte com a ideia de natureza humana. 
UNI
Os pontos de vista que vou apresentar serão as explicações da Religião Cristã, 
da Filosofia, da Sociologia e da Biologia Evolutiva, tendo como plano de fundo a Antropologia. 
Seguirei, em alguns aspectos, o livro “Tábula Rasa: a negação contemporânea da natureza 
humana”, de Steven Pinker, publicado nos Estados Unidos em 2002.
A tradução brasileira é de 2004, sendo, portanto, um livro recente, que apresenta algumas das 
descobertas científicas no âmbito da biologia humana que são significativas para a discussão 
sobre a existência ou não de uma natureza humana. Para defender o seu ponto de vista, o 
autor faz um apanhado histórico do pensamento ocidental.Não concordo com a totalidade dos seus comentários, mas, cientificamente, Pinker levanta 
questões justas, razão suficiente para tomar o seu livro como um dos pontos de partida 
na realização de nossa tarefa no restante deste livro-texto. Em princípio, portanto, natureza 
humana é aquilo que é bioculturalmente universal para o anthropos.
UNIDADE 1 | É POSSÍVEL ENTENDER O SER HUMANO?
22
2 EXPLICAÇÃO RELIGIOSA
UNI
Afirmei na introdução que a explicação religiosa da natureza humana será dada a 
partir da doutrina cristã.
Embora existam outras religiões importantes no mundo, a cultura ocidental 
foi e é influenciada pelo cristianismo. Veja na citação a seguir o resultado de uma 
pesquisa realizada em 2005 pela Enciclopédia Britânica sobre a prevalência das 
principais religiões. 
As principais religiões do mundo e tradições espirituais podem ser 
classificadas em um número menor de grupos maiores ou religiões 
mundiais. De acordo com uma pesquisa realizada em 2005 pela 
Encyclopædia Britannica, a maioria vasta de aderentes religiosos e 
espirituais seguia o cristianismo (33,06% da população mundial), islã 
(21%), hinduísmo (13,33%), religião tradicional chinesa (6,27%) ou 
budismo (5,87%). A irreligiosidade e o ateísmo respondem por 14,27% 
e 3,97% da população mundial. (WIKIPEDIA, 2012).
Trata-se de informações que habitualmente não se tem acesso. Por isso 
é importante comentá-las, pois o articulista exagera em seu desejo de apregoar 
a supremacia do cristianismo como religião mundial. A marca de 33,06% 
corresponde a um terço da população e não “a maioria vasta”. Há ainda que se 
considerar que existem diferenças entre os cristãos: existem os católicos romanos, 
os ortodoxos e os protestantes que se dividem numa infinidade de comunidades 
religiosas. Contudo, um terço da população é uma marca considerável.
Além de nomear as principais religiões, a referida pesquisa revela outro 
dado importante: os não religiosos e os ateus perfazem, hoje, mais ou menos 19% 
da população mundial. Isso significa que praticamente um quinto da população 
mundial ou não tem religião ou se declara ateia. Parte deste grupo populacional 
também está localizada no Ocidente.
 
Leia na citação seguinte, da mesma fonte, outro aspecto importante das 
religiões ou “tradições espirituais” que é o do seu agrupamento doutrinário:
Estas tradições espirituais podem ser também combinadas em grupos 
maiores, ou separadas em subdenominações menores. O cristianismo, 
islão e o judaísmo (e às vezes a Fé Bahá'í) podem ser unidos como 
religiões abraâmicas. O hinduísmo, budismo, sikhismo e jainismo 
são classificados como religiões indianas (ou dármicas). A religião 
tradicional chinesa, confucionismo, taoísmo e shinto são classificados 
como religiões da Ásia Oriental. (WIKIPEDIA, 2012).
TÓPICO 2 | EXISTE UMA NATUREZA HUMANA?
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As informações apresentadas também são importantes para que você 
tenha uma noção da distribuição das doutrinas religiosas pelo mundo. Além 
disso, é possível verificar na filiação das chamadas tradições espirituais o caráter 
patriarcal das principais religiões, pois a maioria se diz herdeira do personagem 
bíblico chamado de Abraão. 
Conforme o Gênesis, Abraão seria o fundador do monoteísmo judaico, 
do qual se originam o judaísmo tradicional, o cristianismo e o islamismo. É, pois, 
desta origem que emana a noção de natureza humana destas religiões. 
UNI
Caro(a) acadêmico(a)! Antes de apresentar a noção cristã de natureza humana, 
farei uma breve exposição da origem das religiões a partir da história da ciência.
A humanidade, em seu alvorecer, não tinha um corpo sistemático de 
explicações como nós temos depois do advento da Filosofia e das Ciências. Além 
disso, se explicar o conhecido é difícil, imagine você explicar o desconhecido. 
Aos poucos, porém, especialmente depois do advento da linguagem 
falada, as explicações começaram a ser formuladas, sendo as primeiras delas as 
mágicas, as míticas e as religiosas. 
Podemos considerar este começo como sendo uma aventura da razão 
humana, aliás, como escrevi em 1998 na minha dissertação de mestrado: “A 
grande aventura da razão começa com a magia”. O caminho da magia divide 
o mundo entre as coisas visíveis, os entes, e as coisas invisíveis, o mundo dos 
espíritos, que por não serem visíveis, mas apenas perceptíveis, como as forças 
psíquicas, por exemplo, ganham aos poucos um estatuto ôntico relevante.
Estes seres invisíveis possuem um poder sobre-humano e precisam ser bem 
tratados para que interfiram em favor dos homens. Esse bom tratamento é dado 
pelos primeiros sacerdotes, que têm a responsabilidade de prover a subsistência 
para a sobrevivência da espécie. Nesse momento da história das mais diversas 
civilizações, a dança da chuva implica certo grau de conhecimento científico, não 
muito diferente do conhecimento de que dispomos hoje em termos de ciência. 
O sacerdote sabe que precisa fazer chover para que a espécie sobreviva, 
e isso se consegue com danças e poções mágicas. Nesse mister, ele descobre algo 
extremamente precioso, a relação entre a chuva, que é uma manifestação da 
natureza, e a sobrevivência da espécie. Trata-se de um conhecimento prático de 
UNIDADE 1 | É POSSÍVEL ENTENDER O SER HUMANO?
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capital importância, pois se o sacerdote não conseguir que chova, com certeza 
fará a sua tribo procurar um local mais apropriado de sobrevivência e encontrar 
nas plantas alimento e fonte de saúde.
 
Vejamos o que diz Colin A. Ronan sobre essa forma de magia:
É impossível examinar a história ou a teoria da ciência sem se 
defrontar com a magia. Esta era um complexo amálgama de 
espiritismo e arcano. Para quem não tenda imaginar a ciência moderna 
meramente como uma taumaturgia, a própria menção da magia, neste 
contexto, pode parecer estranha ou até inaceitável. Contudo, aquilo 
que aparentemente constitui abordagens totalmente disparatadas da 
natureza contém, na verdade, muitos fatores comuns. A magia foi um 
modo legítimo de expressar uma síntese do mundo natural e do seu 
relacionamento com o homem. Quando, numa sociedade primitiva, o 
mago, impostor ou curandeiro se propõe provocar chuva por meios 
artificiais, ele expressa sua compreensão de uma ligação entre a 
chuva e o crescimento das plantações, entre um e outro aspecto da 
natureza e sua estimativa de que a sobrevivência do homem depende 
do comportamento do mundo natural [...]. A magia exprimiu o que, 
de um modo geral, era uma visão anímica da natureza. O mundo 
era povoado por espíritos e forças espirituais ocultas, que habitavam 
talvez os animais, ou as árvores, ou o mar e o vento, e a função do 
mago consistia em submeter estas forças ao seu objetivo, persuadir 
os espíritos a cooperar. [...] E quando passou a adotar processos 
mais realistas a fim de obter o seu bem-estar, com a construção, por 
exemplo, de sistemas de irrigação, o homem começou, consciente 
ou inconscientemente, a relegar os poderes do mundo dos espíritos 
a um papel mais de cooperação que de intervenção direta. Durante 
milhares de anos, as duas formas de abordagem coexistiram lado a 
lado, num estado de relativa trégua, e, à medida que as técnicas de 
controle da natureza do homem se tornaram mais eficientes, o mundo 
dos espíritos foi forçado a redefinir o seu papel (RONAN, 1987, p. 12).
Da magia primitiva aos poucos se constituíram as religiões que se 
tornaram formas mais complexas e racionais de explicar o mundo. É por isso 
que o conhecimento primitivo era tido como sagrado, especialmente aqueles 
conhecimentos ligados à prática da guerra, às técnicas políticas, à administração 
de cidades, à arquitetura, irrigação e fundição de metais. Trata-se, portanto, do 
desenvolvimento paralelo entre os princípios religiosos e aquilo a que chamamos 
hoje de ciência e técnica.
NOTA
Na citação existem palavras de difícil compreensão,como, por exemplo, “arcano”, 
que significa segredo ou mistério, e “taumaturgia”, que significa fazer milagres. Caso você 
encontre outras palavras desconhecidas, uma boa técnica para conhecê-las é a consulta a 
um dicionário.
TÓPICO 2 | EXISTE UMA NATUREZA HUMANA?
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O cristianismo, como já foi visto, é uma das religiões abraâmicas. Assim 
sendo, os cristãos tomam da religião israelita boa parte de seu corpo doutrinário, 
constante do chamado Antigo Testamento. Aquela foi a primeira religião monoteísta 
da época. Continha o seu fundamento na ideia de um deus único e criador. 
A criação do mundo se dá a partir do nada, como explica Hooykaas (1988, p. 
25): “o Deus de Israel, por sua palavra, cria todas as coisas do nada”. Pela palavra-
ato daquele Deus também são criados o homem e a mulher e todas as coisas que 
existem. O que interessa aqui “é a criação dos humanos e do estabelecimento da 
relação entre eles e o criador, pois é isso que define por milênios, como ensina 
Pinker (2002, p. 20), a principal noção de natureza humana”. 
NOTA
Steve Pinker (1954-) é professor de psicologia em Harvard, foi professor assistente 
da Universidade de Stanford e diretor do Centro de Neurociência Cognitiva do MIT. 
Trata-se de um cientista e escritor respeitado e respeitável, de modo que as suas afirmações 
científicas podem ser levadas a sério, muito embora alguns de seus comentários relativamente 
aos filósofos, bem como a Freud e a Marx, sejam passíveis de crítica. Os seus comentários 
relativamente aos antropólogos também parecem adequados. Saliento ainda que ele utiliza 
indiscriminadamente a palavra teoria, ou seja, utiliza o termo teoria tanto para definir o 
criacionismo quanto para o evolucionismo. A fim de não criar confusão, eu utilizo a palavra 
doutrina para definir enunciados religiosos e teoria para enunciados científicos ou filosóficos.
Pinker afirma (2002, p. 20) que:
a tradição bíblica é muito popular especialmente nos Estados Unidos, 
onde praticamente 80% da população acreditam nela. Apenas 15% 
acreditam na teoria da evolução de Darwin. Esta estatística também 
é importante, porque sendo os Estados Unidos o grande divulgador 
de produtos ideológicos por intermédio do cinema, da televisão e dos 
folhetins literários, essas crenças são disseminadas pelo mundo. 
No Brasil, de acordo com o IBGE, cujos dados foram extraídos da 
Wikipédia, encontramos a seguinte situação:
O censo demográfico realizado em 2010, pelo IBGE, apontou a 
seguinte composição religiosa no Brasil: 64,6% dos brasileiros (cerca 
de 123 milhões) declaram-se católicos; 22,2% (cerca de 42,3 milhões) 
declaram-se protestantes (evangélicos tradicionais, pentecostais e 
neopentecostais); 8,0% (cerca de 15,3 milhões) declaram-se irreligiosos: 
ateus, agnósticos, ou deístas; 2,0% (cerca de 3,8 milhões) declaram-se 
espíritas; 0,7% (1,4 milhão) declaram-se as testemunhas de Jeová; 0,5% 
(1 milhão) declaram-se os Santos dos Últimos Dias ou mórmons; 0,3% 
UNIDADE 1 | É POSSÍVEL ENTENDER O SER HUMANO?
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(588 mil) declaram-se seguidores do animismo afro-brasileiro como o 
Candomblé, o Tambor-de-mina, além da Umbanda; 1,6% (3,1 milhões) 
declaram-se seguidores de outras religiões, tais como: os islâmicos 
(300 mil), os budistas (243 mil), os judeus (196 mil), os messiânicos (103 
mil), os esotéricos (74 mil), os espiritualistas (62 mil) e os hoasqueiros 
(35 mil). (WIKIPEDIA, 2012).
Estes dados indicam, no entanto, quantas pessoas seguem uma 
determinada religião, mas não esclarecem quanto à crença no criacionismo ou 
na teoria da evolução. A este respeito não parece haver estatísticas confiáveis. 
Contudo, a julgar pela quantidade de pessoas que se dizem religiosas, também 
deve ser elevado o número de pessoas que acreditam no criacionismo, visto que 
apenas 8% se declaram ateus ou não religiosos, no Brasil. 
UNI
Destaco o seguinte: estas informações são relevantes do ponto de vista 
antropológico, pois mostram a preocupação das pessoas com a sua origem enquanto 
espécie, bem como quanto ao seu bem-estar psíquico (de psychê). Ou seja, existe uma 
preocupação latente com o lugar que as pessoas ocupam na Terra.
O bem-estar da psychê tem consequências existenciais profundas, pois 
é a partir de eventuais sofrimentos desta ordem que muitas pessoas tendem 
a cometer os maiores desatinos. O cuidado com o estado psíquico resulta em 
qualidade de vida incomum. Utilizo a expressão psychê, de onde psíquico, porque 
ela é etimologicamente mais correta do que alma ou espírito.
 
Embora as etimologias mais conhecidas insistam na correlação entre 
psychê e alma, como as citadas a seguir:
Na origem sânscrito-grego: a palavra grega [psyché] aparece como 
deverbal do verbo [psýchein], «soprar, emitir um sopro». O verbo [psýcho], «eu 
sopro, eu deixo escapar o ar» tem provavelmente como origem a forma não 
sufixada [psýo], que representa a raiz bhes-, soprar, atestada no sânscrito bhas-
tra, fole, e no sânscrito-védico, da qual originou sua raiz, [á-psu]: sem sopro, 
sem força. Este termo significou o sopro, a respiração, o hálito, a força vital, 
a vida sentida como sopro, daí alma do ser vivo, sede de seus pensamentos, 
emoções e desejos, donde o próprio ser, a individualidade pessoal, a pessoa, a 
parte imaterial e imortal do ser.
FONTE: Disponível em: <http://lualfavenus.blogspot.com.br/2012/03/alma-e-espirito.html>. 
Acesso em: 20 dez. 2012.
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O problema está na última frase da citação: “Este termo significou o sopro, a 
respiração, o hálito, a força vital, a vida sentida como sopro, daí alma do ser vivo, sede 
de seus pensamentos, emoções e desejos, donde o próprio ser, a individualidade 
pessoal, a pessoa, a parte imaterial e imortal do ser”. Esta conclusão não consta das 
definições gregas. Esta é uma conclusão cristã, com base nos teólogos cristãos. Aliás, 
os gregos sequer tinham a palavra “eu” como nós a conhecemos. A descoberta da 
expressão “eu” pode ser atribuída a Agostinho de Hipona.
FIGURA 4 – AGOSTINHO DE HIPONA (354-430)
FONTE: Disponível em: <portalsaofrancisco.com.br>. Acesso em: 
20 out. 2012.
UNI
Feitos estes esclarecimentos, passo a citar Pinker, que resume de maneira muito 
precisa a concepção religiosa de natureza humana.
 Esta concepção de natureza humana será de muita utilidade para 
entendermos as diferenças entre as várias explicações dadas por filósofos, 
antropólogos, teólogos, biólogos e psicólogos. 
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FIGURA 5 – STEVEN PINKER
FONTE: Disponível em: <pt.www.wikipedia.org/>. Acesso em: 11 
nov. 2012.
Por milênios as principais teorias da natureza humana vieram da 
religião. A tradição judaico-cristã, por exemplo, oferece explicações 
para boa parte dos assuntos hoje em estudo pela biologia e psicologia, 
Os seres humanos são feitos à imagem de Deus e não têm parentesco 
com os animais. As mulheres derivam dos homens e destinam-se a 
ser governadas por eles. A mente é uma substância imaterial; tem 
poderes que nenhuma estrutura puramente física possui, e pode 
continuar a existir quando o corpo morre. A mente é constituída 
por diversos componentes, incluindo senso moral, capacidade de 
amar, capacidade de raciocínio que reconhece se um ato condiz com 
ideais de bondade, e faculdade de decisão que escolhe o modo de se 
comportar. Embora a faculdade de decisão não seja limitada pelas leis 
de causa e efeito, possui tendência inata a escolher o pecado. Nossas 
faculdades cognitivas e perceptivas funcionam com precisão porque 
Deus implantou nelas ideias que correspondem à realidade e porque 
ele coordena seu funcionamento com o mundo exterior. A saúde 
mental provém de reconhecer o propósito de Deus, escolhendo o bem 
e arrependendo-se do pecado, e amando a Deus e aos semelhantes em 
consideração a Deus. (PINKER, 2002, p. 20).
Esta

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