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0 1 1 SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO ............................................................................................ 2 2 OS DESAFIOS DA INTERVENÇÃO PROFISSIONAL................................ 3 2.1 A política social como campo privilegiado da intervenção profissional ............................................................................................................11 2.2 Desafios Cotidianos do Assistente Social nas Políticas Públicas ....... 15 3 A ASSISTÊNCIA SOCIAL COMO POLÍTICA DE SEGURIDADE SOCIAL ...................................................................................................................20 4 ASSISTÊNCIA SOCIAL É POLÍTICA PÚBLICA ....................................... 24 5 A GESTÃO DE TRABALHO NO SISTEMA ÚNICO DE ASSISTÊNCIA SOCIAL ...................................................................................................................28 6 O TRABALHO DO/A ASSISTENTE SOCIAL NA ASSISTÊNCIA SOCIAL ...................................................................................................................32 7 SERVIÇO SOCIAL E PROJETO ÉTICO-POLÍTICO ................................. 41 8 O TRABALHO PROFISSIONAL NA CONTEMPORANEIDADE ............... 45 9 SINTONIZANDO O SERVIÇO SOCIAL COM OS NOVOS TEMPOS ...... 47 9 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .......................................................... 51 2 2 1 INTRODUÇÃO Prezado aluno! O Grupo Educacional FAVENI, esclarece que o material virtual é semelhante ao da sala de aula presencial. Em uma sala de aula, é raro – quase improvável - um aluno se levantar, interromper a exposição, dirigir-se ao professor e fazer uma pergunta, para que seja esclarecida uma dúvida sobre o tema tratado. O comum é que esse aluno faça a pergunta em voz alta para todos ouvirem e todos ouvirão a resposta. No espaço virtual, é a mesma coisa. Não hesite em perguntar, as perguntas poderão ser direcionadas ao protocolo de atendimento que serão respondidas em tempo hábil. Os cursos à distância exigem do aluno tempo e organização. No caso da nossa disciplina é preciso ter um horário destinado à leitura do texto base e à execução das avaliações propostas. A vantagem é que poderá reservar o dia da semana e a hora que lhe convier para isso. A organização é o quesito indispensável, porque há uma sequência a ser seguida e prazos definidos para as atividades. Bons estudos! 3 3 2 OS DESAFIOS DA INTERVENÇÃO PROFISSIONAL Fonte: www.ssrede.pro.br Na década de 30 convive-se com um fenômeno que começa a tomar grandes proporções. Sendo algo distinto da pobreza já existente o pauperismo das massas trabalhadoras retratava o crescimento da pobreza em decorrência da ampliação da capacidade da sociedade de produzir cada vez mais bens e serviços. Conforme Santos e Costa, (2006) as condições econômico-sociais e políticas para o surgimento da denominada questão social estão diretamente articulados ao amplo desenvolvimento das forças produtivas, com a expansão do industrialismo e a ampliação de mercados no século XIX. Na economia são alterados os processos e as relações de produção, as máquinas são incorporadas ao processo produtivo desencadeando uma nova dinâmica industrial que pressupõe a concentração de mão de obra nas cidades e a existência de uma nova disciplina na fábrica. Desta forma, os novos processos e relações de produção afetam o operariado emergente em suas condições de vida e de existência social em termos materiais e políticos. Na grande indústria o grande capital eliminou os entraves à sua plena expansão. Com a introdução da máquina os trabalhadores passaram a ser vistos como apêndices desta, motivo de revolta por parte das massas trabalhadoras. Esse processo, denominado Movimento de Reconceituação, desloca o debate da profissão do “metodologismo” até então reinante, para o debate das relações sociais nos marcos 4 4 do capitalismo, e com ele passa a dar ampla visibilidade à política social como espaço de luta para a garantia dos direitos sociais (FALEIROS, 1990). Fonte: www.uel.br Nesse contexto, segundo Campos (1988), a política social alçou um estatuto teórico, no âmbito do Serviço Social, que lhe permitiu realizar a articulação entre a perspectiva analítica de sociedade e de profissão. Isso foi possível, por um lado, em razão da gênese da profissão vincular-se ao contexto de enfrentamento da questão social através das políticas sociais, assegurando as condições necessárias para a expansão do capitalismo monopolista (CARVALHO, IAMAMOTO, 1982, NETTO, 1992, MONTAÑO, 1998. Apud MIOTO, NOGUEIRA, 2013). Por outro lado, há o reconhecimento de que a política social reveste-se de um caráter contraditório, pois, ao mesmo tempo em que atende aos interesses do capital, atende também às necessidades da classe trabalhadora. Portanto, a sua expansão é marcada pela luta dos trabalhadores na perspectiva da conquista e da consolidação dos direitos sociais (IAMAMOTO, 2003; YAZBEK, 2000; PEREIRA, 2008). No Brasil, o debate instaurado em torno da profissão, e sobre a relação visceral entre Serviço Social e política social, floresceu e aprofundou-se significativamente ao longo das duas últimas décadas do século 20 e consolida-se no início do século 21. Isso pode ser explicado pela alteração nos sistemas de proteção social dos brasileiros, 5 5 após o retorno do país ao Estado de Direito em 1985, período de intensa mobilização da sociedade civil, no sentido de ampliar e garantir direitos em setores de ponta, ou seja, o núcleo duro da política social – saúde, previdência e assistência, e de forte investimento nos marcos profissionais, para expandir os saberes sobre a relação entre questão social e política social. Fonte: www.fespmg.edu.br Estabelece-se um amplo processo de produção de conhecimento em torno da política social, que tem se constituído em um pilar central na consolidação do Serviço Social como área de conhecimento no campo das ciências sociais. Este fato favoreceu tanto a inserção da profissão e de seus profissionais no embate político da sociedade brasileira como, também, a discussão sobre a intervenção profissional dos assistentes sociais no terreno da política social. Esse processo, denominado Movimento de reconceituação, desloca o debate da profissão do “metodologismo” até então reinante, para o debate das relações sociais nos marcos do capitalismo, e com ele passa a dar ampla visibilidade à política social como espaço de luta para a garantia dos direitos sociais (FALEIROS, 1990). Nesse contexto, segundo Campos (1988), a política social alçou um estatuto teórico, no âmbito do Serviço Social, que lhe permitiu realizar a articulação entre a perspectiva analítica de sociedade e de profissão. Essa trajetória lhes possibilitou o 6 6 diálogo com uma argumentação mais consistente junto aos defensores do “produtivismo econômico” da tecnocracia brasileira. Fonte: servicosocial.ulusofona.pt Período de intensa mobilização de segmentos da sociedade civil, no sentido de ampliar e garantir direitos em setores de ponta, ou seja, o núcleo duro da política social – saúde, previdência e assistência – e de forte investimento nos marcos profissionais, para expandir os saberes sobre a relação entre questão social e política social. Estabelece-se um amplo processo de produção de conhecimento em torno da política social, que tem se constituído em um pilar central na consolidação do Serviço Social como área de conhecimento no campo das ciências sociais. Este fato favoreceu tanto a inserção da profissão e de seus profissionais no embate político da sociedade brasileira como, também, a discussão sobre a intervenção profissional dos assistentes sociais no terreno da política social. Em relação ao conhecimentoproduzido, Iamamoto, (2004) destaca o privilégio de uma categoria profissional que atua “na transversalidade das múltiplas expressões da questão social, na defesa dos direitos sociais e humanos e das políticas públicas que os materializam”. Esta situação, de acordo com Simionatto (2004), não significou unicamente o aumento da produção de conhecimento sobre o tema, mas uma crescente 7 7 qualificação em termos de rigor teórico-metodológico e um sensível aprofundamento da discussão dos processos sociais contemporâneos. Fonte: cursosindesfor.com.br Com referência a intervenção profissional, observa-se que a inclusão da política social no debate da profissão permitiu situar mais concretamente os seus objetivos na sociedade capitalista. Pôde-se sobrepor, no campo da intervenção, a questão do “por que fazer” à do “como fazer”. Com o aprofundamento da investigação sobre a inter- relação política social e Serviço Social nas bases da teoria social crítica, pôde-se avançar o conhecimento em direção ao “para que fazer”. As proposições daí advindas constituíram as bases de um projeto profissional para os assistentes sociais brasileiros, construído coletivamente e conhecido como Projeto Ético-Político Profissional (MIOTO, 2009). A partir da Constituição Federal de 1988, foi possível vislumbrar, no campo da política social, uma confluência virtuosa entre os dispositivos legais que foram sendo criados para a implementação do projeto da Seguridade Social brasileiro – Lei Orgânica da Saúde, Lei Orgânica da Assistência Social – e o movimento da categoria profissional em torno de seu Projeto Ético-político Profissional. 8 8 Um projeto que postula o “posicionamento” em favor da equidade e justiça social, que assegura a universalidade de acesso aos bens e serviços relativos aos programas e às políticas sociais, bem como sua gestão democrática”, além do “compromisso com a qualidade dos serviços prestados à população e com o aprimoramento intelectual, na perspectivada competência profissional. Porém, duas situações provocaram a ruptura desta relação virtuosa, encaminhando-se para uma divergência séria que merece ser trazida ao debate. Primeiramente, a reversão praticada, ainda na década de 1990 nas proposições fundamentais da Seguridade Social brasileira, quebrando as expectativas de parte da sociedade de ampliação de direitos sociais. A forma complexa das demandas, em termos quantitativos e qualitativos, além do desenho e da maneira de institucionalização dos programas sociais, influenciados pelas matrizes de regulação das agências multilaterais de financiamento e fomento, com exigências de avaliação de ordem quantitativa e de intenso controle gerencial- burocrático sobre as ações desenvolvidas e os resultados obtidos (VARANDAS, STABILE, ATHAURI, 2007). Fonte: pt.slideshare.net As duas situações, além de produzirem impactos significativos nos processos interventivos dos assistentes sociais, revelam a existência de questões relativas ao 9 9 tratamento da intervenção nas políticas sociais, no âmbito da profissão, que merecem ser abordadas. A exposição está organizada em dois tópicos. O primeiro, trata da relação entre a política social brasileira e a intervenção profissional, em uma breve retrospectiva histórica, marcando os valores profissionais, o espaço da intervenção e a sua convergência ou divergência com as políticas públicas da área social. O segundo, particulariza o debate sobre a intervenção e sua relação com a política social, compreensão favorecida a partir do enquadre do primeiro tópico, no que se refere à expansão e à complexidade das demandas e às respostas oferecidas em termos de princípios e desenhos institucionais. Os desdobramentos econômicos e sociais da divisão do trabalho colocam às necessidades sociais que implicam nas demandas de intervenção social a partir das políticas sociais, configurando na base sócio- ocupacional do Serviço Social ((JUNQUEIRA, 1980. Apud MIOTO, NOGUEIRA, 2013). Netto (1992) ao analisar a emergência do Serviço Social como profissão coloca que é particularmente na intercorrência do conjunto dos processos econômicos, sociais, políticos e teórico-culturais ocorridos no período monopolista do capitalismo que é instaurado o espaço histórico-social que permite o surgimento do Serviço Social enquanto profissão inserida na divisão social (e técnica) do trabalho. O caminho da profissionalização do Serviço Social é, na verdade, o processo pelo qual seus agentes –ainda que desenvolvendo uma auto representação e um discurso centrados na autonomia dos seus valores e da sua vontade–se inserem em atividades interventivas cuja dinâmica, organização, recursos e objetivos são determinados para além de seu controle [...] precisamente quando passam a desempenhar papéis que lhes são alocados por organismos e instâncias alheios às matrizes originais das plataformas do Serviço Social é que os agentes se profissionalizam (NETTO, 1992). 10 10 Fonte: www.youtube.com O processo de instauração do Serviço Social baseia-se nas modalidades de intervenção do Estado burguês na questão social, tipificadas nas políticas sociais. Estas, por sua vez, além de suas dimensões políticas, também se constituem como conjuntos de procedimentos técnico-operativos, o que implica na necessidade de agentes técnicos que não só formulem, mas também implementem políticas sociais (NETTO, 1992). O caráter executivo das políticas sociais envolve a demanda de vários atores ou profissionais dentre eles os que prioritariamente atuam no patamar terminal da ação executiva. Ou seja, atuam no ponto em que as vítimas das sequelas e refrações da questão social são respondidas de forma direta e imediata, tal resposta articulada às políticas sociais setoriais. O campo para o desenvolvimento das atribuições profissionais é bastante amplo se considerarmos de um lado a natureza inclusiva das políticas sociais e o caráter dos serviços cuja tendência é se desenvolver nas mais variadas direções. A intervenção profissional realiza-se à margem das instâncias de formulação de diretrizes e da tomada de decisões em torno das políticas sociais. A ação do assistente social se realiza no âmbito da lógica em que se inscrevem essas políticas, no espaço das estruturas técnicas, legais, burocráticas e formais. Contudo, vale ressaltar que o surgimento do Serviço Social enquanto profissão está 11 11 diretamente articulado ao capitalismo monopolista e que a denominada questão social atribui as bases para sua profissionalização (BISPO, 2010). 2.1 A política social como campo privilegiado da intervenção profissional Fonte: www.p3k.com.br Um recorrido sobre a trajetória da profissão no Brasil, desde a sua institucionalização no país até a época recortada para análise, localiza a intervenção profissional à margem do debate sobre o enfrentamento das demandas sociais pela sociedade brasileira, embora com a presença de profissionais nos quadros estatais, especialmente de âmbito federal, além da inserção em sistemas e organizações de cunho religioso e confessional. As funções desempenhadas pelos assistentes sociais, até meados da década de 1960, evidenciavam a preocupação com a integração dos indivíduos e a normalização das suas condutas. Não se discutia a relação com as políticas sociais, as quais não eram igualmente tratadas no plano analítico, tanto pelo Serviço Social como por outras áreas do conhecimento. Questões mais graves com explicações teóricas mais densas não faziam parte do cotidiano profissional. Há que se levar em conta o momento particular do Serviço Social, buscando a sua consolidação como profissão em uma área supostamente considerada como benemerência e desempenhando ações no sentido de organização da demanda aos serviçose benefícios oferecidos pelo aparato institucional público e privado (MIOTO, NOGUEIRA, 2013). 12 12 Fonte: atuacidadao13.com.br O debate sobre o significado das funções no trato das questões sociais, e destas com as questões estruturais e conjunturais passava ao largo das preocupações profissionais. Essas funções eram centradas de forma bastante endógena no interior do Serviço Social, nos processos e métodos de intervenção, autonomizados das instâncias institucionais. Internacionalmente, conectava-se com as questões relativa ao desenvolvimento e ao progresso social como uma trajetória natural a ser seguida pelos países, à época considerados subdesenvolvidos. Já a partir da segunda metade da década de 50, em clima de grande expectativa, decorrente da filosofia do pós-guerra – a do desenvolvimento – e dos primeiros planos desenvolvimentistas em implantação, o Serviço Social, ao mesmo tempo que incorporava a filosofia, reconhecia a necessidade de uma revisão de sua teoria, de sua postura e de seus métodos, como condição de melhor integrar-se nesse processo (JUNQUEIRA, 1980). Com o rápido processo de urbanização, vivenciado na década de 1970, e o empobrecimento populacional, ampliaram-se as demandas por ações no campo da proteção social aos estados e municípios. Aumentou-se a oferta de serviços, consolidando-se a rede público-privado, especialmente na proteção à criança e ao adolescente. Identifica-se a expansão dos quadros profissionais, cuja ação é polarizada entre iniciativas de desenvolvimento comunitário, atenção a segmentos populacionais bem definidos, tanto em organismos governamentais como não governamentais (MIOTO, NOGUEIRA, 2013). 13 13 Fonte: www.catanduva.sp.gov.br Situa-se, nessa época, a criação das primeiras secretarias estaduais e municipais para dar conta das novas demandas. Instaura-se o discurso do bem-estar, fazendo eco ao debate internacional. Há um aggiornamento toda profissão, que passa a assumir uma função mais definida em termos de posição jurídico administrativa, e, aparentemente, mais qualificada e com melhor posição hierárquica nas instituições recém-criadas. No final deste mesmo período, experiências isoladas trazem uma perspectiva crítica ao fazer do assistente social, descolando-se do discurso dominante do tecnicismo, decorrente este tanto da influência americana como da influência técnica/gerencial própria da ditadura militar, e também das explicações reducionistas sobre a relação entre estrutura e questão social (MIOTO, NOGUEIRA, 2013). A lógica dos programas e projetos sociais aparece no bojo do racionalismo técnico instituído, configurando o momento da emergência dos processos de planejamento como forma de orientar e controlar as mudanças sociais. Entretanto, o método de formulação e acompanhamento do planejamento estatal, em quaisquer dos níveis federativos, foi feito de maneira pontual e assistemática, sempre em termos dos grandes objetivos. 14 14 Fonte: www.canalibase.org.br Tal favorecia a autonomia da ação profissional, mesmo quando divergente da postura oficial dominante, pois as instâncias de controle não detinham a apreensão dos processos interventivos locais e particulares. Nessa época, a política social vai sendo apreendida em sua relação com a questão social, e a criação dos programas de pós-graduação favorece uma leitura mais crítica sobre a realidade brasileira, com a perspectiva máxima paulatinamente inscrita na produção teórica de segmentos da categoria profissional (MIOTO, NOGUEIRA, 2012). O retorno ao Estado de Direito, em 1985, traz um novo alento à profissão, principalmente com a Constituição, em 1988. Esta incorpora o ideário dos direitos sociais, definindo uma perspectiva, no plano constitucional, de valores éticos, caros aos assistentes sociais. Assim como a garantia da proteção social universal sob a responsabilidade do Estado, especialmente no campo da saúde e da assistência social. A intervenção profissional volta-se para a implementação das políticas nacionais. No primeiro momento, logo após o fim da ditadura, é observada a identificação entre os valores profissionais e os dispositivos constitucionais relativos aos direitos sociais (SILVA, 2007). Verifica-se, entretanto, uma assimetria entre a prática do assistente social, continuando o fazer de épocas anteriores, em contraste com os valores atualizados, como a igualdade na fruição dos direitos, a participação democrática e a proteção universal, sob a égide do Estado em algumas políticas sociais. Dura pouco tempo a 15 15 convergência de princípios e valores entre o Serviço Social e as políticas governamentais (MIOTO, NOGUEIRA, 2012). Fonte: slideplayer.com.br O círculo virtuoso rompe-se, pelo menos em duas direções – no campo profissional e no plano das políticas nacionais de proteção social. No plano profissional, não houve o tempo necessário para o reordenamento das práticas para uma perspectiva condizente com as possibilidades de sedimentação dos direitos sociais, oferecidas pelo novo momento. Uma das explicações possíveis para este fato foi a forma de apropriação do novo currículo construído com base na teoria crítica que, no plano ético, posiciona-se radicalmente ao lado da classe trabalhadora. 2.2 Desafios Cotidianos do Assistente Social nas Políticas Públicas Para identificar o modo como os assistentes sociais executam o seu exercício profissional, torna-se necessário reconhecer que o Serviço Social vem se constituindo como profissão, inscrito na divisão social e técnica do trabalho, regulamentada pela Lei nº 8662/93, de 07 de junho de 1993, com alterações determinadas pelas 16 16 resoluções CFESS nº 290/94 e nº 293/94, e balizada pelo Código de Ética, aprovado através da resolução CFESS nº 273/93, de 13 de março de 1993. Fonte: br.linkedin.com É uma profissão reconhecida pela sua natureza analítica e interventiva, o que legitima os assistentes sociais a planejar e construir respostas profissionais mediatizadas pelas necessidades sociais identificadas com experiência pelos sujeitos que vivem nesta realidade social. O assistente social atua nas mais diversas políticas sociais, contratado pelo Estado para planejar, executar, monitorar e avaliar as ações. Ou seja, o Serviço Social é uma profissão requisitada pelo Estado e suas instâncias para atender as necessidades sociais -via políticas sociais -decorrentes das expressões da "questão social" (TORRES, LANZA, SILVA, CAMPOS, 2009). De acordo a identificação de tais necessidades, toma como referência: o reconhecimento das expressões da "questão social"; a análise da realidade social; identifica demandas de atendimento e finca a atuação calcada na perspectiva dos direitos. Portanto, o assistente social atua nas contradições inerentes a constituição da sociedade capitalista e ao mesmo tempo em que responde aos interesses do empregador, interpreta o campo ocupacional no qual se insere como trabalhador assalariado. Por meio de um conjunto de saberes decorrentes do seu processo formativo, constrói respostas profissionais direcionadas as demandas apresentadas pela população usuária, bem como aquelas propostas pelo empregador. Neste sentido, o exercício profissional é construído a partir do entendimento que o profissional tem das 17 17 dimensões que são constitutivas do seu fazer profissional –interventiva, ético-política; analítica e investigativa. Fonte: www.ufba.br Observando o trabalho realizado pelos assistentes sociais vale dizer que deve ser analisado por meio de suas particularidades; no modo como os profissionais analisam as contradições constitutivas da realidade social e efetivam suas atividades. Assim, a este profissional “[...] remete à compreensão do espaço institucional, enquanto expressão dascontradições sociais, [...]” (SILVA; SILVA, 1995), bem como as implicações destas contradições nas condições objetivas de vida dos usuários que buscam no trabalho deste profissional as respostas às suas necessidades. Desde os primórdios da profissão, o trabalho desenvolvido pelos assistentes sociais é direcionado majoritariamente à população que vive em condição de pobreza. Excluída do processo produtivo, da produção de bens e serviços, essa população procura no assistente social o profissional que poderá ampará-la, orientá-la para que possa superar suas necessidades sociais. Atua nas mais diversas políticas públicas, sendo reconhecido como um dos protagonistas na produção do conhecimento sobre: proteção social; contradições inerentes ao modo de produção capitalista; implicações das desigualdades nas condições objetivas de vida da população, entre outros temas essenciais para interpretar a realidade social. 18 18 Fonte: cursosindesfor.com.br A medida em que é requisitado por quem o contratou para construir respostas profissionais, o assistente social também tem reconhecido seus saberes, o que legitima o seu fazer. Esta legitimação não está somente na intervenção em si mas decorre do modo como aqueles que requisitam o trabalho do assistente social reconhecem seus saberes, sua capacidade argumentativa e, conferem e dão aval ao fazer deste profissional. Outro aspecto fundamental para o reconhecimento do exercício profissional do assistente social é identificar as condições objetivas onde este trabalho é realizado; ao mesmo tempo em que é necessário entender o porquê do Serviço Social ser considerado uma profissão que colabora para dar vida e visibilidade às organizações onde os profissionais executam suas ações (LACERDA, 2014). Assim, "as condições que peculiarizam o exercício profissional são uma concretização da dinâmica das relações sociais vigentes na sociedade, em determinadas conjunturas históricas [...] a atuação do assistente social é necessariamente polarizada pelos interesses de tais classes, tendendo a ser cooptada por aqueles que têm uma posição dominante (IAMAMOTO, CARVALHO, 1983). 19 19 É perceptível o quanto essas relações estabelecidas no cotidiano profissional bem como o conhecimento associado a elas colaboram para o estabelecimento de uma cultura profissional, ora associada ao consenso, a minimização dos conflitos, ora associada à defesa de um projeto societário em consonância ao projeto ético-político. A cultura profissional revela hoje as contradições de experiências pelos assistentes sociais no seu cotidiano profissional, o que reflete a luta pela hegemonia da direção que se quer para o Serviço Social na contemporaneidade. Num certo sentido os profissionais reconhecem que o Serviço Social vem ganhando visibilidade e qualidade analítica quando se concretiza a partir de uma articulação de saberes que lhe garantem consistência argumentativa. O que se observa é que a discussão do conhecimento pode ser identificada como algo distante do trabalho realizado pelo assistente social que se reconhece como profissional da prática, ou seja, a dinâmica imposta nos campos ocupacionais, as precárias condições de trabalho possibilitam pouco espaço para que estes profissionais possam analisar do ponto de vista teórico –metodológico ético e político seu exercício profissional ((BARROCO, 2001. Apud TORRES, FREITAS, MONTAGNINI, 2015). Isso favorece a reprodução das atividades determinadas pela organização que contrata seus serviços, sem questionamentos-não necessariamente com o objetivo de se contrapor a elas, mas sim de analisar, com vistas a construção de respostas profissionais critico e criativas que de fato tenham relação com a realidade social, com o projeto ético-político e com as condições objetivas de vida do usuário, sujeito desse processo. Fonte: grupouninova.com.br 20 20 3 A ASSISTÊNCIA SOCIAL COMO POLÍTICA DE SEGURIDADE SOCIAL Fonte: www.sinasefern.org.br A política de Assistência Social, legalmente reconhecida como direito social e dever estatal pela Constituição de 1988 e pela Lei Orgânica de Assistência Social (LOAS), vem sendo regulamentada intensivamente pelo Governo Federal, com aprovação pelo Conselho Nacional de Assistência Social (CNAS), por meio da Política Nacional de Assistência Social (2004) e do Sistema Único de Assistência Social (2005) (CAMPOS, OLIVEIRA, 2014). O objetivo com esse processo é consolidar a Assistência Social como política de Estado; para estabelecer critérios objetivos de partilha de recursos entre os serviços sócio assistenciais e entre estados, DF e municípios; para estabelecer uma relação sistemática e interdependente entre programas, projetos, serviços e benefícios, como o Benefício de Prestação Continuada (BPC) e o Bolsa Família, para fortalecer a relação democrática entre planos, fundos, conselhos e órgão gestor; para garantir repasse automático e regular de recursos fundo a fundo e para instituir um sistema informatizado de acompanhamento e monitoramento, até então inexistente. Para a efetivação da Assistência Social como política pública, contudo, é imprescindível sua integração e articulação à seguridade social e às demais políticas sociais. Por isso, a concepção de Assistência Social e sua materialização em forma de proteção social básica e especial (de média e alta complexidades), conforme 21 21 previsto na PNAS/SUAS, requer situar e articular estas modalidades de proteção social ao conjunto das proteções previstas pela Seguridade Social (OLIVEIRA, 2010). Dito de outro modo, a Assistência Social não pode ser entendida como uma política exclusiva de proteção social, mas deve-se articular seus serviços e benefícios aos direitos assegurados pelas demais políticas sociais, a fim de estabelecer, no âmbito da Seguridade Social, um amplo sistema de proteção social. Nessa perspectiva, a intervenção profissional na política de Assistência Social não pode ter como horizonte somente a execução das atividades arroladas nos documentos institucionais, sob o risco de limitar suas atividades à “gestão da pobreza” sob a ótica da individualização das situações sociais e de abordar a questão social a partir de um viés moralizante. Fonte: www.cfess.org.br Isso significa que a complexidade e diferenciação das necessidades sociais, conforme apontada no SUAS e na PNAS, e que atribui à Assistência Social as funções de proteção básica e especial, com foco de atuação na “matricialidade sócio familiar”, não deve restringir a intervenção profissional, sobretudo a do/a assistente social, às abordagens que tratam as necessidades sociais como problemas e responsabilidades individuais e grupais (CAMPOS, OLIVEIRA, 2014). Isso porque todas as situações sociais vividas pelos sujeitos que demandam a política de Assistência Social têm a mesma estrutural e histórica raiz na desigualdade de classe e suas determinações, que se expressam pela ausência e precariedade de 22 22 um conjunto de direitos como emprego, saúde, educação, moradia, transporte, distribuição de renda, entre outras formas de expressão da questão social. Na PNAS, a Proteção Social Especial refere-se a serviços mais especializados, destinados a pessoas em situações de risco pessoal ou social, de caráter mais complexo, e se diferenciaria da proteção social básica por “se tratar de um atendimento dirigido às situações de violação de direitos”. Assim, é fundamental que os/as trabalhadores/as envolvidos/as na implementação do SUAS tenham clareza das funções e possibilidades das políticas sociais que integram a Seguridade Social, de modo a não atribuir à Assistência Social a intenção e o objetivo hercúleo e inatingível de responder a todas as situações de exclusão, vulnerabilidade, desigualdade social (SILVA,FERREIRA, 2013). Essas são situações que devem ser enfrentadas pelo conjunto das políticas públicas, a começar pela política econômica, que deve se comprometer com a geração de emprego e renda e distribuição da riqueza. A definição dos campos de proteção social (básica ou especial) que compete à assistência e às demais políticas sociais é fundamental, não por mero preciosismo conceitual, mas por outras razões. Primeiro, porque o sentido de proteção social extrapola a possibilidade de uma única política social e requer o estabelecimento de um conjunto de políticas públicas que garantam direitos e respondam a diversas e complexas necessidades básicas (PEREIRA, 2000) da vida social. Desse modo, à Assistência Social não se pode atribuir a tarefa de realizar exclusivamente a proteção social. Fonte: waltersorrentino.com.br 23 23 Esta compete, articuladamente, às políticas de emprego, saúde, Previdência, habitação, transporte e Assistência, nos termos do artigo 60 da Constituição Federal. Se esta articulação não for estabelecida, corre-se dois riscos: o primeiro, de dimensionar a Assistência Social e atribuir a ela funções e tarefas que competem ao conjunto das políticas públicas; e o segundo, de restringir o conceito de proteção social aos serviços sócio assistenciais; neste caso, o conceito de proteção social passa a ser confundido com a Assistência Social e perde sua potencialidade de se constituir em amplo conjunto de direitos sociais. Fonte: pt.slideshare.net Outra razão, de ordem prática, é que o tipo de serviços sócio assistenciais (de proteção social básica ou especial) executados pelos municípios e estados será definidor do montante de recursos que o Governo Federal repassará aos Fundos de Assistência Social, já que os pisos estabelecidos na Norma Operacional Básica (NOB/SUAS) diferenciam-se para cada tipo de proteção social. Portanto, é preciso ter clareza de quais são os direitos da Assistência Social que serão executados nas modalidades de proteção básica e especial, pois sua configuração definirá o montante de recursos que cada município, estado e/ou DF receberá de recursos. Com base nessa compreensão de Assistência Social e nas normas regulamentadoras das profissões, apontamos a seguir algumas referências relativas à intervenção de assistentes sociais no âmbito do SUAS (CORRÊA, MAGALHÃES, 2017). 24 24 4 ASSISTÊNCIA SOCIAL É POLÍTICA PÚBLICA Fonte: fortalecerpsi.com.br O Serviço Social como profissão, em sete décadas de existência no Brasil e no mundo, ampliou e vem ampliando o seu raio ocupacional para todos os espaços e recantos onde a questão social explode com repercussões no campo dos direitos, no universo da família, do trabalho e do “não trabalho”, da saúde, da educação, dos/as idosos/as, da criança e dos/as adolescentes, de grupos étnicos que enfrentam a investida avassaladora do preconceito, da expropriação da terra, das questões ambientais resultantes da socialização do ônus do setor produtivo, da discriminação de gênero, raça, etnia, entre outras formas de violação dos direitos. Tais situações demandam ao Serviço Social projetos e ações sistemáticas de pesquisa e de intervenção de conteúdos mais diversos, que vão além de medidas ou projetos de Assistência Social. Os/as assistentes sociais possuem e desenvolvem atribuições localizadas no âmbito da elaboração, execução e avaliação de políticas públicas, como também na assessoria a movimentos sociais e populares. O primeiro curso de Serviço Social no Brasil surgiu em 1936 e sua regulamentação ocorreu em 1957. O processo de conceituação gestado pelo Serviço Social desde a década de 1960 permitiu à profissão enfrentar a formação tecnocrática conservadora e construir coletivamente um projeto ético-político profissional expresso no currículo mínimo de 1982 e nas diretrizes curriculares de 1996 e no Código de Ética 25 25 de 1986 e 1993, nos quais as políticas sociais e os direitos estão presentes como uma importante mediação para construção de uma nova sociabilidade. Trata-se de uma profissão de nível superior, que exige de seus/suas profissionais formação teórica, técnica, ética e política, orientando-se por uma Lei de Regulamentação Profissional e um Código de Ética. A Assistência Social, como um conjunto de ações estatais e privadas para atender a necessidades sociais, no Brasil, também apresentou nas duas últimas décadas uma trajetória de avanços que a transportou, da concepção de favor, da pulverização e dispersão, ao estatuto de Política Pública e da ação focal e pontual à dimensão da universalização. A Constituição Federal de 1988 situou-a no âmbito da Seguridade Social e abriu caminho para os avanços que se seguiram (SILVA, OLIVEIRA, 2015). Fonte: slideplayer.com.br A Assistência Social, desde os primórdios do Serviço Social, tem sido um importante campo de trabalho de muitos/as assistentes sociais. Não obstante, não pode ser confundida com o Serviço Social, pois confundir e identificar o Serviço Social com a Assistência Social reduz a identidade profissional, que se inscreve em um amplo espectro de questões geradas com a divisão social, regional e internacional do trabalho. Que possui interface com todas as políticas públicas e envolve, em seus processos operativos, diversificadas entidades públicas e privadas, muitas das quais sequer contam com assistentes sociais em seus quadros, mas com profissionais de outras áreas ou redes de apoio voluntárias nacionais e internacionais. 26 26 Serviço Social, portanto, não é e não deve ser confundido com Assistência Social, embora desde a origem da profissão, os/as assistentes sociais atuem no desenvolvimento de ações sócio assistenciais, assim como atuem nas políticas de saúde, educação, habitação, trabalho, entre outras ((PASTORINI, 1997. Apud PIANA, 2008). Fonte: http://uniateneu.edu.br/ A identidade da profissão não é estática e sua construção histórica envolve a resistência frente às contradições sociais que configuram uma situação de barbárie, decorrentes do atual estágio da sociabilidade do capital em sua fase de produção destrutiva, com graves consequências na força de trabalho. A política de Assistência Social, por sua vez, comporta equipes de trabalho profissionais, sendo que a formação, experiência e intervenção histórica dos/as assistentes sociais nessa política social não só os habilitam a compor as equipes de trabalhadores/as, como atribuem a esses/as profissionais um papel fundamental na consolidação da Assistência Social como direito de cidadania. A Seguridade Social deve pautar-se pelos princípios da universalização, da qualificação legal e legítima das políticas sociais como direito, do comprometimento e dever do Estado, do orçamento redistributivo e da estruturação radicalmente democrática, descentralizada e participativa (CORRÊA, MAGALHÃES, 2017). Os movimentos específicos do Conjunto CFESS-CRESS na luta pela instituição e consolidação da Assistência Social como política pública e dever estatal situam-se 27 27 nesta compreensão de direitos, Seguridade Social e cidadania. Esta tem sido a bússola que vem orientando, historicamente, sua ação em momentos importantes no processo de reconhecimento da Assistência Social como direito social e política de Seguridade Social, entre os quais cabe destacar: Durante a Constituinte (1987-1988), o CFESS participou ativamente nas subcomissões e Comissão da Ordem Social, sendo um ardoroso defensor da Seguridade Social como amplo sistema de proteção social, que deveria incluir a Assistência Social. Neste processo, contrapôs-se às forças que defendiam que a Seguridade Social deveria se limitar à Previdência Social; Fonte: advocaciamaar.com.br No transcorrer do processo de elaboração e aprovação da Lei Orgânica da AssistênciaSocial (LOAS, 1989-1993), o Conjunto CFESS-CRESS combateu ferozmente o veto do então Presidente Collor ao primeiro Projeto de LOAS; articulou a elaboração e apresentação ao Congresso de um amplo e alargado Projeto de Lei de Assistência Social (que infelizmente não foi aprovado); lutou no âmbito do Legislativo contra vários Projetos de Lei que defendiam ações extremamente restritivas de Assistência Social; apresentou inúmeras emendas ao Projeto de Lei que veio a ser aprovado e sancionado em 1993, no intuito de ampliar a renda per capita para acesso ao Benefício de Prestação Continuada (BPC), incluir diferente programas, projetos e serviços e garantir a descentralização e o 28 28 exercício do controle social de forma autônoma pelos Conselhos nas três esferas (muitas foram acatadas); Após a aprovação da LOAS, o CFESS continuou lutando arduamente para sua implementação: entrou com ação judicial para que o Conselho Nacional de Assistência Social (CNAS) fosse instituído em 1994; participou de cinco gestões no CNAS, representando o segmento dos/as trabalhadores/as; elaborou e publicou diversas manifestações em defesa do cumprimento da LOAS e, mais recentemente, do SUAS; em todos os estados brasileiros, os CRESS inseriram-se nas lutas pela formulação das leis orgânicas estaduais e municipais de Assistência Social e pela instituição dos conselhos de Assistência Social. 5 A GESTÃO DE TRABALHO NO SISTEMA ÚNICO DE ASSISTÊNCIA SOCIAL As possibilidades de atuação profissional não podem ser desvinculadas das condições e processos em que se realiza o trabalho. É nesse sentido que as competências e atribuições profissionais devem se inserir na perspectiva da gestão do trabalho em seu sentido mais amplo, que contempla ao menos três dimensões indissociáveis: as atividades exercidas pelos/as trabalhadores/as, as condições materiais, institucionais, físicas e financeiras, e os meios e instrumentos necessários ao seu exercício (ALVES, 2009. Apud PERES, 2016). Fonte: direitodetodos.com.br 29 29 A garantia e articulação dessas dimensões são fundamentais para que os/as trabalhadores/as possam atuar na perspectiva de efetivar a política de Assistência Social e materializar o acesso da população aos direitos sociais. A natureza da atuação dos/as profissionais referenciada neste documento está, em grande medida, condicionada à realização das demais dimensões. Fonte: sindiquimicos.org.br O estabelecimento de relações de trabalho estáveis, a garantia institucional e condições e meios necessários à realização das atividades são indispensáveis para o exercício profissional. Nessa perspectiva, o trabalho precário que se manifesta na ausência das dimensões anteriormente citadas, nos baixos salários, na elevada carga de trabalho, na alta rotatividade, na inexistência de possibilidades institucionais para atender às demandas dos/as usuários/as, entre outros, é um obstáculo para a atuação profissional, para a universalização das políticas sociais, para as relações entre trabalhadores/as e usuários/as e para a qualidade e continuidade dos programas, projetos e serviços (PEREIRA, 2008. Apud PERES, 2016). A implantação de uma política de reconhecimento e valorização do/a trabalhador/a e a concretização da NOB/RH/SUAS, com implementação do Plano de Cargos, Carreiras e Salários (PCCS), aprovada em 2007, são imprescindíveis para assegurar as condições de materialização do trabalho dos/as profissionais que atuam no SUAS (CORRÊA, MAGALHÃES, 2017). No que se refere à autonomia do trabalho, as condições objetivas de estruturação do espaço institucional devem assegurar 30 30 aos/às profissionais o direito de realizar suas escolhas técnicas no circuito da decisão democrática, garantir a sua liberdade para pesquisar, planejar, executar e avaliar o processo de trabalho, permitir a realização de suas competências técnica e política nas dimensões do trabalho coletivo e individual e primar pelo respeito aos direitos, princípios e valores ético-políticos profissionais estabelecidos nas regulamentações profissionais (BEHRING, 2003). Fonte: www.cress-mg.org.br No que se refere às condições físicas e técnicas de exercício profissional, alguns procedimentos exigem a garantia de espaço para atendimentos individuais e coletivos, bem como local adequado para a guarda de prontuários e documentos pertinentes ao atendimento aos/às usuários/as. A qualidade na atuação profissional implica na realização de educação permanente em Assistência Social e destinação de recursos para a supervisão técnica sistemática. A carga horária de trabalho deve assegurar tempo e condições para o/a profissional responder com qualidade às demandas de seu trabalho, bem como reservar momentos para estudos e capacitação continuada no horário de trabalho, além de garantir apoio ao/à profissional para participação em cursos de especialização, mestrado ou equivalentes, que visam à qualificação e aprimoramento profissional (MIOTO, NOGUEIRA, 2012). A ausência de espaços de reflexão dos referenciais teóricos e metodológicos que subsidiam o trabalho da equipe interdisciplinar gera dificuldade na compreensão 31 31 do papel e atribuições dos/as profissionais, tanto por parte dos/as gestores/as, quanto dos/as próprios/as trabalhadores/as. Dessa forma, ações de educação permanente devem ser planejadas com base na identificação das necessidades dos (as) profissionais, e levando em consideração as características das demandas locais e regionais. A atuação na Assistência Social ocorre em espaços institucionais e de mediação social junto aos movimentos sociais e populares. Fonte: unilins.edu.br Valores, ideologias, relações sociais e políticas são constitutivos das práticas realizadas nesses espaços. Como seres históricos e sociais, os/as profissionais são sujeitos e investigadores/as dos fenômenos e processos com os quais trabalham. A luta pela competência profissional é fruto do trabalho coletivo e da mobilização social pela garantia dos direitos dos/as trabalhadores/as, pela universalização dos direitos sociais e pela consolidação da Assistência Social como política pública e dever do Estado (PIANA, 2009). Os/as assistentes sociais foram os/as primeiros/as a se mobilizar em defesa da assistência social como direito. Essa luta não se deu de forma isolada. Desde sempre, esses/as profissionais se articularam aos movimentos da classe trabalhadora, dentre os quais, os/as usuários/as da assistência social. Essa articulação se deu e se dá desde o estímulo à organização dos/as usuários/as, passando pela sua mobilização como sujeitos individuais e coletivos, até a construção e fortalecimento de espaços de representação e controle democrático, onde possam ter voz e ação (MIOTO, NOGUEIRA, 2012). 32 32 Essa postura pauta-se na atitude e posicionamento político de compreender e de reconhecer os/as usuários/as como sujeitos históricos, o que implica “fazer com”, significa assumir uma atitude profissional que potencializa as ações dos sujeitos. Tal posicionamento pode, aparentemente, parecer “banal”, mas ele nem sempre prevalece nos espaços profissionais, e requer um compromisso político e uma atitude profissional. Contribuir para o fortalecimento do protagonismo dos/as usuários/as, portanto, exige compromisso político e profissional com a classe trabalhadora e com transformações radicais que tenham como projeto a socialização da riqueza socialmente construída, ao contrário do que acontece na sociedade atual, com a apropriação privada da riqueza. Só por esse caminho os/as usuários/as realmente serão protagonistas de uma história a favor da classe trabalhadora. 6 O TRABALHO DO/A ASSISTENTE SOCIAL NA ASSISTÊNCIA SOCIAL Fonte: cursosabrafordes.com.br As atribuições e competências dos/as profissionaisde Serviço Social, sejam aquelas realizadas na política de Assistência Social ou em outro espaço sócio ocupacional, são orientadas e norteadas por direitos e deveres constantes no Código de Ética Profissional e na Lei de Regulamentação da Profissão, que devem ser 33 33 observados e respeitados, tanto pelos/as profissionais, quanto pelas instituições empregadoras. No que se refere aos direitos dos/as assistentes sociais, o artigo 2º do Código de Ética assegura: Art. 2º - Constituem direitos do/a assistente social: a) garantia e defesa de suas atribuições e prerrogativas, estabelecidas na Lei de Regulamentação da Profissão e dos princípios firmados neste Código; b) livre exercício das atividades inerentes à profissão; c) participação na elaboração e gerenciamento das políticas sociais, e na formulação e implementação de programas sociais; d) inviolabilidade do local de trabalho e respectivos arquivos e documenta- ção, garantindo o sigilo profissional; e) desagravo público por ofensa que atinja a sua honra profissional; f) aprimoramento profissional de forma contínua, colocando-o a serviço dos princípios deste Código; g) pronunciamento em matéria de sua especialidade, sobretudo quando se tratar de assuntos de interesse da população; h) ampla autonomia no exercício da profissão, não sendo obrigado a prestar serviços profissionais incompatíveis com as suas atribuições, cargos ou funções; i) liberdade na realização de seus estudos e pesquisas, resguardados os direitos de participação de indivíduos ou grupos envolvidos em seus trabalhos. No que se refere aos deveres profissionais, o artigo 3º estabelece: Art. 3º - São deveres do/a assistente social: a) desempenhar suas atividades profissionais, com eficiência e responsabilidade, observando a Legislação em vigor; b) utilizar seu número de registro no Conselho Regional no exercício da profissão; c) abster-se, no exercício da profissão, de práticas que caracterizem a censura, o cerceamento da liberdade, o policiamento dos comportamentos, denunciando sua ocorrência aos órgãos competentes; d) participar de programas de socorro à população em situação de calamidade pública, no atendimento e defesa de seus interesses e necessidades. Tendo em vista o disposto acima, o perfil do/a assistente social para atuar na política de Assistência 34 34 Social deve afastar-se das abordagens tradicionais funcionalistas e pragmáticas, que reforçam as práticas conservadoras que tratam as situações sociais como problemas pessoais que devem ser resolvidos individualmente. O reconhecimento da questão social como objeto de intervenção profissional (conforme estabelecido nas Diretrizes Curriculares da ABEPSS), demanda uma atuação profissional em uma perspectiva totalizante, baseada na identificação dos determinantes socioeconômicos e culturais das desigualdades sociais. Fonte: seguridadesocial3.com.br A intervenção orientada por esta perspectiva crítica pressupõe a assunção, pelo/a profissional, de um papel que aglutine: leitura crítica da realidade e capacidade de identificação das condições materiais de vida, identificação das respostas existentes no âmbito do Estado e da sociedade civil, reconhecimento e fortalecimento dos espaços e formas de luta e organização dos/as trabalhadores/as em defesa de seus direitos; formulação e construção coletiva, em conjunto com os/as trabalhadores/as, de estratégias políticas e técnicas para modificação da realidade e formulação de formas de pressão sobre o Estado, com vistas a garantir os recursos financeiros, materiais, técnicos e humanos necessários à garantia e ampliação dos direitos (LACERDA, 2014). 35 35 Fonte: jornal4cantos.com.br As competências e atribuições dos/as assistentes sociais, na política de Assistência Social, nessa perspectiva e com base na Lei de Regulamentação da Profissão, requisitam, do/a profissional, algumas competências gerais que são fundamentais à compreensão do contexto sócio-histórico em que se situa sua intervenção: Apreensão crítica dos processos sociais de produção e reprodução das relações sociais numa perspectiva de totalidade; Análise do movimento histórico da sociedade brasileira, apreendendo as particularidades do desenvolvimento do Capitalismo no país e as particularidades regionais; Compreensão do significado social da profissão e de seu desenvolvimento sócio-histórico, nos cenários internacional e nacional, desvelando as possibilidades de ação contidas na realidade; Identificação das demandas presentes na sociedade, visando a formular respostas profissionais para o enfrentamento da questão social, considerando as novas articulações entre o público e o privado (ABEPSS, 1996). São essas competências que permitem ao/à profissional realizar a análise crítica da realidade, para, a partir daí, estruturar seu trabalho e estabelecer as competências e atribuições específicas necessárias ao enfrentamento das situações e demandas sociais que se apresentam em seu cotidiano. As competências específicas dos/as assistentes sociais, no âmbito 36 36 da política de Assistência Social, abrangem diversas dimensões interventivas, complementares e indissociáveis: Fonte: www.acsc.com.br 1. Uma dimensão que engloba as abordagens individuais, familiares ou grupais na perspectiva de atendimento às necessidades básicas e acesso aos direitos, bens e equipamentos públicos. Essa dimensão não deve se orientar pelo atendimento psicoterapêutico a indivíduos e famílias (próprio da Psicologia), mas sim à potencialização da orientação social, com vistas à ampliação do acesso dos indivíduos e da coletividade aos direitos sociais; 2. Uma dimensão de intervenção coletiva junto a movimentos sociais, na perspectiva da socialização da informação, mobilização e organização popular, que tem como fundamento o reconhecimento e fortalecimento da classe trabalhadora como sujeito coletivo na luta pela ampliação dos direitos e responsabilização estatal; 3. Uma dimensão de intervenção profissional voltada para inserção nos espaços democráticos de controle social e construção de estratégias para fomentar a participação, reivindicação e defesa dos direitos pelos/as usuários/as e trabalhadores/as nos Conselhos, Conferências e Fóruns da Assistência Social e de outras políticas públicas; 4. Uma dimensão de gerenciamento, planejamento e execução direta de bens e serviços a indivíduos, famílias, grupos e coletividade, na perspectiva de fortalecimento da gestão democrática e participativa, capaz de produzir, intersetorial 37 37 e interdisciplinarmente, propostas que viabilizem e potencializem a gestão em favor dos/as cidadãos/ãs; Fonte: www.youtube.com 5. Uma dimensão que se materializa na realização sistemática de estudos e pesquisas que revelem as reais condições de vida e demandas da classe trabalhadora, e possam alimentar o processo de formulação, implementação e monitoramento da política de Assistência Social; 6. Uma dimensão pedagógico-interpretativa e socializadora de informações e saberes no campo dos direitos, da legislação social e das políticas públicas, dirigida aos/às diversos/as atores/atrizes e sujeitos da política: os/as gestores/as públicos/as, dirigentes de entidades prestadoras de serviços, trabalhadores/as, conselheiros/as e usuários/as. A materialização dessas diversas dimensões é prenhe de possibilidades e pode se desdobrar em diversas competências, estratégias e procedimentos específicos, com destaque para: Realizar pesquisas para identificação das demandas e reconhecimento das situações de vida da população, que subsidiem a formulação dos planos de Assistência Social; Formular e executar os programas, projetos, benefícios e serviços pró- prios da Assistência Social, em órgãos da AdministraçãoPública, empresas e organizações da sociedade civil; 38 38 Elaborar, executar e avaliar os planos municipais, estaduais e nacional de Assistência Social, buscando interlocução com as diversas áreas e políticas públicas, com especial destaque para as políticas de Seguridade Social; Formular e defender a constituição de orçamento público necessário à implementação do plano de Assistência Social; Favorecer a participação dos/as usuários/as e movimentos sociais no processo de elaboração e avaliação do orçamento público; Planejar, organizar e administrar o acompanhamento dos recursos orçamentários nos benefícios e serviços sócio assistenciais nos Centros de Referência em Assistência Social (CRAS) e Centros de Referência Especializados de Assistência Social (CREAS); Fonte: www.garopaba.sc.gov.br Realizar estudos sistemáticos com a equipe dos CRAS e CREAS, na perspectiva de análise conjunta da realidade e planejamento coletivo das ações, o que supõe assegurar espaços de reunião e reflexão no âmbito das equipes multiprofissionais; Contribuir para viabilizar a participação dos/as usuários/as no processo de elaboração e avaliação do plano de Assistência Social; prestar 22 assessoria e consultoria a órgãos da Administração Pública, empresas privadas e movimentos sociais em matéria relacionada à política de Assistência Social e acesso aos direitos civis, políticos e sociais da coletividade; 39 39 Estimular a organização coletiva e orientar/as os usuários/as e trabalhadores/as da política de Assistência Social a constituir entidades representativas; Instituir espaços coletivos de socialização de informação sobre os direitos sócio assistenciais e sobre o dever do Estado de garantir sua implementação; Assessorar os movimentos sociais na perspectiva de identificação de demandas, fortalecimento do coletivo, formulação de estratégias para defesa e acesso aos direitos; Fonte: www.amures.org.br Realizar visitas, perícias técnicas, laudos, informações e pareceres sobre acesso e implementação da política de Assistência Social; realizar estudos socioeconômicos para identificação de demandas e necessidades sociais; Organizar os procedimentos e realizar atendimentos individuais e/ou coletivos nos CRAS; Exercer funções de direção e/ou coordenação nos CRAS, CREAS e Secretarias de Assistência Social; Fortalecer a execução direta dos serviços sócio assistenciais pelas prefeituras, governo do DF e governos estaduais, em suas áreas de abrangência; Realizar estudo e estabelecer cadastro atualizado de entidades e rede de atendimentos públicos e privados; 40 40 Prestar assessoria e supervisão às entidades não governamentais que constituem a rede sócio assistencial; Participar nos Conselhos municipais, estaduais e nacional de Assistência Social na condição de conselheiro/a; Atuar nos Conselhos de Assistência Social na condição de secretário/a executivo/a; Prestar assessoria aos conselhos, na perspectiva de fortalecimento do controle democrático e ampliação da participação de usuários/as e trabalhadores/as; • organizar e coordenar seminários e eventos para debater e formular estratégias coletivas para materialização da política de Assistência Social; Participar na organização, coordenação e realização de conferências municipais, estaduais e nacional de Assistência Social e afins; Elaborar projetos coletivos e individuais de fortalecimento do protagonismo dos/as usuários/as; Acionar os sistemas de garantia de direitos, com vistas a mediar seu acesso pelos/as usuários/as; Supervisionar direta e sistematicamente os/as estagiários/as de Serviço Social. Fonte: www.cesesb.edu.br 41 41 A realização dessas competências e atribuições requer a utilização de instrumentais adequados a cada situação social a ser enfrentada profissionalmente. O uso das técnicas e estratégias não deve contrariar os objetivos, diretrizes e competências assinalados, ou seja, estes não devem ser utilizados com a perspectiva de integração social, homogeneização social, psicologização dos atendimentos individuais e/ou das relações sociais, nem se destinar ao fortalecimento de vivências e trocas afetivas em uma perspectiva subjetivista (CFESS, 2012. Apud MATOS, 2015). A definição das estratégias e o uso dos instrumentais técnicos devem ser estabelecidos pelo/a próprio/a profissional, que tem o direito de organizar seu trabalho com autonomia e criatividade, em consonância com as demandas regionais, específicas de cada realidade em que atua. A intervenção profissional, na perspectiva aqui assinalada, pressupõe enfrentar e superar duas grandes tendências presentes hoje no âmbito dos CRAS. A primeira é de restringir a atuação aos atendimentos emergenciais a indivíduos, grupos ou famílias, o que pode caracterizar os CRAS e a atuação profissional como um “grande plantão de emergências”, ou um serviço cartorial de registro e controle das famílias para acessos a benefícios de transferência de renda. A segunda é de estabelecer uma relação entre o público e o privado, onde o poder público transforma-se em mero repassador de recursos a organizações não governamentais, que assumem a execução direta dos serviços sócio assistenciais. Esse tipo de relação incorre no risco de transformar o/a profissional em um/a mero/a fiscalizador/a das ações realizadas pelas ONGs e esvazia sua potencialidade de formulador/a e gestor/a público/a da política de Assistência Social (RAICHELIS, 2010). 7 SERVIÇO SOCIAL E PROJETO ÉTICO-POLÍTICO Segundo Iamamoto (2007), o Serviço Social, por ser uma profissão inserida nas relações sociais na sociedade capitalista, tem na questão social a sua base fundante. Por isso, a dinâmica do desenvolvimento do capitalismo incide sobre as manifestações da questão social, que apresenta diferentes configurações em cada 42 42 conjuntura e, consequentemente, altera as condições concretas do exercício profissional. Fonte: aprender.buzzero.com Em relação as condições concretas de trabalho, as determinações institucionais, Iamamoto (2007) destaca que estas não devem ser consideradas pelos assistentes sociais como condicionantes externos e nem como obstáculos, mas sim como partes constituintes intrínsecas à sua inserção ocupacional. Por isso, é fundamental o conhecimento, pelo profissional, das condições estruturais e conjunturais para a realização da sua intervenção, condição imprescindível para a criação de possibilidades para uma intervenção comprometida com os propósitos expressos no projeto ético-político. O atual projeto profissional do Serviço Social surge vinculado a um novo projeto societário, já que propõe a construção de uma nova ordem social, sem exploração de classe. Devido ao seu caráter histórico, este projeto possui raízes sólidas na realidade social brasileira, não se constituindo algo abstrato, pois se materializa no cotidiano dos assistentes sociais. Como destacado por Braz (2001), a materialidade deste projeto se dá a partir de três dimensões articuladas entre si: a dimensão da produção de conhecimentos no interior do Serviço Social afinadas com as tendências teórico criticas do pensamento social; a dimensão político-organizativa da profissão representada pelos fóruns de deliberação e pelas entidades representativas como a ENESSO, conjunto CFES/CRESS e ABEPSS; e a dimensão jurídico- política da 43 43 profissão, que na esfera estritamente profissional se expressa pelo Código de Ética, pela Lei de Regulamentação da Profissão e pelas novas Diretrizes Curriculares e, numa esfera mais abrangente, pelo conjunto de leis advindas do capítulo da Ordem Social da Constituição de 1988. Por estar vinculado a um novo projeto societário, sem dominação e/ou exploração de classe,etnia e gênero, o projeto ético-político do Serviço Social defende a liberdade como valor ético central, o compromisso com a autonomia, a emancipação e a plena expansão dos indivíduos sociais. Por isso, este projeto profissional encontra limites estruturais para se concretizar, principalmente no contexto de regulação social fundamentada na orientação neoliberal em que há redução das políticas sociais, da concentração de riqueza e da sistemática implementação de uma política macroeconômica lesiva à massa da população. Fonte: slideplayer.com.br Não obstante, ao considerar a dinâmica contraditória e o contexto histórico desfavorável, ao projeto ético-político não se pretende, por isso, desacreditá-lo, mas sim ter clareza de seus desafios e reconhecer a sua validade no questionamento das relações sociais postas pela sociedade capitalista. É com esta compreensão que afirmamos a necessidade de avançarmos nos indicativos de intervenção profissional, parte ainda pouco explorada neste projeto profissional. 44 44 Como apontado por Netto (1999), “(..) não se desenvolveram suficientemente as suas possibilidades [do projeto profissional], por exemplo, no domínio dos indicativos para a orientação de modalidades de práticas profissionais, neste terreno, ainda há muito por fazer-se) (..)” [grifos nossos]. Assim, não podemos considerar este projeto como algo pronto, acabado, mas sim considerá-lo enquanto um processo a ser materializado no cotidiano de intervenção dos assistentes sociais. É com esta compreensão que concordamos com (IAMAMOTO, 2007) quando afirma: Verifica-se (...) uma tensão entre o trabalho controlado e submetido ao poder do empregador, as demandas dos sujeitos de direitos e a relativa autonomia do profissional para perfilar seu trabalho. Assim, o trabalho do assistente social encontra-se sujeito a um conjunto de determinantes históricos, que fogem ao seu controle e impõe limites, socialmente objetivos, à consecução de um projeto profissional coletivo no cotidiano do mercado de trabalho. Alargar as possibilidades de condução do trabalho no horizonte daquele projeto exige estratégias político-profissionais que ampliem bases de apoio no interior do espaço ocupacional e somem forças com segmentos organizativos da sociedade civil, que se movem pelos mesmos princípios éticos e políticos (IAMOMOTO, 2007) Desta forma, o assistente social é desafiado, nos diferente espaço sócio ocupacionais, a desenvolver mediações que possibilitem, no enfrentamento das expressões da questão social, materializar o compromisso ético-político assumido pelo projeto profissional hegemônico no Serviço Social. Fonte: servicosocialdafama.com.br 45 45 8 O TRABALHO PROFISSIONAL NA CONTEMPORANEIDADE É no contexto da globalização mundial sobre a hegemonia do grande capital financeiro, da aliança entre o capital bancário e o capital industrial, que se testemunha a revolução técnico científica de base microeletrônica, instaurando novos padrões de produzir e de gerir o trabalho. Ao mesmo tempo, reduz-se a demanda de trabalho, amplia-se a população sobrante para as necessidades médias do próprio capital, fazendo crescer a exclusão social, econômica, política, cultural de homens, jovens, crianças, mulheres das classes subalternas, hoje alvo da violência institucionalizada. Exclusão social esta que se torna, contraditoriamente, o produto do desenvolvimento do trabalho coletivo. Em outros termos, a pauperização e a exclusão são a outra face do desenvolvimento das forças produtivas do trabalho social, do desenvolvimento da ciência e da tecnologia, dos meios de comunicação, da produção e do mercado globalizado. Estes novos tempos reafirmam, pois, que a acumulação de capital não é parceira da equidade, não rima com igualdade. Verifica-se o agravamento das múltiplas expressões da questão social, base sócio histórica da requisição social da profissão. A linguagem de exaltação do mercado e do consumo, que se presencia na mídia e no governo, corre paralela ao processo de crescente concentração de renda, de capital e de poder. Nos locais de trabalho, é possível atestar o crescimento da demanda por serviços sociais, o aumento da seletividade no âmbito das políticas sociais, a diminuição dos recursos, dos salários, a imposição de critérios cada vez mais restritivos nas possibilidades da população ter acesso aos direitos sociais, materializados em serviços sociais públicos. Estão todos convidados a pensar as mudanças que vêm afetando o mundo da produção, a esfera do Estado e das políticas públicas e analisar como elas vêm estabelecendo novas mediações nas expressões da questão social hoje, nas demandas à profissão e nas respostas do Serviço Social. Em um primeiro momento, pretende-se tratar do tema focando o contexto em que é produzida a questão social e suas repercussões no mercado de trabalho do assistente social. 46 46 Fonte: s.socialesaude.zip.net Ele atravessa e conforma o cotidiano do exercício profissional do Assistente Social, afetando as suas condições e as relações de trabalho, assim como as condições de vida da população usuária dos serviços sociais. Em um segundo momento, procurar-se-á recuperar alguns dos recursos e forças teóricas e ético- políticas, acumulados a partir dos anos 1980, para enfrentar esses desafios, trabalhando especificamente o processo de trabalho em que se insere o Assistente Social - ou seja, a prática do Serviço Social - e as alternativas ético-políticas que se colocam hoje ao exercício e à formação profissional crítica e competente (PIANA, 2008). Pensar o Serviço Social na contemporaneidade requer os olhos abertos para o mundo contemporâneo para decifrá-lo e participar da sua recriação. Um grande pensador alemão do século XIX dizia o seguinte: "a crítica não arranca flores imaginárias dos grilhões para que os homens suportem os grilhões sem fantasia e consolo, mas para que se livrem deles e possam brotar as flores vivas". É esse o sentido da crítica: tirar as fantasias que encobrem os grilhões para que se possa livrar deles, libertando os elos que aprisionam o pleno desenvolvimento dos indivíduos sociais (PIANA, 2008). É nessa perspectiva que se inquire a realidade buscando, pela sua decifração, o desenvolvimento de um trabalho pautado no zelo pela qualidade dos serviços prestados, na defesa da universalidade dos serviços públicos, na atualização dos compromissos ético-políticos com os interesses coletivos da população usuária. 47 47 9 SINTONIZANDO O SERVIÇO SOCIAL COM OS NOVOS TEMPOS Fonte: www.pucsp.br Um dos maiores desafios que o Assistente Social vive no presente é desenvolver sua capacidade de decifrar a realidade e construir propostas de trabalho criativas e capazes de preservar e efetivar direitos, a partir de demandas emergentes no cotidiano. Enfim, ser um profissional propositivo e não só executivo. O Assistente Social tem sido historicamente um dos agentes profissionais que implementam políticas sociais, especialmente políticas públicas. Ou, nos termos de Netto, um executor terminal de políticas sociais, que atua na relação direta com a população usuária (CFAS, 1979. Apud MIOTO, NOGUEIRA, 2013). Mas, hoje, o próprio mercado demanda, além de um trabalho na esfera da execução, a formulação de políticas públicas e a gestão de políticas sociais. Responder a tais requerimentos exige uma ruptura com a atividade burocrática e rotineira, que reduz o trabalho do assistente social a mero emprego, como se esse se limitasse ao cumprimento burocrático de horário, à realização de um leque de tarefas as mais diversas, ao cumprimento de atividades preestabelecidas. Já o exercício da profissão é mais do que isso. É uma ação de um sujeito profissional que tem competência para propor, para negociar com a instituição os seus projetos, paradefender o seu campo de trabalho, suas qualificações e funções profissionais. Requer, pois, ir além das rotinas institucionais e buscar apreender o movimento da realidade para detectar tendências e possibilidades nela presentes passíveis de 48 48 serem impulsionadas pelo profissional. Essa observação merece atenção: as alternativas não saem de uma suposta "cartola mágica" do Assistente Social; as possibilidades estão dadas na realidade, mas não são automaticamente transformadas em alternativas profissionais. Fonte: slideplayer.com.br Sempre existe um campo para a ação dos sujeitos, para a proposição de alternativas criadoras, inventivas, resultantes da apropriação das possibilidades e contradições presentes na própria dinâmica da vida social. Essa compreensão é muito importante para se evitar uma atitude fatalista do processo histórico e, por extensão, do continente latino-americano. Serviço Social: como se a realidade já estivesse dada em sua forma definitiva, os seus desdobramentos predeterminados e os limites estabelecidos de tal forma, que pouco se pode fazer para alterá-los. Tal visão determinista e a-histórica da realidade conduz à acomodação, à otimização do trabalho, ao burocratismo e à mediocridade profissional. Mas é necessário, também, evitar uma outra perspectiva, que venho chamando de messianismo profissional: uma visão heroica do Serviço Social que reforça unilateralmente a subjetividade dos sujeitos, a sua vontade política sem confrontá-la com as possibilidades e limites da realidade social (IAMAMOTO, 2014). Olhar para fora do Serviço Social é condição para se romper tanto com uma visão rotineira, reiterativa e burocrática do Serviço Social, que impede vislumbrar possibilidades inovadoras para a ação, quanto com uma visão ilusória e desfocada da realidade, que conduz a ações inócuas. Ambas têm um ponto em comum: estão de costas para a história, para os processos sociais contemporâneos. 49 49 O segundo pressuposto é entender a profissão hoje como um tipo de trabalho na sociedade. Há muito tempo, desde os anos 1980, vem-se afirmando que o Serviço Social é uma especialização do trabalho, uma profissão particular inscrita na divisão social e técnica do trabalho coletivo da sociedade, ora, essa afirmativa não é sem consequências. As mudanças históricas estão hoje alterando tanto a divisão do trabalho na sociedade, quanto a divisão técnica do trabalho no interior das estruturas produtivas, corporificadas em novas formas de organização e de gestão do trabalho. Sendo o Serviço Social uma especialização do trabalho na sociedade, não foge a esses determinantes, exigindo "apreender os processos macroscópicos que atravessam todas as especializações do trabalho, inclusive, o Serviço Social (RAICHELIS,2010). Fonte: www.faintvisa.com.br A abordagem do Serviço Social como trabalho supõe apreender a chamada "prática profissional”, profundamente condicionada pelas relações entre o Estado e a Sociedade Civil, ou seja, pelas relações entre as classes na sociedade, rompendo com etnogenia no Serviço Social. Por exemplo, aceita-se, como senso comum, que a profissionalização do Serviço Social surge de uma reunificação da filantropia. Inclusive é esta a tônica do discurso da maioria dos pioneiros e da literatura especializada - mesmo na época do movimento de conceituação - que sustenta que o Serviço Social se torna profissão ao se atribuir uma base técnico científica de atividades de ajuda, à filantropia (PIANA, 2008). 50 50 Esta é uma visão de dentro e por dentro das fronteiras do Serviço Social, como se ele fosse fruto de uma evolução interna e autônoma das formas de proteção e de apoio social. Todavia, a constituição e institucionalização do Serviço Social como profissão na sociedade, ao contrário de uma progressiva ação do Estado na regulação da vida social, quando passa a administrar e gerir o conflito de classes, o que pressupõe, na sociedade brasileira, a relação capital/trabalho constituída por meio do processo de industrialização e urbanização. É quando o Estado se "amplia", nos termos de Gramsci passando a tratar a questão social não só pela coerção, mas buscando um consenso na sociedade, que são criadas as bases históricas da nossa demanda profissional. Contudo, se isso é verdade, as mudanças que vêm ocorrendo no mundo do trabalho e na esfera estatal, em suas relações com a sociedade civil, incidem diretamente sobre os rumos do desenvolvimento dessa profissão na sociedade. O Assistente Social dispõe de um Código de Ética profissional e embora o Serviço Social seja regulamentado como uma profissão liberal, não tem essa tradição na sociedade brasileira. 51 51 9 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ABREU, M. Serviço Social e organização da cultura: perfis pedagógicos da prática profissional. SP: Cortez, 2002. BISPO, Priscila. Questão Social, Políticas Sociais e Serviço Social No Capitalismo Monopolista: IV Jorna Internacional de Políticas Públicas, BRAVERMAN, H. Trabalho e capital monopolista. Rio de Janeiro, Guanabara, 1989. CARVALHO, R. Relações sociais e Serviço Social no Brasil. São Paulo, CortezlCelats, 1982. CONSELHO FEDERAL DE SERVIÇO SOCIAL (CFESS). Código de Ética Profissional do Assistente Social. In:BONETTI, D. A et alli. (Orgues.) Serviço Social e Ética. Convite à uma nova próxis. São Paulo, Cortez/CFESS, 1996, pp. 215-230. CF GRAMSCI, A. Maquiavel, a Política e o Estado Moderno. Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 3ª ed., 1978; COUTINHO, C. N. 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