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Literatura Comparada (1)

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Literatura Comparada 
Disciplina Digital 
Tutor(a) Luiz Carlos de sa Campos 
DGT0601 
9001 
 
 
 
 
LITERATURA COMPARADA 
APRESENTAÇÃO 
 
Iniciar 
BEM-VINDO(A) À DISCIPLINA ONLINE: 
LITERATURA COMPARADA 
Esta disciplina tem como objetivo principal conhecer, aplicar e problematizar os 
conceitos teóricos fundamentais do comparatismo na leitura crítica de textos de várias 
épocas e tradições; identificar as diferentes etapas da história da Literatura Comparada 
e sua afirmação como disciplina independente; compreender a dinâmica peculiar ao 
comparatismo brasileiro, como articulador de interpretações questionadoras dos 
padrões civilizatórios importados da Europa; apreender a multiplicidade de formas de 
expressão literária disponíveis no universo multimidiático da cultura contemporânea. 
Aula 1: Primeiros Passos 
Ao final desta aula, você deverá ser capaz de: 
1. Verificar o quanto o ato de comparar é importante. Tanto em nosso cotidiano, como 
na construção do saber acadêmico, e em que medida pode nos auxiliar no 
aprofundamento de nossa compreensão sobre os textos literários; 
2. Reconhecer o caráter múltiplo e transdisciplinar da Literatura Comparada, bem como 
sua utilidade para expandir nossa capacidade de compreensão dos mais variados tipos 
de texto para além de fronteiras nacionais e culturais, tendo em vista o mundo 
globalizado em que vivemos. 
Aula 2: O Nascimento da Literatura Comparada 
Ao final desta aula, você deverá ser capaz de: 
https://stecine.azureedge.net/webaula/estacio/litc01/Apresentacao/index.html#section_2
1. Conhecer a história da Literatura Comparada, com ênfase nas etapas iniciais de sua 
existência, desde os tempos antigos, quando o comparatismo dava seus primeiros 
passos, até o período de afirmação da disciplina nos meios acadêmicos; 
2. Reconhecer as relações necessárias entre a Literatura Comparada e a Teoria da 
Literatura, de onde são colhidos os instrumentos indispensáveis para as análises 
comparatistas. 
Aula 3: Fundamentos Teóricos 
Ao final desta aula, você deverá ser capaz de: 
1. Conhecer alguns dos principais temas de controvérsia entre os pesquisadores em 
Literatura Comparada, verificando o quanto o debate amplo e democrático é 
necessário para o pleno desenvolvimento da disciplina; 
2. Saber o quanto cada uma das principais correntes teóricas do comparatismo tem 
contribuído para o aprimoramento das pesquisas; 
3. Ter conhecimento de exemplos práticos da aplicação de tópicos teóricos na leitura 
crítica dos textos, de tal forma que não restem dúvidas do quanto a teoria e a prática 
se complementam no exercício. 
Aula 4: A Construção do Conceito de Intertextualidade 
Ao final desta aula, você deverá ser capaz de: 
1. Acompanhar alguns passos importantes dos debates teóricos havidos ao longo do 
século XX, que levaram os estudiosos a propor o conceito de intertextualidade; 
2. Verificar que dentro das próprias fileiras do formalismo já havia quem defendesse 
que o estudo da literatura só se realiza por completo se for considerado seu diálogo 
com os contextos sociais; 
3. Abordar aspectos importantes das ideias do filósofo da linguagem Mikhail Bakhtin, 
em particular a importância do dialogismo em todos os aspectos da vida humana; 
4. Destacar o fato de que a noção de intertextualidade, proposta por Júlia Kristeva, 
decorre de uma leitura atenta das proposições de Bakhtin, aplicadas de modo 
específico à análise literária. 
Aula 5: Da Teoria à Prática: As Modalidades de Discurso Intertextual 
Ao final desta aula, você deverá ser capaz de: 
1. Tomar contato com as diferentes modalidades de intertexto, com base na explicação 
do que vem a ser cada uma delas, bem como de exemplos retirados de textos literários 
diversos; 
2. Compreender o quanto um texto literário se enriquece no contato com o conjunto 
dos textos que formam a tradição literária, não somente de seu povo, como de toda a 
humanidade. 
Aula 6: A História da Literatura Comparada no Brasil 
Ao final desta aula, você deverá ser capaz de: 
1. Conhecer a produção de nossos comparatistas pioneiros que apontaram alguns 
caminhos para o desenvolvimento posterior do comparatismo no país; 
2. Estudar o processo de implantação da disciplina nas universidades brasileiras, com 
especial destaque para o trabalho ensaístico de Antônio Cândido; 
3. Tomar contato com a Associação Brasileira de Literatura Comparada, entidade criada 
em 1986 que congrega comparatistas de todo o país e atua como um fórum 
permanente de debates acadêmicos. 
Aula 7: Literatura Comparada e Colonialismo 
Ao final desta aula, você deverá ser capaz de: 
1. Tomar um primeiro contato com os problemas que o colonialismo e a dependência 
cultural provocam em países de passado colonial como o nosso; 
2. Reconhecer a presença de diferentes maneiras de equacionar o problema, gerando 
uma saudável pluralidade de posições a cerca do problema de como se deve avaliar 
esta herança. Assim, do contraste entre as posições assumidas neste debate por 
Antônio Candido, Silviano Santiago e Haroldo de Campos, o tema se enriquece com 
exemplos tirados de nossa própria tradição literária. 
Aula 8: A Literatura Comparada num Mundo em Descolonização 
Ao final desta aula, você deverá ser capaz de: 
1. Continuar a ter uma visão geral do estágio a que chegou nossa disciplina nos dias de 
hoje, marcados pela erosão dos antigos impérios coloniais e o surgimento de um mundo 
globalizado e multipolar; 
2. Ter registrado que as trocas culturais e literárias estejam ou não marcadas pelo signo 
da influência, podem acontecer pelo contato direto entre os escritores e intelectuais 
de antigas colônias, algo muito raro antes, quando a intermediação das metrópoles era 
quase obrigatória. 
Aula 9: A história da Literatura Comparada no Brasil 
Ao final desta aula, você deverá ser capaz de: 
1. Terá um painel conciso do que vem a ser esta nova tendência que impõe sua 
presença não somente nos estudos de Literatura, mas também no conjunto das ciências 
humanas, convidando todas elas a se integrarem numa saudável interdisciplinaridade. 
Desse convívio, os estudos literários tendem a sair fortalecidos e mais flexíveis; 
2. Perceberá, cada vez mais, como perdem força as fronteiras que antes separavam a 
Literatura produzida pelas elites das modalidades de texto nascidas da criatividade do 
povo, produzidas para a veiculação pelos meios audiovisuais de que se alimenta a 
cultura de massa. Num contexto social como o latino-americano, todo esse esforço se 
articula aos discursos de crítica ao colonialismo e à dependência cultural, que já 
estudamos anteriormente; 
3. Compreenderá esses tópicos e será necessário tomar contato com alguns conceitos 
teóricos, como “hegemonia”. “subalternidade” e “indústria cultural”, propostos 
inicialmente por intelectuais marxistas do início do século XX, mas hoje incorporados 
ao debate por diferentes correntes de pensamento teórico. 
Aula 10: A Literatura e as outras Artes na era da cultura digital 
Ao final desta aula, você deverá ser capaz de: 
1. Tomará contato com algumas das tentativas mais recentes de uso dos recursos da 
tecnologia digital como instrumento de enriquecimento da produção literária, sem 
perder de vista que o universo de possibilidades que nos traz o computador é uma nova 
fronteira, que amplia ainda mais o âmbito da Cultura Audiovisual, de que já nos 
ocupamos na aula passada; 
2. Apresentara, de modo sucinto, um debate sobre uma das questões mais importantes 
no que diz respeito à relação entre Literatura e Cultura Audiovisual: as adaptações de 
textos ficcionais consagrados para outras linguagens, notadamente o cinema, pondo 
em destaque o debate em torno da fidelidade ao original, a adaptação enquanto 
experiência intertextual e outros tópicos; 
3. Estudara o conceito de hipertexto, e você conhecerá algumas interessantes 
experiências que têm sido feitas por escritores e artistas que se apropriam da tela do 
computador como suporte para novas experiênciasestéticas. 
Avaliação 
A avaliação é contínua, integradora, com ênfase nos aspectos colaborativos, incluindo 
tarefas coletivas, e contempla o diagnóstico, o processo e os resultados alcançados por 
intermédio de avaliações diagnósticas, formativas e somativas, considerando os 
aspectos da autoavaliação. 
Durante o Curso, os alunos realizam atividades propostas, compostas de questões 
objetivas e discursivas referentes ao conteúdo estudado, podendo ser elas de 
autodiagnostico ou de discussão. 
Bibliografia 
• CÂNDIDO, Antônio. Literatura e subdesenvolvimento. In: ______. A educação 
pela noite e outros ensaios. São Paulo: Ática, 2003. 
• CARVALHAL, Tânia. Literatura Comparada. São Paulo: Ática, 2006. 
• SANT'ANNA, Affonso Romano de. Paródia, paráfrase e cia. São Paulo: Ática, 
2007. 
Neste curso, vamos apresentar uma visão geral da Literatura Comparada, 
compreendida como um exercício constante de leitura em paralelo de diferentes textos 
que apresentem aspectos comuns. Este diálogo tende a ultrapassar fronteiras 
nacionais, linguísticas, dialogar com as diferentes tradições, como também incorporar 
a riqueza da produção poética da cultura multimídia da época em que vivemos. 
 
Vivemos numa época em que já foi superada a fase de afirmação das nacionalidades 
em Literatura. Portanto, não é possível considerar a plena formação dos profissionais 
de Letras sem que eles estejam atentos para a realidade da circulação globalizada das 
informações culturais, ao diálogo constante que as diversas tradições literárias 
mantêm. 
Do mesmo modo, eles devem estar aptos a valorizar a importância do diálogo entre os 
textos literários e as demais modalidades de manifestação artística, aspecto central da 
atual etapa multimídia da produção cultural. Para isso, é importante que os formandos 
adquiram uma visão interdisciplinar e intertextual, estando alertas para a realidade de 
que todas as grandes obras literárias nascem do debate e do confronto de ideias e 
formas de expressão, e tal processo ultrapassa as fronteiras de uma só tradição, de um 
só idioma, de uma só nação. 
Fique Atento(a) e Bom Estudo! 
 
 
LITERATURA COMPARADA 
PRIMEIROS PASSOS 
 
Iniciar 
OLÁ! 
Ao final desta aula, o aluno será capaz de: 
1. Verificar o quanto o ato de comparar é importante. Tanto em nosso cotidiano, como 
na construção do saber acadêmico, e em que medida pode nos auxiliar no 
aprofundamento de nossa compreensão sobre os textos literários; 
2. Reconhecer o caráter múltiplo e transdisciplinar da Literatura Comparada, bem como 
sua utilidade para expandir nossa capacidade de compreensão dos mais variados tipos 
de texto, para além de fronteiras nacionais e culturais, tendo em vista o mundo 
globalizado em que vivemos. 
Hoje em dia, pode-se dizer que a Literatura Comparada é um campo de estudos, bem 
mais do que apenas uma disciplina. Isto porque seu objeto de estudo se mantém em 
diálogo com uma quantidade grande de saberes, agregando contribuições de várias 
disciplinas diferentes. 
https://stecine.azureedge.net/webaula/estacio/litc01/aula1/index.html#section_1
A Linguística, a Semiótica, a História, a Sociologia, a Psicanálise, a Filosofia, entre 
outras, são chamadas a contribuir em nosso esforço para uma compreensão mais 
profunda de nossos objetos de estudo, os textos literários. 
Portanto, estudar Literatura Comparada equivale a abrir um cofre de múltiplas 
possibilidades. Impossível dizer tudo no decorrer de um único semestre. Neste caso, 
apresentaremos algumas ferramentas importantes para que os alunos interessados no 
assunto possam seguir viagem por conta própria. Ao longo de nossas aulas, 
trabalharemos alguns fundamentos, para que cada estudante possa, depois disso, 
explorar novos caminhos, realizar pesquisas que aprofundem mais o domínio sobre a 
matéria. 
Antes de entrar no objeto de nosso estudo em si, cumpre destacar um aspecto: estudar 
Literatura Comparada é algo que não precisa ser um processo complicado, mas não 
tem como deixar de ser complexo. No senso comum, vemos as pessoas confundirem 
as duas coisas com muita frequência. A diferença está no fato de que a complexidade 
reside na riqueza de detalhes, no emaranhado de diferentes informações, a serem 
processadas por nosso cérebro. Então, a vida humana é complexa e nada podemos 
fazer para evitar isso. 
Mergulhar a fundo na compreensão dos fenômenos humanos implica em aceitar o 
convite de conviver com a complexidade. Nada disso tem a ver com a complicação, que 
consiste na dificuldade de alguém com dificuldade de se fazer entender por seus 
ouvintes ou leitores. Por mais complexo que seja um assunto, ele pode ser explicado 
de modo claro acessível. Por outro lado, as coisas mais simples podem se tornar um 
tormento se forem explicadas sem clareza. 
Devemos, então, partir do princípio de que todo processo de construção de 
conhecimento, em área ou ciência, é complexo. Assim, nossas explicações sempre 
buscarão serem acessíveis a iniciantes. Lidaremos com a complexidade buscando evitar 
que nosso conteúdo seja complicado. Mas, por outro lado, ressaltamos o fato de que é 
extremamente necessário que os alunos não confundam a clareza das explicações com 
o empobrecimento de uma disciplina que sempre envolve múltiplos aspectos. 
Outro aspecto a ser considerado é que o conceito de “Literatura Comparada” está 
sujeito à constante ação do tempo. Ou seja, não é possível dizer o que é nossa disciplina 
de modo pronto e acabado, pois a compreensão que temos a respeito dela evolui com 
o passar dos anos, seguindo os rumos do processo histórico. O mesmo se dá com todos 
os demais conceitos elaborados pelo cérebro humano para compreender o mundo ao 
seu redor. 
Portanto, não espere uma resposta pronta para a pergunta “o que é literatura 
comparada?” Foi por isso mesmo que evitamos usar este questionamento como ponto 
de partida de nossas reflexões neste capítulo. As respostas a que chegaremos ao longo 
de nossos estudos são provisórias, são parte de uma construção coletiva, que os 
homens vêm realizando ao longo do tempo, em particular dos últimos dois séculos. 
As comparações no cotidiano 
A comparação como método de compreensão dos fatos da vida tem sido usada pelos 
homens 
há milhares de anos. É um recurso usado e aplicado aos mais diversos aspectos da vida. 
Os motivos para isso podem ser compreendidos sem dificuldade. Diante de uma 
informação nova, as pessoas buscam uma referência em algo que já conhecem para 
facilitar o ato de compreender o que antes não conheciam. 
Um exemplo retirado do cotidiano poderá esclarecer melhor. 
Vamos supor que dois amigos entrem juntos numa concessionária de veículos. João 
conhece bem os novos lançamentos de automóveis e tenta explicar algumas novidades 
a seu amigo Mário. A certa altura dos acontecimentos, ele comenta: “O modelo Sedan 
2010 é tão forte quanto o anterior, porém economiza mais combustível”. Esta frase 
tem sua eficácia garantida na medida em que João parte do pressuposto de que seu 
amigo conhece bem o modelo Sedan mais antigo. Sendo assim, fornece duas 
informações sobre o modelo mais novo: 
• ele é tão forte quando o outro; 
• ele é mais econômico 
De posse dessas duas informações, Mário tem a oportunidade de começar a entender 
o novo modelo do automóvel em questão. Isso o ajudará a efetuar uma avaliação mais 
completa sobre o assunto, mesmo que ele não se limite a confiar na palavra do amigo. 
 
O recurso a comparações tem um papel importante na cultura humana, em geral. De 
tal modo que grande parte dos ditos populares, que reúnem a sabedoria popular, 
acumulada ao longo de séculos, se constrói por meio de comparações. 
Veja o exemplo de duas estudantes comentando uma prova que tenham considerado 
particularmente difícil... 
“Menina, que desastre... Fiquei perdida que nem cego em tiroteio”. 
Bem, temos certeza de que uma situação como esta jamais afetará os nossos alunos, 
tendo em vista que eles sempre estudam com afinco e aproveitam ao máximo os 
conselhose orientações contidos em nossas aulas. Mas também existem os ditados 
populares em que o elemento lúdico, a brincadeira e a ironia conferem riqueza aos 
textos nos quais se encaixem. Veja alguns exemplos: 
• 
• 
• 
Analisando estes exemplos, é possível verificar que todos eles se constroem em dois 
momentos: num primeiro, faz-se a comparação, que deixa no ar uma certa dose de 
mistério; num segundo, tudo se elucida, e o instrumento para se chegar a isso é uma 
frase sucinta, que se oferece como a solução para o mistério. Por mais que não 
concordemos com o teor das associações de ideias aí realizadas, temos que concordar 
que os ditos populares são eficazes por transmitir uma mensagem de modo ligeiro e 
direto. 
Sua eficácia discursiva depende desta agilidade, bem como da capacidade de se adaptar 
aos mais diversos contextos. Por conta desta capacidade de adaptação é que eles vivem 
sendo lembrados em nosso dia a dia. 
A comparação como instrumento de análise e aprendizado 
Creio que o que expusemos até aqui deixou claro como a comparação é um processo 
que se apresenta de modo constante em variados aspectos de nossa vida. Ela tem sido 
sempre usada como um modo de facilitar nossa compreensão do mundo. Agora, 
estamos preparados para mergulhar um pouco mais na consideração da importância da 
comparação como instrumento de construção do conhecimento acadêmico. 
Comparar textos sempre foi um recurso utilizado por professores e ensaístas para levar 
seus alunos e leitores a uma melhor compreensão dos fatos. Mas quando tomamos a 
comparação como um método, um hábito constante, como um instrumento de trabalho 
nos estudos literários, aí sim, estaremos praticando Literatura Comparada. Como diz 
Tânia Carvalhal, a comparação nunca é um fim em si, mas um meio que visa a uma 
melhor compreensão de nosso objeto de estudo. 
Outra importante observação, da mesma autora, é que nossa disciplina não é a única a 
trabalhar a partir de comparações, mas a diferença é que fazemos isso de modo 
sistemático, constante e visando elucidar questionamentos levantados pelo estudiosos 
ao longo de sua investigação. 
Para dar uma noção do trabalho que temos pela frente, podemos considerar o seguinte 
fragmento da canção “Os argonautas”, de Caetano Veloso. Para visualizar O conteúdo, 
acesse a biblioteca virtual disponível na plataforma. 
Para uma plena compreensão da mensagem transmitida no texto, vale considerar o 
andamento lento, quase melancólico da música. Aliás, nunca considere a análise do 
texto de uma canção ignorando o fato de ter sido criada em intima associação com a 
música. Evite retirar a letra da canção do ambiente em que nasceu. Não há dúvidas 
sobre a riqueza poética do texto apresentado, ele não foi concebido para leitura 
silenciosa, mas para a audição, ou mesmo para a leitura em voz alta, para ser cantado. 
Não é à toa que, com frequência, quando nos deparamos com letras de canções que 
conhecemos, nos pomos a cantar silenciosamente, ao invés de ler, simplesmente. 
Mais adiante, teremos oportunidade de trabalhar melhor com à riqueza do diálogo 
entre O texto poético e outras artes, como à música. Por enquanto; vamos nos limitar 
a essas observações» por serem indispensáveis para uma melhor apreciação do texto 
em análise. Outra questão importante para uma plena compreensão do texto de 
Caetano Veloso é prestar atenção aos elementos que ele busca em outros textos. Em 
primeiro lugar, O título da canção remete diretamente ao mito grego dos argonautas» 
um grupo de heróis que percorre os mares com à finalidade de cumprir uma missão 
extremamente difícil: achar o velocino de ouro, objeto raro e sagrado, um talismã que 
garantia poder à quem o conquistasse- Nesta busca, sobreviver era menos importante 
que atingir o triunfo. 
A leitura do texto da canção se enriquece ainda mais se for levado em conta que seu 
refrão cita um dos textos mais conhecidos da obra do poeta português Fernando 
Pessoa, do qual transcrevemos um fragmento: 
Palavras de Pórtico 
Navegadores antigos tinham uma frase gloriosa: "Navegar é preciso; viver não é preciso.”. 
Quero para mim o espírito desta frase, transformada a forma para casar com o que sou: Viver não 
é preciso; o que é necessário é criar. 
Não conto gozar a minha vida; nem em gozá-la penso. Só quero torná-la grande, ainda que para isso 
tenha de ser o meu corpo e a (minha alma) e lenha desse fogo. 
Só quero torná-la de toda a humanidade; ainda que para isso tenha de a perder como minha. 
(In; PESSOA, Fernando. O eu profundo e os outros eus. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1980, p. 
15.). 
Assim, podemos perceber que, por todo o tempo estivemos considerando um texto 
que não fala apenas das aventuras dos marinheiros, de um modo geral, sua fome por 
aventuras, seu destemor diante dos perigos, mas, de modo mais específico, das 
aventuras dos marinheiros portugueses da época das grandes navegações, para quem 
o chamado do mar era mais forte do que a própria necessidade de garantir a 
sobrevivência. 
Mesmo enfrentando os maiores perigos, insinua o texto de Fernando Pessoa, esses 
marinheiros realizaram façanhas de que toda a humanidade pode se orgulhar. Entre 
estas, destaca-se o processo de ocupação e posterior colonização do Brasil, a começar 
pelo nosso descobrimento, obra da frota de Cabral, em 1500. 
Desta forma, percebemos como a canção de Caetano é um tributo aos valentes 
navegantes lusos, sem os quais não estaríamos aqui para continuar a tarefa de construir 
uma nova nação. Além disso, numa leitura paralela dos textos de Pessoa e Caetano, 
fica-nos a clara sugestão de que nós, brasileiros, assim como nossos irmãos 
portugueses, somos importantes para o conjunto da espécie humana, para além de 
fronteiras nacionais. 
Além disso, podemos aplicar ao conceito de “navegar” um sentido que se aplica ao 
cotidiano de cada um de nós, a qualquer momento. Assim, torna-se possível uma nova 
leitura de ambos os textos, tanto o de Pessoa, como o de Caetano, menos 
comprometido com o conhecimento da história de nossa formação social. 
O verbo “navegar” pode ser interpretado por seu potencial metafórico, como algo 
relativo à coragem de enfrentar os desafios da existência. Por outro lado, “viver” seria 
passar pela existência sem aceitar tais desafios, ter uma postura mais acanhada e calma, 
ainda que menos interessante. 
Se olharmos ao nosso redor, podemos verificar que bem poucas são as pessoas 
dispostas a deixar o aconchego seguro do “viver”, em busca do incerto e apaixonante 
“navegar”. Desta forma, o chamado contido na frase “navegar é preciso, viver não é 
preciso” representaria uma tentativa de romper a mesmice do cotidiano, convidando 
cada um de nós a aproveitar a vida ao máximo. Como resultado da comparação que 
fizemos entre os dois textos, destaca-se o fato de que o dilema entre “navegar” ou 
simplesmente “viver” ultrapassa os limites do tempo e se manifesta nas mais variadas 
épocas. O tempo passa, mas o ser humano continua diante dos mesmos desafios de 
sempre. 
Bem, fica bem claro que nada disso teria sido percebido se considerássemos como 
objeto de análise apenas o texto de Caetano. Nossa compreensão sobre o seu trabalho 
ficaria incompleta sem levarmos em conta o diálogo que ela estabelece com outros 
textos. Mas a canção estabelece este diálogo de modo bem explicito. 
Tomemos, agora, outro exemplo. Em Dom Casmurro, Machado de Assis nos chama a 
atenção para a predisposição de Bentinho ao ciúme com uma referência à peça Otelo, 
de Shakespeare, famosa por também abordar como tema central o ciúme doentio de 
um homem, que se torna, mesmo, capaz de matar sua esposa, Desdêmona. Tomemos 
um trecho do romance de Machado. No capítulo LXI, Bentinho perguntara a José Dias, 
antigo amigo da família, como Capitu ia passando, já que não a via fazia algum tempo. 
A resposta virá no capítulo seguinte, intitulado “Uma ponta de lago”. Para visualizar o 
conteúdo, acesse a biblioteca virtual disponível na plataforma. 
Tal observação se justificana medida em que corremos o risco de considerar as obras 
de Machado ou de Caetano menores, na medida em retomam temas ou motivos já 
trabalhados antes, respectivamente, por Shakespeare e Fernando Pessoa. Nada mais 
falso e apressado do que considerar os fatos desta forma. Ao atualizar um tema já 
tocado por outra mente genial no passado, um autor mais recente pode ou não fazer 
um trabalho de qualidade inquestionável. Eles estão pagando um tributo à tradição, 
mas também enriquecendo esta mesma tradição, na medida em que suas obras 
oferecem um novo olhar sobre os antigos temas. 
Ademais, não são esses os únicos textos literários que têm no ciúme o mote central. 
Muito pelo contrário. A prosa de ficção de todos os povos é pródiga de exemplos do 
tipo. Ou seja, a referência a Shakespeare pode ajudar-nos a entender muitas dessas 
obras, mas também não é obrigatória. Tudo depende do contexto. Para o caso do 
romance que citamos, devemos lembrar que foi o próprio Machado quem nos sugeriu 
tal associação, pela escolha do título do capítulo. 
A única referência direta à tragédia de Shakespeare se encontra no título do capítulo. 
Iago cumpre um papel decisivo na peça, ao inocular nos ouvidos de Otelo o veneno do 
ciúme. A partir daí, o fragmento que citamos trabalha a maneira como este veneno age 
no coração de Bentinho, de tal modo a se tornar uma obsessão para ele, a ponto de 
corroer sua alma pelo resto da vida. José Dias faz o papel de Iago, no texto machadiano. 
Porém, é preciso ter cuidado, pois existem nítidas diferenças entre os dois personagens. 
Enquanto na peça, lago se desdobra em repetir suas suspeitas até levar o valente Otelo 
ao crime, no romance José Dias é bem mais sutil. Tendo lançado pequena dose do 
veneno, retira-se de cena. O que se vê a seguir é um Bentinho que sucumbe à sua 
própria fraqueza. 
Nem sempre os paralelos entre diferentes textos literários poderão se estabelecer com 
a mesma facilidade. Na sequência de nosso trabalho, teremos oportunidade de verificar 
o quanto pode se tornar interessante e desafiadora a tarefa de um comparatista. Tudo 
virá a seu tempo. 
Bem, o que tivemos até aqui foram pequenos exemplos de como podem render os 
estudos comparatistas. Sem demonstrar ainda uma grande preocupação com a questão 
do método, procuramos deixar claros alguns princípios que norteiam nossa atividade. 
Por enquanto, o importante é deixar estabelecida a importância do comparatismo como 
recurso indispensável para aprimorar nossa capacidade de conhecimento e de análise 
sobre Literatura. Ao longo de nossas aulas, teremos oportunidade de verificar como a 
comparação entre textos literários diferentes é um recurso precioso para uma leitura 
mais apurada de cada um dos textos considerados. 
Ao longo das próximas aulas, teremos oportunidade de verificar o quanto a construção 
de um método comparativo depende de nossa capacidade de fazer uso da comparação 
de modo sistemático e constante, guiando métodos de pesquisa consistentes, que se 
podem valer de metodologias variadas. 
O que vem na próxima aula 
• Estudará as principais etapas da história da Literatura Comparada, desde o 
começo de sua afirmação como disciplina acadêmica, na França do início do 
século XIX; 
• Compreenderá que a evolução dos estudos comparatistas acompanhou, em 
linhas gerais, a evolução da Teoria da Literatura, com a proposição dos mais 
diversos métodos de análise. 
 
 
CONCLUSÃO 
Nesta aula, você: 
• Verificou o quanto o ato de comparar é importante, tanto em nosso cotidiano, 
como na construção do saber acadêmico, e em que medida pode nos auxiliar no 
aprofundamento de nossa compreensão sobre os textos literários; 
• Reconheceu o caráter múltiplo e transdisciplinar da Literatura Comparada, bem 
como sua utilidade para expandir nossa capacidade de compreensão dos mais 
variados tipos de texto, para além de fronteiras nacionais e culturais, tendo em 
vista o mundo globalizado em que vivemos. 
 
LITERATURA COMPARADA 
O NASCIMENTO DA LITERATURA COMPARADA 
 
Iniciar 
OLÁ! 
Ao final desta aula, o aluno será capaz de: 
1. Conhecer a história da Literatura Comparada, com ênfase nas etapas iniciais de sua 
existência, desde os tempos antigos, quando o comparatismo dava seus primeiros 
passos, até o período de afirmação da disciplina nos meios acadêmicos; 
2. Reconhecer as relações necessárias entre a Literatura Comparada e a Teoria da 
Literatura, de onde são colhidos os instrumentos indispensáveis para as análises 
comparatistas. 
Na aula anterior, tivemos a oportunidade de observar que nossa disciplina está ligada 
diretamente aos rumos da História do Pensamento, de um modo geral. 
Nela se refletem sempre tendências importantes das Ciências Humanas, em cada 
época. Nesta aula, estudaremos com mais detalhes alguns dos momentos decisivos do 
longo percurso histórico de surgimento e afirmação da Literatura Comparada. 
Desta forma, não será novidade afirmar que a história da Literatura Comparada vem 
acompanhando os rumos da história social, política e cultural do Ocidente ao longo do 
tempo. Desta forma, acontecimentos marcantes, como as duas guerras mundiais do 
século XX, para ficar num exemplo bem marcante, tiveram um impacto decisivo nos 
rumos da disciplina. 
Propor questionamentos, formular hipóteses e, por fim, construir argumentos para 
confirmar ou não as hipóteses levantadas. 
O domínio sobre um método fará com que ele tenha mais segurança em suas 
conclusões, levando-as para além de um puro e simples “eu acho que”, ou de 
julgamentos de valor superficiais. Esta necessidade faz com que a história da Literatura 
Comparada acompanhe sempre de perto a história da Teoria Literária. Em 
consequência disso, vamos lidar com uma certa diversidade metodológica. Um mesmo 
trabalho terá sempre a possibilidade de ser conduzido de várias maneiras, dependendo 
da escolha teórica que fizermos. 
Portanto, para um melhor aproveitamento de nosso conteúdo, será útil para o aluno 
revisar em linhas gerais o que já estudou nas aulas de Teoria. Mas vamos por partes. 
Não precisa ser tudo de uma vez. Por enquanto, não vamos nos ocupar ainda das 
correntes de pensamento mais recentes do comparatismo, que se caracterizam por um 
manejo mais sólido dos instrumentos teóricos na condução de seus estudos. Por 
enquanto, de todo o longo trajeto de consolidação da disciplina, estudaremos apenas 
suas etapas iniciais: 
https://stecine.azureedge.net/webaula/estacio/litc01/aula2/index.html#section_1
• 
• 
Este é o longo período que antecede ao processo de afirmação da Literatura 
Comparada como disciplina acadêmica. A expressão “manifestações primitivas” foi 
evitada, com o propósito de se prevenir a possibilidade de interpretações errôneas e 
apressadas. O hábito de comparar textos oriundos de diferentes tradições culturais é 
muito antigo. 
Já era praticado na Antiguidade, por exemplo, quando os intelectuais romanos se 
curvavam diante dos tesouros poéticos da Grécia. Neste contexto, o verbo reflexivo 
“curvavam-se” deve ser entendido com duplo sentido, pois os romanos não somente 
se debruçaram para analisar os escritos da cultura grega, como também tinham grande 
apreço por esta tradição. 
Muito tempo depois, no período renascentista, o empenho em compreender os 
clássicos levou estudiosos da Europa a realizar estudos comparativos. Entretanto, tais 
iniciativas ainda não tinham um caráter de estudo sistemático. Além disso, algumas 
vezes elas tendiam a uma avaliação hierarquizante. 
Ou seja, comparavam-se textos de nações e de épocas diferentes mais para buscar a 
afirmação da superioridade de uma cultura sobre a outra, propósito que hoje não se 
considera mais como digno de atenção. 
A respeito das comparações entre textos de nações e de épocas diferentes, a 
professora Sandra Nitrini tece interessantes considerações, que merecem nossa 
atenção: 
"A produção do conhecimento histórico deveria limitar-se a reproduzir a informação tal como 
estava registrada nas fontes, que para eleseram representadas apenas pelos documentos oficiais 
emitidos pelo Estado ou, no máximo, pela Igreja, embora as de maior confiabilidade fossem as 
relacionadas apenas ao Estado que possuíam o real caráter de fonte primária. Os historiadores 
positivistas trataram especialmente da história dos fatos políticos e ideológicos." 
 
Entre as palavras-chave do fragmento apresentado, pode-se destacar “apreciar” e 
“mérito”. Os antigos estudiosos tinham por meta, basicamente, avaliar a qualidade dos 
textos, quando se dedicavam a trabalhos de comparação. Em geral, partia-se do 
pressuposto de que os grandes mestres do passado eram modelares, enquanto os 
textos mais recentes deviam ser submetidos a um acurado exame, a fim de se constatar 
em que medida mostravam-se capazes de se “comparar”, ou seja, de repetir o nível de 
excelência alcançado pelos mais antigos. 
Um aspecto para o qual a autora nos chama a atenção é a ausência do que ela chama 
de “projeto de comparatismo elaborado”, que podemos traduzir por parâmetros 
teóricos que pudessem ser usados pelos estudiosos para alcançar resultados efetivos 
em seus esforços de compreensão do material pesquisado. O nível de excelência dos 
antigos não era submetido a um exame mais atento, por faltarem instrumentos de 
análise. 
Um exemplo de obra de cunho comparatista elaborada no final do século XVI é dado 
por Tânia Carvalhal, no primeiro capítulo de nosso material didático. Trata-se de um 
texto de Francis Meres, o Discurso comparado de nossos poetas ingleses com os poetas 
gregos, latinos e italianos (1598). Nota-se pelo título o apreço que os intelectuais 
ingleses tinham não somente pelos tesouros da antiguidade clássica, como também 
pelas obras da Itália renascentista. 
Foi assim que a cultura europeia que emergiu do final da Idade Média se construiu a 
partir da revalorização das grandes obras da Antiguidade. Foi com base neste material 
que as novas literaturas europeias se afirmaram. 
É preciso muito cuidado ao avaliar de que modo a influência dos antigos se fez 
presente. Se tomarmos como exemplo a obra épica Os Lusíadas, de Camões, marco de 
afirmação de maturidade da Literatura Portuguesa, veremos a presença de elementos 
tomados de empréstimo dos antigos textos épicos da Grécia e de Roma: a Ilíada e a 
Odisseia, de Homero e a Eneida, de Virgílio. Mas não se trata de copiar o que os antigos 
deixaram. Afinal, o texto camoniano responde aos anseios de seu próprio tempo. Busca 
uma expressão singular para cantar as glórias do povo lusitano. 
Assim, podemos afirmar que a Europa renascentista assimilou o legado da tradição 
clássica, mas retrabalhou esta herança. Estamos muito distantes da cópia pura e simples 
dos modelos. A cópia pura e simples não resultaria na criação de obras literárias dignas 
de responder às inquietações da sociedade europeia. Portanto, estamos muito distante 
de um processo de simples cópia dos modelos consagrados. 
Camões escreve um texto capaz de se comparar às obras épicas de Homero e Virgílio, 
mas de modo algum ele se limita a copiar os procedimentos da poética do classicismo 
antigo. Pelo contrário: pelo fato de ser escrito em português, e não em latim, como 
ainda era corrente na época, Camões atende à necessidade de afirmar a identidade 
cultural de seu povo por meio da expressão literária. 
Uma das marcas peculiares de Os Lusíadas é o fato de não afirmar o heroísmo de modo 
individualizado. Isso o torna diferente de seus modelos vindos da Grécia ou Roma 
antigos. Enquanto nas obras homéricas a atenção recai sobre as atitudes grandiosas de 
homens especiais, Aquiles, Heitor e Ulisses, na obra de Camões todo o povo português 
é cantado, sendo reconhecido em sua contribuição à grande aventura coletiva das 
grandes navegações. 
A etapa seguinte da história da Literatura Comparada remonta ao início do século XIX 
e corresponde ao período em que a Europa ensaiava seu processo de industrialização. 
Nesta época, o interesse por comparações era comum a outros campos do 
conhecimento humano, como as ciências naturais. Aplicada aos estudos literários, fez 
surgir uma perspectiva de cunho cosmopolita, ou seja, uma atenção à contribuição que 
cada povo dava ao patrimônio cultural de toda a humanidade. 
Uma nova mentalidade surgia então. Já na última década do século XVIII, impunha-se 
a necessidade de superar a visão de que os modelos consagrados pela tradição eram 
infalíveis. Poetas e pensadores começavam a alimentar um interesse maior pelo 
presente e pelo futuro do que pelas glórias do passado. 
Até então, quase toda a literatura clássica tendia a valorizar o Antigo, os bons tempos 
que já havia passado, a Idade do Ouro na qual somente os heróis e alguns afortunados 
viveram, e para a qual todos os homens sonhavam voltar assim que o pesadelo do 
presente passasse. 
Mas a revolução industrial trouxe o triunfo da mentalidade capitalista, com um olhar 
mais voltado para o agora e o futuro. O classicismo perdia força, dando espaço ao 
surgimento do período romântico, no qual o conceito de evolução terá um papel 
decisivo. 
Um olhar voltado para a frente, para o potencial humano de construir um novo destino, 
passou a dominar as almas a partir de então. Os burgueses possuíam capacidade de 
empreendimento e buscavam ampliar seus negócios. Para tanto, precisavam livrar-se 
das amarras da tradição, fundando um novo modo de enxergar o mundo, segundo o 
qual haveria mais liberdade para a criação e a imaginação. 
Não demorou muito para que poetas e pensadores percebessem que a lógica burguesa 
atrelava este liberalismo a seus propósitos de enriquecimento. Daí a visão romântica se 
articular em torno de uma visão de repulsa à racionalidade do capitalista. 
Mesmo assim, não houve um retorno aos padrões de pensamento do classicismo. Pelo 
contrário, os românticos opunham-se à racionalidade burguesa afirmando a imaginação 
como capacidade suprema do cérebro humano. Sua recusa em compartilhar dos 
princípios que norteavam os projetos de vida burgueses não foi completa, na medida 
em que também valorizavam mais a invenção do que o cultivo à tradição. 
Além disso, há uma outra característica do romantismo de extrema importância para a 
consolidação da Literatura Comparada: o gosto pelo exótico, que levará estudiosos a 
se interessar pelo estudo da produção literária de povos distantes, para além das 
fronteiras das nações mais ricas da Europa. 
Em 1816, dois intelectuais franceses, Noél e Laplace, publicam antologias de textos de 
literários de diversos países, sob o nome de Curso de literatura comparada, não mais do 
que coletâneas de trechos escolhidos, sem nenhuma preocupação em confrontá-los ou 
de estabelecer paralelos. Os responsáveis pelo volume deixavam por conta dos leitores 
a tarefa de chegar a qualquer conclusão. 
Pode parecer muito pouco, mas se consideramos o contexto histórico em que tal 
iniciativa se deu, temos que concordar que foi um avanço. No começo do século XIX, a 
Europa assistia a um processo de afirmação das nacionalidades e passava por um 
momento de intensa rivalidade e ressentimentos entre os diferentes povos do 
continente. Como resultado disso, eram constantes os conflitos armados, 
comprometendo os princípios fundamentais da suposta fraternidade que deveria 
existir entre os povos de tradição cristã. 
A Literatura Comparada se propunha então como a disciplina disposta a estudar os 
fatos literários numa perspectiva transnacional, para além das fronteiras políticas ou 
mesmo culturais. Estava aberto o caminho para que o conjunto da produção literária 
da espécie humana pudesse ser considerado objeto de estudo de uma só disciplina. 
Contudo, as limitações ideológicas da época impediam que os estudiosos enxergassem 
os fatos para além da Europa. Um passo havia sido dado, mas ainda um passo pequeno. 
Bem, diante de uma situação como esta, o simples fato de se organizar antologias já 
assumia um caráter de tomada de posição diante das contradições da época. 
Desta forma, a LiteraturaComparada nasceu com vínculos bem fortes com a política, 
na medida em que servia de veículo à proposição de um ideal de paz e concórdia. Ou 
seja, a expressão Literatura Comparada nasceu antes de qualquer método de análise 
comparativo em si. Mas, desde o início, existe o propósito de se contrapor à 
mentalidade da época, de nacionalismo exagerado e clima geral de guerra a qualquer 
momento. 
Era como se o comparatismo funcionasse como um necessário contraponto ao espírito 
de afirmação das identidades nacionais. Assim, por exemplo, se França e Inglaterra se 
mantiveram num clima de rivalidade armada nas primeiras décadas do século XIX, os 
estudos comparatistas forneciam uma medida do quanto a literatura inglesa devia à 
francesa em termos de influência, de tal modo que ambos os povos possuíam um 
patrimônio em comum que não podia ser desprezado. O mesmo raciocínio poderia ser 
estendido às relações entre franceses e alemães, ainda mais tensas durante todo o 
século. 
Outros momentos de afirmação da disciplina no mesmo século e ainda na França: Abel-
François Villemain deu maior divulgação à expressão “literatura comparada” em seus 
cursos sobre literatura do século XVIII que ministrou na Sorbonne em 1828-1829, 
como também em seu livro Panorama da literatura francesa do século XVIII. Também 
J.-J. Ampère, em seu Discurso sobre a história da poesia (1830), refere-se à "história 
comparativa das artes e da literatura. A primeira cátedra de literatura comparada surgiu 
na França, em Lyon, em 1887. 
Nos primeiros tempos, a disciplina foi dominada por pesquisas que punham em diálogo 
autores de nacionalidades diferentes. O objetivo era traçar paralelos, em busca de um 
saber capaz de ultrapassar fronteiras. A Literatura Comparada funcionaria, então, como 
uma instância intermediária entre cada literatura nacional, estudada em separado, e a 
literatura geral, objeto de estudo bem mais ambicioso, no qual poucos se aventuravam. 
Entretanto, o comparativismo de então tinha sérias limitações: 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Deste modo, a visão evolucionista esbarrava na visão etnocêntrica, ou mais 
precisamente eurocêntrica, que apontava a civilização europeia como modelo ideal a 
ser copiado por todos os demais povos do mundo. Devemos considerar que antes, na 
primeira leva de colonialismo europeu (séculos XV a XVII), os mercadores ibéricos 
haviam imposto aos povos americanos a visão de que Deus os escolhera para levar ao 
resto do mundo a verdade cristã. No século XIX, o capitalismo industrial levou a uma 
nova onda colonialista, na qual a ciência era usada para justificar a superioridade e o 
predomínio dos novos donos do mundo, os franceses e ingleses. 
Ou seja, o discurso científico substituía o religioso como justificativa para a exploração 
dos outros povos. Porém, não se abandonava a perspectiva de que a Europa é o centro 
do mundo, o continente cuja cultura deveria ser copiada por todos os demais povos do 
mundo, se estes melhorar, chegar a um nível de civilização superior. Para tanto, seria 
necessário esperar o avançar do século XX, a fim de assistir ao início de superação desta 
mentalidade. A história das ideias mostra como foi difícil romper barreiras, ultrapassar 
preconceitos. 
O mundo em que vivemos, marcado pelas consequências da descolonização, não mais 
comporta uma visão eurocêntrica. Entretanto, ainda é grande o esforço dos estudiosos 
no sentido de livrar-se desta herança, quando se propõem a análises que confrontam 
textos e autores oriundos de diferentes partes do mundo, de diferentes tradições 
culturais. 
Um aspecto desta problemática é representado pelos estudos de poesia oral, algo 
extremamente importante se levarmos em conta que em grande parte das nações do 
mundo a população possui um índice de letramento incipiente, onde a escrita não é 
uma prática universalizada. Em tais países, o uso artístico da palavra se vale da oralidade 
como instrumento primordial. 
É o que acontece com a poesia de grande parte da África, ou mesmo aqui no Brasil, 
com a produção das classes desfavorecidas. Para os estudiosos informados numa visão 
eurocêntrica, por mais criativa e interessante que seja a poesia oral, ela deve despertar 
a atenção apenas dos folcloristas, nunca dos estudiosos de literatura. 
Os conflitos, contradições e mudanças trazidos pelo advento do novo século marcaram 
profundamente os estudos comparatistas. Ao longo das próximas aulas estudaremos 
algumas destas mudanças. Por ora, concentramos nossa atenção em alguns tópicos. 
Um deles é a consolidação de uma cultura do audiovisual, que veicula conteúdos os 
mais diversos, como é o caso dos filmes. Resultado da aplicação de avanços 
tecnológicos proporcionados por descobertas científicas que já estavam em curso 
desde o século XIX, como a fotografia, o cinema e a gravação dos sons, permite o 
desenvolvimento da produção em série de artigos de consumo cultural. Desta forma, 
atendia-se a um público que não parava de crescer, já que a população mundial 
aumentava devido aos avanços da ciência médica. 
Um dos exemplos disso é o cinema. A velha arte de narrar histórias ganha, assim, novos 
contornos. A literatura de ficção passa a conviver com a emergência desta nova 
realidade: a palavra escrita vai deixando de reinar soberana e precisa aprender a dividir 
seu espaço com as novas modalidades de narrativa. Para os comparatistas, os novos 
tempos se oferecem como um fértil campo de estudos. 
É bem verdade que a cultura do audiovisual se articula com os interesses do 
capitalismo, constituindo um novo ramo de negócios, a indústria cultural. Assim, sofre 
das pressões inevitáveis no sentido de apresentar baixo grau de invenção e predomínio 
de mensagens já consagradas, os clichês de consumo fácil. Um filme custa caro e os 
investidores não revelam interesse em assumir os riscos de um eventual prejuízo 
provocado pelo recusa do grande público em consumir seu produto. Assim, sempre dão 
preferência à repetição de fórmulas consagradas de sucesso garantido. 
Portanto, sempre é preciso cuidado ao analisar as relações da Literatura, arte que se 
alimenta na inovação estética e no primado da imaginação, com as novas modalidades. 
Felizmente, a despeito de se constituir como indústria, o cinema ganha contornos de 
arte, na medida em que também passa a ser usado como veículo para experiências 
estéticas. O que veio a ser conhecido como “cinema de arte” afirma-se como um 
importante veículo para a expressão da sensibilidade humana ao longo do século. 
O mesmo se pode afirmar com relação à canção. 
A tecnologia das transmissões radiofônicas vem a se constituir como fundamental para 
a difusão de um gênero que, a despeito de ser muito antigo, não atraía a atenção dos 
pesquisadores. 
No Brasil, conhecemos esta realidade de perto, uma vez que uma parte considerável 
de nossa produção poética de qualidade é criada para ser interpretada no palco, antes 
de ser lida em livros. 
Bem, o confronto entre a produção literária e as outras artes, particularmente as novas 
modalidades da era do audiovisual passa, cada vez mais, a ser incorporado como um 
campo de pesquisas para a Literatura Comparada. Sendo assim, a disciplina precisa 
repensar seus rumos, deixando de lado uma atenção voltada unicamente ao confronto 
entre diferentes literaturas nacionais. 
Outra importante alteração de rumos se dará na medida em que as contribuições das 
novas correntes de Teoria da Literatura, como o formalismo ou o estruturalismo, 
passam a ser consideradas nos estudos comparatistas. 
A perspectiva de cunho positivista ainda resiste nas primeiras décadas do século, mas 
vão perdendo o terreno até que em 1958, o crítico estruturalista tcheco René Wellek, 
durante um congresso internacional da disciplina, ponha em cheque os fundamentos 
da visão antiga, e proponha um realinhamento de rumos. Os aspectos centrais deste 
debate serão abordados em nossa próxima aula, destinada a explicar melhor os 
fundamentos teóricos trabalhados por nossa disciplina nosdias atuais. 
O que vem na próxima aula 
• Tomaremos contato mais aprofundado com alguns dos debates teóricos mais 
importantes para a construção do método em Literatura Comparada, como as 
questões de influência, derivação, fonte, origem e originalidade, que 
dominaram a cena nas primeiras décadas de história da Literatura Comparada 
como disciplina devidamente constituída; 
• Será possível fazer uma avaliação crítica da importância de se dar atenção a 
estas questões, por meio de exemplos práticos retirados da leitura de textos 
literários; 
• A seguir, verificaremos de que modo a crítica a estes aspectos levou os 
pesquisadores a abrir novos caminhos para a disciplina, na segunda metade do 
século XX. 
CONCLUSÃO 
Nesta aula, você: 
• Verificará que a história da Literatura Comparada liga-se sempre a outros 
aspectos da história humana, em cada época, em particular a história do 
pensamento em geral; 
• Irá compreender como as ferramentas de análise trabalhadas pela Teoria da 
Literatura são indispensáveis para o sucesso de qualquer pesquisa em 
Literatura 
 
 
LITERATURA COMPARADA 
ALGUNS FUNDAMENTOS TEÓRICOS DA LITERATURA COMPARADA 
 
Iniciar 
OLÁ! 
Ao final desta aula, o aluno será capaz de: 
1. Conhecerá alguns dos principais temas de controvérsia entre os pesquisadores em 
Literatura Comparada, verificando o quanto o debate amplo e democrático é 
necessário para o pleno desenvolvimento da disciplina; 
2. Saberá o quanto cada uma das principais correntes teóricas do comparatismo tem 
contribuído para o aprimoramento das pesquisas; 
3. Terá conhecimento de exemplos práticos da aplicação de tópicos teóricos na leitura 
crítica dos textos, de tal forma que não restem dúvidas do quanto a teoria e a prática 
se complementam no exercício. 
Já destacamos antes que o estudo comparativo de textos literários sempre precisa ser 
guiado por métodos de análise que norteiem os passos do pesquisador. O objetivo da 
https://stecine.azureedge.net/webaula/estacio/litc01/aula3/index.html#section_1
presente aula é apresentar alguns dos fundamentos teóricos básicos da Literatura 
Comparada, com exemplos que permitam a todos os alunos perceberem a utilidade do 
emprego de tais procedimentos para aprofundar a análise comparativa de textos 
literários. 
Afinal, todo corpo de preceitos teóricos sempre se justifica na medida em que nos dota 
de instrumentos para melhorar nossa capacidade de compreender os fenômenos da 
realidade. Ou seja, toda teoria bem aplicada é um importante instrumento para 
enriquecer nossa prática de ler as obras e compará-las entre si. 
Para efeitos didáticos, alguns manuais de Literatura Comparada, incluindo o de Tânia 
Carvalhal, que tomamos como obra de referência, apontam para a existência de três 
escolas de pensamento teórico: 
“Escola francesa” 
 
 
 
“Escola norte-americana” 
 
 
 
“Escola soviética” 
 
 
 
Desde o início, é preciso ter cuidado com tal classificação. Por conta disso, já tomamos 
a iniciativa de colocar aspas em todas essas designações. Por trás de cada uma dessas, 
assinalamos a presença de um corpo de doutrina teórico. 
Devemos, ainda, destacar, que esta divisão tripartite não dá conta da totalidade dos 
caminhos que têm sido trilhados pelos comparatistas. Outras correntes de pensamento 
também têm se afirmado, como reflexo das importantes alterações contextuais 
ocorridas na segunda metade do século XX. 
Mas estas serão objeto de nossa atenção nas próximas aulas. Por enquanto, vamos 
expor alguns dos tópicos que ocuparam o debate entre as três “escolas” delimitadas 
acima. Com isso, já estaremos em contato com grande parte dos instrumentos teóricos 
de que se vale um comparatista em seu trabalho. 
Alguns pontos da discórdia. 
Um dos aspectos que mais chamam a atenção nas pesquisas realizadas pelos 
“franceses” é o fato de estes autores se interessarem somente pela comparação entre 
autores de nacionalidades diferentes. Assim, por um lado, o pesquisador que se 
interessar pela disciplina teria que se revelar um conhecedor da literatura das duas 
nações em questão. Por outro, ficaria impedido de verificar em que medida os diálogos 
entre autores da mesma nacionalidade podem se revelar importante e enriquecedor. 
O que deveria ocupar a atenção de tal pesquisador seriam coisas do tipo: “Machado de 
Assis e os ingleses” ou “Balzac e Machado de Assis,” etc.. Sem desconsiderar a 
importância que tais diálogos tiveram, não somente para este autor, mas para todos os 
grandes nomes da Literatura Brasileira em seu tempo, não podemos deixar de lado o 
quanto limitadora era uma perspectiva de análise como esta. 
Desta forma, um comparatista brasileiro que se interessasse, por exemplo, em se 
debruçar sobre o romance de Machado de Assis se veria limitado em sua capacidade 
de perceber o quanto este autor possa ter se enriquecido no contato com outros 
grandes romancistas brasileiros, como José de Alencar e Manuel Antonio de Almeida. 
Outra exigência da “escola francesa” era a de somente levar em conta o diálogo entre 
produções literárias, não levando em conta a possibilidade de se analisar o diálogo entre 
textos literários, a produção de músicos, artistas plásticos, etc. 
Nos dias atuais, grande parte dos estudos comparatistas se debruça justamente sobre 
a importância das trocas havidas entre a Literatura e as outras Artes. 
Felizmente, as duas outras tendências que apontamos já relativizam, ou mesmo, abolem 
tais limitações. 
De tal forma que, no ponto em que estamos atualmente, não existem mais estas 
barreiras para o trabalho de um comparatista. 
 
Porém, um dos tópicos que mais ocuparam os debates comparatistas, desde o começo, 
é a questão das influências. 
Para os pesquisadores da escola francesa, esta é uma das questões fundamentais do 
trabalho de um comparatista – verificar em que medida um autor de nacionalidade 
alemã, por exemplo, tem sua obra enriquecida no contato com a literatura inglesa, ou 
vice-versa. 
Um estudo que se intitulasse, por exemplo, “Goethe na Inglaterra” se destinaria 
essencialmente a constatar o quanto o genial escritor alemão influenciou seus pares no 
outro país. 
Assim, estudar Literatura Comparada era, essencialmente, detectar a presença de 
elementos que comprovassem a influência de um autor sobre outro, ou vários outros. 
Para explicitar com mais clareza, podemos retomar um exemplo que já utilizamos em 
nossa primeira aula: 
O diálogo entre o romance Dom Casmurro, de Machado de Assis, e a peça Otelo, de 
William Shakespeare, tendo como principal aspecto a maneira como o ciúme destrói as 
relações afetivas. 
Bem, o que nos garante que Machado foi leitor de Shakespeare é o próprio romancista 
brasileiro, que cita textualmente o dramaturgo inglês em seu livro. Se não fosse por 
isso, não teríamos certeza deste fato, pois afinal o ciúme em relacionamentos amorosos 
é um dado comum a muitas outras culturas e nacionalidades, está muito longe de ser 
uma particularidade que tenha sido “descoberta” por Shakespeare. A presença do tema 
nas duas obras poderia simplesmente constituir uma semelhança entre elas, e não a 
confirmação da tese da influência. 
Contudo, para um comparatista à moda antiga, a presença de um tema caro a 
Shakespeare na obra de Machado já constituiria, por si mesmo, uma prova da influência 
que o autor brasileiro sofreu do inglês. Neste caso, a obra de Shakespeare tenderia a 
ser apontada como fonte comum onde teriam ido beber todos os narradores que 
colocassem a problemática do ciúme em suas tramas. 
 
Obviamente, isso é uma visão simplista, se consideramos os padrões de análise em voga 
atualmente. Para tanto, é interessante verificar o que diz um dos autores considerados 
mais importantes do que Tânia Carvalhal chama de “escola soviética”, o pesquisador 
russo Zhirmunsky, quando chama a atenção para o fato de que o mecanismo da 
influência só merece ser levado a sério se tivermos clara a noção de que ele não é tão 
simples quanto parece à primeira leitura.Isso porque, para ele, só ocorreria de verdade 
a influência no caso de a literatura receptora (aquela que estivesse recebendo a 
influência) não ser capaz de elaborar uma formulação própria para o tema tomado de 
empréstimo. 
Retomando nosso exemplo: a leitura de Otelo se revela fecunda na medida em que a 
obra de Machado articula uma formulação nova para a problemática do ciúme. Com 
efeito, podemos verificar em Dom Casmurro a importância central do tema do marido 
ciumento, como também da presença de um personagem que semeia a intriga, como 
faz o Iago da peça de Shakespeare. Trata-se de um amigo da família de Bentinho, José 
Dias. Porém, a maneira como o tema é trabalhado se revela bem diferente. 
Em vez de insistir em sua intriga como Iago, o nosso intrigante lança o veneno somente 
uma vez. Dali para diante, é a mente doentia de Bentinho quem trabalha para dar à 
suspeita os ares de quase certeza. Disso podemos concluir que Machado de Assis é 
mais sutil que Shakespeare, trabalha o tema de maneira bem diversa. 
Este é apenas um exemplo do quanto uma perspectiva teórica mais tradicional pode se 
revelar insuficiente. Ainda que debater as questões das influências e fontes seja 
importante, tal ato não pode ser resolvido de modo tão simplista, como queriam os 
comparatistas da escola francesa. 
No caso do nosso exemplo, a leitura do diálogo entre as obras Otelo e Dom Casmurro 
não se esgota na constatação de que o romance brasileiro se valeu do empréstimo de 
um dos temas centrais do texto dramático britânico. Verificar em que medida Machado 
de Assis difere de Shakespeare no tratamento da temática é de fundamental 
importância para uma avaliação crítica séria sobre a obra do nosso romancista. 
O comparativismo em crise 
Durante o período em que predominou a “escola francesa”, os estudos comparados se 
mantiveram defasados com relação às novas tendências da Teoria da Literatura. Afinal, 
o formalismo russo dera seus passos iniciais pelos idos de 1916 e 17, as correntes de 
inspiração estruturalista surgem a partir dos anos 1930, e, no entanto, algumas de suas 
lições básicas só vieram a contribuir para uma renovação do comparatismo a partir da 
década de 1950, graças à atuação de René Wellek. 
Coube a este autor a iniciativa de introduzir uma ruptura com o comparatismo 
tradicional, dando o passo inicial do que ficou conhecido como “escola americana” de 
Literatura Comparada. Em oposição aos velhos conceitos herdados do século XIX, 
centrados em critérios deterministas, Wellek propõe que os estudos literários 
comparativistas sempre tenham como ponto de partida uma leitura profunda dos 
textos, sem levar em conta somente fatores que lhe são externos, ou seja, ele atribui 
menos importância ao contexto social, ou mesmo a aspectos da individualidade do 
autor, entre outros aspectos externos ao texto. 
Assim, considerações a respeito da vida pessoal do autor, ou mesmo do momento 
histórico em que viveu, perdem importância em nome de um método de análise 
centrado na obra literária em sua realidade material. Quando se analisa 
comparativamente diferentes obras, seria importante verificar em que medida aspectos 
como a maneira como se exprimem as personagens, como é tratado o tempo da 
narrativa, como se faz o uso de discurso direto ou indireto, o emprego de figuras de 
linguagem, destes ou daqueles procedimentos retóricos, entre outros aspectos, se 
fazem presentes em cada um dos textos postos sob as lentes da comparação. 
As considerações externas ao texto perdem importância. Psicologia, sociologia, história 
e filosofia perdem importância como disciplinas de auxílio na análise interpretativa dos 
textos. 
Bem, hoje sabemos que tais pontos de vista possuem suas limitações. Mas a 
argumentação de Wellek trouxe para a Literatura Comparada a vantagem de esvaziar 
a ênfase excessiva que se dava antes a certas questões. Para esta nova tendência, de 
nada adiantaria apontar a presença de influências ou empréstimos sem uma leitura 
atenta e profunda dos textos literários. 
Para usar expressões do próprio Wellek, de nada adiantaria o pesquisador perder 
tempo com o “cálculo de créditos e débitos nacionais”. Assim, por exemplo, de pouco 
adianta para um pesquisador da Literatura Brasileira a mera constatação de que muito 
devemos aos franceses. Afinal, todos sabem o quanto as literaturas da América Latina 
sofreram influência francesa no século XIX e começo do XX. Sem uma leitura atenta de 
nossos autores, estaríamos contribuindo muito pouco para o enriquecimento da 
disciplina. Em vez disso, faríamos erudição vazia, sem conteúdo e propósitos claros. 
Dentro da concepção de tal corrente de pensamento, o importante é o pesquisador se 
valer dos instrumentos teóricos das novas tendências em estudos literários para 
avançar na análise crítica dos tesouros de nossa literatura, adquirindo melhores 
condições para fazer estudos comparativos que nos coloque em diálogo com outras 
literaturas do mundo. 
Já dissemos o quanto Machado de Assis tinha sido mais sutil no tratamento da temática 
do ciúme. Desta forma, ele estaria se distanciando de Shakespeare. Pois bem, os 
comparatistas tradicionais pouco se interessavam pela capacidade demonstrada pelos 
textos “influenciados”, ou seja, os mais recentes, em se mostrar originais, capazes de 
apontar novos rumos no tratamento dos velhos temas. Para eles, o mais importante era 
verificar semelhanças, portanto, “dívidas” dos autores mais novos com relação aos mais 
antigos. Hoje, sabemos o quanto isso é incompleto e inconsistente. 
Outro ponto interessante na crítica de Wellek é a condenação que ele faz ao binarismo, 
ou seja, a prática tradicional de só tomar dois autores, ou duas tradições literárias de 
cada vez. 
Ora, por que um estudo de literatura comparada sobre literatura não poderia articular 
análises que envolvessem autores de três ou mais nacionalidades distintas? Ou mesmo 
comparar autores da mesma nacionalidade, mas de diferentes épocas? Tudo isso fazia 
o campo de atuação da disciplina se tornar muito restrito. 
Os comparatistas da escola antiga tendiam a considerar qualquer estudo que 
envolvesse autores de mais de duas nacionalidades como tópico de estudo da 
“literatura geral”, restando à literatura comparada apenas as pesquisas binárias. Wellek 
ataca esta distinção entre a literatura geral e a comparada, mostrando que não existe 
um fundamento sólido para esta distinção. 
Assim, em nossa análise sobre o ciúme na literatura, Shakespeare e Machado poderiam 
ter a companhia de outros autores, incluindo o romancista português Eça de Queirós 
ou o russo Dostoiévski. Ou, senão, poderíamos nos ater a debater à maneira como a 
temática é trabalhada em dois autores brasileiros. Neste caso, nossa análise se voltaria 
para o diálogo rico e interessante entre o já citado clássico de Machado e o romance 
São Bernardo, de Graciliano Ramos. Pois bem, estes dois possíveis caminhos, por não 
serem binários, estavam fora de questão para os comparatistas tradicionais. 
Entretanto, Wellek foi mais eficiente em apontar as falhas do comparativismo 
tradicional do que em apontar novos caminhos. Sua contribuição foi mais deixar em 
aberto questões que outros autores tentariam responder depois. Mesmo suas lacunas 
serviram para revitalizar o caminho de autores que retomaram alguns dos aspectos 
mais controversos de suas ideias. Pois, como afirma Tânia Carvalhal: 
“A literatura comparada, sendo uma atividade crítica, não necessita excluir o histórico (sem cair no 
historicismo), mas ao lidar amplamente com dados literários e extraliterários ela fornece à crítica 
literária, à historiografia literária e à teoria literária uma base fundamental. Todas essas disciplinas 
concorrem em conjunto para o estudo literário (...)” (CARVALHAL, p. 39) 
 
O legado teórico de René Wellek, como do conjunto da produção teórica formalista e 
estruturalista, foi combater os excessos cometidos antes por uma concepção da 
literatura como resultante de condicionamentos externos.Até o começo do século XX, considerava-se que as obras resultavam sempre de 
condicionamentos externos, como o contexto histórico e social ou aspectos resultantes 
da psique do autor. Buscava-se aplicar aos estudos literários generalizações similares 
às realizadas nas ciências naturais, como a biologia de inspiração darwinista, por 
exemplo. 
Para remediar este mal, os formalistas e estruturalistas propuseram uma dieta rigorosa: 
excluir por completo o estudo do contexto na compreensão dos textos. Fizeram valer 
na análise literária critérios sincrônicos, em lugar dos diacrônicos. A influência da 
Linguística Estrutural era nítida e teve grande utilidade, na medida em que contribuiu 
para que a análise literária se libertasse dos condicionamentos anteriores. 
Contribuiu para que a análise literária se libertasse dos condicionamentos anteriores. 
Superados os rigores desse tratamento, os estudos literários puderam saber aproveitar 
com mais equilíbrio as vantagens que poderiam advir de um diálogo com outras 
disciplinas, tais como a história, a sociologia ou a psicologia. No que diz respeito às 
contribuições da história para a compreensão dos fatos literários, as melhores 
contribuições viriam de autores de formação marxista, como veremos a seguir. 
No ensaio “Crítica e sociologia (tentativa de esclarecimento)” com que abre sua 
importante obra Literatura e Sociedade, Antonio Candido propõe que o estudo de 
aspectos sociais numa obra literária pode adquirir novos contornos na medida em que 
deixarmos de considerar o meio social como algo externo à obra e passarmos a verificar 
que ele se realiza como um dos aspectos internos. 
O meio social não é apenas o universo de referências, as condições sociais em que 
viveu o artista que produziu uma obra determinada. Abrimos as páginas de um romance 
e percebemos com clareza como o meio pode se tornar um dos elementos que fazem 
parte da obra. De tal modo que é impossível uma leitura crítica plena do texto sem 
considerar a presença daquele elemento. 
O exemplo citado por Cândido é bem esclarecedor: no romance Senhora, de José de 
Alencar, os interesses financeiros interferem nas relações afetivas, na medida em que 
o enredo nos dá conta da situação de um rapaz ambicioso que se submete a ser 
comprado como marido por uma rica herdeira. O conflito entre o interesse e os 
sentimentos se torna mais agudo ao tomarmos conhecimento do fato de que esta moça 
havia sido uma antiga namorada dele e que havia sido posta de lado por ser pobre na 
época. Isso a levou a buscar uma vingança após se tornar rica. 
Bem, vemos como se torna aqui praticamente impossível separar a consideração de 
temas sociais de uma leitura adequada do romance. A denúncia da desumanização das 
relações afetivas confere ao texto de Alencar grande força expressiva. Por conta disso, 
ele é um dos grandes clássicos de nossa literatura. A própria estrutura da obra incorpora 
a denúncia, na medida em que o romance vem dividido em quatro partes que recebem 
títulos que aludem a momentos de uma operação financeira: “Preço”, “Quitação”, 
“Posse” e “Resgate”. Além disso... 
"Se, pensando nisto, atentarmos para a composição de Senhora, veremos que repousa numa 
espécie de longa e complicada transação, – com cenas de avanço e recuo, diálogos construídos 
como pressões e concessões, um enredo latente de manobras secretas, – no correr da qual a 
posição dos cônjuges vai se alternando. 
Veremos que o comportamento do protagonista exprime, em cada episódio, uma obsessão com o 
ato da compra a que se submeteu, e que as relações humanas se deterioram por causa de motivos 
econômicos. A heroína, endurecida no desejo da vingança, possibilitada pela posse do dinheiro, 
inteiriça a alma como se fosse o agente de uma operação de esmagamento do outro por meio do 
capital, que o reduz a coisa possuída. E as próprias imagens do estilo manifestam a mineralização 
da personalidade, tocada pela desumanização capitalista, até que a dialética romântica do amor 
recupere a sua normalidade convencional" (CANDIDO, 2006, p. 16). 
Vemos, assim, que a reificação, processo pelo qual o ser humano se vê transformado 
em objeto, é trabalhada com extrema perícia no romance de Alencar. De tal modo que 
se torna um aspecto interno, um de seus elementos fundamentais, mesmo. Neste caso, 
torna-se complicado empreender qualquer trabalho de avaliação crítica da obra que 
não leve em conta o diálogo que o texto propõe com aspectos do contexto social em 
que viveu. O casamento por interesse era, com efeito, algo corriqueiro na sociedade 
brasileira na segunda metade do século XIX. 
Bem, o mesmo poderíamos dizer de muitas outras obras literárias. Assim, como efetuar 
uma leitura minimamente aproveitável de Vidas Secas, o clássico de Graciliano Ramos, 
sem levar em conta a maneira como a seca e as injustiças sociais são elementos centrais 
da realidade nordestina? 
Considerar o diálogo entre texto e contexto, portanto, é válido e, muitas vezes, se 
impõe como indispensável. No entanto, é importante estar atento contra a recaída nas 
simplificações de análise que eram tão frequentes no passado. Os autores do grupo 
apontado no começo desta aula como participantes da terceira escola de Literatura 
Comparada se utilizam das ferramentas teóricas do marxismo para empreender 
análises literárias com viés histórico e sociológico. O teórico russo Zhirmunsky é um 
deles, como também o é o próprio Antonio Candido, um dos pioneiros do 
comparativismo brasileiro. 
A Linguística, a Semiótica, a História, a Sociologia, a Psicanálise, a Filosofia, entre 
outras, são chamadas a contribuir em nosso esforço para uma compreensão mais 
profunda de nossos objetos de estudo, os textos literários. 
Existe ainda outro fator básico que interfere na relação entre a obra literária e o 
contexto social – as ideologias. Com efeito, todo discurso, inclusive o literário, sempre 
reflete os padrões ideológicos vigentes na época em que o autor viveu. Os modos de 
pensar e agir de uma época estão marcados em qualquer discurso que se produza em 
tal época. Visto sob este ponto de vista, todo texto literário testemunha padrões 
ideológicos. Isso se dá mesmo quando o autor não toma plena consciência do fato. Ler 
um clássico da literatura é sempre ter contato com o mundo em que ele viveu. 
O pesquisador de Literatura Comparada precisa estar muito atento a este fato, pois 
com muita frequência analisa autores de épocas e culturas diferentes. Portanto, precisa 
estar atento às diferenças de cunho ideológico. Assim, uma leitura em paralelo de um 
autor brasileiro modernista e de um barroco não pode ser feita sem que se tenha em 
mente que um desses autores viveu na época de afirmação do capitalismo industrial no 
Brasil, ou seja, o começo do século XX, enquanto o outro viveu nos tempos do Brasil 
colônia, quando o país era submetido a um regime escravista. Um trabalho que 
demanda atenção ainda maior quando estamos comparando autores de nacionalidades 
diferentes. 
Resulta disso que a Literatura Comparada demanda um conhecimento de história, ao 
lado do domínio das disciplinas mais diretamente ligadas ao trabalho de análise literária, 
como a estética e a linguística. Deixar de observar este fato pode levar a graves erros 
de interpretação. 
Para ilustrar este ponto, tomo alguns versos do poeta barroco Gregório de Matos 
Guerra: 
 
Não sei, para que é nascer 
Neste Brasil empestado 
Um homem branco, e honrado 
Sem outra raça. 
Terra grosseira e crassa 
Que a ninguém se tem respeito, 
Salvo quem mostra algum jeito 
De ser mulato. (MATOS, 1990, p. 33) 
Bem, o debate a que remete a leitura do trecho acima é acerca da presença de racismo 
na obra do poeta. Assim, o texto insinua o quanto haveria de desonra para um homem 
“branco, e honrado” o fato de ter nascido e viver num “Brasil empestado”, pela presença 
da miscigenação racial. 
Num primeiro momento, o leitor desavisado, sem a informação história adequada, pode 
sentir-se chocado com a visão flagrantementepreconceituosa expressa no poema. 
Entretanto, tal impressão se desfaz se for levado em conta que o poema em questão 
representa um modo de pensar e agir que não existe mais entre nós, mas que era 
normal e corriqueiro nos tempos em que o poeta viveu. 
Com efeito, nos tempos coloniais, todos os filhos de colonos portugueses tinham a mais 
absoluta certeza de sua superioridade sobre os filhos de outras raças, além de estarem 
conscientes do fato de terem sido escolhidos por Deus para governar o mundo, 
promover a supremacia da religião dominante na Europa – o Cristianismo – e governar 
as criaturas bestiais que habitavam os demais continentes. 
Em suma, pela interpretação de mundo dominante na época entre os europeus e seus 
descendentes nascidos na América, o destino dos brancos, cristãos, era dominar o resto 
do mundo. Portanto, valer-se do trabalho servil das criaturas bestiais que porventura 
habitassem os demais continentes era considerado mais do que justo. Estava, desta 
forma, justificada a escravidão. Na Bahia em que viveu o poeta, os negros e mestiços 
eram considerados animais, que podiam ser postos a trabalhar e não tinham os mesmos 
direitos dos brancos. 
Uma coisa é apontar o racismo na obra de um autor que vive nos dias de hoje, em que 
tendemos a reconhecer a igualdade de fato entre todos os seres humanos, 
independente de seus traços físicos, sua cor de pele. Outra, bem diferente, é fazer o 
mesmo com relação à obra de um autor que viveu numa época em que não havia nada 
de absurdo, muito pelo contrário, em acreditar na superioridade de uma raça sobre as 
outras. 
Desta forma, o discurso poético de Gregório encontra-se impregnado pela ideologia de 
seu tempo. Compreender seu legado demanda que se tenha este dado em mente, sob 
pena de cometermos erros grosseiros de análise. Uma leitura comparativa que 
contraponha a obra deste autor à de qualquer poeta de período mais recente resultará 
um fracasso se não estiver ancorada em boa bagagem de conhecimento histórico. Será 
erro crasso utilizar a obra de Gregório como exemplo negativo em trabalhos que visem 
a enaltecer a contribuição de poetas que vieram a exaltar a participação do negro em 
nossa cultura. 
O que vem na próxima aula 
Dando sequência ao nosso trabalho de apresentação dos pressupostos teóricos que 
orientam a prática da pesquisa em Literatura Comparada, o próximo parágrafo se 
dedica a uma revalorização da contribuição dos teóricos Tynianov e Mikahil Bakhtin, 
bem como a apresentar o conceito de Intertextualidade, que Julia Kristeva formulou a 
partir dos estudos de Bakhtin sobre o dialogismo e a polifonia nos textos literários. Em 
seguida, aplicaremos o conceito de intertextualidade à leitura comparativa de alguns 
textos literários, que nos servirão de exemplos. 
 
CONCLUSÃO 
Nesta aula, você: 
• Nesta aula, você teve a oportunidade de travar conhecimento com alguns dos 
fundamentos teóricos sobre os quais a Literatura Comparada veio se 
construindo ao longo do tempo. Sempre com atenção para o fato de que a 
finalidade de toda e qualquer teoria é contribuir para uma leitura mais 
profunda e uma análise crítica mais cuidadosa dos textos literários. Além disso, 
você conheceu três tendências de pensamento, a que denominamos “escolas 
teóricas” que deram contribuição importante para a consolidação de nossa 
disciplina, pondo em debate alguns dos tópicos centrais que norteiam a 
atividade dos comparatistas nos dias de hoje. O estudo das influências 
literárias, das fontes e empréstimos, a necessidade de dar prioridade ao texto, 
penetrando em suas camadas mais profundas, para dele apreender toda 
riqueza possível, o debate em torno do modo como conduzir a reflexão acerca 
do diálogo entre o texto literário e os contextos históricos e sociais foram as 
principais matrizes de que nos ocupamos neste momento. 
LITERATURA COMPARADA 
A CONSTRUÇÃO DO CONCEITO DE INTERTEXTUALIDADE 
 
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OLÁ! 
Ao final desta aula, o aluno será capaz de: 
1. Acompanhar alguns passos importantes dos debates teóricos havidos ao longo do 
século XX, que levaram os estudiosos a propor o conceito de intertextualidade; 
2. Verificar que dentro das próprias fileiras do formalismo já havia quem defendesse 
que o estudo da literatura só se realiza por completo se for considerado seu diálogo 
com os contextos sociais; 
3. Abordar aspectos importantes das ideias do filósofo da linguagem Mikhail Bakhtin, 
em particular a importância do dialogismo em todos os aspectos da vida humana; 
4. Destacar o fato de que a noção de intertextualidade, proposta por Júlia Kristeva, 
decorre de uma leitura atenta das proposições de Bakhtin, aplicadas de modo 
específico à análise literária. 
1 A construção do conceito de intertextualidade 
A contribuição da Teoria Literária para as pesquisas comparatistas vai ainda muito além 
do que expusemos na aula anterior. Um dos conceitos centrais em nosso campo de 
estudos, hoje em dia, é o de intertextualidade, cuja história e importância abordaremos 
agora. 
Antes porém, outras informações se impõem como de máxima importância, para que, 
ao final da presente aula, tenhamos a capacidade de enxergar os fatos literários com 
maior capacidade crítica. 
2 De volta ao formalismo 
Importa destacar que as escolas teóricas sempre possuem uma riqueza bem maior do 
que se pode supor numa análise que peque por excesso de superficialidade e 
esquematismo. Os diversos autores que costumam ser reunidos sob a alcunha de 
“formalistas”, como já destacamos, se propuseram a renovar a teoria da literatura no 
começo do século XX. 
Seria mais exato dizer que houve vários formalismos, e não um só, mas em comum 
estes autores tinham o interesse em construir um método científico para a análise dos 
textos literários, além afirmar o primado da atenção ao texto em si mesmo, ao destacar 
a prioridade em analisar os aspectos internos da obra e denunciar os erros de 
interpretação cometidos no passado por conta de se prestar mais atenção a dados 
externos. 
Num primeiro momento, aproximando-se da linguística estrutural de Saussure, alguns 
dos expoentes do grupo formalista fazem a opção pelo estudo sincrônico do texto, em 
detrimento de uma abordagem que buscasse a filiação deste texto a tradições ou linhas 
de evolução histórica. Todavia, dentro do próprio grupo, já existe a consideração de 
que o estudo mais atento do texto literário não pode dispensar um diálogo atento com 
o contexto social. 
Isso se dá com a obra crítica de Iuri Tynianov, autor que destaca a extrema importância 
de não separar a análise dos textos literários do estudo dos outros fatos sociais. 
 
 
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Figura 1 - Iuri Tynianov 
Segundo Iuri Tynianov, não se pode perder de vista nem o que há de peculiar e único 
na literatura, nem a importância do seu diálogo com o momento histórico no qual uma 
dada obra foi produzida. Trazendo de volta à cena crítica o interesse pelo estudo da 
evolução literária, Tynianov começa a resgatar o interesse pelo estudo diacrônico, sem 
deixar de lado uma perspectiva sincrônica. 
Em suas palavras, a série literária e a série social estão em permuta constante; sendo 
da máxima importância para a plena compreensão do valor de uma obra singular, o 
estudo em paralelo do momento social e histórico, em particular do conjunto formado 
pelas obras que surgiram nos mesmo momentos históricos. 
Uma plena compreensão da ficção de Machado de Assis se enriquece com a leitura em 
paralelo de outras obras da mesma época, além do estudo da própria história social 
brasileira no período de transição do Império para a República. 
Importante ter em mente tanto a série literária à qual essa obra pertence (o conjunto 
de obras representativas de uma determinada literatura nacional) quanto o 
entendimento dos elementos da série social (o momento histórico e as outras 
manifestações artísticas da época, por exemplo)

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