Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
CONTROLADORIA PÚBLICA Jorge Vieira da Silva Auditoria pública, objetivos e finalidade Objetivos de aprendizagem Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados: Descrever os objetivos da auditoria pública. Relacionar a finalidade da auditoria do setor público. Identificar os princípios da auditoria pública. Introdução A auditoria pública é uma excelente ferramenta de gestão, pois permite a melhor utilização dos recursos públicos a partir da melhoria de processos e da correção de erros. Saber como a auditoria pública é realizada permite ao gestor público uma orientação de como melhorar o seu planejamento, a sua organização, a sua liderança e os seus controles. Neste capítulo, você vai ver a auditoria pública, os seus objetivos e a sua finalidade. Inicialmente, verá as definições de auditoria, auditoria privada e pública, auditoria interna e externa, auditorias especializadas, bem como os objetivos da auditoria pública. A seguir, lerá sobre a relação entre os objetivos da auditoria pública e a sua finalidade. Por fim, vai estudar como identificar e analisar os princípios da auditoria pública: ética, julgamento, ceticismo profissional, riscos, materialidade e comunicação. 1 A auditoria pública e seus objetivos Auditoria é um conjunto de métodos, procedimentos e técnicas que visam a verifi car se determinadas ações foram ou estão sendo realizadas de acordo com normas, processos, planejamento ou orçamento pré-estabelecidos. Uma auditoria pode ser classifi cada de diferentes maneiras: de acordo com sua área de aplicação – pode ser privada ou pública; de acordo com a sua origem ou vinculação – pode ser interna ou externa; de acordo com a sua especialização ou objeto de análise – pode ser administrativa, contábil, financeira, orçamentária, de operações, patri- monial, de sistemas, de processos, ambiental, da qualidade, entre outras. Definições de auditoria: privada e pública, interna e externa Conforme a área de aplicação, a auditoria pode ser classifi cada como privada ou pública. Auditoria privada é aquela realizada na administração de empresas, em empresas de propriedade privada. A auditoria privada, portanto, ocorre no contexto da controladoria empresarial. Auditoria pública (ou governamental) é a auditoria aplicada à admi- nistração pública. A auditoria pública, então, ocorre conforme normas, processos, planejamento ou orçamento pré-estabelecidos na adminis- tração pública, no contexto da controladoria pública. A classificação da auditoria interna ou externa está associada à sua vin- culação ou à sua origem. A auditoria de empresas privadas pode ser interna ou externa. Auditoria interna é aquela realizada pela própria empresa, a qual estabelece as suas próprias regras e planeja a auditoria para, em seguida, executá-la. Esse é o caso, por exemplo, das áreas de auditoria interna nas empresas, que fazem auditorias visando à melhoria de processos ou de controles internos. Auditoria pública, objetivos e finalidade2 Auditoria externa é aquela realizada por alguém que não pertence à estrutura organizacional da empresa, a partir de regras e planejamento externos. Esse é o caso, por exemplo, das auditorias independentes que realizam auditoria externa de contabilidade e finanças em empresas de capital aberto, negociadas em bolsas de valores. A auditoria pública também pode ser interna ou externa. Nesse caso, ela segue o que determina o Art. 70 da Seção IX – Fiscalização Contábil, Financeira e Orçamentária, da Constituição Federal de 1988 (BRASIL, 1988, documento on-line): Art. 70. A fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patri- monial da União e das entidades da administração direta e indireta, quanto à legalidade, legitimidade, economicidade, aplicação das subvenções e renúncia de receitas, será exercida pelo Congresso Nacional, mediante controle externo, e pelo sistema de controle interno de cada Poder. Assim, pode-se definir a auditoria pública interna e externa no Brasil da seguinte forma: Auditoria pública interna é uma das formas de controle executadas no sistema de controle interno, ou seja, pelo próprio poder — Executivo, Legislativo ou Judiciário — responsável pelo órgão ou entidade audi- tada. Por exemplo, a auditoria pública interna das unidades das Forças Armadas é feita pela Secretaria de Controles Internos que pertence à estrutura organizacional das Forças Armadas. Auditoria pública externa é uma das formas de controle executadas no sistema de controle externo, ou seja, no sistema de controle que o Poder Legislativo, auxiliado pelo respectivo Tribunal de Contas, executa em todos os órgãos do governo. Por exemplo, o Tribunal de Contas da União (TCU), que auxilia o Congresso Nacional no sistema de controle externo, é responsável pelas auditorias públicas externas nos órgãos e nas entidades de todo o Governo Federal brasileiro. A Figura 1 mostra as auditorias internas e externas, bem como os seus responsáveis na administração pública federal. 3Auditoria pública, objetivos e finalidade Figura 1. Auditorias públicas internas e externas e os seus responsáveis na administração pública federal. Fonte: Adaptada do TCU ([2020]). A administração pública federal tem um sistema de controle interno em cada um dos Poderes: um no Executivo, um no Legislativo e um no Judiciário. O sistema de controle externo é responsabilidade do Congresso Nacional, que, nesse sistema, é auxiliado pelo Tribunal de Contas da União. A estrutura do sistema de controle interno do Poder Executivo inclui a Controladoria Geral da União (CGU), com Assessorias de Controle Interno e equipes de Auditorias Internas. Além disso, há as Secretarias de Controle Interno: uma na Casa Civil, uma no Ministério da Defesa e uma no Ministério das Relações Exteriores. O Poder Legislativo e o Poder Judiciário contam com uma Secretaria de Controle Interno para cada um deles. Todos esses órgãos de controle interno podem realizar controles, sendo a auditoria interna uma das formas de controle interno. A estrutura de controle externo, com Congresso Nacional e TCU, executa várias formas de controles externos, que incluem as auditorias externas feitas por equipes do TCU. Os estados, o Distrito Federal e os municípios possuem estruturas similares às da União nos seus sistemas de controle interno e externo, assim como na forma de execução das suas auditorias interna e externa. Eles seguem os Arts. 25 a 32 da Constituição Federal (BRASIL, 1988), estabelecendo os seus siste- mas de controle nas suas próprias constituições e leis orgânicas. Entretanto, Auditoria pública, objetivos e finalidade4 mantém-se o modelo de desenho organizacional da União, com controladoria pública no Poder Executivo e órgãos de controle interno em cada um dos Poderes, assim como Assembleias Legislativas ou Câmaras de Vereadores. Além disso, os Tribunais de Contas auxiliam executando o controle externo com auditorias externas. Vale lembrar que, além do TCU, o Brasil tem 26 Tribunais de Contas esta- duais, um Tribunal de Contas no Distrito Federal, três Tribunais de Contas de municípios de estados (Bahia, Goiás e Pará) e dois Tribunais de Municípios (São Paulo e Rio de Janeiro). Cada um desses órgãos possui os seus sistemas de controle externo e executa trabalho similar ao do TCU. O Tribunal de Contas da União (CARVALHO NETO, 2011) diferencia controle, fiscalização e auditoria. Controle é o poder que os órgãos dos Poderes Judiciário, Legislativo e Executivo têm de fiscalizar a administração pública; Fiscalização se refere ao poder de polícia que o Estado tem, o qual é atribuído a um órgão ou agente público, de modo que este possa exercer um controle. Trata-se de uma das maneiras de se realizar o controle — e fazer isso com eficácia; Auditoria é um conjunto de métodos, procedimentos e técnicas do qual se lança mão para fazer fiscalizações. Trata-se de uma entre as maneiras possíveisde se realizar a fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial. Auditorias especializadas Auditoria especializada é a auditoria que se baseia no objeto de análise. Por exemplo, em uma auditoria fi nanceira, o objeto de análise são as fi nanças da empresa, órgão ou entidade auditada — o que inclui registros e informações contábeis, fi nanceiras, patrimoniais e de sistemas. Nesse caso, pode-se dizer que o objetivo da auditoria é verifi car as fi nanças e os demonstrativos da organização que está sendo auditada. As auditorias especializadas podem ser classificadas de diferentes manei- ras. Na administração pública, por exemplo, elas podem receber a seguinte classificação: 5Auditoria pública, objetivos e finalidade Auditorias administrativas (auditorias de gestão ou auditorias de conformidade) – podem ser divididas em auditorias de avaliação de gestão ou de acompanhamento de gestão. As auditorias de avaliação de gestão visam a verificar a conformidade da gestão em termos de legalidade e legitimidade, ou seja, a regularidade da gestão. As auditorias de monitoramento de gestão visam a verificar o procedimento do órgão ou entidade auditado em tempo real. Auditorias financeiras (auditorias contábeis) – visam a verificar os registros e as informações contábeis, financeiras, orçamentárias e patrimoniais da empresa, órgão ou entidade auditada. Essas auditorias podem ter foco financeiro, na sua execução, atendo-se somente a esse tipo de registros e informações, mas também podem verificar questões de gestão e operações (o que geralmente acontece). Auditorias operacionais (auditorias de processos) – visam a avaliar os procedimentos de atividades operacionais, com o objetivo de verificar a sua eficiência, ou seja, se os processos estão sendo bem executados; a sua eficácia, ou seja, se os processos estão atingindo objetivos e metas; e a sua econo- micidade, ou seja, se os processos têm uma boa relação de custo-benefício. Auditorias especiais (auditorias ad hoc) – são auditorias específicas para atender a alguma demanda especial de governança, por exemplo, uma auditoria especial solicitada ao TCU pelo Congresso Nacional ou uma auditoria solicitada pelo Ministério da Economia à CGU. As auditorias financeiras (ou contábeis) dos sistemas de controle interno e externo da contro- ladoria pública brasileira incluem a fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial, simultaneamente, de acordo com o que estabelece o Art. 70 da Constituição Federal (BRASIL, 1988). Em teoria, essas auditorias podem ser restritas às seguintes áreas: Auditoria pública, objetivos e finalidade6 A Figura 2 mostra um esquema das diferentes classificações da auditoria pública inseridas na controladoria pública brasileira. Auditoria contábil – pode ser entendida como um dos ramos da contabilidade, que visa a verificar documentos, livros e registros contábeis, assim como a realizar inspeções e obter informações de fontes internas e externas relacionadas à contabilidade da entidade auditada. Esse é o caso da auditoria contábil pública, que examina documentos, livros e registros contábeis, realiza inspeções e obtém informações de fontes relacionadas ao controle contábil do órgão ou entidade auditado. Auditoria financeira – visa a verificar os recursos financeiros da entidade auditada e as operações associadas aos fluxos de entrada e saída desses recursos. Em outras palavras, examina se as receitas e as despesas estão de acordo com a Lei Complementar nº 101, de 4 de maio de 2000, conhecida como Lei de Responsabilidade Fiscal, e outras normas de gestão fiscal (BRASIL, 2000). Trata-se de uma auditoria que em geral é feita em conjunto com as auditorias contábil e patrimonial, na qual se verifica a situação de ativos, passivos, patrimônio, entradas e saídas de fluxos de caixa, resultados e liquidez da entidade auditada. Auditoria orçamentária – visa a verificar se a execução orçamentária está de acordo com a Lei nº 4.320, de 17 de março de 1964, que normatiza a elaboração e o controle dos orçamentos e balanços da União, dos estados, do Distrito Federal e dos municípios (BRASIL, 1964), bem como com as demais legislações orçamentárias (BRASIL, 2020), e se o planejamento e o orçamento estão sendo (ou foram) cumpridos. Auditoria operacional – busca verificar o conjunto das operações do órgão ou entidade auditada, ou seja, se, além da correção dos registros contábeis, financeiros e orçamentários, o órgão ou a entidade está cumprindo o seu papel social e atingindo os objetivos sociais que estão previstos no Plano Plurianual (e que justificam a sua existência). Auditoria patrimonial – verifica, geralmente via inspeção, se os registros contábeis de patrimônio correspondem à realidade. Por exemplo, o registro contábil da compra de ativos pode ter sido feito de acordo com as normas contábeis, financeiras e orçamentárias, mas a auditoria faz a verificação dos ativos adquiridos no seu local de destino. Logo, se foram adquiridos 20 computadores para uma escola, o auditor pode ir até o local para checar se os equipamentos estão lá e se estão de acordo com as especificações da ordem de compra. Na prática, a auditoria financeira é uma só, compreendendo contabilidade, finanças, orçamento, operações e patrimônio. Eventualmente, auditorias especiais (ad hoc) podem focar em somente um desses tipos de auditoria, mas essa não é a regra. 7Auditoria pública, objetivos e finalidade Figura 2. Tipos de auditoria pública no contexto da controladoria pública brasileira. Fonte: Adaptada de Brasil (1988). Em síntese, as auditorias na controladoria pública podem ser classificadas conforme a sua origem (interna e externa) e conforme a sua especialização (contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial). Vale lembrar que outras auditorias são possíveis na administração pública — por exemplo, uma auditoria de sistemas. Objetivos da auditoria pública As auditorias especializadas na controladoria pública brasileira têm objetivos específi cos que correspondem ao objeto de análise. Nesse sentido, atendem a uma legislação específi ca além de normas e manuais publicados pelos sistemas de controle interno e externo. A legislação e as normas que baseiam a execução da auditoria pública brasileira incluem os seguintes documentos: Constituição Federal de 1988, que estabelece o Plano Plurianual, a Lei de Diretrizes Orçamentárias, a Lei Orçamentária Anual, art. 165 e 166 (BRASIL, 1988) e os sistemas de controle interno e externo, art. 70 a 75 (BRASIL, 1988); Lei nº 4.320/1964, que normatiza a elaboração e o controle dos orça- mentos e balanços da União, dos estados, do Distrito Federal e dos municípios (BRASIL, 1964); Auditoria pública, objetivos e finalidade8 Lei de Responsabilidade Fiscal, que normatiza as finanças públicas para a responsabilidade na gestão fiscal e dá outras providências (BRASIL, 2000); Lei do Plano Plurianual, que estabelece diretrizes, objetivos e metas da administração pública federal para despesas de capital e outras decorrentes, e para as despesas relativas aos programas de duração continuada, art. 165 (BRASIL, 1988); Lei de Diretrizes Orçamentárias, que estabelece metas e prioridades para o ano seguinte; fixa o montante de recursos que o governo pretende economizar; traça regras, vedações e limites para as despesas dos Poderes; autoriza o aumento das despesas com pessoal; regulamenta as transferências a entes públicos e privados; disciplina o equilíbrio entre as receitas e as despesas; indica prioridades para os financiamentos pelos bancos públicos, art. 165 (BRASIL, 1988); Lei Orçamentária Anual, que estabelece os orçamentos da União, por intermédio dos quais são estimadas as receitas e fixadas as despesas do Governo Federal, art. 165 (BRASIL, 1988); outras normas e orientações que são fornecidas pelos sistemas de controle interno (de cada umdos três poderes) e externo (Congresso Nacional e TCU, no caso da União). O Quadro 1 traz um resumo dos objetivos das auditorias especializadas da auditoria pública brasileira. Grupo Tipo de auditoria Objetivos Auditoria ad- ministrativa (de gestão) Auditoria de avaliação da gestão Verificar a conformidade da gestão administrativa (regulari- dade, em termos de legalidade e legitimidade) Auditoria de acompanha- mento da gestão Verificar a conformidade da gestão administrativa em tempo real (atividade acompanhada sob supervisão e orientação) Quadro 1. Objetivos das auditorias especializadas da auditoria pública brasileira (Continua) 9Auditoria pública, objetivos e finalidade Os objetivos das diferentes auditorias, como mostra o Quadro 1, dizem respeito ao objetivo da auditoria em si: a auditoria administrativa visa a verificar a conformidade da gestão; a auditoria financeira visa a verificar registros, documentos, lançamen- tos contábeis, financeiros orçamentários e patrimoniais; a auditoria operacional visa a verificar a eficiência, eficácia e econo- micidade do cumprimento de objetivos e metas; a auditoria especial visa a atender aos objetivos de uma solicitação específica de auditoria. Fonte: Adaptado de TCU ([2020]) e CGU ([2020]). Grupo Tipo de auditoria Objetivos Auditoria finan- ceira (contábil) Auditoria contábil Verificar registros e documen- tos contábeis (de lançamentos contábeis) Auditoria financeira Verificar registros e documentos fi- nanceiros (de execução financeira) Auditoria orçamentária Verificar registros e lançamentos orçamentários (de execução orçamentária) Auditoria patrimonial Verificar registros e lançamentos versus patrimônio Auditoria operacional (de processos) Auditoria de processos Verificar a eficiência (se os proces- sos estão sendo bem executados), a eficácia (se os processos estão atingindo objetivos e metas) e a economicidade (se os pro- cessos têm uma boa relação de custo-benefício) Auditoria espe- cial (ad hoc) Auditoria sob demanda (solicitada) Objetivos a definir Quadro 1. Objetivos das auditorias especializadas da auditoria pública brasileira (Continuação) Auditoria pública, objetivos e finalidade10 Todas essas auditorias e os seus objetivos têm uma finalidade na gestão pública. Além dos seus objetivos específicos, as auditorias buscam possibi- litar melhorias na gestão pública sob algum aspecto — seja administrativo, financeiro ou operacional. A seguir, essa finalidade é descrita e associada a cada tipo de auditoria pública. O site do portal do TCU tem uma seção dedicada a Controles e Fiscalização. Nessa seção do portal, você encontrará uma lista de Normas de Auditoria, que inclui: consulta pública; glossário de termos de controle externo; Normas Brasileiras de Auditoria do Setor Público; normas de fiscalização; Normas Internacionais das Entidades Fiscalizadoras Superiores (ISSAI); técnicas, estudos e ferramentas de apoio; orientações em vídeo sobre auditorias. 2 A finalidade da auditoria pública A fi nalidade da auditoria pública — a razão da sua existência — deriva da fi nalidade do próprio Estado e da administração pública. O Brasil é um estado democrático de direito, em que a sociedade (o povo) elege os seus representantes no Poder Legislativo e os líderes do Poder Executivo. O Art. 1º, parágrafo único, da Constituição Federal determina que “Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição” (BRASIL, 1988, documento on-line). O Poder Executivo eleito elabora, com base nos Arts. 165 e 166 da Consti- tuição Federal (BRASIL, 1988), o planejamento e o orçamento, colocando-os em projetos de lei e encaminhando-os para o Poder Legislativo, que os analisa, ajusta e aprova. O controle da execução é feito pelos sistemas de controle interno, em cada um dos três poderes (Executivo, Legislativo e Judiciário), e pelo sistema de controle externo feito pelo Poder Legislativo, com base nos Arts. 70 a 75 da Constituição Federal (BRASIL, 1988). 11Auditoria pública, objetivos e finalidade No contexto desses sistemas de controle, há uma prestação de contas do Poder Executivo para o Poder Legislativo, a quem cabe julgar administra- tivamente — via Tribunais de Contas, que julgam e emitem pareceres — e aprovar as contas. Porém, essa prestação de contas (que frequentemente é referida pelo seu nome em inglês, “accountability”) não é suficiente para a aprovação. É preciso que uma auditoria pública ateste que a execução daquilo que foi planejado e orçado tenha alcançado os seus objetivos e metas, e que isso tenha sido feito de acordo com as formas aprovadas, pelo Poder Legislativo e pela regulamentação complementar, de gestão, de operações e de finanças. Portanto, accountability é um termo em inglês que significa “prestação de contas” e “responsabilização pelas contas apresentadas” diante daqueles que possuem o direito de propriedades ou aos seus representantes. No caso das empresas, na governança corporativa, a diretoria executiva deve prestar contas ao conselho de administração que representa o conjunto de acionistas da empresa. No setor público, esse termo implica a obrigação, com base legal, dos gestores públicos de prestarem contas dos seus atos aos representantes da sociedade do Poder Legislativo. A Figura 3 mostra a relação de accountability do setor público feita pelo Tribunal de Contas da União entre os agentes de governança do setor público, destacando-se a auditoria pública. Figura 3. Relação de accountability do setor público. Fonte: Carvalho Neto (2011, documento on-line). Auditoria pública, objetivos e finalidade12 Como você viu na Figura 3, a auditoria pública está inserida na relação entre sociedade (agente principal da governança pública), Poder Legislativo (representante do agente principal) e gestores públicos (agentes delegados). Os gestores públicos devem prestar contas à sociedade via Poder Legislativo, e essas contas devem ser auditadas. Assim, a sociedade que tem o seu Estado organizado elege os seus representantes no Poder Legislativo, bem como gestores públicos. Em teoria, o que a sociedade espera desses gestores públicos é que eles: planejem benefícios para a sociedade a partir de recursos de impostos; aprovem esse planejamento e o respectivo orçamento junto ao Poder Legislativo; executem o planejamento e o orçamento, fazendo ajustes fiscais; prestem contas daquilo que foi realizado. A auditoria pública se insere nesse contexto e, como atividade de controle, tem como finalidade verificar a execução do planejamento e orçamento público pelos seus gestores. Como você viu anteriormente neste capítulo, a auditoria pública tem objetivos específicos, mas tem a finalidade de verificar a execução: se compete à administração pública executar, compete à auditoria pública verificar essa execução. A auditoria pública e os seus objetivos podem ser agrupados nos três tipos de auditorias: administrativas, financeiras e operacionais. Esses três tipos de auditoria, em conjunto, remetem à finalidade da auditoria pública, que consiste em verificar (1) se os resultados planejados e orçados foram obtidos, (2) se foram obtidos em conformidade com a lei e (3) se foram obtidos com eficiência, eficácia e economicidade. As auditorias administrativas, ao verificarem se a gestão pública está em conformidade com leis e normas, atende a uma parte da finalidade. As auditorias financeiras, ao verificar contabilidade, finanças, orçamento e patrimônio, atendem a uma segunda parte dessa finalidade. As auditorias operacionais, ao compararem objetivos, metas e resultados, atendem à parte restante da finalidade. Caso a finalidade não esteja completa, novas auditorias (as auditorias especiais) podem ser solicitadas em qualquer um desses três tipos de auditoria. 13Auditoria pública, objetivos e finalidade Os gestores públicos devemexecutar as suas atividades visando a atingir os resultados planejados e orçados, fazendo isso em conformidade com a lei e com eficiência, eficácia e economicidade. Ao término de cada período, devem prestar contas formalmente da sua gestão ao respectivo Poder Legislativo. A auditoria pública, seja a auditoria dos Tribunais de Contas no sistema de controle externo ou aquelas dos sistemas de controles internos dos poderes, deve verificar essas contas e declarar, formalmente, que as atividades foram auditadas por critérios administrativos (de gestão), operacionais (de proces- sos) e financeiros (contábeis, financeiros, orçamentários e patrimoniais). A Figura 4 mostra o tripé da finalidade da auditoria pública, formado por gestão, operações e finanças. Figura 4. Finalidade da auditoria pública no Brasil. Fonte: Adaptada de TCU ([2020]). Interessa muito ao Poder Legislativo, principal responsável pelo sistema de controle externo, se os resultados sociais foram alcançados e se a sociedade teve as suas demandas sociais atendidas. O Poder Legislativo deve representar a sociedade nos seus interesses e, para isso, deve aprovar as contas do conjunto de gestores públicos. Auditoria pública, objetivos e finalidade14 Veja um exemplo simplificado de finalidade da auditoria pública. 1. O prefeito eleito de uma cidade do interior do Brasil se elegeu prometendo dar mais opções de lazer para a população. Prometeu a construção de três parques municipais em terrenos de área verde pertencentes ao município. 2. Ao ser eleito, elaborou o planejamento do município em seu Plano Plurianual, fez o orça- mento para esses três parques e os incluiu na Lei Orçamentária Anual, a qual foi aprovada. 3. No período previsto, agindo com responsabilidade fiscal e ambiental, o município construiu e entregou os três parques à população. 4. A unidade central de controladoria pública acompanhou a execução, realizando audi- torias (administrativas, operacionais e financeiras). 5. Na data prevista, as contas do município foram submetidas ao Tribunal de Contas res- ponsável, que as verificou, fez uma auditoria e inspecionou os parques, comprovando a utilização dos recursos. 6. A Câmara de Vereadores recebeu as contas do tribunal, junto a um parecer, e aprovou as contas do município. 7. A população ficou satisfeita com os três novos parques. O TCU adota as Normas ISSAI, as quais são disponibilizadas no seu portal. A Norma ISSAI 100 (INTOSAI, 2017) trata dos princípios fundamentais de auditoria do setor público. Antes de listar esses princípios, a norma avalia o ambiente da auditoria pública: O ambiente da auditoria do setor público é aquele no qual governos e outras entidades do setor público são responsáveis pelo uso de recursos provenientes de tributação e outras fontes, para a prestação de serviços aos cidadãos e outros beneficiários. Essas entidades devem prestar contas de sua gestão e desempenho, assim como do uso dos recursos, tanto para aqueles que proveem os recursos como para aqueles que dependem dos serviços prestados com a utilização de tais recursos, incluindo os cidadãos. A auditoria do setor público ajuda a criar condições apropriadas e a fortalecer a expectativa de que as entidades do setor público e os servidores públicos desempenharão suas atribuições de modo efetivo, eficiente, ético e em conformidade com as leis e os regulamentos aplicáveis (INTOSAI, 2017, documento on-line). 15Auditoria pública, objetivos e finalidade A Norma ISSAI 100 também coloca mais detalhadamente a finalidade da auditoria pública: As auditorias do setor público partem de objetivos que podem ser distintos, dependendo do tipo de auditoria que está sendo realizada. No entanto, todas elas contribuem para a boa governança: • fornecendo aos usuários previstos, com independência, informações objetivas e confiáveis, conclusões ou opiniões baseadas em evidência suficiente e apropriada, relativas às entidades públicas; • aperfeiçoando a accountability e a transparência, promovendo melhorias contínuas e permanente confiança no uso apropriado de recursos e bens públicos e no desempenho da administração pública; • fortalecendo a efetividade dos órgãos que, dentro do ordenamento constitucio- nal, exercem funções gerais de controle e correição sobre o governo, bem como dos responsáveis pela gestão de atividades financiadas com recursos públicos; • criando incentivos para mudança ao proporcionar conhecimento, análises abrangentes e recomendações bem fundamentadas para aprimoramentos (IN- TOSAI, 2017, documento on-line). Os objetivos da auditoria pública dependem do tipo de auditoria realizada (administrativa, operacional ou financeira) e da sua finalidade, como você viu neste capítulo. Presentes nas publicações do TCU e das Normas ISSAI, esses objetivos somam-se aos princípios da auditoria pública, expressos na Norma ISSAI 100, a qual é adotada pelo TCU. 3 Os princípios da auditoria pública Os princípios da auditoria pública são listados na Norma ISSAI 100 – Princípios Fundamentais de Auditoria do Setor Público (INTOSAI, 2017). Esses princípios são adotados pelo TCU, que é, nos termos da norma, a entidade fi scalizadora superior no Brasil. Outros Tribunais de Contas estaduais e municipais, assim como a Controladoria Geral da União e órgãos dos sistemas de controles internos, também adotam tais princípios. Esses princípios, como o nome indica, são fundamentais para a condução de uma auditoria pública. De acordo com a Norma ISSAI 100: A auditoria é um processo cumulativo e iterativo. No entanto, para fins de apre- sentação, os princípios fundamentais são agrupados por princípios relacionados aos requisitos organizacionais das EFS [Entidades Fiscalizadora Superiores], princípios gerais que o auditor deve considerar antes do início e em mais de um momento durante a auditoria e princípios relacionados com as etapas específicas do processo de auditoria (INTOSAI, 2017, documento on-line). Auditoria pública, objetivos e finalidade16 Para saber mais sobre os princípios adotados pelo TCU para a auditoria pública, leia as normas: ▶ ISSAI 100 – Princípios Fundamentais de Auditoria do Setor Público; ▶ ISSAI 200 – Princípios Fundamentais de Auditoria Financeira; ▶ ISSAI 300 – Princípios Fundamentais de Auditoria Operacional; ▶ ISSAI 400 – Princípios Fundamentais de Auditoria de Conformidade. Essas normas tratam dos princípios fundamentais de auditoria do setor público (Norma ISSAI 100), descritos neste capítulo, que são detalhados por tipo de auditoria: financeira (ISSAI 200), operacional (ISSAI 200) e administrativa, de conformidade (ISSAI 300). Todas essas normas estão disponíveis no portal do TCU. Os princípios fundamentais podem ser divididos em princípios gerais e princípios relacionados ao processo de auditoria. Os princípios gerais, definidos na Norma ISSAI 100 (INTOSAI, 2017), são os seguintes: Ética e independência: os auditores devem ser independentes e também devem cumprir exigências éticas; Julgamento, devido zelo e ceticismo profissionais: os auditores devem ter um comportamento profissional apropriado, com ceticismo e julgamento profissional, exercendo devido zelo durante todo o processo de auditoria; Controle de qualidade: os auditores devem executar a auditoria de acordo com normas profissionais de controle de qualidade; Gestão de equipes de auditoria e habilidades: os auditores devem ter as habilidades necessárias, ou então ter acesso a elas; Risco de auditoria: os auditores devem gerenciar os riscos envolvidos no fornecimento de um relatório inadequado nas circunstâncias da auditoria; Materialidade: os auditores devem considerar a questão da materia- lidade durante todo o processo de auditoria; Documentação: os auditores devem preparar a documentação de au- ditoria de forma suficientemente detalhada, a fim de oferecer uma compreensão clara do trabalho realizado, da evidência obtida e das conclusões alcançadas; Comunicação: osauditores devem estabelecer uma comunicação eficaz durante todo o processo de auditoria. 17Auditoria pública, objetivos e finalidade Os princípios relacionados ao processo de auditoria da Norma ISSAI 100 (INTOSAI, 2017) são subdivididos em princípios de planejamento, princípios de execução e princípios de relatório e monitoramento. Logo, esses princípios indicam o processo de auditoria em três etapas: (1) planejamento, (2) execução e (3) relatório e monitoramento. Os princípios você pode ver com detalhes na Figura 5. Figura 5. Princípios da auditoria no setor público. Fonte: Norma ISSAI 100 (INTOSAI, 2017, documento on-line). Os princípios da auditoria do setor público mostrados na Figura 5, em conjunto com os objetivos das auditorias administrativa (de conformidade), operacional e financeira, e as finalidades da auditoria pública, formam a base conceitual e teórica para a auditoria pública no Brasil. Portanto, finalidade, objetivos e princípios devem ser conhecidos pelas três partes envolvidas em uma auditoria pública: (1) o auditor, que executa a auditoria; (2) a parte responsável, que é a empresa, o órgão ou a entidade auditada; (3) o usuário, que é quem recebe o relatório de auditoria para leitura e análise. Auditoria pública, objetivos e finalidade18 BRASIL. [Constituição (1988)]. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Se- nado Federal, 1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/ Constituiçao.htm. Acesso em: 16 abr. 2020. BRASIL. Controladoria-Geral da União. Brasília: CGU, [2020]. Disponível em: https:// www.gov.br/cgu/pt-br. Acesso em: 16 abr. 2020. BRASIL. Lei Complementar n. 101, de 4 de maio de 2000. Estabelece normas de finanças públicas voltadas para a responsabilidade na gestão fiscal e dá outras providências. Brasília, 2000. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/lcp/lcp101. htm. Acesso em: 16 abr. 2020. BRASIL. Lei n. 4.320, de 17 de março de 1964. Estatui Normas Gerais de Direito Financeiro para elaboração e controle dos orçamentos e balanços da União, dos Estados, dos Municípios e do Distrito Federal. Brasília, 1964. Disponível em: http://www.planalto. gov.br/ccivil_03/leis/l4320.htm. Acesso em: 16 abr. 2020. BRASIL. Senado Federal. Controle externo. Brasília: Senado Federal, 2020. Disponível em: https://www12.senado.leg.br/orcamento/glossario/controle-externo. Acesso em: 16 abr. 2020. CARVALHO NETO, A. A. (coord.). Auditoria governamental. Brasília: TCU, 2011. Disponível em: https://portal.tcu.gov.br/lumis/portal/file/fileDownload.jsp?fileId=8A8182A24F0A 728E014F0B277355651D. Acesso em: 16 abr. 2020. INTOSAI. ISSAI 100: princípios fundamentais de auditoria do setor público. Brasília: TCU, 2017. Disponível em: https://portal.tcu.gov.br/lumis/portal/file/fileDownload.jsp?fileId =8A8182A15D3169CE015D56CBA59F12A3. Acesso em: 16 abr. 2020. TCU. Conheça o TCU. Brasília: TCU, [2020]. Disponível em: https://portal.tcu.gov.br/ institucional/conheca-o-tcu/funcionamento/. Acesso em: 16 abr. 2020. Leituras recomendadas INTOSAI. ISSAI 200: princípios fundamentais de auditoria financeira. Brasília: TCU, 2017. Disponível em: https://portal.tcu.gov.br/lumis/portal/file/fileDownload.jsp?fileId=8A 8182A15D3169CE015D56CC01BD1435. Acesso em: 16 abr. 2020. INTOSAI. ISSAI 300: princípios fundamentais de auditoria operacional. Brasília: TCU, 2017. Disponível em: https://portal.tcu.gov.br/lumis/portal/file/fileDownload.jsp?fileId=8A8 182A15D3169CE015D56CC4DE61545. Acesso em: 16 abr. 2020. INTOSAI. ISSAI 400: princípios fundamentais de auditoria de conformidade. Brasília: TCU, 2017. Disponível em: https://portal.tcu.gov.br/lumis/portal/file/fileDownload.jsp?fileId =8A8182A15D3169CE015D56CCB349169F. Acesso em: 16 abr. 2020. 19Auditoria pública, objetivos e finalidade Os links para sites da web fornecidos neste capítulo foram todos testados, e seu fun- cionamento foi comprovado no momento da publicação do material. No entanto, a rede é extremamente dinâmica; suas páginas estão constantemente mudando de local e conteúdo. Assim, os editores declaram não ter qualquer responsabilidade sobre qualidade, precisão ou integralidade das informações referidas em tais links. Auditoria pública, objetivos e finalidade20
Compartilhar