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- Teoria dos Direitos Fundamentais. Direitos Individuais. Garantias Individuais. Direitos Sociais.
- Aulas G7 Jurídico (professor Marcelo Novelino) + questões de concurso + Informativos Dizer o Direito
- Leitura Lei Seca: art. 5º a 6º da CF/88.
- Atualização em 02/09/2022: questões de concurso + distinção entre Direitos e Garantias (Rui Barbosa) + Info 893 STF sobre a liberdade de expressão (itens 2.4.1.1. e 2.4.1.2) + Info 899 STF (item 2.3.1.3) + julgado Info 921 STF (item 2.4.1.1.) + Info 935 STF sobre liberdade religiosa (item 2.4.2.1.1.) + classificação dos direitos humanos, segundo André Carvalho Ramos (item 1.6.); Info 962 (item 2.3.1.3)
TEORIA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS
1. ASPECTOS INTRODUTÓRIOS
1.1. Aplicabilidade
Nos termos da Constituição, as normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata, vejamos:
CF, art. 5º, § 1º: As normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata.
O dispositivo, embora localizado no art. 5º da CF/88, não se refere apenas aos direitos individuais e coletivos, mas a todos os direitos e garantias fundamentais, ou seja, incluem-se os direitos individuais e coletivos, os sociais, de nacionalidade e os políticos.
Aplicação imediata significa que os direitos fundamentais se aplicam imediatamente e independem de outra vontade (não precisam de uma intermediação do legislador). No entanto, ao analisar os direitos em espécie, percebe-se que alguns dispositivos preveem a necessidade de lei para serem exercidos (normas constitucionais de eficácia limitada). 
Ex.1: Ao tratar dos inventos industriais e da proteção assegurada a ele, a própria CF/88 diz que ela depende de lei. 
CF, art. 5º, XXIX: A lei assegurará aos autores de inventos industriais privilégio temporário para sua utilização, bem como proteção às criações industriais, à propriedade das marcas, aos nomes de empresas e a outros signos distintivos, tendo em vista o interesse social e o desenvolvimento tecnológico e econômico do País.
Ex.2: Ao tratar dos atos necessários ao exercício da cidadania, que devem ser gratuitos, a própria CF determina que a lei os especifique.
CF, art. 5º, LXXVII: São gratuitas as ações de habeas corpus e habeas data, e, na forma da lei, os atos necessários ao exercício da cidadania.
Ex.3: salário-mínimo nacionalmente unificado, nos termos da lei.
O paradoxo entre o art. 5º, § 1º e alguns dispositivos da Constituição que exigem expressamente lei regulamentadora fica ainda mais evidente com a existência de um instrumento voltado exatamente para assegurar o exercício de direitos fundamentais carentes de regulamentação legal: o mandado de injunção.
Nesses casos, questiona-se como os direitos serão imediatamente aplicados se não existir a lei regulamentadora. Nesse passo, há duas interpretações do art. 5º, § 1º, CF:
1ª Corrente (Marcelo Novelino – minoritária): O art. 5º, §1º da CF/88 consagra uma regra (mandamento definitivo, que deve ser aplicado na exata medida de suas prescrições), que é excepcionada expressamente em alguns casos pela própria Constituição. Em outras palavras, as normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais, em regra, aplicam-se imediatamente. Entretanto, há exceções que ocorrem apenas quando o próprio dispositivo exigir uma lei regulamentadora para a sua aplicabilidade.
2ª Corrente (Ingo Sarlet – MAJORITÁRIA): Ao mencionar que as normas definidoras de direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata, o art. 5º, §1º da CF/88 não consagra uma regra, mas um princípio (mandamento de otimização, exigindo que algo seja cumprido na maior medida possível, conforme as circunstâncias fáticas e jurídicas existentes). Assim, as normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata “na maior medida possível”. 
##Advertência em relação à 2ª corrente: Cumpre advertir que, embora seja possível falar em aplicabilidade imediata dos direitos fundamentais, a norma do art. 5º § 1º da CF/88 determina um mandado de otimização (uma norma princípio), que impõe aos órgãos estatais a obrigação de reconhecerem a maior eficácia possível aos direitos fundamentais, gerando uma presunção em favor da aplicabilidade imediata das normas que definem direitos. Todavia, tal regra não é absoluta, devido à própria natureza de alguns direitos fundamentais. Existem normas relativas a direitos fundamentais que são, evidentemente, não autoaplicáveis, isto é, necessitam de mediação legislativa para que tenham plena efetividade.
1.2. Localização Topográfica
No Título II da Constituição Federal constam os direitos e garantias fundamentais expressamente consagrados, de forma sistematizada: (cap. 1) direitos e deveres individuais e coletivos; (cap. 2) direitos sociais; (cap. 3) direitos de nacionalidade; (cap. 4) direitos políticos; (cap. 5) partidos políticos.
##Questiona-se: Isso significa que todos os direitos e garantias fundamentais estão no título II e não existem outros localizados fora dela? 
Se dissermos que não existem outros direitos e garantias fundamentais fora do Título II da CF/88, adotaremos a teoria formal dos direitos fundamentais. Ou seja, a teoria formal dos direitos e garantias fundamentais postula que são desta espécie apenas os direitos previstos nos artigos 5º ao 17 da CF/88.
Uma outra forma de identificar os direitos e garantias fundamentais é de acordo com o seu conteúdo, ou seja, de acordo com a relação de proximidade dos direitos e garantias com a dignidade da pessoa humana. A identificação de um direito fundamental pelo seu conteúdo, na qual não importa a sua localização topográfica, baseia-se em uma teoria material.
##Obs.: Veremos que os direitos existem justamente para promover e proteger a dignidade da pessoa humana.
A Constituição de 1988 adota a teoria material dos direitos fundamentais:
CF, art. 5º, § 2º: Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte.[footnoteRef:1] [1: (MPGO-2019): Assinale a alternativa correta: O sistema constitucional brasileiro alberga direitos fundamentais não expressos no texto constitucional, mas que sejam decorrentes do regime e dos princípios adotados pela Constituição Federal. BL: art. 5º, §2º, CF.
(MPAM-2007-CESPE): Embora o art. 5.º da CF disponha de forma minuciosa sobre os direitos e as garantias fundamentais, ele não é exaustivo e não exclui outros direitos. BL: art. 5º, §2º, CF.] 
Como a Constituição adota a teoria material, outros direitos com o mesmo conteúdo também devem ser considerados direitos fundamentais, embora localizados noutra parte ou até mesmo fora do texto constitucional. Ou seja, os direitos e garantias fundamentais não se restringem ao Título II da Constituição.[footnoteRef:2] [2: (Anal. Legisl./Câm. de Deputados-2014-CESPE): Conforme já manifestou o STF e a doutrina dominante, os direitos individuais e coletivos não se restringem aos elencados no artigo quinto da CF, podendo ser encontrados ao longo do texto constitucional.] 
Tal característica não impede que seja reconhecido a tais direitos fora do Título II o caráter de fundamentalidade, dependendo, portanto, do conteúdo que eles possuem (proximidade com a dignidade da pessoa humana).
1.3. Hierarquia dos Tratados Internacionais[footnoteRef:3] [3: ##Atenção: Caiu na prova TJSP-2018, banca VUNESP.] 
Entre 1977 a 2008, o STF adotou o entendimento de que os tratados internacionais, quaisquer que fossem eles, tinham o status de lei ordinária.
Nesse ínterim, a EC n. 45/04 acrescentou o § 3º ao art. 5º da CF/88 dispondo que: “os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais”. 
Assim, a partir da EC n. 45/04, passou a existir uma dupla hierarquia dos tratados:
· Tratados de direitos humanos aprovados por três quintos dosmembros de cada Casa do Congresso Nacional e em dois turnos de votação (forma de emenda constitucional): status constitucional.[footnoteRef:4] [4: (PGEMT-2016-FCC): No que concerne aos Tratados Internacionais de proteção dos direitos humanos e sua evolução constitucional no direito brasileiro à luz da Constituição Federal, eles são caracterizados como sendo de hierarquia constitucional, dependendo de aprovação pelas duas casas do Congresso Nacional, pelo quorum mínimo de 3/5, em dois turnos, em cada casa. BL: art. 5º, §3º, CF/88.
(TJSP-2009-VUNESP): Os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos celebrados pelo Brasil equivalerão às emendas constitucionais quando forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros. BL: art. 5º, §3º, CF/88.] 
· Demais tratados, inclusive de direitos humanos não aprovados pela sistemática do art. 5º, § 3º, da CRFB/88: status de lei ordinária.
Ao chegar a matéria no STF, no ano de 2008, a Suprema Corte adotou novo entendimento. No julgamento do RE n. 466.343 prevaleceu o voto do Min. Gilmar Mendes no sentido de que os tratados e convenções internacionais de direitos humanos não aprovados pelo rito da CF, art. 5º, § 3º estariam situados abaixo da Constituição, mas acima da lei e, portanto, teriam status supralegal. 
Ex.: tratados internacionais sobre direitos humanos anteriores à EC n. 45/04.
Com a adoção do entendimento acima, verifica-se passou a entender-se pela existência de tripla hierarquia dos tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos:
	TRATADOS INTERNACIONAIS E HIERARQUIA
	EQUIVALÊNCIA
	ESPÉCIE
	Equivalem às emendas constitucionais[footnoteRef:5] [5: (TJPR-2012-PUCPR): Os tratados que versem sobre direitos humanos e que forem aprovados, em nosso poder legislativo, pelo mesmo rito previsto para emendas constitucionais, terão status de norma constitucional. BL: art. 5º, §3º, CF/88.] 
	Tratados e Convenções internacionais de direitos humanos, desde que aprovados por 3/5 e em dois turnos de votação, em cada Casa.
	Possuem status supralegal 
(abaixo da CF, mas acima das leis comuns)
	Tratados e Convenções internacionais de direitos humanos, mas não aprovados de acordo com o rito do art. 5º, § 3º, CF (v.g. Pacto de São José da Costa Rica)[footnoteRef:6]. [6: (DPEPR-2017-FCC): De acordo com o posicionamento do Supremo Tribunal Federal sobre a hierarquia dos tratados internacionais de direitos humanos, consideram-se como tratados de hierarquia constitucional: 1) Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e seu respectivo Protocolo Facultativo − Convenção de Nova Iorque e; 2) Tratado de Marraqueche para facilitar o acesso a obras publicadas às pessoas cegas, com deficiência visual ou com outras dificuldades para aceder ao texto impresso.
OBS: O Tratado de Marraqueche foi aprovado pelo Congresso Nacional com status de emenda pelo Decreto Legislativo 261/2015, em setembro de 2015, sendo ratificado em 11 de dezembro de o 2015. Agora, em 2018, o referido Tratado foi promulgado pelo Dec. 9.522/2018. Sendo assim, o Brasil aprovou o Tratado de Marraqueche na forma qualificada prevista no § 3º do artigo 5º da CF/88, conforme o Projeto de Decreto Legislativo 347/2015 do Senado Federal (57/2015, na Câmara dos Deputados). Com o vigor internacional do Tratado, o Brasil passa a ter mais um instrumento com equivalência de emenda constitucional — o terceiro tratado com nível hierárquico formalmente constitucional no Brasil, que vem somar-se à Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e pelo seu Protocolo Facultativo, ambos aprovados por maioria congressual qualificada em 2009 (promulgados pelo Decreto 6.949/2009).
(MPSP-2013): O Decreto Legislativo n.º 186, de 09 de julho de 2008, aprovou o texto da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e de seu Protocolo Facultativo, assinados em Nova Iorque, em 30 de março de 2007. O Decreto n.º 678, de 6 de novembro de 1992, promulgou a Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica), de 22 de novembro de 1969.Tais normas ingressaram no ordenamento jurídico brasileiro com o grau hierárquico de norma constitucional e norma supralegal, respectivamente.
Explicação: A Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e de seu Protocolo Facultativo, assinados em Nova Iorque, em março de 2007 trata-se de NORMA CONSTITUCIONAL, posto que FOI APROVADA PELO QUORUM QUALIFICADO DE EMENDA CONSTITUCIONAL, previsto no art. 5º § 3ºda CF/88. Já a Convenção Americana de Direitos Humanos, como NÃO FORA APROVADA PELO QUORUM QUALIFICADO, trata-se de NORMA SUPRALEGAL, isto é, acima, da lei, mas abaixo da CF/88, consoante entendimento do STF. Porém, há doutrina que entende que os tratados internacionais de Direitos Humanos, MESMO QUE NÃO APROVADOS PELO QUORUM QUALIFICADO DE EMENDA CONSTITUCIONAL, tem status DE NORMA CONSTITUCIONAL, consoante art. 5º, §3º da CF/88.] 
	Equivalem à leis ordinárias
	Tratados e Convenções internacionais que não sejam de direitos humanos.
Vejamos trecho do voto vencedor sobre o tema, que não foi uma criação do Min. Gilmar Mendes, pois já havia sido defendida pelo Min. Sepúlveda Pertence em 2000, que não foi a posição vencedora à época:
RE 466.343/SP – 2008 (voto Min. Gilmar Mendes): […] parece mais consistente a interpretação que atribui a característica de supralegalidade aos tratados e convenções de direitos humanos. Essa tese pugna pelo argumento de que os tratados sobre direitos humanos seriam infraconstitucionais, porém, diante de seu caráter especial em relação aos demais atos normativos internacionais, também seriam dotados de um atributo de supralegalidade.
RHC 79.785-RJ – 2000 (voto Min. Sepúlveda Pertence, mas não vencedora à época): Certo, com o alinhar-me ao consenso em torno da estatura infraconstitucional, na ordem positiva brasileira, dos tratados a ela incorporados, não assumo compromisso de logo [...] com o entendimento, então majoritário - que, também em relação às convenções internacionais de proteção de direitos fundamentais - preserva a jurisprudência que a todos equipara hierarquicamente às leis (...). Se assim é, à primeira vista, parificar às leis ordinárias os tratados a que alude o art. 5º, § 2º, da Constituição, seria esvaziar de muito do seu sentido útil a inovação, que, malgrado os termos equívocos do seu enunciado, traduziu uma abertura significativa ao movimento de internacionalização dos direitos humanos.
1.4. Dupla Fundamentalidade dos Direitos Fundamentais[footnoteRef:7] [7: SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais: uma teoria dos direitos fundamentais na perspectiva constitucional. 11 ed. rev. atual. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2012, p. 74-78.] 
Ingo Wolfgang Sarlet explica que “direitos fundamentais são posições jurídicas reconhecidas e protegidas na perspectiva do direito constitucional interno dos Estados”. Em continuidade, explica o doutrinador que a nota distintiva da fundamentalidade, ou seja, o que qualifica um direito como fundamental é a circunstância de ter uma especial proteção tanto do ponto de vista formal quanto material. Em resumo, a fundamentalidade de um direito é simultaneamente formal e material.
Nesse contexto, a fundamentalidade formal encontra-se ligada ao direito constitucional positivo, tanto de forma expressa ou implicitamente considerado, denotando um regime jurídico qualificado por alguns elementos:
a) Como parte integrante da constituição escrita, os direitos fundamentais situam-se no ápice de todo o ordenamento jurídico, gozando da supremacia hierárquica das normas constitucionais (lembrando que embora existam direitos fundamentais constitucionais nem todos direitos fundamentais são constitucionais);
b) Na qualidade de normas constitucionais, encontram-se submetidos aos limites formais (procedimento agravado) e materiais (cláusulas pétreas) da reforma constitucional (art. 60 da CF), muito embora se possa controverter a respeitodos limites da proteção outorgada pelo constituinte;[footnoteRef:8] [8: (MPDFT-2009): Sobre direitos fundamentais, julgue o seguinte item: As normas de direitos fundamentais impõem- se a todos os poderes constituídos, inclusive ao poder de reforma da constituição. ] 
c) Além disso, as normas de direitos fundamentais são diretamente aplicáveis e vinculam de forma imediata as entidades públicas e, mediante as necessárias ressalvas e ajustes, também os atores privados (art. 5º, §1º, da CF).
A fundamentalidade material, por outro lado, decorre da circunstância de serem os direitos fundamentais elemento constitutivo da Constituição material, contendo decisões sobre a estrutura básica do Estado e da sociedade. Nesse sentido, Sarlet explica que, inobstante não necessariamente ligada à fundamentalidade formal, é por intermédio do direito constitucional positivo (art. 5º, §2º, CF) que a noção de fundamentalidade material permite a abertura da Constituição a outros direitos fundamentais não constantes de seu texto e, portanto, materialmente fundamentais, assim como a direitos fundamentais situados fora do catálogo, mas integrantes da Constituição formal, em que pese possa controverter-se a respeito da extensão do regime da fundamentalidade formal a estes direitos apenas materialmente fundamentais.[footnoteRef:9] [9: (MPGO-2014): A 9ª Emenda à Constituição dos Estados Unidos da América diz textualmente: “A especificação de certos direitos na Constituição não deve ser entendida como uma negação ou depreciação de outros direitos conservados pelo povo”. Segundo a visão de alguns autores, e citada Emenda encerra “norma com fattispecie aberta”, segundo a qual certos direitos não se limitam àqueles descritos na Constituição. Com base nessas premissas, indique a assertiva correta: A fundamentalidade material fornece suporte para a abertura a novos direitos fundamentais, sendo correto observar que aos direitos fundamentais só materialmente constitucionais são aplicáveis aspectos típicos do regime jurídico da fundamentalidade formal. BL: art. 5º, §§1º e 2º, CF.] 
Arremata Sarlet explicando que, com o sentido da nota distintiva da fundamentalidade de determinados direitos (em relação a outros, que não foram expressa ou mesmo implicitamente albergados pela Constituição), é preciso destacar que, no sentido jurídico-constitucional, um determinado direito é fundamental não apenas pela relevância do bem jurídico tutelado em si mesma (por mais importante que o seja), mas pela relevância do bem jurídico na perspectiva das opções do Constituinte, acompanhada pela hierarquia normativa correspondente e do regime jurídico-constitucional assegurado pelo Constituinte às normas de direitos fundamentais.[footnoteRef:10] [10: (MPPR-2019): Sobre direitos fundamentais, é correta a afirmação: A caracterização de um direito como fundamental não é determinada apenas pela relevância do bem jurídico tutelado por seus predicados intrínsecos, mas também pela relevância que é dada a esse bem jurídico pelo constituinte, mediante atribuição da hierarquia correspondente (expressa ou implicitamente) e do regime jurídico-constitucional assegurado às normas de direitos fundamentais. BL: art. 5º, §§1º e 2º, CF.
##Atenção: A questão está correta porque, primeiramente, as normas constitucionais já se situam, naturalmente, no topo da hierarquia normativa. Ademais, os Direitos Fundamentais representam normas materialmente constitucionais, com extrema relevância, sendo dotadas, inclusive, de aplicabilidade imediata (art. 5º, §1º, CF/88).] 
Acrescente-se, ainda, que, com base no art. 5º, §2º da CF, a Constituição brasileira contém cláusula aberta que permite acolher os chamados direitos materialmente fundamentais ou direitos fundamentais em sentido material, que são aqueles não previstos expressamente por ela, mas que, por força de sua essencialidade, são direitos fundamentais, detentor da mesma dignidade dos direitos constitucionalizados. A essa abertura podemos denominar, com apoio em JORGE MIRANDA, de não tipicidade dos direitos fundamentais. CANOTILHO sustenta que, “em virtude de as normas que os reconhecem e protegem não terem a forma constitucional, estes direitos são chamados de direitos materialmente fundamentais. Por outro lado, trata-se de uma ‘norma de FATTISPECIE ABERTA’, de forma a abranger, para além das positivações concretas, todas as possibilidades de ‘direitos’ que se propõem no horizonte da acção humana”.
##Em resumo: Um direito não precisa ter fundamentalidade material para ser considerado fundamental. Fundamentalidade material é entender que aquele direito, no seu conteúdo, na sua natureza, é direito fundamental. Por outro lado, a fundamentalidade formal é a previsão daquilo no rol dos direitos fundamentais. O critério da fundamentalidade material é útil em um segundo momento, para permitir que sejam encontrados outros direitos fundamentais fora do Título II da CF/88.[footnoteRef:11] [11: ##Atenção: Tema cobrado na prova do MPGO-2019.] 
1.5. Distinção entre “Direitos Humanos” e “Direitos Fundamentais” 
Há duas correntes, vejamos:
1ª Corrente – MAJORITÁRIA: Os direitos humanos e os direitos fundamentais possuem, essencialmente, o mesmo conteúdo. São direitos relacionados à liberdade e à igualdade, voltados à promoção e à proteção da dignidade da pessoa humana. Portanto, ambos são semelhantes em relação ao conteúdo. A diferença está no plano em que estão consagrados:
· Direitos humanos: localizados no plano internacional (Tratados e Convenções internacionais).
· Direitos fundamentais: localizados no plano interno (em regra, dentro das Constituições, embora seja possível consagrar outros direitos fundamentais fora do texto constitucional).
Seguindo esta corrente, afirma Ingo Wolfang Sarlet que, “em que pese seja ambos os termos (‘direitos humanos’ e ‘direitos fundamentais’) comumente utilizados como sinônimos, a explicação corriqueira e, diga-se de passagem, procedente para a distinção é de que o termo ‘DIREITOS FUNDAMENTAIS’ se aplica para aqueles direitos do ser humano reconhecidos e positivados na esfera do direito constitucional positivo de determinado Estado, ao passo que a expressão ‘DIREITOS HUMANOS’ guardaria relação com os documentos de direito internacional, por referir-se àquelas posições jurídicas que se reconhecem ao ser humano como tal, independentemente de sua vinculação com determinada ordem constitucional, e que, portanto, aspiram à validade universal, para todos os povos e tempos, de tal sorte que revelam um inequívoco CARÁTER SUPRANACIONAL (internacional).” (SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais. 6ª ed., Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2006, p. 35 e 36).[footnoteRef:12] [12: (MPSP-2019): Em relação aos direitos humanos, é correto afirmar: São aqueles protegidos pela ordem internacional.
(MPSC-2016): Conceitualmente, os direitos humanos são os direitos protegidos pela ordem internacional contra as violações e arbitrariedades que um Estado possa cometer às pessoas sujeitas à sua jurisdição. Por sua vez, os direitos fundamentais são afetos à proteção interna dos direitos dos cidadãos, os quais encontram-se positivados nos textos constitucionais contemporâneos. ] 
2ª Corrente – Minoritária: não há distinção, ou seja, são expressões sinônimas. Até porque um direito muitas vezes inicialmente ratificado no plano externo, depois é incorporado ao plano interno.
##Atenção: ##DPESP-2015: ##FCC: O professor Ingo Wolfang Sarlet defende que os direitos fundamentais positivados em determinado ordenamento jurídico de um país podem ser mais amplos do que os direitos humanos entendidos em uma perspectiva de direito internacional. Em artigo publicado em 15 de fevereiro de 2015, na Revista Consultor Jurídico, o jurista explica: “Com isso já se percebe que os direitos fundamentais, considerados como tais aqueles consagrados nas ordens jurídicas constitucionais e dotados de um particular regime jurídico que é constitutivo da própria fundamentalidade, podem ter (e em muitos casos o têm) uma amplitudemuito maior que a do universo dos direitos humanos, seja qual for o critério justificador de tal noção. É por isso que o FGTS, o “terço sobre as férias”, as ações constitucionais citadas, e muitos outros (poderíamos aqui incluir a garantia da anualidade eleitoral, consagrada no artigo 16 da CF/88), podem — como é o caso no Brasil — assumir a condição de direitos fundamentais e ainda assim não serem direitos humanos, o que não restaria alterado quanto à sua correção mesmo que utilizada outra terminologia, como a de direitos individuais, liberdades públicas, entre outras.” (Fonte: “Pena de morte na Indonésia e FGTS no Brasil. A distinção necessária”, http://www.conjur.com.br/2015-fev-13/direitos-fundamentais-pena-morte-indonesia-fgts-brasil-distincao-necessaria). [footnoteRef:13] [13: (DPESP-2015-FCC): Analise a seguinte assertiva acerca dos direitos fundamentais: Segundo Ingo Wolfgang Sarlet, os direitos fundamentais podem ter uma amplitude muito maior que a do universo dos direitos humanos.] 
1.6. A estrutura dos Direitos Humanos, segundo André de Carvalho Ramos
De acordo com a doutrina de André Carvalho Ramos a estrutura dos Direitos Humanos é variada, podendo se caracterizar em: 
a) direito-pretensão: Confere-se ao titular o direito a ter alguma coisa que é devido pelo Estado ou até mesmo por outro particular. Assim, o Estado (ou esse outro particular) devem agir no sentido de realizar uma conduta para conferir o direito. Por exemplo, o direito à educação, que deve ser prestado pelo Estado gratuitamente (art. 208, I, da CF/88). 
b) direito-liberdade: Compreende a abstenção ao Estado ou a terceiros, no sentido de se ausentarem, de não atuarem como agentes limitadores, ou seja, consiste na faculdade de agir que gera a ausência de direito de qualquer outro ente ou pessoa. Cita-se como exemplo a liberdade de credo (art. 5º, VI, CF/88), não possuindo o Estado (ou terceiros) nenhum direito (ausência de direito) de exigir que essa pessoa tenha determinada religião.
c) direito-poder: Possibilita à pessoa exigir a sujeição do Estado ou de outra pessoa para que esses direitos sejam observados, isto é, implica uma relação de poder de uma pessoa de exigir determinada sujeição do Estado ou de outra pessoa. O exemplo aqui é o direito à assistência jurídica. Desse modo, uma pessoa tem o poder de, ao ser presa, requerer a assistência da família e de advogado, o que sujeita a autoridade pública a providenciar tais contatos (art. 5º, LXIII, da CF/88).
d) direito-imunidade: Segundo Carvalho Ramos, tal espécie impede que uma pessoa ou o Estado hajam no sentido de interferir nesse direito. Consiste, portanto, na autorização dada por uma norma a uma determinada pessoa, impedindo que outra interfira de qualquer modo. Desse modo, uma pessoa é considerada imune à prisão, a não ser em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente, salvo nos casos de transgressão militar ou crime propriamente militar (art. 5º, LVI, da CF/88), o que impede que outros agentes públicos (como, por exemplo, agentes policiais) possam alterar a posição da pessoa em relação à prisão.[footnoteRef:14] [14: (MPSP-2017): Os Direitos Humanos possuem estrutura variada, constituindo um feixe de direitos considerados fundamentais para a assecuração do vetor da Dignidade da Pessoa Humana. Em tal sentido, a doutrina costuma afirmar que os Direitos Humanos dividem-se em direito-pretensão, direito-liberdade, direito-poder e direito-imunidade. Constituem exemplos de cada uma dessas espécies, respectivamente: o acesso à saúde, a crença religiosa, a defesa da propriedade e o direito de não ser preso salvo em flagrante delito ou em virtude de decisão judicial fundamentada.] 
2. CLASSIFICAÇÕES
2.1. Constituição Federal – Título II (artigos 5º ao 17)
A CF/88 trata expressamente dos direitos e garantias fundamentais no seu Título II, dividindo-os entre os art. 5º a 17. Dentro desses dispositivos, cada capítulo trata de um tipo de direito fundamental:
i. Capítulo I: direitos e deveres individuais e coletivos;
##Obs.: O art. 60, § 4º, IV, da CF, diz que são cláusulas pétreas os “direitos e garantias individuais” e não todos direitos e garantias fundamentais. Assim, de acordo com uma interpretação literal, somente os direitos e garantias individuais (excluído os coletivos) do art. 5º seriam cláusulas pétreas.
No entanto, há alguns aspectos a serem mencionados acerca dos “direitos coletivos”, contidos no art. 5º da CF: (i) De acordo com José Afonso da Silva, a rigor, eles são direitos individuais de expressão coletiva, ou seja, são direitos relacionados à liberdade, mas seu exercício não é viabilizado individualmente (v.g. liberdade de reunião ou de associação são individuais, mas não há como serem exercidos por apenas uma pessoa); (ii) Embora o art. 5º da CF consagre esses direitos individuais de expressão coletiva, boa parte dos direitos coletivos propriamente ditos encontram-se localizados junto aos direitos sociais (v.g. direito de greve e liberdade de associação sindical).
Portanto, uma interpretação teleológica e sistemática deixa claro que os direitos coletivos do art. 5º da CF não podem ser excluídos do conceito de cláusulas pétreas.
ii. Capítulo II: direitos sociais;
iii. Capítulo III: direitos de nacionalidade;
iv. Capítulo IV: direitos políticos;
v. Capítulo V: partidos políticos.
2.2. Doutrina
A doutrina tem três principais classificações sobre os direitos fundamentais: (i) unitária; (ii) dualista; (iii) trialista.
2.2.1. Unitária – minoritária
É o entendimento adotado por Jairo Schäfer, na obra “Classificação dos direitos fundamentais: do sistema geracional ao sistema unitário”. Não é a classificação que prevalece na doutrina brasileira.
De acordo com a classificação unitária, “a profunda semelhança entre todos os direitos fundamentais impede sua classificação em categorias estruturalmente distintas”. Em outras palavras, não há uma diferença estrutural entre os direitos fundamentais que justifique uma distinção entre eles.
Ex.: o art. 5º, §1º da CF, ao falar da aplicação imediata, não fala apenas de uma parte deles, mas sim de todos os direitos fundamentais.
2.2.2. Dualista – minoritária
É o entendimento adotado por Ingo Sarlet na obra “A eficácia dos direitos fundamentais”. Não é a classificação que prevalece na doutrina brasileira.
A classificação dualista dispõe que os direitos fundamentais são divididos em direitos de defesa (liberdades negativas, na qual se incluem os direitos políticos) e direitos a prestações ou prestacionais (liberdades positivas).
Os direitos de defesa (liberdades negativas) são os direitos fundamentais clássicos, os quais são criados para proteger o indivíduo contra o arbítrio do Estado. Eles conferem ao indivíduo um espaço de liberdade, no qual não pode haver uma intervenção estatal. Nesse sentido, os direitos de defesa possuem um caráter negativo, pois exigem uma abstenção estatal (v.g. liberdade de expressão).
Existe, no entanto, outro grupo de direitos, os quais foram consagrados nos textos constitucionais após o constitucionalismo social: os direitos prestacionais. Tais direitos consagram liberdades positivas, porque exigem do Estado uma atuação positiva, ou seja, o Estado deve fornecer determinadas prestações (sejam materiais ou jurídicas) (v.g. o direito à saúde exige do Estado o fornecimento de medicamentos, hospitais, etc.).
2.2.3. Trialista – MAJORITÁRIA
De acordo com a classificação trialista, os direitos fundamentais são divididos em direitos de defesa (com status negativo), direitos a prestações (com status positivo) e direitos de participação (com status ativo).
· Direitos de defesa: são os direitos que exigem do Estado uma abstenção, relacionados às liberdades civis.
Incidência: liberdades civis, basicamente (v.g. liberdade de locomoção, liberdade de manifestação do pensamento, liberdade religiosa, etc.). 
##Obs.: Há direitos de defesa expressos em outros dispositivos da Constituição que não o art. 5º (v.g. direito à associação sindical prevista noart. 8º).
· Direitos prestacionais: consagram liberdades positivas, porque exigem do Estado uma atuação positiva, ou seja, o Estado deve fornecer determinadas prestações (sejam materiais ou jurídicas).[footnoteRef:15] [15: (TJSP-2015-VUNESP): Reconhecida a força normativa do texto constitucional e aceita a sistematização proposta por Robert Alexy, é correto afirmar que os direitos fundamentais previstos têm natureza prestacional quando correspondem aos denominados direitos positivos.] 
Incidência: direitos sociais, basicamente (v.g. saúde, educação, moradia, previdência social). 
##Obs.: Há direitos prestacionais no rol do art. 5º (v.g. assistência judiciária gratuita).
· Direitos de participação: são os direitos que permitem ao indivíduo participar na política e nos rumos do Estado. 
Incidência: direitos políticos. 
A classificação trialista é a mais adotada pela doutrina e tem como pressuposto a Teoria dos “status” de Georg Jellinek.
2.3. Teoria dos “Status” (Georg Jellinek)[footnoteRef:16]-[footnoteRef:17] [16: ##Atenção: Tema cobrado nas provas: i) PGEPE-2009 (CESPE); ii) PCGO-2013.] [17: (Anal. Legisl.-Câm. Municipal/RJ-2014): Conforme a Teoria Geral dos Direitos Fundamentais, no final do século XIX, Jellinek desenvolveu a doutrina dos quatro status, segundo a qual o indivíduo pode encontrar-se em face do Estado por 4 status: status passivo, ativo, negativo ou positivo.] 
Gilmar Mendes afirma que, no final do século XIX, Georg Jellinek desenvolveu a doutrina dos quatro status em que o indivíduo pode encontrar-se em face do Estado. Dessas situações extraem-se deveres ou direitos diferenciados por particularidades de natureza. Portanto, a Teoria dos “status”, de Jellinek, trata das funções que os direitos fundamentais desempenham nas relações entre os particulares e o Estado. 
A utilização da "teoria dos status" como paradigma de uma teoria de posições globais abstratas justifica-se não apenas por sua importância histórica, mas, sobretudo, pela grande relevância como fundamento para as classificações dos direitos fundamentais. Um status não se confunde com um direito. Dentre as diversas formas de descrever o que é um status, tem importância central sua caracterização como “uma relação com o Estado que qualifica o indivíduo”. Segundo a concepção de Jellinek, o direito tem como conteúdo o “ter” (ex.: aquisição de um terreno diz respeito apenas ao "ter"), ao passo que o status tem como conteúdo o “ser” (ex.: o direito de votar e o direito de livremente adquirir uma propriedade modifica o status de uma pessoa e com isso o seu "ser").
Segundo Jellinek, há quatro espécies de direitos fundamentais. Em outras palavras, quando a Constituição consagra um direito ou dever fundamental, ela confere ao particular quatro tipos de status diferentes em relação ao Estado:
I. Status passivo (ou status “subjectionis”): é aquele no qual o indivíduo é detentor de deveres perante o Estado. Em outras palavras, no status passivo o direito fundamental não confere ao indivíduo um direito, mas sim um dever ou proibição estatal ao qual está submetido. Aqui, o indivíduo está subordinado ao Estado diante do dever que lhe é imposto (posição de sujeição), ou seja, é o Estado que possui a competência para vincular o indivíduo por meio de mandamentos e proibições. Ex.: alistamento eleitoral obrigatório. 
##Obs.: Por isso, a classificação trialista têm três espécies e a teoria dos status de Jellinek possui quatro espécies. O status passivo, na verdade, não confere direitos, mas sim deveres, de modo que o status passivo não entra na classificação trialista.
II. Status ativo (ou status “activus” ou “civitates”): O indivíduo possui competências para influenciar a formação da vontade do Estado. Essa influência ocorre através dos direitos de participação (direitos políticos), ou seja, pelo direito do voto.
III. Status negativo (ou status “negativus” ou “libertatis”): Costuma ser referido em dois sentidos diversos:
1º sentido: Em sentido estrito (conforme a proposta original de Jellinek): Diz respeito apenas às liberdades jurídicas não protegidas. Representa, portanto, o espaço que o indivíduo tem para agir livre da atuação do Estado, podendo autodeterminar-se sem ingerência estatal.
2º sentido: Em sentido amplo (mencionado pela maior parte da doutrina): Refere-se aos direitos de defesa, ou seja, direitos a ações negativas do Estado voltadas à proteção do status negativo em sentido estrito. Nesse sentido, gera uma obrigação negativa endereçada ao Estado para que este deixe de fazer algo.
Sob esta ótica, impõe aos órgãos estatais o dever de não intervir na esfera de liberdade dos indivíduos (não agir, não fazer algo, abster-se ...). Como se pode notar, os status passivo e negativo são antagônicos, pois este tem como conteúdo as liberdades individuais (faculdades) e aquele as obrigações impostas aos indivíduos (deveres e proibições).
Sendo assim, para o status negativo, o indivíduo goza de um espaço de liberdade diante das ingerências dos poderes públicos. Em outras palavras, o indivíduo possui um espaço de liberdade no qual a intervenção por parte do Estado não é autorizada.
Exemplos: não censurar manifestação do pensamento, não interceptar uma correspondência; não proibir manifestações religiosas; não restringir indevidamente a liberdade de locomoção; não retirar a vida de uma pessoa.
IV. Status positivo (ou status “positivus” ou “civitatis”): o indivíduo tem o direito de exigir uma atuação positiva do Estado. É o inverso do status negativo, pois o indivíduo não exige uma não intervenção, mas sim uma prestação material ou jurídica. Está relacionado aos direitos prestacionais.[footnoteRef:18] [18: (SEPLAG/MG-2014-FUNCAB): Consoante a teoria dos status dos direitos fundamentais, de autoria de Jellinek, o direito à saúde, tal como previsto na Constituição Federal, é considerado fundamental de status positivo.] 
Diante disso, o status positivo é o titularizado por indivíduos dotados de capacidade jurídica para recorrer ao aparato estatal e utilizar suas instituições, ou seja, é o que assegura aos indivíduos pretensões positivas perante o Estado. O cerne desse status revela-se, portanto, no direito do cidadão a ações estatais.
3. CARACTERÍSTICAS
Vejamos os aspectos que os direitos fundamentais possuem e que os diferenciam dos demais direitos. De acordo com a doutrina, os direitos fundamentais têm como características: (i) universalidade; (ii) historicidade; (iii) inalienabilidade, imprescritibilidade e irrenunciabilidade; (iv) relatividade (ou limitabilidade).
3.1. Universalidade
Dizer que os direitos fundamentais são universais significa que a vinculação à liberdade e igualdade, valores diretamente ligados à dignidade humana, conduz à universidade dos direitos fundamentais. 
Em outras palavras, os direitos fundamentais são considerados como tendo a característica da universalidade porque existe um núcleo mínimo de proteção da dignidade da pessoa humana que deve estar presente em qualquer tipo de sociedade.
Como os direitos fundamentais são vinculados à liberdade e à igualdade, em qualquer época ou sociedade, um núcleo mínimo deve ser assegurado.
Quando se fala em universalidade, há dois aspectos importantes que precisam ser ressalvados:
· Validade universal não significa uniformidade: Os direitos fundamentais não são consagrados de modo uniforme em todas as Constituições. A cultura e a história de cada sociedade são determinantes para estabelecer quais direitos fundamentais serão contemplados e em que medida.
Exemplo: Pena de morte: alguns países não admitem, em hipótese alguma; alguns admitem em certas hipóteses e outros admitem com maior incidência.
· Existem alguns direitos fundamentais cuja titularidade exige determinados requisitos ou condições: Por isso, não são todos os direitos fundamentais que podem ser usufruídos indistintamente por qualquer pessoa. 
Exemplos: direitos de nacionalidade, direitos políticos, direito à aposentadoria, etc., são restritos a determinadas pessoas que atendam a certos requisitos.
##Atenção:##PGEGO-2013: ##MPPR-2019: O professor Ingo Sarlet explica que, “de acordo com o princípio da universalidade, todas as pessoas, pelo fato de serem pessoas são titulares de direitos e deveres fundamentais, o que, por sua vez, não significa que não possa haver diferenças a serem consideradas, inclusive, em alguns casos, por força do próprio princípio da igualdade, além de exceções expressamente estabelecidas pela Constituição, como dá conta a distinção entre brasileiro nato e naturalizado, algumas distinções relativas aos estrangeiros, entre outras”.[footnoteRef:19] [19: SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais: uma teoria dos direitos fundamentais na perspectiva constitucional. 11 ed. rev. atual. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2012, p. 220-221.] 
##Atenção: Uma crítica que se faz em relação à característica da universalidade é no sentido de que cada povo e sociedade possui sua cultura própria, às vezes variando muito de uma sociedade para outra. Há autores que alegam que a universalidade seria uma tentativa de ocidentalização de outras culturas, ou seja, uma tentativa de imposição da cultura ocidental sobre outras sociedades, pois os direitos que consideramos como fundamentais são os direitos da nossa sociedade.
3.2. Historicidade
Os direitos fundamentais são históricos por terem surgido em épocas diferentes e por evoluírem com o passar do tempo.
A característica da historicidade, a priori, afasta a fundamentação jusnaturalista dos direitos fundamentais. Os jusnaturalistas sustentam que os direitos fundamentais seriam direitos naturais, caracterizados por serem eternos, universais e imutáveis.[footnoteRef:20] Todavia, se analisarmos os direitos fundamentais, veremos que eles não possuem todas essas características (eternidade, universalidade e imutabilidade). [20: (DPEPR-2017-FCC): O preâmbulo da Constituição dispõe que um dos propósitos da Assembleia Constituinte foi o de instituir um Estado Democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade e a segurança. Tal avanço se deve, em certa medida, à afirmação dos direitos fundamentais como núcleo de proteção da dignidade da pessoa humana. Considere: No campo das posições filosóficas justificadoras dos direitos fundamentais, destaca-se a corrente jusnaturalista, para quem os direitos do homem são imperativos do direito natural, anteriores e superiores à vontade do Estado.] 
Nesse sentido, existem as chamadas dimensões (ou gerações) de direitos fundamentais, as quais nada mais são do que a identificação de que esses direitos surgiram em momentos distintos, de acordo com a demanda de cada sociedade. Em um primeiro momento, tivemos a Revolução Liberal, na qual a demanda era por liberdade contra o absolutismo do Estado (1ª geração); depois tivemos uma demanda por direitos sociais no contexto da Revolução Industrial (2ª geração); após, tivemos os direitos ligados à fraternidade, como ao meio ambiente, à autodeterminação dos povos, direito ao progresso (3ª geração); em seguida, tivemos os direitos referentes à democracia, à informação e ao pluralismo (4ª geração); etc. Ou seja, os direitos fundamentais não surgem ao mesmo tempo, mas sim em épocas diferentes e de acordo com as necessidades sociais. Conforme Norberto Bobbio, os direitos fundamentais não são dados, mas conquistados pela sociedade.
E mais: o conteúdo de tais direitos evoluem e se modificam com o passar do tempo. Logo, é difícil considerar que os direitos fundamentais são imutáveis conforme os jusnaturalistas. 
Ex.1: A igualdade formal da revolução liberal não é igual à igualdade substancial do estado social.
Ex.2: A democracia antes era vista sob uma ótica meramente formal, no sentido de que democrático era aquilo que correspondia à vontade da maioria. Hoje se fala em democracia no seu aspecto substancial, consistindo ela na vontade da maioria, mas aliada à proteção e respeito aos direitos básicos de todas as pessoas, inclusive das minorias.
3.3. Inalienabilidade, Imprescritibilidade, Indisponibilidade e Irrenunciabilidade[footnoteRef:21] [21: ##Atenção: Tema cobrado nas provas: i) MPDFT-2009; ii) DPEPR-2017 (FCC).] 
Por terem fundamento na dignidade da pessoa humana e serem desprovidas, em sua maioria, de conteúdo econômico-patrimonial, parte da doutrina considera os direitos fundamentais imprescritíveis,[footnoteRef:22] inegociáveis, indisponíveis e irrenunciáveis.[footnoteRef:23] [22: (DPEPI-2009-CESPE): Os direitos fundamentais possuem determinadas características que foram objeto de detalhado estudo da doutrina nacional e internacional. A respeito dessas características, assinale a opção correta: A imprescritibilidade dos direitos fundamentais vincula-se à sua proteção contra o decurso do tempo.] [23: (PGEGO-2013): Direitos fundamentais “são o conjunto de normas, princípios, prerrogativas, deveres e institutos, inerentes à soberania popular, que garantem convivência pacífica, digna, livre e igualitária, independentemente de credo, raça, origem, cor, condição econômica ou status social. Sem os direitos fundamentais, o homem não vive, não convive, e, em alguns casos, não sobrevive” (BULOS, Uadi Lammêgo. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva, 2011). Tendo em vista esse conceito, está correta a seguinte proposição: Os direitos fundamentais são irrenunciáveis, ou seja, podem não ser exercidos pelo titular, mas não pode haver renúncia, como ocorre na liberdade de crença.] 
##Observações:
· Não são todos os direitos fundamentais que são desprovidos de conteúdo econômico-patrimonial. Exemplos: direitos de propriedade e herança.
· As características citadas não são unânimes na doutrina;
Exemplo: irrenunciabilidade → a irrenunciabilidade depende do sentido que se entende por renúncia.
· Essas características possuem viés jusnaturalista.
· Algumas dessas características são mencionadas em declarações de direitos. 
Exemplos: A Declaração de Direitos do Homem e do Cidadão de 1789 trata no preâmbulo e no art. 2º a respeito de algumas dessas características (v.g. imprescritibilidade); a Declaração Universal de Direitos Humanos de 1948 menciona em seu preâmbulo a imprescritibilidade dos direitos fundamentais.
	
As quatro características devem ser analisadas com cautela, pois não se aplicam indistintamente a todos os direitos. Façamos algumas distinções conceituais:
a) Renúncia a um direito fundamental é distinta do uso negativo de um direito
· Renúncia: Consiste em abdicar, de um modo juridicamente vinculativo e voltado para o futuro, a um determinado direito ou ao seu exercício. 
Ex.1: Se um indivíduo assina um documento em que declara não querer receber herança de seus familiares, seria uma espécie de renúncia ao direito fundamental da herança; 
Ex.2: Se dois indivíduos pactuam que não recorrerão de decisão judicial, proferida em 1º grau de jurisdição, haverá renúncia ao duplo grau de jurisdição; 
Ex.3: Se, ao ser contratado por uma empresa, um indivíduo assina um compromisso de não se associar a nenhum sindicato ou de não fazer greve, há renúncia a um direito fundamental (a validade dessa renúncia é outra questão).
· Uso negativo de um direito: Trata-se do não exercício fático e atual de uma posição jurídica por seu titular. Não significa renúncia por parte do titular.
Ex.1: Se em um litígio há uma decisão judicial contrária ao interesse de um indivíduo, o qual não interpõe recurso, há o não exercício fático e atual de um direito, ou seja, há o seu uso negativo (não exercício), consistente em não interpor recurso; 
Ex.2: Se um indivíduo opta pela não participação em uma greve determinada, ele está fazendo o uso negativo do seu direito de greve.
##Questiona-se: Em que casos a renúncia pode ou não ser admitida? Não obstante a doutrina (v.g. José Afonso da Silva) considere os direitos fundamentais como irrenunciáveis, não há dúvida de que é admitida a renúncia a certos direitos. A própria legislação prevê expressamente algumas hipóteses de renúncia. Exemplos: renúncia ao direito de propriedade, renúnciaao direito à herança e renúncia ao direito de nacionalidade (CF, art. 12, § 4º).
b) Renúncia total e perpétua (ou irreversível) (renúncia à titularidade) VS. renúncia parcial e temporária (ou reversível) (renúncia ao exercício)
· Renúncia total e perpétua/irreversível: Não é admissível a renúncia total e perpétua do exercício a um direito fundamental, pois isso seria como se estivesse renunciado à titularidade daquele direito.[footnoteRef:24] [24: ##Atenção: Tema cobrado na prova do MPMG-2017.] 
Ex.: Acordo no qual o indivíduo abre mão definitivamente do exercício do direito de greve. Tal documento seria juridicamente inválido.
· Renúncia parcial e temporária/reversível: É admitida em determinadas hipóteses a renúncia ao exercício de certo direito em um determinado momento.
Ex: Posso fazer a renúncia do direito a uma determinada propriedade.
c) Pressupostos da renúncia válida
Para que a renúncia a um direito fundamental seja considerada válida, temos os seguintes pressupostos:
· Espécie de direito fundamental envolvido: Existem direitos fundamentais que permitem a renúncia ao exercício e outros não podem ser objeto desse tipo de abdicação 
Exemplos: 
(a) Admitem renúncia: herança (art. 1.804 e ss, CC), propriedade (art. 1.275, CC), nacionalidade (art. 12, §4º, CF); 
(b) Não admitem renúncia: direitos da personalidade, salvo previsão legal (art. 11, CC).
· Vontade livre e autodeterminada: A renúncia somente pode ser válida se a manifestação da vontade for livre e autodeterminada. 
##Obs.: Inalienabilidade, imprescritibilidade, indisponibilidade e irrenunciabilidade são características “prima facie”, ou seja, são características provisórias. Tais características poderão ser afastadas, de acordo com as circunstâncias fáticas e jurídicas existentes, para a prevalência de outros direitos. Em suma, não são características definitivas.
3.4. Relatividade (ou Limitabilidade) [footnoteRef:25] [25: ##Atenção: Tema cobrado nas provas: i) TJPR-2008; ii) MPDFT-2009; iii) PGEPE-2009 (CESPE); iv) MPF-2012 v) MPT-2012; vi) TJDFT-2016 (CESPE).] 
Não existem direitos absolutos, pois, por mais importante que eles sejam, todos encontram limites em outros direitos ou interesses coletivos também consagrados na Constituição. 
A tese da existência de direitos absolutos, portanto, é incompatível com a ideia de que todos os direitos são passíveis de restrições impostas por interesses coletivos ou por outros também consagrados na CF/88.[footnoteRef:26] [26: (MPSC-2021-CESPE): Considerando a teoria geral dos direitos fundamentais, julgue o item seguinte: Os direitos fundamentais não são absolutos e podem ser restringidos ou limitados por previsão constitucional ou legal, em benefício do interesse social e em observância às bases de proporcionalidade.
##Atenção: ##STF: “(...) Não há, no sistema constitucional brasileiro, direitos ou garantias que se revistam de caráter absoluto, mesmo porque razões de relevante interesse público ou exigências derivadas do princípio de convivência das liberdades legitimam, ainda que excepcionalmente, a adoção, por parte dos órgãos estatais, de medidas restritivas das prerrogativas individuais ou coletivas, desde que respeitados os termos estabelecidos pela própria Constituição. O estatuto constitucional das liberdades públicas, ao delinear o regime jurídico a que estas estão sujeitas - e considerado o substrato ético que as informa - permite que sobre elas incidam limitações de ordem jurídica, destinadas, de um lado, a proteger a integridade do interesse social e, de outro, a assegurar a coexistência harmoniosa das liberdades, pois nenhum direito ou garantia pode ser exercido em detrimento da ordem pública ou com desrespeito aos direitos e garantias de terceiros. (...)” (STF, Tribunal Pleno, MS 23452, Rel. Min. Celso de Mello, Tribunal Pleno, j. 16/9/99); “(...) Inexistem garantias e direitos absolutos. As razões de relevante interesse público ou as exigências derivadas do princípio de convivência das liberdades permitem, ainda que excepcionalmente, a restrição de prerrogativas individuais ou coletivas. Não há, portanto, violação do princípio da supremacia do interesse público. (...)” (STF, 2ª T., RE 455283 AgR, Rel. Min. Eros Grau, j. 28/3/06).
(MPT-2012): Sobre a restrição de direitos humanos e direitos fundamentais, é correto afirmar: Excepcionalmente, a Constituição da República admite a restrição de direitos e garantias fundamentais que ela própria consagra, em razão de interesses superiores.] 
“Só há liberdade onde houver restrição da liberdade”, pois se as pessoas fizerem tudo o que bem entenderem, ninguém vai ter liberdade para fazer nada.
A relatividade é uma característica que todo direito possui para permitir a convivência das liberdades públicas. A colisão de direitos pressupõe a cedência recíproca entre eles.[footnoteRef:27] [27: ##Atenção: Tema cobrado na prova do MPMG-2019.] 
Refere Pedro Lenza que os direitos fundamentais não são absolutos (relatividade), havendo, muitas vezes, no caso concreto, confronto, conflito de interesses. A solução ou vem discriminada na própria Constituição (ex.: direito de propriedade versus desapropriação), ou caberá ao intérprete, ou magistrado, no caso concreto, decidir qual direito deverá prevalecer, levando em consideração a regra da máxima observância dos direitos fundamentais envolvidos, conjugando-a com a sua mínima restrição. [footnoteRef:28] [28: (Anal. Legisl./Câm. Deputados-2014-CESPE): A solução para conflitos de interesses decorrentes da relativização dos direitos fundamentais tanto encontra disciplina na própria Constituição quanto permite ao intérprete, no caso concreto, decidir qual direito deverá prevalecer, considerando-se a regra da máxima observância dos direitos fundamentais envolvidos, conjugando-a com a sua mínima restrição.] 
##Obs1: Na doutrina, alguns autores sustentam que, excepcionalmente, alguns direitos fundamentais devem ser considerados absolutos. Segundo Bobbio, são absolutos: 
(i) o direito de não ser escravizado, que implica a eliminação do direito a possuir escravos; e 
(ii) o direito a não ser torturado, que implica a eliminação do direito de torturar.
Ocorre que, a rigor, os dois direitos citados são concretizações da proteção da dignidade da pessoa humana na forma de regra, ou seja, são regras que se caracterizam por já especificarem a proteção da dignidade da pessoa humana. Conforme visto, as regras já são um mandamento definitivo. [footnoteRef:29] [29: ##Atenção: Tema cobrado na prova da PGEPE-2009 (CESPE).] 
##Obs2: Há autores que entendem que, mesmo as regras (que são mandamentos definitivos), em hipóteses excepcionalíssimas, poderão ser derrotadas ou superadas. Segundo Richard Posner, por exemplo, deve-se admitir a tortura de um terrorista com o objetivo de descobrir a localização de uma bomba e, assim, salvar a vida de vários inocentes.
4. EFICÁCIA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS
4.1. Espécies
4.1.2. Eficácia vertical[footnoteRef:30] [30: ##Atenção: Tema cobrado na prova da PGEPE-2009 (CESPE).] 
Os direitos fundamentais surgiram para proteger o indivíduo contra o arbítrio do Estado. As primeiras Constituições a consagrarem os direitos fundamentais (Constituição francesa de 1791 e Constituição norte-americana de 1787) tinham o intuito de proteger as liberdades individuais contra o arbítrio do Estado. Basicamente, tais Constituições garantiam direitos civis e políticos oponíveis ao Estado.
Como a relação entre o Estado e o particular é uma relação de subordinação (o indivíduo está subordinado ao Estado), a aplicação dos direitos fundamentais a essas relações verticais ficou conhecida como eficácia vertical dos direitos fundamentais.
Portanto, a eficácia vertical consiste na aplicação dos direitos fundamentais às relações verticais, ou seja, relações entre o Estado e os particulares.[footnoteRef:31] [31: (PCMS-2017-FAPEMS): A eficácia vertical dos direitos fundamentais foi desenvolvida para proteger os particulares contra o arbítrio do Estado, de modo a dedicar direitos em favor das pessoasprivadas, limitando os poderes estatais.] 
b) Eficácia horizontal ("Drittwirkung”[footnoteRef:32], ou externa, ou em relação a terceiros, ou privada) [footnoteRef:33] [32: (MPF-2011): "Eficácia horizontal", no âmbito da proteção internacional dos Direitos Humanos, , tem o mesmo significado de "Drittwirkung".
##Atenção: Historicamente, a abordagem da proteção aos direitos humanos era feita considerando que seus violadores principais seriam os Estados. Isso porque eram comuns os abusos derivados do mau uso dos poderes que eram colocados à disposição dos Estados para a consecução do bem geral, tudo sob a aparência da soberania que o Estado exercia sobre os indivíduos em seu território. A construção da rede de proteção a direitos humanos iniciou-se, então, com o resguardo dos direitos humanos dos indivíduos em face do Poder Público. Denominou-se essa primeira rede de proteção como “eficácia vertical” dos direitos humanos (ou vertikale unmittelbare Anwendbarkeit), em clara alusão à relação de supremacia e ascendência dos Estados em face dos indivíduos (estabelecendo uma relação de verticalidade). Com o tempo, percebeu-se que os Estados não seriam os únicos entes aptos a violar direitos humanos. Os próprios indivíduos podem violar direitos humanos de seus pares, nas relações que travam cotidianamente entre si. Os exemplos clássicos vivenciados para se chegar a essa conclusão foram a escravidão, a discriminação e a tortura. Fica evidenciado que os Estados e a sociedade internacional devem oferecer proteção aos indivíduos também nesse contexto. A essa segunda rede de proteção de direitos humanos denominou-se “eficácia horizontal” dos direitos humanos (ou horizontale Anwendbarkeit, ou unmittelbare Drittwirkung, ou apenas Drittwirkung), em referência à inexistência de supremacia e ascendência entre indivíduos (estabelecendo, portanto, uma relação de horizontalidade).] [33: ##Atenção: Tema cobrado nas provas: i) PGEPE-2009 (CESPE); ii) DPERN-2015 (CESPE); iii) DPEBA-2016 (FCC).] 
No entanto, com o passar do tempo, passou-se a perceber que a opressão e a violência contra o indivíduo não emanavam somente por parte do Estado. Viu-se que, muitas vezes, a opressão é resultante de ato de outros particulares. Surge, então, a necessidade de utilizarem-se os direitos fundamentais nas relações entre particulares, nas quais há uma suposta igualdade jurídica (horizontalidade).
Como a relação entre particulares é horizontal, a aplicação dos direitos fundamentais foi denominada de eficácia horizontal (ou externa, ou em relação a terceiros, ou privada).[footnoteRef:34] Sobre o assunto, vejamos os seguinte julgados: [34: (PCMS-2017-FAPEMS): A eficácia horizontal trata da aplicação dos direitos fundamentais entre os particulares, tendo na constitucionalização do direito privado a sua gênese.
(DPEAL-2017-CESPE): Acerca do movimento da constitucionalização do direito, julgue o item a seguir: Uma das consequências da constitucionalização do direito é a chamada eficácia horizontal dos direitos fundamentais.
(PGEGO-2013): Direitos fundamentais “são o conjunto de normas, princípios, prerrogativas, deveres e institutos, inerentes à soberania popular, que garantem convivência pacífica, digna, livre e igualitária, independentemente de credo, raça, origem, cor, condição econômica ou status social. Sem os direitos fundamentais, o homem não vive, não convive, e, em alguns casos, não sobrevive” (BULOS, Uadi Lammêgo. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva, 2011). Tendo em vista esse conceito, está correta a seguinte proposição: Tradicionalmente os direitos fundamentais são aplicados entre o Estado e o particular, mas, pela teoria da eficácia horizontal, se admite a aplicação entre os particulares.] 
STJ: 1. “O art. 1.337 do Código Civil estabeleceu sancionamento para o condômino que reiteradamente venha a violar seus deveres para com o condomínio, além de instituir, em seu parágrafo único, punição extrema àquele que reitera comportamento antissocial, verbis: "O condômino ou possuidor que, por seu reiterado comportamento anti-social, gerar incompatibilidade de convivência com os demais condôminos ou possuidores, poderá ser constrangido a pagar multa correspondente ao décuplo do valor atribuído à contribuição para as despesas condominiais, até ulterior deliberação da assembléia". 2. Por se tratar de punição imputada por conduta contrária ao direito, na esteira da visão civil-constitucional do sistema, deve-se reconhecer a aplicação imediata dos princípios que protegem a pessoa humana nas relações entre particulares, a reconhecida eficácia horizontal dos direitos fundamentais que, também, deve incidir nas relações condominiais, para assegurar, na medida do possível, a ampla defesa e o contraditório. Com efeito, buscando concretizar a dignidade da pessoa humana nas relações privadas, a Constituição Federal, como vértice axiológico de todo o ordenamento, irradiou a incidência dos direitos fundamentais também nas relações particulares, emprestando máximo efeito aos valores constitucionais. Precedentes do STF. 3. Também foi a conclusão tirada das Jornadas de Direito Civil do CJF: En. 92: Art. 1.337: As sanções do art. 1.337 do novo Código Civil não podem ser aplicadas sem que se garanta direito de defesa ao condômino nocivo. 4. Na hipótese, a assembleia extraordinária, com quórum qualificado, apenou o recorrido pelo seu comportamento nocivo, sem, no entanto, notificá-lo para fins de apresentação de defesa. Ocorre que a gravidade da punição do condômino antissocial, sem nenhuma garantia de defesa, acaba por onerar consideravelmente o suposto infrator, o qual fica impossibilitado de demonstrar, por qualquer motivo, que seu comportamento não era antijurídico nem afetou a harmonia, a qualidade de vida e o bem-estar geral, sob pena de restringir o seu próprio direito de propriedade. 5. Recurso especial a que se nega provimento. (REsp 1365279/SP, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, 4ª Turma, j. 25/8/15).
STF: “(...) o espaço de autonomia privada garantido pela Constituição às associações não está imune à incidência dos princípios constitucionais que asseguram o respeito aos direitos fundamentais de seus associados. A autonomia privada, que encontra claras limitações de ordem jurídica, não pode ser exercida em detrimento ou com desrespeito aos direitos e garantias de terceiros, especialmente aqueles positivados em sede constitucional, pois a autonomia da vontade não confere aos particulares, no domínio de sua incidência e atuação, o poder de transgredir ou de ignorar as restrições postas e definidas pela própria Constituição, cuja eficácia e força normativa também se impõem, aos particulares, no âmbito de suas relações privadas, em tema de liberdades fundamentais. A exclusão de sócio do quadro social da UBC, sem qualquer garantia de ampla defesa, do contraditório, ou do devido processo constitucional, onera consideravelmente o recorrido, o qual fica impossibilitado de perceber os direitos autorais relativos à execução de suas obras. A vedação das garantias constitucionais do devido processo legal acaba por restringir a própria liberdade de exercício profissional do sócio. O caráter público da atividade exercida pela sociedade e a dependência do vínculo associativo para o exercício profissional de seus sócios legitimam, no caso concreto, a aplicação direta dos direitos fundamentais concernentes ao devido processo legal, ao contraditório e à ampla defesa (art. 5º, LIV e LV, CR/88).” [STF. 2ª Turma. RE 201819, Relator p/ Acórdão Min. Gilmar Mendes, julgado em 11/10/2005].[footnoteRef:35] [35: (TRF2-2018): Marque a alternativa correta: A chamada eficácia horizontal dos direitos fundamentais impõe a sua observância mesmo nas relações jurídicas estabelecidas entre particulares. Portanto, afigura-se possível a revisão judicial da exclusão de associado dos quadros de associação privada, quando violado direito individual previsto na Constituição Federal.
(DPESC-2017-FCC): No julgamento do Recurso Extraordinário n° 201.819/RJ, a SegundaTurma do Supremo Tribunal Federal, sob a relatoria para o acórdão do Ministro Gilmar Mendes, decidiu acerca da impossibilidade de exclusão de sócio, por parte da União Brasileira de Compositores, sem garantia da ampla defesa e do contraditório. O caso em questão representa um leading case inovador da nossa Corte Constitucional atinente ao seguinte ponto da Teoria Geral dos Direitos Fundamentais: Eficácia dos direitos fundamentais nas relações privadas.] 
c) Eficácia diagonal
Recentemente, começou a se falar em uma terceira espécie de eficácia. Em determinadas situações, a relação entre dois particulares não é de igualdade, pois há um desequilíbrio fático, na qual um dos particulares encontra-se, de certa forma, submetido ao outro, ou seja, é uma relação diagonal. A aplicação dos direitos fundamentais a tais relações é denominada por parte da doutrina como eficácia diagonal.
Exemplos: relações laborais (patrão e empregado); relações consumeristas (fornecedor e consumidor).
Nessas relações há um desequilíbrio mais acentuado que o presente nas relações horizontais, de forma que o Estado deve agir, de uma forma mais intensa, para proteger a parte fraca da relação.[footnoteRef:36] [36: (PCMS-2017-FAPEMS): A eficácia diagonal trata da aplicação dos direitos fundamentais entre os particulares nas hipóteses em que se configuram desigualdades fáticas.] 
Nesse sentido, Eduardo Gonçalves refere:
Foi justamente a partir destas relações que o autor Sergio Gamonal desenvolveu a teoria da eficácia diagonal dos direitos fundamentais que consiste na necessária incidência e observância dos direitos fundamentais em relações privadas (particular-particular) que são marcadas por uma flagrante desigualdade de forças, em razão tanto da hipossuficiência quanto da vulnerabilidade de uma das partes da relação. Trata-se de uma eficácia diagonal por que, em tese, as partes estão em situações equivalentes (particular-particular), mas, na prática, há um império do poder econômico, razão por que se defende a observância dos direitos fundamentais nestas relações. A este respeito, o TST já tem aplicado a eficácia diagonal dos direitos fundamentais nas relações trabalhistas para combater atos discriminatórios.[footnoteRef:37] [37: in: http://www.eduardorgoncalves.com.br/2016/08/eficacia-diagonal-dos-direitos.html] 
##Obs.: A diferença entre a eficácia horizontal e a eficácia diagonal está na intensidade de aplicação dos direitos fundamentais:
· Relação diagonal: maior intensidade conferida ao direito fundamental, pois a manifestação de vontade pode ser afetada por algum vício, coação ou necessidade.
· Relação horizontal: menor intensidade conferida ao direito fundamental, pois a manifestação de vontade é supostamente livre.
4.2. Teorias Acerca da Eficácia Horizontal
Tratando-se da eficácia horizontal dos direitos fundamentais (homem x homem), há quatro teorias que se destacam: (i) teoria da ineficácia horizontal; (ii) teoria da eficácia horizontal indireta; (iii) teoria da eficácia horizontal direta; (iv) teoria integradora.
4.2.1. Teoria da ineficácia horizontal
Atualmente, é a teoria menos adotada ao redor do mundo, porém é a predominante nos Estados Unidos. 
Nos EUA, tanto a doutrina quanto a jurisprudência não admitem a aplicação dos direitos fundamentais às relações entre particulares (com exceção da 13ª Emenda, que trata da proibição da escravidão), basicamente, por três fundamentos:
i. Liberalismo político: é uma filosofia política que prega a mínima intervenção possível do Estado nas relações privadas. Assim, se os particulares querem deliberar entre si, isso é problema deles e não cabe ao Estado intervir.
ii. Autonomia privada: diretamente ligada ao liberalismo, é a possibilidade do indivíduo de adotar suas próprias decisões de acordo com a sua visão de mundo. Essa autonomia não deve ser objeto de interferência por parte do Estado.
iii. Interpretação do texto constitucional: A Constituição norte-americana atual é a mesma Constituição elaborada em 1787, quando os direitos fundamentais foram nela consagrados com o único e exclusivo objetivo de proteger o indivíduo contra o arbítrio do Estado e, por conseguinte, eram oponíveis apenas ao Estado. 
Portanto, com base em uma interpretação literal, a jurisprudência e a doutrina majoritárias estadunidenses não admitem a eficácia horizontal dos direitos fundamentais, os quais devem ser aplicados somente às relações Estado-particular para proteger os indivíduos contra o arbítrio do Estado.
Com o intuito de contornar esta ineficácia horizontal dos direitos fundamentais, foi desenvolvida a doutrina da “state action” (ou da ação estatal).
A doutrina da “state action” parte do pressuposto de que a violação do direito fundamental só pode ocorrer por meio de uma ação estatal. Com base neste pressuposto, tal doutrina foi desenvolvida para finalidades bem específicas, quais sejam: 1ª) Afastar a impossibilidade de aplicação dos direitos fundamentais às relações entre particulares e 2ª) Definir em que situações uma conduta privada está vinculada aos direitos fundamentais. Para tanto, é utilizado um artifício, qual seja, a equiparação dos atos privados aos atos estatais.
Exemplo: Caso Company Town: Foi o caso de uma companhia gigantesca, comparada a uma cidade, na qual os empregados lá viviam com suas famílias. Essa empresa proibiu que as testemunhas de jeová fizessem pregações mesmo fora do horário de trabalho. 
A Suprema Corte Americana entendeu que, embora essa seja uma relação entre particulares, neste caso o ato da empresa se equiparava a um ato estatal, ou seja, era como se uma prefeitura tivesse proibido que determinado grupo religioso fizesse pregações nesta comunidade. Assim, através da doutrina da state action, a Suprema Corte disse que esse ato violava a liberdade religiosa, pois era equiparado a uma atividade estatal.
4.2.2. Teoria da eficácia horizontal indireta ou mediata[footnoteRef:38] [38: ##Atenção: Tema cobrado na prova do MPPR-2016.] 
Foi desenvolvida por Günter Dürig na Alemanha e é até hoje a teoria mais utilizada no Direito Alemão. 
O ponto de partida da teoria da eficácia horizontal indireta é a existência de um direito geral de liberdade, ou seja, esta teoria parte da premissa de que todos os indivíduos têm um direito geral de liberdade, o qual só poderá sofrer restrições se houver expressa previsão legal. Para isso, é necessário que o legislador infraconstitucional crie regras para intermediar a aplicação dos direitos fundamentais às relações entre particulares.[footnoteRef:39] [39: (TJSC-2019-CESPE): A respeito da eficácia mediata dos direitos fundamentais, assinale a opção correta segundo a doutrina e a jurisprudência do STF: A eficácia mediata dos direitos fundamentais dirige-se, primeiramente, ao legislador.] 
Em outras palavras, os alemães sustentam que os particulares têm um direito geral de liberdade, podendo estabelecer cláusulas negociais sem que o Estado possa interferir nessa margem. Essa liberdade individual somente poderá ser restringida se o legislador criar normas regulamentando as relações contratuais.
O professor Pedro Lenza explica que, “de acordo com a eficácia mediata, os direitos fundamentais são aplicados de maneira reflexa, tanto em uma dimensão proibitiva e voltada para o legislador, que não poderá editar lei que viole direitos fundamentais, como, ainda, positiva, voltada para que o legislador implemente os direitos fundamentais, ponderando quais devam aplicar-se às relações privadas”.[footnoteRef:40] [40: LENZA, Pedro, 2019, p. 1165.] 
Portanto, a Constituição não é aplicada diretamente às relações de direito privado, mas por meio de uma norma de Direito Civil referente ao caso concreto. Norma de Direito Civil intermedeia a aplicação dos direitos fundamentais.[footnoteRef:41] [41: (TJCE-2018-CESPE): De acordo com a doutrina e a jurisprudência dos tribunais superiores acerca da eficácia horizontal dos direitos fundamentais, assinale a opção correta: O efeito horizontal indireto obriga o Poder Judiciário a observar a normatividadedos direitos fundamentais ao decidir conflitos interindividuais.] 
Nesse sentido, há uma relativização dos direitos fundamentais nas relações contratuais, pois é necessário que a lei estabeleça como os direitos devam ser aplicados. 
A expressão “indireta” advém justamente da necessidade de mediação através de lei.
##Em resumo: Para esta teoria, os direitos fundamentais poderiam ser relativizados em favor da “autonomia privada'” e da “responsabilidade individual”. Além disso, reconhece-se um direito geral de liberdade, cabendo ao legislador a tarefa de mediar a aplicação dos direitos fundamentais às relações privadas, por meio de uma regulamentação compatível com os valores constitucionais.
##Críticas feitas pela teoria da eficácia horizontal indireta à aplicação direta dos direitos fundamentais às relações entre particulares: Essa teoria se utiliza três argumentos para dizer que os direitos fundamentais não devem ser aplicados diretamente às relações entre particulares: 
i. Causaria uma desfiguração do direito privado: O direito privado perderia suas características e se tornaria um direito público, pois estariam sendo aplicadas às relações contratuais as mesmas regras de direito público que estão previstas na Constituição para a relação Estado versus Particular;
ii. Seria uma ameaça à autonomia privada: As pessoas não poderiam livremente contratar entre si, prejudicando a autonomia privada;
iii. Incompatibilidade com os princípios democrático, da separação dos Poderes e da segurança jurídica: Como os direitos fundamentais são exteriorizados em termos muito vagos e imprecisos, ou seja, em razão da baixa densidade semântica dos direitos fundamentais, há uma ampliação da margem interpretativa do juiz. Isso causa insegurança jurídica (não se sabe o que será decidido), atinge a separação dos poderes (o legislativo deveria decidir tais temas) e o princípio democrático (o juiz não foi eleito democraticamente para decidir como esses princípios são exteriorizados).
##Conclusão: Segundo essa corrente, os direitos fundamentais não ingressam no cenário privado como direitos subjetivos, sendo necessária a intermediação do legislador. Para que se possa invocar esse direito contra outro indivíduo, é necessário que o legislador regulamente de que maneira os direitos fundamentais serão aplicados. O pressuposto disso é a existência de um direito geral de liberdade, que só poderia ser restringido nas relações de particulares se existisse uma lei regulamentando. Para os adeptos, uma aplicação direta causaria a desfiguração do direito privado e ameaçaria a autonomia privada.
4.2.3. Teoria da eficácia horizontal direta (Drittwirkung)[footnoteRef:42] [42: ##Atenção: Tema cobrado na prova do MPPR-2016.] 
A teoria, embora tenha surgido na Alemanha, a partir da década de 50, com Hans Carl Nipperdey, atualmente, não tem grande aceitação no direito germânico. Entretanto, essa teoria é adotada em vários países, como Portugal, Espanha, Itália e Brasil.[footnoteRef:43] [43: No Brasil, muitas vezes os juízes aplicam os direitos fundamentais nas relações entre particulares como se fosse algo trivial e que não envolvesse discussões maiores.] 
De início, a teoria da eficácia horizontal direta parte da premissa que deve haver vinculação direta dos particulares aos direitos fundamentais, independentemente de qualquer intermediação legislativa, ainda que não se negue a existência de determinadas especificidades nesta aplicação, bem como a necessidade de ponderação dos direitos fundamentais como a autonomia da vontade.
Desse modo, temos a diferença da relação Estado-particular (vertical) e particular-particular (horizontal), é que a aplicação às relações entre particulares não ocorre com a mesma intensidade que nas relações Estado-particular.
Nas relações privadas, é necessário que haja uma ponderação entre o direito fundamental envolvido e a autonomia da vontade. Em cada caso concreto, deve-se verificar se deve prevalecer o direito fundamental ou a autonomia da vontade. 
Portanto, é inegável que a aplicabilidade direta dos direitos fundamentais às relações de ordem privada não é igual a aplicação desses mesmos direitos aos entes estatais, visto que há nas relações entre os particulares um mínimo de autonomia privada, denominado por J. J. Canotilho de “o núcleo irredutível de autonomia pessoal”[footnoteRef:44] esfera na qual os direitos fundamentais não incidiriam. A propósito, Canotilho afirma que “esse núcleo” não pode ser “confiscado” pela aplicação direta e desmedida das normas constitucionais relativas aos direitos fundamentais, trazendo a seguinte situação concreta: “É difícil, por exemplo, argumentar com o princípio da igualdade ou proibição de não discriminação no caso de um pai que favorece um filho em relação ao outro através da concessão da quota disponível, ou de um senhorio que promove acção de despejo por falta de pagamento de renda, mas abdica desse direito em relação a outro inquilino, nas mesmas circunstâncias, pelo facto de este ter as mesmas convicções políticas.” [footnoteRef:45] [44: (TJPR-2017-CESPE): Acerca da formação histórica, da classificação e da eficácia dos direitos fundamentais, assinale a opção correta: A eficácia imediata dos direitos fundamentais encontra limites no núcleo irredutível da autonomia pessoal, situação em que se configura a eficácia moderada na relação entre os poderes privados e os indivíduos.] [45: CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição, 2. ed. Coimbra: Almedina, 1998. p. 1.158.] 
Ex.1: princípio da isonomia: A aplicação do princípio da isonomia nas relações Estado-particular (vertical) é muito mais intensa que nas relações particular-particular (horizontal). 
Como o Estado é responsável por gerir o bem comum, ele não pode contratar alguém licitamente por ser amigo de um governante, devendo dar oportunidade a todos que estejam interessados. Já uma empresa particular pode contratar um amigo sem qualquer problema nisso.
Isso não significa que o princípio da isonomia não precisa ser observado no âmbito privado. Por exemplo, a empresa Air France não pode dar tratamento diferenciado aos seus empregados em razão da nacionalidade. Sobre o assunto, vejamos o seguinte julgado do STF:
RE 161.243/DF: [...] Ao recorrente, por não ser francês, não obstante trabalhar para a empresa francesa, no Brasil, não foi aplicado o Estatuto do Pessoal da Empresa, que concede vantagens aos empregados, cuja aplicabilidade seria restrita ao empregado de nacionalidade francesa. Ofensa ao princípio da igualdade: C.F., 1967, art. 153, § 1º; C.F., 1988, art. 5º, caput).
Ex.2: ampla defesa e devido processo legal: Uma associação não pode excluir seus associados sem lhes viabilizar os direitos à ampla defesa e ao devido processo legal. Sobre o assunto:
COOPERATIVA - EXCLUSÃO DE ASSOCIADO - CARÁTER PUNITIVO - DEVIDO PROCESSO LEGAL. Na hipótese de exclusão de associado decorrente de conduta contrária aos estatutos, impõe-se a observância ao devido processo legal, viabilizado o exercício amplo da defesa. Simples desafio do associado à assembléia geral, no que toca à exclusão, não é de molde a atrair adoção de processo sumário. Observância obrigatória do próprio estatuto da cooperativa. STF. 2ª T., RE 158215, Min. Rel. Marco Aurélio, j. 30/04/96.[footnoteRef:46] [46: ##Atenção: Cobrado na prova do MPRO-2008 (CESPE).] 
##Em resumo: Distinção entre efeito horizontal mediato/indireto e efeito horizontal imediato/direto:
· O efeito horizontal mediato/indireto refere-se precipuamente à obrigação do juiz de observar o papel (efeito, irradiação) dos direitos fundamentais, sob pena de intervir de forma inconstitucional na área de proteção do direito fundamental, prolatando uma sentença inconstitucional. Segundo Bernardo Gonçalves, as normas infraconstitucionais são interpretadas à luz da CF, como se esta fosse um filtro. A aplicação dos direitos fundamentais na relação entre particulares seria sempre mediada pela atuação do legislador ou mesmo pela atuação do juiz,que deveria interpretar o direito infraconstitucional à luz das noras de direitos fundamentais. 
· O efeito horizontal imediato/direto refere-se ao vínculo direto das pessoas aos direitos fundamentais ou de sua imediata aplicabilidade para a solução de conflitos interindividuais. Nas palavras de Bernardo Gonçalves, os direitos fundamentais já trazem condições de plena aplicabilidade nas relações entre particulares, dispensando a mediação infraconstitucional, não necessitando da atuação (sindicabilidade) do legislador nem da interpretação da legislação infraconstitucional à luz da Constituição. Com base na perspectiva da máxima efetividade, a CF deveria ser aplicada diretamente nas relações entre particulares.
4.2.4. Teoria integradora
A teoria integradora busca conciliar algumas premissas da teoria da eficácia horizontal indireta e da teoria da eficácia horizontal direta. Os dois grandes expoentes da teoria integradora são Robert Alexy e Ernst-Wolfgang Böckenförde.
De acordo com a teoria integradora, os direitos fundamentais devem irradiar seus efeitos nas relações entre particulares por meio de lei (regra). Porém, excepcionalmente, havendo omissão legislativa na intermediação, os direitos fundamentais poderão ser aplicados diretamente (exceção).
É uma teoria integradora porque a regra é a necessidade de intermediação por lei. Todavia, não existindo essa intermediação, em hipóteses excepcionais, deve se admitir a aplicação direta do direito fundamental.
5. DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E DIREITOS FUNDAMENTAIS[footnoteRef:47] [47: ##Atenção: Tema cobrado na prova da PGEPE-2009 (CESPE).] 
A dignidade da pessoa humana está prevista na CF/88 no art. 1º, inciso III, como um dos fundamentos da República Federativa do Brasil.
Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:
I - a soberania;
II - a cidadania
III - a dignidade da pessoa humana;
IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa;
V - o pluralismo político.[footnoteRef:48] [48: (TJMS-2010-FCC): A República Federativa do Brasil tem como fundamentos a soberania, a cidadania, a dignidade da pessoa humana, os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa e o pluralismo político. BL: art. 1º, CF/88.] 
Parágrafo único. Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição.
	DICA MNEMÔNICA: “SO-CI-DI-VA-PLU”.
##Obs.: Os fundamentos da República Federativa do Brasil são princípios estruturantes que não se confundem com os objetivos fundamentais (art. 3º, CF/88 – “CO-GA-ERRA-PRO”), ao passo que esses últimos representam metas a serem buscadas pelos Poderes Públicos.
A dignidade da pessoa humana é um tema complexo em vista do seu caráter filosófico. No entanto, após a 2ª Guerra Mundial, as Constituições ocidentais começaram a consagrar em seus textos a dignidade, de modo que ela se converteu de um valor eminentemente filosófico para um valor tipicamente jurídico.
5.1. Natureza: Valor Constitucional Supremo ou Qualidade Intrínseca?
##Questiona-se: A dignidade da pessoa humana é um direito fundamental embora não esteja entre o Título II, mas dentro dos fundamentos da República Federativa do Brasil? 
Tanto no direito brasileiro, como no direito comparado, prevalece o entendimento de que a dignidade não é um direito fundamental ou mesmo sequer um direito, pois ela não é algo concedido pelo ordenamento jurídico. Não é porque a CF/88 prevê a dignidade no art. 3º, III, que temos ela.
Há dois posicionamentos predominantes em relação à natureza jurídica da dignidade da pessoa humana:
1ª Corrente: A dignidade da pessoa humana seria o valor constitucional supremo. A dignidade seria o núcleo axiológico da Constituição. Trata-se do entendimento de que o Estado existe para o ser humano e não o ser humano para o Estado.
2ª Corrente: A dignidade da pessoa humana seria uma qualidade intrínseca de todo ser humano. Todo indivíduo, pelo simples fato de ser humano, é o bastante para ter dignidade.
##Obs.: A expressão “dignidade da pessoa humana” foi cunhada para diferenciá-la da “dignidade da pessoa divina”.
Sendo a dignidade uma qualidade intrínseca e inexistindo uma categorização entre seres humanos, a dignidade não comporta quaisquer relativizações. Assim, não existem pessoas com mais ou pessoas com menos dignidade. Não existem pessoas de primeiro e segundo grau.
Esta noção começou a ser consagrada nos textos constitucionais após o fim da 2ª Guerra Mundial em razão do contexto nazista, no qual se estabelecia uma hierarquia entre seres humanos (pessoas de primeiro e segundo grau) para justificar as experiências em pessoas e atrocidades cometidas. 
5.2. Algo Absoluto
A dignidade é considerada algo absoluto. 
##Obs.: Dizer que a dignidade é algo absoluto não significa compreendê-la como um direito absoluto. 
##Questiona-se: Mas o que é algo absoluto? Conforme Béatrice Maurer, “a pessoa não tem mais ou menos dignidade em relação a outra pessoa. Não se trata, destarte, de uma questão de valor, de hierarquia, de uma dignidade maior ou menor. É por isso que a dignidade do homem é um absoluto”. Ou seja, não é que a dignidade é um direito absoluto, ela é absoluta por não comportar categorizações entre as pessoas.
5.3. Sistema de Direitos Fundamentais
##Questiona-se: Se a dignidade não é um direito, por que estudá-la no âmbito dos direitos fundamentais? Qual a relação da dignidade com os tais direitos?
Trata-se de um vínculo muito forte, pois os direitos fundamentais surgem para proteger e promover a dignidade da pessoa humana. A dignidade da pessoa humana é como se fosse um núcleo sobre o qual os direitos fundamentais gravitam.
Ex.: A igualdade e a liberdade, por exemplo, estão diretamente ligadas à dignidade (primeiro grau). Os direitos sociais, por sua vez, são decorrentes da igualdade (derivações de segundo grau).
Assim, a dignidade da pessoa humana é o núcleo em torno do qual os direitos fundamentais gravitam. Desta forma, é possível falar em um sistema de direitos fundamentais, porque os direitos fundamentais possuem um núcleo em comum.
##Obs.: A dignidade é “o alfa e o ômega”. Alfa e ômega são, respectivamente, a primeira e a última letra do alfabeto grego clássico. A ideia da expressão é a de que a dignidade é a origem e o fim dos direitos fundamentais, porque foram criados para proteger e promover a dignidade e devem ser interpretados, quando aplicados a um caso concreto, com tal finalidade.
##Obs.: A expressão “protoprincípio” tem o sentido de que a dignidade é um princípio do qual se originam outros princípios.
5.4. A Consagração da Dignidade da Pessoa Humana Impõe Deveres
##Questiona-se: Quais são as consequências jurídicas decorrentes da consagração da dignidade da pessoa humana como um dos fundamentos da República?
Nós podemos extrair três deveres decorrentes da consagração da dignidade da pessoa humana como um dos fundamentos da República. Esses deveres não são impostos somente aos Poderes Públicos, como também aos particulares.
a) Dever de respeito
Tanto os poderes públicos quanto os particulares devem respeitar a dignidade das demais pessoas, não adotando condutas que violem a dignidade de terceiros. O dever de respeito, portanto, possui caráter negativo, no sentido de exigir uma abstenção. 
Ex.: Não torturar está incluído no dever de respeito à dignidade.
O dever de respeito pode ser concretizado com base no entendimento adotado pelo Tribunal Constitucional Federal da Alemanha, o qual realiza uma conjugação entre a “fórmula do objeto” (criada por Kant) e a “expressão de desprezo”.
A “fórmula do objeto” pode ser assim sintetizada: o ser humano deve sempre ser tratado como um fim em si mesmo e nunca como um meio para se atingir determinados fins. Se o ser humano for tratado como objeto (daí o termo “fórmula do objeto”) a dignidade será violada.
##Obs.1: A filosofia construída por Kant forneceu as principais bases teóricaspara o conceito de dignidade que temos no mundo ocidental. Sendo um dos principais responsáveis pela universalização deste conceito.
##Obs.2: Vejamos as definições dadas por Kant (livro “Fundamentação da metafísica dos costumes”) que auxiliam na compreensão das bases teóricas da dignidade:
· O traço distintivo do ser humano é existir como um “fim em si mesmo” (“fórmula do objeto”) e não um meio para consecução dos fins.
· “No reino dos fins tudo tem um preço ou uma dignidade” (imperativo categórico). Segundo Kant, aquilo que possui preço pode ser trocado por algo equivalente, mas aquilo que tem dignidade é insubstituível. Nesse passo, a única coisa que dispõe de dignidade, no reino dos fins, é o ser humano.
· “Age de tal forma que trates a humanidade, tanto na tua pessoa como na pessoa de qualquer outro, sempre também como um fim e nunca unicamente como um meio” (imperativo categórico). A dignidade não é só em relação a terceiros, mas também sobre como a pessoa trata a si mesma.
Ex.: A atividade do “arremesso de anão” era uma febre nos anos 80, sendo o anão utilizado como espécie de bala de canhão. Um comissário, utilizando do poder de polícia, determinou que as casas nas quais este tipo de espetáculo estava acontecendo fossem fechadas, justificando que aquela atividade era violadora da dignidade da pessoa humana, pois os anões estavam sendo tratados como um meio e a atividade era fruto do desprezo por ela. A justiça francesa concordou que a atividade era violadora da dignidade da pessoa humana, embora não estivesse consagrada na constituição francesa.
Não somente as casas, como também um anão recorreu dessa decisão, alegando que o que viola sua atividade não é o fato de participar do espetáculo, onde é inserido no meio social e recebe pela atividade, mas sim estar em casa, desempregado e dependendo de uma pensão do governo.
A questão, aqui, centrou-se na indagação quanto ao Estado ou a pessoa vitimada ter legitimidade para decidir o que viola a dignidade ou não. Ocorre que, mesmo entendendo a própria pessoa que não está sendo violada sua dignidade com a atividade, isso estigmatiza todo o grupo de pessoas que estão na mesma condição.
À “fórmula do objeto” no Tribunal Constitucional Federal da Alemanha acrescentou um segundo aspecto: a “expressão de desprezo”. O Tribunal matizou a “fórmula do objeto” entendendo que nem sempre o tratamento do ser humano como meio significa, necessariamente, uma violação à dignidade. Assim, para que ela seja violada, não basta que o ser humano seja tratado como um meio, sendo necessário também que tal tratamento seja fruto de uma expressão de desprezo pelo ser humano.
Ex.: Pessoas que não tinham o vírus do HIV que se ofereceram para participar de um teste da vacina contra esta doença foram utilizadas como meio, mas isso não viola a dignidade dessas pessoas. Se elas voluntariamente se ofereceram como cobaias para um fim altruísta, não há violação.
b) Dever de proteção
O dever de proteção é um dever mais direcionado ao Estado. Os Poderes Públicos devem adotar medidas protetivas da dignidade da pessoa humana, como no caso dos direitos individuais (v.g. proteger o direito à liberdade, o direito à igualdade, etc.).
Além dos direitos individuais, tanto o Poder Legislativo quanto o Poder Executivo, devem adotar políticas públicas para proteger a dignidade (v.g. criando leis que criminalizem determinadas condutas ofensivas à dignidade).
Por fim, o Poder Judiciário possui um importante papel através da interpretação não só dos direitos fundamentais, como também dos direitos em geral. Assim, deve haver o emprego da dignidade como um vetor interpretativo (v.g. cf. a CF/88, a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade são garantidos aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no país, porém o STF estende esta proteção a estrangeiros não residentes fundamentando-se, principalmente, na dignidade da pessoa humana. Se ela é uma qualidade intrínseca que todo ser humano possui, não se pode deixar de oferecê-los e assegurá-los a uma pessoa apenas porque ela não é brasileira ou não resida no Brasil).[footnoteRef:49] [49: (PGEGO-2013): Direitos fundamentais “são o conjunto de normas, princípios, prerrogativas, deveres e institutos, inerentes à soberania popular, que garantem convivência pacífica, digna, livre e igualitária, independentemente de credo, raça, origem, cor, condição econômica ou status social. Sem os direitos fundamentais, o homem não vive, não convive, e, em alguns casos, não sobrevive” (BULOS, Uadi Lammêgo. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva, 2011). Tendo em vista esse conceito, está correta a seguinte proposição: Os brasileiros, natos ou naturalizados, bem como os estrangeiros residentes no País, são titulares dos direitos fundamentais, conforme previsão constitucional.] 
c) Dever de promoção
Os Poderes Públicos devem adotar não só medidas protetivas, mas também medidas voltadas à promoção de condições dignas de existência, as quais são promovidas, sobretudo, através da consagração de direitos sociais, de políticas públicas (do Poder legislativo e do Poder Executivo) e do mínimo existencial.
6. DIMENSÃO SUBJETIVA E DIMENSÃO OBJETIVA[footnoteRef:50] [50: ##Atenção: Tema cobrado nas provas: i) PCGO-2013; ii) MPPR-2016.] 
6.1. Dimensão Subjetiva
A dimensão subjetiva é considerada a visão clássica e mais evidente dos Direitos Fundamentais, visto que são vistos como um direito da pessoa em face do Estado, no qual será possível deve atuar de duas formas:
1ª) atuação negativa, no sentido de abster de intervir para que não viole os direitos previstos, especialmente os direitos e garantias individuais; e 
2ª) atuação positiva, quanto às prestações que o Estado faz para as pessoas de modo a garantir condições mais dignas de sobrevivência, especificamente os direitos sociais. 
Portanto, em linhas gerais, a dimensão subjetiva é a aquela segundo a qual os direitos fundamentais são pensados sob a perspectiva dos indivíduos, titulares destes direitos. Nesse sentido, Marcelo Novelino explica que “o indivíduo que possui um direito fundamental é titular de posição jurídica contemplada pela norma jusfundamental, que pode ter a estrutura de princípio e/ou de regra”. [footnoteRef:51]-[footnoteRef:52] [51: NOVELINO, Marcelo. Curso de Direito Constitucional. 14ª Ed. Salvador: Editora JusPodivm, 2019, p. 328-329.] [52: (DPEBA-2016-FCC): No âmbito da Teoria dos Direitos Fundamentais, a dimensão subjetiva dos direitos fundamentais está atrelada, na sua origem, à função clássica de tais direitos, assegurando ao seu titular o direito de resistir à intervenção estatal em sua esfera de liberdade individual.] 
Portanto, a dimensão subjetiva pode ser compreendida como a faculdade de impor uma atuação negativa ou positiva aos titulares do Poder Público. Ex.: A pessoa, como indivíduo, tem direito a liberdade de manifestação e pensamento, direito a um processo com o devido processo legal, etc.
##Em resumo: Na dimensão subjetiva, os direitos fundamentais são destinados às PESSOAS/PARTICULAR contra a atuação (positiva ou negativa) do ESTADO. A relação aqui é pessoa vs Estado. A RELAÇÃO É VERTICAL.
Todavia, os direitos fundamentais não podem ser considerados somente sob o enfoque dos indivíduos, enquanto posições jurídicas oponíveis aos poderes públicos e particulares. Vejamos a próxima dimensão.
6.2. Dimensão Objetiva[footnoteRef:53]-[footnoteRef:54] [53: (DPEMG-2019): A respeito dos direitos e garantias individuais e coletivas, assinale a alternativa correta: A proibição de revista íntima de funcionárias e de clientes do sexo feminino por empresas privadas, órgãos e entidades da administração pública, direta e indireta, fundamenta-se na garantia fundamental do direito à intimidade (art. 5º, X, CRFB/88).
(TJRS-2018-VUNESP): Assinale a alternativa que corretamente contempla um exemplo de aplicação do conceito de dimensão objetiva dos direitos fundamentais: Decisão do STF em que foi firmado o entendimento de que a revistaíntima em mulheres em fábrica de lingerie, ou seja, empresa privada, constitui constrangimento ilegal.
##Atenção: A fábrica de lingerie, ou seja, empresa privada, ao impor uma regra, ainda que consentida pela empregada (relação de particular com outro particular) constitui constrangimento ilegal, por violar o direito a INTIMIDADE (direito fundamental). Assim, na dimensão objetiva dos direitos fundamentais é estabelecido diretrizes para a atuação dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário e, ainda, para as relações particulares. No caso em tela, o direito fundamental de inviolabilidade da intimidade está recebendo uma diretriz para posteriores revistas íntimas realizadas em mulheres em empresas privadas. Como consequência de sua dimensão objetiva, os direitos fundamentais conformam o comportamento do Poder Público e cria para o Estado um dever de proteção desses direitos contra agressões advindas do próprio Estado ou de particulares.
(MPPR-2016): Assinale a alternativa correta: A função dos direitos sociais constitucionais como direito a prestações materiais é somente uma das espécies no âmbito das possíveis posições subjetivas decorrentes das normas de direitos sociais, visto que além de assumirem uma nítida função defensiva (negativa), atuando como proibições de intervenção, também implicam em prestações do tipo normativo (positiva).] [54: ##Atenção: Tema cobrado na prova do TJRS-2018 (VUNESP).] 
Pela dimensão objetiva, os direitos fundamentais são juridicamente válidos do ponto de vista da comunidade, ou seja, como valores ou fins a serem realizados, em grande medida, através da ação estatal. Nesta dimensão, os direitos fundamentais formam uma “ordem de valores”, ou seja, como fins para serem buscados. Ex.: A liberdade é um valor a ser buscado por ser importante para a sociedade, independentemente da consideração de seus titulares individualmente. 
O professor Bernardo Gonçalves explica que a dimensão objetiva “vai além da perspectiva subjetiva dos direitos fundamentais como garantias do indivíduo frente ao Estado e coloca os direitos fundamentais como um verdadeiro "norte" de "eficácia irradiante" que fundamenta todo o ordenamento jurídico.”[footnoteRef:55]-[footnoteRef:56] [55: FERNANDES, Bernardo Gonçalves. Curso de Direito Constitucional. 9. ed. Salvador. JusPODIVM, 2017, p. 314.] [56: (MPDFT-2013): Assinale a alternativa correta: O aspecto objetivo dos direitos fundamentais, segundo a concepção dominante, reúne decisões de valores, que se irradiam por todo o ordenamento jurídico.] 
Nesse sentido, a doutrina e jurisprudência apresentam três enfoques/premissas da dimensão objetiva nos quais os direitos fundamentais apresentam critérios de controle da ação estatal, que devem ser aplicados independentemente de eventuais violações a direitos subjetivos fundamentais. Vejamos a aplicação de uma dessas premissas: 
· Atuação dos direitos fundamentais como normas de competência negativa: Significa que aquilo que está sendo outorgado ao indivíduo em termos de liberdade para ação e em termos de livre arbítrio em sua esfera, está sendo objetivamente retirado do Estado. Ex.: É como se fossem dois lados de uma moeda: se a CF/88 me assegura como indivíduo a liberdade de manifestação e pensamento, vedando apenas o anonimato, por outro lado, ela está impondo ao estado o dever de não haver ingerências nessa liberdade.
	
· Atuação dos direitos fundamentais como pautas interpretativas e critérios para a configuração do direito infraconstitucional (“efeito de irradiação dos direitos fundamentais”): Nesse sentido, os direitos fundamentais impõem que a legislação infraconstitucional seja interpretada e criada à luz dos direitos fundamentais (“interpretação conforme”). Em um primeiro aspecto (pautas interpretativas), exige-se que os direitos fundamentais sejam vetores para a interpretação, seja da CF ou das normas infraconstitucionais (“interpretação conforme a constituição”). Em um segundo aspecto (critérios para a configuração do direito infraconstitucional), os direitos fundamentais devem ser observados quando da criação de normas infraconstitucionais. Vejamos o seguinte julgado do STF:
ADI 4.277/DF: [...] O sexo das pessoas, salvo disposição constitucional expressa ou implícita em sentido contrário, não se presta como fator de desigualação jurídica. Proibição de preconceito, à luz do inciso IV do art. 3º da Constituição Federal, por colidir frontalmente com o objetivo constitucional de “promover o bem de todos”. (…) Ante a possibilidade de interpretação em sentido preconceituoso ou discriminatório do art. 1.723 do Código Civil, não resolúvel à luz dele próprio, faz-se necessária a utilização da técnica de “interpretação conforme a Constituição”. Isso para excluir do dispositivo em causa qualquer significado que impeça o reconhecimento da união contínua, pública e duradoura entre pessoas do mesmo sexo como família. Reconhecimento que é de ser feito segundo as mesmas regras e com as mesmas consequências da união estável heteroafetiva.
· Os direitos fundamentais impõem o dever de proteção e promoção de posições jurídicas fundamentais contra possíveis violações por terceiros, tornando-se verdadeiros mandamentos normativos direcionados ao Estado. Assim, independentemente de haver um titular ou não daquele direito no caso concreto, o Estado tem o dever de proteger o direito fundamental em questão. Em outras palavras, ainda que não se reconheça a consagração de pretensões subjetivas, é possível identificar um dever imposto ao Estado de adotar as medidas necessárias para a concretização de normas de direitos fundamentais. Vejamos o seguinte julgado do STF, em que é possível identificar as duas dimensões:
ADI 3.510/DF (voto Min. Lewandowski): [...] penso que a discussão travada nestes autos não deve limitar-se a saber se os embriões merecem ou não ser tratados de forma condigna, ou se possuem ou não direitos subjetivos na fase pré-implantacional, ou, ainda, se são ou não dotados de vida antes de sua introdução em um útero humano (…). Creio que o debate deve centrar-se no direito à vida entrevisto como um bem coletivo [dimensão objetiva], pertencente à sociedade [dimensão objetiva] ou mesmo à humanidade [dimensão objetiva] como um todo, sobretudo tendo em conta os riscos potenciais que decorrem da manipulação do código genético humano.
##Em resumo: Na dimensão subjetiva, temos que a extensão dos direitos fundamentais destinados às PESSOA/PARTICULAR contra a atuação de outra PESSOA/PARTICULAR ou outras PESSOAS/COLETIVIDADE. A relação aqui é particular vs particular. A RELAÇÃO É HORIZONTAL. Elas “destina-se a organizar uma atividade que tenha influência coletiva, funcionando como programa diretor para a realização constitucional”.[footnoteRef:57] [57: BARROS, Suzana de Toledo. O princípio da proporcionalidade e o controle de constitucionalidade das leis restritivas de direitos fundamentais. 3ª ed. Brasília: Brasília Jurídica, 2003., p. 132-134] 
##Em resumo: ##Dica retirado do site Qconcursos:
a) Dimensão objetiva dos direitos fundamentais:
- atende a interesses de uma coletividade.
- direitos de proteção (atuação negativa) e exigência de prestações (atuação positiva) pelo indivíduo em relação ao Poder Público.
b) Dimensão subjetiva dos direitos fundamentais :
- atende a interesses de indivíduos, de forma unitária.
- valores básicos do Estado de Direito estabelecendo diretrizes de atuação do Poder Executivo, Legislativo e Judiciário, bem como na relação entre particulares (eficácia irradiante dos direitos fundamentais).
7. CONTEÚDO ESSENCIAL
7.1. Objetivo
##Questiona-se: Qual a razão de buscar definir o conteúdo essencial dos direitos fundamentais? 
O objetivo de definir o conteúdo essencial dos direitos fundamentais é evitar que os Poderes Públicos (sobretudo o Poder Legislativo) desnaturalizem/desconfigurem os direitos fundamentais ao regulamentá-los ou ao restringi-los. 
Assinale-se que o conteúdo essencial não é aplicado somente ao legislador, mas também ao juiz. Na hora de interpretar um direitofundamental, o juiz também não pode violar o conteúdo essencial deste direito.
7.2. Formas de determinação
Há duas teorias através das quais o conteúdo essencial dos direitos fundamentais é determinado: (i) teoria absoluta; (ii) teoria relativa.
7.2.1. Teoria absoluta (menos utilizada)[footnoteRef:58] [58: ##Atenção: Cobrada na prova do TJDFT-2016.] 
A teoria absoluta faz uma distinção entre o conteúdo essencial deste direito e a sua periferia.
· Conteúdo essencial (ou “núcleo duro”): Conteúdo essencial é o “núcleo duro” do direito fundamental. Segundo a teoria absoluta, o núcleo duro é definido de modo absoluto. Isto é, através da interpretação do direito fundamental, é possível delimitar, precisamente, seus contornos. Ao delimitá-lo precisamente, o conteúdo essencial torna-se inviolável, não podendo ser atingido pelo legislador.
· Periferia (parcela periférica): Além do núcleo duro definido através da interpretação, há uma parte periférica do direito, na qual a intervenção legislativa é possível e legítima, ainda que não de forma totalmente discricionária.
Assim, o direito fundamental tem o seu núcleo duro e a sua parte periférica. Ao regulamentar este direito fundamental ou criar restrições a ele, o legislador pode entrar na periferia do direito e regulamentá-la. Porém, o legislador não pode adentrar e regulamentar o núcleo duro, sob pena de violar o direito fundamental e ser a lei declarada inconstitucional.
Gilmar Mendes afirma que os adeptos da teoria absoluta entendem o núcleo essencial dos direitos fundamentais como unidade substancial autônoma que, independentemente de qualquer situação concreta, estaria a salvo de eventual decisão legislativa. Além disso, refere que tal teoria adota uma interpretação material segundo a qual existe um espaço interior livre de qualquer intervenção estatal. Neste caso, além da exigência de justificação, imprescindível em qualquer hipótese, ter-se-ia um “limite do limite” para a própria ação legislativa, consistente na identificação de um espaço insuscetível de regulação.[footnoteRef:59] [59: ##Atenção: ##CESPE: ##TJDFT-2016: Gilmar Mendes explica que a ordem constitucional brasileira não contemplou qualquer disciplina expressa e direta sobre a proteção do núcleo essencial de direitos fundamentais. Todavia, é inequívoco que a CF/88 veda expressamente qualquer proposta de emenda tendente a abolir os direitos e garantias individuais (art. 60, §4º, IV, CF).] 
Exemplo de utilização da teoria absoluta:
ADPF 130 (voto Min. Ayres Britto): A uma atividade que já era ‘livre’ (incisos IV e IX do art. 5º), a Constituição Federal acrescentou o qualificativo de ‘plena’ (§ 1º do art. 220). Liberdade plena que, repelente de qualquer censura prévia, diz respeito à essência mesma do jornalismo (o chamado ‘núcleo duro’ da atividade). (…) Assim entendidas as coordenadas de tempo e de conteúdo da manifestação do pensamento, da informação e da criação lato sensu, sem o que não se tem o desembaraçado trânsito das ideias e opiniões, tanto quanto da informação e da criação. Interdição à lei quanto às matérias nuclearmente de imprensa, retratadas no tempo de início e de duração do concreto exercício da liberdade, assim como de sua extensão ou tamanho do seu conteúdo. (…) As matérias reflexamente de imprensa, suscetíveis [periferia], portanto, de conformação legislativa, são as indicadas pela própria Constituição, tais como: direitos de resposta e de indenização, proporcionais ao agravo; proteção do sigilo da fonte (“quando necessário ao exercício profissional”); responsabilidade penal por calúnia, injúria e difamação; diversões e espetáculos públicos (…).
##Adendo: ##Atenção: ##TRF3-2011: ##TJRS-2012: ##DPEES-2012: ##TJDFT-2016: ##TJPR-2017: ##CESPE: O STF julgou inconstitucional norma que criou conselho profissional (autarquia) para a fiscalização do jornalismo, dada a impossibilidade do estabelecimento de controles estatais sobre a profissão jornalística. O exercício do poder de polícia do Estado é vedado nesse campo em que imperam as liberdades de expressão e de informação. Vejamos:
STF, RE 511961: "No campo da profissão de jornalista, não há espaço para a regulação estatal quanto às qualificações profissionais. O art. 5º, incisos IV, IX, XIV, e o art. 220, não autorizam o controle, por parte do Estado, quanto ao acesso e exercício da profissão de jornalista. Qualquer tipo de controle desse tipo, que interfira na liberdade profissional no momento do próprio acesso à atividade jornalística, configura, ao fim e ao cabo, controle prévio que, em verdade, caracteriza censura prévia das liberdades de expressão e de informação, expressamente vedada pelo art. 5º, inciso IX, da Constituição. A impossibilidade do estabelecimento de controles estatais sobre a profissão jornalística leva à conclusão de que não pode o Estado criar uma ordem ou um conselho profissional (autarquia) para a fiscalização desse tipo de profissão."[footnoteRef:60] [60: (TJRS-2012): Em relação ao diploma de jornalismo, decisão do STF considerou que exigi-lo era desproporcional e violava a liberdade de expressão e informação.
(MPDFT-2011): O Estado não pode criar uma ordem ou um conselho profissional para a fiscalização da atividade jornalística.] 
##Atenção: ##CESPE: ##TJDFT-2016: Gilmar Mendes explica que a ordem constitucional brasileira não contemplou qualquer disciplina expressa e direta sobre a proteção do núcleo essencial de direitos fundamentais. Todavia, é inequívoco que a CF/88 veda expressamente qualquer proposta de emenda tendente a abolir os direitos e garantias individuais (art. 60, §4º, IV, CF).
7.2.2. Teoria relativa[footnoteRef:61] (mais utilizada) [61: ##Atenção: Tema cobrado nas provas: i) MPT-2012; ii) DPERN-2015 (CESPE).] 
A teoria relativa procura justificar as restrições aos direitos fundamentais mediante o recurso ao princípio da proporcionalidade. 
Pela teoria relativa, a verificação de violação ou não do direito fundamental é realizada à luz do princípio da proporcionalidade, no bojo do caso concreto, mesmo que seja um caso concreto em tese. Portanto, não existe na teoria relativa uma barreira intransponível. 
Em face do caso concreto, se a lei passar pelo crivo da proporcionalidade (adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito) ela não violará o conteúdo essencial do direito disciplinado. Do contrário, o conteúdo essencial será violado e ela será considerada uma “lei desproporcional”. 
O Min. Gilmar Mendes leciona que os adeptos da teoria relativa entendem que o núcleo essencial há de ser definido para cada caso, tendo em vista o objetivo perseguido pela norma de caráter restritivo. O núcleo essencial seria aferido mediante a utilização de um processo de ponderação entre meios e fins, com base no princípio da proporcionalidade. O núcleo essencial seria aquele mínimo insuscetível de restrição ou redução com base nesse processo de ponderação. Segundo essa concepção, a proteção do núcleo essencial teria significado marcadamente declaratório. [footnoteRef:62] [62: (MPF-2011): A teoria relativa do núcleo essencial dos direitos fundamentais funde o conceito de núcleo essencial com o de respeito ao princípio da proporcionalidade nas medidas restritivas de direitos.] 
Exemplo de utilização da teoria relativa:
RE 603.583/RS (voto Min. Luiz Fux): No que concerne, por seu turno, à eventual violação do núcleo essencial da liberdade profissional, também não se enxerga a sua ocorrência. Como visto acima [princípio da proporcionalidade], qualquer bacharel em Direito pode prestar o Exame de Ordem quantas vezes for necessário até a sua aprovação, sendo certo que não há qualquer limitação numérica de aprovados (…).
##Atenção: ##CESPE: ##Distinção entre a Teoria Absoluta e a Teoria Relativa: Marcelo Novelino distingue, de forma didática, as duas teorias:[footnoteRef:63] [63: NOVELINO, Marcelo. Curso de Direito Constitucional. 14ª Ed. Salvador: Editora JusPodivm, 2019, p. 328-329.] 
I. Para a teoria absoluta, há um núcleo no âmbito de proteção de cada direito fundamental,cujos limites são intransponíveis, ainda que eventualmente existam outros fatores que justifiquem sua restrição. Sob tal prisma, o conteúdo essencial refere-se ao espaço de maior intensidade valorativa do direito, sua parte intocável, delimitada em abstrato através da interpretação. Em sentido forte, a proteção constitucional é assegurada apenas par o “núcleo duro”, considerado o “coração do direito”. A parte periférica pode sofrer intervenções legislativas, mesmo que dentro determinados limites. 
II. Para a teoria relativa, a definição daquilo que deve ser protegido irá depender das circunstâncias do caso concreto (possibilidade fática) e das demais normas envolvidas (possibilidade jurídica). Nesta concepção, o conteúdo essencial de um direito será variável, por depender do resultado da ponderação. Sob essa perspectiva, não há delimitação fixa e preestabelecida, por não se tratar de elemento estável nem de parte autônoma do direito fundamental. A teoria relativa é a única que comporta a teoria dos princípios, proposta por Robert ALEXY e, portanto, mais compatível com a doutrina constitucional pátria.
7.2.3. Fragilidades das teorias absoluta e relativa
As duas teorias analisadas acima pretendem assegurar maior proteção dos direitos fundamentais, na medida em que buscam preservar os direitos fundamentais contra uma ação legislativa desarrazoada. Entretanto, elas apresentam fragilidades, vejamos: 
· A teoria absoluta, ao acolher uma noção material do núcleo essencial, insuscetível de redução por parte do legislador, pode converter-se, em muitos casos, numa fórmula vazia, dada a dificuldade ou até mesmo a impossibilidade de se demonstrar ou caracterizar in abstracto a existência desse mínimo essencial.
· Já a opção pela teoria relativa pode conferir uma flexibilidade exagerada ao estatuto dos direitos fundamentais, o que acaba por descaracterizá-los com princípios centrais do sistema constitucional.
8. RESTRIÇÕES OU LIMITES AOS DIREITOS FUNDAMENTAIS[footnoteRef:64] [64: ##Atenção: Tema cobrado na prova da PGEPE-2009 (CESPE).] 
8.1. Formas de Fixação dos Limites ou Restrições
Existem duas formas de se fixar os limites ou as restrições aos direitos fundamentais: (i) teoria interna; (ii) teoria externa.
A teoria interna costuma falar em limites aos direitos fundamentais e a teoria externa costuma falar em restrições aos direitos fundamentais. Porém, a rigor são sinônimos, pois a ideia é a mesma.
8.1.1. Teoria interna
A teoria interna sustenta que os direitos fundamentais e os seus limites imanentes consistem em um só objeto.
Os limites imanentes de um direito fundamental são fixados, a priori, por um processo interno (daí o nome teoria interna), através da interpretação do próprio direito fundamental (e não dos outros direitos fundamentais envolvidos). Ou seja, assim como a teoria absoluta do conteúdo essencial dos direitos fundamentais, a teoria interna no tocante às limitações sustenta que é através da interpretação, pura e simplesmente, que se fixa os limites imanentes ao direito fundamental. Não há uma ponderação de direitos.
Neste processo, como são fixados os limites precisos através de uma interpretação, é extraída uma regra. Portanto, todo direito fundamental constitui uma regra. Consequentemente, é aplicada a lógica do tudo ou nada: inexiste colisão ou ponderação entre direitos fundamentais. 
Exemplo de aplicação da teoria interna:
ADI 3.510/DF (voto Min. Ayres Britto): O Magno Texto Federal não dispõe sobre o início da vida humana ou o preciso instante em que ela começa. Não faz de todo e qualquer estádio da vida humana um autonomizado bem jurídico, mas da vida que já é própria de uma concreta pessoa, porque nativiva (teoria “natalista”, em contraposição às teorias “concepcionista” ou da “personalidade condicional”). E quando se reporta a “direitos da pessoa humana” e até dos “direitos e garantias individuais” como cláusula pétrea está falando de direitos e garantias do indivíduo-pessoa, que se faz destinatário dos direitos fundamentais “à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade”, entre outros direitos e garantias igualmente distinguidos com o timbre da fundamentalidade (como direito à saúde e ao planejamento familiar) (…) O Direito infraconstitucional protege por modo variado cada etapa do desenvolvimento biológico do ser humano. Os momentos da vida humana anteriores ao nascimento devem ser objeto de proteção pelo direito comum. O embrião pré-implanto é um bem a ser protegido, mas não uma pessoa no sentido biográfico a que se refere a Constituição.
##Obs1: Toda esta “ginástica” é feita para dizer que não há uma colisão entre a inviolabilidade do direito à vida do embrião e o direito à vida das pessoas que podem ser salvas através das pesquisas com células-tronco embrionárias. Para isso, o voto do Ministro diz que não há colisão porque a CF não consagra a vida do embrião como um bem jurídico tutelado, sendo isso protegido pelo direito comum. Por isso, a lei não é inconstitucional por não violar nenhum dispositivo da CF, que apenas protege a vida da pessoa e não do indivíduo que não nasceu.
##Obs2: Veja-se que, se utilizarmos esta teoria, a própria criminalização do aborto é inconstitucional, pois, ao impedir a mulher de abortar, estamos subjugando diversos direitos de índole constitucional (v.g. direitos à privacidade e ao próprio corpo) para proteger um direito (direito do embrião) que não está na CF/88.
8.1.2. Teoria externa
##Obs.: A teoria dos princípios de Robert Alexy somente é compatível com a teoria relativa (quanto a determinação) e a teoria externa (quanto às restrições).
A teoria externa parte da premissa de que há dois objetos distintos: o direito fundamental em si e suas restrições. São coisas distintas porque as restrições não são determinadas através de um processo interno de interpretação do direito, mas sim identificáveis a partir de uma perspectiva externa, consistente na análise dos outros direitos fundamentais consagrados pela Constituição. 
Portanto, para se chegar à delimitação precisa do direito fundamental há duas etapas a serem observadas:
1ª etapa: Identificação do conteúdo inicialmente protegido da forma mais ampla possível. Aqui há um direito “prima facie” (provisório).
Ex.: liberdade de manifestação do pensamento: qualquer manifestação, mesmo que ofenda a honra de alguém, em princípio, está protegida pelo direito à liberdade de manifestação do pensamento.
2ª etapa: São definidos os limites externos do direito, através da ponderação prima facie entre o direito analisado e entre os demais direitos consagrados pela Constituição. Como resultado desta ponderação, temos o direito definitivo que deve ser observado.
Exemplo de aplicação da teoria externa:
ADI 3.510/DF (voto Min. Celso de Mello): Como se sabe, a superação dos antagonismos existentes entre princípios constitucionais – como aqueles concernentes à inviolabilidade do direito à vida, à plenitude da liberdade de pesquisa científica (cujo desenvolvimento propicie a cura e a recuperação de pessoas afetadas por patologias graves e irreversíveis) e ao respeito à dignidade da pessoa humana – há de resultar da utilização, pelo Poder Judiciário, de critérios que lhe permitam ponderar e avaliar, “hic et nunc” (desde logo), em função de determinado contexto e sob uma perspectiva axiológica concreta, qual deva ser o direito a preponderar no caso. [...] A questão pertinente ao direito à vida admite a possibilidade de, ele próprio, constituir objeto de ponderação por parte do Estado, considerada a relevantíssima circunstância (ocorrente na espécie) de que se põem em relação de conflito, com esse mesmo direito, interesses existenciais titularizados por milhões de pessoas afetadas por patologias graves e irreversíveis, cuja superação pode ser conseguida com a liberação – que se impõe como uma exigência de ordem ética e de caráter jurídico – das pesquisas científicas com células-tronco embrionárias.
##Obs.: Aqui o Ministro disse, em suma, que na colisão entre a inviolabilidade do direito àvida do embrião e o direito à saúde de milhões de pessoas que podem ser salvas pelas pesquisas com células-tronco, deve prevalecer o direito destas pessoas, especialmente porque tais embriões seriam descartados.
9. LIMITES DOS LIMITES[footnoteRef:65] [65: ##Atenção: Caiu na prova da DPERN-2015 (CESPE).] 
A expressão “limites dos limites” foi cunhada por Karl August Betterman, em 1964, para fazer referência ao paradoxo das restrições aos direitos fundamentais: os direitos fundamentais foram consagrados nas constituições para proteger os indivíduos do arbítrio do estado (direitos fundamentais de primeira dimensão). Porém, esses mesmos direitos fundamentais que atuam como limites à atuação do Estado podem ser limitados pelo próprio Estado. Essas limitações do próprio Estado precisam observar determinados limites (por isso “limites dos limites”).
Em outras palavras, quando se fala em “limites dos limites” está se falando nos requisitos que uma lei restritiva aos direitos fundamentais deva observar. São eles:
· Princípio da legalidade (CF, art. 5º, II): qualquer restrição a um direito fundamental somente será válida se veiculada por lei. Portanto, um ato infralegal (v.g. decreto) não pode restringir um direito fundamental;
##Obs.: Marcelo Novelino entende que não é adequado falar em princípio da reserva legal (que exige lei em sentido estrito) neste caso, pois uma restrição a um direito fundamental, no Brasil, não precisa necessariamente ser feita por uma lei ordinária ou complementar.
O art. 62 da CF admite, por exemplo, que medida provisória - que é uma lei em sentido amplo - possa tratar de direitos individuais.
· Princípio da não retroatividade (CF, art. 5º, XXXVI): uma restrição a direito fundamental não pode prejudicar o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada. Assim, uma restrição a direito fundamental não pode ocorrer de forma retroativa;
· Princípios da generalidade e abstração (+ princípio da isonomia): Somente uma norma geral e abstrata pode restringir um direito fundamental. A norma deve ser geral e abstrata em razão do princípio da isonomia, para que todos sejam tratados da mesma maneira;
· Princípio da salvaguarda do conteúdo essencial: A lei restritiva não pode violar o conteúdo essencial de um direito fundamental.
Se adotarmos a teoria relativa (quanto a forma de determinação), significa que uma lei deve passar pelo crivo do princípio da proporcionalidade.
Por outro lado, se adotarmos a teoria absoluta (quanto a forma de determinação), a salvaguarda do conteúdo essencial será analisada através da interpretação.
De toda forma, adotando-se a teoria absoluta ou relativa, uma lei restritiva a um direito fundamental não pode violar o conteúdo essencial deste direito.
10. POSTULADO DA PROPORCIONALIDADE[footnoteRef:66] [66: ##Atenção: Caiu na prova do TJSP-2018, banca VUNESP.] 
10.1. Nomenclatura
Na doutrina, são utilizadas diferentes denominações: “princípio da proporcionalidade”, “postulado da proporcionalidade”, “máxima da proporcionalidade”.
Tradicionalmente, a proporcionalidade é referida como um princípio. No entanto, considerando a distinção realizada por Robert Alexy entre princípio e regra, a proporcionalidade não é um princípio, pois ela não é ponderada frente a algo diverso. 
O princípio da proporcionalidade trata-se, portanto, de uma condição de possibilidade do raciocínio com princípios: ao analisar a aplicação de princípios é empregada, como critério formal, a proporcionalidade. A proporcionalidade não tem um conteúdo próprio (como tem, por exemplo, os direitos à vida e à liberdade), despontando como uma forma de se raciocinar com princípios.
##Obs.1: Humberto Ávila diferencia regra, princípio e postulado. Postulado seria uma metanorma ou uma norma de segundo grau, isto é, uma norma que trata da estrutura de aplicação e de modos de raciocínio em relação a outras normas. Robert Alexy utiliza a expressão “máxima” da proporcionalidade (no mesmo sentido adotado por Humberto Ávila).
##Obs.2: Os termos “proporcionalidade” e “razoabilidade” costumam ser empregados por parcela da doutrina como sinônimos. Na própria jurisprudência do STF são encontrados julgados onde “proporcionalidade” e “razoabilidade” são tratadas como equivalentes. Parte da doutrina, no entanto, realiza uma distinção entre os dois (v.g. Virgílio Afonso da Silva e Humberto Ávila).
* Sobre o tema, ver artigos disponibilizados no fórum de constitucional como “material complementar”:
- O proporcional e o razoável (Virgílio Afonso da Silva)
- A distinção entre princípio e regra e o dever de proporcionalidade (Humberto Ávila)
10.2. Consagração Implícita[footnoteRef:67] [67: ##Atenção: Tema cobrado na prova da DPEBA-2016 (FCC).] 
##Questiona-se: De onde é extraída a proporcionalidade? Há três entendimentos na doutrina sobre a origem da proporcionalidade:
a) “Cláusula do devido processo legal substantivo”
Segundo este entendimento, a proporcionalidade seria extraída da “cláusula do devido processo legal substantivo” (CF, art. 5º, LIV e LV). É o entendimento adotado nos EUA e em alguns julgados mais antigos do STF.
b) Princípio do Estado de Direito (CF, art. 1º)
Na Alemanha, a proporcionalidade costuma ser deduzida do princípio do Estado de Direito. Pauta-se no fato de que em um Estado de Direito é inadmissível a conduta dos Poderes Públicos que seja arbitrária ou desproporcional. É o sentido atualmente adotado no STF.
c) Sistema de direitos fundamentais (Canotilho)
Conforme este entendimento, a proporcionalidade pode ser deduzida do sistema de direitos fundamentais. A Constituição, ao consagrar um sistema de direitos fundamentais, por consequência, veda-se qualquer tipo de arbitrariedade por parte do Estado.
10.3. Máximas Parciais[footnoteRef:68]-[footnoteRef:69] [68: (MPMG-2017): Quanto aos direitos fundamentais, assinale a alternativa correta: O princípio da proporcionalidade, amplamente utilizado na jurisdição constitucional, liga-se ao preceito da finalidade legítima, bem como é critério definidor daquilo que compõe o núcleo essencial de um direito fundamental.] [69: ##Atenção: Tema cobrado nas provas: i) DPESP-2010 (FCC); ii) TJSP-2018 (VUNESP).] 
As três máximas da proporcionalidade são: (i) adequação; (ii) necessidade (ou exigibilidade, ou princípio da menor ingerência possível); e (iii) proporcionalidade em sentido estrito.
As três máximas parciais possuem a estrutura de regra e, portanto, não são ponderadas. Assim, uma medida estatal restritiva de direitos fundamentais só será proporcional se for adequada ao fim a que se destina, se for necessária e se for proporcional em sentido estrito.
a) Adequação
A adequação envolve uma relação entre meio e fim: as medidas adotadas pelos Poderes Públicos devem ser aptas para fomentar (promover em tese) os objetivos almejados. Deste modo, uma medida só será proporcional se ela tiver a aptidão para alcançar a finalidade, a qual se destina.[footnoteRef:70] [70: (MPMG-2021): Sobre a interpretação das normas constitucionais, é correto afirmar: Dentro do juízo de proporcionalidade, o subprincípio da adequação julga se as medidas de intervenção no direito fundamental são razoáveis e aptas para se alcançar o fim almejado.
##Atenção: O princípio da proporcionalidade serve para fazer a ponderação de interesses no caso concreto quando duas normas constitucionais estiverem em choque. Este postulado é composto de três subprincípios ou elementos de seu conteúdo, que são: a adequação (ou idoneidade), a necessidade e a proporcionalidade em sentido estrito. Esses três subprincípios da proporcionalidade são bem sintetizados por Willis Santiago Guerra Filho: “Resumidamente, pode-se dizer que uma medida é ADEQUADA, se atinge o fim almejado, EXIGÍVEL, por causar o menor prejuízo possível e finalmente, PROPORCIONAL EM SENTIDO ESTRITO, se as vantagens que trará superarem as desvantagens." (GUERRA FILHO, Willis Santiago. Ensaios de Teoria Constitucional. Fortaleza: UFC, 1989, p. 75.)] 
Se há um meio utilizado para atingir um fim, mas este meio não é adequadopara este fim, significa que a medida é desproporcional.
Exemplo de aplicação nº 1: Uma lei na Alemanha exigiu que a pessoa tivesse habilidades em armas de fogo para realizar a falcoaria, que consiste em uma caça realizada com falcões, que não utiliza armas de fogo. A Suprema Corte alemã entendeu que esta lei não proporcional, pela perspectiva da adequação, em razão de que o meio consistente em obrigar as pessoas que realizavam a caça a ter habilidades com armas de fogo, não era adequada para o fim consistente em ordenar e organizar a caça na Alemanha. Logo, essa lei estava restringindo de forma injustificada o direito fundamental de quem queria praticar este tipo de caça.
Exemplo de aplicação nº 2:
RE 603.583/RS (voto Min. Luiz Fux): Com efeito, trata-se de medida adequada à finalidade a que se destina, qual seja, a aferição da qualificação técnica necessária ao exercício da advocacia em caráter preventivo, com vistas a evitar que a atuação do profissional inepto cause prejuízo à sociedade.
RE 414.426: Nem todos os ofícios ou profissões podem ser condicionadas ao cumprimento de condições legais para o seu exercício. A regra é a liberdade. Apenas quando houver potencial lesivo na atividade é que pode ser exigida inscrição em conselho de fiscalização profissional. A atividade de músico prescinde de controle. Constitui, ademais, manifestação artística protegida pela garantia da liberdade de expressão. (STF. Plenário. RE 414426/SC, Min. Rel. Ellen Gracie, j. 01/08/11).[footnoteRef:71] [71: (TRF2-2018): A respeito dos direitos fundamentais e garantias individuais é correto afirmar: Devido à livre escolha da profissão ou oficio são inconstitucionais as leis que, a despeito da desnecessidade de proteção a interesse público especifico, restrinjam o exercício de atividades como, por exemplo, a de músico. BL: Entend. Jurisprud.] 
##Atenção: ##STF: ##TJMS-2020: ##FCC: O art. 5º, XIII, parte final, da CF admite a limitação do exercício dos trabalhos, ofícios ou profissões, desde que materialmente compatível com os demais preceitos do texto constitucional, em especial o valor social do trabalho (arts. 1º, IV; 6º, caput e inciso XXXII; 170, caput e inciso VIII; 186, III, 191 e 193 da CF) e a liberdade de manifestação artística (art. 5º, IX, da CF). As limitações ao livre exercício das profissões serão legítimas apenas quando o inadequado exercício de determinada atividade possa vir a causar danos a terceiros e desde que obedeçam a critérios de adequação e razoabilidade, o que não ocorre em relação ao exercício da profissão de músico, ausente qualquer interesse público na sua restrição. A existência de um conselho profissional com competências para selecionar, disciplinar e fiscalizar o exercício da profissão de músico, para proceder a registros profissionais obrigatórios, para expedir carteiras profissionais obrigatórias e para exercer poder de polícia, aplicando penalidades pelo exercício ilegal da profissão, afronta as garantias da liberdade de profissão e de expressão artística. (STF. Plenário. ADPF 183, Min. Rel. Alexandre de Moraes, Tribunal Pleno, j. 27/9/19. (Info 960).[footnoteRef:72] [72: (TJMS-2020-FCC): À luz da jurisprudência do STF, em matéria de direitos e garantias fundamentais e aspectos correlatos, admitem-se limitações por lei ao livre exercício das profissões, sendo consideradas legítimas quando o inadequado exercício de determinada atividade possa vir a causar danos a terceiros e desde que obedeçam a critérios de adequação e razoabilidade. BL: art. 5º, XIII, CF e Entend. STF.] 
 O objetivo almejado pela lei é aferir a qualificação técnica necessária ao exercício da advocacia em caráter preventivo, evitando-se que as pessoas sejam patrocinadas por pessoas desqualificadas. O meio do exame de ordem é adequado a este objetivo.
##Obs.: Alguns autores colocam “objetivo legítimo” e “meio legítimo” como se fossem dois de cinco passos (e não três – adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito) do princípio da proporcionalidade:
i. Objetivo legítimo: Para a medida ser adequada, o objetivo almejado por ela deve ser legítimo. É necessário questionar: (a) Qual o objetivo perseguido com a interferência?; (b) Esse objetivo se identifica exatamente com a situação fática?; (c) Esse objetivo é juridicamente admissível?
Exemplo: Programa de incentivos fiscais para empresas se instalarem no sul do país é legítimo? Não, pois criar incentivos para aumentar o desenvolvimento para uma região do país que é uma das mais desenvolvidas só aumentaria as desigualdades regionais. Se fossem programar para o Norte e Nordeste (v.g. Sudam e Sudene) sem problema, mas nesse caso a região já é uma das mais desenvolvidas, não sendo o objetivo legítimo em face da CF/88. 
ii. Meio legítimo: Para o meio ser legítimo, o meio empregado deve ser precisamente designado e juridicamente avaliado.
Exemplo: Reduzir os custos de uma execução penal é um objetivo legítimo, mas se para isso adotarmos a pena de morte, certamente não há um meio legítimo em razão de que a CF proíbe a pena de morte, salvo em caso de guerra declarada.
b) Necessidade (ou exigibilidade, ou princípio da menor ingerência possível)
A necessidade significa que, havendo dois ou mais meios similarmente eficazes, deve-se optar pelo menos oneroso possível, para que não cause uma ingerência indevida no direito fundamental.
Se uma norma estabelece uma medida restritiva a um direito, para analisarmos se ela é proporcional ou não, devemos saber se existem outras medidas que possam ter a mesma eficácia que ela e sejam menos gravosas.
Exemplo de aplicação nº 1: Uma lei na Alemanha proibiu a venda de determinado alimento em flocos que era semelhante a um chocolate, cujo objetivo era evitar que os consumidores se confundissem na hora de comprar o produto adquirindo o doce achando que era chocolate quando na verdade não era. O Tribunal Alemão considerou que a lei era desproporcional e, por conseguinte, inconstitucional. O meio utilizado era adequado, pois, de fato, evitava que os consumidores se confundissem na hora de comprar o alimento, porém o meio não era necessário, pois existem outros meios similarmente eficazes, mas menos gravosos que esse, por exemplo colocar uma advertência na embalagem.
Exemplo de aplicação nº 2:
RE 603.583/RS (voto Min. Luiz Fux): (…) o Exame de Ordem também atende ao subprincípio da necessidade ou exigibilidade, traduzindo-se no meio menos gravoso de atingir o resultado pretendido. Afinal, cuida-se de exame realizado com periodicidade quadrimestral, de modo que o bacharel em direito dispõe de três oportunidades anuais para o prestar. O exame é objetivo, impessoal, padronizado (…)
Como uma pessoa pode tentar fazer o exame três vezes por ano, até passar, esse mecanismo já é o menos gravoso, passando pelo critério da necessidade.
c) Proporcionalidade em sentido estrito
A proporcionalidade em sentido estrito corresponde à ponderação, ou seja, o grau de satisfação do princípio constitucional fomentado deve ser suficientemente forte para justificar a restrição do princípio constitucional ofendido.
Se há uma lei que está restringindo determinado princípio para promover outro princípio, é necessário analisar se o grau de promoção ou de fomento do segundo princípio é suficientemente forte para justificar o grau de afetação do primeiro princípio. Se a medida não puder ser justificada pela promoção do segundo princípio em relação a restrição do primeiro princípio, significa que a lei não é proporcional.
##Obs.: “Lei material de sopesamento”: Robert Alexy afirma que “quanto maior for o grau de não-satisfação ou de afetação de um princípio, tanto maior terá que ser a importância da satisfação do outro”. É uma análise na qual se leva em consideração os princípios que são fomentados por uma medida e os que são restringidos por ela.
 Exemplo de aplicação:
RE 603.583/RS (voto Min. Luiz Fux): (…) Atendimento do subprincípio da proporcionalidade em sentido estrito, na medida em que os benefícios gerados superam as restrições impostas. De fato,uma limitação ao exercício de atividade profissional que será superável em qualquer tempo pelo indivíduo que lograr aprovação no Exame de Ordem é muito reduzida diante do evidente ganho da sociedade (…)
Desse modo, se analisarmos o custo versus o benefício do Exame de Ordem, a restrição do princípio da liberdade profissional é justificada em relação à promoção da proteção da sociedade.
##Obs.: Há duas situações distintas:
Em um caso concreto, analisa-se se uma lei é ou não proporcional. Nesse caso, este ato deve passar pelo crivo da proporcionalidade para vermos se ele é adequado, necessário ou proporcional em sentido estrito. Neste caso, a ponderação é apenas a etapa final. Porém, existem situações nas quais não há uma norma restritiva a um direito fundamental, mas sim a colisão entre dois direitos fundamentais (v.g. liberdade de informação e privacidade). Quando não há norma restritiva, não se analisa pela proporcionalidade, faz-se a ponderação diretamente, que seria a proporcionalidade em sentido estrito.
Em outras palavras, a ponderação (correspondente à proporcionalidade em sentido estrito diretamente) se faz quando há colisão de princípios ab initio. Porém, quando a colisão está em uma lei que promove um princípio em detrimento de outros devemos passar pelo crivo da proporcionalidade em seus três aspectos: necessidade, adequação e proporcionalidade em sentido estrito.
10.4. Princípio da Proibição de Proteção Deficiente (ou Insuficiente) 
O princípio da proporcionalidade geralmente é utilizado no sentido de proibição de excesso, o qual tem por finalidade evitar cargas coativas excessivas na esfera jurídica dos particulares. No sentido da proporcionalidade em relação à proibição do excesso, busca-se a “menor ingerência possível”, evitando que os Poderes Públicos adotem medidas excessivamente gravosas. Ela atua quando os Poderes Públicos vão além do desejável.
Todavia, há outra faceta do princípio da proporcionalidade, que no sentido inverso, trata-se da proibição de proteção insuficiente, a qual exige dos órgãos estatais o dever de tutelar de forma adequada e suficiente determinados direitos fundamentais consagrados na Constituição. Ela atua quando os Poderes Públicos vão aquém do desejável.[footnoteRef:73] [73: (MPGO-2019): Sobre o princípio da proporcionalidade no sistema constitucional brasileiro, assinale a alternativa correta: O princípio da proporcionalidade funciona como limite à proteção insuficiente pelo Estado de direitos e bens constitucionalmente protegidos.
##Atenção: O princípio da proporcionalidade se desdobra em duas vertentes, uma negativa (proibição do excesso) e outra positiva (proibição de proteção insuficiente). A proibição de proteção insuficiente aduz que nem a lei, nem a atuação do Estado podem apresentar insuficiência em relação à garantia dos direitos fundamentais, ou seja, cria-se um dever para o Estado, (diga-se para o legislador, juiz e demais aplicadores do direito) que não pode abrir mão dos mecanismos de tutela, a fim de assegurar a proteção de um direito fundamental. Já a proibição do excesso visa, na consecução de um fim, a utilização do meio estritamente adequado, evitando-se uma atuação estatal de forma excedente.
(DPEBA-2016-FCC): É considerado pela doutrina como (sub)princípio derivado do princípio da proporcionalidade: Proibição de proteção insuficiente.
(DPERN-2015-CESPE): Assinale a opção correta em relação aos direitos fundamentais e aos conflitos que podem ocorrer entre eles: A proibição do excesso e da proteção insuficiente são institutos jurídicos ligados ao princípio da proporcionalidade utilizados pelo STF como instrumentos jurídicos controladores da atividade legislativa.] 
Exemplo: O direito da inviolabilidade do direito à vida precisa ser protegido por outras normas, como, por exemplo, de uma lei criminalizando o homicídio. Em mesmo passo, se fosse imposta uma pena restritiva de direitos como preceito secundário do crime de homicídio, essa seria uma proteção insuficiente do direito à vida.
##Obs.: Toda vez que a CF/88 expressa um mandamento de criminalização, a proteção feita pelo legislador àquele bem jurídico deve ser adequada. Se a pena para o crime for muito pequena, ela será insuficiente. Vejamos o seguinte precedente do STF:
RE 778.889/PE: 1. A licença maternidade prevista no artigo 7º, XVIII, da Constituição abrange tanto a licença gestante quanto a licença adotante, ambas asseguradas pelo prazo mínimo de 120 dias. Interpretação sistemática da Constituição à luz da dignidade da pessoa humana, da igualdade entre filhos biológicos e adotados, da doutrina da proteção integral, do princípio da prioridade e do interesse superior do menor. 2. As crianças adotadas constituem grupo vulnerável e fragilizado. Demandam esforço adicional da família para sua adaptação, para a criação de laços de afeto e para a superação de traumas. Impossibilidade de se lhes conferir proteção inferior àquela dispensada aos filhos biológicos, que se encontram em condição menos gravosa. Violação do princípio da proporcionalidade como vedação à proteção deficiente. 3. Quanto mais velha a criança e quanto maior o tempo de internação compulsória em instituições, maior tende a ser a dificuldade de adaptação à família adotiva. Maior é, ainda, a dificuldade de viabilizar sua adoção, já que predomina no imaginário das famílias adotantes o desejo de reproduzir a paternidade biológica e adotar bebês. Impossibilidade de conferir proteção inferior às crianças mais velhas. Violação do princípio da proporcionalidade como vedação à proteção deficiente.
Analisando o julgado acima, o legislador, ao conceder prazos diferentes no caso de adoção de crianças com idade mais avançada, corresponderia uma violação à proteção deficiente, pois as crianças mais velhas também precisam se adaptar ao novo lar, possuindo, às vezes até mais dificuldades para isso.
##Atenção: ##DPEDF-2019: ##MPMG-2021: ##Resumo: Übermassverbot e Untermassverbot são termos da doutrina constitucional alemã, que também são utilizados para articular teses no direito penal — tanto de defesa quanto de acusação. São desdobramentos do princípio da proporcionalidade e significam proibição do excesso e proibição de proteção deficiente ou insuficiente respectivamente. Proibição do excesso (Übermassverbot) é a vedação da atividade legislativa que ao legislar acaba por ir além do necessário, em excesso, afetando direitos fundamentais como a liberdade de expressão, liberdade de locomoção, a honra, a dignidade, entre outros. Portanto, aqui o Estado não pode ir além do necessário. Proibição de proteção deficiente ou insuficiente (Untermassverbot) é o revés da proibição do excesso, quando o Estado não legisla acerca de um determinado direito fundamental desprotegendo-o. Tal proibição consiste em não se permitir uma deficiência na prestação legislativa, de modo a desproteger bens jurídicos fundamentais. Nessa medida, seria inconstitucional, por exemplo, por afronta à proporcionalidade, lei que pretendesse descriminalizar o aborto.
DIREITOS FUNDAMENTAIS EM ESPÉCIE 
DIREITOS E GARANTIAS INDIVIDUAIS
1. DESTINATÁRIOS DOS DIREITOS E GARANTIAS INDIVIDUAIS
Os direitos e garantias individuais estão sistematicamente consagrados no art. 5º da CF/88: “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes”.[footnoteRef:74] [74: (TJPA-2014-VUNESP): O texto constitucional, em seu art. 5.º, caput, prevê expressamente valores ou direitos fundamentais ao ditar literalmente que todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade. BL: art. 5º, caput, CF.
OBS: Apesar do caput do art. 5º enunciar direitos apenas a brasileiros e estrangeiros residentes no Brasil, a doutrina eo STF os estendem também para estrangeiros em trânsito e pessoas jurídicas (HC 94.016/2008).] 
O dispositivo acima dispõe expressamente que referidos direitos e garantias individuais são garantidos aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País (destinatários). Por conseguinte, o art. 5º da CF/88 assegura a eles a inviolabilidade de cinco direitos: (i) vida, (ii) liberdade, (iii) igualdade, (iv) segurança e (v) propriedade.
##Obs.: A “segurança” prevista no “caput” do art. 5º da CF/88 é a “segurança jurídica”. A segurança jurídica é concretizada em vários incisos deste dispositivo (v.g. princípio da legalidade, princípio do devido processo legal, princípio do juiz natural, princípio da não retroatividade). Por sua vez, a “segurança pública” é um direito social, consagrada no art. 6º da CF/88, junto com os demais direitos sociais.
1.1. Interpretação Literal (CF, art. 5º)
A partir de uma interpretação literal do art. 5º da CF/88, conclui-se que somente poderão invocar os direitos e garantias individuais os brasileiros (natos ou naturalizados, pessoas físicas ou jurídicas) e os estrangeiros residentes no País. 
##Obs.: Para José Afonso da Silva, os estrangeiros não residentes no País podem invocar apenas direitos previstos em tratados e convenções internacionais.
##Atenção: ##TJDFT-2016: ##CESPE: ##MPPR-2019: Portanto, percebe-se que o caput do art. 5°da CF/88 apenas referência, de modo expresso, dos brasileiros - natos ou naturalizados (art. 12, II, CF/88) - e dos estrangeiros residentes no país enquanto titulares dos direitos fundamentais. Entretanto, a doutrina mais atual e a STF têm realizado interpretação do dispositivo na qual o fator meramente circunstancial da nacionalidade não excepciona o respeito devido à dignidade de todos os homens, de forma que os estrangeiros não residentes no país (turista), assim como os apátridas, devam ser considerados destinatários dos direitos fundamentais. Nesses termos, de forma extensiva (interpretação extensiva) o próprio STF, em sua jurisprudência, já no início dos anos 90, reconheceu que os estrangeiros, mesmo que não residentes no país, a condição de destinatários – não de todos – mas de alguns dos direitos fundamentais consagrados pela Constituição de 1988. Nada impede que um habeas corpus, por exemplo, seja impetrado por estrangeiro de passagem (turista), que tenha sua liberdade de locomoção dentro do território nacional violada. Nesse sentido, vejamos:
STF: (...) O súdito estrangeiro, mesmo o não domiciliado no Brasil, tem plena legitimidade para impetrar o remédio constitucional do "habeas corpus", em ordem a tornar efetivo, nas hipóteses de persecução penal, o direito subjetivo, de que também é titular, à observância e ao integral respeito, por parte do Estado, das prerrogativas que compõem e dão significado à cláusula do devido processo legal. - A condição jurídica de não-nacional do Brasil e a circunstância de o réu estrangeiro não possuir domicílio em nosso país não legitimam a adoção, contra tal acusado, de qualquer tratamento arbitrário ou discriminatório. (...)” (STF, 2ª T., HC 94404, Rel. Min. Celso de Mello, j. 18/11/2008).
Gilmar Mendes explica que o gozo da titularidade de direitos fundamentais por parte dos brasileiros evidentemente prescinde da efetiva residência em território brasileiro, pois a titularidade sujeita-se exclusivamente ao vínculo jurídico da nacionalidade, ao passo que para os estrangeiros a titularidade dos direitos assegurados na CF somente é reconhecida se estiverem residindo no Brasil, embora com isto não se esteja a delimitar – ainda – quais sejam tais direitos. 
1.2. Interpretação Extensiva
A interpretação literal, todavia, não é a majoritária na doutrina e nem a adotada pela jurisprudência do STF. 
O entendimento majoritário, consistente na interpretação extensiva, admite que os estrangeiros não residentes no país também possam invocar os direitos do art. 5º[footnoteRef:75]. [75: Apesar do caput do art. 5º da CF/88 enunciar direitos apenas a brasileiros e estrangeiros residentes no Brasil, a doutrina e o STF os estendem também para estrangeiros em trânsito e pessoas jurídicas (HC 94.016/08).] 
A interpretação extensiva é fundamentada em duas normas previstas na Constituição:
a) Dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, CF)
A dignidade da pessoa humana, consagrada na Constituição como um dos fundamentos da República Federativa do Brasil, impõe três espécies de deveres: (i) de respeito; (ii) de proteção; e (iii) de promoção.
O dever de proteção impõe a adoção de interpretações que promovam a dignidade da pessoa humana pelo Poder Judiciário. Nesse sentido, a dignidade atua como diretriz hermenêutica: sendo a dignidade um atributo de todo ser humano (independentemente de qualquer condição) e estando os direitos individuais diretamente ligados a ela, não se pode excluir do âmbito de proteção desses direitos a determinados indivíduos, apenas pela razão de eles possuírem outra nacionalidade e não residirem no País.
Portanto, qualquer indivíduo que esteja no território brasileiro poderá invocar direitos e garantias individuais básicos, mesmo que não seja residente no País. Todo o ser humano possui dignidade, de forma que os direitos e garantias individuais possuem uma titularidade universal.
##Obs.1: Essa interpretação extensiva não é feita apenas no direito brasileiro. Por exemplo, na Espanha e em Portugal, em suas Constituições, possui um dispositivo muito semelhante e a jurisprudência desses países faz uma interpretação semelhante.
##Obs.2: Essa interpretação extensiva ora estudada refere-se aos direitos individuais. Não são todos os direitos fundamentais que podem ser invocados por estrangeiros, pois existem direitos sociais, de nacionalidade e direitos políticos não invocáveis por estrangeiros. Portanto, a interpretação extensiva refere-se, precipuamente, aos direitos e garantias individuais.
b) Primazia dos direitos humanos nas relações internacionais (art. 4º, II, CF)
Um segundo fundamento da interpretação extensiva é a primazia dos direitos humanos nas relações internacionais, que está consagrado no art. 4º, II da CF/88. Vejam um precedente do STF nesse sentido:
STF – HC 94.016/SP: O súdito estrangeiro, mesmo aquele sem domicílio no Brasil, tem direito a todas as prerrogativas básicas que lhe assegurem a preservação do status libertatis e a observância, pelo Poder Público, da cláusula constitucional do due process. [...] A condição jurídica de não nacional do Brasil e a circunstância de o réu estrangeiro não possuir domicílio em nosso país não legitimam a adoção, contra tal acusado, de qualquer tratamento arbitrário ou discriminatório.
1.3. Pessoas Jurídicas
Os direitos e garantias fundamentais, quando consagrados nas primeiras Constituições (francesa de 1791 e norte-americana de 1787), o foram para proteger o indivíduo contra o arbítrio do Estado (direitos liberais). Na época, havia um estado absolutista que foi derrubado pelas revoluções liberais, surgindo tais direitos, voltados precipuamente à proteção da liberdade do indivíduo (direitos de 1ª geração).
	##Atenção: ##MPPR-2019: ##Questiona-se: Uma pessoa jurídica, ainda que de direito público, especialmente considerando que tais direitos e garantias foram criados exatamente para proteger o indivíduo de tais entidades, pode invocar direitos individuais?
O entendimento atual (jurisprudência e doutrina majoritárias) é o de que qualquer pessoa jurídica, privada ou pública, poderá invocar certos direitos e garantias individuais. Obviamente, nem todos os direitos e garantias individuais são aplicáveis às pessoas jurídicas (v.g. liberdade de locomoção). Porém, quando for pertinente, tais direitos podem ser aplicados.
· Exemplos de direitos aplicáveis às pessoas jurídicas de direito privado: devido processo legal, juiz natural, ampla defesa e contraditório. 
· Exemplo de direitos aplicáveis às pessoas jurídicas de direito público, incluídos os entes federativos: poderão ser invocados, basicamente, as garantias processuais (v.g. ampla defesa, contraditório,devido processo legal, juiz natural, etc.).
Veja o entendimento do STF sobre o tema:
STF - AC 2.395 MC/PB: A imposição de restrições de ordem jurídica, pelo Estado, quer se concretize na esfera judicial, quer se realize no âmbito estritamente administrativo (como sucede com a inclusão de supostos devedores em cadastros públicos de inadimplentes), supõe, para legitimar-se constitucionalmente, o efetivo respeito, pelo Poder Público, da garantia indisponível do ‘due process of law’, assegurada, pela Constituição da República (art. 5º, LIV), à generalidade das pessoas, inclusive às próprias pessoas jurídicas de direito público, eis que o Estado, em tema de limitação ou supressão de direitos, não pode exercer a sua autoridade de maneira abusiva e arbitrária. Doutrina. Precedentes.
##Atenção: ##MPPR-2019: Segundo Gilmar Mendes, não há, em princípio, impedimento superável a que pessoas jurídicas venham, também, a ser consideradas titulares de direitos fundamentais, não obstante estes, originariamente, terem por referência a pessoa física. Acha-se superada a doutrina de que os direitos fundamentais se dirigem apenas às pessoas humanas.
2. DIREITOS INDIVIDUAIS
a) Direitos individuais em espécie
Iniciaremos agora o estudo dos direitos elencados no art. 5º da CF, quais sejam: i) Direito à vida; ii) Direito à igualdade; iii) Direito à privacidade; iv) Direitos de liberdade; v) Direito à propriedade. Os 78 incisos do art. 5º da CF densificam e concretizam os valores previstos no caput, além do direito à privacidade, que não está previsto no caput do art. 5º, mas também é tratado nos seus incisos.
##Obs.: A segurança jurídica, prevista no caput do art. 5º, está relacionada às garantias individuais, que serão estudadas em momento oportuno.
b) Parâmetros de estudo
Ao estudarmos a maioria dos direitos fundamentais, faremos uma análise sempre baseada em dois aspectos:
· Âmbito de proteção: é o bem jurídico protegido pelo direito fundamental.
· Restrições: são as intervenções legítimas, constitucionalmente fundamentadas, isto é, que encontram uma justificativa no texto constitucional.
##Obs.: A restrição ilegítima não é restrição, mas violação ao direito fundamental.
Exemplo de restrição: A CF/88 consagra a inviolabilidade do sigilo de correspondência, de dados, de comunicações telegráficas e de comunicações telefônicas. Porém, ressalva que, no caso das comunicações telefônicas, pode haver uma restrição se houver autorização judicial, na forma que a lei estabelecer, para fins de investigação criminal ou instrução processual penal.
Essa possibilidade de um juiz autorizar uma interceptação telefônica é uma intervenção constitucionalmente fundamentada no âmbito de proteção do direito à inviolabilidade das comunicações.
Quando a intervenção é legítima e passa pelo crivo da proporcionalidade, ela é chamada de restrição. Se a intervenção for ilegítima, ela não é restrição, mas sim uma violação ao direito fundamental.
2.1. Direito à Vida
2.1.1. Âmbito de proteção
a) Abrangência
O bem jurídico protegido pela Constituição é a vida humana, em seu sentido biológico. A CF/88 não protege no caput do art. 5º a vida dos animais e das plantas, nem a vida em sentido espiritual (após a morte).
b) Acepções
Este âmbito de proteção do direito à vida abrange duas acepções distintas:
· Negativa: É o direito de permanecer vivo. Isso impede que o Estado e outras pessoas atuem de forma a intervir no direito à vida. Exige-se, portanto, uma abstenção (conduta negativa). 
Ex.: o Estado não pode condenar alguém à pena de morte, salvo no caso de guerra declarada.
· Positiva: É o direito de exigir do Estado prestações materiais e jurídicas para proteger e promover o direito à vida. [footnoteRef:76] [76: (Agente de Segurança Penitenciária/PE-2017-CESPE): O direito individual fundamental à vida possui duplo aspecto: sob o prisma biológico, traduz o direito à integridade física e psíquica; em sentido mais amplo, significa o direito a condições materiais e espirituais mínimas necessárias a uma existência condigna à natureza humana.] 
Ex.1: exigir proteção à mulher ameaçada pelo companheiro (Lei Maria da Penha);
Ex.2: exigir proteção à testemunha; 
Ex.3: a jurisprudência do STF não admite a extradição quando o País requerente prevê a pena de morte para o crime, caso em que, para que a extradição seja autorizada, deve o Estado requerente fazer a comutação da pena: da pena de morte para a pena privativa de liberdade com duração máxima de trinta anos.
c) Dimensões (MPF 2013)
Além das acepções, existem dimensões, as quais todo direito fundamental possui.
##Atenção: Essas duas dimensões não são apenas do direito à vida. Elas estão presentes em todos os direitos fundamentais. Vejamos elas:
· Subjetiva: O direito fundamental é pensado sob o aspecto do indivíduo. Em outras palavras, a proteção conferida pelo direito fundamental é proporcionada à pessoa que o titulariza. Vejamos um exemplo trazido pela jurisprudência do STF:
Dimensão subjetiva: STF - ADI 3.510, Ayres Britto: o Magno Texto Federal não dispõe sobre o início da vida humana ou o preciso instante em que ela começa. Não faz de todo e qualquer estádio da vida humana um autonomizado bem jurídico, mas da vida que já é própria de uma concreta pessoa, porque nativiva (teoria ‘natalista’, em contraposição às teorias ‘concepcionista’ ou da ‘personalidade condicional’).
· Objetiva: O direito é protegido pela perspectiva da comunidade. Portanto, ainda que ninguém o titularize no caso concreto, o direito merece proteção por ser importante para a sociedade. Vejamos um exemplo trazido pela jurisprudência do STF:
Dimensão objetiva: STF - ADI 3.510, Lewandowski: Creio que o debate deve centrar-se no direito à vida entrevisto como um bem coletivo, pertencente à sociedade ou mesmo à humanidade como um todo, sobretudo tendo em conta os riscos potenciais que decorrem da manipulação do código genético humano.
##Obs.: A dimensão objetiva, desenvolvida no Direito Alemão, está relacionada à ideia de Constituição como “ordem objetiva de valores”. 
d) Distinção entre irrenunciabilidade e inviolabilidade
Outro aspecto relevante relacionado ao direito à vida é a distinção entre irrenunciabilidade e inviolabilidade:
· Irrenunciabilidade: protege o direito em face do próprio titular, ou seja, o titular não pode renunciar a ele por ser um direito fundamental. 
##Obs.: Lembre-se que alguns direitos fundamentais podem ser objeto de renúncia em relação ao seu exercício. Porém, no caso do direito à vida, a questão é um pouco diferente, porque não se pode abrir mão de forma parcial e temporária destes direitos.[footnoteRef:77] [77: (MPMG-2017): Quanto aos direitos fundamentais, assinale a alternativa correta: É admissível a renúncia ao exercício dos direitos fundamentais como corolário do livre desenvolvimento da personalidade.
##Atenção: É admissível a renúncia ao exercício de determinado direito, desde que pontual, que pode ser expressa (como no caso do Big Brother quanto á proteção do direito à imagem) ou tácita (a exemplo do não ajuizamento de reintegração de posse, renunciando ao exercício do direito de propriedade). O que é irrenunciável é a titularidade do direito, por exemplo, caso o sujeito renunciasse definitivamente ao seu direito à imagem ou ao seu direito de ter qualquer propriedade. Desse modo, os direitos fundamentais são irrenunciáveis, mas o seu exercício pode ser renunciado. Assim, não se pode dispor do próprio direito, pois que é inerente ao ser humano, mas pode não ser exercido.] 
Questão1: Eutanásia: Ainda que a pedido da pessoa que deseja morrer, aquele que atende ao pedido responde, segundo a jurisprudência dos Tribunais de Justiça brasileiros, por homicídio privilegiado. Portanto, mesmo que a pessoa queira abreviar sua própria vida, com o intuito de minimizar sofrimentos, um terceiro não poderá adotar esta conduta.
Questão2: Testemunhas de Jeová: Testemunhas de Jeová, com base em uma interpretação do texto bíblico, recusam-se a receber transfusão de sangue e seus derivados. Assim, quandohá tratamento alternativo, por óbvio, deve-se respeitar a vontade do paciente. 
A celeuma encontra-se na inexistência de alternativas quando a recusa à transfusão coloque em risco a vida do paciente. Nesse caso, o médico deverá respeitar a vontade do paciente ou agir conforme o Código de Ética Médica? Temos suas situações: (i) Se a pessoa é absolutamente capaz e está consciente no momento da transfusão, no entendimento de Marcelo Novelino, a vontade do paciente deve ser respeitada. (ii) Todavia, em se tratando de incapazes, os responsáveis não podem impedir a transfusão. Tais entendimentos, no entanto, são objeto de controvérsias.
Em um caso concreto, no qual os pais de uma criança pediram para que não fosse realizada a transfusão e o filho acabou morrendo, entendeu-se que os pais não poderiam ser responsabilizados, mas os médicos foram, pois contrariaram o Código de Ética Médica, o qual preceitua que a vontade do paciente deve ser respeitada apenas caso não o coloque em risco de vida.
· Inviolabilidade: protege o direito fundamental contra a intervenção por parte de terceiros. Portanto, o Estado e outros particulares não podem intervir no direito à vida, salvo se houver uma justificativa constitucionalmente adequada (intervenção legítima), pois embora o direito à vida seja um dos mais importantes em nossa sociedade, ele não é absoluto, de forma que existem circunstâncias em que outros direitos ou o direito à vida de terceiros podem ter um peso relativo maior.
2.1.2. Restrições
a) Pena de morte no caso de guerra declarada
A pena de morte no caso de guerra declarada trata-se da única restrição expressamente prevista no texto constitucional em relação à inviolabilidade do direito à vida. Vejamos:
CF, art. 5º: (…): XLVII – não haverá penas:
a) de morte, salvo em caso de guerra declarada, nos termos do art. 84, XIX (…).[footnoteRef:78] [78: (PCGO-2018-UEG): A Constituição admite como possível a pena de morte em caso de guerra declarada. BL: art. 5º, XLVII, “a”, CF.] 
A pena de morte é regulamentada pelo art. 56 do Código Penal Militar (DL n. 1.001/1969).
Art. 56 do CPM: A pena de morte é executada por fuzilamento.
##Obs.: Embora essa seja a única restrição ao direito à vida prevista na Constituição, podemos encontrar na legislação infraconstitucional e na jurisprudência do STF outras hipóteses de restrição consideradas legítimas, em razão de outros valores consagrados na CF/88. Vejamos abaixo.
b) Aborto	
Há hipóteses de aborto que não são punidas pelo Código Penal, por não o considerar como uma violação à vida sem razão constitucionalmente justificada.
b.1) Aborto necessário
CP, art. 128: Não se pune o aborto praticado por médico:
I - se não há outro meio de salvar a vida da gestante; (...).
O art. 128, I, do CP, trata do aborto terapêutico ou necessário. Nesse caso, há um conflito entre dois direitos à vida: (i) o da gestante; (ii) e o do feto. Nesse passo, o Estado não pode impor à gestante que coloque em risco sua própria vida para salvar a vida do feto.
A rigor, o dispositivo não consubstancia uma excludente de punibilidade conforme dispõe o Código Penal, mas de antijuridicidade (estado de necessidade). O CP, art. 128, I não gera maiores polêmicas. 
b.2) Aborto sentimental
O dispositivo disciplina o aborto sentimental (gravidez resultante de estupro). Há grande controvérsia em torno do contido neste inciso II:
CP, art. 128: Não se pune o aborto praticado por médico: (...)
II - se a gravidez resulta de estupro e o aborto é precedido de consentimento da gestante ou, quando incapaz, de seu representante legal.
Nessa hipótese, há um conflito entre: (i) o direito à vida do feto; e (ii) a liberdade sexual da mãe e a sua dignidade. 
Prevalece que a ressalva expressa no Código Penal (não punibilidade do aborto) é justificada por outros valores constitucionais (liberdade sexual da mãe e dignidade). O Estado não pode impor à mulher a geração de uma criança fruto de um ato violento (há autores que entendem que a dignidade do feto é absoluta e que, portanto, tal dispositivo não teria sido recepcionado pela CRFB/88).
##Obs.: Há doutrina minoritária no sentido de que esta hipótese de aborto não foi recepcionada pela CF/88.
b.3) Aborto no primeiro trimestre (##Atenção: Caiu na prova do TJMS-2020)
Por fim, há um recente julgado da 1ª Turma do STF segundo o qual o tratamento do aborto previsto no Código Penal deve ser interpretado conforme a Constituição, no sentido de que tal ato não pode ser punido quando ocorrer no primeiro trimestre de gestação. Nesse caso, outros direitos fundamentais da mulher justificariam a opção pela não manutenção da gravidez[footnoteRef:79]. Veja o julgado: [79: (Advogado/BANPARÁ-2017): Acerca do aborto, o STF, em recente julgado de sua 1ª Turma, afirmou ser necessário conferir interpretação conforme a Constituição aos arts. 124 a 126 do Código Penal (que tipificam o crime de aborto) para excluir do seu âmbito de incidência a interrupção voluntária da gestação efetivada no primeiro trimestre do período gestacional. BL: Info 849, STF.] 
1º turma do STF – HC 124.306/RJ: [...] 3. Em segundo lugar, é preciso conferir interpretação conforme a Constituição aos próprios arts. 124 a 126 do Código Penal – que tipificam o crime de aborto – para excluir do seu âmbito de incidência a interrupção voluntária da gestação efetivada no primeiro trimestre. A criminalização, nessa hipótese, viola diversos direitos fundamentais da mulher, bem como o princípio da proporcionalidade [...] 7. Anote-se, por derradeiro, que praticamente nenhum país democrático e desenvolvido do mundo trata a interrupção da gestação durante o primeiro trimestre como crime, aí incluídos Estados Unidos, Alemanha, Reino Unido, Canadá, França, Itália, Espanha, Portugal, Holanda e Austrália.
c) Aborto de gravidez de feto com anencefalia
O STF entende que a antecipação do parto, na hipótese de anencefalia, não pode ser tipificada como crime de aborto. A rigor, como a morte do nascituro é um evento certo, apenas tratar-se-ia de uma antecipação terapêutica do parto. Vejamos:
ADPF 54/DF: O Brasil é uma república laica, surgindo absolutamente neutro quanto às religiões. Considerações. [...] Mostra-se inconstitucional interpretação de a interrupção da gravidez de feto anencéfalo ser conduta tipificada nos artigos 124, 126 e 128, incisos I e II, do Código Penal.[footnoteRef:80] [80: (Anal. Previdênc./RO-2017-IBADE): Acerca da decisão do STF sobre a interrupção da gravidez de feto anencefálico, assinale a alternativa correta: Tencionava-se fosse dada a dispositivos do Código Penal uma interpretação conforme a Constituição e o instrumento escolhido para sua propositura foi a arguição de descumprimento de preceito fundamental.
##Atenção: ADPF 54: A Confederação Nacional dos Trabalhadores da Saúde do Brasil ingressou com uma ação de arguição de descumprimento de preceito fundamental no STF (ADPF 54) pedindo que a Corte Constitucional conferisse ao Código Penal uma interpretação conforme a Constituição e declarasse que o aborto de fetos anencéfalos não é crime. (...)
(PGEPA-2011): Na ADPF 54 - “caso da anencefalia” - o rel. Min. Marco Aurélio concedeu, em 2/08/04, a liminar requerida para, além de determinar o sobrestamento dos processos e decisões não transitadas em julgado, reconhecer o direito constitucional da gestante de submeter-se à operação de antecipação terapêutica do parto de fetos anencéfalos; mas o Tribunal, em sessão de 20/10/04, negou referendo à liminar concedida.] 
d) Pesquisa com células-tronco embrionárias (##Atenção: Caiu na prova do TJMS-2020)
A pesquisa com células-tronco embrionárias não viola a CF/88, pois embora o direito à vida do embrião, segundo alguns Ministros deva ser preservado, existem outros direitos na constituição (v.g. saúde e vida das pessoas que podem ser salvas com este tipo de pesquisa) que justificam a medida. Ademais, justificou o STF que, no caso concreto, não há nenhuma viabilidade dos embriões virem a transformar-se em pessoa humana, já que seriam eles descartados. Vejamos:
ADI3.510/DF: A Lei de Biossegurança não veicula autorização para extirpar do corpo feminino esse ou aquele embrião. Eliminar ou desentranhar esse ou aquele zigoto a caminho do endométrio, ou nele já fixado. Não se cuida de interromper gravidez humana, pois dela aqui não se pode cogitar. A ‘controvérsia constitucional em exame não guarda qualquer vinculação com o problema do aborto.’ (Ministro Celso de Mello). (g.n.).
##Obs.: Algumas questões inerentes ao direito à vida ainda não foram discutidas pelo STF, como a do “Lei de tiro de destruição” (autorização para o abate de aeronaves, com suspeita de tráfico de drogas, que se recusam a obedecer à ordem de pouso).
Muitos entendem que essa norma é inconstitucional, consubstanciando-se em espécie de pena de morte. 
Outra corrente entende pela constitucionalidade, pois embora a vida das pessoas na aeronave seja colocada em risco, existem outros valores a serem tutelados aptos a justificar essa restrição. Ademais, apenas é abatida a aeronave que se recusa a obedecer aos comandos da FAB.
Na Alemanha aconteceu um caso semelhante, mas com circunstâncias diferentes: lá foi feita uma lei após 11 de setembro, determinando que as aeronaves que não obedecessem determinado comando quando houvesse suspeita de sequestro por terroristas, pudessem ser abatidas. Nesse caso, o TFA julgou a lei inconstitucional, pois não se poderia utilizar um cálculo utilitarista no sentido de que “é melhor que morram essas pessoas do avião do que se coloque em risco um número maior de vidas”. 
Atente-se que o caso da lei brasileira é diferente, pois as aeronaves que potencialmente receberão o “tiro de destruição” não são tripuladas por passageiros comerciais.
2.2. Direito à Igualdade
Há inúmeras nomenclaturas empregadas para fazer referência ao princípio da igualdade. Além disso, o uso dessas expressões não é consensual.
##Obs.: São muito comuns as seguintes distinções, terminologicamente falando:
· Igualdade perante a lei e igualdade na lei;
· Igualdade formal e igualdade material;
· Igualdade jurídica (ou de direito) e igualdade fática (ou de fato).
Elas serão estudadas no curso deste tópico.
2.2.1. Evolução histórica
a) Antigo Regime
No Antigo Regime, os direitos e deveres dos indivíduos eram decorrentes dos grupos sociais aos quais eles pertenciam. Dito de outro modo, as pessoas não possuíam direitos e deveres em razão de sua natureza humana, mas em razão dos grupos dos quais faziam parte.
b) Revoluções liberais
Com as Revoluções liberais (francesa e norte-americana) a visão do Antigo Regime foi superada. O princípio da igualdade foi consagrado nas Constituições, extirpando os privilégios de origem estamental e afirmando a igualdade de todos perante a lei. Tratava-se de uma igualdade formal: tratamento isonômico conferido a todos pelo ordenamento jurídico.
Portanto, a partir do final do século XVIII, o direito à igualdade começa a ser tratado pelas Constituições. Nesse contexto dos primeiros textos constitucionais, a igualdade é meramente formal, no sentido de que o ordenamento jurídico deve tratar a todos indistintamente. 
Todavia, a igualdade formal pode despontar em injustiças, pois embora a máxima aristotélica (“justiça é tratar os iguais de forma igual e os desiguais de forma desigual, na proporção de sua desigualdade”) já fosse utilizada como parâmetro para a igualdade, não havia uma preocupação com o conteúdo justo ou injusto do tratamento. 
Ex.: O tratamento distinto conferido aos senhores e aos escravos era admitido e normal, pois eram pessoas que estavam em situações diferentes e, portanto, deveriam ser tratadas de maneira diferente.
Em suma, a igualdade formal foi um avanço, mas insuficiente para reduzir injustiças e exterminar as desigualdades fáticas que continuavam existindo.
c) Estado social
Com a Revolução Industrial (início do sec. XX), inicia-se uma nova visão a respeito da igualdade. Com o advento do Estado Social, as diferenciações arbitrárias e injustas passaram a ser consideradas incompatíveis com o direito à igualdade. Em outras palavras, a preocupação não se limitava a tratar todas as pessoas da mesma forma, mas também era no sentido de impedir que diferenciações arbitrárias e injustas (v.g. senhores e escravos) continuassem sendo empregadas.
Portanto, desperta-se uma preocupação com o conteúdo da igualdade (matéria). A igualdade material desponta em dois sentidos:
i. Preocupação com o conteúdo justo conferido pela lei (evitar diferenciações arbitrárias e injustas).
ii. Redução das desigualdades existentes.
Os sentidos da concepção material podem ser identificados como:
i. Princípio da igualdade jurídica: Impõe o dever de tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais, na medida de sua desigualdade. Todavia, o tratamento igual para os iguais e o tratamento desigual para os desiguais deve ser justo (não pode ser arbitrário ou discriminatório).
Exemplo de igualdade jurídica: Lei prevendo alíquotas diferenciadas para o pagamento do imposto de renda. Esta diferenciação está relacionada à igualdade jurídica, pois se preocupa com o conteúdo justo da norma. Seria injusto tributar, da mesma maneira, uma pessoa extremamente rica e uma pessoa que recebe um salário-mínimo. Não é uma igualdade fática, pois o objetivo da diferença de alíquota não é reduzir as desigualdades fáticas existentes (o pobre não vai ficar rico pagando menos IR).
ii. Princípio da igualdade fática: Impõe aos Poderes Públicos o dever de adotar medidas concretas para a redução ou compensação de desigualdades existentes no plano dos fatos. Na verdade, a igualdade fática exige um tratamento jurídico desigual. É necessário que se trate pessoas diferentes de formas diferentes para reduzir as desigualdades existentes entre elas.
Exemplo de igualdade fática: Sistema de cotas: o Estado, ao criar um sistema de cotas para pessoas carentes, deseja reduzir a distância entre pessoas que estudaram em boas escolas e pessoas que estudaram em escolas públicas de má qualidade. Adota-se uma medida diante da concorrência desigual.
##Obs.: Robert Alexy cita o “paradoxo da igualdade”. Trata-se de uma colisão entre a igualdade fática e a igualdade jurídica. Conforme o autor “quem quer promover a igualdade fática tem que estar disposto a aceitar a desigualdade jurídica”. Em outras palavras, só é possível reduzir desigualdades existentes no plano fático se for conferido um tratamento juridicamente diferenciado. Ao tratar todos da mesma forma no sentido jurídico, as desigualdades não serão reduzidas no plano fático.
##Atenção: A CF/1988 consagra a igualdade jurídica, a igualdade fática ou ambas as hipóteses? Há dois dispositivos na CF/88 que revelam que tanto igualdade jurídica como a igualdade fática foram consagradas no nosso ordenamento:
· Princípio da igualdade jurídica: CF, art. 5º, “caput”: “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes”.
· Princípio da igualdade fática: CF, art. 3º: “Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: (...) reduzir as desigualdades sociais e regionais”.
Em suma, a Constituição consagra a igualdade formal (CF, art. 5º, caput) ao mesmo tempo em que impõe a busca por uma igualdade material, conforme se depreende de vários dispositivos, como os que consagram direitos sociais (CF, art. 6º e ss.) e o que aponta a 'redução das desigualdades' sociais e regionais como um dos objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil (CF, art. 3º, III).
##Atenção: ##Doutrina: ##TRF4-2010: ##Cartórios/TJSP-2012: ##VUNESP: ##Conteúdo Jurídico do Princípio da Igualdade: ##Critérios para Identificação do desrespeito à Isonomia: Celso Antônio Bandeira de Mello aponta os critérios para identificação do desrespeito à isonomia. Para o autor, o reconhecimento das diferenciações, que não podem ser feitas sem quebra da isonomia, são os seguintes: i) O elemento tomadocomo fator de desigualação (critério de distinção); b) A correlação lógica abstrata existente entre o fator erigido e a disparidade estabelecida no tratamento jurídico diversificado (entre o fator de desigualação e a desigualação consequente); iii) A consonância desta correlação lógica com os interesses absorvidos no sistema constitucional. Em resumo, o doutrinador explica que, tem-se que investigar, de um lado, aquilo que é adotado como critério discriminatório, ou seja, o próprio elemento tomado como fator de desequiparação; de outro, cumpre verificar se há justificativa racional, isto é, fundamento lógico, para, à vista do traço desigualador acolhido, atribuir o específico tratamento jurídico construído em função da desigualdade proclamada. Finalmente, impende analisar se a correlação ou fundamento racional abstratamente existente é, in concreto, afinado com os valores prestigiados no sistema normativo constitucional. A dizer: se guarda ou não harmonia com eles.[footnoteRef:81] Humberto Ávila ensina que a igualdade deve funcionar como regra, prevendo a proibição de tratamento discriminatório; como princípio, instituindo um estado igualitário com fim a ser promovido; e como postulado, estruturando a aplicação do Direito em função de elementos (critério de diferenciação e finalidade de distinção) e da relação entre eles (congruência do critério em razão do fim).[footnoteRef:82]-[footnoteRef:83] [81: MELLO, Celso Antônio Bandeira de. O conteúdo jurídico do princípio da igualdade. 3. ed. 20ª tiragem. São Paulo: Malheiros, 2011, pp. 21-22.] [82: ÁVILA, Humberto. Teoria dos princípios: da definição à aplicação dos princípios jurídicos. 12. ed. São Paulo: Malheiros, 2004, p. 162.] [83: (TRF4-2010): Quanto à igualdade, assinale a alternativa correta: Segundo autorizada doutrina (Celso Antonio Bandeira de Mello, Humberto Ávila, etc.), o elemento-chave para a verificação da igualdade é o critério de distinção (“medida de comparação”) analisado à luz da finalidade.] 
##Atenção: ##Doutrina: ##MPF-2011/2012: ##MPT-2017: ##MPBA-2018: ##Teoria do Impacto Desproprocional: Segundo o ministro aposentado Joaquim Barbosa, a teoria do impacto desproporcional consiste em: “Toda e qualquer prática empresarial, política governamental ou semigovernamental, de cunho legislativo ou administrativo, ainda que não provida de intenção discriminatória no momento de sua concepção, deve ser condenada por violação do princípio constitucional da igualdade material se, em consequência de sua aplicação, resultarem efeitos nocivos de incidência especialmente desproporcional sobre certas categorias de pessoas” (Ação afirmativa e princípio constitucional da igualdade, Renovar, 2001, p. 24).[footnoteRef:84] [84: (MPBA-2018): Assinale a alternativa correta: É possível conceber a Teoria do Impacto Desproporcional como aquela que permite que se constatem violações ao princípio da igualdade quando os efeitos práticos de determinadas normas, aparentemente neutras, causem dano excessivo, ainda que não intencional, aos integrantes de determinados grupos vulneráveis.
(MPT-2017): Assinale a alternativa correta: À luz da teoria do impacto desproporcional, há ofensa ao princípio da igualdade, ainda que não haja intenção de discriminar, se houver real impacto, de modo desproporcional, de medidas teoricamente neutras, colocando determinados grupos em situação desvantajosa em relação a outros segmentos.
(MPF-2012): Assinale a alternativa correta: Viola o princípio da igualdade material qualquer prática empresarial, governamental ou semigovernamental, de natureza administrativa ou legislativa que, embora concebida de forma neutra, gere, em consequência de sua aplicação, efeitos desproporcionais sobre certas categorias de pessoas.
##Atenção: Consoante doutrina de Orlando Gomes: [...] a teoria do impacto desproporcional pode ser singelamente resumida na seguinte formulação: toda e qualquer prática empresarial, política governamental ou semi-governamental, de cunho legislativo ou administrativo, ainda que não provida de intenção discriminatória no momento de sua concepção, deve ser condenada por violação do princípio constitucional da igualdade material, se em consequência de sua aplicação resultarem efeitos nocivos de incidência especialmente sobre certas categorias de pessoas. (GOMES, 2001, p. 23-24).
(MPF-2011): A teoria do impacto desproporcional, adotada no Brasil, permite que se constatem violações ao princípio da igualdade quando os efeitos práticos de determinadas normas, de caráter aparentemente neutro, causem um dano excessivo, ainda que não intencional, aos integrantes de determinados grupos vulneráveis.] 
2.2.2. Âmbito de proteção e intervenção
a) Âmbito de proteção
Como dito anteriormente, o estudo dos direitos fundamentais, em regra, deve ser feito através da análise do âmbito de proteção e da intervenção neste direito. Todavia, a igualdade possui uma peculiaridade: não possui um âmbito de proteção material preestabelecido como os outros direitos fundamentais.
A igualdade é um conceito relacional, ou seja, a análise envolvendo supostas violações pressupõe uma comparação entre indivíduos, grupos, coisas ou situações atingidas pela norma. Assim, é necessário comparar a diferença de tratamento para verificar se é compatível ou não com a Constituição. 
Portanto, o importante não é analisar se o critério é baseado no gênero, na cor, etc., per si, mas sim se esse critério adotado é razoável ou arbitrário no caso concreto.
Exemplo: A diferença de tratamento entre homens e mulheres não é necessariamente incompatível com o princípio da isonomia. A própria Constituição possui dispositivos nos quais as mulheres recebem tratamento diferenciado (v.g. idade mínima de aposentadoria e tempo de contribuição e medidas protetivas – Lei Maria da Penha).[footnoteRef:85] [85: (PGM.-Curitiba/PR-2019-UFPR): A Constituição da República de 1988 ficou conhecida como a “Constituição cidadã”, sendo amplamente elogiada no mundo todo pela sua forte proteção aos direitos fundamentais. Esse alto nível da dogmática jurídica brasileira observável no processo constituinte é uma decorrência da superação da mentalidade vivenciada durante a ditadura militar oriunda do Golpe de 1964, notadamente em relação à posição social da mulher. Sobre o assunto, assinale a alternativa correta: O fato de a Constituição estabelecer a igualdade entre gêneros não implica a impossibilidade da adoção de políticas públicas diferenciadoras fundadas na proteção às vulnerabilidades, que podem ser levadas a efeito pelo Legislativo, pelo Executivo ou, mediante condições específicas, até mesmo pelo Judiciário.] 
b) Intervenção
A intervenção ocorre quando há tratamento igual a situações essencialmente desiguais ou desigual a situações essencialmente iguais:
· Restrição (intervenção legítima): Se houver justificação constitucionalmente adequada para que o tratamento seja igual, mesmo sendo a situação essencialmente desigual, haverá intervenção legítima.
· Violação (intervenção ilegítima): Caso o critério adotado seja arbitrário, preconceituoso ou discriminatório a intervenção será ilegítima, ou seja, haverá uma violação do direito à igualdade. Nesse sentido, a igualdade costuma ser tratada como proibição de arbítrio.
Exemplo: O STF exige a presença de três requisitos para que sejam estabelecidos critérios de restrição à admissão em concurso públicos:
i. Previsão em lei; 
RE n. 307.112: Concurso público para policial militar. Limitação de idade. Edital que fixa idade limite para o ingresso na corporação, o que a Lei ordinária (L. 7.289/84), não restringiu. Jurisprudência assentada.
ii. Razoabilidade da exigência decorrente das atribuições a serem exercidas;
Súmula 683/STF: O limite de idade para a inscrição em concurso público só se legitima em face do art. 7.º, XXX, da Constituição, quando possa ser justificado pela natureza das atribuições do cargo a ser preenchido.[footnoteRef:86] [86: (TJMG-2012-VUNESP): De acordo com o STF, não ofende o princípio da igualdade a limitação de idadepara a inscrição em concurso público, desde que se leve em conta a natureza das atribuições do cargo a ser preenchido.] 
iii. Observância de um grau mínimo de objetividade e publicidade do critério e sua justificação; 
STF - RE 417.019 AgR: Concurso público: além da necessidade de lei formal prevendo-o como requisito para o ingresso no serviço público, o exame psicotécnico depende de um grau mínimo de objetividade e de publicidade dos atos em que se desdobra: precedentes.
2.2.3. Destinatários do dever de igualdade
Como diferença ligada diretamente aos destinatários do dever de igualdade (aqueles que têm o dever de respeitar o direito), há uma distinção entre “igualdade perante a lei” e “igualdade na lei”:
· “Igualdade perante a lei”: é um termo utilizado desde as constituições liberais clássicas, no sentido de que a igualdade deve ser observada no momento de aplicação da lei (pelo Poder Executivo e Poder Judiciário). 
Tal entendimento surgiu porque antes do fim da 2ª Guerra Mundial, as Constituições não eram compreendidas como documentos eminentemente jurídicos, mas sim políticos, sobretudo as declarações de direitos. Essas declarações de direitos fundamentais sequer vinculavam o Poder Legislativo (o legislador era visto como um concretizador dos direitos fundamentais), pois o legislador era visto como um amigo dos direitos fundamentais e não inimigo.
· “Igualdade na lei”: Posteriormente, observou-se que muitas vezes as maiores violações ao princípio da igualdade e a outros direitos fundamentais advinham do próprio Parlamento. Viu-se que o legislador não era tão amigo assim dos direitos fundamentais. 
A partir desse contexto, houve também uma mudança de paradigma em relação às Constituições, com o pleno reconhecimento de sua força normativa, sendo inadmissíveis dispositivos sem caráter vinculante (v.g. conselhos e exortações morais), inclusive para o legislador. 
Por conseguinte, fora empregada uma nova expressão para designar o princípio da igualdade. A “igualdade na lei” deve ser observada tanto na aplicação quanto na elaboração da lei. Tem como destinatários todos os poderes públicos (Executivo, Judiciário e Legislativo). [footnoteRef:87] [87: (MPM-2013): Assinale a alternativa correta: O princípio da isonomia refere-se à igualdade na lei (entendida como a exigência destinada ao legislador, que, no processo de formação do ato legislativo, nele não poderá incluir fatores de discriminação responsáveis pela ruptura da ordem isonômica) e também à igualdade perante a lei (esta pressupõe lei já elaborada e traduz imposição destinada aos demais poderes estatais, que, na aplicação da norma legal, não poderão subordiná-la a critérios que ensejem tratamento seletivo ou discriminatório).] 
##Obs.: Embora a Constituição utilize a expressão “todos são iguais perante a lei”, a jurisprudência do STF e a doutrina possuem entendimento consolidado no sentido de que os destinatários do dever de igualdade não são apenas o Executivo e o Judiciário, mas todos os Poderes Públicos. Nesse sentido, vejamos o seguinte precedente:
STF - AI 360.461 AgR/MG: O princípio da isonomia – que vincula, no plano institucional, todas as instâncias de poder – tem por função precípua, consideradas as razões de ordem jurídica, social, ética e política que lhe são inerentes, a de obstar discriminações e extinguir privilégios (RDA 55/114), devendo ser examinado sob a dupla perspectiva da igualdade na lei e da igualdade perante a lei (RTJ 136/444.455).
2.2.4. Ações afirmativas (discriminações positivas)
##Obs.: As ações afirmativas não se confundem com o sistema de cotas, o qual é apenas uma das espécies de ações afirmativas dentre outras existentes.
Definição: As ações afirmativas consistem em políticas públicas ou programas privados desenvolvidos, em regra, com caráter temporário, visando à redução de desigualdades decorrentes de discriminações (v.g. raça, etnia)[footnoteRef:88] ou de hipossuficiência econômica (v.g. classe social) ou física (v.g. deficiência)[footnoteRef:89], por meio da concessão de algum tipo de vantagem compensatória de tais condições.[footnoteRef:90] Entende-se por ações afirmativas o conjunto de medidas especiais voltadas a grupos discriminados e vitimados pela exclusão social ocorridos no passado ou no presente. O objetivo das ações afirmativas é eliminar as desigualdades e segregações, de forma que não se mantenham grupos elitizados e grupos marginalizados na sociedade, ou seja, busca-se uma composição diversificada onde não haja o predomínio de raças, etnias, religiões, gênero, etc.[footnoteRef:91] [88: (Anal. Minist./MPCE-2020-CESPE): Os direitos fundamentais são prerrogativas próprias dos cidadãos em função de sua especial condição de pessoa humana, e as garantias fundamentais são os instrumentos e mecanismos necessários para a proteção, a salvaguarda ou o exercício desses direitos. Com relação a esse assunto, julgue o item que se segue: Ações afirmativas, como a reserva de vagas para negros em concursos públicos, são uma forma de garantia dos direitos fundamentais e visam minimizar ou eliminar uma situação histórica de desigualdade ou discriminação.] [89: (MPAM-2015-FMP): Considere as seguintes alternativas em relação às ações afirmativas: A reserva de vagas nos concursos públicos para pessoas com deficiência, conforme prevê a Constituição da República Brasileira, é um exemplo típico de ação afirmativa.] [90: (DPEPE-2018-CESPE): As medidas de discriminação reversa que, com o objetivo de proteger grupos historicamente discriminados ou vulneráveis, promovem políticas compensatórias focais são denominadas ações afirmativas.] [91: (TRF4-2010): Quanto à igualdade, assinale a alternativa correta: Admitem-se “ações afirmativas” sem ofensa à igualdade, mas é difícil delimitar os legítimos contornos dessas políticas.] 
##Obs.1: Programas privados também podem utilizar ações afirmativas. Exemplos: Faculdade particular cria um sistema de bolsas para pessoas de uma comunidade carente; empresa privada reserva percentual de vagas para pessoas com deficiência.
##Obs.2: Caráter temporário: As ações afirmativas não objetivam a solução definitiva do problema, pois não o corrigem em sua raiz, apenas reduzem momentaneamente as consequências. Assim, é necessário que os Poderes Públicos atuem concomitantemente às ações afirmativas sobre os problemas de base, visando corrigir e impedir a perpetuação dos problemas em questão. Há, todavia, ações afirmativas que não visam a redução de desigualdades e, portanto, não são temporárias (v.g. proteção e respeito à cultura indígena). 
Tem uma frase interessante de Boaventura de Souza Santos: “Temos o direito de ser iguais quando a diferença nos inferioriza. Temos o direito de ser diferentes quando a igualdade nos descaracteriza.”
##Obs.3: As ações afirmativas estão relacionadas à igualdade fática, pois seu objetivo é reduzir desigualdades existentes.
Exemplos de ações afirmativas: sistema de cotas (“reserva de vagas”); bolsas de estudo; reforço escolar; programas especiais de treinamento; cursinhos pré-vestibulares para pessoas carentes; linhas especiais de crédito; estímulos fiscais diversos; etc.
Acerca do tema, o STF decidiu pela constitucionalidade de cotas baseadas em critérios étnico-raciais e socioeconômicos:
ADPF 186 (Cotas – UNB): I – Não contraria - ao contrário, prestigia – o princípio da igualdade material [Obs.: Perceba que o que foi visto em aula como igualdade fática, é chamado pelo STF de igualdade material], previsto no caput do art. 5º da Carta da República, a possibilidade de o Estado lançar mão seja de políticas de cunho universalista, que abrangem um número indeterminados de indivíduos, mediante ações de natureza estrutural, seja de ações afirmativas, que atingem grupos sociais determinados, de maneira pontual, atribuindo a estes certas vantagens, por um tempo limitado [Obs.: Caráter temporário], de modo a permitir-lhes a superação de desigualdades decorrentes de situações históricas. 
II – O modelo constitucional brasileiro incorporou diversosmecanismos institucionais para corrigir as distorções resultantes de uma aplicação puramente formal do princípio da igualdade. 
III – Esta Corte, em diversos precedentes, assentou a constitucionalidade das políticas de ação afirmativa [...]. 
IV – Medidas que buscam reverter, no âmbito universitário, o quadro histórico de desigualdade que caracteriza as relações étnico-raciais e sociais em nosso País, não podem ser examinadas apenas sob a ótica de sua compatibilidade com determinados preceitos constitucionais, isoladamente considerados, ou a partir da eventual vantagem de certos critérios sobre outros, devendo, ao revés, ser analisadas à luz do arcabouço principiológico sobre o qual se assenta o próprio Estado brasileiro. 
V - Metodologia de seleção diferenciada pode perfeitamente levar em consideração critérios étnico-raciais ou socioeconômicos, de modo a assegurar que a comunidade acadêmica e a própria sociedade sejam beneficiadas pelo pluralismo de ideias, de resto, um dos fundamentos do Estado brasileiro, conforme dispõe o art. 1º, V, da Constituição. [...]. 
VII – No entanto, as políticas de ação afirmativa fundadas na discriminação reversa apenas são legítimas se a sua manutenção estiver condicionada à persistência, no tempo, do quadro de exclusão social que lhes deu origem. Caso contrário, tais políticas poderiam converter-se benesses permanentes, instituídas em prol de determinado grupo social, mas em detrimento da coletividade como um todo, situação [...] incompatível com o espírito de qualquer Constituição que se pretenda democrática, devendo, outrossim, respeitar a proporcionalidade entre os meios empregados e os fins perseguidos.[footnoteRef:92] [92: (TJSP-2015-VUNESP): Ao analisar decisões do Supremo Tribunal Federal na aplicação do princípio da igualdade, por exemplo na ADPF 186/DF (sistema de cotas para ingresso nas universidades públicas), é correto afirmar que as discriminações positivas correspondem a maior efetividade ao princípio da igualdade.] 
##Atenção: ##Parêntese: ##MPF-2017: ##Tema de Direito Constitucional e Direitos Humanos: No que consiste a denominação “discriminação sistêmica” ou “discriminação estrutural”? André de Carvalho Ramos, em seu Curso de Direito Humanos, explica que, “consiste na sujeição de grupos historicamente vulneráveis a práticas constantes de negação de direitos ou tratamento discriminatório inferiorizante. Os parâmetros para a constatação da discriminação estrutural ou sistêmica podem ser assim resumidos: (i) identificação de grupo vulnerável afetado, por motivo de raça, nacionalidade, sexo, orientação sexual ou outro fator de diferenciação; (ii) a situação de marginalização e exclusão desse grupo é fruto de fatores históricos, sociais, econômicos e culturais; (iii) é possível aferir padrão e disseminação de condutas de exclusão em organizações públicas ou privadas, bem como em zonas geográficas; (iv) esse padrão de conduta gere situação ou desvantagem desproporcional ao grupo vulnerável.” E continua: “No Brasil, a discriminação sistêmica foi identificada no racismo institucional que consiste em um conjunto de normas, práticas e comportamentos discriminatórios cotidianos adotados por organizações públicas ou privadas que, movidos por estereótipos e preconceitos, impõe a membros de grupos raciais ou étnicos discriminados situação de desvantagem no acesso a benefícios gerados pelo Estado e por demais instituições e organizações”.[footnoteRef:93] [93: (MPF-2017): A discriminação sistêmica consiste em um conjunto de normas, práticas e comportamentos discriminatórios adotados por entes públicos ou privados que impõe, às vítimas, situação de desvantagem e prejuízo.] 
2.3. Direito à Privacidade
A privacidade é gênero, no qual estão abrangidas a vida privada, a intimidade, a honra e a imagem das pessoas, que são valores consagrados no art. 5º, X da CF/88:
CF, art. 5º, X: são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação.[footnoteRef:94] [94: (MPSP-2011): Considerando a disciplina constitucional brasileira, é possível afirmar que o direito à privacidade encontra expressão constitucional na inviolabilidade da intimidade, da vida privada, da honra e da imagem das pessoas. BL: art. 5º, X, CF.] 
Embora a redação do inciso empregue a expressão “inviolabilidade”, já vimos que não há direitos absolutos. Todos eles encontram limites em interesses coletivos ou em outros direitos também consagrados pela Constituição. Assim, a inviolabilidade é “prima facie” (provisória), podendo ser afastada quando outros direitos de peso relativo maior justifiquem uma restrição ao direito à privacidade. 
Exemplo: Não há uma hierarquia absoluta a colisão entre o direito à privacidade e o direito à liberdade de expressão, sendo necessário verificar as circunstâncias fáticas e jurídicas para definir qual delas prevalecerá no caso específico.
Para tentar estabelecer critérios e parâmetros para a proteção ser estabelecida em maior ou menor grau, devemos ter em conta que, quanto mais próximo das experiências definidoras da identidade do indivíduo, maior deve ser a proteção. 
Exemplo: Questões relacionadas à intimidade estão mais próximas da identidade do indivíduo do que as relativas à vida privada.
Vejamos os aspectos em espécie a serem levados em consideração para definirmos a proteção a ser estabelecida em maior ou menor grau:
a) Local em que ocorreu o fato: locais públicos e reservados
Caso o fato ocorra em local reservado (v.g. casa), o grau de proteção deverá ser maior do que do fato ocorrido em local público (v.g. rua). 
Exemplo: Imagens captadas por câmera de segurança localizada em uma rua ou no interior de um supermercado. As imagens poderão ser utilizadas em um processo judicial sem necessidade de autorização judicial. 
Todavia, é uma situação distinta de uma câmera instalada no interior de um escritório ou residência, que são locais reservados. Aqui o grau de proteção será muito maior.
Todavia, o fato ocorrido em local público não está desprovido de proteção.
Exemplo: Caso da Daniela Cicarelli: Quando flagrada transando em uma praia, embora fosse um local público, prevaleceu o entendimento de que o direito a intimidade deveria imperar, pois não havia interesse público (apenas “do público”) na divulgação das imagens.
b) “Tipo” de pessoa envolvida: pessoas públicas e comuns
O grau de proteção de privacidade de uma pessoa comum é maior do que o grau de proteção atribuído a uma pessoa pública.[footnoteRef:95] [95: ##Atenção: Tema cobrado na prova do TRF4-2010.] 
Exemplo: A divulgação de doença de uma pessoa comum pode não conter nenhum tipo de interesse para o público. Por outro lado, a grave doença de um político possui interesse relevante para os eleitores terem ciência da possibilidade de substituição pelo Vice, devendo prevalecer o direito à informação em relação ao direito à privacidade.
c) Esferas – Teoria das esferas (Direito Alemão)
Segundo a teoria das esferas, quanto mais próximo das identidades definidoras do indivíduo, maior deve ser a proteção conferida pelo Direito.
c.1) Esfera pública
A esfera pública compreende:
· Fatos públicos: Fatos pertencentes ao domínio público ou informações passíveis de serem obtidas licitamente de outra forma (v.g. fatos constantes em livro histórico; anais do Congresso Nacional; informações constantes em processo judicial).
· Atos praticados em local público ou com o desejo de torná-los públicos: Deve ser analisado o elemento volitivo (vontade do indivíduo), ou seja, deve-se verificar se o indivíduo, expressa ou tacitamente, dela abriu mão temporariamente.
Ex.1: Indivíduo que abriu mão do exercício ao direito à privacidade ao assinar contrato de participação em reality show, obviamente abriu mão temporariamente de parcela da sua privacidade.
Ex.2: Indivíduo que está em um comício público ou em um show, sabe que aquele não é um local reservado e lá será filmado e fotografado.
c.2) Esfera privada
Compreendeas relações com o meio social sem interesse na divulgação. Há uma proteção menor do que a conferida à esfera íntima, porém maior que a conferida à esfera pública.
Exemplos: dados da declaração de Imposto de Renda e dados de uma conta bancária não fazem parte da intimidade de um indivíduo, tanto que precisam ser declarados. Porém, fazem parte da esfera privada do indivíduo, de forma que não podem ser divulgados livremente.
c.3) Esfera íntima
É a esfera mais próxima da identidade definidora do indivíduo. Ela compreende as informações confidenciais e segredos pessoais. São as informações que a pessoa não quer e não precisa compartilhar com ninguém.
Essa proteção deve ser muito maior do que a conferida aos fatos da vida privada.
Exemplos: anotações em um diário; orientação sexual.
d) Honra
A CF/88 também protege a honra e a imagem das pessoas, que não se confundem com esferas acima mencionadas. A honra pode ser:
· Honra subjetiva: estima do indivíduo de si próprio;
· Honra objetiva: reputação do indivíduo perante o meio social.
Ambas as “espécies” de honra estão protegidas pelo art. 5º, X, da CF. 
##Obs.: Essa proteção à honra objetiva é também conferida às pessoas jurídicas. Vejamos:
Art. 52: Aplica-se às pessoas jurídicas, no que couber, a proteção dos direitos da personalidade. 
S. 227 STJ: A pessoa jurídica pode sofrer dano moral.
e) Imagem
A proteção à imagem existe independentemente do dano à honra. 
Exemplo: Às vezes, a divulgação da imagem pode não atingir a honra da pessoa, mas ser utilizada para fins comerciais, sem autorização do titular. 
O Código Civil regulamentou o tema do inciso X, art. 5º, da CF:
CC, art. 20: Salvo se autorizadas, ou se necessárias à administração da justiça ou à manutenção da ordem pública, a divulgação de escritos, a transmissão da palavra, ou a publicação, a exposição ou a utilização da imagem de uma pessoa poderão ser proibidas, a seu requerimento e sem prejuízo da indenização que couber, se lhe atingirem a honra, a boa fama ou a respeitabilidade, ou se se destinarem a fins comerciais.
Parágrafo único. Em se tratando de morto ou de ausente, são partes legítimas para requerer essa proteção o cônjuge, os ascendentes ou os descendentes.
CC, art. 21: A vida privada da pessoa natural é inviolável, e o juiz, a requerimento do interessado, adotará as providências necessárias para impedir ou fazer cessar ato contrário a esta norma.
Os artigos do Código Civil praticamente estabeleceram uma primazia do direito à privacidade sobre a liberdade de informação e à liberdade de expressão, ao apontar ser necessária autorização, salvo nos casos de interesse público ou de necessidade à administração da Justiça.
A partir desses dispositivos houve uma polêmica em relação à publicação das biografias não autorizadas, pela discussão sobre a necessidade ou não de autorização da pessoa retratada. O Supremo Tribunal Federal fez uma interpretação conforme a Constituição, dizendo que tais dispositivos não poderiam ser simplesmente interpretados no sentido de que a autorização é sempre necessária. 
Mediante um juízo de ponderação, a Corte estabeleceu uma regra no sentido de ser inexigível autorização prévia de pessoa biografada relativamente a obras biográficas literárias ou audiovisuais, sendo também desnecessária autorização de pessoas retratadas como coadjuvantes (ou de seus familiares, em caso de pessoas falecidas ou ausentes). Porém, se houver abuso, os prejudicados têm direito à indenização. Vejamos:
STF – ADI 4.815/DF: EMENTA: [...] APARENTE CONFLITO ENTRE PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS: LIBERDADE DE EXPRESSÃO, DE INFORMAÇÃO, ARTÍSTICA E CULTURAL, INDEPENDENTE DE CENSURA OU AUTORIZAÇÃO PRÉVIA (ART. 5º INCS. IV, IX, XIV; 220, §§ 1º E 2º) E INVIOLABILIDADE DA INTIMIDADE, VIDA PRIVADA, HONRA E IMAGEM DAS PESSOAS (ART. 5º, INC. X). ADOÇÃO DE CRITÉRIO DA PONDERAÇÃO PARA INTERPRETAÇÃO DE PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL. PROIBIÇÃO DE CENSURA (ESTATAL OU PARTICULAR). GARANTIA CONSTITUCIONAL DE INDENIZAÇÃO E DE DIREITO DE RESPOSTA (...). 9. Ação direta julgada procedente para dar interpretação conforme à Constituição aos arts. 20 e 21 do Código Civil, sem redução de texto, para, em consonância com os direitos fundamentais à liberdade de pensamento e de sua expressão, de criação artística, produção científica, declarar inexigível autorização de pessoa biografada relativamente a obras biográficas literárias ou audiovisuais, sendo também desnecessária autorização de pessoas retratadas como coadjuvantes (ou de seus familiares, em caso de pessoas falecidas ou ausentes).[footnoteRef:96]- [footnoteRef:97] [96: (Proc./UNICAMP-2018-VUNESP): Um escritor pretende publicar uma biografia não autorizada de um ex-jogador de futebol. Este, sabendo da intenção do escritor, notifica-o extrajudicialmente, ordenando que o livro não seja publicado. É possível afirmar corretamente: o livro pode ser publicado sem prévia autorização do ex-jogador e não pode ser recolhido por decisão judicial, podendo o ex-jogador requerer reparação civil ou direito de resposta, nos termos da lei. BL: ADI 4815, STF.
(Advogado-AL/RO-2018-FGV): Em uma interpretação do Direito Civil conforme a Constituição Federal é inexigível o consentimento da pessoa biografada em relação a obras biográficas literárias ou audiovisuais. L: ADI 4815, STF.] [97: ##Atenção: Tema cobrado na prova do MPRO-2017 (FMP).] 
Segundo Bernardo Gonçalves, “o direito à imagem também recebe juridicamente um tratamento bipartido: por “imagem-retrato” trata-se do direito à reprodução gráfica do sujeito, seja total, seja parcial; e por “imagem-atributo” protege-se a imagem dentro do seu contexto ("conjunto de atributos cultivados pelo indivíduo e reconhecidos pelo meio social)”.[footnoteRef:98] [98: (MPMS-2015): Considere a seguinte afirmação sobre o direito fundamental à imagem: A imagem atributo pode ser aplicada à pessoa jurídica, quer através da proteção à marca ou do produto.
##Atenção: Em síntese, a imagem-atributo da personalidade pode ser definida como a imagem que a pessoa exterioriza nas suas relações sociais, revelando-se como a reputação que goza em seu meio social, de trabalho, familiar, etc. Assim como a imagem-retrato, também é protegida constitucionalmente, pois todas as pessoas tem direito de preservar a imagem justificadamente em torno dela. Nesta proteção, o retrato deixa de ser a exteriorização da figura para ser o retrato moral do indivíduo. Distancia-se, entretanto, a violação deste direito com o direito à honra, visto que a violação de um não implica necessariamente a violação do outro. O que constantemente ocorre é o dano causado conjuntamente às duas imagens, tanto retrato quanto atributo. Por fim, verifica-se que, havendo violação da imagem-atributo, enseja-se a indenização correspondente à lesão, sem haver a necessidade da comprovação do dano material.] 
2.3.1. Distinções conceituais
Art. 5º, (…) X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação;
(…) XII - é inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas, salvo, no último caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal;[footnoteRef:99] [99: (Téc. Judic./TRT2-2018-FCC): Está em conformidade com os direitos e garantias fundamentais previstos na Constituição Federal a decisão judicial que autoriza a quebra do sigilo telefônico para fins de investigação criminal ou instrução processual penal, sendo incabível decisão judicial para determinar a mesma providência para fins de instrução processual civil. BL: art. 5º, XII, CF.
(PCMA-2018-CESPE): De acordo com o entendimento do STF, a polícia judiciária não pode, por afrontar direitos assegurados pela CF, invadir domicílio alheio com o objetivo de apreender, durante o período diurno e sem ordem judicial, quaisquer objetos que possam interessar ao poder público. Essa determinaçãoconsagra o princípio da reserva de jurisdição. BL: art. 5º, inciso XI e XII da CF/88.
(Anal. Judic./TRT6-2018-FCC): A CF/88 autoriza o pedido de interceptação de comunicações telefônicas, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de: investigação criminal ou instrução processual penal. BL: art. 5º, inciso XII, CF.] 
2.3.1.1. Interceptação ambiental
Definição: Consiste na captação de sinais eletromagnéticos, ópticos ou acústicos, feita por terceiros, sem o conhecimento de nenhum dos interlocutores. Portanto, a interceptação pressupõe uma terceira pessoa. 
##Obs.: Caso o próprio interlocutor realize a gravação, não haverá interceptação da comunicação, mas gravação clandestina.
A intercepção ambiental, inclusive, está prevista na Lei das Organizações Criminosas:
Lei n. 12.850/2013, art. 3º: Em qualquer fase da persecução penal, serão permitidos, sem prejuízo de outros já previstos em lei, os seguintes meios de obtenção da prova: (…)
II - captação ambiental de sinais eletromagnéticos, ópticos ou acústicos.
Segundo a doutrina, os mesmos procedimentos empregados na interceptação telefônica (Lei 9.296/96) devem ser aplicados, por analogia, à interceptação ambiental, pois a Lei de Organizações Criminosas não disciplina o assunto.
Em regra, a interceptação ambiental é lícita, mesmo que sem autorização judicial. Porém, excepcionalmente, será ilícita quando violar a:
· Expectativa de privacidade (v.g. interceptação ambiental de pessoa dentro de sua residência viola a expectativa de privacidade; todavia, a interceptação ambiental de pessoa no meio da rua não viola a expectativa de privacidade);
##Obs.: Obviamente, não havendo autorização judicial, a interceptação será ilícita.
· Confiança decorrente de relações interpessoais ou profissionais (v.g. conversa particular entre cliente e advogado; entre paciente e médico; entre padre e pessoa que está confessando).
2.3.1.2. Gravação clandestina
Definição: Consiste na captação de conversa telefônica (v.g. grampo), pessoal (v.g. gravador de bolso) ou ambiental (v.g. câmera colocada por dos interlocutores no ambiente) feita por um dos interlocutores, sem o conhecimento dos demais.
Em regra, a gravação clandestina é lícita, mesmo que sem autorização judicial. Porém, será ilícita quando:
· Utilizada sem justa causa (v.g. a gravação clandestina feita para utilizar em sua defesa em processo judicial é legítima; gravação clandestina feita para gravar agente público que exige propina é legítima).
· Violar causa legal específica de sigilo (v.g. contratos sigilosos; contrato entre médico e paciente). Vejamos o seguinte precedente do STF:
STF – AI 560.223 AgR/SP: 1. A gravação ambiental meramente clandestina, realizada por um dos interlocutores, não se confunde com a interceptação, objeto cláusula constitucional de reserva de jurisdição. 2. É lícita a prova consistente em gravação de conversa telefônica realizada por um dos interlocutores, sem conhecimento do outro, se não há causa legal específica de sigilo nem de reserva da conversação. Precedentes…. (g.n.).[footnoteRef:100] [100: ##Atenção: Tema cobrado na prova do MPGO-2019.] 
2.3.1.3. Quebra de sigilo de dados
Definição: Consiste no acesso a informações privadas, contidas em transações bancárias (quebra do sigilo de dados bancários), declarações à Receita Federal (quebra do sigilo de dados fiscais), registros das operadoras de telefonia (quebra do sigilo de dados telefônicos) ou arquivos eletrônicos (quebra do sigilo de dados informáticos).
##Obs.: O acesso aos registros das operadoras de telefonia (o histórico das ligações) é distinto da interceptação telefônica e da gravação telefônica clandestina. Nesse caso, trata-se da quebra de sigilo de dados telefônicos em que não há acesso ao conteúdo do diálogo. Exige-se uma razão para que os sigilos sejam quebrados porque todos eles compõem a vida privada do indivíduo. A quebra será ilícita quando:
· Desprovida de justificação constitucional: Se não houver outro direito fundamental que justifique a quebra do sigilo ela não poderá ser autorizada (v.g. suspeita de que o indivíduo recebeu valores decorrentes da prática de atos ilícitos).
· Autorizada por autoridade incompetente.
· Autoridades competentes: magistrados (Poder Judiciário) e Comissão Parlamentar de Inquérito (federal ou estadual – CF, art. 58, § 3º). 
##Obs.: A CPI municipal não é competente, diante da inexistência de órgão jurisdicional municipal. 
· Autoridades incompetentes: o TCU e o MP, em regra, são incompetentes para determinar a quebra de sigilo. No entanto, excepcionalmente, se houver recursos públicos envolvidos ou algo dentro da competência fiscalizatória, ambos poderão requisitar os dados diretamente, sem passar pelo crivo do Poder Judiciário. Vejamos os seguintes precedentes:
STF - MS 21.729/DF: [...] 5. Não cabe ao Banco do Brasil negar, ao Ministério Público, informações sobre nomes de beneficiários de empréstimos concedidos pela instituição, com recursos subsidiados pelo erário federal, sob invocação do sigilo bancário, em se tratando de requisição de informações e documentos para instruir procedimento administrativo instaurado em defesa do patrimônio público. (g.n.).
STF e STJ - [...]: Não são nulas as provas obtidas por meio de requisição do Ministério Público de informações bancárias de titularidade de Prefeitura para fins de apurar supostos crimes praticados por agentes públicos contra a Administração Pública. É lícita a requisição pelo Ministério Público de informações bancárias de contas de titularidade da Prefeitura, com o fim de proteger o patrimônio público, não se podendo falar em quebra ilegal de sigilo bancário. O sigilo de informações necessário à preservação da intimidade é relativizado quando há interesse da sociedade em conhecer o destino dos recursos públicos. Diante da existência de indícios da prática de ilícitos penais envolvendo verbas públicas, cabe ao MP, no exercício de seus poderes investigatórios (art. 129, VIII, da CF/88), requisitar os registros de operações financeiras relativos aos recursos movimentados a partir de conta-corrente de titularidade da Prefeitura. Essa requisição compreende, por extensão, o acesso aos registros das operações bancárias sucessivas, ainda que realizadas por particulares, e objetiva garantir o acesso ao real destino desses recursos públicos. [STJ. 5ª T. HC 308.493-CE, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, j. 20/10/15 (Info 572). STF. 2ª T. RHC 133118/CE, Rel. Min. Dias Toffoli, j. 26/9/17 (Info 879).]
MS 33.340/DF: TCU não está autorizado a, manu militari, decretar a quebra de sigilo bancário e empresarial de terceiros, medida cautelar condicionada à prévia anuência do Poder Judiciário, ou, em situações pontuais, do Poder Legislativo. [...]. 8. In casu, contudo, o TCU deve ter livre acesso às operações financeiras realizadas pelas impetrantes, entidades de direito privado da Administração Indireta submetidas ao seu controle financeiro, mormente porquanto operacionalizadas mediante o emprego de recursos de origem pública. (g.n.)[footnoteRef:101] [101: (Procurador-ALE/RJ-2017-FGV): Determinada agência de fomento estadual, enquadrada como instituição financeira, é instada pelo competente Tribunal de Contas a apresentar dados relativos aos financiamentos públicos por ela concedidos. Diante da requisição, deve a agência: fornecer os dados requisitados pelo Tribunal de Contas, considerando o fato de que operações financeiras que envolvam recursos públicos não estão submetidas ao sigilo bancário. BL: STF, MS 33340.] 
Recentemente, o STF analisou a possibilidade de autoridades fazendárias requisitarem diretamente dados bancários para fins fiscais. Tal autorização, contida na LC n. 105/01, foi objeto de várias ações diretas de inconstitucionalidade e de recursos extraordinários. Inicialmente, o STF adotou o entendimento de que as autoridades fazendárias teriam que requisitar ao Poder Judiciário as informações. No entanto, em precedente mais recente, o STF alterou o seu posicionamento, pacificandoo entendimento de que a requisição direta pelas autoridades fazendárias é admitida, especialmente porque há mecanismos de controle para atuação de tais entidades e porque o sigilo não é retirado, apenas transferido da esfera bancária para a esfera fiscal. Vejamos o julgado:
RE 601.314/SP: 4. Verifica-se que o Poder Legislativo não desbordou dos parâmetros constitucionais, ao exercer sua relativa liberdade de conformação da ordem jurídica, na medida em que estabeleceu requisitos objetivos para a requisição de informação pela Administração Tributária às instituições financeiras, assim como manteve o sigilo dos dados a respeito das transações financeiras do contribuinte, observando-se um translado do dever de sigilo da esfera bancária para a fiscal (...) 6. Fixação de tese em relação ao item “a” do Tema 225 da sistemática da repercussão geral”: “O art. 6º da Lei Complementar 105/01 não ofende o direito ao sigilo bancário, pois realiza a igualdade em relação aos cidadãos, por meio do princípio da capacidade contributiva, bem como estabelece requisitos objetivos e o translado do dever de sigilo da esfera bancária para a fiscal.[footnoteRef:102] [102: (DPEAP-2018-FCC): Dados protegidos por sigilo bancário são requisitados a determinada instituição financeira pela Secretaria da Receita Federal, com base em permissivo legal, para utilização em sede de procedimento administrativo visando à apuração de supostas irregularidades fiscais cometidas por contribuinte pessoa física. Nessa hipótese, à luz da CF/88 e da jurisprudência do STF,  não há ofensa ao direito ao sigilo bancário, inerente ao direito constitucional à vida privada, na requisição efetuada pela autoridade fazendária, sendo constitucional o respectivo permissivo legal, na medida em que exija da autoridade fazendária que mantenha o dever de sigilo imposto na esfera bancária. BL: Info 815, STF.
(TJPR-2017-CESPE): Com base no texto constitucional e na jurisprudência do STF acerca dos direitos e garantias fundamentais, individuais e coletivos, assinale a opção correta: Dado o dever fundamental de pagar tributos, não é oponível o sigilo de informações bancárias à administração tributária. BL: Info 815, STF.] 
##Atenção: ##STF: ##DOD: Os dados obtidos por meio da quebra dos sigilos bancário, telefônico e fiscal devem ser mantidos sob reserva. Assim, a página do Senado Federal na internet não pode divulgar os dados obtidos por meio da quebra de sigilo determinada por comissão parlamentar de inquérito (CPI). STF. Plenário. MS 25940, Rel. Min. Marco Aurélio, j. 26/4/18 (Info 899).
##Atenção: ##STF: ##DOD: ##Repercussão Geral: Em 2019, o STF decidiu que é possível o compartilhamento, sem autorização judicial, dos relatórios de inteligência financeira da UIF e do procedimento fiscalizatório da Receita Federal com a Polícia e o Ministério Público: 
1. É constitucional o compartilhamento dos relatórios de inteligência financeira da UIF [UIF = Leia-se “COAF”] e da íntegra do procedimento fiscalizatório da Receita Federal do Brasil (RFB), que define o lançamento do tributo, com os órgãos de persecução penal para fins criminais, sem a obrigatoriedade de prévia autorização judicial, devendo ser resguardado o sigilo das informações em procedimentos formalmente instaurados e sujeitos a posterior controle jurisdicional. 2. O compartilhamento pela UIF* e pela RFB, referente ao item anterior, deve ser feito unicamente por meio de comunicações formais, com garantia de sigilo, certificação do destinatário e estabelecimento de instrumentos efetivos de apuração e correção de eventuais desvios. STF. Plenário. RE 1055941/SP, Rel. Min. Dias Toffoli, j. 4/12/19 (repercussão geral – Tema 990) (Info 962).
2.3.1.4. Interceptação de comunicações
Definição: Consiste na intromissão em comunicação, feita por terceiro (como toda interceptação), sem conhecimento de nenhum dos interlocutores. 
A doutrina costuma distinguir:
· Interceptação em sentido estrito: nenhum dos interlocutores tem conhecimento da gravação.
· Escuta telefônica: um dos interlocutores tem conhecimento de que terceiro está gravando, mas os demais não.
A interceptação telefônica, em princípio, é vedada pela CF, art. 5º, XII: “é inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas, salvo, no último caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal”.
	##Questiona-se: O fato de a Constituição dizer “(…) salvo, no último caso (…)” significa que nas demais hipóteses não pode haver violação ou restrição em situação alguma? O sigilo das correspondências e das comunicações telegráficas e de dados é absoluto? 
Não, pois não existem direitos absolutos. Embora a Constituição utilize o termo “inviolável”, a inviolabilidade é apenas “prima facie” (provisória, isto é, em um primeiro momento). Portanto, poderá ser afastada para a prevalência de outros valores de peso maior (justificação constitucionalmente legítima).
a) Interceptação de correspondência
Não obstante a Constituição apontar que o sigilo de correspondência é inviolável, o próprio texto constitucional possui dois dispositivos que permitem restringi-lo: 
(i) estado de defesa (art. 136, § 1º, I, “b”, CF)[footnoteRef:103]; e [103: (TJAL-2008-CESPE): O estado de defesa autoriza a restrição ao direito de reunião, ainda que exercida no seio das associações, ao sigilo de correspondência e ao sigilo de comunicação telegráfica e telefônica.] 
(ii) estado de sítio (art. 139, III, CF).
Além das previsões expressas, princípios de peso maior, no caso concreto, como a privacidade, poderão justificar uma restrição. (##Atenção: Isso foi cobrado na prova da Defensoria Pública de Santa Catarina de 2012).
Exemplo: É o caso da segurança pública, que pode justificar uma restrição ao direito ao sigilo de correspondência do preso, caso haja suspeita de que ele está utilizando-se deste direito para a prática de crimes. Os direitos fundamentais servem para impedir arbítrios do Estado, mas não para garantir a impunidade.
Vejamos o seguinte precedente do STF e o art. 41 da LEP:
HC 70.814/SP: A administração penitenciária, com fundamento em razões de segurança pública, de disciplina prisional ou de preservação da ordem jurídica, pode, sempre excepcionalmente, e desde que respeitada a norma inscrita no art. 41, parágrafo único, da Lei n. 7.210/84, proceder à interceptação da correspondência remetida pelos sentenciados, eis que a cláusula tutelar da inviolabilidade do sigilo epistolar não pode constituir instrumento de salvaguarda de práticas ilícitas.[footnoteRef:104] [104: ##Atenção: Tema cobrado na prova do MPBA-2018.] 
Lei n. 7.210/84, art. 41: Constituem direitos do preso: (…) 
XV – contato com o mundo exterior por meio de correspondência escrita.
Parágrafo único. Os direitos previstos nos incisos V, X e XV poderão ser suspensos ou restringidos mediante ato motivado do diretor do estabelecimento.[footnoteRef:105] [105: (DPERO-2017-VUNESP): Entre os direitos e deveres do condenado, afirma-se corretamente que não é direito do condenado manter contato com o mundo exterior por meio de correspondência escrita de forma irrestrita. BL: art. 41, XV c/c § único da LEP.
(MPSC-2016): Um dos direitos consagrados aos presos pela Lei n. 7.210/84 é o de manter contato com o mundo exterior por meio de correspondência escrita, da leitura e de outros meios de informação que não comprometam a moral e os bons costumes. A mesma lei, todavia, confere ao diretor do estabelecimento a suspensão ou restrição desse direito, desde que o faça mediante ato motivado. BL: art. 41, XV c/c § único da LEP.] 
b) Interceptação da comunicação de dados
As Constituições anteriores não mencionavam o sigilo de dados. Em razão desta introdução ter se dado na década de 80 (na época em que começou o desenvolvimento da informática), muitos autores (Manuel Gonçalves Ferreira Filho, entre outros) interpretam essa proteção como sendo apenas de dados informáticos. Entretanto,Marcelo Novelino não acredita que esta interpretação seja a correta, pois o princípio da máxima efetividade impõe que a interpretação seja feita na maior medida possível, ou seja, todos os dados estão protegidos pelo dispositivo.
Outra restrição feita pelo STF é em relação ao tipo de proteção dada pelo dispositivo: Entende a Corte que o que a CF/88 protege é a comunicação de dados (liberdade de comunicação), não os dados em si. Portanto, alguns dados (fiscais, bancários, etc.) podem ser quebrados. Vejamos:
STF - MS 21.729 (voto do rel. min. Sepúlveda Pertence): Da minha leitura, no inciso XII da Lei Fundamental, o que se protege, e de modo absoluto, até em relação ao Poder Judiciário, é a comunicação ‘de dados’, e não os ‘dados’, o que tornaria impossível qualquer investigação administrativa, fosse qual fosse.
##Obs.: Esse entendimento do STF cria uma sinuca de bico ao dispor no sentido de que o dispositivo é uma regra (absoluta, portanto). Ora, se a comunicação dos dados é que está protegida e não os dados em si, estar-se-á dizendo que os dados não são protegidos. Mas, conforme visto, há dados que merecem proteção e o fato de ele ter chegado ao ser destinatário, não significa que ele possa ser acessado e devassado por qualquer um. Porém, interpretando o dispositivo não como uma regra, mas como um princípio (e não há princípios absolutos), poderá haver a restrição em relação a outros valores constitucionais justificarem.
c) Interceptação das comunicações telefônicas
Lei n. 9.296/96, art. 1º: A interceptação de comunicações telefônicas, de qualquer natureza, para prova em investigação criminal e em instrução processual penal, observará o disposto nesta Lei e dependerá de ordem do juiz competente da ação principal, sob segredo de justiça.
Parágrafo único. O disposto nesta Lei aplica-se à interceptação do fluxo de comunicações em sistemas de informática e telemática [e-mail, SMS, ‘Whatsapp’].
##Obs.: Embora a Constituição exija lei apenas para as comunicações telefônicas, o fato da Lei n. 9.296/96 estender a proteção ao sigilo de dados não a torna inconstitucional, porque ela está ampliando a proteção ao direito fundamental (ao sigilo de dados).
Definição de comunicações telefônicas: “Abrange não apenas a conversa por telefone, mas também a transmissão, emissão ou recepção de símbolos, caracteres, sinais, escritos, imagens, sons ou informações de qualquer natureza, por meio de telefonia, estática ou móvel (celular). Por conseguinte, é possível a interceptação de qualquer comunicação via telefone, conjugada ou não com a informática, o que compreende aquelas realizadas direta (fax, modens) e indiretamente (internet, e-mail, correios eletrônicos)” (Renato Brasileiro).
Para que haja a interceptação em voga, são os requisitos exigidos pela Constituição:
1º Requisito: Ordem judicial: Há a submissão do sigilo à cláusula da reserva de jurisdição. Ela significa que apenas o Poder Judiciário pode dar, não só a última palavra, mas também a primeira sobre o assunto. Esse entendimento foi adotado pelo STF em alguns de seus precedentes, vejamos:
STF - MS 23.452/RJ: O postulado da reserva constitucional de jurisdição importa em submeter, à esfera única de decisão dos magistrados, a prática de determinados atos cuja realização, por efeito de explícita determinação constante do próprio texto da Carta Política, somente pode emanar do juiz, e não de terceiros, inclusive daqueles a quem se haja eventualmente atribuído o exercício de ‘poderes de investigação próprios das autoridades judiciais’. (PROVA TJMG-2012)
##Obs.: Cláusula de reserva de jurisdição: Conforme o precedente acima, como ela está submetida à cláusula de reserva de jurisdição, a CPI não pode determinar a interceptação telefônica. Ademais, há outros casos submetidos à cláusula da reserva constitucional de jurisdição conforme o STF:
(...) A cláusula constitucional da reserva de jurisdição - que incide sobre determinadas matérias, como a ¹busca domiciliar (CF, art. 5º, XI), a ²interceptação telefônica (CF, art. 5º, XII) e a ³decretação da prisão de qualquer pessoa, ressalvada a hipótese de flagrância (CF, art. 5º, LXI) - traduz a noção de que, nesses temas específicos, assiste ao Poder Judiciário, não apenas o direito de proferir a última palavra, mas, sobretudo, a prerrogativa de dizer, desde logo, a primeira palavra, excluindo-se [...] a possibilidade do exercício de iguais atribuições, por parte de quaisquer outros órgãos ou autoridades (...)
Em decisão posterior, o STF decidiu que também está submetida à cláusula da reserva constitucional de jurisdição 4o sigilo imposto a processo judicial:
MS 27.483 MC-REF/DF: Comissão Parlamentar de Inquérito não tem poder jurídico de, mediante requisição, a operadoras de telefonia, de cópias de decisão nem de mandado judicial de interceptação telefônica, quebrar sigilo imposto a processo sujeito a segredo de justiça. Este é oponível a Comissão Parlamentar de Inquérito, representando expressiva limitação aos seus poderes constitucionais.
2º Requisito: seja feita na forma da lei (Lei n. 9.296/96).
3º Requisito: Para fins de investigação criminal ou instrução processual penal. Trata-se de uma “reserva legal qualificada”, pois a Constituição não apenas exige lei em sentido formal, como também ela deve ter uma finalidade específica.[footnoteRef:106] [106: ##Atenção: Tema cobrado na prova do TJDFT-2016.] 
##Obs.: Essa regra comporta exceções, a depender dos direitos envolvidos no caso concreto, a justificar a medida (v.g. caso no Mato Grosso, em que um juiz de uma vara de família autorizou interceptação telefônica para encontrar uma criança que havia sido levada por um parente e nenhum outro meio mostrou-se hábil para encontrá-la – foi um caso de “derrotabilidade de regras”, no qual uma regra foi superada em situação muito excepcional por princípios de peso maior). Geralmente, isso não ocorre.
	##Questiona-se: As informações obtidas em uma interceptação telefônica, realizada para fins de investigação criminal ou instrução processual penal, poderão ser utilizadas como prova emprestada em um processo administrativo disciplinar? 
Para o STJ, sim, desde que a interceptação tenha sido feita com autorização do juízo criminal e com observância das demais exigências contidas na Lei nº 9.296/1996 (STJ. 3ª Seção. MS 14.140-DF, Rel. Min. Laurita Vaz, j. 26/9/2012).
O STF também decidiu no mesmo sentido afirmando que:
A prova colhida mediante autorização judicial e para fins de investigação ou processo criminal pode ser utilizada para instruir procedimento administrativo punitivo. Assim, é possível que as provas provenientes de interceptações telefônicas autorizadas judicialmente em processo criminal sejam emprestadas para o processo administrativo disciplinar. STF. 1ª Turma. RMS 28774/DF, rel. orig. Min. Marco Aurélio, red. p/ o acórdão Min. Roberto Barroso, j. 9/8/16 (Info 834). (COBRADA NA PROVA DA DPC/RJ 2013)
	##Questiona-se: As informações obtidas em uma interceptação telefônica, realizada para fins de investigação criminal ou instrução processual penal, poderão ser utilizadas em PAD correlato não somente contra o servidor investigado, mas também contra outros servidores que cometeram algum ilícito administrativo? 
Sim. Vejamos o seguinte precedente do STF:
STF - Inq. 2.424 QO-QO/RJ: Dados obtidos em interceptação de comunicações telefônicas e em escutas ambientais, judicialmente autorizadas para produção de prova em investigação criminal ou em instrução processual penal, podem ser usados em procedimento administrativo disciplinar, contra a mesma ou as mesmas pessoas em relação às quais foram colhidos, ou contra outros servidores cujos supostos ilícitos teriam despontado à colheita dessa prova. (COBRADA NA PROVA DA DPC/RJ 2013)
2.3.2. Inviolabilidade do domicílio
CF, art. 5º, XI: a casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial.
2.3.2.1. Âmbitode proteção
Conceito de casa: A palavra “casa” não é interpretada em seu sentido literal. É necessário interpretá-la como faz o Código Penal, no sentido de abranger compartimentos habitados, mesmo naqueles onde a pessoa exerce sua atividade profissional. 
Vejamos um precedente do STF, em que faz uma interpretação de “casa” equivalente ao que consta no Código Penal:
STF – HC 93.050/RJ: ... o conceito normativo de ‘casa’ revela-se abrangente e, por estender-se a qualquer compartimento privado não aberto ao público, onde alguém exerce profissão ou atividade (CP, art. 150, § 4º, III), compreende, observada essa específica limitação espacial (área interna não acessível ao público), os escritórios profissionais, inclusive os de contabilidade, ‘embora sem conexão com a casa de moradia propriamente dita’ (NELSON HUNGRIA). Doutrina. Precedentes. (COBRADO PROVA TRF2 2014 e DPESC 2012)
##Obs.: Em regra, o carro não é equiparado a casa. A busca em automóvel é equiparada à busca pessoal, a não ser que ele sirva como residência. Vejamos a seguinte decisão:
STF - RHC 117.767/DF: As apreensões de documentos no interior de veículos automotores, por constituírem hipótese de busca pessoal — caracterizada pela inspeção do corpo, das vestes, de objetos e de veículos (não destinados à habitação do indivíduo) —, dispensam autorização judicial quando houver fundada suspeita de que neles estão ocultados elementos necessários à elucidação dos fatos investigados, a teor do disposto no art. 240, § 2º, do CPP.
2.3.2.2. Restrições
b) Restrições expressas
São as restrições expressas à inviolabilidade do domicílio:
i. Flagrante delito (exige-se fundada suspeita no domicílio; se não houver uma justificativa prévia e plausível para a entrada, ela se revela arbitrária);[footnoteRef:107] [107: (TJDFT-2008): Em caso de flagrante delito, igualmente, autoriza-se o ingresso na casa, de dia ou de noite, independentemente de quem quer que seja. BL: art. 5º, XI da CF/88.] 
ii. Desastre (v.g. desabamento);[footnoteRef:108] [108: (TJDFT-2008): Em caso de desastre, ou para prestar socorro, autoriza-se a entrada na casa, seja de dia ou de noite, tenha-se ou não anuência do morador ou autorização judicial. BL: art. 5º, XI da CF/88.] 
iii. Prestar socorro;[footnoteRef:109] [109: (Anal. Judic./TRF5-2017-FCC): Fernando passou mal de manhã em sua residência e, como estava sozinho, tentou sair para buscar ajuda, mas não conseguiu nem abrir o portão de casa. Fernando teve tempo apenas de pedir auxílio ao seu vizinho, Paulo, desmaiando logo em seguida, ali mesmo no jardim. Paulo, desesperado, rapidamente telefonou ao Corpo de Bombeiros. Nessa situação, à luz da Constituição Federal, os bombeiros estarão autorizados a adentrar no imóvel de Fernando, assim que chegarem, já que para a prestação de socorro pode-se penetrar na casa do morador, sem o seu consentimento, a qualquer hora. BL: art. 5º, XI da CF/88.] 
iv. Determinação judicial, durante o dia (submissão do ingresso à cláusula da reserva de jurisdição).[footnoteRef:110] [110: (Anal. Jurídic./DPEAM-2018-FCC): Em certa pequena propriedade rural reside família que cultiva produtos agrícolas no mesmo local, tendo o imóvel sido dado em garantia de empréstimo contraído para custear o combate a pragas existentes na plantação. Não sendo liquidado o pagamento da dívida no prazo convencionado, o credor promoveu a respectiva cobrança judicial, motivo pelo qual foi expedido mandado judicial de penhora do referido imóvel. Ao cumprir o mandado de penhora, o oficial de justiça foi impedido pela família, tanto durante o dia, quanto durante a noite, de ingressar no imóvel. De acordo com a Constituição Federal, ao determinar a penhora da referida propriedade rural na situação narrada, o juiz agiu incorretamente, não podendo o oficial de justiça, ademais, ingressar no imóvel durante a noite, sem o consentimento do morador, para cumprimento de determinação judicial. BL: art. 5º, XI da CF/88. 
(TJDFT-2008): No período diurno, por determinação judicial, excepciona-se também a inviolabilidade domiciliar. Nesta hipótese, estamos diante da denominada reserva de jurisdição, ou seja, situações em que se faz indispensável a atuação do Poder Judiciário, autorizando determinada conduta, sem a qual seria a mesma considerada ilícita. BL: art. 5º, XI da CF/88.] 
##Obs.: Em relação ao dia: Com relação ao período considerado como dia, há dois critérios utilizados:
· Critério cronológico (critério mais tradicional): dia é o período compreendido entre 6 e 18 horas.
Atenção: Não confundir com o critério do CPC para cumprimento de mandados, que é até as 20h00m.
· Critério físico-astronômico (critério mais moderno e adequado): dia é o período compreendido entre a aurora e o crepúsculo, ou seja, entre o nascer do sol e o pôr-do-sol.
Atenção: A conjugação dos dois critérios sobre o dia oferece maior proteção ao direito fundamental ao domicílio. Essa é proposta sugerida por Alexandre de Moraes em seu Manual de Direito Constitucional.
As justificativas constitucionais para o cumprimento durante o dia são: 
(i) O período noturno trata-se de período de descanso; 
(ii) O período noturno dificulta a fiscalização de arbitrariedades por parte da polícia durante o cumprimento do mandado judicial.
Considerações:
· Justificativa prévia na hipótese de flagrante delito: A entrada forçada em domicílio, sem uma justificativa prévia conforme o direito, é arbitrária e não será a constatação de situação de flagrância, posterior ao ingresso, que justificará a medida. 
Portanto, a entrada forçada em domicílio sem mandado judicial só é lícita, mesmo em período noturno, quando amparada em fundadas razões (prévias), devidamente justificadas a posteriori, que indiquem que dentro da casa ocorre situação de flagrante delito, sob pena de responsabilidade disciplinar, civil e penal do agente ou da autoridade e de nulidade dos atos praticados. Vejamos o seguinte precedente:
STF - RE 603.616/RO: [...] 5. Justa causa. A entrada forçada em domicílio, sem uma justificativa prévia conforme o direito, é arbitrária. Não será a constatação de situação de flagrância, posterior ao ingresso, que justificará a medida. Os agentes estatais devem demonstrar que havia elementos mínimos a caracterizar fundadas razões (justa causa) para a medida (...) 6. Fixada a interpretação de que a entrada forçada em domicílio sem mandado judicial só é lícita, mesmo em período noturno, quando amparada em fundadas razões, devidamente justificadas a posteriori, que indiquem que dentro da casa ocorre situação de flagrante delito, sob pena de responsabilidade disciplinar, civil e penal do agente ou da autoridade e de nulidade dos atos praticados.
· Ingresso da autoridade policial, no período noturno, em escritório de advocacia, para instalação de equipamento: É possível esse ingresso quando a medida foi autorizada por medida judicial sem que caracterize violação do domicílio, pois o princípio da proporcionalidade justifica a medida.
O escritório, de fato, entra no conceito de “casa”, mas dizemos que ele não pode ser invadido no período noturno por tal motivo não faz sentido. A noite é justamente o período em que não há ninguém no escritório e é a hora em que se faz possível a instalação dos equipamentos sem que terceiros vejam que a escuta está sendo implantada. 
Vejamos alguns julgados:
STF – Inq 2.424/RJ: 8. PROVA. Criminal. Escuta ambiental e exploração de local. Captação de sinais óticos e acústicos. Escritório de advocacia. Ingresso da autoridade policial, no período noturno, para instalação de equipamento. Medidas autorizadas por decisão judicial. Invasão de domicílio. Não caracterização. Suspeita grave da prática de crime por advogado, no escritório, sob pretexto de exercício da profissão. Situação não acobertada pela inviolabilidade constitucional.[footnoteRef:111] [111: ##Atenção: Tema cobrado nas provas do TRF5-2009 (CESPE); TJPR-2017 (CESPE) e TJAC-2019 (VUNESP).] 
Inf. n. 529: Não obstante a equiparação legal da oficina de trabalho com o domicílio, julgou-se ser precisorecompor a ratio constitucional e indagar, para efeito de colisão e aplicação do princípio da concordância prática, qual o direito, interesse ou valor jurídico tutelado por essa previsão. Tendo em vista ser tal previsão tendente à tutela da intimidade, da privatividade e da dignidade da pessoa humana, considerou-se ser, no mínimo, duvidosa, a equiparação entre escritório vazio com domicílio stricto sensu, que pressupõe a presença de pessoas que o habitem (...) De toda forma, concluiu-se que as medidas determinadas foram de todo lícitas por encontrarem suporte normativo explícito e guardarem precisa justificação lógico-jurídico constitucional, já que a restrição conseqüente não aniquilou o núcleo do direito fundamental e está, segundo os enunciados em que desdobra o princípio da proporcionalidade, amparada na necessidade da promoção de fins legítimos de ordem pública. (Atenção: Caiu na prova TJSP-2018)
	##Questiona-se: O fiscal da Receita Federal poderá ingressar em um estabelecimento contra a vontade do proprietário ou do responsável, mesmo sem ordem judicial? A fiscalização tributária possui autoexecutoriedade para adentrar em um domicílio sem que haja autorização do responsável? 
Não, pois o Supremo entende que, após a CF/88, o atributo da autoexecutoriedade dos atos administrativos deve ceder ante a inviolabilidade do domicílio. Na ausência de autorização, é necessário que o agente público tenha autorização judicial, sob pena de ilicitude da entrada. Vejamos:
STF – HC 103.325 MC/RJ: O atributo da autoexecutoriedade dos atos administrativos [...] não prevalece sobre a garantia constitucional da inviolabilidade domiciliar, ainda que se cuide de atividade exercida pelo Poder Público em sede de fiscalização tributária.
	##Questiona-se: Como visto, o ingresso forçado não é justificável para a fiscalização tributária. Mas e quando a fiscalização visa promover o direito à saúde e houver suspeita de foco de mosquito da dengue na residência?
Neste caso, a tutela da saúde pública justifica a subjugação do direito à inviolabilidade do domicílio. Vejamos o art. 1º da Lei 13.301/2016:
Lei n. 13.301/2016, art. 1º: Na situação de iminente perigo à saúde pública pela presença do mosquito transmissor do vírus da dengue, do vírus chikungunya e do vírus da zika, a autoridade máxima do Sistema Único de Saúde - SUS de âmbito federal, estadual, distrital e municipal fica autorizada a determinar e executar as medidas necessárias ao controle das doenças causadas pelos referidos vírus, nos termos da Lei nº 8.080, de 19 de setembro de 1990, e demais normas aplicáveis, enquanto perdurar a Emergência em Saúde Pública de Importância Nacional - ESPIN.
§1º: Entre as medidas que podem ser determinadas e executadas para a contenção das doenças causadas pelos vírus de que trata o caput, destacam-se:
(...)
IV - ingresso forçado em imóveis públicos e particulares, no caso de situação de abandono, ausência ou recusa de pessoa que possa permitir o acesso de agente público, regularmente designado e identificado, quando se mostre essencial para a contenção das doenças”.
2.4. Direito à Liberdade
Benjamin Constant distingue duas espécies de liberdade:
· Liberdade negativa (ou liberdade civil, ou liberdade dos modernos, ou liberdade de agir): “situação na qual um sujeito tem a possibilidade de agir sem ser impedido, ou de não agir sem ser obrigado por outros”. Em outras palavras, a liberdade negativa consiste em uma ausência de impedimento ou constrangimento. Benjamin Constant denominou esta liberdade de “dos modernos” porque a expressão foi por ele cunhada quando da Revolução Francesa, época em que tal liberdade era uma novidade.
· Liberdade positiva (ou liberdade política, ou liberdade dos antigos, ou liberdade de querer): “situação na qual um sujeito tem a possibilidade de orientar seu próprio querer no sentido de uma finalidade sem ser determinado pelo querer dos outros”. Ou seja, a liberdade positiva está relacionada à autonomia e autodeterminação, é uma liberdade de escolhas. Benjamin Constant chamou esta liberdade de “dos antigos” porque já existia desde a Grécia Antiga.
2.4.1. Liberdade de manifestação do pensamento
CF, art. 5º, IV: é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato.[footnoteRef:112] [112: (Téc./MPU-2018-CESPE): A liberdade de pensamento é exercida com ônus para o manifestante, que deverá se identificar e assumir a autoria daquilo que ele expressar. BL: art. 5º, IV, CF.] 
Analisando o dispositivo, temos uma regra e uma restrição a esta regra:
· Regra: liberdade na manifestação do pensamento;
· Restrição à regra: vedação do anonimato.
2.4.1.1. Âmbito de proteção
a) Liberdade de pensar
A liberdade de manifestação do pensamento não está limitada à liberdade de pensar, embora a englobe. 
	##Questiona-se: O Estado possui meios para interferir no pensamento? 
O Estado não pode interferir diretamente no pensamento, mas pode capturar as informações ou selecionar as que serão expostas, e desta maneira, controlar indiretamente aquilo que as pessoas pensam. Em outras palavras, ao direcionar as informações, o Estado induz as pessoas a um determinado tipo de pensamento, restringindo a liberdade de pensar.
b) Liberdade de manifestar o pensamento
A liberdade de manifestação é fundamental por permitir a livre competição no “mercado de ideias”. A livre competição no “mercado de ideias” é a melhor forma de se buscar a verdade, pois se uma ideia for inadequada, com o tempo ela será sufragada (uma verdade absoluta hoje, amanhã pode não mais ser). Por seu turno, se o Estado restringe quaisquer informações, dar-se-á margem a arbitrariedades.
O STF, em alguns precedentes, vem estabelecendo a “posição preferencial” (preferred position) da liberdade de expressão do pensamento (v.g. ADPF 130 – sobre a antiga lei de imprensa), ou seja, essa liberdade tem uma posição preferencial (“prima facie”, isto é, num primeiro momento) sobre os outros direitos. Nesse sentido, em regra, é melhor se assegurar a liberdade de manifestação do pensamento e depois, se houver abuso, a responsabilização, do que fazer uma censura prévia.[footnoteRef:113] Por mais que a responsabilização, às vezes, não cumpra o papel de retomar o status quo ante, esse é um risco inerente à vida em sociedade. [113: (MPGO-2019): Assinale a alternativa correta: Segundo entendimento do Supremo Tribunal Federal, a liberdade de imprensa tem, na Constituição Federal de 1988, característica de “sobredireito”, com precedência sobre a imagem, a honra, a intimidade e a vida privada, o que afasta a possibilidade de controle prévio, pelo Poder Judiciário, sobre o exercício de referida liberdade. BL: ADPF 130 (vide trecho marcado na ementa abaixo).
(TJSP-2015-VUNESP): Diante de informação relativa a iminente publicação de matéria considerada ofensiva à intimidade e à honra de autoridade pública em jornal local, nos termos definidos pelo STF no julgamento da ADPF 130/DF, é possível conceder ordem judicial que assegure, após configurado o dano causado à honra e à intimidade, a sua reparação. BL: ADPF 130.
##Atenção: ##STF: ##TRF4-2010: ##DPESP-2012: ##TJSP-2015: ##MPGO-2019: ##FCC: ##VUNESP: ARGUIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL. LEI DE IMPRENSA. ADEQUAÇÃO DA AÇÃO. REGIME CONSTITUCIONAL DA "LIBERDADE DE INFORMAÇÃO JORNALÍSTICA", EXPRESSÃO SINÔNIMA DE LIBERDADE DE IMPRENSA. (...) O art. 220 da Constituição radicaliza e alarga o regime de plena liberdade de atuação da imprensa, porquanto fala: a) que os mencionados direitos de personalidade (liberdade de pensamento, criação, expressão e informação) estão a salvo de qualquer restrição em seu exercício, seja qual for o suporte físico ou tecnológico de sua veiculação; b) que tal exercício não se sujeita a outras disposições que não sejam as figurantes dela própria, Constituição. A liberdade de informação jornalística é versada pela Constituição Federal como expressão sinônima de liberdade de imprensa. Os direitos que dão conteúdo à liberdade de imprensa são bens de personalidade que se qualificam como sobredireitos.Daí que, no limite, as relações de imprensa e as relações de intimidade, vida privada, imagem e honra são de mútua excludência, no sentido de que as primeiras se antecipam, no tempo, às segundas; ou seja, antes de tudo prevalecem as relações de imprensa como superiores bens jurídicos e natural forma de controle social sobre o poder do Estado, sobrevindo as demais relações como eventual responsabilização ou consequência do pleno gozo das primeiras. A expressão constitucional "observado o disposto nesta Constituição" (parte final do art. 220) traduz a incidência dos dispositivos tutelares de outros bens de personalidade, é certo, mas como consequência ou responsabilização pelo desfrute da "plena liberdade de informação jornalística" (§ 1º do mesmo art. 220 da Constituição Federal). Não há liberdade de imprensa pela metade ou sob as tenazes da censura prévia, inclusive a procedente do Poder Judiciário, pena de se resvalar para o espaço inconstitucional da prestidigitação jurídica. Silenciando a Constituição quanto ao regime da internet (rede mundial de computadores), não há como se lhe recusar a qualificação de território virtual livremente veiculador de ideias e opiniões, debates, notícias e tudo o mais que signifique plenitude de comunicação.
Com o que a Lei Fundamental do Brasil veicula o mais democrático e civilizado regime da livre e plena circulação das ideias e opiniões, assim como das notícias e informações, mas sem deixar de prescrever o direito de resposta e todo um regime de responsabilidades civis, penais e administrativas. Direito de resposta e responsabilidades que, mesmo atuando a posteriori, infletem sobre as causas para inibir abusos no desfrute da plenitude de liberdade de imprensa. 5. PROPORCIONALIDADE ENTRE LIBERDADE DE IMPRENSA E RESPONSABILIDADE CIVIL POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. Sem embargo, a excessividade indenizatória é, em si mesma, poderoso fator de inibição da liberdade de imprensa, em violação ao princípio constitucional da proporcionalidade. (...). STF. Plenário. ADPF 130, Rel. Min. Carlos Britto, j. 30/4/09.
(PGEPA-2011): Na ADPF 130, o STF, por maioria, julgou pela total procedência da ação para o efeito de declarar a Lei federal 5.250/67 (“Lei de Imprensa”) como não recepcionada pela CF/88, entendendo que na ponderação entre os direitos fundamentais que dão conteúdo à liberdade de imprensa e o bloco dos direitos fundamentais à imagem, honra, intimidade e vida privada, deve ser dada precedência aos primeiros; cabendo a incidência a posteriori do segundo bloco para o efeito de assegurar o direito de resposta e assentar responsabilidades penal, civil e administrativa. BL: ADPF 130.] 
Vejamos o seguinte precedente do STF:
STF - Rcl 18.638 MC/CE: [...] 33. A conclusão a que se chega, portanto, é a de que o interesse público na divulgação de informações – reiterando-se a ressalva sobre o conceito já pressupor a satisfação do requisito da verdade subjetiva – é presumido. A superação dessa presunção, por algum outro interesse, público ou privado, somente poderá ocorrer, legitimamente, nas situações-limite, excepcionalíssimas, de quase ruptura do sistema (...) Como regra geral, não se admitirá a limitação de liberdade de expressão e de informação, tendo-se em conta a já mencionada posição preferencial (preferred position) de que essas garantias gozam. (g.n.).
A questão recentemente foi objeto de análise pelo STF, em julgado da 1ª Turma, veiculado no Info 893, vejamos:
STF - O STF tem sido mais flexível na admissão de reclamação em matéria de liberdade de expressão, em razão da persistente vulneração desse direito na cultura brasileira, inclusive por via judicial. No julgamento da ADPF 130, o STF proibiu enfaticamente a censura de publicações jornalísticas, bem como tornou excepcional qualquer tipo de intervenção estatal na divulgação de notícias e de opiniões. A liberdade de expressão desfruta de uma posição preferencial no Estado democrático brasileiro, por ser uma pré-condição para o exercício esclarecido dos demais direitos e liberdades. A retirada de matéria de circulação configura censura em qualquer hipótese, o que se admite apenas em situações extremas. Assim, em regra, a colisão da liberdade de expressão com os direitos da personalidade deve ser resolvida pela retificação, pelo direito de resposta ou pela reparação civil. Diante disso, se uma decisão judicial determina que se retire do site de uma revista determinada matéria jornalística, esta decisão viola a orientação do STF, cabendo reclamação. STF. 1ª Turma. Rcl 22328/RJ, Rel. Min. Roberto Barroso, j. 6/3/18 (Info 893).[footnoteRef:114][footnoteRef:115] [114: Igualmente, vejamos o teor do julgado veiculado no Info 905, STF (Fonte: DOD): Uma decisão judicial determinou a retirada de matéria de “blog” jornalístico, bem como a proibição de novas publicações, por haver considerado a notícia ofensiva à honra de delegado da polícia federal. Essa decisão afronta o que o STF decidiu na ADPF 130/DF, que julgou não recepcionada a Lei de Imprensa. A ADPF 130/DF pode ser utilizada como parâmetro para ajuizamento de reclamação que verse sobre conflito entre a liberdade de expressão e de informação e a tutela das garantias individuais relativas aos direitos de personalidade. A determinação de retirada de matéria jornalística afronta a liberdade de expressão e de informação, além de constituir censura prévia. Essas liberdades ostentam preferência em relação ao direito à intimidade, ainda que a matéria tenha sido redigida em tom crítico. O STF assumiu, mediante reclamação, papel relevante em favor da liberdade de expressão, para derrotar uma cultura censória e autoritária que começava a se projetar no Judiciário. STF. 1ª Turma. Rcl 28747/PR, Rel. Min. Alexandre de Moraes, red. p/ ac. Min. Luiz Fux, j. 5/6/18 (Info 905).] [115: ##Atenção: Tema cobrado na prova da DPEDF-2019 (CESPE).] 
Assim, embora não haja hierarquia entre direitos fundamentais, a liberdade de expressão (aqui entendida em sentindo amplo) possui uma posição preferencial (preferred position) em relação aos demais direitos. Isso significa que o afastamento da liberdade de expressão é excepcional, e o ônus argumentativo é de quem sustenta o direito oposto. Como consequência disso, deve-se fazer uma análise muito rigorosa, criteriosa e excepcional de toda e qualquer medida que tenha por objetivo restringir a liberdade de expressão.[footnoteRef:116] [116: (MPF-2012): Assinale a alternativa correta: De acordo com a jurisprudência do STF. a liberdade de expressão ocupa uma posição especial no sistema constitucional brasileiro, o que lhe atribui peso abstrato elevado em hipótese de colisão com outros direitos fundamentais ou interesses sociais.] 
##Obs.: O fato de a liberdade de manifestação ter uma posição preferencial, não significa que é um direito absoluto (o que não existe). Portanto, esse direito não prevalecerá sempre e em qualquer caso. A própria CF/88 impõe alguns limites ou qualificações à liberdade de expressão, como por exemplo:
a) vedação do anonimato (art. 5º, IV);
b) direito de resposta (art. 5º, V);
c) restrições à propaganda comercial de tabaco, bebidas alcoólicas, agrotóxicos e terapias (art. 220, § 4º);
d) classificação indicativa (art. 21, XVI); e
e) dever de respeitar a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas (art. 5º, X).
 
Isso significa que é indispensável que haja uma ponderação entre a liberdade de expressão e os direitos da personalidade.
##Obs.: Ponderação entre liberdade de expressão e os direitos da personalidade: [footnoteRef:117] Tanto a liberdade de expressão como os direitos de privacidade, honra e imagem têm estatura constitucional. Vale dizer: entre eles não há hierarquia. De modo que não é possível estabelecer, em abstrato, qual deve prevalecer. Em caso de conflito entre normas dessa natureza, impõe-se a necessidade de ponderação, que, como se sabe, é uma técnica de decisão que se desenvolve em três etapas: [117: ##Atenção: Tema cobrado na prova do MPRO-2017 (FMP).] 
1) na primeira, verificam-se as normasque postulam incidência ao caso;
2) na segunda, selecionam-se os fatos relevantes;
3) e, por fim, testam-se as soluções possíveis para verificar, em concreto, qual delas melhor realiza a vontade constitucional.
 
Em um cenário ideal, a ponderação deve procurar fazer concessões recíprocas, preservando o máximo possível dos direitos em disputa. No limite, porém, fazem-se escolhas. Todo esse processo intelectual tem como fio condutor o princípio instrumental da proporcionalidade ou razoabilidade.
 
##Obs.: Critérios para a ponderação entre a liberdade de expressão e os direitos da personalidade: O Min. Roberto Barroso defende a aplicação de 8 critérios ou elementos a serem considerados na ponderação entre a liberdade de expressão e os direitos da personalidade. São eles:
a) veracidade do fato: a notícia divulgada deve ser verdadeira. Isso porque a informação que goza de proteção constitucional é a verdadeira. A divulgação deliberada de uma notícia falsa, em detrimento de outrem, não constitui direito fundamental do emissor. Os veículos de comunicação têm o dever de apurar, com boa-fé e dentro de critérios de razoabilidade, a correção do fato ao qual darão publicidade. É bem de ver, no entanto, que não se trata de uma verdade objetiva, mas subjetiva, subordinada a um juízo de plausibilidade e ao ponto de observação de quem a divulga. Para haver responsabilidade, é necessário haver clara negligência na apuração do fato ou dolo na difusão da falsidade.[footnoteRef:118]- [footnoteRef:119] [118: (TJBA-2019-CESPE): No que se refere à liberdade de expressão, à liberdade de imprensa e aos seus limites, assinale a opção correta: A publicação de informações falsas em veículos de comunicação social não está assegurada pela liberdade de imprensa. BL: Entend. doutrinário e jurisprudencial.
##Atenção: ##Doutrina: ##STJ: ##TJBA-2019: ##TJMA-2022: ##CESPE: ##Doutrina: De fato, esse é o entendimento da doutrina sobre o alcance do direito fundamental à liberdade de imprensa. A respeito, Mendes e Branco: “A informação falsa não seria protegida pela Constituição, porque conduziria a uma pseudo‐operação da formação da opinião”. Assinala‐se a função social da liberdade de informação de “colocar a pessoa sintonizada com o mundo que a rodeia (...), para que possa desenvolver toda a potencialidade da sua personalidade e, assim, possa tomar as decisões que a comunidade exige de cada integrante”. Argumenta ‐se que, “para se exercitar o direito de crônica, que está intimamente conexo com o de receber informações, será mister que se atenda ao interesse da coletividade de ser informada, porque através dessas informações é que se forma a opinião pública, e será necessário que a narrativa retrate a verdade”. Cabe recordar que o direito a ser informado – e não o é quem recebe notícias irreais – tem também raiz constitucional, como se vê do art. 5º, XIV, da CF.” (MENDES, Gilmar e BRANCO, Paulo. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva, 2017, p. 242). ##STJ: “ (...) 1. Conforme se extrai do voto da Ministra Cármen Lúcia, relatora da ADI 4.815/DF, “o dever de respeito ao direito do outro conduz ao de responder nos casos em que, mesmo no exercício de direito legitimamente posto no sistema jurídico, se exorbite causando dano a terceiro. Quem informa e divulga informação responde por eventual excesso, apurado por critério que demonstre dano decorrente da circunstância de ter sido ultrapassada esfera garantida de direito do outro". 2. A liberdade de imprensa - embora amplamente assegurada e com proibição de controle prévio - acarreta responsabilidade a posteriori pelo eventual excesso e não compreende a divulgação de especulação falsa, cuja verossimilhança, no caso, sequer se procurou apurar. 4. Gera dano moral indenizável a publicação de notícia sabidamente falsa, amplamente divulgada, a qual expôs a vida íntima e particular dos envolvidos. 5. Nos termos da jurisprudência do STJ, admite-se a revisão do valor fixado a título de condenação por danos morais quando este se mostrar ínfimo ou exagerado, ofendendo os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade. Hipótese em que o valor foi estabelecido na instância ordinária de forma desproporcional à gravidade dos fatos. 6. Recurso especial a que se dá parcial provimento. STJ. 4ª T., REsp 1582069/RJ, Rel. Min. Marco Buzzi, Rel. p/ Ac. Min. Maria Isabel Gallotti, j. 16/2/17. (...) Cumpre destacar ainda o trecho da decisão monocrática da Min. Maria Isabel Gallotti, “(...) A liberdade de imprensa – embora amplamente assegurada e com proibição de controle prévio – acarreta responsabilidade a posteriori pelo eventual excesso e não compreende a divulgação de especulação falsa, cuja verossimilhança, no caso”. STJ. AREsp 1265555. Decisão Monocrática. Min. Isabel Gallotti. Data de Publicação em 18/05/2018.] [119: ##Atenção: Tema cobrado na prova do TJMA-2022 (CESPE).] 
 
b) licitude do meio empregado na obtenção da informação: o conhecimento acerca do fato que se pretende divulgar tem de ter sido obtido por meios admitidos pelo direito. A Constituição, da mesma forma que veda a utilização, em juízo, de provas obtidas por meios ilícitos, também proíbe a divulgação de notícias às quais se teve acesso mediante cometimento de um crime. Se o jornalista ou alguém empreitado pelo veículo de comunicação realizou, por exemplo, uma interceptação telefônica clandestina, invadiu domicílio, violou o segredo de justiça em um processo de família ou obteve uma informação mediante tortura ou grave ameaça, sua divulgação, em princípio, não será legítima. Note-se ainda que a circunstância de a informação estar disponível em arquivos públicos ou poder ser obtida por meios regulares e lícitos torna-a pública e, portanto, presume-se que a divulgação desse tipo de informação não afeta a intimidade, a vida privada, a honra ou a imagem dos envolvidos.
 
c) personalidade pública ou privada da pessoa objeto da notícia: a depender se a pessoa for uma personalidade pública ou privada, o grau de exposição é maior ou menor.
 
d) local do fato: deve-se analisar também se os locais dos fatos narrados são reservados ou protegidos pelo direito à intimidade.
 
e) natureza do fato: deve-se analisar se os fatos divulgados possuem caráter sigiloso ou se estão relacionados com a intimidade da pessoa.
 
f) existência de interesse público na divulgação em tese: presume-se, como regra geral, o interesse público na divulgação de qualquer fato verdadeiro.
 
g) existência de interesse público na divulgação de fatos relacionados com a atuação de órgãos públicos.
h) preferência por sanções a posteriori, que não envolvam a proibição prévia da divulgação: o uso abusivo da liberdade de expressão pode ser reparado por mecanismos diversos, que incluem a retificação, a retratação, o direito de resposta, a responsabilização civil ou penal e a proibição da divulgação. Somente em hipóteses extremas se deverá utilizar a última possibilidade. Nas questões envolvendo honra e imagem, por exemplo, como regra geral será possível obter reparação satisfatória após a divulgação, pelo desmentido – por retificação, retratação ou direito de resposta – e por eventual reparação do dano, quando seja o caso.
##Atenção: ##STF: ##DOD: Segundo o STF, é inconstitucional o § 1º do art. 4º da Lei nº 9.612/98[footnoteRef:120]. Esse dispositivo proíbe, no âmbito da programação das emissoras de radiodifusão comunitária, a prática de proselitismo, ou seja, a transmissão de conteúdo tendente a converter pessoas a uma doutrina, sistema, religião, seita ou ideologia. O STF entendeu que essa proibição afronta os arts. 5º, IV, VI e IX, e 220, da Constituição Federal. A liberdade de pensamento inclui o discurso persuasivo, o uso de argumentos críticos, o consenso e o debate público informado e pressupõe a livre troca de ideias e não apenas a divulgação de informações. STF. Plenário. ADI 2566/DF, rel. orig. Min. Alexandre de Moraes, red. p/ o ac. Min. Edson Fachin, j. 16/5/2018 (Info 902). [120: Lei 9.612/98, art. 4º. (...) §1º É vedado o proselitismo de qualquer naturezana programação das emissoras de radiodifusão comunitária.] 
2.4.1.2. Restrições
Em determinadas hipóteses, a manifestação do pensamento pode atingir direitos fundamentais de terceiros, tais como a honra e a imagem (CF, art. 5º , X), razão pela qual a identificação de quem emitiu o juízo é necessária, a fim de que seja viabilizada eventual responsabilização nos casos de manifestação abusiva.
A CF/88 indica expressamente a vedação do anonimato (art. 5º, IV da CF/88), a qual possui basicamente duas finalidades: 1) a de evitar, de forma preventiva, manifestações abusivas do pensamento e; 2) a de permitir, de forma repressiva, o exercício do direito de resposta (um direito autônomo) e a responsabilização civil e/ou penal (CF, art. 5º, V: “é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem”). Quanto à matéria divulgada, publicada ou transmitida por veículo de comunicação social, o direito de resposta ou de retificação do ofendido está regulamentado pela Lei nº 13.188/2015.
Sendo assim, em regra, a vedação do anonimato impede utilização de denúncias anônimas ou bilhetes apócrifos como fundamento para a instauração de inquérito policial ou como prova processual lícita (art. 5.º, LVI, CF).[footnoteRef:121] [121: ##Atenção: Tema cobrado nas provas: i) MPDFT-2011; ii) MPRR-2017 (CESPE).] 
· Exceção1: A denúncia autônoma em si não é considerada como fonte de prova, mas é considerada uma notitia criminis autônoma em relação à prova obtida posteriormente através de uma investigação. Essa investigação, por sua vez, não fica contaminada pela denúncia. Vejamos:
STF - Inq 1.957 (voto do Min. Celso de Mello): Nada impede, contudo, que o Poder Público, provocado por delação anônima (v.g. “disque-denúncia”), adote medidas informais destinadas a apurar, previamente, em averiguação sumária, ‘com prudência e discrição’, a possível ocorrência de eventual situação de ilicitude penal, desde que o faça com o objetivo de conferir a verossimilhança dos fatos nela denunciados em ordem a promover, então, em caso positivo, a formal instauração da ‘persecutio criminis’, mantendo-se, assim, completa desvinculação desse procedimento estatal em relação às peças apócrifas”. (g.n.).
· Exceção2: O bilhete ou escrito apócrifo, quando produzido pelo próprio acusado (v.g. bilhete enviado pelo acusado pedindo o preço do resgate pelo sequestro) ou quando ele constituir o corpo de delito do crime (v.g. carta apócrifa em que haja um crime contra a honra de alguém) podem ser considerados fontes de prova.
##Obs.: Dentre as restrições constitucionais indiretas, podem ser mencionadas, ainda, as punições legalmente estabelecidas para os casos de discriminação atentatória dos direitos e liberdades fundamentais (CF, art. 5º , XLI - a lei punirá qualquer discriminação atentatória dos direitos e liberdades fundamentais) e de prática de racismo (CF, art. 5º , XLII - a prática do racismo constitui crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de reclusão, nos termos da lei). Ambos os dispositivos consagram hipóteses de reserva legal qualificada. A Lei 7.716/1989, que define os crimes resultantes de preconceito de raça ou de cor, estabelece pena de reclusão de um a três anos e multa para quem "praticar, induzir ou incitar a discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional" (art. 20).
No julgamento do Caso Ellwanger, considerado um dos mais importantes precedentes do STF sobre o tema, prevaleceu o entendimento de que "o preceito fundamental de liberdade de expressão não consagra o 'direito à incitação ao racismo', dado que um direito individual não pode constituir-se em salvaguarda de condutas ilícitas, como sucede com os delitos contra a honra". O Tribunal, ao fixar a prevalência dos princípios da dignidade da pessoa humana e da igualdade jurídica, deixou consignado que as liberdades públicas, por não serem incondicionais, devem ser exercidas de maneira harmônica, observados os limites definidos na própria Constituição. Vejamos trecho desse histórico julgado:
(...) 1. Escrever, editar, divulgar e comerciar livros "fazendo apologia de idéias preconceituosas e discriminatórias" contra a comunidade judaica (Lei 7716/89, artigo 20, na redação dada pela Lei 8081/90) constitui crime de racismo sujeito às cláusulas de inafiançabilidade e imprescritibilidade (CF, artigo 5º, XLII). (...)[footnoteRef:122] [122: (MPT-2013): No que concerne aos direitos e garantias fundamentais, considerando-se o texto constitucional e a jurisprudência do STF, assinale a alternativa correta: Escrever, divulgar e comercializar livros fazendo apologia de ideias preconceituosas e discriminatórias contra a comunidade judaica constitui crime de racismo sujeito às cláusulas de inafiançabilidade e imprescritibilidade.] 
6. Adesão do Brasil a tratados e acordos multilaterais, que energicamente repudiam quaisquer discriminações raciais, aí compreendidas as distinções entre os homens por restrições ou preferências oriundas de raça, cor, credo, descendência ou origem nacional ou étnica, inspiradas na pretensa superioridade de um povo sobre outro, de que são exemplos a xenofobia, "negrofobia", "islamafobia" e o anti-semitismo.
(...) 13. Liberdade de expressão. Garantia constitucional que não se tem como absoluta. Limites morais e jurídicos. O direito à livre expressão não pode abrigar, em sua abrangência, manifestações de conteúdo imoral que implicam ilicitude penal. [footnoteRef:123] [123: (PGEPA-2011): No HC 82424-2 – “Caso Ellwanger” –, o STF julgou pedido de “habeas corpus” em favor de editor de obras que veiculavam ideias supostamente antissemitas. Analise as proposições abaixo e assinale a alternativa correta: A ordem de “habeas corpus” foi indeferida com fundamento, entre outros, de que o direito à liberdade de expressão não pode abrigar, em sua abrangência, manifestações de conteúdo imoral que implicam em ilicitude penal. ] 
14. As liberdades públicas não são incondicionais, por isso devem ser exercidas de maneira harmônica, observados os limites definidos na própria Constituição Federal (CF, artigo 5º, § 2º, primeira parte). O preceito fundamental de liberdade de expressão não consagra o "direito à incitação ao racismo", dado que um direito individual não pode constituir-se em salvaguarda de condutas ilícitas, como sucede com os delitos contra a honra. Prevalência dos princípios da dignidade da pessoa humana e da igualdade jurídica. [footnoteRef:124] (...) STF. Plenário. HC 82424, Relator p/ Ac. Min. Maurício Corrêa, j. 17/09/03.[footnoteRef:125] [124: ##Atenção: Tema cobrado nas provas: i) MPRR-2017 (CESPE); ii) DPEAL-2017 (CESPE); iii) MPMG-2019.] [125: ##Atenção: Tema cobrado na prova da DPEPR-2017 (FCC).] 
##Obs.: Tratando de temática semelhante ao Caso Ellewanger, citado acima, o STF julgou recentemente julgou o seguinte caso:
O direito à liberdade religiosa é, em grande medida, o direito à existência de uma multiplicidade de crenças/descrenças religiosas, que se vinculam e se harmonizam – para a sobrevivência de toda a multiplicidade de fés protegida constitucionalmente – na chamada tolerância religiosa. Há que se distinguir entre o discurso religioso (que é centrado na própria crença e nas razões da crença) e o discurso sobre a crença alheia, especialmente quando se faça com intuito de atingi-la, rebaixá-la ou desmerecê-la (ou a seus seguidores). Um é tipicamente a representação do direito à liberdade de crença religiosa; outro, em sentido diametralmente oposto, é o ataque ao mesmo direito. Como apontado pelo STJ no julgado recorrido, a conduta do paciente não consiste apenas na ‘defesa da própria religião, culto, crença ou ideologia, mas, sim, de um ataque ao culto alheio, que põe em risco a liberdade religiosa daqueles que professam fé diferente [d]a do paciente. A incitação ao ódio público contra quaisquer denominações religiosas e seus seguidores não está protegida pela cláusula constitucional que assegura a liberdade de expressão. Assim, é possível, adepender do caso concreto, que um líder religioso seja condenado pelo crime de racismo (art. 20, §2º, da Lei nº 7.716/81) por ter proferido discursos de ódio público contra outras denominações religiosas e seus seguidores. STF. 2ª Turma. RHC 146303/RJ, rel. Min. Edson Fachin, red. p/ o ac. Min. Dias Toffoli, j. 6/3/18 (Info 893).[footnoteRef:126] [126: (MPMG-2019): A propósito do direito ao reconhecimento, leia o texto a seguir: “É possível falar em um direito fundamental ao reconhecimento, que é um direito ao igual respeito da identidade pessoal. Trata-se de um direito que tem tanto uma faceta negativa como outra positiva. Em sua faceta negativa ele veda as práticas que desrespeitam as pessoas em sua identidade, estigmatizando-as. Na dimensão positiva, ele impõe ao Estado a adoção de medidas voltadas ao combate dessas práticas e à superação de estigmas existentes.” (SARMENTO, Daniel. Dignidade da pessoa humana. 2. ed. Belo Horizonte: Fórum, 2016. p. 257). De acordo com o posicionamento doutrinário acima, a assertiva seguinte harmoniza-se com o direito ao reconhecimento: Há que se distinguir entre o discurso religioso (que é centrado na própria crença e nas razões da crença) e o discurso sobre a crença alheia, especialmente quando feito com o intuito de atingi-la, rebaixá-la ou desmerecê-la (ou a seus seguidores). BL: Info 893, STF.] 
Ambos os julgados comentados acima envolveram o crime de racismo enquadrado no art. 20 da Lei 7.716/81. Diante disso, surge alguns questionamentos acerca da doutrina do “Hate Speech” (discurso do ódio):
##Questiona-se: No que compreende a doutrina do “Hate Speech” (Discurso do Ódio)? São “manifestações de pensamento que ofendam, ameacem ou insultem determinado grupo de pessoas com base na raça, cor, religião, nacionalidade, orientação sexual, ancestralidade, deficiência ou outras características próprias. (...) No direito norte-americano, prevalece o entendimento de que até o discurso de ódio (hate speech) inclui-se no âmbito de proteção da liberdade de expressão.” (BERNARDES, Juliano Taveira; FERREIRA, Olavo Augusto Vianna Alves. Direito Constitucional. Tomo II. 7ª ed. Salvador: Juspodivm, 2017, p. 128).
##Questiona-se: E no direito brasileiro, a doutrina do “Hate Speech” (Discurso do Ódio) é aceita? No Brasil, ao contrário dos EUA, prevalece que o hate speech não é protegido pela ordem constitucional. Isso porque o direito à liberdade de expressão não é absoluto, podendo a pessoa que proferiu o discurso de ódio ser punida, inclusive criminalmente, em caso de abuso. Esse tem sido, por exemplo, o entendimento das bancas examinadoras:
· (PGERS-2015-FUNDATEC): Ao tratar do alcance da liberdade de expressão em relação ao chamado “discurso do ódio” (“hate speech”), o STF sustentou que o direito à liberdade de expressão é um direito relativo, objeto de ponderação, à luz dos princípios da dignidade humana, proporcionalidade e razoabilidade, não podendo acolher a incitação ao ódio racial ou religioso. (certo)
##Atenção: Situação deve ser analisada com base no caso concreto: Assim, podemos concluir que é possível a condenação de um líder religioso pelo crime de racismo (art. 20, §2º, da Lei nº 7.716/81) em caso de discursos de ódio público contra outras denominações religiosas e seus seguidores. Vale ressaltar, no entanto, que essa condenação dependerá do caso concreto, ou seja, das palavras que foram proferidas e da intenção do líder religioso de suprimir ou reduzir a dignidade daquele que é diferente de si. Desse modo, não é qualquer crítica de um líder religioso a outras religiões que configurará o crime de racismo. Nesse sentido, recentemente o STF absolveu um líder religioso dessa imputação por falta de dolo. Relembre:
Determinado padre escreveu um livro, voltado ao público da Igreja Católica, no qual ele faz críticas ao espiritismo e a religiões de matriz africana, como a umbanda e o candomblé. O Ministério Público da Bahia ofereceu denúncia contra ele pela prática do art. 20, § 2º da Lei nº 7.716/89 (Lei do racismo). No caso concreto, o STF entendeu que não houve o crime. A CF/88 garante o direito à liberdade religiosa. Um dos aspectos da liberdade religiosa é o direito que o indivíduo possui de não apenas escolher qual religião irá seguir, mas também o de fazer proselitismo religioso. Proselitismo religioso significa empreender esforços para convencer outras pessoas a também se converterem à sua religião. Desse modo, a prática do proselitismo, ainda que feita por meio de comparações entre as religiões (dizendo que uma é melhor que a outra) não configura, por si só, crime de racismo. Só haverá racismo se o discurso dessa religião supostamente superior for de dominação, opressão, restrição de direitos ou violação da dignidade humana das pessoas integrantes dos demais grupos. Por outro lado, se essa religião supostamente superior pregar que tem o dever de ajudar os "inferiores" para que estes alcancem um nível mais alto de bem-estar e de salvação espiritual e, neste caso não haverá conduta criminosa. Na situação concreta, o STF entendeu que o réu apenas fez comparações entre as religiões, procurando demonstrar que a sua deveria prevalecer e que não houve tentativa de subjugar os adeptos do espiritismo. Pregar um discurso de que as religiões são desiguais e de que uma é inferior à outra não configura, por si, o elemento típico do art. 20 da Lei nº 7.716/89. Para haver o crime, seria indispensável que tivesse ficado demonstrado o especial fim de supressão ou redução da dignidade do diferente, elemento que confere sentido à discriminação que atua como verbo núcleo do tipo. STF. 1ª Turma. RHC 134682/BA, Rel. Min. Edson Fachin, julgado em 29/11/2016 (Info 849).
 
Desse modo, em concursos públicos deve-se ficar atento para a redação do enunciado.
Por fim, quanto à limitação do direito de expressão, o Min. Gilmar Mendes explica que “a Carta brasileira não adotou a fórmula alemã de prever, explicitamente, que a liberdade de expressão possa ser limitada por leis destinadas a proteger a juventude. Isso não impede que, no Brasil, sejam editadas leis, com o fito de preservar valores relevantes da juventude, restringindo a liberdade de expressão. Isso porque não são apenas aqueles bens jurídicos mencionados expressamente pelo constituinte (como a vida privada, a intimidade, a honra e a imagem) que operam como limites à liberdade de expressão. Qualquer outro valor abrigado pela Constituição pode entrar em conflito com essa liberdade, reclamando sopesamento, para que, atendendo ao critério da proporcionalidade, descubra­-se, em cada grupo de casos, qual princípio deve sobrelevar.” Desse modo, para a maioria dos ministros do STF, autoriza-se à lei infraconstitucional regular outros pontos não permitidos expressamente, pois é possível extrair da CF uma permissão que vise a garantir a unidade constitucional. Em outras palavras, a permissão para uma regulação mais ampla alicerça-se no fato de a liberdade de expressão confrontar-se com outros direitos fundamentais, sendo a lei um meio de harmonizar esse conflito na busca de efetivação dos princípios constitucionais.[footnoteRef:127] [127: (MPBA-2018): Sobre os direitos fundamentais em espécie positivados na Constituição Federal, tal qual interpretados pelo STF, responda: O direito fundamental à liberdade de expressão é passível de sofrer restrições por meio de lei, inclusive em hipóteses não previstas de modo expresso na Constituição Federal.] 
2.4.2. Liberdade de consciência, crença e culto
2.4.2.1. Âmbito de proteção
2.4.2.1.1. Definições
Há três diferentes liberdades consagradas no art. 5º, VI da CF/88:
CF/88, VI - é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias; 
a) Liberdade de consciência 
Trata-se da faculdade de aderir a certos valores morais ou espirituais, independentes de qualquer aspecto religioso.
A liberdade de consciência é a mais ampla das três a serem analisadas, poisabrange a liberdade de crer em algo, de não crer, ou de ter determinadas convicções que não possuam natureza religiosa (filosófica, política).
##Obs.: A liberdade de consciência abrange a liberdade de crença, que é uma liberdade mais restrita.
b) Liberdade de crença
Trata-se da faculdade de crer em conceitos sobrenaturais propostos por alguma religião ou revelação (teísmo), de acreditar na existência de um Deus, mas rejeitar qualquer espécie de revelação divina (deísmo) ou, ainda, de não ter crença em Deus algum (ateísmo).[footnoteRef:128] [128: (MPSP-2012): A Constituição Federal, ao consagrar a inviolabilidade de crença religiosa está também assegurando a proteção plena à liberdade de culto e as suas liturgias, bem como o direito de não acreditar ou professar nenhuma fé, devendo o Estado respeito ao ateísmo.] 
A liberdade de crença possui tanto um aspecto positivo (acreditar em algo) quanto um aspecto negativo (não acreditar em nada).
c) Liberdade de culto (mais restrita de todas)
Trata-se da exteriorização da liberdade de crença, podendo ser exercida em locais privados ou abertos ao público. O culto é uma forma de exteriorizar aquilo em que o indivíduo acredita. 
Exemplos: procissão, culto ecumênico, missa em praça pública ou igreja.
Além de os templos gozarem de imunidade (art. 150, VI, b, CF), o culto poderá ser exercido em outros locais, sejam eles privados e públicos. 
##Atenção: ##STF: ##Info 935: ##DOD: É constitucional a lei de proteção animal que, a fim de resguardar a liberdade religiosa, permite o sacrifício ritual de animais em cultos de religiões de matriz africana. STF. Plenário. RE 494601/RS, rel. orig. Min. Marco Aurélio, red. p/ o ac. Min. Edson Fachin, j. 28/3/19 (Info 935).
##Comentário sobre o julgado acima: ##DOD: O princípio da laicidade significa dizer que o Estado brasileiro é laico (secular ou não-confessional), ou seja, não existe nele uma religião oficial (art. 19, I, da CF/88). Assim, por força deste princípio, o Estado não pode estar associado a nenhuma religião, nem sob a forma de proteção, nem de perseguição. Há, portanto, uma separação formal entre Igreja e Estado. O STF entendeu que, ao contrário do que alegou o MP/RS, a referida lei não viola o princípio da laicidade. A proteção legal às religiões de matriz africana não representa um privilégio, mas sim um mecanismo de assegurar a liberdade religiosa, mantida a laicidade do Estado. Desse modo, a lei estadual, na verdade, está de acordo com o princípio da laicidade. Isso porque a laicidade do Estado proíbe que haja o menosprezo ou a supressão de rituais, especialmente no caso de religiões minoritárias que poderiam ser subjugadas pelo Estado.
##Comentário sobre o julgado acima: ##DOD: Além disso, não há violação ao princípio da igualdade: A CF promete uma sociedade livre de preconceitos, entre os quais, o religioso. A proibição do sacrifício de animais em seus cultos negaria a própria essência da pluralidade cultural, com a consequente imposição de determinada visão de mundo. Ao se conferir uma proteção aos cultos de religiões historicamente estigmatizadas, o legislador não ofende o princípio da igualdade. Ao contrário, materializa esse princípio diante do preconceito histórico sofrido.
##Comentário sobre o julgado acima: ##DOD: Por fim, não há violação ao art. 225 da CF/88: O legislador, ao admitir a prática de imolação (sacrifício), não violou o dever constitucional de amparo aos animais, estampado no art. 225, § 1º, VII, da CF/88. Isso porque se deve evitar que a tutela de um valor constitucional relevante (meio ambiente) aniquile o exercício de um direito fundamental (liberdade de culto), revelando-se desproporcional impedir todo e qualquer sacrifício religioso quando diariamente a população consome carnes de várias espécies. Além disso, deve-se reforçar o argumento de que os animais sacrificados nestes cultos são abatidos de forma rápida, mediante degola, de sorte que a realização dos rituais religiosos com estes animais não se amolda ao art. 225, § 1º, VII, que proíbe práticas cruéis com animais.
##Parêntese: Lembrar que nenhum direito é absoluto. Portanto, é necessário analisar se o direito à liberdade de culto não colide com outro direito fundamental (v.g. liberdade de locomoção, descanso, silêncio).
Observação geral: Essas três liberdades estão consagradas na CF, art. 5º, VI: “é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias”. 
Além disto, o inciso VII: “é assegurada, nos termos da lei, a prestação de assistência religiosa nas entidades civis e militares de internação coletiva”.
2.4.2.1.2. Objeção de consciência (escusa de consciência ou imperativo de consciência)
CF, art. 5º, VIII: ninguém será privado de direitos por motivo de crença religiosa ou de convicção filosófica ou política, salvo se as invocar para eximir-se de obrigação legal a todos imposta e recusar-se a cumprir prestação alternativa, fixada em lei.[footnoteRef:129] [129: (MPBA-2018): O brasileiro que se recusa a cumprir prestação alternativa legalmente estabelecida, após ter invocado convicção política para eximir-se de obrigação legal a todos imposta, poderá, em razão dessa conduta, ser privado de direitos. BL: art. 5º, VIII, CF.
OBS: A pessoa tem direito a não cumprir a obrigação imposta por motivos de consciência sem que isso a prive de direitos. Entretanto, ela há de cumprir a obrigação alternativa, caso contrário, poderá sim ser privada de direitos.] 
	##Questiona-se: A prestação alternativa fixada em lei consubstancia penalidade imposta à pessoa que se exime de cumprir uma obrigação legal imposta a todos?
Não, pois ela trata da possibilidade do indivíduo não violar a sua própria consciência. Se não existir lei fixando a prestação alternativa, o sujeito não pode ser obrigado a cumprir a obrigação legal a todos imposta.
Quando se fala em “obrigação legal imposta a todos” não significa que a obrigação legal tenha que ser imposta a todos os indivíduos da nação, mas sim a todos que se encontrem em determinada situação. 
Ex.1: O voto é uma obrigação imposta a todos que possuem mais de dezoito anos e menos de setenta anos, exceto os analfabetos. 
Ex.2: O serviço militar é obrigatório para todos os homens (não para as mulheres), excetuando-se ainda os eclesiásticos.
Para se invocar essa liberdade de consciência, não basta que a pessoa simplesmente diga que aquilo é incompatível com o que ela acredita. A escusa de consciência deve ser relacionada a algo fortemente arraigado na consciência do indivíduo, dentro de um determinado contexto social ou cultura.
Ex.1: Peiote em cultos religiosos → embora este produto tenha o consumo proibido por lei em razão de ser entorpecente, tanto no Brasil quanto nos EUA, a lei ressalva a sua utilização dentro de celebrações religiosas. Nesse contexto, o chá não serve para ficar doidão, mas sim da utilização desta planta medicinal há muitos anos em cultos religiosos, como forma de tradição cultural.
Ex.2: Café holandês que se transformou na “igreja dos adoradores da fumaça, do fogo e das cinzas”, para burlar a legislação holandesa que proibia o fumo em locais fechados. Neste caso, há uma clara intenção de burlar a legislação, pois a ideia foi apenas poder fumar em locais fechados quando tal prática é proibida. Portanto, não se admite a escusa de consciência para hipóteses como essa, pois não há uma tradição arraigada no contexto do fumo.
Se o indivíduo se recusar a cumprir a obrigação legal imposta a todos e também se recusar a cumprir a prestação alternativa fixada em lei (recusa dupla), poderá sofrer a sanção de perda ou suspensão de direitos políticos, nos termos do art. 15, IV da CF:
CF, art. 15: É vedada a cassação de direitos políticos, cuja perda ou suspensão só se dará nos casos de: (...).
IV - recusa de cumprir obrigação a todos imposta ou prestação alternativa, nos termos do art. 5º, VIII.
##Obs.: Há divergência acerca da natureza jurídica dapenalidade em caso de recusa dupla. Parcela da doutrina entende tratar-se de suspensão, pois quem recusou pode readquirir esses direitos. Porém, a maioria da doutrina constitucionalista entende que a hipótese é de perda.
Exemplos em que a escusa de consciência pode ou não ser alegada:
a) Serviço militar obrigatório
CF, art. 143, § 1º: Às Forças Armadas compete, na forma da lei, atribuir serviço alternativo aos que, em tempo de paz, após alistados, alegarem imperativo de consciência, entendendo-se como tal o decorrente de crença religiosa e de convicção filosófica ou política, para se eximirem de atividades de caráter essencialmente militar. (…)
§ 2º: As mulheres e os eclesiásticos ficam isentos do serviço militar obrigatório em tempo de paz, sujeitos, porém, a outros encargos que a lei lhes atribuir.
Inicialmente, o imperativo de consciência somente é admissível em tempo de paz. Por outro lado, em tempo de guerra, a lei não admite que se alegue imperativo de consciência para se eximir. Esse impedimento não viola uma cláusula pétrea, pois se trata de uma norma originária da CF e não se admite no Brasil normas originárias inconstitucionais. Portanto, a regra geral é que se pode alegar escusa de consciência; a exceção é que em tempos de guerra ela não pode ser alegada.
Ademais, esta obrigação do serviço militar obrigatório não é para todos, excluindo-se as mulheres e os eclesiásticos. Importante notar que essa exclusão apenas ocorre em tempos de paz, aplicando-se a ressalva retro. Mesmo em tempo de paz, mulheres e eclesiásticos podem ser obrigados a outros encargos que a lei lhes atribuir. Em outras palavras, nos termos da lei, o serviço militar será obrigatório a todos os brasileiros, com exceção das mulheres e eclesiásticos, em tempo de paz. Todavia, em caso de mobilização, ambos ficarão sujeitos aos encargos relacionados com a defesa nacional, de acordo com suas aptidões, consoante dispõe o art. 143, §2º, CF.
Portanto, a escusa de consciência, prevista no art. 5º, VIII da CF, poderá ser invocada, em tempo de paz, para que o alistado possa se eximir das atividades de caráter essencialmente militar, nos termos do art. 143, § 1º da CF. Por se tratar de uma obrigação legal imposta a todos, terá que cumprir prestação alternativa, fixada em lei. Em caso de descumprimento, poderá haver suspensão dos direitos políticos, consoante dispõe o art. 15, IV da CF.[footnoteRef:130] [130: (TRF5-2011-CESPE): Com relação à defesa do Estado e das instituições democráticas e aos direitos políticos, assinale a opção correta: Apesar de a prestação de serviço militar ser obrigatória, a recusa em cumpri-la é admitida sob a alegação do direito de escusa de consciência, cabendo, nesse caso, às forças armadas atribuir àquele que exercer esse direito serviço alternativo em tempo de paz, cuja recusa enseja como sanção a declaração da perda dos direitos políticos. BL: art. 143, caput e §1º, CF c/c art. 15, IV, CF.] 
A regulamentação citada pelo § 1º está contida na Lei n. 8.239/91, art. 3º, § 2º, que dispõe sobre a prestação de serviço alternativo obrigatório, vejamos: “Entende-se por Serviço Alternativo o exercício de atividades de caráter administrativo, assistencial, filantrópico ou mesmo produtivo, em substituição às atividades de caráter essencialmente militar”. 
b) Voto
O voto é obrigatório aos maiores de dezoito anos e menores de setenta, com exceção dos analfabetos.
	##Questiona-se: Uma pessoa pode alegar a escusa de consciência para se eximir do alistamento obrigatório e do voto?
Segundo o TRF 1, o fato de a pessoa ser obrigada a comparecer à votação não viola a sua liberdade de consciência, pois ela não é obrigada a votar em determinado candidato. Há opção de votar em branco ou nulo. Portanto, a obrigação tem caráter meramente formal. 
TRF1 - AC 16.203: [...] 2. Não pode o autor eximir-se de comparecer à votação expondo como argumento a inviolabilidade da liberdade de consciência e a privação de direitos referentes à convicção filosófica ou política (art. 5.º, VI e VIII, da CF/88), pois aos brasileiros alfabetizados, maiores de dezoito e menores de setenta anos, o voto é obrigatório, conforme art. 14, § 1.º, I, da Constituição Federal. 3. A obrigatoriedade de votar é formal, logo a liberdade está garantida pela faculdade do cidadão de votar em branco ou anular seu voto. 4. Os pedidos de declaração da inexistência de obrigatoriedade do voto e da desnecessidade de justificação ou cumprimento de prestação alternativa são juridicamente impossíveis em face do ordenamento constitucional (art. 14, § 1.º, I da CF/1988). 5. Apelação improvida.
c) Certames (v.g. concursos, ENEM, vestibular, de faculdade, etc.)
	##Questiona-se: Se uma prova cai em algum dia sagrado e/ou de guarda, no qual a pessoa reserva para adorar seu Deus (v.g. shabat – período do pôr do sol de sexta-feira ao pôr do sol de sábado), a pessoa pode alegar imperativo de consciência para não fazer a prova no dia?
O ideal é que os interesses em jogo sejam conciliados, dando-se à pessoa a oportunidade de assistir a aula em outra turma e/ou fazer prova com outra turma ou outro semestre. No caso de prova, a título de alternativa, caso a prova caia em algum dia de guarda de determinada religião, a pessoa poderá ficar isolada em um determinado local, incomunicável, até passar o período. Desse modo, a pessoa não é prejudicada e não leva vantagem em relação aos demais.
##Obs.: O julgado abaixo não serve de precedente geral sobre o tema por tratar de situação bastante específica, pois nesse caso, no ato da inscrição era possível colocar a ressalva em relação ao dia quando do preenchimento do formulário. Os que ajuizaram esta ação não haviam preenchido o item em questão. Vejamos:
STF - 389 AgR/MG: [...] 2. Pedido de restabelecimento dos efeitos da decisão do Tribunal a quo que possibilitaria a participação de estudantes judeus no Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM) em data alternativa ao Shabat 3. Alegação de inobservância ao direito fundamental de liberdade religiosa e ao direito à educação. [...] 5. Em mero juízo de delibação, pode-se afirmar que a designação de data alternativa para a realização dos exames não se revela em sintonia com o principio da isonomia, convolando-se em privilégio para um determinado grupo religioso [...]; 7. Pendência de julgamento das Ações Diretas de Inconstitucionalidade nº 391 e nº 3.714, nas quais esta Corte poderá analisar o tema com maior profundidade. 8. Agravo Regimental conhecido e não provido.
2.4.2.2. Dever de neutralidade do Estado
Na Constituição brasileira de 1824, havia uma ligação entre igreja e Estado, sem uma separação tal qual conhecemos hoje. Antes do advento da República, a religião católica apostólica romana era a religião oficial, sendo as outras religiões permitidas apenas com seu culto doméstico ou particular em casas para este fim. Embora se admitisse que outras religiões pudessem ser exercidas, o exercício somente podia ocorrer em locais privados. Vejamos:
CPIB/1824, art. 5º: A Religião Catholica Apostolica Romana continuará a ser a Religião do Imperio. Todas as outras Religiões serão permitidas com seu culto domestico, ou particular em casas para isso destinadas, sem fórma alguma exterior do Templo.
Em 15 de novembro de 1889, ocorreu a Proclamação da República no Brasil e a República é conhecida como “o governo das razões”: o Estado e a igreja não podem se confundir. Portanto, foi necessário separar essas duas instituições, ou seja, uma separação total.
Em dispositivo parecido com o art. 19 da CF/88, vedou-se aos Estados estabelecer, subvencionar ou embaraçar o exercício de cultos religiosos. Outro dispositivo permitiu o exercício público e livre das confissões religiosas. Era reconhecido pelo Estado apenas o casamento civil, ou seja, o casamento religioso sequer era reconhecido. Os cemitérios, que antes pertenciam à igreja, passaram a ter caráter não religioso (secular) e passaram a ser administrados pela autoridade municipal. Por fim, nos estabelecimentos públicos não se permitia o ensino religioso.Vejamos:
CREUB/1891, art. 11: É vedado aos Estados, como à União: (…)
2º: estabelecer, subvencionar ou embaraçar o exercício de cultos religiosos. (...)
CREUB/1891, art. 72, (…) 
§ 3º: Todos os indivíduos e confissões religiosas podem exercer publica e livremente o seu culto.
§ 4º: A República só reconhece o casamento civil, cuja celebração será gratuita;
§ 5º: Os cemiterios terão caracter secular e serão administrados pela autoridade municipal, ficando livre a todos os cultos religiosos a pratica dos respectivos ritos em relação aos seus crentes, desde que não offendam a moral publica e as leis;
§ 6º: Será leigo o ensino ministrado nos estabelecimentos públicos;
§ 7º: Nenhum culto ou igreja gosará de subvenção official, nem terá relações de dependencia ou alliança com o Governo da União, ou o dos Estados. A representação diplomatica do Brasil junto á Santa Sé não implica violação deste principio.
Portanto, com a Proclamação da República e, mais especificamente, com o advento da Constituição de 1891 houve a consagração de um Estado laico, o qual permanece até hoje. As demais Constituições brasileiras, desde 1891, consagraram a laicidade do Estado brasileiro.
Assinale-se que essa forte reação ocorrida em 1981 foi equilibrada e, diante da importância do fenômeno religioso, passou-se a admitir algumas questões àquela época proibidas, como a possibilidade de ensino religioso em escolas públicas, o reconhecimento do casamento religioso para fins jurídicos, etc.
Atualmente, o dever de laicidade (neutralidade) está previsto expressamente no art. 19 da CF/88: 
Art. 19, CF: É vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
I - estabelecer cultos religiosos ou igrejas, subvencioná-los, embaraçar-lhes o funcionamento ou manter com eles ou seus representantes relações de dependência ou aliança, ressalvada, na forma da lei, a colaboração de interesse público; (...).[footnoteRef:131] [131: (PGERS-2015-FUNDATEC): O princípio da laicidade estatal: Veda ao Estado que estabeleça cultos religiosos ou igrejas, de forma a subvencioná-los, embaraçar-lhes o funcionamento ou manter com eles relações de dependência ou aliança, ressalvada a colaboração de interesse público. BL: art. 19, I, CF.
(MPF-2011): O princípio da laicidade do Estado impõe a neutralidade estatal em matéria religiosa, mas não é incompatível com a colaboração entre o Poder Público e representantes das igrejas e cultos religiosos que vise à promoção do interesse público. BL: art. 5º, VII, c/c art. 19, I, CF.] 
##Obs.: Não confundir laicidade, laicismo e ateísmo:
· Laicidade: significa a neutralidade do Estado brasileiro em relação ao fenômeno religioso. O Estado deve garantir simetricamente a liberdade religiosa sem favorecer determinadas religiões e sem prejudicar outras. 
A garantia simétrica da liberdade religiosa, segundo Habermas, é uma forma de desarmar o potencial conflituoso que existe entre as várias religiões e de assegurar o pluralismo religioso. Por conseguinte, o Estado laico não deve admitir argumentos religiosos na esfera pública. De acordo com o mesmo autor, os argumentos religiosos, para serem levados à esfera pública, devem sofrer uma “tradução institucional”, ou seja, devem ser traduzidos em argumentos racionalmente justificáveis para que possam ser admitidos e impostos a todos.
· Laicismo: é uma espécie de antirreligião, ou seja, trata-se de uma perspectiva refratária ao fenômeno religioso. O Estado brasileiro não é refratário ao fenômeno religioso. Pelo contrário, é amigo da religião (v.g. isenta os templos de culto), incentivando o fenômeno como algo que desempenha um papel social.
· Ateísmo: é a negativa da existência de Deus. Também não é o caso do Estado brasileiro.
	##Questiona-se: Os feriados católicos violam o dever de neutralidade do Estado?
Conforme a Constituição, os feriados existem para celebrar datas com caráter cultural não religioso. Muitos feriados possuem um caráter religioso, mas aliados a um caráter histórico e cultural muito forte, como o natal, a páscoa, o carnaval… A pretexto de assegurar a neutralidade do Estado, não faria sentido que estes feriados fossem extintos de nosso calendário. Porém há datas questionáveis, por exemplo a data da padroeira do Brasil. O ideal não é que todas as religiões tenham feriado, mas sim que nenhuma tenha feriados exclusivos para ela. Assinale-se que se trata de um tema muito polêmico.
	##Questiona-se: Quanto à colocação de símbolos religiosos em locais públicos, como os crucifixos colocados nos Tribunais do Júri e em escolas públicas, isso viola o dever de neutralidade do Estado? 
O CNJ entendeu que não viola o dever de neutralidade do Estado, pois os crucifixos são símbolos da cultura brasileira (mais do que símbolos religiosos).
Segundo Ronald Dworkin, “Em uma sociedade secular tolerante o Estado não deve estar oficialmente comprometido com o ateísmo nem com qualquer religião. Não deve tolerar qualquer referência ou insinuação religiosa ou antirreligiosa em cerimônias oficiais ou em declarações políticas. [...] Não deve considerar ilegal símbolos religiosos, mas também não deve instalar ou permitir que se instale tais símbolos em qualquer propriedade pública” (Ronald Dworkin. Is democracy possible here?: principles for a new political debate). Essa posição de Dworkin é também compartilhada por Marcelo Novelino.
2.4.2.3. Ensino religioso
No art. 210, §1º da CF/88, assim dispõe:
CF, Art. 210. Serão fixados conteúdos mínimos para o ensino fundamental, de maneira a assegurar formação básica comum e respeito aos valores culturais e artísticos, nacionais e regionais.
 1º - O ensino religioso, de matrícula facultativa, constituirá disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino fundamental.[footnoteRef:132] (...) [132: (TJSC-2015-FCC): É inconstitucional lei que proíba o ensino religioso como disciplina a ser ministrada nos horários normais das escolas públicas de ensino fundamental. BL: art. 210, §1º, CF.
(MPRS-2014): Considere a seguinte afirmação sobre Direitos Fundamentais: Uma das posições jusfundamentais que decorre do regime constitucional da liberdade religiosa é o direito subjetivo ao ensino religioso em escola pública de ensino fundamental. BL: art. 210, §1º, CF.
(DPERR-2013-CESPE): O ensino religioso deve existir obrigatoriamente nas escolas públicas de ensino fundamental, sem que tal circunstância caracterize afronta à liberdade de crença. BL: art. 210, §1º, CF.] 
Perceba, portanto, que tal ensino deverá obrigatoriamente existir nas escolas públicas, em que pese, conforme a dispõe a CF/88, com a matrícula facultativa, em respeito à liberdade religiosa que significa, inclusive a liberdade de não professar nenhuma religião.
Em relação ao conteúdo a ser ministrado, o ensino religioso poderá ser de três espécies: 
1) confessional: quando transmite os princípios e dogmas de uma determinada religião;
2) interconfessional: quando são ensinados os princípios comuns às várias religiões;
3) não confessional, quando voltado a uma visão expositiva das diversas religiões.
Cumpre registrar que a Lei de Diretrizes e Bases da Educação - LDB (Lei 9.394/96) que afirmava que o ensino religioso seria oferecido nas escolas públicas em caráter confessional ou interconfessional. Todavia, com a alteração legislativa trazida pela Lei 9.475/97, ficou estabelecido que os conteúdos do ensino religioso serão definidos após os sistemas de ensino ouvirem a entidade civil, constituída pelas diferentes denominações religiosas, consoante dispõe o §2º do art. 33 da LDB, , devendo ser assegurado o respeito à diversidade cultural religiosa do Brasil e vedadas quaisquer formas de proselitismo, tal como consta no caput do art. 33 da LDB, ou seja, de expressões de caráter dogmático que propiciem em discriminação social, cultural ou religiosa e que ameacem a igualdade e o reconhecimento entre as religiões. Vejamos o teor do art. 33 da LDB:
Art. 33. O ensino religioso, de matrícula facultativa, é parte integrante da formação básica do cidadão e constitui disciplinados horários normais das escolas públicas de ensino fundamental, assegurado o respeito à diversidade cultural religiosa do Brasil, vedadas quaisquer formas de proselitismo. (Redação dada pela Lei nº 9.475, de 22.7.1997)
 1º Os sistemas de ensino regulamentarão os procedimentos para a definição dos conteúdos do ensino religioso e estabelecerão as normas para a habilitação e admissão dos professores. (Incluído pela Lei nº 9.475, de 22.7.1997)
 2º Os sistemas de ensino ouvirão entidade civil, constituída pelas diferentes denominações religiosas, para a definição dos conteúdos do ensino religioso. (Incluído pela Lei nº 9.475, de 22.7.1997)
Nesse ponto, é importante destacar que o STF julgou improcedente o pedido para conferir interpretação conforme a dispositivos da LDB e do acordo Brasil-Santa Sé, com a finalidade de somente o modelo não confessional de ensino religioso fosse considerado compatível com o princípio da laicidade do Estado. 
##Atenção: ##STF: ##DOD: ##Anal. Judic./STJ-2018: ##MPSC-2019: ##MPGO-2019: ##MPMT-2019: ##DPESP-2019: ##FCC: Vejamos o teor do julgado veiculado no Info 879 do STF (fonte DOD):
A CF/88 prevê que “o ensino religioso, de matrícula facultativa, constituirá disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino fundamental.” (art. 210, § 1º). Diante disso, nas escolas públicas são oferecidas aulas de ensino religioso, normalmente vinculadas a uma religião específica. É o chamado ensino religioso confessional. O PGR ajuizou ADI pedindo que fosse conferida interpretação conforme a Constituição ao art. 33, §§ 1º e 2º da LDB e ao art. 11, § 1º do acordo Brasil-Santa Sé. Na ação, o PGR afirmava que não é permitido que se ofereça ensino religioso confessional (vinculado a uma religião específica). Para o autor, o ensino religioso deve ser voltado para a história e a doutrina das várias religiões, ensinadas sob uma perspectiva laica e deve ser ministrado por professores regulares da rede pública de ensino, e não por pessoas vinculadas às igrejas. O STF julgou improcedente a ADI e decidiu que o ensino religioso nas escolas públicas brasileiras pode ter natureza confessional, ou seja, pode sim ser vinculado a religiões específicas. A partir da conjugação do binômio Laicidade do Estado (art. 19, I) e Liberdade religiosa (art. 5º, VI), o Estado deverá assegurar o cumprimento do art. 210, § 1º, CF/88, autorizando na rede pública, em igualdade de condições o oferecimento de ensino confessional das diversas crenças, mediante requisitos formais previamente fixados pelo Ministério da Educação. Assim, deve ser permitido aos alunos, que expressa e voluntariamente se matricularem, o pleno exercício de seu direito subjetivo ao ensino religioso como disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino fundamental, ministrada de acordo com os princípios de sua confissão religiosa, por integrantes da mesma, devidamente credenciados a partir de chamamento público e, preferencialmente, sem qualquer ônus para o Poder Público. Dessa forma, o STF entendeu que a CF/88 não proíbe que sejam oferecidas aulas de uma religião específica, que ensine os dogmas ou valores daquela religião. Não há qualquer problema nisso, desde que se garanta oportunidade a todas as doutrinas religiosas. STF. Plenário. ADI 4439/DF, rel. orig. Min. Roberto Barroso, red. p/ o ac. Min. Alexandre de Moraes, j. 27/9/17 (Info 879).[footnoteRef:133] [133: (MPGO-2019): Segundo jurisprudência recente do STF, o ensino religioso nas escolas públicas de ensino fundamental, que constituirá disciplina dos horários normais, poderá ter natureza confessional, na medida que sua matrícula é facultativa nos termos do artigo 210, § 1°, da CF/88. BL: Info 879, STF.
(DPESP-2019-FCC): O art. 19, I, CF/88, proíbe que a União, Estados, Distrito Federal e Municípios estabeleçam cultos religiosos ou igrejas, que os subvencionem ou mantenham com eles relação de dependência ou aliança. Ao mesmo tempo, a CF/88 garante a liberdade de consciência e de crença (art. 5º, VI), bem como assegura que ninguém pode ser privado de direitos por motivo de crença religiosa ou de convicção filosófica ou política (art. 5º , VIII). Tais normas compõem o que se denomina de Estado Laico. Sobre a laicidade estatal, no julgamento da ADI 4439, entendeu-se que o ensino religioso nas escolas públicas não viola a laicidade estatal sob o argumento, dentre outros, de que seria de matrícula facultativa, podendo ser até mesmo confessional, pois a laicidade estatal tem significado de “neutralidade” e não de “oposição” ou “beligerância” às religiões. BL: Info 879, STF.
(MPBA-2018): Sobre os direitos fundamentais em espécie positivados na Constituição Federal, tal qual interpretados pelo STF, responda: O ensino religioso em escolas públicas pode ter natureza confessional, não havendo que se falar em violação à cláusula da laicidade do Estado e ao direito fundamental à liberdade religiosa. BL: Info 879, STF.] 
##Atenção: ##DOD: Assim, a partir da conjugação do binômio Laicidade do Estado (art. 19, I) e Liberdade religiosa (art. 5º, VI), o STF entendeu que o Estado deverá assegurar o cumprimento do art. 210, § 1º da CF/88, autorizando na rede pública, em igualdade de condições, o oferecimento de ensino confessional das diversas crenças, mediante requisitos formais previamente fixados pelo Ministério da Educação. Assim, deve ser permitido aos alunos, que expressa e voluntariamente se matricularem, o pleno exercício de seu direito subjetivo ao ensino religioso como disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino fundamental, ministrada de acordo com os princípios de sua confissão religiosa, por integrantes da mesma, devidamente credenciados a partir de chamamento público e, preferencialmente, sem qualquer ônus para o Poder Público. Em outras palavras, se a igreja católica ou uma igreja evangélica quiser oferecer ensino religioso confessional cristão, ministrado por um padre ou pastor vinculado à Igreja, ela pode. Se uma mesquita islâmica também assim desejar, igualmente pode. Se o representante de uma religião de matriz africana quiser oferecer as aulas, isso deverá ser permitido e assim por diante. O STF entendeu, portanto, que a CF/88 não proíbe que sejam oferecidas aulas de uma religião específica, que ensine os dogmas ou valores daquela religião. Não há qualquer problema nisso, desde que se garanta oportunidade a todas as doutrinas religiosas. O ensino religioso é, então, encarado da seguinte forma: o Estado disponibiliza a estrutura física das escolas públicas, assim como já acontece com alguns hospitais e presídios, para que seja usada para que a religião que assim desejar possa fazer a livre disseminação de suas crenças e ideais para aqueles alunos que professam da mesma fé e que voluntariamente queriam cursar a disciplina. E não se trata de permitir proselitismo religioso, que tem por objetivo a conversão de determinada pessoa para que adira a uma religião, pois o requisito constitucional primordial é a matrícula facultativa do aluno que já professa a crença objeto da disciplina.
Por seu turno, também merece algumas considerações em relação ao ensino religioso das escolas particulares. Nessa situação, deve-se admitir o ensino religioso confessional, sendo descabido impor a instituições privadas com determinada orientação confessional que ministre princípios de outras religiões.
Quanto ao ensino religioso nas escolas particulares, Bernardo Gonçalves entende que “pode ser confessional, interconfessional ou não confessional, à luz da linha a ser delimitada pela própria escola, porém a matrícula, como nas escolas públicas, também deve ser facultativa.”[footnoteRef:134] Nesse ponto, vejamos o seguinte julgado do STF: [134: FERNANDES, Bernardo Gonçalves. Curso de Direito Constitucional. 9. ed. Salvador. JusPODIVM, 2017, p. 447.] 
AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI N. 6.584/94 DO ESTADO DA BAHIA. ADOÇÃO DE MATERIAL ESCOLAR E LIVROS DIDÁTICOS PELOS ESTABELECIMENTOS PARTICULARES DE ENSINO. SERVIÇO PÚBLICO. VÍCIO FORMAL. INEXISTÊNCIA. 1. Osserviços de educação, seja os prestados pelo Estado, seja os prestados por particulares, configuram serviço público não privativo, podendo ser prestados pelo setor privado independentemente de concessão, permissão ou autorização. 2. Tratando-se de serviço público, incumbe às entidades educacionais particulares, na sua prestação, rigorosamente acatar as normas gerais de educação nacional e as dispostas pelo Estado-membro, no exercício de competência legislativa suplementar (§2º do ar. 24 da Constituição do Brasil). 3. Pedido de declaração de inconstitucionalidade julgado improcedente. (ADI 1266, Relator(a): EROS GRAU, Tribunal Pleno, julgado em 06/04/2005).
Nesse ponto, pontua Marcelo Novelino que “em se tratando de escolas particulares, a obrigatoriedade de matrícula no ensino religioso somente se revela compatível com o princípio da liberdade religiosa (CF, arts. 5º, VI), se a instituição não receber recursos públicos (CF, art. 213), e se houver outra entidade educacional na localidade”. [footnoteRef:135] [135: NOVELINO, Marcelo. Curso de Direito Constitucional. 14ª Ed. Salvador: Editora JusPodivm, 2019, p. 407.] 
2.4.3. Liberdade de reunião
Encontra-se previsto no art. 5º, XVI da CF/88:
XVI - todos podem reunir-se pacificamente, sem armas, em locais abertos ao público, independentemente de autorização, desde que não frustrem outra reunião anteriormente convocada para o mesmo local, sendo apenas exigido prévio aviso à autoridade competente;
2.4.3.1. Âmbito de proteção
Trata-se de direito individual de exercício coletivo. Apesar de o exercício de tais direitos ter como premissa a atuação de uma pluralidade de sujeitos, a titularidade continua sendo de cada uma dos indivíduos. Coletivos, desse modo, são os instrumentos de exercício e não a titularidade dos direitos. 
Compreende um direito eminentemente instrumental, que visa a assegurar a livre expressão das ideias, incluindo-se, em seu âmbito de proteção, o direito de protestar. 
Quanto ao direito de protestar, cumpre lembrar do polêmico e histórico julgado pelo Plenário do STF em relação à “marcha da maconha”, a ADPF 187, do qual se extrai o seguinte trecho do voto do Min Relator:
(...) O Supremo Tribunal Federal, em ambos os casos, deixou claramente consignado que o direito de reunião, enquanto direito-meio, atua em sua condição de instrumento viabilizador do exercício da liberdade de expressão, qualificando-se, por isso mesmo, sob tal perspectiva, como elemento apto a propiciar a ativa participação da sociedade civil, mediante exposição de idéias, opiniões, propostas, críticas e reivindicações, no processo de tomada de decisões em curso nas instâncias de Governo.
É por isso que esta Suprema Corte sempre teve a nítida percepção de que há, entre as liberdades clássicas de reunião e de manifestação do pensamento, de um lado, e o direito de participação dos cidadãos na vida política do Estado, de outro, um claro vínculo relacional, de tal modo que passam eles a compor um núcleo complexo e indissociável de liberdades e de prerrogativas político-jurídicas, o que significa que o desrespeito ao direito de reunião, por parte do Estado e de seus agentes, traduz, na concreção desse gesto de arbítrio, inquestionável transgressão às demais liberdades cujo exercício possa supor, para realizar-se, a incolumidade do direito de reunião, tal como sucede quando autoridades públicas impedem que os cidadãos manifestem, pacificamente, sem armas, em passeatas, marchas ou encontros realizados em espaços públicos, as suas idéias e a sua pessoal visão de mundo, para, desse modo, propor soluções, expressar o seu pensamento, exercer o direito de petição e, mediante atos de proselitismo, conquistar novos adeptos e seguidores para a causa que defendem. (...) (STF. Plenário. ADPF 187, Rel. Min. Celso de Mello, j. 15/06/2011). 
##Atenção: ##STF: ##MPRO-2013: ##DPEPB-2014: ##DPEPR-2014: ##MPDFT-2011/2015: ##DPERN-2015: ##MPRR-2017: ##TJBA-2019: ##PRF-2021: ##CESPE: ##FCC: O STF entendeu que a marcha pela descriminalização da maconha é constitucional, mas o uso de tais substâncias, não é. Desse modo, na ADPF 187, o STF consignou que a passeata que defenda a legalização do uso de substâncias entorpecentes (informalmente conhecida como "Marcha da Maconha'') é legítima manifestação de duas liberdades individuais revestidas de caráter fundamental: o direito de reunião (como liberdade-meio) e o direito à livre expressão do pensamento (como liberdade-fim). É, portanto, um legítimo debate que não se confunde com incitação prática de delito nem se identifica com apologia de fato criminoso.[footnoteRef:136] O STF, entretanto, condicionou seu exercício. (Marcha da maconha): [136: (DPEMG-2019): A respeito dos direitos e garantias individuais e coletivas, assinale a alternativa correta: No exercício da “interpretação conforme à Constituição”, a declaração de constitucionalidade pelo STF de manifestações em eventos públicos para a descriminalização de determinado tipo penal confere eficácia aos direitos fundamentais de liberdade de expressão (direito-fim) e de reunião (direito-meio).
(MPRR-2017-CESPE): Considerando que a liberdade de expressão é uma importante garantia fundamental protegida pela CF em seu artigo 5.º, inciso IV, julgue o item a seguir: Segundo entendimento do STF, a CF permite a manifestação pública pela descriminalização de determinados tipos penais sem que se configure apologia ao crime.
(DPEPB-2014-FCC): Em relação aos eventos públicos de defesa da legalização ou descriminalização do uso de drogas, o STF decidiu que são admitidos, uma vez que correspondem ao exercício dos direitos de reunião e de manifestação de pensamento.] 
- Não pode ter crianças ou adolescentes;[footnoteRef:137] [137: (DPERN-2015-CESPE): Com referência aos direitos fundamentais em espécie, assinale a opção correta com base no entendimento do STF acerca desse tópico: Salvo quando envolver criança e(ou) adolescente, os direitos à reunião e à livre manifestação do pensamento podem ser exercidos mesmo quando praticados para defender a legalização de drogas.] 
- Não pode ter o uso da droga.
Assim, segundo o posicionamento do STF, é permitido a manifestação em espaços públicos para a defesa da legalização das drogas ou da abolição de qualquer outro tipo penal, e portanto:
- NÃO se confunde com incitação à prática de delito;
- NEM se identifica como apologia de fato criminoso.
Cumpre registrar que o direito de reunião protege não apenas a pretensão de estar com outras pessoas, como também de convocar, preparar e organizar uma manifestação. 
Tal direito fundamental tem, por um lado, uma dimensão negativa, consubstanciada no dever de não interferência do Estado em seu exercício; por outro, uma dimensão positiva, presente no dever do Estado de "proteger os manifestantes, assegurando os meios necessários para que o direito à reunião seja fruído regularmente. Essa proteção deve ser exercida também em face de grupos opositores ao que se reúne, para prevenir que perturbem a manifestação" (MENDES et alii, 2007).[footnoteRef:138] [138: (DPEPR-2014-UFPR): No curso do ano passado, o Brasil vivenciou o ressurgimento das manifestações de rua em diversas cidades do país, cujo ápice se deu em 13 de junho de 2013. Tais manifestações colocaram em evidência a necessidade de aprofundar o tratamento jurídico que deve ser conferido ao tema, especialmente para estabelecer a natureza, o sentido e o alcance do direito de reunião, bem como dirimir eventuais conflitos deste com outros direitos humanos. Diante disso, é correto afirmar: O sentido de fundamentalidade de que se reveste essa liberdade pública permite afirmar que seu exercício mostra-se essencial para a propagação das reivindicações das minorias, ainda que impopulares. ] 
Vale ressaltar que a CF/88 protege, prima facie, o exercício desse direito fundamental, independentemente do local em que se realize (reservado ou aberto ao público) ou de qualquer autorização dos poderes públicos (art. 5º, XVI, CF).
2.4.3.2. Restrições
O art. 5º, XVI da CF, que consagraa liberdade de reunião, encontra-se duas espécies de restrições estabelecidas com a estrutura de regra:
· 1ª restrição (de índole material): Compreende na exigência de que a reunião seja pacífica e sem armas;
· 2ª restrição (de índole formal): Consiste na observância da precedência na escolha do local e na exigência de prévio aviso à autoridade competente.
Igualmente se constitui em uma restrição diretamente estabelecida pela CF/88, mesmo que consagrada em outro dispositivo, a possibilidade de suspensão desta liberdade durante a vigência de estado de sítio, nos termos do art. 139, VI da Lei Maior:
Art. 139. Na vigência do estado de sítio decretado com fundamento no art. 137, I, só poderão ser tomadas contra as pessoas as seguintes medidas: (...)
IV - suspensão da liberdade de reunião;
Cumpre destacar que o princípio da liberdade de reunião poderá ser restringido no caso de decretação do estado de defesa, pelo Presidente da República, para preservar ou prontamente restabelecer, em locais restritos e determinados, a ordem pública ou a paz social ameaçadas por grave e iminente instabilidade institucional ou atingidas por calamidades de grandes proporções na natureza. Nessa situação, o decreto que instituir o estado de defesa determinará o tempo de sua duração, especificará as áreas a serem abrangidas e indicará as medidas coercitivas a vigorarem, dentre as quais está elencada a restrição ao direito de reunião, ainda que exercida no seio das associações. É o que consta no art. 136, § 1.º, I, "a" da CF/88:
Art. 136. O Presidente da República pode, ouvidos o Conselho da República e o Conselho de Defesa Nacional, decretar estado de defesa para preservar ou prontamente restabelecer, em locais restritos e determinados, a ordem pública ou a paz social ameaçadas por grave e iminente instabilidade institucional ou atingidas por calamidades de grandes proporções na natureza.
§ 1º O decreto que instituir o estado de defesa determinará o tempo de sua duração, especificará as áreas a serem abrangidas e indicará, nos termos e limites da lei, as medidas coercitivas a vigorarem, dentre as seguintes:
I - restrições aos direitos de:
a) reunião, ainda que exercida no seio das associações; (...)
Ademais, ao lado das hipóteses referidas, outras restrições poderão ser impostas, de acordo com as circunstâncias fáticas e jurídicas do casei concreto, por princípios de hierarquia constitucional, como, por exemplo, a liberdade de locomoção (art. 5º, XV, CF), no caso de reuniões que inviabilizem o tráfego em determinadas vias; ou, ainda, o direito à saúde (art. 6 º, CF), no caso de manifestações realizadas nas proximidades de hospitais ou casas de repouso.
2.4.4. Liberdade de associação
Encontra-se previsto no art. 5º, incisos XVII, XVIII, XIX e XXI da CF/88:
XVIII - a criação de associações e, na forma da lei, a de cooperativas independem de autorização, sendo vedada a interferência estatal em seu funcionamento; 
XIX - as associações só poderão ser compulsoriamente dissolvidas ou ter suas atividades suspensas por decisão judicial, exigindo-se, no primeiro caso, o trânsito em julgado; 
XX - ninguém poderá ser compelido a associar-se ou a permanecer associado; 
XXI - as entidades associativas, quando expressamente autorizadas, têm legitimidade para representar seus filiados judicial ou extrajudicialmente;
2.4.4.1. Âmbito de proteção
A liberdade de associação, assim como a liberdade de reunião, é um direito individual de exercício coletivo. Ambas têm em comum a pluralidade de participantes e o fim previamente determinado. A principal diferença é que a reunião possui uma duração limitada (caráter episódico), enquanto a associação tem um caráter permanente. 
As associações (art. 5º , XVII a XXI) - uma das formas de organização coletiva, ao lado dos sindicatos (art. 8º) e dos partidos políticos (art. 17) - podem representar seus filiados, judicial ou extrajudicialmente (CF, art. 5º, XXI). Além de autorização expressa, exige-se que a matéria seja tenha pertinência com os fins sociais da entidade. Trata-se de hipótese de representação processual. 
Nas hipóteses de impetração de mandado de segurança coletivo ou de mandado de injunção coletivo, em defesa de seus associados, é suficiente a autorização genérica contida no estatuto da associação, por ser hipótese de legitimação extraordinária (ou substituição processual) atribuída às associações pela própria Constituição (art. 5º, LXX). O STF sumulou o entendimento de que “a impetração de mandado de segurança coletivo por entidade de classe em favor dos associados independe da autorização destes” (Súmula 629/STF), assim como o de que “a entidade de classe tem legitimação para o mandado de segurança ainda quando a pretensão veiculada interesse apenas a uma parte da respectiva categoria” (Súmula 630/STF).
A suspensão das atividades ou a dissolução compulsória de uma associação só poderão ocorrer por decisão judicial, quando desaparecer algum dos requisitos para sua constituição. É o caso, por exemplo, de uma associação criada para fins lícitos, mas que se dedica à prática de atividades ilícitas. Para que uma associação possa ser compulsoriamente dissolvida, a CF/88 exige o trânsito em julgado da decisão judicial (art. 5º, XIX). 
A liberdade de associação é um direito de defesa que exige, precipuamente, uma abstenção estatal. A CF veda expressamente a intervenção estatal na criação e funcionamento das associações (art. 5º, XVIII). No caso das cooperativas, a interferência estatal em seu funcionamento também é vedada, mas a criação deve ocorrer “na forma da lei” (art. 5º, XVIII}. Trata-se de reserva legal simples. 
Constitui, ainda, intervenção violadora da liberdade de associação compelir qualquer pessoa a se associar ou a permanecer associada (art. 5º, XX). 
2.4.4.2. Restrições 
O dispositivo que consagra a liberdade de associação estabelece, como restrição expressa ao âmbito de proteção deste direito, a vedação de associações para fins ilícitos e de caráter paramilitar (art. 5º, XVII).
##Atenção: Acerca do direito de associação, André Antunes Soares de Camargo explica: “Primeiramente introduzida como direito fundamental na Constituição de 1891[11], repetida nos textos constitucionais subsequentes, a liberdade associativa, encontra-se atualmente prevista no artigo 5º, incisos XVII, XVIII, XIX e XX, da CF/88[12]. Da leitura conjunta desses dispositivos constitucionais, podem ser listadas as seguintes 10 características e dimensões desse direito:
(a) O termo “associação” possui sentido vasto, bastando que haja uma união voluntária e com um fim comum, havendo solidariedade entre seus membros[13];
(b) O termo “associação” possui duas acepções: em sentido lato, como qualquer associação de pessoas, inclusive as com finalidade lucrativa, partidos políticos, associações profissionais ou sindicais[14] e, em sentido estrito, significa pessoas jurídicas sem fim lucrativo[15];
(c) Possui quatro subdireitos, quais sejam o de criar uma associação, o de aderir a qualquer associação já existente, o de se desligar de uma associação e o de dissolver espontaneamente uma associação[16];
(d) Possui duas garantias coletivas: (i) é vedada a interferência estatal no funcionamento das associações; e (ii) só podem ser dissolvidas compulsoriamente ou ter suas atividades suspensas por decisão judicial transitada em julgado[17];
(e) Diferencia-se do mero direito de reunião de pessoas, pois demanda uma associação estável e permanente de pessoas, com interesses comuns e cuja atividade não afronte a ordem jurídica[18];
(f) Possui uma natureza negativa, proibindo o Estado, em regra, de interferir desde o processo de criação até o de dissolução de associações (direito de auto-organização de estatutos, escolha de associados, liberdade de gestão e continuar ou descontinuar a atividade)[19];
(g) Trata-se de uma liberdade de “mão dupla”, ou seja, englobando a associação e a desassociação, esta sendo praticamente um “direito potestativo” do associado, pois pode alterar a situação jurídica dos demais associados, formalizadomediante uma declaração receptícia de vontade[20];
(h) Alguns autores o classificam como um direito coletivo (titularizado e exercitado por pessoas coletivamente consideradas entre si)[21];
(i) Apresenta-se como um direito complexo[22]; e
(j) Possui uma base contratual, ânimo de permanência (estabilidade) e deve percorrer um fim lícito[23].[footnoteRef:139] [139: (MPMS-2015): Sobre o direito de associação é correto afirmar que: Possui base contratual. BL: art. 5º, XX, CF.
##Atenção: Trata-se de base contratual, pois ninguém poderá ser compelido a associar-se ou permanecer associado (art. 5º XX, CF), ou seja, a adesão a uma associação precisa da minha vontade (de querer associar-se) e da vontade da Associação (em me aceitar como associado). Um acordo de vontades entre duas partes com um objetivo específico é um contrato. Por isso, fala-se que a associação possui base contratual. Isso fica nítido ao entrarmos em uma associação, pois você deverá respeitar as regras dela, tendo direitos e deveres (cláusulas contratuais).] 
Por fim, vale lembrar que há expressamente duas limitações constitucionais à liberdade de associação, ambas relacionadas às suas finalidades e previstas no artigo 5º, inciso XVII, da CF/88: (a) percorrer fins ilícitos; e (b) ter caráter paramilitar[24]”.[footnoteRef:140] [140: Fonte: https://www.conjur.com.br/2014-jul-03/andre-camargo-aspectos-gerais-liberdade-associacao-brasil ] 
2.5. Direito à Propriedade
2.5.1. Âmbito de proteção
a) Proteção prima facie
CF, art. 5º, XXII: é garantido o direito de propriedade.
O direito à propriedade é garantido pela Constituição, mas não é um direito absoluto. É garantido apenas “prima facie”, ou seja, é garantido provisoriamente, podendo ser afastado caso outro direito de peso maior justifique a restrição. Este entendimento é adotado pelo STF.
Exemplo: Se a função social da propriedade não está sendo cumprida, a garantia ao direito de propriedade pode sofrer restrições.
Vejamos o seguinte precedente do STF:
STF – MS 25.284: O direito de propriedade não se revela absoluto. Está relativizado pela Carta da República – arts. 5º, XXII, XXIII e XXIV, e 184.[footnoteRef:141] [141: (MPMG-2018): Com matriz constitucional, em relação à função social da propriedade no sistema codificado, é de se afirmar: A inexistência de direito absoluto e intangível. BL: art. 5º, XXIII, CF e Entend. Jurisprud.
##Atenção: ##STF: ##TRF1-2009: ##CESPE: ##MPPB-2011: ##TJRO-2019: ##VUNESP: É correto afirmar que a propriedade, sob o viés da função social, passa a ter sentido jurídico quando submetida a valores sociais baseados em uma ordem pública fundada em princípios que preservam o seu exercício (a propriedade), porém, SEM caráter absoluto. ] 
b) Conceito de propriedade
Para Gilmar Mendes, em que pese o conceito de propriedade integre a definição constante da legislação civil, é certo que a garantia constitucional da propriedade abrange não só os bens móveis ou imóveis, mas também outros valores patrimoniais.
c) Regime jurídico do direito de propriedade
	##Questiona-se: Qual é o regime jurídico do direito de propriedade? 
Há grande divergência entre os civilistas e os constitucionalistas. Segundo o professor José Afonso da Silva, o regime jurídico do direito de propriedade é público, pois toda a estrutura deste direito está prevista na Constituição. De acordo com o mesmo autor, o Código Civil disciplina as relações civis decorrentes do direito de propriedade e não o direito em si. 
Gilmar Mendes entende que, em geral, os interesses individuais estão regulamentados pelo direito privado, enquanto a função social da propriedade está regulamentada pelo direito público.
d) Pequena propriedade rural
Dentro do âmbito de proteção deste direito, a Constituição assegura a impenhorabilidade da pequena propriedade rural. Vejamos:
CF, art. 5º, XXVI: a pequena propriedade rural, assim definida em lei, desde que trabalhada pela família, não será objeto de penhora para pagamento de débitos decorrentes de sua atividade produtiva, dispondo a lei sobre os meios de financiar o seu desenvolvimento.[footnoteRef:142] [142: (TJSC-2013): A pequena propriedade rural, assim definida em lei, desde que trabalhada pela família, não será objeto de penhora para pagamento de débitos decorrentes de sua atividade produtiva, dispondo a lei sobre os meios de financiar o seu desenvolvimento. BL: art. 5º, XXVI, CF/88. ] 
Todavia, não é uma impenhorabilidade absoluta da pequena propriedade rural. Ela é impenhorável para pagamento de débitos decorrentes de sua atividade produtiva. E mais: a impenhorabilidade é assegurada, desde que a propriedade seja trabalhada pela família.
2.5.2. Restrições
A Constituição Federal prevê as seguintes restrições a este direito:
· Função social da propriedade;
· Desapropriação (desapropriação-sanção);
· Requisição;
· Expropriação-sanção; 
· Confisco;
· Usucapião.
a) Desapropriação-sanção: Função social
CF, art. 5º, XXIII: a propriedade atenderá a sua função social.
Há um conflito aparente entre este os incisos XXII (“é garantido o direito de propriedade”) e XXIII (“a propriedade atenderá a sua função social”). Sobre a função social há uma divergência doutrinária, a qual consiste em considerá-la como elemento ou restrição ao direito de propriedade:
· Elemento: Segundo José Afonso da Silva, a função social é um elemento do direito de propriedade. Segundo ele, a função social integra o direito de propriedade, não se tratando de uma mera restrição. Portanto, o direito de propriedade só é garantido pela Constituição se a propriedade atender a sua função social.
· Restrição: Segundo Daniel Sarmento, a função social não é um elemento do direito de propriedade, mas sim uma restrição. Em outras palavras, mesmo que a propriedade não cumpra sua função social, ainda assim esse direito é garantido pela Constituição. 
Exemplo: O STF considera ilegítimas as invasões de terras pelo MST, ainda que a pretexto de promover a reforma agrária. Sendo assim, mesmo não cumprindo a função social este direito está protegido pela Constituição.
##Questiona-se: Quando a propriedade cumpre sua função social? 
A Constituição define a função social da propriedade urbana e da propriedade rural. 
Dispõe que quem define as exigências da função social da propriedade urbana é o plano diretor do Município e não a própria Constituição. Vejamos:
CF, art. 182, § 2º: A propriedade urbana cumpre sua função social quando atende às exigências fundamentais de ordenação da cidade expressas no plano diretor. 
O plano diretor é obrigatório para os Municípios com mais de 20 mil habitantes.[footnoteRef:143] [143: (MPSC-2016): Quanto à política urbana, dispôs a Constituição Federal que o instrumento básico da política de desenvolvimento e de expansão urbana é o plano diretor, que será obrigatório para cidades com mais de vinte mil habitantes. BL: art. 182, §1º, C.
(TJPA-2012-CESPE): Considerando que o município A, com 30.000 habitantes e sem plano diretor, decida utilizar instrumentos de política urbana previstos no Estatuto da Cidade ao detectar que diversos imóveis localizados em seu perímetro urbano não são utilizados, o que configura claro desrespeito à função social de propriedade, neste caso o referido município deverá elaborar plano diretor. BL: art. 182, §4º, CF.] 
Tratando-se da função social da propriedade rural, expressa a CF/88 que ela é cumprida quando atende, simultaneamente, segundo critérios e graus de exigência estabelecidos em lei (norma de eficácia limitada, pois depende da lei estabelecendo os critérios e graus de exigência), aos seguintes requisitos: (i) aproveitamento racional e adequado; (ii) utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e preservação do meio ambiente; (iii) observância das disposições que regulam as relações de trabalho; (iv) exploração que favoreça o bem-estar dos proprietários e dos trabalhadores. Vejamos o teor do art. 186, CF:
CF, art. 186: A função social é cumprida quando a propriedade rural atende, simultaneamente, segundo critérios e graus de exigênciaestabelecidos em lei, aos seguintes requisitos:
I - aproveitamento racional e adequado;
II - utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e preservação do meio ambiente; 
III - observância das disposições que regulam as relações de trabalho;
IV - exploração que favoreça o bem-estar dos proprietários e dos trabalhadores.[footnoteRef:144] [144: (TJPI-2015-FCC): José é proprietário de um imóvel rural situado no interior do Estado do Piauí, no qual explora, com sucesso econômico, a pecuária de corte extensiva. A propriedade possui reserva legal e áreas de preservação permanente. Possui trinta funcionários regulares, que, todavia, são submetidos a uma intensa e contínua exposição ao sol, o que tem provocado sérios problemas de saúde. Neste cenário, segundo a Constituição Federal, a propriedade rural em questão não cumpre com sua função social, diante da existência de condição que não favorece o bem-estar de seus trabalhadores. BL: art. 186, IV da CF] 
##Questiona-se: Quais são as sanções decorrentes do não cumprimento da função social? 
A CF/88 prevê diferentes consequências para o não cumprimento da função social da propriedade:
· 1ª Situação: Imóvel urbano 
Havendo plano diretor (pois sem plano diretor não há como saber quais são as exigências para o cumprimento da função social), ao proprietário do solo urbano não edificado, subutilizado ou não utilizado que não promover seu adequado aproveitamento poderão ser aplicadas, sucessivamente, as seguintes penas: (i) parcelamento ou edificação compulsórios; (ii) imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana progressivo no tempo (IPTU progressivo); (iii) desapropriação com pagamento mediante títulos da dívida pública (não em dinheiro) de emissão previamente aprovada pelo Senado Federal, com prazo de resgate de até dez anos, em parcelas anuais, iguais e sucessivas, assegurados o valor real da indenização e os juros legais. Vejamos o seu teor:
CF, art. 182, § 4º: É facultado ao poder público municipal, mediante lei específica para área incluída no plano diretor, exigir, nos termos da lei federal, do proprietário do solo urbano não edificado, subutilizado ou não utilizado que promova seu adequado aproveitamento, sob pena, sucessivamente, de:
I - parcelamento ou edificação compulsórios;
II - imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana progressivo no tempo;[footnoteRef:145] [145: (TJSP-2017-VUNESP): O princípio da função social da propriedade tem incidência no âmbito do direito tributário, uma vez que pressupõe manifestação de riqueza e se liga à ideia de justiça distributiva. BL: art. 182, §4º, CF.
(TJPI-2007-CESPE): O IPTU pode ser progressivo no tempo, sendo essa uma das formas de apenação em caso de descumprimento de exigência pelo poder público municipal de adequado aproveitamento de solo urbano não-edificado, subutilizado ou não-utilizado. BL: art. 182, §4º, II, CF.] 
III - desapropriação com pagamento mediante títulos da dívida pública de emissão previamente aprovada pelo Senado Federal, com prazo de resgate de até dez anos, em parcelas anuais, iguais e sucessivas, assegurados o valor real da indenização e os juros legais.[footnoteRef:146] [146: (MPMG-2013): A Declaração Universal dos Direitos Humanos, em seu artigo XXV, nº1, diz: “Toda pessoa tem direito a um padrão de vida capaz de assegurar a si e a sua família saúde e bem-estar, inclusive alimentação, vestuário, habitação, cuidados médicos e os serviços sociais indispensáveis, e direito à segurança em caso de desemprego, doença, invalidez, viuvez, velhice ou outros casos de perda dos meios de subsistência fora de seu controle”. Expressamente, a Constituição da República Federativa do Brasil, em seu artigo 6º, por introdução da Emenda Constitucional nº 26, prevê a moradia como direito social, no mesmo patamar da educação, da saúde, do trabalho, do lazer, da segurança, da previdência social, da proteção à maternidade e à infância e da assistência aos desamparados. Com base no ordenamento constitucional brasileiro, pode-se afirmar Pelo ordenamento constitucional brasileiro, a propriedade é um direito fundamental, mas não possui um caráter absoluto, pois deve cumprir uma função social, que se dá, entre outras formas, pelo atendimento das exigências fundamentais de ordenamento das cidades, expressadas nos planos diretores, podendo estes estabelecerem áreas para que o Poder Público municipal, mediante lei específica, exija do proprietário do solo urbano não edificado, subutilizado ou não utilizado, que promova o seu adequado aproveitamento, sob pena, sucessivamente de parcelamento ou edificação compulsórios, imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana progressivo no tempo e desapropriação com pagamento mediante títulos da dívida pública. BL: art. 182, §4º, CF.] 
##Obs.1: Perceba que, segundo o STF, mesmo quando a propriedade não cumpre a sua função social, ele está garantido pela CF, ainda que prima facie. O proprietário está protegido pelo direito, não podendo ser retirada a propriedade de forma arbitrária, fazendo-se necessário o devido processo legal. Ainda que demonstrado o descumprimento, o proprietário deverá ser indenizado caso lhe seja tomada a propriedade, a diferença é que a indenização será paga em títulos da dívida pública e não em dinheiro.
##Obs.2: Quando a propriedade cumpre sua função social, a indenização será sempre em dinheiro em caso de desapropriação.
· 2ª Situação: Imóvel rural 
Tratando-se da propriedade rural, compete à União desapropriar por interesse social, para fins de reforma agrária, o imóvel rural que não esteja cumprindo sua função social, mediante prévia e justa indenização em títulos da dívida agrária, com cláusula de preservação do valor real, resgatáveis no prazo de até vinte anos, a partir do segundo ano de sua emissão, e cuja utilização será definida em lei. Vejamos o seu teor:
CF, art. 184: Compete à União desapropriar por interesse social, para fins de reforma agrária, o imóvel rural que não esteja cumprindo sua função social, mediante prévia e justa indenização em títulos da dívida agrária, com cláusula de preservação do valor real, resgatáveis no prazo de até vinte anos, a partir do segundo ano de sua emissão, e cuja utilização será definida em lei.
§ 1º As benfeitorias úteis e necessárias serão indenizadas em dinheiro (...).[footnoteRef:147] [147: (TJRJ-2014-VUNESP): A desapropriação por interesse social do imóvel rural que não cumpra sua função social importa prévia e justa indenização em títulos da dívida agrária, e as benfeitorias úteis e necessárias serão indenizadas em dinheiro. BL: art. 184, caput e §1º da CF/88.] 
##Obs.: Se o imóvel rural estiver cumprindo sua função social, ele não pode ser desapropriado na forma aqui prevista.
b) Desapropriação e requisição
A desapropriação e a requisição estão previstas, respectivamente, nos incisos XXIV e XXV do art. 5º da CF/88:
Desapropriação → CF, art. 5º, XXIV: a lei estabelecerá o procedimento para desapropriação por necessidade ou utilidade pública, ou por interesse social, mediante justa e prévia indenização em dinheiro, ressalvados os casos previstos nesta Constituição [desapropriação-sanção].
Requisição → CF, art. 5º, XXV: no caso de iminente perigo público, a autoridade competente poderá usar de propriedade particular, assegurada ao proprietário indenização ulterior, se houver dano. [footnoteRef:148] [148: (MPPR-2016): A requisição administrativa, como forma de intervenção temporária na propriedade, encontra previsão no capítulo referente aos direitos e deveres individuais e coletivos da CF/1988, que estabelece que no caso de iminente perigo público a autoridade competente poderá usar de propriedade particular, assegurada ao proprietário indenização ulterior, se houver dano. BL: art. 5º, XXV, CF.
(TJSP-2013-VUNESP): A atuação do Estado, no exercício do poder de polícia, provocando danos na coisa, com objetivo de remover perigo iminente, sem que o dono da coisa seja culpado do perigo, constitui ato lícito. Entretanto, o ato enseja a responsabilidadecivil do Estado para reparar o dano causado. BL: art. 5º, XXV, CF.] 
##Obs.: No caso da requisição, não há transferência compulsória da propriedade. Ela é utilizada temporariamente enquanto houver o iminente perigo público. A indenização é sempre posterior porque a propriedade continua com o proprietário e ele só será indenizado se houver algum dano.
##Obs.: Diferenças entre desapropriação e requisição:
	DESAPROPRAÇÃO
	REQUISIÇÃO
	Se refere apenas a bens.
	Se refere em relação a bens e serviços[footnoteRef:149] [149: (TJMG-2018-Consulplan): Na requisição o Estado utiliza bens móveis, imóveis e serviços particulares em situação de perigo público iminente. BL: art. 5º, XXV, CF.] 
	Voltada à aquisição da propriedade.
	Ocorre o uso da propriedade.
	Decorre de necessidades permanentes.
	Decorre de necessidades transitórias e urgentes.
	Executada por acordo ou processo judicial.
	Decorre do poder de autoexecutoriedade
	Indenização: justa, prévia e, em regra, paga em dinheiro (salvo desapropriação-sanção pelo não cumprimento da função social da propriedade)
	Indenização: posterior e só se houver dano, sempre em dinheiro
##Questiona-se: As operações de transferência de imóveis desapropriados para fins de reforma agrária são isentas de tributos?
Não são isentas de tributos (gênero), mas apenas de impostos (espécie), federais, estaduais e municipais. Vejamos o art. 184, §5º, CF:
CF, art. 184, § 5º: São isentas de impostos federais, estaduais e municipais as operações de transferência de imóveis desapropriados para fins de reforma agrária. [footnoteRef:150] [150: (TJGO-2012-FCC): Relativamente à desapropriação por interesse social, para fins de reforma agrária, são isentas de impostos federais, estaduais e municipais as operações de transferência de imóveis desapropriados para fins de reforma agrária. BL: art. 184, §5º, CF/88.] 
##Questiona-se: Admite-se desapropriação de propriedade produtiva e de pequena e média propriedade rural? 
Quanto à desapropriação para fins de necessidade ou utilidade pública, com certeza! A insuscetibilidade de desapropriação nesses casos é apenas para fins de reforma agrária. Vejamos o art. 185, CF:
CF, art. 185: São insuscetíveis de desapropriação para fins de reforma agrária: 
I - a pequena e média propriedade rural, assim definida em lei, desde que seu proprietário não possua outra; 
II - a propriedade produtiva.
c) Expropriação-sanção e confisco
 A expropriação-sanção e o confisco estão previstos no art. 243, caput e § único, da CF:
Expropriação-sanção → CF, art. 243, “caput”: As propriedades rurais e urbanas de qualquer região do País onde forem localizadas culturas ilegais de plantas psicotrópicas ou a exploração de trabalho escravo na forma da lei serão expropriadas e destinadas à reforma agrária e a programas de habitação popular, sem qualquer indenização ao proprietário e sem prejuízo de outras sanções previstas em lei, observado, no que couber, o disposto no art. 5º.
##Obs.: A diferença entre a expropriação-sanção e a desapropriação-sanção é que a desapropriação-sanção sempre enseja indenização (ainda que não seja em dinheiro), ao passo que a expropriação-sanção se dá sem qualquer tipo de indenização ao proprietário.
Confisco → Art. 243, Parágrafo único. Todo e qualquer bem de valor econômico apreendido em decorrência do tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins e da exploração de trabalho escravo será confiscado e reverterá a fundo especial com destinação específica, na forma da lei.
##Obs.: A expropriação irá recair sobre a totalidade do imóvel, ainda que o cultivo ilegal ou a utilização de trabalho escravo tenham ocorrido em apenas parte dele. Nesse sentido: STF. Plenário. RE 543974, Rel. Min. Eros Grau, julgado em 26/03/2009.
##Questiona-se: É necessário algum requisito para que haja o confisco de bens ou o bem será confiscado desde que relacionado ao tráfico ilícito de entorpecentes e ao trabalho escravo? 
Não, o confisco independe de quaisquer requisitos além dos previstos no art. 243 da CF, bastando a demonstração de que está relacionado à exploração de trabalho escravo ou tráfico de drogas. Vejamos o seguinte precedente do STF:
STF – RE 638.491/PR: É possível o confisco de todo e qualquer bem de valor econômico apreendido em decorrência do tráfico de drogas, sem a necessidade de se perquirir a habitualidade, reiteração do uso do bem para tal finalidade, a sua modificação para dificultar a descoberta do local do acondicionamento da droga ou qualquer outro requisito além daqueles previstos expressamente no art. 243, parágrafo único, da Constituição Federal (CF). (g.n.)
##Questiona-se: A responsabilidade do proprietário do imóvel em caso de confisco ou expropriação-sanção é subjetiva ou objetiva?
Segundo o STF, a responsabilidade do proprietário é subjetiva (e não objetiva), mas há uma inversão do ônus da prova (o proprietário deve comprovar que não incorreu em culpa). Vejamos:
STF – RE 635.336/PE: A expropriação prevista no artigo 243, da Constituição Federal, pode ser afastada desde que o proprietário comprove que não incorreu em culpa, ainda que in vigilando ou in elegendo.
Assim, o proprietário pode afastar sua responsabilidade demonstrando que não incorreu em culpa. Ele pode provar, por exemplo, que foi esbulhado ou até enganado pelo possuidor ou pelo detentor.
##Questiona-se: E se houver mais de um proprietário, o que fazer neste caso? 
Se o imóvel pertencer a dois ou mais proprietários (condomínio), haverá a expropriação mesmo que apenas um deles tenha participação ou culpa. Restará apenas ao proprietário inocente buscar reparação daquele que participou ou teve culpa.
##Atenção: Exploração de trabalho escravo: Esta parte foi introduzida pela EC n. 81/2014. Trata-se de norma não autoaplicável: “…ou a exploração de trabalho escravo na forma da lei…” (de eficácia limitada). Não havendo lei regulamentadora, não pode ocorrer a expropriação-sanção no caso do trabalho escravo. 
##Atenção: Não é aplicável isso no caso de cultivo de plantas psicotrópicas, cuja norma é autoaplicável.
d) Usucapião
A CF/88 possui uma hipótese de usucapião especial, diferente da prevista no Código Civil. Vejamos seus requisitos:
d.1) Requisitos comuns (imóveis urbanos e rurais)
i. Requisitos tradicionais do usucapião: posse ininterrupta, sem oposição e com “animus domini”;
ii. Prazo de 5 anos;
iii. Não possuir outro imóvel (urbano ou rural);
iv. Moradia.
d.2) Requisitos específicos
· Tratando-se de imóvel urbano: 250 m² (no máximo). 
##Obs.: Preenchidos os requisitos do art. 183 da CF/88, o reconhecimento do direito a usucapião especial urbana não pode ser obstado por legislação infraconstitucional que estabeleça módulos urbanos na respectiva área em que situado o imóvel (STF – RE 422.349/RS).
· Tratando-se de imóvel rural: 50 hectares (no máximo) e tornar a propriedade produtiva com o seu trabalho ou de sua família.
##Questiona-se: A Constituição admite usucapião de imóvel público? 
Há vedação expressa, tanto no caso de imóveis urbanos (art. 183, § 3º, CF), quanto no caso de imóveis rurais (art. 191, parágrafo único, CF).
GARANTIAS INDIVIDUAIS
Grande parte das garantias consagradas no art. 5º da CF ou são de natureza penal ou de natureza processual (que serão estudadas em outras disciplinas). Por isso, só trataremos das garantias relacionadas à Segurança Jurídica (legalidade e não retroatividade das leis) e as Ações Constitucionais (especificamente o habeas data – o HC será estudado em processo penal, MS em processo civil e o Mandado de Injunção já foi estudado na parte de controle de constitucionalidade). 
1. GARANTIAS RELACIONADAS À SEGURANÇA JURÍDICA
##Questiona-se: Qual a diferença entre os direitos fundamentais e as garantias? 
Finalidade: Garantias são instrumentos de proteção e efetividade dos direitos. Muitas vezes a linha divisória não é muito nítida. Ex.: o dispositivo que consagra o HC tem, ao mesmo tempo, um direito (liberdade de locomoção) e a garantia desse direito (próprio HC). 
CF, art. 5º, LXVIII: conceder-se-á habeascorpus sempre que alguém sofrer ou se achar ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder;
Direitos vs. Garantias: 
· Os Direitos são os valores considerados importantes em determinada sociedade que são consagrados no plano normativo e, por isso, se expressam através de normas jurídicas (ex.: vida, liberdade, igualdade, segurança jurídica e propriedade). 
· As garantias, por sua vez, servem para assegurar esses direitos consagrados no texto constitucional. Portanto, possuem um caráter instrumental, não sendo um fim em si mesmo. [footnoteRef:151] [151: (MPSC-2019): Os direitos fundamentais são bens e vantagens prescritos na norma constitucional, ao passo que as garantias fundamentais são os instrumentos através dos quais se assegura o exercício dos aludidos direitos, destacando-se que a garantias nem sempre estarão nas regras definidas constitucionalmente como remédios constitucionais. 
(Téc. Judic./STJ-2004-CESPE): A inviolabilidade de direitos individuais é distinguida das garantias constitucionais, ainda que atuem em conexão.] 
##Obs.: Ainda sobre a diferença entre direitos e garantias, cabe destacar que um dos primeiros estudiosos a enfrentar esse tormentoso tema foi Rui Barbosa, que, analisando a Constituição de 1891, distinguiu "as disposições meramente declaratórias, que são as que imprimem existência legal aos direitos reconhecidos, e as disposições assecuratórias, que são as que, em defesa dos direitos, limitam o poder. Aquelas instituem os direitos, estas as garantias; ocorrendo não raro juntar-se, na mesma disposição constitucional, ou legal, a fixação da garantia, com a declaração do direito”. Assim, os direitos são bens e vantagens prescritos na norma constitucional, enquanto as garantias são os instrumentos através dos quais se assegura o exercício dos aludidos direitos (preventivamente) ou prontamente os repara, caso violados. (Rui Barbosa, República: teoria e prática).[footnoteRef:152] [152: (PGEGO-2013): Direitos fundamentais “são o conjunto de normas, princípios, prerrogativas, deveres e institutos, inerentes à soberania popular, que garantem convivência pacífica, digna, livre e igualitária, independentemente de credo, raça, origem, cor, condição econômica ou status social. Sem os direitos fundamentais, o homem não vive, não convive, e, em alguns casos, não sobrevive” (BULOS, Uadi Lammêgo. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva, 2011). Tendo em vista esse conceito, está correta a seguinte proposição: Direitos e garantias fundamentais não se confundem, pois enquanto aqueles consagram disposições declaratórias, estas estabelecem disposições assecuratórias.] 
##Obs.: Diferenças entre as garantias fundamentais dos remédios constitucionais: Os remédios constitucionais constituem espécies do gênero garantia. Isso porque, uma vez consagrado o direito, a sua garantia nem sempre estará nas regras definidas constitucionalmente como remédios constitucionais (ex: habeas corpus, habeas data, etc.). Em determinadas situações, a garantia poderá estar na própria norma que assegura o direito. Exemplos: é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos – art. 5, VI (direito) – garantindo-se na forma da lei a proteção aos locais de culto e suas garantias (garantia); direito ao juízo natural (direito) – art. 5, XXXVII, veda a instituição de juízo ou tribunal de exceção (garantia). 
1.1. Princípio da Legalidade
É uma garantia voltada à proteção de direitos fundamentais de valores diversos, ou seja, não protege apenas um valor, mas vários valores consagrados na Constituição, especialmente a liberdade, a propriedade e a segurança jurídica (embora outros valores também sejam por ele protegidos).
Objetivo: Esse princípio tem como principal objetivo limitar o poder do Estado, evitando que ele adote medidas arbitrárias e ações violadoras de direitos fundamentais. Para isso, a Constituição confere ao Parlamento (órgão máximo de representatividade popular) a função de estabelecer as leis restritivas de direitos fundamentais.
Duplo enfoque/significado: De um lado, o princípio da legalidade protege o particular contra possíveis desmandos, tanto do Executivo (que deve pautar seus atos pelas leis), quanto do Judiciário (que deve aplicar os direitos conforme as leis). Impede, portanto, ações arbitrárias de ambos os poderes.[footnoteRef:153] Por outro lado, o princípio da legalidade se apresenta como marco avançado do Estado de Direito, tendo a função de conformar a ações/comportamentos dos particulares às normas jurídicas das quais as são a suprema expressão. Para a sua plena realização, o princípio da legalidade exige a produção de lei em sentido estrito, ou seja, lei elaborada pelo Parlamento. Entretanto, a Constituição preceitua que ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa, senão em virtude da lei. É o teor do art. 5º, II, CF/88: [153: (Assist. Téc./UFPB-2017-CPCON): O princípio da legalidade, em síntese, afirma que só é permitido ao Estado fazer determinações aos indivíduos se houver alguma norma jurídica anterior ao fato que possa espelhar essa ordem estatal. Assim, caso um agente do Estado queira impor mandamentos ao indivíduo sem esse amparo normativo, o ato será considerado ilegal, já que a regra é a plena liberdade individual (livre iniciativa), só limitada ou retirada se houver norma prescrevendo um fazer ou deixar de fazer algo pelo Estado.
OBS: Para Hely Lopes Meirelles, “na Administração Pública não há liberdade nem vontade pessoal. Enquanto na administração particular é lícito fazer tudo que a lei não proíbe, na Administração Pública só é permitido fazer o que a lei autoriza”.] 
CF, art. 5º, II: ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei;[footnoteRef:154] [154: (MPDFT-2009): Sobre direitos fundamentais, julgue o seguinte item: O princípio da legalidade significa dizer que ninguém será obrigado a fazer, ou deixar de fazer algo, senão em virtude de lei. BL: art. 5º, II, CF.] 
Todavia, quando a CF/88 preceitua no inciso II “em virtude de lei”, esta deve ser interpretada em sentido amplo, nos termos do art. 59 da CF: atos emanados do Parlamento e atos que tenham o conteúdo geral e abstrato (conteúdo das leis). Portanto, não são apenas leis complementares ou ordinárias que podem impor obrigações e deveres. Na verdade, ninguém é obrigado a fazer ou deixar de fazer algo, senão em função de um ato normativo geral e abstrato, cujo fundamento de validade seja a Constituição. 
Desse modo, desde que sejam respeitados os denominados limites formais e materiais com fulcro na Constituição, tais espécies normativas adstritas ao art. 59 da CF poderão criar direitos e deveres. Em outras palavras, observadas as limitações as limitações materiais e formais, a imposição direitos e deveres poderá ser veiculada por todos os atos normativos primários elencados no art. 59 da CF, a saber: a emendas constitucionais, leis complementares, leis ordinárias, leis delegadas, medidas provisórias, decretos legislativos e resoluções.[footnoteRef:155] [155: (TJSP-2018-VUNESP): O princípio da legalidade, já incorporado ao direito pátrio pelas Cartas anteriores, foi mantido pelo artigo 5°, II, da atual Constituição. Sobre o tema, é possível afirmar que o conceito de legalidade não corresponde exclusivamente à lei em sentido formal, mas abrange também os preceitos normativos da própria Constituição e aqueles editados com base nela, como as emendas constitucionais, as leis complementares, as leis delegadas e as medidas provisórias. BL: art. 5º, II e art. 59 da CF.
##Atenção: ##TJDFT-2008: ##MPDFT-2009: ##AGU-2009: ##CESPE: ##MPRS-2014: O princípio da legalidade possui uma abrangência mais ampla que o princípio da reserva legal. Enquanto o princípio da legalidade consiste na submissão a todas as espécies normativas elaboradas em conformidade com o processo legislativo constitucional (leis em sentido amplo), o princípio da reservalegal incide apenas sobre campos materiais específicos, submetidos exclusivamente ao tratamento do Poder Legislativo (leis em sentido estrito). Quando a exige a regulamentação integral de sua norma por lei em sentido formal (ato emanado do Poder Legislativo e elaborado de acordo com o devido processo legislativo), trata-se de reserva legal absoluta; se, apesar de exigir a edição desta espécie de lei, permite que ela apenas fixe os parâmetros de atuação a serem complementados por ato infralegal (por óbvio, respeitados os limites estabelecidos pela legislação), trata-se de reserva legal relativa. Portanto, conclui-se a reserva legal possui abrangência menor que o princípio da legalidade. Isso porque a reserva legal apenas exige que haja lei exigindo determinados comportamentos, enquanto a legalidade orienta a criação de princípios e regras que irão embasar todo o ordenamento jurídico.
(MPPR-2016): Assinale a alternativa correta: O art. 5, inc. II, da CF expressa a ideia de que somente a lei pode criar regras jurídicas (Rechtsgesetze), no sentido de interferir na esfera jurídica dos indivíduos de forma inovadora, sendo inegável nesse sentido o conteúdo material da expressão em virtude de lei presente na Constituição de 1988. BL: art. 5º, II, CF.] 
Restrições: Existem na Constituição duas restrições expressas ao princípio da legalidade: estado de defesa (art. 136, CF) e estado de sítio (art. 137, CF). Durante esses estados de legalidade extraordinária, é possível que sejam impostos determinados deveres, mesmo que não haja previsão na lei. Portanto, atos do executivo podem ser elaborados, impondo determinados deveres (em razão da gravidade da situação). 
Princípio da Legalidade X Reserva Legal: Não confundir o Princípio da Legalidade com o Princípio da Reserva Legal. 
O Princípio da Reserva Legal incide sobre campos materiais específicos, constitucionalmente submetidos a tratamento exclusivo pelo Poder Legislativo (em outras palavras, exige-se lei em sentido estrito – ordinárias e complementares). Ex.: normas gerais de direito tributário. Na doutrina, faz-se a diferença entre reserva legal absoluta e reserva legal relativa.
· Reserva Legal Absoluta: A Constituição exige a regulamentação integral de sua norma por lei em sentido formal. O tratamento da matéria tem que ser integralmente feito por lei em sentido formal. Não é possível que uma matéria submetida à reserva legal absoluta seja, por exemplo, regulamentada parte por lei e parte por decreto. 
· Reserva Legal Relativa: Exige-se a edição de lei em sentido formal, mas permite-se que esta lei apenas fixe os parâmetros de atuação a serem complementados por ato infralegal. A lei fixará apenas os parâmetros de atuação do executivo. 
Vejamos o seguinte julgado:
STF - HC 74.109/SP: “ALEGADO VÍCIO NA COMPOSIÇÃO DO ÓRGÃO JULGADOR DE SEGUNDA INSTÂNCIA – INOCORRÊNCIA [...] O sistema de substituição externa nos Tribunais judiciários constitui, no plano de nosso direito positivo, matéria sujeita ao domínio temático da lei. Subordina-se, em conseqüência, ao princípio da reserva legal absoluta, cuja incidência afasta, por completo, a possibilidade de tratamento meramente regimental da questão.” (g.n)
A doutrina também divide a reserva legal em simples e qualificada:
· Reserva legal simples: A Constituição se limita a autorizar a intervenção legislativa, sem fazer qualquer exigência quanto ao conteúdo ou à finalidade da lei. Simplesmente exige que a matéria seja tratada por lei. Ex.: art. 5º, VI, parte final, CF:
CF, art. 5º, VI - é inviolável a liberdade de consciência e de crença [não há reserva legal expressa], sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias [há reserva legal expressa];[footnoteRef:156] [156: (MPRS-2014): Considere a seguinte afirmação sobre Direitos Fundamentais: A liberdade de crença apresenta-se na Constituição Federal como direito individual sem reserva legal expressa, ao passo que a proteção aos locais de culto e as suas liturgias submete-se ao regime da reserva legal simples. BL: art. 5º, II e VI, CF.] 
· Reserva legal qualificada: As condições para a restrição vêm fixadas na Constituição, que estabelece os fins a serem perseguidos e/ou os meios a serem utilizados.[footnoteRef:157] Ex.: art. 5º, XII, CF/88: [157: (MPPR-2017): Assinale a alternativa correta: A reserva qualificada de lei ocorre quando a norma constitucional exige que a restrição de determinado direito fundamental somente se perfaça por meio de lei em sentido formal, atrelando a limitação a fins a serem necessariamente perseguidos ou os meios a serem compulsoriamente adotados pelo legislador e pelo administrador.
 ##Atenção: ##MPDFT-2009: ##TJDFT-2016: ##CESPE: Quanto à intervenção do legislador no âmbito de proteção dos direitos fundamentais, o princípio da reserva legal costuma ser classificado em dois grupos: 
a) Reserva legal simples: Ela se distingue por autorizar o legislador a intervir no âmbito de proteção de um direito fundamental sem estabelecer pressupostos e/ou objetivos específicos a serem observados, implicando, portanto, a atribuição de uma competência mais ampla de restrição. Ex.: art. 5°, LVIII, CF/88.
b) Reserva legal qualificada: É aquela em que as condições para a restrição vêm fixadas na Constituição, que estabelece os fins a serem perseguidos e os meios a serem utilizados. Ex.: art. 5°, XII, CF/88.] 
CF, art. 5º, XII: é inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas, salvo, no último caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal;  
STF - AC 2.695 MC/RS: “[...] Mais expressiva, ainda, é a norma contida no § 1º desse artigo [art. 220, que trata da liberdade de imprensa] ao subordinar, expressamente, o exercício da liberdade jornalística à ‘observância do disposto no art. 5º, IV, V, X, XIII e XIV’. Temos aqui verdadeira ‘reserva legal qualificada’, que autoriza o estabelecimento de restrição à liberdade de imprensa com vistas a preservar outros direitos individuais, não menos significativos, como os direitos de personalidade em geral.
Por fim, fala-se, ainda, em reserva legal proporcional.
· Reserva Legal Proporcional: Deve haver a compatibilidade da restrição (reserva legal) com o princípio da proporcionalidade, ou seja, é necessário verificar a adequação entre os meios utilizados e os fins perseguidos pelo legislador, a exigibilidade e proporcionalidade em sentido estrito da medida adotada. Portanto, não basta apenas analisar a forma da lei; essa lei deve passar pelo crivo da proporcionalidade (não pode violar o núcleo essencial do direito fundamental). 
Ex.: art. 5º, XIII, da CF/88 “é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer”. Para exercício da profissão de advogado, exige-se a aprovação no exame da OAB e bacharelado em direito – essa lei foi questionada no STF, que não analisou apenas a forma (Constituição permite a restrição dessa liberdade), mas também analisou a proporcionalidade (chegando à conclusão que a exigência era adequada, necessária e proporcional em sentido estrito).[footnoteRef:158]-[footnoteRef:159] [158: (TJGO-2015-FCC): A Lei 8.906/94, que dispõe sobre o Estatuto da Advocacia e a Ordem dos Advogados do Brasil – OAB, estabelece, em seu art. 8o , inciso IV e § 1o , que, “para inscrição como advogado é necessário” haver “aprovação em Exame de Ordem”, “regulamentado em provimento do Conselho Federal da OAB”. A exigência em questão é constitucional, por ser compatível tanto com a exigência de lei para o estabelecimento de condições para o exercício profissional, como com a finalidade institucional do exercício da advocacia como função essencial à Justiça. BL: art. 5º, XIII, CF.
(TJPR-2012-UFPR): O art. 5º, XIII da CF, que assegura a liberdade de “exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidasas qualificações profissionais que a lei estabelecer”, constitui norma de eficácia contida, passível de ser restringida pelo legislador, como no caso da restrição imposta pela exigência de aprovação do exame da OAB para o exercício da profissão de advogado. 
##Atenção: Além disso, é dotada de aplicabilidade direta, imediata, mas não integral, passível de ser restringida pelo legislador, como no caso da restrição imposta pela exigência de aprovação do exame da OAB para o exercício da profissão de advogado.] [159: ##Atenção: Tema cobrado na prova do MPF-2013.] 
Prova Oral TJPE (2015-FCC): Questiona-se: A legalidade do art. 5º da Constituição da República é a mesma legalidade do art. 37 da CF/88? Segundo José Levi Mello do Amaral Júnior, Einsenmann identificou a existência de vários sentidos para a legalidade. O sentido clássico de legalidade encontra-se no art. 5º, II (ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei) e retrata a essência mais íntima do Estado de Direito. Quem nos governa é a lei, expressão da nossa vontade, manifestada diretamente ou indiretamente (por meio dos nossos representantes). Em Rousseau, esta lei denomina-se vontade geral. Essa lei implica coincidência entre quem manda e quem obedece. Podemos fazer tudo aquilo que a lei não nos veda. Este primeiro sentido é a legalidade-compatibilidade. O segundo sentido encontra-se no art. 37, caput, que trata dos princípios da Administração Pública. Diferentemente da pessoa humana (que pode fazer tudo o que a lei não nos veda), a Administração só pode fazer aquilo que a lei lhe permite. Este segundo sentido é a legalidade-conformidade.
1.2. Princípio da não retroatividade das leis (ou irretroatividade das leis)
Finalidade: Tal princípio visa resguardar a incolumidade de situações definitivamente consolidadas, de modo a preservar a segurança jurídica. Por isso, muitos extraem desse dispositivo a própria segurança jurídica (art. 5º, caput e inciso XXXVI). 
##Atenção: A única Constituição brasileira até hoje que não consagrou esse princípio foi a Constituição de 1937.
Previsão: Atualmente, o princípio está consagrado no art. 5º, XXXVI da CF/88 e no art. 6º da LINDB, vejamos:
CF, art. 5º, XXXVI: a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada;
LINIDB, art. 6º: A Lei em vigor terá efeito imediato e geral, respeitados o ato jurídico perfeito, o direito adquirido e a coisa julgada.[footnoteRef:160] [160: (TJRR-2015-FCC): Considere o seguinte texto: Conforme foi visto, em regra, uma lei só se revoga por outra. Dificilmente, entretanto, se poderá traçar de imediato a linha divisória entre o império da lei antiga e o da lei nova que a tenha revogado ou derrogado. Relações jurídicas existirão sempre, de tal natureza, que, entabuladas embora no regime do velho estatuto, continuarão a surtir efeitos quando o diploma revogador já esteja em plena vigência. Outras, de acabamento apenas começado, terão sido surpreendidas por nova orientação inaugurada pelo legislador. Por outro lado, tal pode ser o teor do estatuto novo, que as situações que pretenda abranger mais parecerão corresponder ao império do diploma revogado. Ora, é exatamente a esse entrechoque dos mandamentos da lei nova com os da lei antiga, que se denomina conflito das leis no tempo. (FRANÇA, R. Limongi. Manual de Direito Civil. v. 1. p. 37. 4. ed. RT, 1980). A legislação brasileira sobre essas questões dispõe que a lei em vigor terá efeito imediato e geral, respeitados o ato jurídico perfeito, o direito adquirido e a coisa julgada. BL: art. 6º, LINDB.
(MPGO-2014): A lei em vigor terá efeito imediato e geral, respeitados o ato jurídico perfeito, o direito adquirido e a coisa julgada. Consideram-se adquiridos os direitos que o seu titular, ou alguém por ele, possa exercer, como aqueles cujo começo do exercício tenha termo pré-fixo, ou condição pré-estabelecida inalterável, a arbítrio de outrem. BL: art. 6º da LINDB e art. 5º, XXXVI da CF/88.] 
##Questiona-se: Qual a diferença entre os dois planos (constitucional e legal)? 
Quando o princípio está consagrado apenas na lei, ele não obriga o legislador, que poderia fazer uma lei posterior, revogando inteiramente/parcialmente o princípio. Nesse caso, é mais voltada ao intérprete, que não terá a faculdade de interpretar a lei com efeitos retroativos.
Contudo, ao ser consagrado na CF/88, serve como limite não apenas à atuação do intérprete, mas, também, à atuação do legislador que, em regra, não poderá fazer leis com efeitos retroativos. 
Embora a regra seja a não retroatividade, existem algumas situações em que a eficácia retroativa é admitida. A eficácia retroativa:
a) Pode ser oponível a todas as leis (tanto de direito público, quanto de direito privado);
b) Jamais se presume. Para que uma lei possa retroagir, é necessária previsão expressa;
c) Deve ser sempre excepcional e emanar de disposição expressa – não pode, portanto, ser regra (pois a regra é a irretroatividade); e
d) Não pode gerar lesão a ato jurídico perfeito, direito adquirido e coisa julgada.
Exemplo: Leis penais benéficas ao réu (previsão na própria Constituição); leis interpretativas (consideradas contemporâneas à própria lei interpretada). Mesmo nesses casos, as situações jurídicas definitivamente consolidadas e os direitos subjetivos definitivamente constituídos não poderão ser alterados. 
Vejamos o seguinte precedente do STF:
STF – ADI 605 MC/DF: “O princípio da irretroatividade ‘somente’ condiciona a atividade jurídica do Estado nas hipóteses expressamente previstas pela Constituição, em ordem a inibir a ação do Poder Público eventualmente configuradora de restrição gravosa (a) ao status libertatis da pessoa (CF, art. 5.º, XL), (b) ao status subjectionais do contribuinte em matéria tributária (CF, art. 150, III, “a”) e (c) a ‘segurança’ jurídica no domínio das relações sociais (CF, art. 5.º, XXXVI), na medida em que a retroprojeção normativa da lei ‘não’ gere e ‘nem’ produza os gravames referidos, nada impede que o Estado edite e prescreva atos normativos com efeito retroativo. As leis, em face do caráter prospectivo de que se revestem, devem, ‘ordinariamente’, dispor para o futuro. O sistema jurídico-constitucional brasileiro, contudo, ‘não’ assentou, como postulado absoluto, incondicional e inderrogável, o princípio da irretroatividade. A questão da retroatividade das leis interpretativas.” (g.n.)
A jurisprudência do STF tem, ainda, algumas decisões importantes a respeito do direito adquirido: 
· 1ª decisão:
Não cabe a alegação de direito adquirido contra a mudança de regime jurídico (RE 957.768 AgR/PB); 
Exemplo: Um servidor público, regido pela Lei 8.112/90, que tem determinados direitos assegurados, não pode dizer, caso haja mudança na lei, que o seu regime jurídico é o regime da lei anterior e que, portanto, tem direito de manter seus benefícios. Outro exemplo são os extintos quinquênios. Os servidores que já haviam incorporado aquele valor não tiveram a redução, mas, dali em diante, não puderam adquirir novos quinquênios. 
· 2ª decisão:
A irredutibilidade de vencimentos é uma “modalidade qualificada” de direito adquirido (não veda a redução de parcelas que componham os critérios legais de fixação, desde que não se diminua o valor da remuneração na sua totalidade) (RE 364.317/RS);[footnoteRef:161] [161: (TJMG-2012-VUNESP): Com relação ao princípio do “direito adquirido”, o STF já consolidou o entendimento de que a garantia constitucional de irredutibilidade de vencimentos dos servidores públicos é “modalidade qualificada” de “direito adquirido”. BL: STF, RE 105.137.] 
A lei não pode reduzir os vencimentos, mas isso não significa que ela não pode retirar benefícios (como os quinquênios mencionados anteriormente), desde que o valor total da remuneração não seja reduzido. 
· 3ª decisão:
Súmula 654/STF: “A garantia da irretroatividade da lei, prevista no art 5º, XXXVI, da Constituição da República, não é invocável pela entidade estatal que a tenha editado”; 
A irretroatividade éuma garantia colocada à disposição dos indivíduos contra o arbítrio do Estado. Por isso, se o Poder Público editar a lei, ele não pode alegar a irretroatividade em seu benefício.
· 4ª decisão:
Súmula 473/STF: “A administração pode anular seus próprios atos, quando eivados de vícios que os tornam ilegais, porque deles não se originam direitos; ou revogá-los, por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos, e ressalvada, em todos os casos, a apreciação judicial”.
Direitos adquiridos e normas constitucionais: Pode-se invocar direitos adquiridos em face da Constituição? É necessário diferenciar o tipo de norma constitucional.
- Normas constitucionais originárias: O STF tem uma jurisprudência pacífica no sentido de que não se pode invocar direito adquirido em face de uma nova Constituição, ou seja, o poder constituinte originário não está submetido aos direitos adquiridos na ordem jurídica anterior, já que ele é um poder autônomo/inicial.[footnoteRef:162]-[footnoteRef:163] [162: (MPRR-2017-CESPE): O poder constituinte originário pode limitar os proventos de aposentadoria que sejam percebidos em desacordo com a CF, não sendo oponível, nesse caso, a alegação de direito adquirido.
##Atenção: De acordo com o STF, não existe direito adquirido em face do poder constituinte originário, uma vez que ele é inicial, juridicamente ilimitado, incondicionado, autônomo e permanente.
(PGMBH-2017-CESPE): Devido às características do poder constituinte originário, as normas de uma nova Constituição prevalecem sobre o direito adquirido.] [163: ##Atenção: Tema cobrado na prova do MPBA-2018.] 
Embora não esteja obrigado a observar esses direitos adquiridos, em alguns casos, é necessário que ele diga expressamente que aqueles direitos não serão observados. Por isso, é necessário diferenciar os tipos de retroatividade:
a) Retroatividade Mínima: Alcança os efeitos futuros de fatos passados. O fato ocorreu em um determinado momento e, posteriormente, surge uma nova Constituição. Na retroatividade mínima, a Constituição se aplica imediatamente e de forma automática. Não precisa estar expresso no texto constitucional. [footnoteRef:164] [164: ##Atenção: Tema cobrado na prova do MPGO-2019.] 
Exemplo: Quando há alteração das regras de competência. Se a nova Constituição muda as regras de competência, ela se aplica automaticamente aos processos em curso; outro exemplo é o art. 17 do ADCT (se a pessoa recebia acima do teto, com a advento da nova Constituição, terá que se adaptar ao teto).
Vejamos o seguinte precedente:
STF - RE 242.740/GO: “EMENTA: Pensão especial cujo valor é estabelecido em número de salários mínimos. Vedação contida na parte final do artigo 7º, IV, da Carta Magna, a qual tem aplicação imediata. - Esta Primeira Turma, ao julgar o RE 140.499, que versava caso análogo ao presente, assim decidiu: "Pensões especiais vinculadas a salário mínimo. Aplicação imediata a elas da vedação da parte final do inciso IV do artigo 7º da Constituição de 1988. Já se firmou a jurisprudência desta Corte no sentido de que os dispositivos constitucionais têm vigência imediata, alcançando os efeitos futuros de fatos passados (retroatividade mínima). Salvo disposição expressa em contrário - e a Constituição pode fazê-lo -, eles não alcançam os fatos consumados no passado nem as prestações anteriormente vencidas e não pagas (retroatividades máxima e média)...”. (g.n.) [footnoteRef:165] [165: ##Atenção: Tema cobrado na prova do MPGO-2019.] 
##Atenção: ##STF: ##MPGO-2019: Segundo Gilmar Mendes, reconhece-se como típico das normas do poder constituinte originário serem elas dotadas de eficácia retroativa mínima, já que se entende como próprio dessas normas atingir efeitos futuros de fatos passados. No entanto, no entendimento atual do STF, os efeitos do ato praticado anteriormente que se exauriram antes da nova norma constitucional não sofrem a influência da nova norma constitucional, a não ser que esta seja expressa nesse sentido. Em outras palavras, as garantias do direito adquirido, do ato jurídico perfeito e da coisa julgada não se dirigem ao constituinte originário quanto a situações constituídas no passado que sejam destinadas a produzir efeitos ao longo do tempo; quanto a situações ocorridas no passado que se exauriram, as garantias persistem, salvo disposição contrária expressa no texto da nova Constituição. (Fonte: Curso de Direito Constitucional - Gilmar Mendes)
b) Retroatividade Média: É necessária previsão expressa. Alcança fatos que ocorreram no passado, mas que estão pendentes de serem consumados. 
Exemplo: uma prestação vencida e não paga. 
Vejamos o seguinte precedente:
STF - RE 168.618/PR: “A Constituição tem eficácia imediata, alcançando os efeitos futuros de fatos passados (retroatividade mínima). Para alcançar, porém, hipótese em que, no passado, não havia foro especial que só foi outorgado quando o réu não mais era Prefeito - hipótese que configura retroatividade média, por estar tramitando o processo penal -, seria mister que a Constituição o determinasse expressamente, o que não ocorre no caso...”
c) Retroatividade Máxima: É necessária previsão expressa. Diz respeito a fatos já consumados.
Exemplo: Já houve preclusão. 
Vejamos art. 231, §6º da CF:
CF, art. 231, § 6º: São nulos [têm vícios de origem e, portanto, devem retroagir] e extintos, não produzindo efeitos jurídicos, os atos que tenham por objeto a ocupação, o domínio e a posse das terras a que se refere este artigo, ou a exploração das riquezas naturais do solo, dos rios e dos lagos nelas existentes, ressalvado relevante interesse público da União, segundo o que dispuser lei complementar, não gerando a nulidade e a extinção direito a indenização ou a ações contra a União, salvo, na forma da lei, quanto às benfeitorias derivadas da ocupação de boa-fé.
- Emendas: Gera muita divergência na doutrina e já foi alterado o entendimento na jurisprudência, em razão da redação ao art. 5º, XXXVI: “a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada”. Não há um consenso sobre a interpretação do termo “lei” (se seria em sentido estrito ou em sentido amplo).
Se a lei for em sentido estrito, a limitação só se dirige ao Poder Legislativo e não ao poder constituinte derivado reformador – essa era a interpretação do STF antes da CF/88. 
Se considerarmos que é lei em sentido amplo, abrangeria normas feitas, também, pelo poder constituinte derivado reformador. 
Hoje, prevalece na doutrina e na jurisprudência do STF o entendimento de que a lei é em sentido amplo, abrangendo, portanto, as Emendas Constitucionais, Medidas Provisórias, Leis Delegadas, etc. Para o professor Marcelo Novelino, é o entendimento mais adequado por proteger a segurança jurídica (veja que já temos mais de 90 Emendas Constitucionais, então não é tão difícil aprovar uma EC). Vejamos o seguinte precedente do STF:
STF - ADI 2.356 MC/DF: “[...] O art. 78 do ADCT, acrescentado pelo art. 2.º da EC 30/2000, ao admitir a liquidação ‘em prestações anuais, iguais e sucessivas, no prazo máximo de dez anos’ dos ‘precatórios pendentes na data de promulgação’ da emenda, violou o direito adquirido do beneficiário do precatório, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada. [...] Pelo que a alteração constitucional pretendida encontra óbice nos incisos III e IV do § 4.º do art. 60 da Constituição, pois afronta ‘a separação dos Poderes’ e ‘os direitos e garantias individuais’” [...]
Isso não significa que a irretroatividade seja uma garantia absoluta. No caso da não retroatividade, excepcionalmente, ela poderá ser restringida para que um outro direito de peso maior possa prevalecer. 
Ex.: Exame de DNA em investigação de paternidade. Em um caso no Distrito Federal, mesmo após a existência do exame de DNA, houve pedido de investigação de paternidade, mas o DF não oferecia gratuitamente esse exame, a mãe do menino não tinha como custear e não conseguiram provar a paternidade. Posteriormente, o DF passou a custear e a mãe do menino entrou novamente com aação, quando se alegou coisa julgada. Contudo, o Min. Dias Toffoli entendeu que nesse caso se justificaria a alteração da coisa julgada por terem direitos de peso maior em jogo. 
##Questiona-se: O ato jurídico perfeito é oponível a leis de ordem pública (pergunta muito frequente em provas no CESPE)? 
Segundo o STF, a Constituição não faz qualquer distinção entre leis de ordem pública ou não. Portanto, o ato jurídico perfeito pode sim ser invocado mesmo se tratando de lei de ordem pública. Vejamos o seguinte precedente:
STF – RE 200.514/RS: “Esta Corte já firmou o entendimento (assim, entre outros precedentes, na ADIN 493-0, de que fui relator) de que o princípio constitucional segundo o qual a lei nova não prejudicará o ato jurídico (artigo 5º, XXXVI, da Carta Magna) se aplica, também, às leis infraconstitucionais de ordem pública.”
Coisa julgada: Qual tipo de coisa julgada está protegida pela Constituição? 
Segundo o STF, a coisa julgada protegida é tanto a formal (efeitos endoprocessuais), quanto a material (efeitos extraprocessuais). Contudo, a coisa julgada administrativa não está protegida por esse dispositivo em análise (RE 144.996).
##Atenção: Relativização da coisa julgada: Em determinadas situações, pode ocorrer a relativização, inclusive da coisa julgada. O STF tem várias decisões onde utiliza dois princípios constitucionais para relativizar a coisa julgada: força normativa da constituição e máxima efetividade. Segundo o STF, a manutenção de soluções divergentes enfraquece a força normativa da constituição e contraria o princípio da máxima efetividade. 
Na condição de guardião da Constituição, cabe ao STF dar a última palavra a respeito da sua interpretação. Em hipóteses de divergência interpretativa, mesmo que a decisão já tenha transitado em julgado, é possível haver a relativização. Ex.: TJMG deu uma decisão, interpretando a CF/88 no sentido A; depois, o STF interpreta a Constituição no sentido B. Essa divergência pode enfraquecer a força normativa da Constituição. Por isso, admite-se a relativização da coisa julgada, através da propositura de ação rescisória, dentro do prazo de 2 anos, para que o entendimento do STF possa prevalecer.[footnoteRef:166] [166: (MPSC-2016): Como princípio fundamental relacionado à segurança jurídica a Constituição Federal expressamente previu que “a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada”. A ação rescisória, entretanto, é uma das hipóteses de relativização desse princípio. ] 
##Obs.: A Súmula 343 do STF não se aplica na hipótese de interpretação constitucional. Aqui, o Supremo faz um distinguishing: a Súmula se aplica quando há divergência sobre a interpretação de lei infraconstitucional, todavia, não quando há dúvida sobre a intepretação da Constituição. Vejamos:
Súmula 343/STF: “Não cabe ação rescisória por ofensa a literal dispositivo de lei, quando a decisão rescindenda se tiver baseado em texto legal de interpretação controvertida nos tribunais.”
Inexigibilidade de título judicial no NCPC: São duas hipóteses em que o título judicial se torna inexigível: 
(i) quando o Supremo declara uma lei inconstitucional e o Título Executivo Judicial foi baseado nessa lei; e 
(ii) o Título Executivo Judicial tem como fundamento uma interpretação incompatível com interpretação dada pelo Supremo. 
##Atenção: Cuidado com o prazo: Imagine que o TJ deu uma decisão que transitou em julgado. Anos depois, o STF dá uma decisão, interpretando de maneira diferente. De acordo com o § 15 do art. 525 do NCPC, o prazo de dois anos para ação rescisória é contado, não da decisão do TJ, mas do trânsito em julgado da decisão do STF. Mas e se a decisão do Supremo for dada 10 anos depois? Se se admitisse que, ainda assim, fosse possível a ação rescisória, geraria uma insegurança jurídica enorme. Por isso, a constitucionalidade desse artigo está sendo questionada, vejamos: 
CPC/2015, art. 525, § 12. Para efeito do disposto no inciso III do § 1 o deste artigo, considera-se também inexigível a obrigação reconhecida em título executivo judicial fundado em lei ou ato normativo considerado inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal, ou fundado em aplicação ou interpretação da lei ou do ato normativo tido pelo Supremo Tribunal Federal como incompatível com a Constituição Federal, em controle de constitucionalidade concentrado ou difuso.
§ 14. A decisão do Supremo Tribunal Federal referida no § 12 deve ser anterior ao trânsito em julgado da decisão exequenda. 
§ 15. Se a decisão referida no § 12 for proferida após o trânsito em julgado da decisão exequenda, caberá ação rescisória, cujo prazo será contado do trânsito em julgado da decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal. [footnoteRef:167] [167: (PGM-Fortaleza/CE-2017-CESPE): Situação hipotética: Ao ser intimado em cumprimento de sentença, o executado tomou conhecimento de que, após o trânsito em julgado da decisão condenatória executada, o STF considerou inconstitucional lei que amparava a obrigação reconhecida no título executivo judicial. Assertiva: Nesse caso, será cabível a utilização de ação rescisória, cujo prazo será contado do trânsito em julgado da decisão proferida pelo STF. BL: art. art. 525, §12 e 15, NCPC.] 
Mudança de entendimento do STF: Imagine que uma decisão seja dada por um Tribunal em conformidade com a jurisprudência do STF à época. Contudo, um ano depois, o STF muda esse entendimento. A decisão do tribunal pode ser relativizada nesse caso (sendo que na época que foi dada estava de acordo com o entendimento do STF)? De acordo com o atual entendimento, não cabe a rescisória nessa situação. Vejamos o seguinte precedente:
STF - RE 590.809/RS: “Não cabe ação rescisória quando o julgado estiver em harmonia com o entendimento firmado pelo Plenário do Supremo à época da formalização do acórdão rescindendo, ainda que ocorra posterior superação do precedente.”
##Questiona-se: É possível conciliar esse entendimento com o disposto no § 15 do art. 525 do NCPC? 
Para o professor Marcelo Novelino, é possível. Quando o NCPC diz que a ação rescisória será cabível no prazo de 2 anos da decisão do STF, podemos interpretar esse dispositivo no seguinte sentido: é cabível a rescisória, desde que, no momento da decisão, não houvesse precedente do Supremo sobre o tema. Se decidiu em harmonia com o entendimento do Supremo à época, não caberá ação rescisória. 
2. AÇÕES CONSTITUCIONAIS
2.1. Habeas Data
Surge na CF/88 como uma reação à Constituição anterior, em que os dados referentes às convicções/condutas das pessoas ficavam arquivados pelo governo de forma sigilosa. Com o processo de redemocratização, a CF/88 achou por bem permitir que esses dados sejam acessados pelas pessoas, desde que as informações digam respeito a ela. 
O Habeas Data protege informações pessoais e não o acesso a informações relativas a terceiros. Vejamos o art. 5º, LXXII da CF:
CF, art. 5.º, LXXII: conceder-se-á “habeas-data”: 
a) para assegurar o conhecimento de informações relativas à pessoa do impetrante, constantes de registros ou bancos de dados de entidades governamentais ou de caráter público; 
b) para a retificação de dados, quando não se prefira fazê-lo por processo sigiloso, judicial ou administrativo.[footnoteRef:168] [168: (TJAP-2009-FCC): Dentre as garantais constitucionais constantes da Constituição, incluem-se o habeas data para assegurar o conhecimento de informações relativas à pessoa do impetrante, constantes de registros ou bancos de dados de entidades governamentais ou de caráter público, bem como para a retificação de dados, quando não se prefira fazê-lo por processo sigiloso, judicial ou administrativo. BL: art. 5º, LXXII, CF/88. 
(TJSP-2009-VUNESP): O Habeas Data será concedido para a retificação de dados, quando não se prefira fazê-lo por processo sigiloso, judicial ou administrativo. BL: art. 5º, LXXII, “b”, CF/88. ] 
A Constituição prevê apenas as hipóteses de cabimento do habeas data para assegurar o conhecimento de informações pessoais e para retificação de dados. Além disso,também há previsão constitucional sobre a gratuidade desta ação. Todo o procedimento desse remédio constitucional, contudo, é feito pela Lei 9.507/97. 
2.1.1. Legitimidade Ativa
A Lei 9507/97 não faz qualquer menção à legitimidade ativa. Em razão disso, a doutrina majoritária dispõe que a legitimidade ativa deve ser interpretada em sentido amplo, ou seja, devem ser considerados como partes legítimas para impetrar habeas data qualquer pessoa física ou jurídica (inclusive de direito público e/ou estrangeiras) para obtenção de informações a seu respeito. 
Essa ação é considerada personalíssima, ou seja, apenas o próprio impetrante pode propor ação para ter acesso a informações a seu respeito. O STF possui uma decisão em que, excepcionalmente, permitiu a propositura de habeas data por terceiros, herdeiros ou sucessores, na defesa de interesse do falecido. Veja que a legitimação de terceiros não é permitida de forma geral. Veja o precedente:
STF - HD 147/DF: “É parte legítima para impetrar habeas data o cônjuge sobrevivente na defesa de interesse do falecido”;
##Questiona-se: O MP pode impetrar habeas data? Apenas se for para obtenção de informação sobre o próprio órgão ministerial. Ou seja, não tem legitimidade para impetrar habeas data com finalidade de ter acesso a informações sobre terceiros. Há uma impossibilidade de legitimação extraordinária. 
2.1.2. Legitimidade Passiva
##Questiona-se: Quem tem legitimidade passiva? O órgão ou entidade (pessoa jurídica) detentor da informação que se pretende obter, retificar ou complementar. Portanto, pessoas físicas de determinado órgão não podem ser consideradas coautoras e integrar o polo passivo da ação. Isso se justifica em razão do art. 2º da Lei 9.507/97, que menciona “órgão ou entidade”:
Art. 2° O requerimento será apresentado ao órgão ou entidade depositária do registro ou banco de dados e será deferido ou indeferido no prazo de quarenta e oito horas.
##Questiona-se: Esse órgão ou entidade tem que ter natureza pública? O art. 5º, LXXII da CF dispõe “constantes de registros ou bancos de dados de entidades governamentais ou de caráter público”. Quando se fala de “caráter público”, o texto está se referindo ao órgão/entidade? O entendimento da doutrina, com base na Lei 9.507/97, é de que o caráter público é dos dados e não da entidade. Vejamos o que diz o art. 1º, § único da Lei 9507/97:
Parágrafo único. Considera-se de caráter público todo registro ou banco de dados contendo informações que sejam ou que possam ser transmitidas a terceiros ou que não sejam de uso privativo do órgão ou entidade produtora ou depositária das informações.
Assim, Serasa, SPC, universidades particulares, partidos políticos, etc., podem, portanto, figurar no polo passivo de ação de habeas data. 
2.1.3. Objeto
##Questiona-se: O que o habeas data visa tutelar? Tutela, principalmente, os direitos fundamentais à privacidade (CF, art. 5.º, X) e o acesso à informação (CF, art. 5.º, XIV e XXXIII). 
Lembrar que “acesso à informação” é apenas com relação a informações de caráter pessoal do titular e não a toda e qualquer informação.
2.1.4. Objetivo
Visa assegurar o conhecimento, a retificação e/ou a complementação de informações pessoais constantes de registros de dados, sempre que não se prefira fazê-lo por processo sigiloso, judicial ou administrativo.
Embora a Constituição fale apenas em conhecimento e retificação de dados, a Lei 9.507/97 trata de três hipóteses de cabimento do habeas data, inserindo também a possibilidade de complementação de informações pessoais. 
2.1.5. Hipóteses de cabimento
Art. 7° Conceder-se-á habeas data:
I - para assegurar o conhecimento de informações relativas à pessoa do impetrante, constantes de registro ou banco de dados de entidades governamentais ou de caráter público;
II - para a retificação de dados, quando não se prefira fazê-lo por processo sigiloso, judicial ou administrativo;
III - para a anotação nos assentamentos do interessado, de contestação ou explicação sobre dado verdadeiro mas justificável e que esteja sob pendência judicial ou amigável.
Conhecimento de informações pessoais: O cabimento da ação, neste caso, está condicionado à natureza pessoal da informação pretendida. As informações que não sejam de caráter pessoal (ex.: informação de interesse público) devem ser buscadas por Mandado de Segurança. Nessa hipótese, não há necessidade de justificar os motivos pelos quais se quer acesso às informações pessoais. Independe de qualquer motivo. Vejamos a seguinte decisão do STJ:
STJ – REsp 781.969/RJ: “[...] A pretensão do impetrante, de obter certidão para o cômputo do adicional por tempo de serviço, respeita ao direito de informação, cuja previsão encontra-se no art. 5.º, XXXIII, da Carta Magna de 1988, devendo ser pleiteada via mandado de segurança.”
Retificação de dados: Nesse caso, o STJ tem um precedente que afirma que, para que seja solicitada a retificação de dados, é necessário o prévio conhecimento de tais dados, não sendo possível pedir, no mesmo habeas data, o acesso à informação e a retificação, o que, na opinião de Marcelo Novelino, vai contra o princípio da celeridade e da economia processual. Vejamos o precedente em comento: 
STJ – HD 160/DF: “Em razão da necessidade de comprovação de plano do direito do demandante, mostra-se inviável a pretensão de que, em um mesmo habeas data, se assegure o conhecimento de informações e se determine a sua retificação. É logicamente impossível que o impetrante tenha, no momento da propositura da ação, demonstrado a incorreção desses dados se nem ao menos sabia o seu teor. Por isso, não há como conhecer do habeas data no tocante ao pedido de retificação de eventual incorreção existente na base de dados do Banco Central do Brasil.
##Obs.: Esse entendimento parece equivocado, pois a pessoa pode não ter o acesso completo às informações, mas pode ter tido a notícia de que a informação estava equivocada. 
Complementação de dados: A pessoa pede para que as informações sejam complementadas na base de dados. Nesse caso, deve haver o interesse de agir do autor, que terá que comprovar que a não complementação gera algum prejuízo concreto (à imagem, à honra, de ordem material, etc.).
2.1.6. Interesse de Agir
A Lei 9.507/97 exige, para impetração do habeas data, que haja uma recusa por parte da autoridade administrativa em autorizar os dados. Por isso, muitos questionaram a constitucionalidade desta lei dizendo que ela violava o princípio da inafastabilidade da função jurisdicional, ao obrigar a pessoa a esgotar as vias administrativas antes de recorrer ao judiciário.
Contudo, o STF entendeu que a lei não apresenta inconstitucionalidade, pois, ao exigir a recusa, ela está tratando do interesse de agir do indivíduo. Se não houve recusa, não há pretensão resistida e, consequentemente, não há interesse de agir. 
Atente-se que a Lei 9.507/97 prevê que o interesse de agir surge com a recusa ou com a demora da prestação/retificação/complemento das informações. Vejamos o seguinte:
Art. 8° A petição inicial, que deverá preencher os requisitos dos arts. 282 a 285 do Código de Processo Civil, será apresentada em duas vias, e os documentos que instruírem a primeira serão reproduzidos por cópia na segunda.
Parágrafo único. A petição inicial deverá ser instruída com prova:
I - da recusa ao acesso às informações ou do decurso de mais de dez dias sem decisão;
II - da recusa em fazer-se a retificação ou do decurso de mais de quinze dias, sem decisão; ou
III - da recusa em fazer-se a anotação a que se refere o § 2° do art. 4° ou do decurso de mais de quinze dias sem decisão.
Súmula 2/STJ: “Não cabe o habeas data (CF, art. 5.º, LXXII, “a”) se não houve recusa de informações por parte da autoridade administrativa.”
No mesmo sentido: STF - RHD 22/DF e RHD 24/DF.
2.1.7. Liminar e decisão de mérito
Não há nenhuma previsão na Lei 9.507/97 sobre a concessão de liminar. No entanto, em razão do poder geral de cautela do Judiciário, a doutrina, de forma unânime, entende que a liminar pode ser cabível em determinadas

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