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A escravidão contemporânea e o Direito do Trabalho

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Em novembro 30, 2008 por Equipe Âmbito Jurídico(https://ambitojuridico.com.br/author/ambitojuridicoold/)
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A escravidão contemporânea e os princípios do Direito do Trabalho
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Resumo: O trabalho escravo existe desde os tempos remotos. No Brasil, ele está relacionado à herança
cultural, a desigualdade e a impunidade. Trabalhadores abandonam suas cidades de origem e aceitam
propostas sedutoras feitas por aliciadores, no intuito de suprir sua necessidades básicas, submetendo-
se a escravidão ou/e práticas análogas a esta, utilizadas pelo escravocrata contemporâneo que surgiu
no contexto da globalização neoliberal. Os princípios protetivos do trabalho inseridos na Constituição
Federal Brasileira de 1988 e os princípios constantes na Consolidação das Leis do Trabalho são
mitigados pela situação de vulnerabilidade e necessidade do trabalhador que busca sua dignidade no
trabalho a fim de suprir o que o Estado deveria lhe fornecer. Com o advento da Lei 10.803/2003
ampliou-se o rol das formas de trabalho em condições análogas a de escravo, o que facilitou a
tipicidade da conduta do escravocrata. Diversas medidas com o propósito de erradicar o trabalho
escravo contemporâneo estão sendo tomadas pelo Estado, pela Organização Internacional do Trabalho
e pela Sociedade Civil. Mesmo assim a situação persiste.[1]
Palavras-chave: Escravidão. Princípios Protetivos. Medidas de Combate.
Sumário: Introdução. 1. A Escravidão na História da Humanidade. 1.1. A Escravidão nas Sociedades
Arcaicas. 1.2. A Escravidão na Antiguidade Clássica. 1.3. A Escravidão Dentro do Pacto Metropolitano
Colonial. 1.4. A Abolição da Escravidão: Interesses e Manutenção da Desigualdade. 2. A Escravidão
Capitalista Contemporânea. 2.1. A Relação da Escravidão Com a Globalização Neoliberal: O Contexto
Neo-escravocrata Mundial. 2.2. A Escravidão no Brasil Em Suas Várias Regiões. 3. O Direito e o
Combate ao Trabalho Análogo à de Escravo. 3.1. A Dignidade do Trabalho e os Direitos Sociais
Previstos na Constituição. 3.2. O Direito do Trabalho e os Princípios Protetivos da Dignidade do
Trabalho. 3.2.1 Princípio da Proteção. 3.2.2 Princípio da Irrenunciabilidade. 3.2.3 Princípio da
Continuidade da Relação de Emprego. 3.2.4 Princípio da Primazia da Realidade. 3.2.5 Princípios da
R bilid d d B fé 3 3 A R d ã C di ã A ál à d E 3 3 1 C ê i P
https://edgrmtracking.com/?rid=d231641208086f3b
Razoabilidade e da Boa-fé. 3.3 A Redução a Condição Análoga à de Escravo. 3.3.1 Competência Para
Julgar O Crime do Artigo 149 do CPB. 3.3.2 A Ação Articulada No Combate a Escravidão. 3.3.3 As
Varas Intineirantes Como Meio de Reduzir a Impunidade. 3.3.4 A Portaria nº 540/2004 do Ministério do
Trabalho e Emprego. 3.4. Projetos Legislativos e Práticas Punitivas que Poderiam Efetivar
Juridicamente o Combate ao Trabalho Análogo ao Escravo. 3.4.1 Outros Projetos de Lei. Conclusão.
Referências.
INTRODUÇÃO
A função dos princípios do direito do Trabalho no século XXI é a de informar todo o sistema jurídico
permitindo ao trabalhador aclamá-los e invocá-los em meio ao sistema neoliberal globalizado adotado
pelo país, de modo a influenciar as relações de trabalho em suas varias modalidades e proteger o
hipossuficiente qual seja: o trabalhador.
As garantias mínimas de proteção ao trabalhador estão previstas na constituição Federal Brasileira, de
1988 que tem como um dos princípios a dignidade humana e a valorização do trabalho. A
Consolidação das leis Trabalhistas existe desde 1943; o Código Penal Brasileiro dede 1940 o qual
prevê como crime a escravidão ou situação análoga a esta, porém acentuadamente tem se
demonstrado no seio da sociedade a realidade cruel da escravidão.
Projetos Legislativos, práticas administrativas e da sociedade civil no combate a escravidão se
intensificam a cada dia. Mas, ainda assim a escravidão e suas modalidades são reais no Brasil em
todo o mundo, tanto nas áreas urbanas quanto nas rurais. Uma vez que o ser humano tem de converter
a própria atividade em ganho de subsistência pessoal e familiar. Tal situação escravizante não é nova,
simplesmente tem se transformado ao longo dos séculos.
No direito do trabalho há uma preocupação com o direito ao trabalho, cujo fundamento é o próprio
direito à vida.
1. A ESCRAVIDÃO NA HISTÓRIA HUMANA
1.1 A escravidão nas sociedades arcaicas
A Terra é considerada como o substrato material para a existência e manutenção da vida. A ambiência
na qual o ser humano vive e convive com o meio físico, com o universo biológico e mais especialmente
com os outros homens.
A Bíblia Sagrada no livro de Genesis revela a criação do homem (humanidade) como um ato divino. O
homem foi feito para governar (administrar), por isso nele foi colocada a capacidade de raciocínio, que
os demais animais não possuem. Vale dizer que o homem vivia apenas da coleta de alimentos
encontrados na natureza a qual foi feita por Deus, para deleite do próprio homem, o qual não conhecia
uma jornada exaustiva de trabalho, e, mesmo experimentando um grande esforço em suas atividades,
gozava de tempo para reposição de suas forças, gozava do ócio (no sentido grego), pois foi um tempo
de liberdade. Apenas a Deus o homem devia obediência. (Bíblia de Estudos de Genebra 2002, p. 11).[2]
“Nas sociedades primitivas havia um nível de cooperação mui grande e os homens se uniam para lutar e
enfrentar os desafios da natureza hostil e dos animais ferozes. Os meios de produção, as áreas de caça,
assim como os produtos,aqui são propriedades comuns.
Mais, nesse momento os homens passam a dominar o fogo, a utilizar instrumentos de trabalho que são
encontrados ao acaso, o que significa que constantemente os homens estão em um processo de domínio
sobre a Natureza e sobre si mesmos ”[3]
sobre a Natureza e sobre si mesmos. [3]
Através do materialismo histórico, e dos princípios do materialismo dialético de Frederick Engels, o
filósofo alemão Kall Marx expõe a história evolutiva da sociedade, por fatores materiais (econômicos e
técnicos). Divergindo do que ele chama de senso comum (ação dos grandes homens e ação divina).
“No lugar das idéias os fatos, no lugar dos heróis a luta de classes”. E, mais a frente explica que:
O modo de produção do trabalho marcou a evolução do homem (sociedade), visto que:
“O modo de produção patriarcal surge quando, na luta contra a natureza, o homem inicia a
domesticação de animais; depois há o incremento da agricultura graças ao uso de instrumentos de
metal; e há ainda a fabricação de vasilhas de barro que possibilita fazer reservas […] a consequencia da
modificação das forças produtivas é a alteração das relações de produção e o modo de produção,
como por exemplo, o aparecimento de uma forma específica de propriedade (propriedade da família,
num sentido muito amplo); diferenciação de funções de classe (autoridade do patriarca, do pai de
família); alteração do direito hereditário,estabelecendo a filiação paterna (e não mais materna).”[4]
A Bíblia Sagrada registra que já na época patriarcal, escravos eram adotados tanto para fins de
sucessão (herança), quanto para fins de perpetuidade da descendência.[5]
A escravidão nem sempre teve significados, formas e objetivos iguais. Por exemplo, entre as tribos
mais primitivas, podia ser apenas um momento de espera antes que os vencedores devorassem os
vencidos apropriando-se de sua força e coragem. Assim o escravo tinha um valor de uso, mas não de
troca; e a própria morte lhe assegurava a vida, incorporando em outro corpo o seu espírito guerreiro.
Sem dúvida alguma, fatores históricos como: a invenção e domínio da escrita e oadvento do comércio
transformaram e alteraram a relação entre os homens, e no momento em que as relações entre os
homens se alteram substancialmente, surge o que foi conhecido como civilização, a qual foi marcada
pela produção de excedentes econômicos, de grupos fortes que se apropriaram desses excedentes, do
nascimento da propriedade privada dos meios de produção, das classes sociais e do Estado.
Lovejoy (2002, p. 29) ao estudar o continente africano, evidencia que a escravidão é bem mais antiga
do que o tráfico do povo africano. Ela vem desde os primórdios de nossa história, quando os povos
vencidos em batalhas eram escravizados por seus conquistadores.
A Bíblia sagarada registra também a conquista do reino de Judá e Israel (reino do norte e reino do sul.
Hoje a nação de Israel) pelo Rei da Babilônia Nabucodonosor por volta de 587 e 586 a.C. um destaque
importante é que não houve um cerceamento dos direitos de culto religioso dos judeus, apesar da
destruição do templo de Jerusalém (local de cultos). Na Babilônia, o povo continuou se reunindo para
louvar ao Deus Jeová , mesmo no cativeiro. (Bem diferente do que ocorreu com os escravos trazidos
para o Brasil na época do colonialismo os quais não tinham nem essa liberdade.
1.2 A escravidão na antiguidade
Aos poucos a sociedade sem classes deu lugar à sociedade escravocrata, a qual foi formada por
senhores e escravos. Ou seja: a primeira forma de exploração do homem pelo homem.
Como caracterizou Paul Lovejoy (2002 p 29-30)
“[…]a escravidão foi uma forma de exploração com características específicas. Os escravos eram uma
propriedade do seu senhor […] eram estrangeiros alienados pela sua origem ou dos quais, por sanções
judiciais ou outras, se retirava a herança social que lhes coubera ao nascer. A coerção podia ser usada
à vontade pelo senhor de escravo Pois a força de trabalho do escravo estava á completa disposição de
à vontade pelo senhor de escravo. Pois a força de trabalho do escravo estava á completa disposição de
um senhor. Não tinham direito a sua própria sexualidade e nem ás suas próprias capacidades
reprodutivas. A condição de escravo era herdada a não ser que fosse tomada alguma medida para
modificar essa situação.”
Muitas civilizações usaram e dependeram do trabalho escravo para a execução de tarefas mais
pesadas e rudimentares. Além da Babilônica, como já relatado, a civilização Greco-Romana também se
destacam. Estas últimas detinham um grande número de escravos; contudo, muitos de seus escravos
eram bem tratados e tiveram a chance de comprar sua liberdade(alforria).
Isso tinha um fundamento:
O mundo antigo nunca tratou o trabalho com prestígio e nobreza. Era quase unanimidade afirmar que o
trabalho significava uma atividade secundária.
Baseados na máxima Aristotélica de que “pensar requer ócio” (que tinha uma conotação diferente do
que entendemos por ócio hoje sinônimo de desocupação, lazer, folga preguiça). A elite grega se
desobrigava do trabalho servil e se utilizava dos escravos permitindo “consagrar-se melhor à cidade,
aos prazeres do corpo ou à investigação das coisas eternas do espírito”.Como registra Paulo Sérgio do
Carmo(1992, p.19):
Pois,
“[…] O trabalho escravo caracterizava esse período pela rejeição da tecnologia, tornando desnecessário
o uso de máquinas. Segundo Aristóteles tudo o que servia a vida prática já havia sido descoberto,
cabendo concentrar esforços na busca dos sentidos, na qualidade das coisas, enriquecendo-as de
significado. O tempo para a busca dos significados e da razão das coisas era exatamente o tempo do
ócio.”
Na Grécia Clássica foi exatamente o uso do tempo livre dedicado ao ócio que definiu os fundamentos
da cultura, da ética e da moral ocidental. Nessa época, porém, o pleno gozo do lazer era um direito de
poucos; Assim como nas sociedades contemporâneas capitalistas.
Na Grécia homens livres deveriam se dedicar a atividades que indicassem contemplação à natureza ou
às prerrogativas políticas, contendo-se em trabalho intelectual. De outro lado o trabalho físico era
destinado às mulheres e aos escravos, consubstanciando em atividades indignas e humilhantes
necessárias a manutenção das cidades. Esses realizavam atividades agrícolas, em pequenas
indústrias, no porto, no trabalho doméstico além de serviços públicos.
Nas primeiras etapas da História, encontramos, quase por toda parte, uma complexa divisão da
sociedade em várias ordens, uma graduação variada de posições sociais.
No século V a.C, a sociedade ateniense era composta por 40.000 homens livres e o tempo que tinham
liberado para o ócio e a criação (e o tempo para a guerra, e as coisas de governo, e a acumulação de
riquezas…) só era possível graças ao trabalho de 40.000 escravos; ou seja, a moral ocidental, a nossa
sociedade, se fundou em um processo extremamente contraditório, entre a liberação do pensamento e
a sustentação material dos meios que garantem essa liberação.
O sistema jurídico moderno tem por fundamento o Direito Romano. Este foi o legado deixado pela
Roma Antiga. Mas, apesar disto, a escravidão também existiu naquela época e os escravos eram
considerados como res. Não possuindo qualquer direito, sendo obrigados ao trabalho até o fim de suas
forças ou de suas vidas
forças ou de suas vidas.
Verifica-se que muito antes de Platão e de Aristóteles no sec.VIII a.C, o historiador Hesíodo trata sobre
o trabalho. Para ele o trabalho era o único meio de fazer reinar a ordem e salvaguardar a justiça.
Vale registrar que o ócio sofre modificação na sociedade Romana. Nela o trabalho começa a ser
introduzido e exigido como condição indispensável para o gozo do ócio. O termo se “metamorfoseia”
em descanso. E permanece assim até a Idade Média.
Seguindo o movimento dialético Marxista a tese (senhor) opõe-se a antítese (escravo), que engendra a
síntese feudalismo.
No modo de produção feudal a base econômica é a propriedade dos meios de produção pelo senhor
feudal.
Na idade Média predominou o regime da servidão, um meio termo entre a escravidão e o trabalho livre;
as classes dominantes, nobreza e clero, evitavam ao máximo o trabalho embora pregasse a
necessidade de que o mesmo imperasse sobre toda na sociedade.
Kall Marx ao relatar o modo de produção feudal evidencia que neste sistema o servo trabalha um
tempo para si e outro para o senhor, o qual, além de se apropriar de uma parte da produção daquele,
ainda lhe cobra impostos pelo uso comum do moinho, do lagar, etc. E que a contradição de interesses
dessas duas classes leva ao aparecimento de uma nova figura o burguês. Surgido dentre os servos que
se dedicam ao artesanato e ao comércio, essa nova figura forma os burgos, que consegue aos poucos
a liberdade pessoal e das cidades. (obra citada, p. 276.)
“A escravidão declinou no sec.IV d.C. não como resultado de um movimento abolicionista, mas em
conseqüência a mudanças socioeconômicas complexas que substituíram o escravo-mercadoria e, em
grande parte o camponês livre, por um outro tipo de trabalhador o colonus (…),o servo(…).” (CARMO
1992 p. 20)
1.3 A escravidão dentro do pacto metropolitano colonial
A partir de 1500 d.C. as condições econômicas eram acentuadas entre uma época e outra e de um
lugar para o outro. O comércio estava sofrendo rápido processo de expansão, e as grandes
explorações geográficas eram tanto resultantes desse processo como aceleradores do mesmo; a
economia monetária substituía de modo crescente a economia natural ou de auto-suficiência; os
estados nacionais e economias nacionais unificadas tornavam-se uma força dominante. (JACOB
1993,p.13)
Como diversos países europeus procuravam acumular metais, bem como proteger seus produtos em
busca de uma balança de comércio favorável, ocorreu que a política mercantilista de um país entrava
diretamente em choque com a de outro, igualmente mercantilista.
Os condutores do mercantilismo concluíram que a solução seria cada país mercantilista dominar áreas
determinadas, dentro das quais ter vantagenseconômicas declaradas. Surgiram, então, com grande
força, as idéias colonialistas.
Na busca pela dominação econômica surge o chamado pacto colonial, também denominado de
exclusivo metropolitano, era um sistema pelo qual os países da Europa que possuiam colonias na
America, mantinham o monopólio da importação das matérias-primas mais lucrativas dessas
possessões, bem como da exportação de bens de consumo para as respectivas colônias.
O Brasil e várias regiões da América Latina, colonizados por portugueses e espanhóis, são exemplos
típicos de colônias de exploração. Elas apresentavam as seguintes características: produção agrícola
baseada na grande propriedade (enormes extensões de terra); ênfase na produção destinada ao
mercado externo (produtos agrícolas e metais preciosos); grande utilização do trabalho escravo de
índios e negros.
No caso do Brasil, por exemplo, foi organizada uma produção a fim de fornecer açúcar e tabaco, mais
tarde ouro e diamantes, depois algodão e, em seguida, café, para o comércio europeu. Não se
objetivava, de modo algum, desenvolver na colônia qualquer atividade voltada para seus interesses
internos.
A regra básica do pacto colonial era que, à colônia só era permitido produzir o que a metrópole não
tinha condições de fazer. Por isso, a colônia não podia concorrer com a metrópole. Logo a posição da
colonia era tão somente a de geradora de riquezas.
A lógica do pacto colonial integra as idéias econômicas do Mercantilismo, sendo exemplificada pelas
companhias de comércio exclusivistas criadas no seculo XVII.
O latifúndio monocultor (plantations) no Brasil exigia uma mão-de-obra permanente.
Apesar de todos esses obstáculos, o indígena é amplamente escravizado, permanecendo como mão-
de-obra básica na economia extrativista do Norte do Brasil, mesmo após o término do período colonial.
A maior utilização do negro como mão-de-obra escrava básica na economia colonial, deve-se
principalmente ao tráfico negreiro, atividade altamente rentável, tornando-se uma das principais fontes
de acumulação de capitais para metrópole.
Exatamente o contrário ocorria com a escravidão indígena, já que os lucros com o comércio dos
nativos não chegava até a metrópole.
Dentro do cenário econômico, Paul Lovejoy (2002 p 398) analisa a relação das exportações de
escravos nas regiões da África :
“O comercio exterior era um fator essencial dessa infra-esrutura. nem todos os escravos eram
capturados com fins de exportação. no entanto, era necessário que os escravos fossem deslocados
para uma distancia consideravel do seu local de escravização.Aqui havia um fator de “empurrão” na
economia que alimentava o setor de exportação. Quer o mercado externo desse ou nao um “puxão” por
escravos, havia uma força nativa que movimentava os cativos. Quando a demanda externa influenciava
o preço, então era apenas lógico que os dois fatores pudessem reforçar o fluxo de escravos da Africa.
Quando a ligação com o mercado externo ficou estabelecida, e na verdade enquanto ela continuou a se
expandir, a economia politica invariavelmente tornou-se mais intimamente ligada ao comercio de
exportação.”
E descorda de estudiosos que afirmam que o setor de exportação teve um impacto marginal sobre a
sociedade e a economia Africanas. Explicando que:
“A ameaça de venda para comerciantes associados ao comércio de exportação era tao importante no
controle dos escravos quanto o medo das chibatadas nas plantations das Americas.” (op cit. p401)
Ou seja, era um método de coação que facilitava a submissão dos escravos.Não muito diferente das
plantations hoje.
Desde meados do século XV os portugueses, se utilizavam do tráfico negreiro, pois, o comércio de
escravos era regular em Portugal, sendo que durante o reinado de D. João II o tráfico negreiro foi
institucionalizado com a ação direta do Estado português, que cobrava taxas e limitava a participação
de particulares.
Quanto à procedência étnica do negro, destacaram-se dois grupos importantes: os bantos, capturados
na África equatorial e tropical provenientes do Congo, Guiné e Angola, e os sudaneses, vindos da África
ocidental, Sudão e norte da Guiné.
Entre os elementos deste segundo grupo, destacavam-se muitos negros islamizados, responsáveis
posteriormente por uma rebelião de escravos ocorrida na Bahia em 1835, conhecida como a Revolta
dos Malês.
Assim como os Indios os Africanos não se sujeitaram facilmente ao regime escravocrata imposto no
Brasil. Através de fugas isoladas, passando pelo suicídio, pelo banzo (nostalgia que fazia o negro cair
em profunda depressão o levando à morte) e pelos quilombos, as formas de resistência do negro à
escravidão, variavam, sendo a formação dos quilombos a mais conseqüente. Seu primeiro líder foi
Ganga Zumba, substituído depois de morto por seu sobrinho Zumbi,que foi covardemente assassinado
em 1695 pelo bandeirante Domingos Jorge Velho, contratado por latifundiários da região. O mesmo
acontece na atualidade, onde capangas são utilizados para defender os interesses dos patrões
(latifudiários), ameaçando e até matando os que são contra os regimes impostos nas fazendas.
Os quilombos eram aldeamentos de negros que fugiam dos latifúndios, passando a viver
comunitariamente. O maior e mais duradouro foi o quilombo dos Palmares, surgido em 1630 em
Alagoas, estendendo-se numa área de 27 mil quilômetros quadrados até Pernambuco. Desenvolveu-se
através do artesanato e do cultivo do milho, feijão, mandioca, banana e cana-de-açúcar, além do
comércio com aldeias vizinhas.
Apesar dos muitos negros mortos em Palmares, a quantidade de escravos crescia muito e em 1681
atingia a cifra de 1 milhão de negros trazidos somente de Angola. Esse grande número de negros
utilizado como escravos, deixa clara a alta lucratividade do tráfico negreiro, responsável inicialmente
pelo abastecimento da lavoura canavieira em expansão nos séculos XVI e XVII e posteriormente nas
áreas de mineração e da lavoura cafeeira nos séculos XVIII e XIX respectivamente.
A escravidão é transformada como instituição quando os escravos desempenham um papel essencial
na economia. Como bem ressalta Paul Lovejoy (2002, p.402 ).
Já na colônia, submetidos a um duro trabalho, o negro quilombo (fujão), era o mais sofrido, era
submetido à novena ou trezena (nove, ou treze chibatadas). Outros tipos de punições a que estavam
sujeitos ainda, era o tronco, vira mundo, cepo, bacalhau (relho de cinco pontas), o mais comum.
As classes de negros não eram iguais. Havia uma certa distinção entre escravos domésticos, escravos
de ganho, e os escravos de eito, estes, submetidos a um trabalho mais árduo, nos canaviais. Os
escravos não formavam um todo homogêneo, os negros não gostavam dos recém-chegados da África,
os mulatos (em especial os que assumiam funções remuneradas: feitores, mestres-de-açúcar, etc.),
desprezavam os escravos em geral, os escravos urbanos viam com certa superioridade os escravos
agrários e, às vezes até ajudavam na luta contra os quilombos. Os ladinos se julgavam melhores que
os boçais. Afora isso, havia ainda as diferenças culturais, os negros islamizados, por exemplo, eram
rebeldes, e não se misturavam aos companheiros de infortúnio, mantendo-se isolados.
O ciclo do ouro se constituiu um dos episódios básicos da história brasileira do séc. XVIII. Favoreceu o
povoamento do interior, deslocou o eixo histórico colonial do nordeste para o centro-sul. Surgiu um
novo tipo de sociedade (mais flexível que a do açúcar).
Também surgiram novas cidades como: Ouro Preto, Sabará, Mariana, São João d’El Rey, etc., bem
como a criação de novas capitanias (Minas Gerais, Goiás, Mato Grosso). O ouro era monopólio real, a
exploração era feita através do arrendamento de lotes ou “datas de minas”, que eram sorteadas aos
particulares. Seu tamanho variava conforme o número de escravos do candidato contemplado. Este
tinha um prazo para iniciar a extração, não podia negociar a data recebida, exceto se provasse ter
perdido todos osseus escravos. Em caso de repetição da alienação de uma data, o responsável ficava
proibido de novamente candidatar-se e receber outra.
Inicialmente a mineração era superficial, e restringia-se ao leito dos rios. A mineração em profundidade
teve início no séc. XIX, com a vinda para o Brasil de companhias americanas e inglesas.
A exploração do ouro no séc. XVIII se deu de duas maneiras: lavras (organizada, empresarial), ou pelos
faiscadores (iniciativa privada) e ex-escravos que exerciam pequenos ofícios nas cidades.
O ciclo do ouro possibilitou surgimento de grupos intermediários entre a classe rica, e a classe pobre
(classe mercantil). Pois o ouro exigia menor investimento do que o açúcar. Outra classe também
surgiu, a dos funcionários públicos para cobrar impostos, e coibir o contrabando. O contrabando foi a
principal causa de Portugal desestimular a vinda de gado do NE, pelo vale do S. Francisco, o que
incentivou a atividade pecuária no extremo sul, necessária para abastecer a região mineradora.
No plano das relações internacionais havia uma forte dependência de Portugal em relação à Inglaterra
(1703 – Tratado de Comércio e Amizade – de Methuen – nome do diplomata inglês que o obteve). A
Inglaterra se encarregou da sustentação militar e diplomática da frágil nação lusa, numa Europa
conflagrada pela guerra de sucessão da Espanha, em troca da abertura dos portos lusitanos aos
artigos manufaturados britânicos. Neste tratado, a única vantagem para Portugal eram os privilégios
alfandegários para o vinho (até 1786).
Os resultados do Tratado de Methuen não foram positivos para os lusos. O abastecimento de Portugal
e do Brasil com produtos britânicos acarretou um «déficit» crescente de Lisboa em relação à Londres.
Portugal se tornou colônia comercial da Inglaterra, e ainda perdeu em 1786, as vantagens que possuía
de colocação de seus vinhos no mercado britânico.
O ouro brasileiro que foi entregue aos cofres portugueses, lá ficou, isto é, não foi utilizado para pagar
os «déficits» lusitanos, serviu para estimular os gastos monstruosos da monarquia.
A decadência do colonialismo foi acompanhada de um crescente enrijecimento administrativo e
político. Portugal desenvolveu ao máximo a idéia de que a colônia só servia para enriquecer a
metrópole. O Brasil só podia vender para Portugal, e comprar de Portugal, a preços fixados por este,
além disso, não podia produzir nada que Portugal pudesse produzir e/ou vender para o Brasil, como
aguardente, sal, manufaturas. Em 1785, a Rainha D. Maria I, assinou o famoso alvará que leva o seu
nome, proibindo as manufaturas no Brasil, afim de não desperdiçar os esforços que deveriam se
concentrar na agricultura.
O fisco tornou-se opressivo ao extremo, foi criada uma contribuição “voluntária” para reconstrução de
Lisboa, após o terremoto de 1755, que continuou sendo cobrada até muito depois da cidade ficar
pronta de novo
pronta de novo.
Não era mais Portugal quem abastecia o Brasil, e sim a Inglaterra via Portugal, o qual se constituiu num
intermediário encarecedor.
Terminar com o monopólio tornou-se no séc. XVIII, um ideal do capitalismo liberal que veio ao encontro
dos interesses de duas classes sociais bastante distanciadas no espaço, o latifundiário do Brasil, e o
burguês da Inglaterra.
O colonialismo mercantilista e monopolista entrou em crise quando as sociedades coloniais
amadureceram, combateram impostos extorsivos e desejaram liberdade para comprar e vender, e o
capitalismo em expansão no Velho Mundo reclamou a expansão dos mercados, opondo-se aos
mercados fechados vigentes em defesa de seus negócios.
O ouro terminou a cana sofreu a concorrência do Caribe, o algodão do Maranhão sofreu a concorrência
do sul dos EUA, afora o ouro das Gerais, a cana do Nordeste, e o algodão do Maranhão, o Brasil tinha
pouca coisa a oferecer.
A Bahia importava o escravo da Guiné, único meio de escoar a produção de fumo, e importava o
caríssimo e indomável escravo negro islamizado da Guiné, pois era a única moeda usada para adquirir
especificamente aquele tipo de negro africano, sendo por isso, comprado pelos traficantes que o
comerciavam.No mais, extraíam as especiarias da Amazônia (cravo, canela, castanha-do-pará, cacau,
urucum, salsaparrilha, sementes, etc.), criava-se gado no sertão nordestino, e no extremo sul, e
praticava-se uma débil agricultura de subsistência junto aos latifúndios monocultores.
No aspecto social, a concentração de poder, riqueza, e o que existia de cultura, concentrava-se no
litoral. Em geral a sociedade era agrária, latifundiária, patriarcal, católica e escravista.
O Brasil rústico disperso, e primitivo que havia no interior, era ignorado pela sociedade concentrada no
litoral.
A colonização do nosso país foi essencialmente uma colonização de exploração. À metrópole, só
interessava servir-se dos recursos, e riquezas existentes na colônia.
Num segundo momento, a classe dominante já nascida no Brasil, e portanto, brasileira, também não
interessou em mudar a situação. Pois eram favorecidos e privilegiados pela coroa portuguesa, e
ajudavam a manter a dominação sobre seus irmãos brasileiros.
Em todos os momentos, todos os povos de diferentes nacionalidades que aqui aportaram, tinham um
único objetivo: a exploração, o saque, e o aviltamento da cultura dos povos indígenas nativos desta
terra. Será que adquirimos mesmo a independência e a liberdade? A história do passado e seus
figurantes têm muito a ver com os grandes personagens da classe dominante da atualidade, os quais
agem sempre visando o interesse econômico individual, ou de classes dominantes, com as quais estão
comprometidos.
“Modificam-se os meios, permanecem os objetivos”. Na fase colonial, portugueses, franceses e
holandeses, vinham com seus navios movidos à vela, até a colônia, e daqui saíam carregados com
ouro, pau-brasil, aguardente, sal, etc.; no presente, os “grandes conquistadores” do FMI, vêm à periferia
com seus jatos, e daqui se retiram levando nossas reservas cambiais. Durante o jugo da metrópole,
vinham governadores gerais e vice-reis, para gerenciar a colônia, na atualidade, somos “governados”
por brasileiros natos, só que as determinações do que o governo tem de fazer ou deixar de fazer,
dentro do país, normalmente são ditadas pelo imperialismo capitalista estrangeiro.
Com relação à África “A imposição do colonialismo extinguiu a escravidão como um modo de
produção e marcou a completa integração da África na órbita do capitalismo”. A África permaneceu
periférica ao capitalismo, mesmo quando a escravidão foi desmontada. “As novas formas de
organização do trabalho-migração, produção camponesa, coerção colonial através de taxação e dos
projetos de corvéia, e o alistamento militar compulsório- estavam associadas á dominação colonial.”
Relata Paul Lovejoy (2002, p.408 e 409).
1.4 A abolição da escravidão: interesses e manutenção da desigualdade social
A partir da metade do século XIX a escravidão no Brasil passou a ser contestada pela Inglaterra.
Interessada em ampliar seu mercado consumidor no Brasil e no mundo. O Parlamento Inglês aprovou a
Lei Bill Aberdeen (1845), que proibia o tráfico de escravos, dando o poder aos ingleses de abordarem e
aprisionarem navios de países que faziam esta prática. (direito de busca e apreensão)
Em 1850, o Brasil cedeu às pressões inglesas e aprovou a Lei Eusébio de Queiróz que acabou com o
tráfico negreiro.
Em 1854 Portugal decreta que os escravos em seus territórios são livres. E em 1869 abole a
escravidão. Em 28 de setembro de 1871 era aprovada a Lei do Ventre Livre que dava liberdade aos
filhos de escravos nascidos a partir daquela data. E no ano de 1885 era promulgada a Lei dos
Sexagenários que garantia liberdade aos escravos com mais de 60 anos de idade.
Somente no final do século XIX é que a escravidão foi mundialmente proibida . Aqui no Brasil, sua
abolição se deu em 13 de maio de 1888 com a promulgação da Lei Áurea, feita pela Princesa Isabel. A
assinatura dalei Áurea, decretou o fim do direito de propriedade de uma pessoa sobre outra. Portanto,
o Brasil foi o último país americano a abolir a escravidão Pelo menos formalmente.
Mas observa-se que o drama dos trabalhadores daqui não era diferente do resto do mundo.Como
lembra Evaristo de Moraes Filho (1971 p III), na introdução do relançamento do livro do pai – Evaristo
de Moraes – que descreve o seguinte:
“A falta de higiene e de segurança nas fábricas que surgiam, as condições exaustivas de prestação de
serviço, durante mais de 12 horas de trabalho fatigante, sem descanso obrigatório nem férias, com
salários de fome, tudo isso representada a sociedade industrial brasileira […], como já havia acontecido
com a Europa no século XIX.”
Passou-se mais de 120 anos da assinatura da Lei Áurea, mas o nosso país ainda convive com as
marcas deixadas pela exploração da mão-de-obra escrava. Conforme cálculos da Comissão Pastoral
da Terra, (CPT) existem no Brasil 25 a 40 mil pessoas submetidas às condições análogas a de escravo.
Os dados constituem uma realidade de grave violação aos direitos humanos, que envergonham não
somente os brasileiros, mas toda a comunidade internacional. ¹
A nova escravidão é mais vantajosa para os empresários que a da época do Brasil – Colônia e do
Império, pelo menos do ponto de vista financeiro e operacional.
O sociólogo norte-americano Kevin Bales, considerado um dos maiores especialistas no tema, traçou
paralelos entre esses dois sistemas que demonstram que o histórico de desigualdade da população
negra não se alterou substancialmente após a assinatura da Lei Áurea, em maio de 1888. Apesar da
escravidão ter se tornado oficialmente ilegal, o Estado e a sociedade não garantiram condições para os
libertos poderem efetivar sua cidadania.[6]
E como bem ressalta Paul lovejoy (2002, p. 409-410):
“A questão não é se houve ou não um rompimento drástico com o passado, mas a maneiras pelas quais
as pessoas foram capazes de formar a nova ordem, preservando a antiga ou superando-a […]
O surgimento de um sistema internacional de escravidão uniu as Américas […] e a África, assim como a
antiga historia da escravidão nos países mulçumanos tinha atraído algumas regiões da África para a
órbita islâmica
O desmonte desse sistema internacional exigiu mais do que a libertação dos escravos nas Américas, e o
legado da opressão e do racismo nas Américas é apenas um aspecto da trágica herança da escravidão.”
Atualmente a etnia não significa vulnerabilidade ou propensão ao trabalho escravo ou análogo a este. A
seleção se dá pela capacidade da força física de trabalho e baixos custos, não pela cor. Qualquer
pessoa miserável moradora nas regiões de grande incidência de aliciamento para a escravidão pode
cair na rede da escravidão.
Há uma grande incidência de afro descendentes entre os libertados da escravidão em uma proporção
maior do que a que ocorre no restante da população
brasileira (de acordo com integrantes dos dados dos Grupos Móveis de Fiscalização). Por fim, as
estatísticas mostram que há mais negros pobres do que brancos pobres no Brasil. Outro fator a ser
considerado é que o Maranhão, um dos Estados com maior quantidade de trabalhadores libertos da
escravidão, é também a unidade da federação com menor Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) e
o que possui a maior quantidade de comunidades quilombolas.[7]
Varias são as causas que impulsionam o homem à escravidão, dentre elas a desigualdade social e a
impunidade. Da primeira como conseqüência tem-se a pobreza, a miséria, e o desemprego, a ausência
de educação “adequada”, (dentre outras). Da segunda a reincidência e incentivo a pratica da escravidão
ou semelhante a ela.
De acordo com especialistas “o Brasil combate a escravidão e não as causas da escravidão”. É numa
entrevista para o site agencia repórter Brasil o padre Xavier Marie Plassat, da Pastoral da Terra,
apontou a miséria como causa do trabalho escravo: “o Brasil precisa de educação, empregos e reforma
agrária para erradicar a miséria que propicia o trabalho escravo.”[8]
Sem dúvida a miséria no mundo e especialmente no Brasil é a conseqüência da desigualdade social. A
riqueza nas mãos de uma minoria (classe dominante) tem sido uma arma de coação física e moral
contra a maioria dominada.
A exclusão social torna os marginalizados cada vez mais supérfluos e incapazes de ter uma vida digna,
levando-os a um esforço sobrenatural, para obter o mínimo necessário para sua sobrevivência. Como
por exemplo, alimentação e educação adequada.
Infelizmente as autoridades as quais nos representam são as principais causadoras desse processo de
desigualdade que causa exclusão e que gera violência.
A exclusão social está presente no Brasil desde a época da colônia, como já visto, em função da
adoção de uma estrutura econômica escravagista, que se reproduziu e permanece até hoje, embora
com um grau menor e de maneira menos ostensiva.
A temática da exclusão social passou a ganhar destaque no país na década de 70, diretamente
relacionado ao crescimento econômico, oriundo do período ditatorial brasileiro.
O Brasil é hoje o país com os maiores índices de desigualdade, segundo a Unesco. Os 10% mais ricos
detém mais de 46% da renda nacional, enquanto os 50% mais pobres detém somente 14% da renda do
país. São dados, inclusive, piores dos que os apresentados por países africanos, reconhecidos
mundialmente por sua situação de miserabilidade.
Outro fator que contribui para a desigualdade é a impunidade Pois são raríssimos os casos de
condenação por mão-de-obra escrava e análoga a esta no Brasil.
O Diretor da Organização Internacional do Trabalho (OIT), Armand Pereira (Apud 2007, OIT p. 69)
aponta a impunidade como a principal causa da escravidão no Brasil. A pobreza não é a origem do
trabalho escravo, e, sim, uma facilidade para quem comete esse tipo crime.
Ao abordar a escravidão na África, Paul Lovejoy (2002 p.33) declara: “[…] Existem exemplos de
escravização voluntária, principalmente quando a ameaça de morrer de fome não deixava à pessoa
nenhum outro recurso.”
Lovejoy defende que a escravidão não era um caso de violência consciente por parte da sociedade ou
de um inimigo. Podia haver causas estruturais que colocavam pessoas em situações nas quais elas
não podiam ter assegurada a sua sobrevivência e achavam necessário escravizar a si mesmas.
O interesse da manutenção da desigualdade social reside no interesse dos detentores do capital pelos
lucros. Quanto mais inferioridade econômica do explorado mais dependência e vulnerabilidade.
Hoje é evidente entre os políticos, principalmente em ano eleitoral, como este, a famosa campanha em
prol dos direitos humanos. E a base desses discursos sempre é a desigualdade entre classes, a
erradicação da miséria, da escravidão, salários mais justos para os trabalhadores, etc. Em fim,
promessas de condições dignas para sobrevivência de qualquer ser humano. Mas, são apenas
promessas, pois qual será o seu discurso ou o que defenderá e que bandeira levantará nas próximas
eleições se as desigualdades desaparecerem?
A Comissão Nacional para Erradicação do Trabalho Escravo (CONATRAE) enumerou as mentiras mais
contadas por aqueles que não querem ver o problema da escravidão resolvido.[9]
Mentiras:
1. Não existe trabalho escravo no Brasil.
2. A escravidão foi extinta em 13 de maio de 1888.
3. Se o problema existe, é pequeno. Além disso, apenas uma meia dúzia de fazendeiros utiliza trabalho
escravo.
4. A lei não explica detalhadamente o que é trabalho escravo. Com isso, o empresário não sabe o que
é proibido fazer.
5. A culpa não é do fazendeiro e sim de “gatos”, gerentes e prepostos. O empresário não sabe dos
fatos que ocorrem dentro de sua fazenda e por isso não pode ser responsabilizado.
6. O trabalho escravo urbano é do mesmo tamanho que o trabalho rural.
7. Já existem muitas punições para quem pratica trabalho escravo. É só fazer cumprir a lei que a
questão está resolvida. Não é necessária aaprovação de uma lei de confisco de terras.
8. A Justiça já tem muitos instrumentos para combater o trabalho escravo, não é necessário criar
mais um.
9. Esse tipo de relação de trabalho já faz parte da cultura da região.
10. Não é possível aplicar a legislação trabalhista na região de fronteira agrícola amazônica. Isso
geraria desemprego.
11. A fiscalização abusa do poder e é guiada por um viés ideológico. A Polícia Federal entra armada
nas fazendas.
12. A divulgação internacional prejudica o comércio exterior e vai trazer prejuízo ao país.
13. A imprensa prejudica a imagem de estados como Pará, Mato Grosso, Tocantins, Maranhão, Rio de
Janeiro e Bahia, entre outros, ao mostrar que há propriedades com trabalho escravo.
14. O Estado está ausente da região de fronteira agrícola e só aparece para punir quem está
desenvolvendo o país.
2 A ESCRAVIDÃO CAPITALISTA CONTEMPORÂNEA.
2.1 A relação da escravidão com a globalização neoliberal: o contexto neo-escravocrata mundial
Segundo Relatório Global da OIT de 2007, ao menos 12,3 milhões de pessoas no mundo sofrem as
penas do trabalho forçado. As diversas modalidades de trabalho forçado no mundo têm sempre em
comum duas características: o uso da coação e a negação da liberdade. No Brasil, o trabalho escravo
resulta da soma do trabalho degradante com a privação de liberdade. O trabalhador fica preso a uma
dívida, tem seus documentos retidos, é levado a um local isolado geograficamente o que dificulta o seu
retorno para casa, ou é impedido por seguranças armados.
À Revolução Industrial do século XVIII eclodida com a invenção da máquina a vapor e o uso da
eletricidade, seguiu-se a Segunda Revolução Industrial, no início do século XX, marcada pela produção
em série e em massa, com empresas verticalizadas, que desenvolviam, dentro das fábricas, todas as
etapas do processo produtivo, desde a matéria-prima até a comercialização do produto final (método
fordista-taylorista).
O Estado, por sua vez, intervinha na economia concedendo, de um lado, infra-estrutura, e de outro,
garantindo o consumo, adotando políticas de bem-estar social, seguindo as lições de Keynes. Tudo
funcionava bem. Todavia, após um longo período de acumulação de capitais, o capitalismo do bem
estar social, (welfare state), dos anos 1960 e 1970, sentido fundamentalmente no Primeiro Mundo,
passou por uma crise estrutural, a partir dos anos 1970.
O Japão pós-1945 já vinha se reestruturando, e, estando o Ocidente em crise (a partir dos anos 1970),
passou a distribuir sua receita toyotista, que traz como ponto de partida básico um número reduzido de
trabalhadores, priorizando apenas o que é central na especialidade do processo produtivo (teoria do
foco), gerando empresas com estruturas horizontalizadas – o que faz ampliar o espaço do processo
produtivo.
Assim, desde a década de 70, o modo de organização da empresa vem sofrendo substancial
modificação, com formas mais flexíveis de trabalho, menos hierarquizadas – acentuadas pelos
avanços tecnológicos, com destaque para o uso da microeletrônica, biogenética e comunicação,
ensejando a Terceira Revolução Industrial ou Terceira Onda – que difunde a automação das empresas,
nítida nos países economicamente desenvolvidos. O trabalho vivo é trocado pelo trabalho morto, ou
seja, troca-se o homem pela máquina.
Essa Terceira Revolução Industrial repercutiu intensa e diretamente nas relações de trabalho, como as
revoluções industriais anteriores o fizeram, por serem as mudanças sociais corolário das econômicas.
Paralelamente, a partir dos anos 1970, marcados pelas crises do petróleo. Pode-se destacar entre elas
a guerra do Yom Kipur (1973), a revolução Islamica do Irã (1979) e a guerra Irã-Iraque (a partir de 1980).
Os preços do barril de petróleo atingiram valores altíssimos, chegando a aumentar até 400% em cinco
meses (17/10/1973 – 18/3/1974), o que provocou grande recessão nos EUA e na Europa
desestabilizando a economia ao redor do mundo pela retração do consumo mundial. Em 1989
verificou-se o fim da guerra fria, que teve como emblema a Queda do Muro de Berlim, a derrocada do
socialismo soviético e no leste europeu eliminou-se a ameaça da expansão socialista, preparando o
caminho para o ressurgimento do liberalismo econômico em detrimento das políticas do bem-estar
social.
Iniciou-se um processo de reorganização econômica onde o capital passou, então, a movimentar um
processo de reestruturação produtiva, introduzindo novos problemas e desafios para o mundo do
trabalho:
O neoliberalismo não foi uma idéia nova na história do moderno sistema-mundo, apesar de ter sido
anunciada como tal. Era na verdade a antiga idéia de que os governos do mundo deviam sair do
caminho das grandes e eficientes empresas, nos seus esforços para dominar o mercado mundial. A
primeira implicação política era que todos os governos, deviam permitir que essas corporações
atravessassem livremente cada fronteira com os seus bens e o seu capital (desmontagem do setor
produtivo Estatal). A segunda implicação política era que os governos, deviam renunciar a qualquer
papel como proprietários destas empresas produtivas, privatizando qualquer uma que fosse de sua
propriedade (privatização do Estado). E a terceira implicação política era a de que os governos
deveriam minimizar se não eliminar, todo e qualquer tipo de transferências de bem-estar social para as
suas populações (desregulamentação do direito do Trabalho).
Neste contexto de reorganização do capital surge a globalização. E nenhum país é imune a ela. Hoje, a
grande empresa se organiza em rede, externando as etapas do ciclo produtivo, para diversas empresas
filhas situadas em todo o planeta.
Com a globalização e o desenvolvimento tecnológico acelerado em alguns setores e alguns países em
detrimento de outros, promove-se uma desvalorização generalizada do trabalho e as pessoas não
conseguem sobreviver a não ser em condições de extrema degradação.[10]
O “modelo” neoliberal globalizante, implementado no Brasil principalmente a partir de 1990, articulado
numa ampla aliança mundial, fundada internamente nas elites urbanas, rurais e nas altas classes, que
passaram por sua vez a operar importantes mudanças estruturais que para garantir o seu
funcionamento levou o país para uma situação de total dependência externa e profunda ilusão política
num suposto desenvolvimento nacional.
Este modelo neoliberal globalizante, que já havia reforçado a desigualdade estrutural existente na
sociedade brasileira, reforçou o domínio das chamadas leis dos serviços públicos de mercado, do
individualismo, da competitividade e do
consumismo, sufocando os valores da igualdade, da solidariedade, da soberania nacional, de uma
democracia participativa.
Este modelo econômico se subordinou ao grande capital, impondo privatização de estatais, abertura
comercial sem salvaguardas nem contrapartida. Nos últimos vinte anos ele agravou a violência e a
crise de valores, a corrupção e a inércia da maioria dos movimentos sociais, inclusive o sindical,
carreirismo político e oportunismos.
Assim, se por um lado, a mundialização da economia alavanca o desenvolvimento econômico, por
outro, agrava o quadro da miséria, do desemprego e da marginalização. Ingredientes perfeitos para o
aliciamento de mão-de-obra escrava.
Vê-se, pois que o mundo do trabalho está em disponibilidade para o capital e sem direitos, para que as
regras do mercado, como preconiza o sistema neoliberal, não sofra nenhum tipo de restrição. Dá-se
uma ofensiva generalizada do capital e do Estado contra a classe trabalhadora e contra as condições
vigentes no apogeu do fordismo. Daí a precarização do trabalho e dos direitos sociais, implicando em
aceleradas formas de desigualdades sociais. O que ocorre é uma mudança no trabalho, que deixa de
ser mais garantido como no regime taylorista – fordista, para ser flexível adaptado ao novo contexto
econômico, só que em processo de desregulamentação, o que implica na desmonta de direitossociais
arduamente conquistados pela classe operária, acentuando a terceirização.
O raciocínio do mercado globalizado neoliberal impõe sua ideologia e antes de sugar toda a força
produtiva do trabalhador já consegue fazer dele um derrotado. Pois, mostra-lhe a todo instante que ele
não é capaz de acompanhar a veloz evolução tecnológica, fazendo-o sentir-se frágil, impotente,
incompetente e culpado. As novas técnicas de gestão nesta fase informacional, com a propagação
dos meios informatizados de produção fazem o operário acreditar que ele não se atualizou que está
fadado à exclusão do Mercado de trabalho pela sua própria inércia.
O sucesso empresarial hoje depende da transformação de uma tecnologia em um padrão para o
mercado. Enquanto todo tempo em que aquela tecnologia funciona com padrão a empresa que a
controla aufere renda de monopólio, ampliando fantasticamente sua lucratividade. O ritmo acelerado
da substituição tecnológica caracterizou todos os ciclos de inovações. Tecnologias recentes são
rapidamente superadas e tornam-se obsoletas.
Especificamente no Brasil, o colapso do padrão de financiamento da economia brasileira no início dos
anos 80, em razão da crise da dívida externa, levou à adoção de um conjunto de programas de ajustes
macroeconômicos, que até hoje prejudicam a retomada do crescimento econômico sustentado. Nesse
cenário, o país terminou rompendo com a tendência de estruturação do mercado de trabalho
inaugurada ainda nos anos 30 com Vargas.
Nas negociações realizadas entre 1982 e 1988, os credores eram contrários a redução no valor da
dívida. Em 1989, Nicholas Brady, então secretário do Tesouro dos Estados Unidos, apresentou um
plano cujos princípios orientaram o acordo assinado, em abril de 1994, no final da gestão de Fernando
Henrique Cardoso como ministro da Fazenda. Logo depois de assinar o acordo, Fernando Henrique
Cardoso seria lançado candidato à presidência da República
Conforme análise do professor Paulo Nogueira Batista Jr., o Brasil era, até abril de 1994, o único dos
principais devedores latino-americanos que ainda não havia aderido ao chamado Plano Brady. A
adesão brasileira foi negociada no final do governo Collor, por um governo profundamente fragilizado,
ameaçado de impeachment, que tentava apressar a definição das características fundamentais do
acordo, com o intuito de criar um fato político capaz de reforçar a sua base de apoio externa e as suas
chances de sobrevivência em face da crescente oposição interna.
O economista Marcio Pochmann divide à evolução do mercado de trabalho em dois períodos:
“Em síntese, podemos observar dois períodos muito distintos no que diz respeito à evolução do mercado
de trabalho. Um movimento de estruturação do mercado de trabalho que ocorreu simultaneamente ao
processo de industrialização e institucionalização das relações e condições de trabalho (1940/1980),
marcado pela expansão do emprego assalariado, principalmente com registro, e das ocupações nos
segmentos organizados da economia (tipicamente capitalista).
O período pós 1980 foi de reversão na trajetória geral das ocupações, com fortes sinais de uma
progressiva desestruturação do mercado de trabalho. O desassalariamento de parcela crescente da
População Economicamente Ativa e a expansão das ocupações nos segmentos não-organizados e do
desemprego têm ocorrido paralelamente ao abandono do projeto de industrialização nacional e da
adoção de políticas macroeconômicas de reinserção internacional e enfraquecimento do estatuto do
trabalhador”[11]
O discurso neoliberal afeta os princípios do Direito do Trabalho, especialmente o princípio da proteção
quando desloca a proteção para o empregador, sob o argumento de que o emprego é o bem maior. O
pior é que, deste modo, jamais consegue se vir como produtor da riqueza, colaborador no crescimento
econômico e, sobretudo, como pessoa humana, agente e sujeito da sociedade, com dignidade e honra
que devam ser respeitados por seus companheiros de trabalho, pelos patrões e pelo Estado.
Infelizmente muitos trabalhadores, por motivos óbvios, não conseguem compreender seu lugar nesse
contesto capital X trabalho, haja vista que nunca foram respeitados , nunca foram tratados como gente,
nunca foram verdadeiramente cidadãos e nem tiveram acesso efetivo aos direitos inerentes à
dignidade humana. Não são os direitos apenas que lhes são negados, mas o reconhecimento de sua
condição humana. E isto é terrivelmente cruel e desonroso.
O liberalismo trás com ele infrações cada vez mais freqüentes das leis trabalhistas: empregar pessoas
sem carteira de trabalho para não pagar as contribuições previdenciárias e poder demiti-las em caso
acidente de trabalho, sem penalidade; empregar pessoas sem lhes pagar o que é devido; exigir um
trabalho cuja duração ultrapassa as autorizações legais, etc.
Entre outros males também está a manipulação deliberada da ameaça, da chantagem e de insinuações
contra os trabalhadores, no intuito de desestabilizá-los psicologicamente, de levá-los a cometer erros,
para depois usar as conseqüências desses atos como pretexto para a demissão por incompetência
profissional, como sucede amiúde com os gerentes.
Como declaração do ex-presidente da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho-
ANAMATRA (APUD 2007 OIT p 92)
“Transigir com o desrespeito à supremacia da sensibilidade do ser humano, negando-lhe esta qualidade é
acima de tudo abrir mão de qualquer sentimento moral, negando ao homem o direito de existir.
Estou absolutamente convencido de que todos os atos são importantes, insuficientes, no entanto, para
eliminar as formas degradantes de exploração do trabalho humano, se não tivermos a capacidade crítica
de romper com a ideologia neoliberal que domina o mundo, responsável pela propagação da idéia de que
“qualquer trabalho é melhor do que nada”.
Ainda é prematuro definir com precisão o grau e a extensão da crise econômica que enfrentaremos no
próximo período histórico, mas um dado fundamental é que a opção das elites brasileiras em abandonar a
idéia de construir uma economia nacional e independente, e a implementação de um projeto que
subordinou a economia brasileira ao capital internacional financeiro nos levou a um cenário econômico,
político e social extremamente grave, que nos próximos anos poderá nos levar a uma nova crise do
modelo econômico.”
Nos países o impacto é evidente: na Índia, na Tailândia, no Sri Lanka, há pais vendendo filhos, Na
Europa está havendo muito trabalho doméstico em condições degradantes, envolvendo especialmente
mulheres levadas da África por traficantes, assim como prostituição de mulheres jovens oriundas do
Brasil ou da Rússia.
Na Inglaterra é mais comum o trabalho doméstico; na Itália e na França, há mais escravização sexual,
prostituição; e na Alemanha, trabalho industrial. Essas pessoas são clandestinas, não têm direitos,
ficam com medo de denunciar, porque correm o risco de serem deportadas e voltar em condições
ainda piores para o seu país.
Na China, nas áreas em que acontece uma industrialização e uma aproximação com os países
capitalistas há muita gente trabalhando em condições sub-humanas, vivendo na rua ou embaixo de
pontes. Na antiga União Soviética: trabalho infantil e escravo nos Urais.
No Sudão, os muçulmanos estão usando na guerra crianças negras capturadas e convertidas em
soldados.
O segundo governo de Luís Inácio da Silva ao continuar a implementação da liberalização da economia
como condição de suposta modernização do Brasil e a praticar uma inserção nacional na globalização
neoliberal de forma dependente e subordinada impôs ao país um modelo econômico com forte
predomínio da produção agrária para exportação e sob o comando de agro-indústrias nacionais e
multinacionais, que tendem a forçar cada vez mais a desorganização da agricultura familiar e a trazer
sérias implicações sociais para a realidade social brasileira.
O trabalho forçado é conseqüência do modelo de globalização adotadono mundo, em que a
competitividade instiga uma constante redução nos custos do trabalho. Com isso, leva para baixo as
condições de emprego, culminando na imposição do trabalho forçado e de um sistema para suprir
esse tipo de mão-de-obra. O que acontece em países pobres ou ricos. Arion Sayão Romita[12], divide a
globalização em quatro fases: do Império romano; fase das grandes navegações o período das guerras
napoleônicas da livre iniciativa e da livre concorrência; e a quarta fase que é a fase da internet, das
empresas transnacionais e da economia mundializada( Alguns colocam como etapa Monopólio
Financeira).
Nicola Phillips, professora de economia política da Universidade de Manchester, defendeu que o tráfico
de pessoas para exploração econômica e sexual está relacionado ao modelo de globalização e de
capitalismo que o mundo adota.
Esse modelo é baseado em um entendimento de competitividade nos negócios que pressiona por uma
redução constante nos custos do trabalho. Empregadores tentam flexibilizar ao máximo as leis e
relações trabalhistas para lucrar com isso e, ao mesmo tempo, atender uma procura por produtos cada
vez mais baratos por parte dos consumidores. Para atuar no problema, deve-se atuar tanto na oferta
desse tipo de mão-de-obra quanto na demanda. Uma das ramificações do processo de flexibilização
como já mencionado, é a terceirização.
2.2 A escravidão no Brasil em suas várias regiões
“Em geral, onde há muita miséria, não há trabalho escravo. Onde há miséria, existe uma população apta
ao aliciamento, ali vai se encontrar a mão de obra necessária que vai para outras regiões.” (Padre
Ricardo Resende Figueira).
Há escravidão em todas as regiões do Brasil e ela varia de acordo com a atividade econômica
prevalecente e o nível de desigualdades ali constantes:
A Pastoral da Terra contabiliza cerca de 25 mil pessoas em situação de escravidão no Brasil. As
denúncias surgiram nos anos 70. Mas, somente na década de 90 que o País assumiu as suas culpas.
Em 1992, surgiu o Programa para a Erradicação do Trabalho Forçado (PERFOR). Em 1995, o Grupo
Executivo de Repressão ao Trabalho Forçado e o Grupo Móvel de Fiscalização. Infelizmente o quadro
de escravidão:
“…não se restringe a distantes e “inatingíveis” pontos do território nacional, locais em que o imaginário
coletivo facilmente denominaria de “perdidos no tempo”. Esse quadro não ocorre isolado de uma
realidade mais ampla, não se afasta de modernos atores econômicos, mas, antes, se repete nas
grandes capitais brasileiras do Sudeste, quer na exploração de imigrantes clandestinos, quer na
repetição da exploração da miséria dos migrantes brasileiros ou, ainda, atingindo brasileiros que se
lançam ao exterior, seja em razão do tráfico de seres humanos para prostituição, seja nas relações
domésticas”. ( OIT 2007, p.15)
Em 2003, o Governo lançou o Plano Nacional de Erradicação do Trabalho Escravo e, em seguida, a
Comissão Nacional de Erradicação do Trabalho Escravo (CONATRAE) – com representantes dos
Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário e de vários segmentos da sociedade civil. (OIT 2007, p. 48-
49)
A escravidão contemporânea é mais cruel e desumana que a escravidão nos tempos primórdios. Ela se
caracteriza pelo cerceamento da liberdade, pela degradação das condições de trabalho, pela servidão
por dívida, pelas condições de isolamento geográfico, pelo uso da violência, pelo acirramento das
relações sociais e pelo desrespeito e violação aos direitos humanos.
A carvoaria usa mão-de-obra masculina como, também, feminina e infantil. Na fruticultura ou na área
de cana de açúcar há presença feminina e infantil. Mas o trabalho de derrubar floresta, para plantar
pasto, é prioritariamente executado pela mão-de-obra masculina.
As formas de escravidão encontradas no Brasil se diversificam em trabalho forçado, Escravidão por
Dividas, Trabalho Degradante, jornada de Trabalho Exaustiva e Escravidão Infanto-Juvenil as quais
estão abaixo conceituadas:
1. Trabalho Forçado
Que se caracteriza como sendo todo trabalho ou serviço exigido de um indivíduo sob ameaça de
qualquer penalidade e para o qual ele não se ofereceu de espontânea vontade (Convenção nº29 OIT,
1930, p.1).
2. Escravidão por Dívidas
Neste modelo, a pessoa empenha sua própria capacidade de trabalho ou a de pessoas sob sua
responsabilidade (esposa, filhos, pais) para saldar uma conta. E isso acontece sem que o valor do
serviço executado seja aplicado no abatimento da conta de forma razoável ou que a duração e a
natureza do serviço estejam claramente definidas. A forma mais encontrada no país.
3. Trabalho Degradante
Este é evidenciado quando o trabalhador se vê obrigado a realizar suas atividades laborais sem as
mínimas condições de higiene e segurança no ambiente de trabalho, prejudicando assim sua saúde
física e mental.
Relaciona-se com próprio o trabalho escravo stricto sensu. Pressupõe, portanto, a falta explícita de
liberdade. Mesmo nesse caso, porém, a idéia de constrição deve ser relativizada.
Este tem como modalidade a jornada de trabalho exaustiva.
3.1 Jornada de Trabalho Exaustiva
Esta está inserida nas condições degradantes por afrontar a dignidade do trabalhador.
Esta categoria se liga com o trabalho. Nesse contexto, entram não só a própria jornada exaustiva de
que nos fala o CPB no art. 149 – seja ela extensa ou intensa – como o poder diretivo exacerbado, o
assédio moral e situações análogas.
Note-se que, embora também o operário de uma fábrica possa sofrer essas mesmas violações, as
circunstâncias que cercam o trabalho escravo – como a falta de opções, o clima opressivo e o grau de
ignorância dos trabalhadores – as tornam mais graves ainda.
4 .Escravidão Infanto-Juvenil.
Como o nome sugere é a utilização de mão-de-obra de crianças e pré-adolescentes no trabalho
escravo ou análogo a este. Aqui neste tipo, quase sempre os pais são coniventes com tal exploração.
No Nordeste brasileiro, as crianças e adolescentes estão presentes em mais de 11 atividades. Destas,
a colheita da cana-de-açúcar é a principal atividade onde o trabalho infantil está envolvido.
Os Estados do Ceará e Pernambuco, juntamente com o Rio de Janeiro, são os recordistas na
exploração de mão-de-obra infantil nos canaviais. Nesta atividade, as crianças cortam a cana,
suportam o peso de sacos da planta e correm o risco até de sofrerem mutilação. Ademais, não
trabalham menos de dez horas por dia, ficam expostos ao sol e fazem o serviço sem proteção
nenhuma.
O mesmo panorama se descortina nos sisais da Bahia; na cultura do fumo em Alagoas; na colheita da
uva em Pernambuco e Rio Grande do Norte; nas salinas do Ceará, Piauí e Rio Grande do Norte; nas
cerâmicas de Alagoas, Rio Grande do Norte, Bahia, Pernambuco, Piauí, Sergipe e Maranhão; e nas
pedreiras de Pernambuco, Alagoas, Bahia, Rio Grande do Norte, Paraíba e Piauí.
Na região Sul, que ao lado do Sudeste, é considerada a mais rica e desenvolvida, a mão-de-obra infantil
é explorada em 21 atividades. Só o Rio Grande do Sul concentra 11 dessas atividades.
As extrações de acácia e ametista no Rio Grande do Sul, pelos menores, são as que mais chocam. As
crianças lavam as pedras de ametista com produtos químicos tóxicos sem nenhuma proteção, ficam
expostos à fuligem da máquina de lixar a pedra e suportam o peso do minério das minas até o local de
beneficiamento. Podendo até serem mutiladas na lixa.
Igualmente, a mão-de-obra infantil é usada nas madeireiras de Santa Catarina e Paraná; na produção
de cerâmica no Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná; nas cristaleiras de Santa Catarina; na
construção civil dos centros urbanos do Paraná e Santa Catarina; na indústria moveleira e no curtume
dos três estados sulistas.
Na zona urbana dos Estados do Sul, a situação se iguala ao Nordeste, nos escritórios, comércios e
supermercados.
No Centro-Oeste a exploração da força de trabalho infantil é deprimente. Em Goiás, os adolescentes
trabalham duro em jornadas diárias que não duram menosque 10 horas na colheita do algodão, do
tomate e do alho. Todavia, o que mais impressiona são as olarias e cerâmicas, onde as crianças
começam a trabalhar às quatro da manhã e vão até as cinco e meia da tarde.
Nas pequenas e precárias fábricas de cerâmica, adolescentes menores de 14 anos chegam a empurrar
carretas com mais de 150 quilos de tijolos sob um terreno irregular. E suportam o calor intenso dos
fornos por horas até os tijolos ficarem prontos.
Na zona urbana de Mato Grosso, há crianças catadoras de lixo, que brincam, comem e tiram o sustento
do dia, tentando separar o lixo reciclável para vender em outros lugares. Já no Mato Grosso do Sul as
carvoarias batem recorde na exploração do trabalho infantil.
A mão de obra de imigrantes é outra questão que tem vindo à tona nos centros urbanos,refletindo a
atual situação .
Segundo estimativa do Conselho Nacional de Imigração, vinculado ao Ministério do Trabalho,
atualmente existem no país 800 mil trabalhadores imigrantes em situação legal. Outros 200 mil
estariam irregulares. No caso dos legais, predominam os portugueses, enquanto os bolivianos
aparecem em maior número entre os irregulares.
Especificamente aos mais de 100 mil bolivianos que hoje trabalham no Estado de São Paulo, a maioria
está em situação irregular, sem visto para trabalho, e exercem atividades em oficinas de confecção.
Estimativas da Pastoral do Migrante Latino-Americano apontam que há hoje mais de 200 mil bolivianos
vivendo no município de São Paulo. Destes, cerca de 12 mil em situação de escravidão. Como
trabalham de forma irregular, autoridades brasileiras não têm informações exatas para quantificá-los.
Ações de fiscalização têm encontrado, com freqüência, nas pequenas tecelagens – onde a mão-de-
obra boliviana é explorada. Num relatório expõe-se que:
“Os bolivianos costumam trabalhar das 6h às 23h ou das 7h às 24h e ganham entre R$ 200,00 e R$ 400,00
– valor difícil de ser alcançado – por mês. Moram num cubículo, no próprio local de trabalho. São
quartinhos de 2,00m x 1,50m que abrigam o trabalhador, sua família, a máquina de costura e mais um
espaço para colocar a roupa que é produzida (em alguns, o quarto e a oficina ficam em ambientes
diferentes). Os colchões são enrolados durante o dia e à noite, quando vão dormir, se transformam em
cama. As roupas prontas são normalmente entregues a coreanos que têm lojas de roupas baratas[…]
[…]Há entre os bolivianos formas de descontos e dívidas, dois elementos que acabam mantendo os
trabalhadores no local. Eles seguem trabalhando gratuitamente até que paguem a dívida. Se errarem em
alguma peça, pagam pela peça inteira o preço que o dono venderia para os coreanos. Em fases boas,
costuram de 200 a 250 peças por dia. Hoje em dia, ficam em média com 80 peças diárias, recebendo R$
0,10 por cada uma delas – deveriam receber R$ 0,20; a diferença fica pela moradia e alimentação.[13]”
O art. 5º da CFB/88 prevê igualdade para estrangeiros residentes no país a inviolabilidade do direito a
vida, a liberdade a igualdade a segurança e a propriedade, nos termos nela dispostos.
Cabe aqui salientar que a Lei 6.815/80 Art. 125, XII prevê como crime: Introduzir estrangeiro
clandestinamente ou ocultar clandestino ou irregular. Sob pena de detenção de um a três anos e, se o
infrator for estrangeiro, expulsão.
As usinas sucroalcooleiras são as principais responsáveis pelo trabalho escravo no Brasil, segundo
pesquisa da CPT (Comissão Pastoral da Terra) divulgada. O setor também é apontado como o
campeão de desrespeito à legislação trabalhista. Dos 5.974 trabalhadores libertados da escravidão
pelo Grupo Móvel do Ministério do Trabalho em 2007, 3.131 – ou seja, 52% – saíram de usinas do setor
sucroalcooleiro.[14]
De acordo com nota da CPT, a expansão da área plantada com cana-de-açúcar, motivada pelo incentivo
ao biocombustível, pode aumentar as ocorrências de trabalho escravo. A CPT informa que essas
usinas também desrespeitam a legislação trabalhista e a maioria está ligada ao setor da cana.
Um resumo sobre o documento “Direitos Humanos e Indústria da Cana” revela que A indústria da cana
sempre teve grande importância na economia e no processo histórico brasileiros. A atividade adquiriu
dimensão ainda maior no Brasil com a crise internacional dos anos 70, que causou forte alta no
mercado petroleiro e impulsionou o setor canavieiro, a partir da criação do Proálcool. De 1972 a 1995,
o governo brasileiro incentivou o aumento da área de plantação de cana (as plantations) e a
estruturação do complexo sucro-alcooleiro, com grandes subsídios e diferentes formas de incentivo.
O Brasil é atualmente o maior produtor mundial de etanol e atingiu um recorde de 17,4 bilhões de litros
em 2006. Neste ano, cerca de 4,2 bilhões de litros de álcool deverão ser destinados à exportação.
Estima-se que até 2012 a produção anual de etanol no Brasil seja de 35 bilhões de litros.
Algumas grandes empresas estrangeiras têm adquirido usinas de cana no Brasil, entre elas Bunge,
Noble Group, ADM e Dreyfus, além de mega-empresários como George Soros e Bill Gates. Assim como
as Companhias que se instalaram no Brasil no ciclo do ouro com o fim de extrair riquezas.[15]
A expansão de monoculturas para a produção de agrocombustíveis tem trazido conseqüências para o
país. Uma delas é a ampliação da grilagem (que é a ação ilegal visando transferir terra pública para
bens de terceiros) de grandes áreas de terras públicas pelas empresas produtoras de soja, além de
“legalizar” as grilagens já existentes. O ciclo da grilagem no Brasil costuma começar com o
desmatamento, utilizando-se de trabalho escravo, depois vem a pecuária e a produção de soja.
Outra conseqüência do monopólio da terra pelos usineiros é o desemprego em outros setores
econômicos, estimulando a migração e a submissão de trabalhadores a condições degradantes.
Apesar da propaganda de “eficiência”, a indústria de agroenergia está baseada na exploração de mão-
de-obra barata e até mesmo escrava.
Os trabalhadores são remunerados por quantidade de cana cortada e não por horas trabalhadas.
No estado de São Paulo, maior produtor do país, a meta de cada trabalhador é cortar entre 10 e 15
toneladas de cana por dia e recebem R$2,92 por tonelada de cana cortada e empilhada.
Novas pesquisas com cana de açúcar transgênica, mais leve e com maior nível de sacarose, significam
mais lucros para os usineiros e mais exploração para os trabalhadores.
Entre 2004 e 2007 foram registradas 20 mortes por exaustão no corte da cana. Em 2005, outras 450
mortes de trabalhadores foram registradas pelo MTE nas usinas de São Paulo.
As causas destas mortes de trabalhadores variam em:
1 Homicídios ;
2 Acidentes no precário transporte para as usinas;
3 Doenças como parada cardíaca, câncer;
4 Carbonização durante as queimadas.
O trabalho escravo também é comum no setor:
Os trabalhadores são geralmente migrantes do nordeste ou do Vale do Jequitinhonha, em Minas
Gerais, aliciados por intermediários que selecionam a mão-de-obra para as usinas. Mais conhecidos
como “gatos” ou “turmeiros”.
Em 2006, a Procuradoria do Ministério Público fiscalizou 74 usinas no estado de São Paulo e todas
foram autuadas.
Em março de 2007, fiscais do MTE resgataram 288 trabalhadores em situação de escravidão em seis
usinas de São Paulo. Em outra operação realizada em março, o Grupo de Fiscalização da Delegacia
Regional do Trabalho em Mato Grosso do Sul resgatou 409 trabalhadores no canavial da usina de
álcool Centro Oeste Iguatemi. Entre eles, havia um grupo de 150 índios. E em novembro o Grupo Móvel
de Fiscalização descobriu 1011 indígenas vivendo em condições degradantes nas usinas. A utilização
da mão-de-obra indígena permanece figurando no cenário das plantações.
No dia 8 de abril de 2008, uma fiscalização do Grupo identificou 1.500 trabalhadores em condições
degradantes nos municípios de Campo Alegre de Goiás e Mineiros, ambos em Goiás, e Alto Taquari,
em Mato Grosso. Ou seja, todos os anos,centenas de trabalhadores são encontrados em condições
semelhantes nos canaviais: sem registro trabalhista, sem equipamentos de proteção, sem água ou
alimentação adequada, sem acesso a banheiros e vivendo em moradias precárias. Muitas vezes os
trabalhadores precisam pagar por instrumentos como botas e facões. No caso de acidentes de
trabalho, não recebem tratamento adequado. O Ministério Público do Trabalho decidiu ajuizar três
ações civis públicas por danos morais coletivos contra a empresa, no valor de R$ 5 milhões cada.
A Pastoral dos Migrantes estima que cerca de 200 mil trabalhadores migrantes trabalhem em São
Paulo no período da safra da cana, laranja e café. No setor canavieiro do estado, o número de
migrantes por safra é estimado em 40 mil. As condições de trabalho dessas pessoas violam
sistematicamente os direitos humanos. Esses trabalhadores muitas vezes iniciam suas atividades já
endividados e a situação antes “temporária”, torna-se agora permanente por falta de alternativas de
emprego em suas regiões de origem. Uma das dívidas contraídas antes de iniciar o trabalho é com o
transporte (em grande parte, clandestino).
Na entressafra, um número mais reduzido de mão-de-obra é utilizado para o preparo da terra e plantio
em algumas áreas, além da aplicação de agrotóxicos. O desemprego causado pelo modelo agrícola
baseado na monocultura e no latifúndio aumenta o contingente de trabalhadores que se submetem a
trabalhar em lugares distantes de sua origem, em condições precárias.
Na região dos canaviais aumentam as chamadas “cidades-dormitórios”, onde os trabalhadores
migrantes vivem em cortiços, barracos ou nas “pensões”. Apesar da situação precária, os custos com
moradia e alimentação são muito acima da média, pagos pela população em geral. Tanto os
alojamentos das usinas quanto as “pensões” são barracos ou galpões improvisados, superlotados,
sem ventilação ou condições mínimas de higiene.
A incorporação de novas tecnologias no setor canavieiro aprofundou a dinâmica de exploração do
trabalho, através de formas precárias de arregimentação, contratação, moradia, alimentação etc.
As colheitadeiras funcionam em áreas planas e contínuas, mas causam maior compactação do solo e
prejudicam as mudas que deveriam rebrotar. A mecanização gera superexploração do trabalho porque
cria novas exigências como o corte rente ao solo (para maior aproveitamento da concentração de
sacarose) e a ponteira da cana bem aparada. Isso aumenta o esforço dos trabalhadores e a jornada de
trabalho.
O corte mecanizado se tornou referência para a quantidade cortada pelos trabalhadores, que subiu de
5 a 6 toneladas por dia para cada trabalhador na década de 80, para 9 a 10 toneladas por dia na década
de 90. Hoje, já se registra uma exigência das usinas de 12 a 15 toneladas por dia, principalmente em
regiões onde o ritmo das máquinas se tornou referência de produtividade.
Há registros de quatro assassinatos de indígenas ocorridos em alojamentos de usinas. Menores de
idade falsificam seus documentos para irem trabalhar no corte de cana, enganados por falsas
promessas de ganhar muito dinheiro, deixam a escola da aldeia ou da cidade, burlando a fiscalização e
saem muitas vezes, neste caso sem o consentimento dos pais.
O não cumprimento da meta freqüentemente significa que o trabalhador será dispensado e colocado
em uma lista que circulará por diversas usinas, o que o impede de voltar a trabalhar na safra seguinte.
Um estudo apresentado por pesquisadores da Universidade Metodista de Piracicaba e do Centro de
Referência de Saúde do Trabalhador, Erivelton Fontana de Laat e Rodolfo Vilela, respectivamente,
mostram uma situação assustadora quanto às condições físicas em que fica o cortador de cana:
“Em 10 minutos o trabalhador derruba 400 quilos de cana, desfere 131 golpes de podão, faz 138 flexões
de coluna, num ciclo médio de 5,6 segundos cada ação. O trabalho é feito em temperaturas acima de 27º
C com muita fuligem no ar e ao final do dia terá ingerido mais de 7,8 litros de água, em média, desferido
3.792 golpes de podão e feito 3.994 flexões com rotação da coluna. A carga cardiovascular é alta, acima
de 40% e em momentos de pico os batimentos cardíacos chegam a 200 por minuto ”
de 40%, e em momentos de pico os batimentos cardíacos chegam a 200 por minuto.
O pagamento por produção é um complicador na situação do trabalho na cana-de-açúcar. Esse
sistema colabora com a superexploração da mão-de-obra.
No pagamento por produção, as usinas usam um complicado sistema de medidas que impossibilita ao
trabalhador ter um controle sobre a quantidade cortada e sobre o valor do pagamento. Uma forma de
efetivar a mais-valia (excedente da produção).
A falta de controle da produção e do valor do pagamento pelos trabalhadores é o principal meio de
pressão dos usineiros para aumentar a produtividade do trabalho, pois se os trabalhadores soubessem
quanto ganhariam teriam a possibilidade de interromper o trabalho quando tivessem chegado ao limite
de sua resistência física.
O setor sucroalcooleiro é responsável por grande parte dos números de trabalho escravo no Brasil.
Segundo a Comissão Pastoral da Terra, 53% dos 5.974 trabalhadores libertados pelo Grupo Especial de
Fiscalização Móvel, ou seja, 3.117 trabalhadores trabalhavam nas usinas sucroalcooleiras dos estados
do Pará, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Goiás, São Paulo e Ceará.
O caso de maior dimensão ocorreu em Ulianópolis (PA) onde foram libertados no ano passado 1.064
trabalhadores numa usina. O relatório do MTE aponta servidão por dívidas, jornadas diárias de até 14
horas, falta de qualidade da água e da alimentação, falta de uso de equipamento de proteção,
transporte inadequado, alojamentos superlotados, etc. Em junho de 2007, o Ministério do Trabalho
resgatou 42 trabalhadores de uma usina do grupo Cosan, a maior do setor sucroalcooleiro, em
Igarapava, São Paulo.
O relatório da missão internacional apontou dados preocupantes da União da Indústria de Cana- de -
açúcar (ÚNICA):
Com a mecanização serão desativados todos os 189 mil postos de trabalho manuais em São Paulo até
a safra 2010/21. Por outro lado, serão criados 55 mil postos em funções mecânicas e, possivelmente,
outros 20 mil nas usinas. Ou seja, o desemprego atingirá, no mínimo, 114 mil trabalhadores somente
em São Paulo até a safra 2020/21.
Há dúvidas, porém, sobre a possibilidade de se massificar a mecanização do setor, uma vez que os
baixos salários e a precariedade das condições de trabalho tornam mais lucrativo para as empresas
manter o corte manual do que investir em maquinário. Atualmente, mais de 60% da colheita da cana é
feita manualmente no Brasil. Muitos trabalhadores morrem por exaustão. Entre 2004 e 2007 foram
registradas 21 mortes por exaustão no corte da cana.
Com as sistemáticas denúncias destas condições de trabalho e dos alarmantes casos de morte por
exaustão nas lavouras de açúcar, a Pastoral do Migrante avalia que houve uma pequena melhora no
quadro geral:
De acordo com Padre Antônio Garcia, membro da equipe da Pastoral do Migrante em Guariba, São
Paulo, o Ministério Público do Trabalho tem intensificado fiscalizações e autuações das empresas; a
imprensa local e nacional tem dado importante visibilidade para o tema e isso faz com que as
empresas tenham receio de serem autuadas, uma vez que não querem ter seu nome ligado à situação
degradante de trabalho; além disso, por meio das audiências públicas que têm realizado na região,
algumas em parceria com a Relatoria Nacional para o Direito Humano ao Trabalho, tiveram conquistas
como a pausa no trabalho, o café com pão e a barraca contra o sol, para poderem almoçar.[16]
A realidade do povo brasileiro é lamentável! As pessoas parecem estar tão sonolentas e entorpecidas
pelo trabalho como meio de suprir suas necessidades que acabam se submetendo a tais condições.
Dar um basta e cobrar mais de quem deve garantir a dignidade do trabalhador em suas diversas
categorias seja no

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