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Cuidados de Emergência Elisa M. Mazzaferro and Richard B. Ford Manejo Pré-hospitalar do Animal Traumatizado, Avaliação da Cena Exame Inicial Preparação para o Transporte Exame, Manejo e Triagem Iniciais de Emergência Avaliação Inicial e Procedimentos de Reanimação Emergenciais Exames Auxiliares de Diagnóstico Resumo do Estado do Paciente O Paciente com Rápida Descompensação Procedimentos Diagnósticos e Terapêuticos de Emergência Paracentese Abdominal e Lavado Peritoneal Diagnóstico Técnicas de Colocação de Bandagem e Tala Terapia com Hemocomponentes Mensuração da Pressão Venosa Central Fluidoterapia Lavagem Orogástrica Suplementação de Oxigênio Oximetria de Pulso Capnometria (Monitoração da Concentração de Dióxido de Carbono Expirado) Toracocentese Traqueostomia Uro-hidropropulsão Técnicas de Acesso Vascular Dor: Avaliação, Prevenção e Controle Impacto Fisiológico da Dor não Tratada Reconhecimento e Avaliação da Dor Controle da Dor Aguda em Pacientes Emergenciais Graves ou em Cuidados Intensivos e Traumatizados Tratamento Farmacológico da Dor: Analgésicos Maiores Analgésicos Menores Fármacos Analgésicos Adjuvantes Técnicas de Anestesia Local e Regional para o Paciente em Emergência Tratamento de Emergência de Condições Específicas Abdome Agudo Terapias Adjuvantes Choque Anafilático (Anafilactoide) Edema Angioneurótico e Urticária Complicações e Emergências Anestésicas Distúrbios Hemorrágicos Queimaduras Emergências Cardíacas Emergências Otológicas Lesão Elétrica e Choque Elétrico Emergências da Genitália Feminina e do Trato Reprodutivo Emergências da Genitália Masculina e do Trato Reprodutivo Emergências Ambientais e Domésticas Fraturas e Trauma Musculoesquelético Emergências Gastrointestinais Hipertensão Sistêmica Emergências Metabólicas Emergências Neurológicas Emergências Oculares Emergências Oncológicas Venenos e Toxinas Emergências Respiratórias Doenças Pulmonares Lesões Superficiais de Tecido Mole Choque Tratamento do Paciente em Choque Tromboembolismo: Sistêmico Emergências do Trato Urinário Manejo pré-hospitalar do animal traumatizado Avaliação Da Cena 1. Peça ajuda! Geralmente há necessidade de mais de uma pessoa no local do acidente para dar assistência ao animal e evitar lesão ao animal e às pessoas presentes. 2. Caso o acidente tenha ocorrido em uma zona de tráfego de carros, alerte os motoristas que se aproximarem do animal traumatizado na estrada. O alerta poderá ser feito por meio de uma peça de roupa ou outro objeto que chame a atenção dos motoristas que estiverem se aproximando. Cuidado para não ser ferido por motoristas que podem não vê-lo ou identificá-lo ao se aproximarem! 3. Caso o animal esteja consciente, evite se machucar enquanto o move para um local seguro. Utilize um cinto, corda ou pedaço de pano comprido para fazer uma mordaça e conter a cabeça do animal de forma segura. Caso isso não seja possível, cubra a cabeça do animal com uma toalha, cobertor ou casaco antes de movê-lo para evitar que ele o morda. 4. Caso o animal esteja inconsciente ou imóvel, mova-o para um local seguro com um material de apoio para as costas, que pode ser feito utilizando-se uma caixa, porta, tábua plana, cobertor ou lençol. Exame Inicial 1. Há patência de vias aéreas? Caso haja ruídos respiratórios ou o animal esteja em estupor, estenda a cabeça e pescoço delicada e cuidadosamente. Se possível, tracione a língua. Limpe o muco, sangue ou vômito da boca. Em animais inconscientes, mantenha a estabilidade da cabeça e do pescoço. 2. Procure por sinais de respiração. Caso não haja evidência de respiração ou a mucosa oral esteja cianótica, inicie a respiração boca-nariz. Circunde a região do focinho com suas mãos e assopre no interior da narina de 15 a 20 vezes por minuto. 3. Há evidência de função cardíaca? Verifique se há um pulso palpável nos membros pélvicos ou um batimento apical sobre o esterno. Caso não sejam encontrados sinais de função cardíaca, inicie as compressões cardíacas externas de 80 a 120 vezes por minuto. 4. Há alguma hemorragia? Utilize um pano limpo, toalha, papel-toalha, fralda descartável ou absorvente feminino para cobrir o ferimento. Pressione firmemente para reduzir a hemorragia e evitar perdas sanguíneas adicionais. Não utilize um torniquete, pois este poderá causar lesão adicional. Pressione, e, à medida que o sangue penetrar na primeira camada do material da bandagem, coloque uma segunda camada sobre ela. 5. Cubra qualquer ferimento externo. Utilize um material de bandagem limpo embebido em água morna e transporte o animal para um centro de emergência veterinária mais próximo. Investigue imediatamente procurando feridas penetrantes no abdome e tórax. 6. Há alguma fratura evidente? Imobilize fraturas com talas caseiras feitas de jornal, cabo de vassoura ou galhos de árvore. Amordace o animal antes de tentar colocar qualquer tala. Caso uma tala não possa ser colocada de forma segura, envolva o animal com uma toalha ou cobertor e o transporte para um centro de emergência veterinária mais próximo. 7. Há alguma queimadura? Coloque toalhas geladas e úmidas sobre a área queimada e vá trocando por outras quando as toalhas atingirem a temperatura corporal. 8. Cubra o animal para mantê-lo aquecido. Caso o animal esteja tremendo ou em choque, envolva-o em um cobertor, toalha ou casaco e o transporte para o centro de emergência veterinária mais próximo. 9. O animal está apresentando hipertermia (por intermação/insolação)? Resfrie o animal com toalhas úmidas à temperatura ambiente (não fria) e o transporte para um centro de emergência veterinária mais próximo. Preparação Para O Transporte 1. Telefone antes! Informe ao centro veterinário que você está chegando. Esteja preparado com números e locais de emergência disponíveis. 2. Mova o paciente traumatizado cuidadosamente. Utilize a mesma abordagem da retirada do animal da via de tráfego e coloque-o no banco de trás do carro. 3. Dirija com cuidado. Não transforme um acidente em dois. O ideal é que, enquanto uma pessoa dirige o carro, outra esteja com o animal. Exame, manejo e triagem iniciais de emergência O exame do animal com traumatismo agudo que está inconsciente e em choque e apresenta hemorragia aguda ou dificuldade respiratória deve ser feito simultaneamente ao tratamento imediato e agressivo para estabilizar o paciente. Como, em geral, não há tempo para uma anamnese detalhada, o diagnóstico baseia-se principalmente nos achados do exame físico e testes simples de diagnóstico. A triagem é a arte e a habilidade de avaliar pacientes rapidamente e classificá-los de acordo com a urgência requerida do tratamento. O reconhecimento imediato e o pronto atendimento podem salvar o animal. Avaliação Inicial E Procedimentos De Reanimação Emergenciais Realize um exame breve, mas completo e sistemático, de todo animal, considerando o ABC [airway (via aérea); breathing (respiração); circulation (circulação)] mais importantes para qualquer paciente emergencial. ABC A = Via aérea Há patência de vias aéreas? Puxe a língua do paciente para fora e remova qualquer material que esteja obstruindo a via aérea. Talvez seja necessário realizar sucção e utilizar um laringoscópio. Realize a intubação ou coloque uma fonte de oxigênio transtraqueal caso haja necessidade de suplementação de oxigênio. A traqueostomia de emergência poderá ser necessária na ocorrência de obstrução de via aérea superior que não possa ser solucionada imediatamente com os procedimentos anteriores. B = Respiração O animal está respirando? Caso o animal não esteja respirando, intube a traqueia imediatamente e inicie a ventilação artificial com uma fonte de suplementação de oxigênio (ver Parada Cardíaca e Reanimação Cerebrocardiopulmonar, nesta seção). Se o animal estiver respirando, quais são a frequência e o padrão respiratórios? A frequência respiratória está normal, aumentada ou diminuída? O padrão respiratório está normal ou a respiração está rápida e superficial ou lenta e profunda com dificuldade inspiratória? Os ruídos respiratórios estão normais ouhá um estridor agudo alto na inspiração, característico de uma obstrução em via aérea superior? O animal está com a cabeça estendida e os cotovelos afastados do corpo, ou seja, ortopneia? As comissuras bucais se movimentam durante a inspiração e expiração? Há evidência de dificuldade expiratória com um esforço abdominal na expiração? Observe a parede torácica lateral. As costelas se movimentam para fora e para dentro com a inspiração e expiração ou há movimento paradoxal da parede torácica em que uma área se move para dentro durante a inspiração e para fora durante a expiração, sugestivo de uma instabilidade torácica? Há algum enfisema subcutâneo sugestivo de lesão de via aérea? Ausculte o tórax bilateralmente. Os sons respiratórios estão normais? Eles soam ásperos com crepitações decorrentes de pneumonia, edema pulmonar ou contusões pulmonares? Os sons pulmonares estão abafados devido à efusão pleural ou pneumotórax? Há ruídos respiratórios em um gato com bronquite (asma)? Qual é a cor das membranas mucosas? As membranas mucosas estão cor-de-rosa e normais ou pálidas ou cianóticas? Palpe a região cervical para verificar se há deslocamento de traqueia e enfisema subcutâneo, assim como a região torácica para evidenciar fratura de costelas e também enfisema subcutâneo. C = Circulação Qual é a condição circulatória? Qual é a condição da frequência e ritmo cardíaco do paciente? Você consegue ouvir o coração, ou ele está abafado por causa de hipovolemia, efusão pleural ou pericárdica, pneumotórax ou hérnia diafragmática? Palpe o pulso. A qualidade do pulso está forte e regular ou há pulsos filiformes e irregulares? Qual é o ritmo do eletrocardiograma (ECG) e o valor da pressão arterial (PA) do paciente? Há hemorragia arterial? Repare se há presença de algum sangramento. Seja cuidadoso caso haja algum sangue no pelo. Use luvas. O sangue poderá ser do paciente, e as luvas ajudarão a evitar contaminação adicional de qualquer ferimento; ou ainda, o sangue poderá ser de uma pessoa que inicialmente socorreu o animal. Caso haja ferimentos externos, observe suas características e condições. Coloque uma bandagem compressiva sobre qualquer sangramento ou ferimento externo para evitar hemorragia adicional ou contaminação por organismos nosocomiais. Estabeleça um acesso venoso de grande calibre ou intraósseo (ver Técnicas de Acesso Vascular, nesta seção). Caso haja choque hipovolêmico ou hemorrágico, institua imediatamente os procedimentos de reposição volêmica. Inicie com um quarto da dose calculada para os líquidos cristaloides para o tratamento do choque (0,25 × [90 mL/kg] para cães; 0,25 × [44 mL/kg] para gatos) e avalie novamente os parâmetros de perfusão sanguínea: frequência cardíaca, tempo de preenchimento capilar e PA. Caso haja suspeita de contusões pulmonares, o uso de coloides, como o amido hidroxietílico na dose de 5 mL/kg em bolus crescentes, pode melhorar a perfusão sanguínea com um volume menor de fluido administrado. Em casos de traumatismo craniano, a solução de cloreto de sódio hipertônica (7%) pode ser administrada (4 mL/kg em bolus intravenoso) associada ao amido hidroxietílico. A hemorragia abdominal aguda causada por traumatismo pode ser tamponada com uma bandagem compressiva nesta região. Após o ABC imediatos, prossiga com o restante do exame físico e tratamento utilizando o recurso mnemônico A CRASH PLAN: airway (via aérea); cardiovascular (sistema cardiovascular); respiratory (sistema respiratório); abdomen (abdome), spine (coluna vertebral); head (cabeça); pelvis (pelve); limbs (membros); arteries (artérias); nerves (nervos). A Crash Plan A = Via aérea C e R = Sistemas Cardiovascular e Respiratório A = Abdome Palpe o abdome do paciente. Há alguma dor ou lesão penetrante? Observe o umbigo do paciente, pois o avermelhamento ao seu redor poderá ser sugestivo de hemorragia intra- abdominal. Há líquido ou neoformação palpável? Examine as regiões inguinal, caudal, torácica e paralombar. Faça tricotomia dos pelos para examinar o paciente quanto à presença de contusões ou feridas perfurantes. Percuta e ausculte o abdome para avaliar a presença de gases e os borborigmos gastrointestinais. S = Coluna Vertebral Palpe a coluna vertebral do animal para verificar a simetria. Há alguma dor ou aumento de volume evidente ou presença de fratura? Realize um exame neurológico desde a primeira vertebral cervical até a última vértebra da cauda. H = Cabeça Examine olhos, ouvidos, boca, dentes e focinho e avalie a resposta à atividade sensorial e motora promovida pelos nervos cranianos. Aplique um corante fluorescente nos olhos para verificar a presença de úlceras de córneas em qualquer ocorrência de traumatismo craniano. Há anisocoria ou síndrome de Horner? P = Pelve Realize um exame retal. Palpe para investigar a presença de fratura ou hemorragia. Examine a genitália externa. L = Membros Examine as extremidades torácica e pélvica. Há alguma fratura aberta (exposta) ou fechada evidente? Coloque rapidamente uma tala nos membros para evitar danos adicionais e auxiliar no controle da dor. Examine pele, músculos e tendões. A = Artérias Palpe as artérias periféricas para avaliar os pulsos. Pode-se utilizar o Eco-Doppler para avaliação do pulso caso haja presença de doença tromboembólica. Mensure a PA do paciente. N = Nervos Observe e avalie o grau de consciência, o comportamento e a postura do animal. Verifique frequência, padrão e esforço respiratório. O paciente está consciente, obnubilado ou comatoso? As pupilas estão simétricas e responsivas à luz, ou há anisocoria? O paciente exibe alguma postura anormal, como a postura de Schiff- Sherrington (membros torácicos rígidos e estendidos e paralisia flácida de membros pélvicos), que pode indicar traumatismo grave de coluna com lesão medular? Examine os nervos periféricos para avaliar os estímulos motores e sensoriais de membros e cauda. Exames Auxiliares De Diagnóstico Técnicas Hemodinâmicas Realize eletrocardiografia, monitoração direta ou indireta da PA e oximetria de pulso em qualquer paciente em emergência. Técnicas de Imagem Obtenha radiografias do tórax e abdome em qualquer animal que tenha sofrido uma lesão traumática quando a sua condição estiver mais estável e possa tolerar o posicionamento para esses procedimentos. Radiografias exploratórias podem revelar pneumotórax, contusões pulmonares, hérnia diafragmática, efusão pleural ou abdominal e pneumoperitônio. AFAST e TFAST1 Têm-se descrito as avaliações centradas no abdome e tórax após o trauma (AFAST e TFAST) para identificação de líquido livre abdominal e de ar e líquido livre torácico (incluindo pericárdio). Durante a ultrassonografia, pode-se avaliar quatro quadrantes abdominais, pela: (1) visualização do diafragma ou fígado na linha média ventral imediatamente caudal ao esterno, (2) visualização esplenorrenal no quadrante lateral esquerdo, (3) visualização cistocólica na linha média ventral sobre a bexiga urinária e (4) visualização hepatorrenal na lateral direita. Para avaliação do tórax, posiciona-se o paciente em decúbito lateral, e o transdutor (probe) do ultrassom é direcionado ao plano horizontal no aspecto dorsal do nono espaço intercostal. Nos planos transverso e longitudinal caudal ao cotovelo, pode-se avaliar a presença de efusão pericárdica e pleural. A avaliação pelo ultrassom é rápida e pode revelar a ocorrência de hemorragia. Assim como em outras técnicas ultrassonográficas, às vezes os resultados do AFAST e TFAST dependem do operador. Testes de Laboratório Os testes de diagnóstico imediatos devem incluir hematócrito, proteínas totais, glicose, nitrogênio não proteico (NNP) e densidade urinária. O hemograma e a contagem de plaquetas, assim como a realização de hemogasometria arterial e eletrólitos, parâmetros de coagulação (tempo de coagulação ativado [TCA], tempo de protrombina [TP], tempo de tromboplastina parcial ativada [TTPA]), perfil bioquímico sérico, lactato sérico e urinálise, deverão ser considerados para a melhor avaliação clínicado paciente Exames Invasivos Pode ser necessária a realização de técnicas de exames invasivos de diagnóstico, incluindo-se toracocentese, paracentese abdominal e lavado peritoneal diagnóstico (LPD). Resumo Do Estado Do Paciente Após concluir o exame físico inicial, responda às seguintes questões: Qual o tratamento de suporte requerido neste momento? Há necessidade de procedimentos de diagnósticos adicionais? Em caso afirmativo, quais procedimentos; e o paciente está estabilizado o suficiente para tolerá-los sem estresse adicional? Deve-se instituir um período de observação suplementar antes de se iniciar um plano terapêutico mais definitivo? Há necessidade de intervenção cirúrgica imediata? Há necessidade de tratamento de suporte intensivo antes da cirurgia? Quais riscos anestésicos são evidentes? O Paciente Com Rápida Descompensação Os animais que não respondem à reanimação inicial geralmente apresentam distúrbios fisiológicos graves contínuos ou preexistentes que contribuem para a grande instabilidade cardiovascular e metabólica. O clínico deverá estar atento à ocorrência de descompensação orgânica em um paciente que não responde ou responde de forma incompleta aos esforços iniciais de reanimação (Quadros 1-1 e 1-2). Leitura Adicional Quadro 1-1 Sinais clínicos de descompensação Pulso periférico fraco ou de baixa qualidade Extremidades periféricas frias Cianose ou membranas mucosas acinzentadas Membranas mucosas pálidas Tempo de preenchimento capilar prolongado Temperatura corporal aumentada ou diminuída Débito urinário reduzido em um paciente euvolêmico Confusão ou estado mental alterado Depressão Taquicardia ou bradicardia Hematócrito em declínio Abdome distendido, dolorido Arritmia cardíaca Padrão respiratório anormal Dificuldade ou agonia respiratória Perda sanguínea gastrointestinal via êmese ou pelas fezes Quadro 1-2 Causas de descompensação aguda Insuficiência renal aguda Síndrome da angústia respiratória aguda Ruptura intestinal e gástrica Arritmia cardíaca Edema e hemorragia no sistema nervoso central e herniação de tronco cerebral Coagulopatias, incluindo-se coagulação intravascular disseminada Hemorragia interna Síndrome da falência múltipla de órgãos Pneumotórax Contusão pulmonar Tromboembolismo pulmonar Sepse ou choque séptico Síndrome da resposta inflamatória sistêmica Ruptura de bexiga urinária Crowe DT: Patient triage. In Silverstein DC, Hopper K, editors: Small animal critical care medicine, St Louis, 2009, Elsevier. Ettinger SJ, Feldman EC, editors: Critical care. In Textbook of veterinary internal medicine, ed 7, St Louis, 2010, Elsevier-Saunders. Lisciandro GR, Lagutchik MS, Mann KA, et al: Evaluation of an abdominal fluid scoring system determined using abdominal focused assessment with sonography for trauma in 101 dogs with motor vehicle trauma, J Vet Emerg Crit Care 19:426–437, 2009. Lisciandro GR, Lagutchik MS, Mann KA, et al: Evaluation of a thoracic focused assessment with sonography for trauma (TFAST) protocol to detect pneumothorax and concurrent thoracic injury in 145 traumatized dogs, J Vet Emerg Crit Care 18:258–269, 2008. Mathews KA: Veterinary emergency and critical care manual, Guelph, Ontario, Canada, 1996, Lifelearn. Wingfield WE: Decision making in veterinary emergency medicine. In Wingfield WE, editor: Veterinary emergency secrets, ed 2, Philadelphia, 2001, Hanley & Belfus. Wingfield WE: Treatment priorities in trauma. In Wingfield WE, editor: Veterinary emergency secrets, ed 2, Philadelphia, 2001, Hanley & Belfus. Procedimentos diagnósticos e terapêuticos de emergência Paracentese Abdominal E Lavado Peritoneal Diagnóstico Abdominocentese (paracentese abdominal) refere-se à punção da cavidade peritoneal com o propósito de colher fluido quando este está presente em mais de 6 mL/kg dentro da cavidade abdominal. Quando há suspeita de peritonite e não se obtém amostra de fluido por meio da paracentese, pode ser realizado o lavado peritoneal diagnóstico (LPD). Para realizar a paracentese abdominal, siga os seguintes passos: 1. Posicione o paciente em decúbito lateral esquerdo e faça tricotomia ampla com o umbigo no centro. 2. Realize a antissepsia da área tricotomizada com uma solução antimicrobiana 3. Coloque luvas, insira uma agulha de calibre 20 ou 22 ou um cateter vascular em quatro quadrantes: cranial e à direita, cranial e à esquerda, caudal e à direita e caudal e à esquerda do umbigo. À medida que insere a agulha ou cateter, gire cuidadosamente a agulha de modo que nenhum órgão abdominal seja perfurado pela extremidade da agulha. Geralmente, não há necessidade de anestesia local para este procedimento, embora uma sedação leve ou uso de analgésico possam ser indicados caso haja dor abdominal grave. Em alguns casos, o líquido flui livremente a partir de uma ou mais agulhas. Caso isso não aconteça, aspire cuidadosamente com uma seringa de 3 a 6 mL com o paciente em decúbito lateral ou em posição quadrupedal. Evite mudanças de posições enquanto as agulhas estiverem posicionadas, pois pode ocorrer punção iatrogênica de órgãos intra-abdominais. 4. Armazene qualquer fluido coletado em tubos estéreis com e sem EDTA para análise citológica e bioquímica e cultura bacteriana. Avalie o fluido hemorrágico cuidadosamente quanto à presença de coágulos. Normalmente as efusões hemorrágicas se tornam rapidamente desfibrinadas e não coagulam. A formação de coágulo pode ocorrer na presença de hemorragia ativa contínua ou ser causada pela punção iatrogênica de órgãos como o baço ou fígado. Caso a paracentese abdominal não seja produtiva, o LPD poderá ser realizado. Apesar de haver kits comerciais disponíveis de diálise peritoneal, eles são relativamente caros e geralmente não são práticos para o veterinário da rotina clínica. Para realizar o LPD, siga os seguintes passos: 1. Faça tricotomia e antissepsia da região ventral do abdome conforme descrito anteriormente. 2. Coloque luvas estéreis e corte diversos orifícios laterais em um cateter vascular (dispositivo plástico) de calibre 16 a 18. Tenha cuidado para não cortar mais de 50% da circunferência do cateter, para não haver risco de este quebrar dentro do abdome do paciente. 3. Insira o cateter dentro da cavidade peritoneal em posição caudal e à direita do umbigo, direcionando-o dorsal e caudalmente. 4. Injete 10 a 20 mL de solução de Ringer lactato ou solução salina a 0,9% aquecida à temperatura corporal do paciente. Durante a injeção do fluido na cavidade peritoneal, atente para sinais de dificuldade respiratória, pois um aumento da pressão intra- abdominal pode impedir as movimentações diafragmáticas e a função respiratória. 5. Remova o cateter. 6. Estimule o movimento do animal enquanto massageia o abdome para distribuir o fluido por toda cavidade abdominal. Se isso não for possível, movimente-o de um lado para outro. 7. Em seguida, faça novamente antissepsia da região ventral do abdome do paciente e realize a paracentese abdominal conforme descrito anteriormente. Armazene o fluido colhido para cultura e análise citológica; entretanto, os achados de análise bioquímica podem estar artificialmente diminuídos em virtude da diluição. Lembre-se de que provavelmente haverá obtenção de apenas uma pequena porção do fluido que foi injetado. Leitura Adicional Walters JM: Abdominal paracentesis and diagnostic peritoneal lavage, Clin Tech Small Anim Pract 18(1):32–38, 2003. Hackett TB, Mazzaferro EM: Veterinary Emergency and Critical Care Procedures, London, 2006, Blackwell Scientific. Jandrey KE: Abdominocentesis. In Silverstein DC, Hopper K, editors: Small animal critical care medicine, St Louis, 2009, Elsevier. Técnicas De Colocação De Bandagem E Tala Em geral, as bandagens podem ser utilizadas em feridas abertas ou fechadas. A bandagem é utilizada para seis tipos principais de feridas: feridas abertas contaminadas ou infectadas; feridas abertas em fase de cicatrização; feridas fechadas; feridas que requerem bandagem compressiva; feridas que requerem alívio de pressão; e feridas que requeremimobilização. No Quadro 1-3, há uma lista das diversas funções das bandagens. Quadro 1-3 Funções das bandagens e talas Exercer pressão Remover o espaço morto Reduzir o edema Minimizar a hemorragia Evitar pressão sobre a ferida Evitar úlceras de decúbito Proteger as feridas Bandagens úmidas compressivas – tratar lesões cortantes profundas Absorver exsudato e desbridar feridas Proteger a ferida de bactérias do ambiente Proteger o ambiente do sangue, exsudato e bactérias da ferida Imobilizar a ferida e sustentar estruturas ósseas subjacentes Minimizar o desconforto do paciente Servir como um veículo para antissépticos e antibióticos Servir como um indicador de secreções de ferida Proporcionar uma aparência estética Os materiais e métodos de bandagem dependem do tipo de lesão, da necessidade de pressão e imobilização, da necessidade de evitar pressão e da fase de cicatrização. Em geral, o material de bandagem é composto por três camadas: camada de contato com a ferida, camada secundária e, finalmente, a camada externa. Caso haja necessidade de alívio de pressão ou imobilização, o material da tala poderá ainda ser incorporado à bandagem. A camada de contato é aquela em que o material da bandagem fica, de fato, adjacente à ferida. A camada secundária ou intermediária é colocada sobre a camada de contato (primária). Por fim, a camada terciária ou externa recobre a bandagem e fica exposta ao ambiente. Feridas Abertas Contaminadas ou Infectadas Feridas abertas contaminadas ou infectadas geralmente apresentam grande quantidade de tecido necrosado e material estranho, além de drenarem grande quantidade de exsudato. A camada de contato utilizada em uma ferida aberta contaminada ou infectada deve ser composta por compressa de gaze de trama larga sem enchimento de algodão. Pode-se aplicar uma compressa de gaze seca caso a ferida apresente exsudação mínima, mas umedecida com solução salina a 0,9% ou de Ringer lactato estéril se ela evidenciar exsudação altamente viscosa. Pode-se aplicar pomadas tópicas (sulfadiazina de prata, pomada de clorexidina). A camada intermediária deve ser constituída por material absorvente e espesso, envolvida por uma camada externa de faixa porosa, como Elastikon® (Johnson & Johnson Medical, Arlington, Texas) ou Vetrap® (3M, St Paul, Minnesota). As bandagens deverão ser trocadas pelo menos uma vez ao dia ou com maior frequência caso haja extravasamento de exsudato pela bandagem. Para aplicar uma bandagem úmida compressiva, primeiro coloque a camada de contato sobre a ferida. Em seguida, coloque faixas de fita adesiva (esparadrapo) sobre a pata do paciente em ambos os lados, se possível, para manter a bandagem no lugar e evitar que deslize pelo membro. Enrole a camada intermediária sobre a camada de contato e fixe as pontas das fitas adesivas ao seu redor. Enrole a camada final ou terciária sobre a bandagem. Pode-se, ainda, realizar uma bandagem compressiva úmida, cuja função é a de auxiliar o desbridamento da ferida. A gaze deverá ser trocada quando estiver seca. Tecidos necrosados e debris que se aderirem à gaze serão removidos juntamente. Além disso, a bandagem úmida dilui o exsudato da ferida e aumenta sua absorção pela camada de contato da gaze. Se houver exsudação intensa da ferida, a camada de contato e a camada intermediária absorverão o exsudato, removendo-o da ferida. Por fim, pode-se aplicar medicamentos na ferida para promover o desenvolvimento de tecido de granulação saudável. Feridas Abertas em Fase de Cicatrização Cicatrização Inicial Durante o estágio inicial de cicatrização, observam-se tecido de granulação, algum exsudato e mínima epitelização. Coloque uma bandagem não aderente com medicamento antibacteriano (gaze impregnada com vaselina ou nitrofurazona) ou material absorvente (esponja porosa, hidrogel ou curativo hidrocoloide) em contato com a ferida para minimizar o dano à camada de tecido de granulação. Em seguida, coloque uma camada intermediária absorvente, e depois uma camada externa porosa, assim como anteriormente descrito. O tecido de granulação pode crescer através da malha da gaze ou aderir às esponjas porosas e ser rompido no momento da remoção da bandagem. Podem ocorrer hemorragia e rompimento da camada de tecido de granulação. Cicatrização Final Em uma fase posterior da cicatrização, o tecido de granulação pode exsudar fluido sanguinolento e apresentar algum grau de epitelização. Para isso, é necessário utilizar uma bandagem não aderente. A camada de contato deve ser composta por compressa não aderente, esponja porosa, hidrogel ou substância hidrocoloide. A camada intermediária e a camada externa devem conter material absorvente e fita adesiva porosa, respectivamente. A utilização de compressa não aderente na camada de contato poderá possibilitar que o exsudato viscoso da ferida não seja bem absorvido, mas isso pode ser vantajoso e facilitar a epitelização, desde que não haja complicações. É possível ocorrer infecção, tecido de granulação exuberante ou aderência de material absorvente à ferida, retardando a cicatrização. Cicatrização Úmida A cicatrização úmida é um novo conceito de manejo de ferida, no qual se permite que a exsudação da ferida fique em contato com a lesão. Na ausência de infecção, uma ferida úmida cicatriza mais rapidamente e apresenta atividade enzimática como resultado da desagregação de macrófagos e células polimorfonucleares. Ocorre degradação enzimática ou “desbridamento autolítico” da ferida. A umidificação das feridas tende a promover um melhor grau de quimiotaxia aos neutrófilos e macrófagos e fagocitose bacteriana do que o uso de bandagens úmidas compressivas. Entretanto, uma provável complicação e desvantagem da cicatrização úmida é o desenvolvimento de colonização bacteriana, foliculite e traumatismos das margens da ferida que podem ocorrer devido à contínua umidade do ambiente. Utilize soluções do tipo surfactantes (Constant-Clens®, Kendall, Mansfield, Massachussetts) para a limpeza e desbridamento inicial da ferida. Para um desbridamento enzimático rápido, utilize compressas oclusivas com propriedades bactericidas para auxiliar na cicatrização da ferida. Em feridas necrosadas úmidas, faça bandagens com uma compressa pré-umedecida em salina hipertônica (Curasalt® [Kendall], salina 20%) para limpar e desbridar as feridas. A salina hipertônica desidrata o tecido necrótico e as bactérias, desbridando a ferida infectada. Remova e troque a bandagem de salina hipertônica a cada 24 a 48 horas. Em seguida, coloque gaze impregnada com agentes antibacterianos (Kerliz AMD® [Kendall]) sobre a ferida para atuar como uma barreira à colonização bacteriana. Caso a ferida esteja inicialmente seca ou apresente exsudação mínima e não mostre contaminação evidente ou infecção, aplique gel amorfo de água, glicerina e um polímero (Curafil® [Kendall]) sobre ela, a fim de promover uma cicatrização úmida e proteolítica. Interrompa o uso de gel umedecido, como o Curafil®, quando a ferida seca se tornar úmida. Por fim, o estágio final da cicatrização úmida ajuda a promover o desenvolvimento de uma camada de tecido de granulação saudável. Utilize compressas com alginato de cálcio (Curasorb® ou Curasorb Zn® com zinco [Kendall]) em feridas não infectadas e com uma quantidade moderada de secreção. O gel de alginato promove o desenvolvimento rápido da camada de tecido de granulação e epitelização. Pode-se também colocar compressas porosas em feridas exsudativas após a formação da camada de tecido de granulação saudável. Troque as compressas porosas em intervalos de, no mínimo, 4 a 7 dias. Bandagens com Açúcar O uso de açúcar granulado vem tornando-se popular para o tratamento de feridas abertas que estejam contaminadas e/ou infectadas. O açúcar tem propriedades antibacterianas e auxilia a promover a cicatrização e o desenvolvimento da camada de granulação. As bandagens com açúcar são uma excelente escolha para cortes ou feridas por avulsão de pele, queimaduras e úlceras de decúbito, particularmente aquelas infectadas por Pseudomonasspp., Escherichia coli ou Streptococos spp. A colocação de bandagens com açúcar é semelhante à da bandagem úmida compressiva, deve-se lavar inteiramente a ferida com água filtrada ou solução salina estéril. Em seguida, realize o desbridamento dos tecidos desvitalizados. Na sequência, coloca-se uma camada espessa (aproximadamente 1 cm de espessura) de açúcar granulado sobre o leito da ferida, envolvendo-a com gazes estéreis e material de bandagem algodoada, e finalizando com a camada externa. Inicialmente, as compressas da ferida devem ser trocadas no mínimo duas vezes ao dia, em seguida uma vez ao dia e, finalmente, uma vez a cada 1 ou 2 dias à medida que a camada de tecido de granulação se torne mais saudável. A retirada do açúcar pode ocorrer quando houver a presença de tecido de granulação saudável. Feridas Fechadas Feridas sem Secreção Nas feridas sem secreção, tal como uma laceração que tenha sido tratada cirurgicamente, pode-se colocar uma simples bandagem com uma camada de contato não adesiva (p. ex., Telfa pad® [Kendall]), uma camada intermediária de material absorvente e uma camada externa elástica e porosa (Elastikon®, Vetrap®) para evitar contaminação durante a cicatrização. A almofada não aderente não se fixa à ferida e não causa desconforto ao paciente. Como geralmente há mínima secreção na ferida, a função da camada intermediária é mais protetora do que absorvente. Qualquer pequena quantidade será absorvida pela camada intermediária da bandagem. Em qualquer bandagem, é importante colocar uma faixa de fita adesiva ou esparadrapo diretamente no membro do paciente e, depois, circundar essa bandagem para evitar que ela deslize. Coloque frouxamente as camadas intermediária e externa ao redor do membro, iniciando pela parte distal e subindo para a parte proximal com uma cobertura de algodão entre elas. Este método evita a pressão excessiva capaz de prejudicar a drenagem venosa. Sempre que possível, deixe o terceiro e quarto dígitos do membro pélvico expostos para permitir exame diário da bandagem e verificar se há obstrução da circulação sanguínea. Caso haja compressão, os dígitos se tornarão edemaciados e separados. Geralmente, quando colocadas e mantidas adequadamente (p. ex., a bandagem não fica molhada), essas bandagens apresentam poucas complicações. Feridas Abertas Feridas com Secreção Em alguns casos, é necessário colocar um dreno de Penrose para permitir a drenagem da ferida. Pode sair uma quantidade considerável de secreção pelo dreno e tecidos moles subjacentes. A função da bandagem é auxiliar a diminuir o espaço morto criado pela própria ferida, absorver o fluido que drena dela e que contaminará o ambiente, mas também evitar a contaminação da ferida por material do ambiente externo. Quando a bandagem for removida, o clínico poderá avaliar a quantidade e tipo de material drenado pela ferida e determinar quando o dreno poderá ser removido. Quando um dreno é colocado sobre uma ferida com secreção, deve-se utilizar na camada intermediária da bandagem uma compressa não aderente disponível comercialmente e colocar diversas camadas de gaze absorvente diretamente sobre o dreno na sua extremidade distal. Cubra as camadas de gaze com uma camada grossa de compressa intermediária absorvente para drenar o fluido que sair da ferida. Caso a gaze e as camadas intermediárias não sejam grossas e absorventes o suficiente, haverá risco de o fluido drenado atingir a camada externa da bandagem e constituir uma fonte de contaminação por bactérias oriundas do ambiente externo, contaminando a ferida. Feridas que Requerem Bandagem Compressiva Hemorragia Discreta Algumas feridas, como lacerações, apresentam sangramento ou hemorragia discreta que requer uma bandagem imediata até que o tratamento definitivo possa ser instituído. Para criar uma bandagem compressiva, coloque uma compressa não aderente em contato direto com a ferida, seguida por uma camada grossa de material absorvente, envolvida por uma camada de material de bandagem elástica, como por exemplo, Elastikon® ou Vetrap®. Diferente da bandagem para ferida fechada, a camada externa deverá ser realizada com alguma tensão e até mesmo com pressão ao redor do membro, iniciando pela extremidade distal (dígitos) e subindo para a parte proximal. A bandagem compressiva serve para controlar a hemorragia, mas não deve ser deixada por períodos longos. As bandagens compressivas mantidas por muito tempo podem prejudicar a função de nervos e ocasionar necrose e perda tecidual. Sendo assim, as bandagens compressivas devem ser utilizadas apenas no hospital, para avaliação constante do paciente. Caso haja hemorragia por meio da bandagem, coloque outra camada sobre a primeira até que a ferida pare de sangrar definitivamente, pois a remoção da primeira camada romperá qualquer coágulo que tenha sido formado e acarretará hemorragia adicional. Imobilização Inicial de Fraturas As fraturas requerem imobilização imediata para evitar o desconforto do paciente e traumatismo adicional dos tecidos moles do membro afetado. Assim como em todas as bandagens, deve-se aplicar uma camada de contato, uma camada intermediária e uma camada externa. Inicie a bandagem por uma camada de contato adequada ao tipo de ferida. A camada intermediária deverá ser de material absorvente e grosso, seguida da camada externa de material poroso e elástico. Por exemplo, em uma fratura exposta distal de rádio e ulna, pode-se colocar um curativo do tipo Telfa® não aderente. Em seguida, uma camada grossa de gaze acolchoada por algodão. Finalmente, uma camada de faixa porosa e elástica protegerá a ferida. Deve-se exercer alguma pressão entre uma camada e outra da bandagem para que fique fixa no membro. Deixe o terceiro e quarto dígitos do membro pélvico expostos para que seja possível monitorar alterações da circulação sanguínea, que podem sugerir que a bandagem está muito apertada e necessita ser trocada. Caso a bandagem seja utilizada em uma fratura exposta, poderá haver prejuízo da drenagem e aumento do risco de infecção da ferida. As bandagens colocadas para imobilização inicial da fratura são temporárias até que seja possível corrigi-las definitivamente. Tecido de Granulação Exuberante As feridas com tecido de granulação exuberante devem ser tratadas com cuidado para não haver prejuízo do processo de cicatrização, mas sim reduzir a formação exagerada de tecido que prejudicaria a epitelização. Para fazer uma bandagem em uma ferida com um tecido de granulação exuberante, coloque uma pomada com corticosteroide, que auxiliará a controlar o crescimento exuberante do tecido de granulação, e, em seguida, uma camada de contato não aderente e uma camada de material elástico para aplicar alguma pressão na ferida. Deixe o terceiro e quarto dígitos expostos para que a circulação possa ser monitorada diversas vezes ao dia. As bandagens muito apertadas devem ser removidas imediatamente para evitar danos ao nervos e prejuízo à vascularização, necrose e perdas teciduais. Como a drenagem da ferida pode estar prejudicada, há risco de infecção. Remoção do Espaço Morto Feridas abertas ou aquelas que apresentam espaços entre a camada de tecido subcutâneo e fáscia devem receber bandagens compressivas para ajudar a reduzir o espaço morto e evitar a formação de seroma. Um exemplo de ferida que pode requerer este tipo de bandagem é aquela resultante da remoção de um lipoma infiltrativo na região lateral ou ventral do tórax. Seja cuidadoso ao colocar bandagem compressiva ao redor do tórax ou região cervical, pois bandagens aplicadas de forma muito apertada podem prejudicar a ventilação. Para colocar uma bandagem compressiva e remover espaço morto, coloque uma camada de contato não aderente sobre a ferida. Geralmente um dreno é necessário para absorver qualquer exsudato ou secreção da ferida. Coloque diversas camadas de material absorvente sobre o local para drenar qualquer secreção adicional. Fixe com cuidado, mas firmemente, uma camada de material de algodão elástico como a atadura de crepe sobre oespaço morto, para causar pressão suficiente para controlar a drenagem. Introduza pelo menos dois dedos entre o tórax do animal e a bandagem para assegurar que esta não esteja muito apertada. Finalize com uma camada de material elástico como Vetrap® ou Elastikon®. A bandagem poderá ser realizada após a recuperação pós- anestésica do animal que seja capaz de se levantar, pois há a tendência de que a bandagem fique muito apertada quando realizada com o animal que está se recuperando da anestesia e ainda deitado. Alívio das Úlceras de Pressão Diversas feridas requerem uma bandagem que cause alívio da pressão no contato com o meio externo. Úlceras (escaras) que possam necessitar dessa bandagem para cicatrizar incluem úlceras de decúbito, úlceras por bandagem compressiva ou engessadas, área propícia à ulceração (como o íleo ou ísquio de pacientes em decúbito ou caquéticos) e locais de reparação cirúrgica de áreas ulceradas. Há duas formas básicas de bandagens de alívio de úlcera de pressão: bandagem modificada em forma de rosca e bandagem em forma de rosca. Bandagem Modificada em Forma de Rosca Uma bandagem modificada em forma de rosca deve ser colocada sobre proeminências ósseas nos membros, quando há sinais iniciais de pressão (p. ex., hiperemia), para evitar lesão adicional. Para colocar uma bandagem modificada em forma de rosca, são necessários os seguintes materiais: atadura gessada, material de revestimento grosso e adesivo poroso ou fita elástica larga. Este tipo de bandagem se torna compressivo após duas ou três trocas de bandagem, por isso deverá ser trocado frequentemente. Para colocar uma bandagem modificada em forma de rosca, siga os seguintes passos (Fig. 1-1): FIGURA 1-1 Bandagem modificada em forma de rosca. A, Diversas camadas de atadura gessada são dobradas juntas formando uma almofada. B, A almofada é dobrada sobre si mesma e é feito um corte no centro. C, O corte é transformado em um orifício. D, O orifício é colocado sobre a proeminência óssea. (De Swaim SF, Henderson RA: Small animal wound management, ed 2, Media, Pa, 1997, Williams & Wilkins.) 1. Faça diversas camadas de atadura gessada e dobre-as todas juntas, criando uma almofada de aproximadamente 8 cm. 2. Dobre a almofada sobre si mesma e faça um corte no centro. Transforme esse corte em um orifício. 3. Coloque a almofada de atadura de gesso sobre a ferida de forma que o orifício fique sobre a proeminência óssea. 4. Envolva o material da bandagem sobre a almofada. 5. Coloque faixa elástica sobre o material de revestimento, com sobreposição de fita de esparadrapo para fixá-lo no local. 6. Outra alternativa seria fixar, por meio de sutura, a pele ao redor das proeminências ósseas em alguns pontos da citada bandagem, para mantê-la fixa. Bandagem em Forma de Rosca Assim como a bandagem modificada em forma de rosca, uma bandagem em forma de rosca é utilizada sobre as proeminências ósseas para ajudar a evitar a pressão excessiva sobre a área da parte distal dos membros pélvicos, como os maléolos laterais, quando é indicado mais acolchoamento do que aquele propiciado pela bandagem modificada em forma de rosca. Para fazer uma bandagem em forma de rosca, utilize uma toalha de mão ou um material de bandagem de malha comprida (malha tubular), fita adesiva, gaze de algodão, material de bandagem elástica ou sutura com fita umbilical. À medida que a bandagem se tornar compressiva ou suja, troque-a para evitar danos adicionais aos tecidos subjacentes. Para criar uma bandagem em forma de rosca, siga os seguintes passos (Figs. 1-2 e 1-3): FIGURA 1-2 Bandagem em forma de rosca feita com material de malha de bandagem sobre o olécrano. FIGURA 1-3 O tarso. 1. Enrole uma toalha de mão de forma apertada e passe uma fita ao seu redor para criar um círculo com um orifício no centro. Alternativamente, pegue uma bandagem de malha comprida e enrole-a conforme faria com uma meia, criando um círculo acolchoado com um orifício no centro. Certifique-se de que o orifício central seja grande o suficiente para ser encaixado ao redor da lesão cirúrgica ou da úlcera. 2. Coloque o orifício sobre a úlcera ou local da ferida cirúrgica. 3. Mantenha o orifício no local com faixas e algodão e, em seguida, bandagem elástica. Como alternativa, aplique pontos de sutura frouxos na pele adjacente e ao redor da ferida. Mantenha a rosca no local com fita umbilical fixada pelos pontos de sutura e recubra a bandagem. Caso seja necessário, a lesão do centro pode ser inspecionada e tratada através do orifício central. Feridas que Requerem Imobilização Talas com Fixador Externo É necessário utilizar uma tala com fixador externo quando fraturas ou luxações estão associadas a feridas abertas. Em alguns casos, pode ser difícil fazer uma bandagem sob as barras do fixador externo de forma que permaneça em contato com a ferida. Para criar acolchoamento ao redor dos pinos, encaixe almofadas de espumas de borrachas para que fiquem firmes logo abaixo e ao redor dos pinos. Envolva o fixador externo com camadas de bandagem para reduzir o risco de contaminação do ferimento por micro-organismos do ambiente e absorver o fluido que drena da ferida (Figs. 1-4 a 1-6). FIGURA 1-4 Almofadas de espuma de borracha são colocadas sob os pinos do fixador externo e ao redor deles, adjacentes à ferida. FIGURA 1-5 Bandagem de atadura gessada é colocado ao redor do fixador externo para manter a espuma de borracha e a camada de contato firmes no local. FIGURA 1-6 O Vetrap® é colocado sobre a camada intermediária para evitar contaminação pelo ambiente externo. Talas em Forma de Taça ou Concha Indica-se uma tala em forma de taça ao se fazer uma bandagem acolchoada para reduzir a pressão na extremidade do membro e evitar a extensão da extremidade quando o cão ou gato apoiar a pata. Caso os dígitos estiquem, a extensão do membro poderá retardar ou prejudicar a cicatrização da ferida. A tala tem a função de manter a pata na posição mais vertical para que o paciente apoie o peso na ponta dos dígitos e não diretamente no coxim durante o processo de cicatrização. Para fazer uma tala em forma de taça ou concha, siga os seguintes passos (Figs. 1-7 a 1- 11): FIGURA 1-7 Faixas de esparadrapo sobre a pele do membro. FIGURA 1-8 Camada de algodão absorvente. FIGURA 1-9 Fixação da fita de esparadrapo sobre a camada intermediária para evitar que a bandagem deslize. FIGURA 1-10 Coloque a camada de material de gesso da bandagem em forma de concha no local, nos aspectos cranial e caudal do membro. FIGURA 1-11 Fixe a bandagem em forma de concha com Kling® e, em seguida, com uma camada de Vetrap®. 1. Coloque uma camada de contato não aderente diretamente sobre a ferida. 2. Coloque fitas de esparadrapo em contato com a pele do cão, para que as pontas sejam fixadas na camada intermediária, evitando que a bandagem deslize. 3. Posicione uma camada intermediária absorvente bem espessa sobre a camada de contato para que a bandagem fique bem acolchoada. Puxe as pontas de esparadrapo de forma que sejam fixadas na camada intermediária. 4. Coloque um pedaço de bandagem previamente enrolado no comprimento adequado, como aquele utilizado para imobilizar a pata, adjacente à parte posterior do membro, na altura do carpo ou do tarso. No caso de tala em concha, coloque uma camada de atadura gessada nos aspectos cranial e caudal da pata, ajustando-a ao local. 5. Pegue uma atadura gessada e embeba-a em água morna após enrolar no comprimento adequado. Torça a almofada, ajustando-a no aspecto caudal (ou cranial e caudal, no caso de tala em concha) do membro pélvico e na pata. 6. Fixe o material de gesso no local com uma camada de atadura de algodão elástica do tipo Kling®. 7. Fixe a bandagem no local com uma camada justa de Elastikon® ou Vetrap®. Talas Laterais ou Caudais Talas curtas ou longas feitas de material de gesso podem ser incorporadas a uma bandagem acolchoada macia para propiciar sustentação extra ao membro acima e abaixo do local da fratura. Para que uma tala caudal ou lateral sejaeficaz, deve-se incluir, no mínimo, uma articulação acima do local de fratura para evitar o efeito de apoio do peso e ruptura ou dano adicional às estruturas de tecido mole subjacentes. Uma tala curta lateral ou caudal é utilizada em fraturas e luxações distais de metacarpo, metatarso, carpo e tarso. Para colocar uma tala curta lateral ou caudal, realize os seguintes passos: 1. Coloque uma camada de contato caso haja uma ferida na área. 2. Coloque fitas de esparadrapo na extremidade distal do membro para posteriormente serem fixadas à camada intermediária da bandagem e evitar o deslize distal da bandagem. 3. Coloque camadas de algodão enroladas desde os dígitos até o nível médio da tíbia e fíbula ou nível médio de rádio e ulna. Coloque tensão uniforme nas camadas com alguma sobreposição de cada camada consecutiva, da parte distal para a parte proximal do membro. 4. Fixe a tala curta lateral ou caudal e a ajuste à extremidade distal na altura dos dígitos e na parte proximal no nível médio da tíbia e fíbula ou médio do rádio e ulna. 5. Fixe a tala lateral ou caudal ao membro com outra camada externa de atadura de algodão elástico (Kling®). 6. Cubra toda a bandagem e a tala com uma camada externa de Vetrap® ou Elastikon®. Certifique-se de que o terceiro e o quarto dígitos permaneçam visíveis, permitindo a avaliação diária da circulação. Talas longas laterais ou caudais são utilizadas para imobilizar fraturas da tíbia ou fíbula e rádio ou ulna. As talas são aplicadas de forma semelhante às talas curtas, mas se estendem às partes mais proximais na altura das regiões axilares e inguinais para promover imobilização acima do local da fratura. Talas em Espiga A tala em espiga é utilizada para imobilizar o úmero e as articulações do cotovelo e ombro no caso de luxação ou fratura. Para colocar uma tala em espiga, realize os seguintes passos: 1. Coloque uma camada de contato caso haja presença de alguma ferida. 2. Coloque fitas de esparadrapo na parte distal do membro de forma que as pontas possam ser fixadas à camada intermediária e evitar o deslizamento distal da bandagem. 3. Enrole camadas de atadura de gaze sobrepondo-as, elevando o membro, da parte distal para a proximal. 4. Inclua a bandagem da pata em uma camada de bandagem de algodão ao redor do tórax. 5. Fixe o algodão no local com uma camada firme de material de algodão elástico, como Kling®. Certifique-se de que a bandagem não esteja muito apertada para não prejudicar a respiração. 6. Coloque o material da tala no aspecto lateral do membro desde o nível dos dígitos, envolvendo todo o membro e se estendendo até a parte proximal sobre a escápula e linha média dorsal. 7. Após enrolar a tala no comprimento e largura adequados, umedeça-a com água morna para permitir que se ajuste e endureça. 8. Posicione adequadamente a tala e a ajuste à bandagem no corpo do paciente. 9. Fixe a tala no local com outra camada de atadura de algodão elástico tipo Kling®. 10. Enrole toda a bandagem no local com uma camada de material de bandagem externa, como Elastikon® ou Vetrap®. Leitura Adicional Mathews KA, Binnington AG: Wound management using sugar, Compend Contin Educ Pract Vet 24:41–50, 2002. Piermattei DL, Flo GL: Brinker, Piermattei, and Flo’s handbook of small animal orthopedics and fracture management, ed 4, St Louis, 2006, Elsevier. Terapia Com Hemocomponentes Coleta e Administração A terapia com hemocomponentes envolve a separação do sangue em componentes celular e líquido e infusão de componentes específicos de acordo com a necessidade de cada paciente. A terapia com hemocomponentes é o principal manejo inicial e continuado em emergências hematológicas e pode propiciar suporte ao paciente criticamente enfermo até que a causa primária tenha sido controlada. A separação do sangue em hemácias, plasma, crioprecipitado e produtos ricos em plaquetas permite uma reposição mais específica dos déficits do animal, diminuindo os riscos a reações transfusionais e promovendo o uso mais eficiente do doador de sangue. O Quadro 1-4 lista as indicações para transfusão de hemácias, plasma rico em plaquetas, plasma resfriado ou fresco resfriado e crioprecipitado. Quadro 1-4 Abordagem terapêutica com hemocomponentes Reposição de Hemácias • Hematócrito que diminui rapidamente para menos de 20% no cão e menos de 12% a 15% no gato • Perda aguda de mais de 30% do volume sanguíneo (30 mL/kg no cão, 20 mL/kg no gato) • Sinais clínicos de letargia, colapso, hipotensão, taquicardia, taquipneia (perda sanguínea aguda ou crônica) • Hemorragia contínua • Resposta insatisfatória à administração de cristaloides e coloides Reposição de Plaquetas • Hemorragia com risco de morte causada por trombocitopenia ou trombocitopatia • Necessidade de intervenção cirúrgica em um paciente com trombocitopenia ou trombocitopatia grave Reposição de Plasma • Hemorragia com risco de morte com atividade diminuída de fatores de coagulação • Inflamação grave (pancreatite, síndrome da resposta inflamatória sistêmica) • Reposição de antitrombina (coagulação intravascular disseminada, enteropatia ou nefropatia com perda de proteína) • Necessidade de cirurgia em um paciente com atividade diminuída de fatores de coagulação • Hipoproteinemia grave – para reposição parcial de albumina, globulina e fatores de coagulação Tipos Sanguíneos e Antigenicidade No animal sadio, os receptores de membrana celular na superfície das hemácias servem ao propósito de autorreconhecimento versus não reconhecimento de substâncias. A presença ou ausência de diversas cadeias de glicoproteínas e glicolipídios na superfície da hemácia auxilia na definição dos grupos ou “tipos” sanguíneos dentro de uma mesma espécie. Em cães, seis principais antígenos eritrocitários caninos de superfície celular (DEA – dog erythrocyte antigen, 1.1, 1.2, 3, 4, 5 e 7) foram identificados. Cães que são negativos ao DEA 1.1, 1.2 e 7, mas positivos ao DEA 1.4 são conhecidos como “doadores universais” e possuem sangue tipo DEA 1.1 negativo. Os cães DEA 1.1 e 1.2 são os antígenos eritrocitários mais imunogênicos conhecidos na medicina transfusional canina. A transfusão de sangue DEA 1.1 ou 1.2 positivo para um cão DEA 1.1 e 1.2 negativo pode resultar em hemólise imediata ou em uma reação de hipersensibilidade do tipo tardia. Além disso, a viabilidade de células DEA 1.1 e 1.2 positivas em um receptor DEA 1.1 e 1.2 negativo é de curta duração, anulando, por fim, o objetivo de aumentar a oferta de oxigênio a longo prazo no animal receptor. Assim como em cães, os grupos sanguíneos felinos são definidos por cadeias específicas de carboidratos ligados a lipídios (glicolipídios) e proteínas (glicoproteínas) na superfície eritrocitária. Três tipos sanguíneos (A, B e AB) foram identificados nos gatos. O tipo A é o tipo sanguíneo mais comum. O tipo B é relativamente incomum e ocorre em gatos das raças abissínia persa, devon rex e british shorthair, mas pode ser encontrado também em gatos domésticos de pelo curto e longo. O tipo A é completamente dominante sobre o tipo B de acordo com a genética mendeliana simples. O tipo AB é um tipo sanguíneo raro que tem sido pouco encontrado em gatos domésticos de pelo curto; gatos das raças birman, abissínia, somali, British shorthair e Scottish fold; e ainda gatos da raça norwegian forest. Diferente dos cães, os gatos possuem anticorpos naturais contra outros tipos sanguíneos felinos. A presença de autoanticorpos naturais é de fundamental importância, tornando necessário tipificar o sangue com ou sem reação cruzada antes de qualquer transfusão em felinos, pois reações transfusionais hemolíticas podem ser potencialmente fatais, mesmo sem sensibilização ou transfusão sanguínea prévia. O gato tipo B possui grandes quantidades de anticorpos anti-A, principalmente da subclasse de imunoglobulinas M (IgM). Ocorrerá destruição do sangue tipo A em um gato do tipo B após minutos a horas da transfusão, sendo que um volume de até mesmo 1 mL de sangue incompatível poderá causar uma reação fatal. Tipicamente, gatos dotipo A possuem anticorpos anti-B fracos dos subtipos IgG e IgM. A transfusão do sangue tipo B em um gato tipo A resultará em uma reação com sinais clínicos leves e redução acentuada da meia-vida das hemácias para apenas 2 dias. Como gatos do tipo AB possuem ambos os receptores na superfície celular, eles não apresentam aloanticorpos naturais; a transfusão de sangue tipo A em um gato tipo AB pode ser realizada com segurança caso não haja disponibilidade de um doador tipo AB. A meia-vida de hemácias de uma transfusão espécie-específica em um gato é de, aproximadamente, 33 dias. Programas de Doadores de Sangue Cada clínica deve avaliar a relação custo-benefício e a necessidade de hemoderivados e sua quantidade total na rotina ao decidir qual a melhor opção para atender às necessidades da equipe, dos proprietários e dos pacientes. Hospitais com casuística elevada, que requerem grande quantidade de hemoderivados em intervalos regulares, podem escolher manter uma população de cães e gatos doadores. A manutenção de uma população confinada de doadores pode ser impraticável em razão dos custos com alimentação e alojamento dos animais e uso de gaiolas que poderiam ser utilizadas por outros pacientes. Além disso, os cuidados com os animais – incluindo-se avaliação clínica frequente, testes sanguíneos (hemograma, perfis bioquímicos e testes para dirofilariose) e tarefas diárias – são intensamente laboriosos para o veterinário e funcionários. Outras opções incluem a utilização de animais de funcionários ou de proprietários como doadores. Esta prática elimina o custo de alojamento dos doadores na clínica e o trabalho necessário às tarefas diárias. Os animais doadores podem ser utilizados conforme a necessidade da clínica, ou as coletas para a reposição do estoque de hemoderivados podem ser agendadas. A última opção, que pode ser mais prática para clínicas com baixa demanda de hemoderivados, é a compra destes de bancos de sangue comerciais. Os doadores de sangue devem ser submetidos a exames físicos anuais e testes de triagem gerais, incluindo-se hemograma, perfil bioquímico sérico e teste sorológico para dirofilariose oculta. Os doadores caninos ainda devem ser examinados inicialmente para doença de Lyme, Babesia, febre maculosa das Montanhas Rochosas (Rickettsia rickettsii), Ehrlichia e Brucella. O ideal é que os cães tenham mais de 27 kg e entre 1 e 8 anos de idade, apresentem hematócrito (Ht) de pelo menos 40% e nunca tenham recebido transfusão. Caso necessário, um cão saudável poderá doar, com segurança, 10 a 20 mL/kg de sangue total a cada 3 ou 4 semanas. Preferencialmente, os gatos doadores de sangue devem pesar mais que 3,5 kg, ter entre 1 e 8 anos de idade e nunca ter recebido transfusão. Além disso, antes das doações, os gatos deverão ser submetidos a testes para detecção do vírus da leucemia felina (FeLV – feline leucemia virus), vírus da imunodeficiência felina (FIV – feline immunodeficiency virus), Mycoplasma haemofelis e peritonite infecciosa felina (FIP – feline infectious peritonitis) e devem apresentar um Ht tolerável, de, no mínimo, 30%, embora seja recomendável 35% e 40%. Coleta e Manipulação do Sangue Qualquer coleta de sangue deve ser realizada da maneira menos estressante possível para o animal doador. Deve-se realizar exame físico e determinar o Ht (ou VG – volume globular) e a proteína total antes de qualquer doação. O sangue pode ser obtido da veia jugular ou artéria femoral. No entanto, devido ao risco de laceração da artéria femoral com hemorragia subsequente ou desenvolvimento de síndrome compartimental, recomenda-se a utilização da veia jugular como o local principal para coleta de sangue em cães e gatos. Após preparação adequada (tricotomia e antissepsia) da região, coloque o cão em decúbito lateral, esternal, ou ainda sentado no chão. O sangue poderá ser coletado em um sistema aberto ou fechado. Os sistemas de coleta fechados são preferíveis, pois diminuem a probabilidade de contaminação do hemoderivado, facilitando seu processamento. Pode-se utilizar um sistema aberto como alternativa, caso o sangue seja transfundido em até 24 horas. Insira uma agulha de calibre 16 na veia jugular com uma pinça hemostática no tubo de coleta para impedir a entrada de ar. Em seguida, remova a pinça, deixando o sangue fluir para dentro da bolsa por gravidade. As bolsas de cães devem ter aproximadamente 450 mL, que correspondem a 450 g na balança após ser zerada, pois 1 mL pesa aproximadamente 1 g. Embora um volume de 450 mL possa ser obtido de um doador de sangue a cada 21 dias, é preferível que as doações sejam menos frequentes, a cada 3 meses. A coleta de sangue em gatos geralmente requer o uso de sedação, a menos que um acesso venoso seja implantado cirurgicamente. Todos os gatos doadores devem ser submetidos a exame físico e determinação de Ht e proteína total antes da sedação e subsequente doação de sangue. Após tricotomia e antissepsia da região de veia jugular, insira um cateter do tipo borboleta de calibre 19 na veia jugular e aspire o sangue. O cateter borboleta deverá ser conectado a uma torneira de três vias e uma seringa de 60 mL, contendo 7 mL do anticoagulante CPDA-1 (citrato, fosfato, dextrose e adenina). Na maioria dos casos, obtém-se um volume total de 53 mL de sangue. O sangue pode ser transfundido imediatamente ou colocado em uma bolsa de coleta estéril pequena contendo 0,14 mL de anticoagulante CPDA-1 por mililitro de sangue total. Não se deve colher mais que 11 a 15 mL/kg de sangue do gato doador em uma mesma sessão (Quadro 1-5). Quadro 1-5 Materiais necessários para coleta e processamento de sangue Cães Bolsa de coleta de sangue Clipes seladores Alicates de ordenha ou tubo a vácuo para coleta de sangue (opcional) Pinça hemostática Extrator de plasma Gatos Seringa de 60 mL Torneira de três vias 7 mL de solução de CPDA-1 Cetamina Diazepam Processamento e Armazenamento de Hemoderivados A instituição da terapia com hemocomponentes vem tornando-se cada vez mais rotineira na medicina e veterinária. A terapia com hemoderivados envolve a separação do sangue total em seus componentes celular e plasmático e, em seguida, a administração de derivados específicos em um receptor, baseando-se na necessidade individual de cada paciente. A preparação de plasma fresco congelado, refrigerado, crioprecipitado e pobre em crioprecipitado requer o uso de uma centrífuga refrigerada. Atualmente, estão disponíveis no mercado modelos de chão e bancada, embora o custo e a manutenção possam inviabilizar a compra. Após a coleta, retire todo o sangue restante no equipo, selando-o (seladora térmica ou climpes de alumínio) em seguida. A bolsa deverá ser identificada de forma clara com o nome do doador, tipo sanguíneo do doador, data da coleta e validade e Ht do doador no momento da coleta. Caso o sangue não seja utilizado imediatamente ou processado para obtenção de plasma rico em plaquetas, a bolsa deverá ser refrigerada. A centrifugação da bolsa a 4.000 a 5.000 rotações por minuto por 5 minutos irá separar as hemácias dos componentes plasmáticos. O uso de extrator de plasma facilitará o fluxo do plasma para bolsas-satélite para armazenamento adicional. O plasma fresco congelado, o crioprecipitado e o plasma pobre em crioprecipitado devem ser congelados em até 8 horas após a coleta para assegurar a preservação de fatores de coagulação lábeis, incluindo-se fatores V e VIII e fator de von Willebrand (FvW). O plasma fresco congelado possui meia-vida de 1 ano após a data da coleta. Antes de congelar, coloque uma fita elástica ao redor da bolsa para dobrá-la durante o processo de congelamento. Esta fita elástica é removida após o congelamento da bolsa. Em casos de queda de energia inadvertida ou que não for notada a dobra na bolsa fornecerá uma medida de controle de qualidade, indicando a ocorrência de um descongelamento inadvertido. O descongelamento parcial e a centrifugação diferencial do plasma fresco refrigerado permitem a preparação de crioprecipitado e plasma pobre em crioprecipitado.Após 1 ano, ou caso a bolsa de plasma tenha sido preparada depois de 8 horas da coleta, considera-se plasma congelado. O plasma congelado contém todo o tipo de fatores de coagulação dependentes de vitamina K (II, VII, IX, X), imunoglobulinas e albumina, mas é relativamente desprovido de fatores de coagulação lábeis. O plasma congelado possui meia-vida de 5 anos após a data de coleta ou 4 anos após o vencimento da bolsa de plasma fresco congelado. As hemácias devem ser armazenadas em temperatura de 1°C a 6 °C imediatamente após a coleta e processamento. As hemácias e o plasma congelado ainda podem ser preparados na ausência de uma centrífuga refrigerada por meio de armazenamento da bolsa de sangue total em posição vertical em temperatura de 1°C a 6 °C em um refrigerador por 12 a 24 horas até que haja separação das hemácias. O plasma pode ser acondicionado em uma segunda bolsa de estocagem e congelado, obtendo-se plasma congelado. Devido ao atraso no processamento, este plasma resultante não apresenta fatores de coagulação lábeis. O plasma fresco congelado, plasma congelado, crioprecipitado e plasma crioprecipitado devem ser armazenados em temperatura de até -20° C até o seu uso (Tabela 1-1). Os produtos devem ser descongelados em água morna até que não se observam mais cristais. Nenhum derivado de plasma deve ser aquecido a mais de 37° C, pois pode haver desnaturação proteica. Tabela 1-1 Armazenamento de Hemoderivados ACD, Ácido citrato dextrose; SA-1, solução aditiva; CPDA-1, citrato fosfato dextrose adenina; VPT, viabilidade pós- transfusão; FvW, fator de von Willebrand; ST, sangue total. Teste de Reação Cruzada Antes da administração de hemoderivados, verifique o tipo sanguíneo dos doadores e dos receptores e realize um teste de reação cruzada de acordo com a disponibilidade de tempo. No mínimo, deve-se realizar a tipagem sanguínea antes da transfusão. Cartões de tipagem sanguínea rápida estão disponíveis para o uso em cães e gatos Rapid Vet-H®, apesar de apresentarem problemas e da impossibilidade de utilização em animais com autoaglutinação. Contudo, já existem no mercado métodos confiáveis que podem ser utilizados em animais com autoaglutinação, como Plasvacc USA®, Templeton, California. Um teste de reação cruzada simula a resposta in vitro do receptor ao plasma e antígenos eritrocitários do doador. O teste de reação cruzada é realizado para diminuir o risco de reações transfusionais em pacientes que foram previamente sensibilizados ou que apresentem aloanticorpos naturais, ou ainda no caso de isoeritrólise neonatal. Outra indicação para realização do teste de reação cruzada inclui a diminuição do risco de sensibilização do paciente caso sejam necessárias outras transfusões. A reação cruzada pode ser classificada como maior e menor. A reação cruzada maior mistura as hemácias do doador com o plasma do receptor e, assim, testa se o receptor possui anticorpos contra as hemácias do doador. Uma reação cruzada menor mistura o plasma do doador com as hemácias do receptor, testando a ocorrência pouco provável de que o soro do doador contenha anticorpos direcionados contra as hemácias do receptor. O Quadro 1-6 fornece uma descrição passo a passo mais completa dos testes de reação cruzada maior e menor. Os testes de reação cruzada não avaliam outras causas de reações transfusionais de hipersensibilidade imediata, incluindo leucócitos e plaquetas. Quadro 1-6 Protocolo para realização de reação cruzada maior e menor Materiais Necessários Solução fisiológica a 0,9% em almotolia Tubos de teste de 3 mL Pipetas de Pasteur Centrífuga Lâmpada de visualização de aglutinação Passos 1. Identifique os tubos de teste da seguinte forma: CR: Controle do receptor HR: Hemácias do receptor PR: Plasma do receptor SD: Sangue total do doador* CD: Controle do doador* SR: Sangue total do receptor* PD: Plasma do doador* Ma: Reação cruzada maior* Me: Reação cruzada menor* 2. Para realização do teste de reação cruzada, obtenha uma amostra de sangue refrigerada do banco de sangue para cada doador a ser testado ou utilize o sangue do doador contido em um tubo com EDTA. Certifique-se de que os tubos estejam corretamente identificados. 3. Colete 2 mL de sangue do receptor e coloque em um tubo com EDTA. Centrifugue o sangue por 5 minutos. 4. Extraia o sangue do tubo do doador. Centrifugue o sangue por 5 minutos. Utilize uma pipeta diferente para cada transferência, pois pode haver contaminação cruzada. 5. Pipete o plasma do doador e as células do receptor e coloque em tubos identificados PD e PR, respectivamente. 6. Coloque 125 mcL de células do doador e do receptor em tubos identificados SD e HR, respectivamente. 7. Adicione 2,5 mL de solução de cloreto de sódio a 0,9% da almotolia em cada tubo de hemácias, utilizando um pouco de pressão para promover a mistura das células. 8. Centrifugue a suspensão de hemácias por 2 minutos. 9. Descarte o sobrenadante e ressuspenda as hemácias com cloreto de sódio a 0,9% dos tubos de lavagem. 10. Repita os passos 8 e 9 até um total de três lavagens. 11. Coloque duas gotas da suspensão de hemácias do doador e duas gotas do plasma do receptor em um tubo identificado Ma (esta é a reação cruzada maior). 12. Coloque duas gotas do plasma do doador e duas gotas da suspensão de hemácias do receptor em um tubo identificado Me (esta é a reação cruzada menor). 13. Prepare tubos-controle colocando duas gotas do plasma do doador com duas gotas da suspensão de hemácias do doador (este é o controle do doador); e coloque duas gotas do plasma do receptor com duas gotas da suspensão de hemácias do receptor (este é o controle do receptor). 14. Incube as reações maior e menor e os tubos-controle à temperatura ambiente por 15 minutos. 15. Centrifugue todos os tubos por 1 minuto. 16. Leia os tubos utilizando o visualizador de aglutinação. 17. Procure por aglutinação e/ou hemólise. 18. Classifique a aglutinação de acordo com a seguinte escala de classificação: 4 + :Um agregado sólido de células 3 + :Diversos agregados grandes de células 2 + :Agregações celulares de tamanho médio com um fundo claro 1 + :Hemólise, sem agregação celular NEG: Negativo para hemólise; negativo para aglutinação de hemácias EDTA, ácido etilenodiaminotetracético. *Indica que deve ser realizado para cada doador a ser testado. Indicações para a Terapia Transfusional Há diversas indicações para a realização de transfusões de sangue total e de hemoderivados. Avalie cuidadosamente o paciente que possa necessitar de uma transfusão, bem como o tipo de terapia transfusional adequado a ele. Uma vez decidido qual hemoderivado necessita ser transfundido, calcule o volume a ser administrado. Tenha cuidado ao administrar grandes volumes em pacientes pequenos ou naqueles com insuficiência cardíaca, pois há risco de ocorrência de sobrecarga de volume. Havendo a necessidade de hemácias, deve-se realizar, no mínimo, uma tipagem sanguínea antes da administração do sangue de tipo específico. O melhor método é a realização de reação cruzada para cada bolsa administrada para reduzir o risco de reação transfusional ou sensibilização do paciente a antígenos eritrocitários exógenos. Em pacientes com hemorragia grave, quando não há tempo suficiente nem mesmo para realizar um teste de tipagem sanguínea, pode-se administrar o sangue de um doador universal (DEA 1.1, 1.2 e 1.7 negativos). Um conceito equívoco frequente é o de que se deve administrar sangue total ou concentrado de hemácias quando o Ht do paciente diminui para determinado valor. Não existe um número absoluto de “gatilho transfusional”, realize a transfusão sempre que um paciente apresentar sinais clínicos de anemia, incluindo letargia, anorexia, fraqueza, taquicardia e/ou taquipneia (Tabela 1-2). As indicações para transfusão de sangue total fresco incluem desordens de hemostasia e coagulopatias, como coagulação intravascular disseminada (CID), doença de von Willebrand e hemofilia. Sangue total fresco e plasma rico em plaquetas também podem ser administrados em casos de trombocitopeniaou trombocitopatia graves. Sangue total e concentrado de hemácias podem ser administrados em pacientes com anemia. Indica-se uma transfusão caso o Ht diminua para menos de 10% ou caso uma hemorragia aguda diminua o Ht para menos de 20% no cão ou menos de 12 a 15% no gato. Considere a administração do plasma fresco congelado ou crioprecipitado em casos de coagulopatia, inclusive na doença de von Willebrand, intoxicação por rodenticidas com depleção ativa de fatores de coagulação dependentes de vitamina K e hemofilia ou, ainda, em casos de hipoproteinemia grave com concentrações de albumina inferior a 2 g/dL. O plasma congelado também será adequado em casos de hipoproteinemia grave, intoxicação por componentes similares à varfarina e deficiência de fator IX (hemofilia B). Tabela 1-2 Indicações para Administração de Hemoderivados Hemoderivados Indicações Sangue fresco total Coagulopatia com hemorragia ativa (CID, trombocitopenia; hemorragia aguda intensa; indisponibilidade de sangue armazenado) Sangue total armazenado Hemorragia aguda intensa ou contínua; choque hipovolêmico causado por hemorragia não responsiva à f luidoterapia convencional com cristaloide e coloide; indisponibilidade de equipamento necessário para preparar os hemoderivados Concentrado de hemácias Anemia não regenerativa; anemia hemolítica imunomediada; correção da anemia antes da cirurgia; perda sanguínea aguda ou crônica Plasma fresco congelado Depleção do fator de coagulação associada à hemorragia ativa (congênita – fator de von Willebrand, hemofilia A, hemofilia B; adquirida – antagonista de vitamina K, intoxicação por rodenticidas, CID); hipoproteinemia aguda ou crônica (queimaduras, feridas exsudativas, efusão cavitárias; perda hepática, renal ou gastrointestinal); substituição de colostro em neonatos Plasma congelado (contém fatores de coagulação estáveis) Perda aguda de plasma ou proteína; hipoproteinemia crônica; substituição de colostro em neonatos; hemofilia B e deficiência de determinados fatores de coagulação Plasma rico em plaquetas* Trombocitopenia com hemorragia ativa (trombocitopenia imunomediada, CID); função plaquetária anormal (congênita – trombastenia em bassethounds; adquirida – AINEs, outros fármacos) Crioprecipitado (concentração de fator VIII, fator de von Willebrand e fibrinogênio) Deficiências congênitas de fatores de coagulação (rotina ou antes da cirurgia); hemofilia A, hemofilia B, doença de von Willebrand, hipofibrinogenemia; deficiências adquiridas de fatores de coagulação CID, Coagulação intravascular disseminada; AINEs, anti-inflamatórios não esteroidais. *Deve ser comprado por questões logísticas, pois não se consegue obter sangue suficiente simultaneamente para fornecer uma quantidade satisfatória de plaquetas; plaquetas transfundidas possuem uma meia-vida muito curta (< 2 horas). Considerações para Administração Terapêutica de Hemocomponentes Ao se considerar o tipo de hemoderivado necessário para transfusão, deve-se responder uma série de questões para reduzir o risco de reação transfusional e de rejeição ou destruição do derivado que tenha sido transfundido. Primeiramente, é essencial o conhecimento do tipo sanguíneo do paciente. Sempre que possível, deve-se administrar hemácias do tipo sanguíneo específico. Caso um animal já tenha recebido transfusão anteriormente, o risco de reação transfusional ou rejeição aumenta devido à produção de anticorpos contra cadeias de glicoproteína da superfície das hemácias. Se o animal já tiver recebido uma transfusão, deve-se realizar o teste de reação cruzada do sangue do paciente (hemácias e plasma) com o sangue do doador (hemácias e plasma) para se certificar de que não há incompatibilidade. Em cães, caso não haja disponibilidade para realização de tipagem sanguínea e teste de reação cruzada, ou se a situação de emergência requerer a realização de transfusão antes que a tipagem sanguínea e reação cruzada possam ser realizados, deve-se administrar o sangue de um doador universal (p. ex., DEA 1.1, 1.2 e 1.7 negativos) sempre que possível. Como não há doador universal para o gato, e pelo fato de apresentarem aloanticorpos naturais, deve-se realizar a tipagem sanguínea e a reação cruzada antes de qualquer transfusão. Transfusão de Hemoderivados A Tabela 1-3 indica a dose do hemoderivados e as taxas de administração. Tabela 1-3 Dose e Taxas de Infusão de Hemoderivados TCA; Tempo de coagulação ativada; TTPA; tempo de tromboplastina parcial ativada; TP; tempo de protrombina. Transfusão de Hemácias As hemácias devem ser aquecidas lentamente a 37 °C antes de sua administração. Aquecedores de bolsa de sangue estão disponíveis para uso na medicina veterinária, proporcionando transfusão rápida sem reduzir a temperatura corporal do paciente. Os derivados de hemácias e plasma devem ser administrados utilizando-se equipos próprios para transfusão de sangue contendo um filtro interno de 170 µm para retenção de partículas. Equipos com filtros menores também podem ser utilizados quando o volume a ser administrado for muito pequeno. Sempre que possível, os hemoderivados devem ser administrados ao longo de 4 horas, de acordo com as recomendações da American Association of Blood Banks. O volume de hemocomponentes necessário para atingir o aumento específico do Ht do paciente depende muito se a transfusão for de sangue total ou de concentrado de hemácias, e, ainda, se houver hemorragia contínua ou destruição eritrocitária. Pelo fato de o Ht do concentrado de hemácias ser geralmente elevado (80% para o sangue de cães greyhound), é necessário um volume total menor quando comparado ao volume utilizado de sangue total para atingir um aumento semelhante no Ht do paciente. Em geral, 10 mL de concentrado de hemácias/kg ou 20 mL de sangue total/kg aumentam em 10% o VG do paciente. A “Regra do Um” estabelece que 1 mL por 1 lb (453,6 g) de sangue total aumentará o Ht em 1%. Caso o Ht do paciente não aumente como previsto, deve-se considerar a ocorrência de hemorragia ou destruição contínua de hemácias. A meta da transfusão de hemácias é aumentar o Ht para 25% a 30% em cães e 15% a 20% em gatos. Se um animal estiver hipovolêmico e o sangue total for administrado, o fluido será redistribuído para o compartimento extravascular em 24 horas após a transfusão. Isso resultará em um aumento secundário do Ht após 24 horas da transfusão, somado ao aumento inicial 1 a 2 horas após o término da transfusão de hemácias. Uso de Plasma Fresco Congelado O volume de plasma a ser transfundido depende muito da necessidade do paciente. Em geral, a transfusão de plasma não deve exceder 22 mL/kg durante um período de 24 horas em animais normovolêmicos. Descongele o plasma à temperatura ambiente ou coloque-o em uma embalagem plástica do tipo Ziploc® e sob água fria (não morna) até descongelar. Em seguida, administre o plasma por meio de equipo específico para transfusão sanguínea com filtro interno ou de um equipo de gotejamento-padrão com um filtro externo para transfusão sanguínea. A velocidade média de infusão de plasma em um paciente normovolêmico não deve exceder 22 mL/kg/h. Em situações de necessidade extrema, o plasma pode ser administrado na taxa de até 5 a 6 mL/kg/min. Em pacientes com insuficiência cardíaca ou outros problemas circulatórios, a taxa de infusão de plasma não deve exceder 5 mL/kg/hora. O plasma ou outros hemoderivados não devem ser misturados ou utilizados na mesma linha de infusão de fluidos contendo cálcio, incluindo solução de Ringer lactato, cloreto de cálcio ou gluconato de cálcio. O fluido mais seguro para ser misturado a qualquer hemoderivado é o cloreto de sódio a 0,9%. Administre plasma fresco congelado, plasma congelado e crioprecipitado em volume de 10 mL/kg até que se controle o sangramento ou que se elimine a causa da perda contínua de albumina. O objetivo da terapia de transfusão de plasma é aumentar a albumina até um mínimo de 2 g/dL, ou até o sangramento cessar, como nos casos de coagulopatias. Monitore o paciente para confirmar o controle
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