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1 Laís Flauzino | MEDICINA A concentração extracelular de íons cálcio é determinada pela interação da absorção intestinal de cálcio, a excreção renal e a captação/liberação óssea desse elemento pelos ossos. ABSORÇÃO E EXCREÇÃO: Ingesta diária normal de cálcio: 1000mg (1L de leite) • 35% (350mg) é absorvido pelos intestinos e enviado à corrente sanguínea – essa absorção é facilitada pela vitamina D. • 250mg são excretadas pelas fezes por meio de sulcos gastrointestinais e células epiteliais descamadas – 90% do cálcio consumido é excretado. • 10% do cálcio ingerido é filtrado nos rins. • 99% é reabsorvido pelos túbulos renais, através da ação do PTH. Quando a quantidade de cálcio iônico sérico está baixa, há aumento da reabsorção desse mineral. O aumento do cálcio sérico provoca diminuição da reabsorção. 0,1% do cálcio total do corpo encontra-se no líquido extracelular, cerca de 1% está nas células e o restante encontra-se nos ossos - podem servir como grandes reservatórios, armazenando o excesso de cálcio e liberando cálcio quando a concentração no líquido extracelular diminui. 98% do cálcio encontra-se armazenados nos ossos – a troca de cálcio ósseo com o meio extracelular atua como um mecanismo de tamponamento, para evitar quedas bruscas ou aumentos acentuados de cálcio sérico. O cálcio desempenha papel fundamental em muitos processos fisiológicos: • Contração dos músculos esqueléticos, cardíaco e lisos • Coagualação sanguínea • Transmissão de impulsos nervosos O plasma e os líquidos intersticiais mostram uma concentração normal do cálcio iônico de cerca de 2,4 mEq/ℓ, que corresponde à metade da concentração plasmática total de cálcio. Esse cálcio iônico é a forma ativa para a maioria das funções do cálcio no corpo, incluindo seu efeito sobre o coração, o sistema nervoso e a formação óssea. EFEITOS FISIOLÓGICOS DAS ALTERAÇÕES DAS [] NOS LÍQUIDOS CORPORAIS: HIPOCALCEMIA: A diminuição da concentração de cálcio no líquido extracelular causa mais excitação do sistema nervoso – devido ao aumento da permeabilidade da membrana neuronal dos íons sódio, permitindo o desencadeamento natural de potenciais de ação. A hiperexcitação nervosa desencadeia uma série de impulsos que são transmitidos para os músculos esqueléticos periféricos provocando uma contração muscular tetânica. A tetania normalmente ocorre quando a concentração sanguínea de cálcio diminui de seu nível normal de 9,4 mg/dℓ para cerca de 6 mg/dℓ, o que corresponde a apenas 35% abaixo do normal; a concentração letal costuma ser de aproximadamente 4 mg/dℓ. HIPERCALCEMIA: As células excitáveis, como os neurônios, são sensíveis a alterações das concentrações do cálcio iônico. Aumentos acima do normal provocam a depressão progressiva do SN e da atividade muscular. • Provoca depressão do SN e das atividades reflexas. • Redução do intervalo QT do coração • Constipação intestinal – devido a contratilidade deprimida das paredes musculares do TGI • Diminuição do apetite 2 Laís Flauzino | MEDICINA Esses efeitos depressores começam a aparecer quando o nível sanguíneo do cálcio se eleva acima de 12 mg/dℓ, podendo ser intensificados conforme o nível de cálcio passa de 15 mg/dℓ. Quando a concentração de cálcio ultrapassa cerca de 17 mg/dℓ no sangue, cristais de fosfato de cálcio tendem a precipitar por todo o corpo. CÁLCIO E OSSO: Os cristais de hidroxiapatita não conseguem se precipitar em tecidos normais, exceto no osso. O mecanismo indutor da deposição dos sais de cálcio no osteoide não é totalmente compreendido, mas a regulação desse processo parede depender do pirofosfato – que inibe a cristalização da hidroxiapatita e a calcificação do osso. O osteoblasto também secreta pelo menos duas outras substâncias que regulam a calcificação óssea: (1) nucleotídio pirofosfatase/fosfodiesterase 1 (NPP1), que produz pirofosfato fora das células, e (2) proteína de anquilose (ANK), que contribui para a reserva extracelular de pirofosfato, transportando-o do interior para a superfície da célula. Deficiências de NPP1 ou de ANK originam diminuição do pirofosfato extracelular e excessiva calcificação do osso, como esporões ósseos, ou mesmo calcificação de outros tecidos, como tendões e ligamentos da coluna, que ocorre em pessoas com uma forma de artropatia denominada espondilite anquilosante. Precipitação do cálcio em tecidos não ósseos sob condições anormais: Tal precipitação ocorre nas paredes arteriais na arteriosclerose, fazendo com que as artérias se tornem tubos semelhantes a ossos. Da mesma forma, os sais de cálcio frequentemente se depositam em tecidos em processo de degeneração ou nos coágulos sanguíneos antigos. Presumivelmente nesses casos, os fatores inibidores, que normalmente evitam a deposição de sais de cálcio, desaparecem dos tecidos, permitindo a precipitação. Cálcio intercambiável: Se os sais de cálcio solúveis forem injetados por via intravenosa, a concentração do cálcio iônico poderá aumentar imediatamente para níveis elevados. No entanto, dentro de 30 a 60 minutos, a concentração de íons cálcio volta ao normal. Da mesma forma, se grandes quantidades de íons cálcio forem removidas dos líquidos corporais circulantes, essa concentração de íons cálcio novamente retornará ao normal dentro de 30 minutos a cerca de 1 hora. Esses efeitos se devem, em grande parte, à presença de cálcio do tipo intercambiável na composição óssea, que sempre está em equilíbrio com íons cálcio nos líquidos extracelulares. Uma pequena porção desse cálcio intercambiável também corresponde ao cálcio encontrado em todas as células do tecido, especialmente em tipos de células permeáveis, como as do fígado e as do trato gastrointestinal. Esse cálcio intercambiável fornece um mecanismo rápido de tamponamento para manter a concentração de cálcio iônico nos líquidos extracelulares, evitando sua ascensão a níveis excessivos ou sua queda a níveis baixos, em condições transitórias de excesso ou diminuição da disponibilidade de cálcio. Deposição e reabsorção de osso: O osso é continuamente depositado pelos osteoblastos, e continuamente reabsorvido onde os osteoclastos estão ativos. O PTH controla a atividade de reabsorção óssea dos osteoclastos por meio de um mecanismo indireto - As células osteoclásticas de reabsorção óssea não apresentam receptores de PTH. Em vez disso, os osteoblastos sinalizam aos precursores de osteoclastos para que formem osteoclastos maduros. O PTH se liga a receptores nos osteoblastos adjacentes, estimulando a síntese de RANKL, que também é chamado de ligante de osteoprotegerina (OPGL). O RANKL se liga a seus receptores (RANK) nos pré-osteoclastos, diferenciando-os em osteoclastos multinucleados maduros. Os osteoclastos maduros, então, desenvolvem uma borda pregueada e liberam enzimas e ácidos que promovem a reabsorção óssea. PARATORMÔNIO: PTH é produzido pelas glândulas paratireoides e age aumentando a reabsorção de cálcio e fósforo. Atua diminuindo a excreção de cálcio pelos rins e aumentando sua absorção intestinal. Entretanto, apesar do aumento da reabsorção do fósforo, esse hormônio diminui o fósforo sérico, porque promove o aumento da excreção renal desse mineral. O aumento da concentração do cálcio é ocasionado, principalmente, por dois efeitos do PTH: (1) aumenta a absorção de cálcio e de fósforo do osso, e (2) diminui com rapidez a excreção de cálcio pelos rins. O PTH apresenta dois efeitos para mobilizar o cálcio e o fósforo no osso. Um deles corresponde à fase rápida que começa em minutos e aumenta progressivamente por várias horas. Essa fase resulta da ativação das células ósseas já existentes (principalmente os osteócitos), para promover a 3 Laís Flauzino | MEDICINA liberação de cálcio e fósforo. A segunda fase é muito mais lenta, exigindo alguns dias ou mesmo semanaspara seu desenvolvimento pleno; tal fase resulta da proliferação dos osteoclastos, seguida pela reabsorção osteoclástica muito acentuada do próprio osso, não apenas da liberação de sais de fosfato de cálcio do osso. (osteólise e ativação dos osteoclastos) O excesso de atividade da glândula paratireoide causa a liberação rápida de sais de cálcio dos ossos, com a consequente hipercalcemia no líquido extracelular; por outro lado, a hipofunção das glândulas paratireoides causa hipocalcemia, frequentemente resultando em tetania. O PTH também aumenta a reabsorção tubular renal do cálcio, ao mesmo tempo que diminui a reabsorção de fósforo (ver Capítulo 30). Além disso, aumenta a reabsorção de íons magnésio e hidrogênio, enquanto reduz a reabsorção de íons sódio, potássio e aminoácidos, da mesma maneira que influencia o fósforo. O aumento da reabsorção de cálcio ocorre principalmente na alça ascendente de Henle e nos túbulos distais. Não fosse o efeito do PTH sobre os rins, para aumentar a reabsorção de cálcio, a perda contínua de cálcio na urina acabaria em sua consequente depleção no líquido extracelular e nos ossos. O PTH eleva muito a absorção de cálcio e de fósforo dos intestinos, aumentando a formação nos rins de 1,25-di-hidroxicolecalciferol a partir da vitamina D. É estimulado pela concentração de cálcio sérico. Até mesmo a mais insignificante redução da concentração de íons cálcio no líquido extracelular faz com que as glândulas paratireoides aumentem sua secreção dentro de minutos; em caso de persistência do declínio da concentração de cálcio, as glândulas passarão por hipertrofia, atingindo um tamanho até cinco vezes superior ou mais. Por outro lado, as condições que aumentam a concentração de cálcio iônico acima do normal provocam a diminuição da atividade e do volume das glândulas paratireoides. Tais condições incluem (1) quantidades excessivas de cálcio na dieta, (2) teor elevado de vitamina D na dieta e (3) reabsorção óssea causada por fatores diferentes do PTH (p. ex., desuso dos ossos). Se há hipercalemia, ocorre a diminuição na produção do paratormônio pelas glândulas. Se há hipocalemia, as glândulas paratireoides atuam secretando mais PTH. A produção excessiva de PTH é denominada hiperparatireoidismo. VITAMINA D: A vitamina D é inicialmente formada na pele: as radiações solares produzem colecalciferol, que é levada ao fígado para ser convertida em 25- hidroxicolecalciferol. Após ser produzida, a 25-hidroxicolecalciferol é levada ao rim para ser convertida em calcitrol (1,25 di- hidroxicolecalciferol). Sendo ela a forma mais ativa da vitamina D. Por isso, sem os rins para realizar essa conversão, a vitamina D perde quase toda a sua eficácia. Para mais, o PTH apresenta ação fundamental na ativação renal para conversão do calcitriol. Assim, a vitamina D atua aumentando a absorção intestinal de cálcio, bem como a de fósforo. E mais, diminuindo a excreção renal de cálcio e fósforo, e estimulando a mineralização óssea. A concentração plasmática de 1,25-di- hidroxicolecalciferol é inversamente influenciada pela concentração de cálcio no plasma. Existem duas razões para esse efeito. • Primeiro, o cálcio iônico tem um leve efeito de impedir a conversão de 25-hidroxicolecalciferol em 1,25-di-hidroxicolecalciferol. • Segundo, e ainda mais importante, a secreção do PTH é muito suprimida quando a concentração plasmática do cálcio iônico sobe acima de 9 a 10 mg/100 mℓ. Portanto, em concentrações de cálcio abaixo desse nível, o PTH promove a conversão de 25- hidroxicolecalciferol em 1,25-di-hidroxicolecalciferol nos rins. Em concentrações mais elevadas do cálcio ao suprimir o PTH, o 25-hidroxicolecalciferol é convertido em um composto diferente – o 24,25-di- hidroxicolecalciferol – que tem efeito quase nulo de vitamina D. Quando a concentração plasmática do cálcio já for muito alta, a formação de 1,25-di-hidroxicolecalciferol é muito deprimida. A ausência de 1,25-di- 4 Laís Flauzino | MEDICINA hidroxicolecalciferol, por sua vez, diminui a absorção de cálcio pelos intestinos, ossos e túbulos renais, levando, assim, a queda do nível de cálcio iônico para seu nível normal. AÇÕES DA VITAMINA D: A forma ativa da vitamina D, o 1,25-di- hidroxicolecalciferol (calcitriol), apresenta diversos efeitos nos intestinos, rins e ossos, como o aumento da absorção de cálcio e fósforo para o líquido extracelular e a contribuição com a regulação dessas substâncias por feedback. O 1,25-di-hidroxicolecalciferol atua como um hormônio para promover a absorção intestinal de cálcio, aumentando principalmente, ao longo de um período de cerca de 2 dias, a formação de calbindina, uma proteína ligante do cálcio, nas células epiteliais intestinais. Essa proteína atua na borda em escova dessas células para transportar o cálcio para o citoplasma celular. O cálcio, então, move-se através da membrana basolateral da célula por meio de difusão facilitada. A absorção de cálcio é diretamente proporcional à quantidade dessa proteína ligante. Além disso, essa proteína permanece nas células por várias semanas, após a remoção do 1,25-di- hidroxicolecalciferol do corpo, causando um efeito prolongado de absorção do cálcio. Outros efeitos do 1,25-di-hidroxicolecalciferol que podem desempenhar um papel na promoção da absorção de cálcio incluem a formação de (1) trifosfatase de adenosina estimulada pelo cálcio na borda em escova das células epiteliais; e (2) fosfatase alcalina nas células epiteliais. A vitamina D também aumenta a reabsorção de cálcio e fósforo pelas células epiteliais dos túbulos renais, tendendo, assim, a diminuir a excreção de tais substâncias na urina. No entanto, esse efeito é fraco e, provavelmente, sem grande importância para a regulação da concentração dessas substâncias no líquido extracelular. A vitamina D desempenha importantes papéis na reabsorção e deposição ósseas. A administração de quantidades extremas de vitamina D causa a reabsorção óssea. Na ausência dessa vitamina, o efeito do PTH na indução da reabsorção óssea é bastante reduzido ou mesmo impedido. O mecanismo dessa ação da vitamina D não é totalmente compreendido, mas acredita-se que ele seja o resultado do efeito do 1,25-di- hidroxicolecalciferol de aumentar o transporte de cálcio através das membranas celulares. A vitamina D em quantidades menores promove a calcificação óssea. Uma das maneiras de promover essa calcificação é aumentar a absorção de cálcio e fósforo pelos intestinos. No entanto, mesmo na ausência de tal aumento, a vitamina D é capaz de intensificar a mineralização óssea. CALCITONINA: Hormônio peptídico secretado pela tireoide. Tende a diminuir a concentração plasmática de cálcio – tem efeitos opostos aos do PTH. O principal estímulo para a secreção de calcitonina é a elevação da concentração de cálcio iônico no líquido extracelular. Em contraste, a secreção do PTH é estimulada pela diminuição da concentração de cálcio. Em alguns animais jovens, a calcitonina diminui a concentração sanguínea do cálcio iônico com rapidez, começando dentro de minutos após a injeção da calcitonina, de pelo menos duas formas. 1. O efeito imediato consiste na redução das atividades absortivas dos osteoclastos e possivelmente do efeito osteolítico da membrana osteocítica em todo o osso, desviando o equilíbrio em favor da deposição de cálcio nos sais de cálcio. Esse efeito é particularmente significativo em animais jovens, por causa do rápido intercâmbio de cálcio absorvido e depositado. 2. O segundo e mais prolongado efeito da calcitonina baseia-se na diminuição da formação de novos osteoclastos. Além disso, como a reabsorção osteoclástica do osso conduz secundariamente à atividade osteoblástica, a diminuição da quantidade de osteoclastos é seguida por diminuição do número de osteoblastos. Portanto, o resultado efetivo, durante umlongo período, é a redução da atividade osteoclástica e osteoblástica, e, consequentemente, o efeito pouco prolongado na concentração plasmática do cálcio iônico. Ou seja, o efeito no cálcio plasmático é principalmente transitório, durando de algumas horas a alguns dias, no máximo. A calcitonina tem efeitos secundários menores no uso do cálcio nos túbulos renais e nos intestinos. Mais uma vez, os efeitos são opostos aos do PTH, mas parecem ser de pouca importância, sendo raramente considerados. Dois motivos explicam o fraco efeito da calcitonina no cálcio plasmático. Primeiro, qualquer redução inicial da concentração de íons cálcio causada pela calcitonina leva a um poderoso estímulo da secreção de PTH em poucas horas, o que acaba quase que anulando o efeito da calcitonina. Quando a glândula tireoide é removida, e a calcitonina não é mais secretada, a concentração sanguínea do cálcio iônico não tem uma alteração mensurável a longo prazo, o que novamente demonstra o efeito predominante do sistema de controle do PTH. 5 Laís Flauzino | MEDICINA Segundo, as taxas diárias de absorção e deposição do cálcio no ser humano adulto são pequenas, e, mesmo após o retardo da velocidade de absorção pela calcitonina, isso se reflete como um efeito muito leve na concentração plasmática de íons cálcio. O efeito da calcitonina em crianças é muito maior, porque a remodelagem óssea ocorre mais rapidamente em crianças, com absorção e deposição do cálcio de até 5 gramas ou mais por dia – o equivalente a 5 a 10 vezes a quantidade total desse elemento em todo o líquido extracelular. https://www.eumedicoresidente.com.br/post/fisiolog ia-pth-calcio-vitamina-d Hall, John, E. e Michael E. Hall. Guyton & Hall - Tratado de Fisiologia Médica. Disponível em: Minha Biblioteca, (14th edição). Grupo GEN, 2021. https://www.eumedicoresidente.com.br/post/fisiologia-pth-calcio-vitamina-d https://www.eumedicoresidente.com.br/post/fisiologia-pth-calcio-vitamina-d