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MapeamentoDeAçõesEPráticasAntirracistas_Silva_2022

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Prévia do material em texto

UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE
CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS
DEPARTAMENTO DE CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO
CURSO DE GRADUAÇÃO EM BIBLIOTECONOMIA
MONIKE DE CARVALHO E SILVA
MAPEAMENTO DE AÇÕES E PRÁTICAS ANTIRRACISTAS EM BIBLIOTECAS
ESCOLARES DO RIO GRANDE DO NORTE
NATAL-RN
2022
MONIKE DE CARVALHO E SILVA
MAPEAMENTO DE AÇÕES E PRÁTICAS ANTIRRACISTAS EM BIBLIOTECAS
ESCOLARES DO RIO GRANDE DO NORTE.
Monografia apresentada ao Departamento de Ciência da
Informação, da Universidade Federal do Rio Grande do
Norte, como requisito parcial para obtenção do grau de
Bacharel em Biblioteconomia.
Orientadora: Prof. Me. Maria da Conceição Davi
NATAL-RN
2022
Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN
Sistema de Bibliotecas - SISBI
Catalogação de Publicação na Fonte. UFRN - Biblioteca Setorial do Centro Ciências Sociais Aplicadas - CCSA
Silva, Monike de Carvalho e.
Mapeamento de ações e práticas antirracistas em bibliotecas
escolares do Rio Grande do Norte / Monike de Carvalho e Silva. -
2022.
57f.: il.
Monografia (Graduação em Biblioteconomia) - Universidade
Federal do Rio Grande do Norte, Centro de Ciências Sociais
Aplicadas, Departamento de Ciências da Informação. Natal, RN,
2022.
Orientador: Prof. Me. Maria da Conceição Davi.
1. Biblioteca escolar - Monografia. 2. Relações
étnico-raciais - Monografia. 3. Lei 10.639/03 - Monografia. 4.
Lei 11.645/08 - Monografia. I. Davi, Maria da Conceição. II.
Universidade Federal do Rio Grande do Norte. III. Título.
RN/UF/Biblioteca CCSA CDU 027.8
Elaborado por Eliane Leal Duarte - CRB-15/355
MAPEAMENTO DE AÇÕES E PRÁTICAS ANTIRRACISTAS EM BIBLIOTECAS
ESCOLARES DO RIO GRANDE DO NORTE.
Monografia apresentada ao Departamento de Ciência da
Informação, da Universidade Federal do Rio Grande do
Norte, como requisito parcial para obtenção do grau de
Bacharel em Biblioteconomia.
Orientadora: Prof. Me. Maria da Conceição Davi
MONOGRAFIA APROVADA EM ____/____/2022.
BANCA EXAMINADORA
____________________________________________
Prof. Me. Maria da Conceição Davi
Orientadora
_____________________________________________
Prof. Me. Arthur Ferreira Campos (UFRN)
_____________________________________________
Prof. Me. Wagner Oliveira de Medeiros (UFRN)
AGRADECIMENTOS
Quero agradecer primeiramente à minha família, em especial à minha mãe, Maria, que
me apoia em todos os meus sonhos e acredita em mim, mesmo quando nem eu acreditei.
Agradeço à minha irmã, Mona, que me apoiou durante toda minha jornada de graduação com
seus conselhos e que sempre torce por mim.
Agradeço aos meus gatinhos que amo tanto, quarta, berlin e bobô, e aos que já se
foram, açúcar e bambina.
Agradeço aos amigos que fiz no curso, o companheirismo e as risadas foram
essenciais para chegarmos até aqui, jamais os esquecerei. A todos os professores do curso de
biblioteconomia da UFRN agradeço pela dedicação e amor com que nos ensinam.
Agradeço à minha orientadora Maria da Conceição Davi, a nossa querida Nina,
obrigada pela paciência, dedicação e pela confiança em mim.
RESUMO
A biblioteca escolar é elemento importante da composição das instituições de ensino, sua
missão é promover serviços e materiais que gerem aprendizado aos alunos e dar apoio aos
planos pedagógicos dos professores. A biblioteca escolar deve estar inserida no projeto
político-pedagógico da escola para que as discussões sobre as relações étnico-raciais possam
ocorrer dentro da biblioteca combatendo o racismo e disseminando conhecimento sobre os
grupos étnicos do Brasil. Assim, o objetivo geral da pesquisa é identificar as práticas
pedagógicas de combate ao racismo idealizadas ou implementadas por bibliotecários nas
bibliotecas escolares de Natal-RN, e os objetivos específicos são: a) Discorrer sobre as
relações entre a biblioteca escolar e a educação antirracista na educação de crianças e
adolescentes; b) Verificar a integração das Leis 10.639/03 e 11.645/08 com as atividades das
bibliotecas escolares do RN; e c) Identificar e discutir as ações culturais e práticas
antirracistas que são aplicadas dentro das bibliotecas escolares. Apresenta contexto histórico
da construção do racismo e as nuances que existem no Brasil, bem como o desenvolvimento e
as lutas dos movimentos negros, grupos militantes que exigem reparações aos negros
brasileiros, pelo histórico da escravidão e pela herança deixada no pós-abolição, que
defendem a educação antirracista dentro das instituições como meio de combater e erradicar o
racismo estrutural que existe no Brasil. Para determinar as ações e práticas antirracistas em
bibliotecas escolares em Natal-RN, duas escolas de ensino fundamental, uma particular e uma
municipal, foram selecionadas. As responsáveis pelas respectivas bibliotecas aceitaram ser
entrevistadas e suas respostas foram analisadas a partir das Leis, 10.639/03 e 11.645/08, que
determinam o ensino da História e Cultura Afro-brasileira e Indígena no currículo nacional, e
da Lei 12.244/10 que dispõe sobre a universalização das bibliotecas escolares. Por fim,
concluímos que a pesquisa contribui para a disseminação do tema das relações étnico-raciais
no contexto das bibliotecas escolares e da importância do profissional bibliotecário.
Palavras- chave: Biblioteca escolar; relações étnico-raciais; Lei 10.639/03; Lei 11.645/08;
racismo.
ABSTRACT
The school library is an important element in the composition of educational institutions, its
mission is to promote services and materials that generate learning for students and support
the pedagogical plans of teachers. The school library must be part of the school's
political-pedagogical project so that discussions on ethnic-racial relations can take place
within the library, fighting racism and disseminating knowledge about the ethnic groups in
Brazil. Thus, the general objective of the research is to identify the pedagogical practices to
combat racism idealized or implemented by librarians in school libraries in Natal-RN, and the
specific objectives are: a) To discuss the relationship between the school library and
anti-racist education in education of children and adolescents; b) Verify the integration of
Laws 10.639/03 and 11.645/08 with the activities of the RN school libraries; and c) Identify
and discuss the cultural actions and anti-racist practices that are applied within school
libraries. It presents the historical context of the creation of racism and the nuances that exist
in Brazil, as well as the development and struggles of black movements, militant groups that
demand reparations to Brazilian blacks, for the history of slavery and for the legacy left in the
post-abolition, which defend anti-racist education within institutions as a means of combating
and eradicating the structural racism that exists in Brazil. To determine the anti-racist actions
and practices in school libraries in Natal-RN, two elementary schools in the initial and final
years, one private and one municipal, were selected. Those responsible for the respective
libraries agreed to be interviewed and their answers were analyzed based on the Laws,
10.639/03 and 11.645/08, which determine the teaching of Afro-Brazilian and Indigenous
History and Culture in the national curriculum, and the Law 12.244/10 that provides for the
universalization of school libraries. Finally, we conclude that the research contributes to the
dissemination of the theme of ethnic-racial relations in the context of school libraries and the
importance of the professional librarian.
Keywords: school library; ethnic-racial relations; Law 10.639/03; Law 11.645/08; racism.
LISTA DE ILUSTRAÇÕES E QUADROS
Quadro 1 - Grau de escolaridade . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 41
Quadro 2 - Quantitativo de recursos humanos. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 41
Quadro 3 - Abordagem étnico-racial. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 42
Quadro 4 - Implementação da 10.639/2003 e 11.645/2008. . . . . . . . . . .. . . 43
Quadro 5 - Situações de racismo na escola. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 44
Quadro 6 - Ensino das relações étnico- raciais. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 46
Quadro 7 - Atividades, projetos, eventos e práticas antirracista . . . . . . . . . . 47
Quadro 8 - Datas importantes no contexto das relações étnico raciais. . . . . . 48
Quadro 9 - Resposta dos estudantes. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 49
Quadro 10 - Bibliografia antirracista . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 50
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
RN Rio Grande do Norte
BE Biblioteca Escolar
IFLA International Federation of Library Associations and Institutions
LDB Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
MNU Movimento Negro Unificado (MNU)
MUCDR Movimento Unificado Contra a Discriminação Racial
CNE Conselho Nacional de Educação
CECAN Centro de Cultura e Arte Negra
ABREVIDA Associação Afro-Brasileira de Educação Cultural e Preservação da
Vida
NEN Núcleo de Estudos do Negro
UERJ Universidade Estadual do Rio de Janeiro
UNB Universidade de Brasília
MEC Ministério da Educação
ONU Organização das Nações Unidas
UNESCO Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura
SEPPIR Secretaria Especial de Políticas de Promoção de Igualdade Racial
GEMAA Grupo de Estudos Multidisciplinares da Ação Afirmativa
SME Secretaria Municipal de Educação
UERN Universidade Estadual do Rio Grande do Norte
EJA Ensino de Jovens e Adultos
JENAT Jornada de Educação das Unidades de Ensino de Natal
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 11
1.1 OBJETIVO GERAL. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 13
1.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 13
1.3 JUSTIFICATIVA. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 14
2 METODOLOGIA. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 15
2.1 CARACTERIZAÇÃO DA PESQUISA. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 15
2.2 CAMPO DE PESQUISA. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 16
3 CONTEXTUALIZANDO O RACISMO NO BRASIL. . . . . . . . . . . 18
4 EDUCAÇÃO ANTIRRACISTA. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 28
4.1 LEI Nº 10.639/03 E LEI Nº 11.645/08 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 32
5 A IMPORTÂNCIA DAS RELAÇÕES ÉTINCO-RACIAIS NA
BIBLIOTECA ESCOLAR. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
37
6 AÇÕES CULTURAIS E PRÁTICAS ANTIRRACISTAS NAS
BIBLIOTECAS ESCOLARES DO RIO GRANDE DO NORTE. . 40
7 CONSIDERAÇÕES FINAIS . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 52
REFERÊNCIAS. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 54
APÊNDICE A - PERGUNTAS DA ENTREVISTA. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 57
11
1 INTRODUÇÃO
A desigualdade racial no Brasil por muito tempo foi, e ainda é hoje por uma parcela da
população, posta em dúvida com argumentos de que a única desigualdade que seria observada
no país seria de classe e não de raça, pois no brasil não existiria racismo. Essa ideia é
estabelecida como verdade no imaginário de muitos brasileiros, pois é o que se costumava
aprender nas aulas e nos livros de história, quando se estudava sobre escravidão africana,
abolição e imigrantes europeus no brasil, até pelo menos início do século XXI.
No Brasil, as bases teóricas da educação são direcionadas para a epistemologia
colonial, que reforça a ideia de monocultura, ou seja, que os únicos povos com cultura
milenar, com produção intelectual e científica, invenções tecnológicas, protagonismo
histórico, e religião e tradições adequadas, eram os europeus e seus descendentes na América,
o que se mostra como uma educação violenta e desumana em um país intercultural como o
Brasil.
Durante muitas décadas o racismo estrutural e institucionalizado marginaliza os corpos
negros e indígenas no Brasil, a cidadania é usurpada e o genocídio e epistemicídio ocorrem
sob o olhar da democracia, das periferias das cidades às Terras Indígenas desprotegidas no
interior do país. O racismo pode se manifestar de diversas formas, uma delas é o apagamento
das culturas, uma arma poderosa usada no período colonial e também pós-colonial para
destruir nações. Para Sueli Carneiro (2005, p. 96),
o epistemicídio é, para além da anulação e desqualificação do conhecimento dos
povos subjugados, um processo persistente de produção da indigência cultural: pela
negação ao acesso a educação, sobretudo de qualidade; pela produção da
inferiorização intelectual; pelos diferentes mecanismos de deslegitimação do negro
como portador e produtor de conhecimento e de rebaixamento da capacidade
cognitiva pela carência material e/ou pelo comprometimento da autoestima pelos
processos de discriminação correntes no processo educativo. Isto porque não é
possível desqualificar as formas de conhecimento dos povos dominados sem
desqualificá-los também, individual e coletivamente, como sujeitos cognoscentes. E,
ao fazê-lo, destitui-lhe a razão, a condição para alcançar o conhecimento “legítimo”
ou legitimado. Por isso o epistemicídio fere de morte a racionalidade do subjugado ou
a sequestra, mutila a capacidade de aprender etc.
Foi através das lutas, protestos e demandas dos movimentos negros, durante todo o
século XX, que medidas puderam ser tomadas para fomentar um sistema educacional que
realmente propicie uma educação antirracista e que possa trabalhar as relações étnico-raciais e
representar as etnias não-brancas e não-ocidentais existentes no brasil de forma digna. Dentro
12
da instituição escolar, a biblioteca tem seu protagonismo social no ensino-aprendizagem em
conjunto com os professores, bem como na disseminação do conhecimento, incentivo à leitura
e contribuição positiva para as relações étnico-raciais, quando está devidamente apoiada e
inserida no projeto político-pedagógico da instituição. De acordo com o Manifesto da IFLA
(International Federation of Library Association and Institutions) para a Biblioteca Escolar
(BE) (1999, p. 1),
A biblioteca escolar promove serviços de apoio à aprendizagem e livros aos
membros da comunidade escolar, oferecendo-lhes a possibilidade de se
tornarem pensadores críticos e efetivos usuários da informação, em todos os
formatos e meios. As bibliotecas escolares ligam-se às mais extensas redes
de bibliotecas e de informação, em observância aos princípios do Manifesto
UNESCO para Biblioteca Pública.
A Lei 12.244/2010 sobre a universalização das bibliotecas, determina a
obrigatoriedade da biblioteca escolar em todas as escolas do Brasil, e que seja administrada
por um profissional bibliotecário, com a data limite de 10 anos para a adaptação nacional.
Porém sabemos que não é o que acontece na prática, pois a profissão de bibliotecário é
desvalorizada e a população muitas vezes não entende a importância das bibliotecas no
desenvolvimento educacional de uma sociedade.
Assim, tem-se as Leis 10.639/03 e 11.645/08, as duas alteram a Lei 9.394/96 que
estabelece as Diretrizes e Bases da Educação Nacional, adicionando a obrigatoriedade do
ensino de História e Cultura da Afro-brasileira e Indígena no currículo nacional e determina,
também, a data oficial do dia 20 de novembro como Dia da Consciência Negra. Através das
Diretrizes Curriculares para ensino das Relações Étnico-Raciais a biblioteca é mencionada
como local que o ensino das relações raciais também deve ocorrer. Desse modo, assim como
os professores, os bibliotecários devem, também, ter conhecimentos sobre as Leis e
capacidade para administrar essas relações e combater o racismo.
Logo, a partir da perspectiva de o bibliotecário combater o racismo dentro da
biblioteca escolar, surge a curiosidade de identificar seexistem práticas pedagógicas que
combatam o racismo, idealizadas ou implementadas por bibliotecários através da biblioteca
escolar no estado do Rio Grande do Norte, especificamente na cidade de Natal.
Assim, este trabalho está estruturado em 7 seções, primeiro a introdução, em seguida,
na seção 2, é apresentada a metodologia, a caracterização e o campo de pesquisa. Na seção 3 é
13
contextualizado o racismo no Brasil através de breve resgate histórico, bem como na seção 4 é
apresentado a educação antirracista e os caminhos percorridos pelos ativistas dos movimentos
negros até conseguir assegurar o direito das ações afirmativas para os negros. Em seguida, na
seção 5 é dissertado sobre a importância das relações étnico-raciais na biblioteca, e na seção 6
temos a análise comparativa das respostas das entrevistas. Por fim, as considerações finais do
trabalho são expostas na seção 7.
1.1. OBJETIVO GERAL
Identificar as práticas pedagógicas de combate ao racismo idealizadas ou
implementadas por bibliotecários nas bibliotecas escolares de Natal-RN.
1.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS
● Discorrer sobre as relações entre a biblioteca escolar e a educação antirracista na
educação de crianças e adolescentes;
● Verificar a integração das leis 10.639/03 e 11.645/08 com as atividades das bibliotecas
escolares do RN;
● Identificar e discutir as ações culturais e práticas antirracistas que são aplicadas dentro
das bibliotecas escolares.
Assim, a preocupação sobre a conscientização do combate às desigualdades raciais na
sociedade, a começar na infância com as relações na escola, e com o protagonismo da
biblioteca escolar na luta antirracista, são os objetivos norteadores desta pesquisa.
14
1.3 JUSTIFICATIVA
O tema das relações étnico-raciais é atual e necessário, com o aumento da
desinformação, do negacionismo e desconfiança nas ciências, bem como radicalização das
crianças e adolescentes que tem se observado no Brasil nos últimos anos, abre uma questão de
preocupação com a situação do racismo no Brasil. É preciso pensar de que modo as práticas
do dia a dia nas escolas podem combater o racismo nas instituições, e nas relações dos
estudantes nos anos iniciais, e como a biblioteca escolar e o bibliotecário podem contribuir
para erradicar as desigualdades raciais e o racismo no Brasil.
Entendemos que a biblioteca escolar é um local de transformação social que pode
contribuir no combate ao racismo com práticas tais como, apresentações, eventos, projetos,
cursos, clubes, grupos de leitura, etc. Durans (2018, p. 13) indica,
Os conflitos e a discriminação são fatores latentes e vigentes na escola, e não se
limitam apenas às relações interpessoais. Nos diversos materiais didáticos
pedagógicos, tais como, jornais, revistas e principalmente no livro didático que é
bastante usado em sala de aula, percebe-se que a visão eurocêntrica é um fator
determinante, pois a cultura do branco (europeu) é retratada de maneira positiva em
detrimento da cultura afro. No livro didático, o negro não é visto como guerreiro,
líder e sim como escravo sem raízes e sem cultura. logo o próprio livro didático
reforça o processo discriminatório no cotidiano escolar.
A pesquisa contribui para a disseminação do tema das relações étnico-raciais no
contexto das bibliotecas escolares, e da importância do profissional bibliotecário atuando em
seu cargo, no contexto da cidade do Natal no Rio Grande do Norte, e sobre o cumprimento
das Leis sobre o ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Indígena, e da universalização
das bibliotecas escolares, bem como sobre a importância da luta antirracista dentro das
instituições.
A motivação com a abordagem do tema das relações étnico-raciais através da
biblioteca escolar surge do histórico pessoal da autora com o racismo sofrido na escola por ser
negra, e com a preocupação de como experiências do tipo poderiam ser abordadas através de
práticas que os estudantes pudessem engajar ativamente pelo combate ao racismo.
15
2 METODOLOGIA
A escolha do método de investigação é de grande importância quando se pretende
iniciar uma pesquisa científica, é a fase do trabalho que irá nortear o caminho a ser tomado de
modo a organizar o conhecimento e fazer com o que a pesquisa mantenha seu caráter
científico. “Para que um conhecimento possa ser considerado científico, torna-se necessário
identificar as operações mentais e técnicas que possibilitam a sua verificação. Ou, em outras
palavras, determinar o método que possibilitou chegar a esse conhecimento.” (GIL, 2008).
Assim, para pôr em prática o processo de investigação sobre as questões levantadas na
problematização da pesquisa, bem como atender aos objetivos do trabalho, é necessário
definir a metodologia científica e as técnicas adequadas para que a coleta e análise dos dados
de pesquisa tenham credibilidade e valor científico.
2.1 CARACTERIZAÇÃO DA PESQUISA
A pesquisa se caracteriza como exploratória pois objetiva identificar quais são as
práticas antirracistas adotadas dentro de bibliotecas escolares da cidade de Natal. Desse modo,
o método científico usado é o indutivo, e a pesquisa tem uma abordagem qualitativa, do tipo
exploratória quanto aos objetivos. Os procedimentos de investigação escolhidos foram,
método histórico, levantamento bibliográfico, entrevista estruturada e estudo de caso
comparado.
O método indutivo foi o escolhido pois os dados usados foram coletados das respostas
dos bibliotecários das Escolas Municipais e Privadas escolhidas para a pesquisa, que
aceitaram responder à entrevista e a partir desses dados específicos é possível inferir uma
conclusão ampla sobre a situação das bibliotecas escolares de Natal. A problematização da
proposta desta pesquisa pode se aprofundar na observação a situação das bibliotecas escolares
seguindo este método como explica Marconi e Lakatos que caracterizam a indução como:
Processo mental por intermédio do qual, partindo de dados particulares,
suficientemente constatados, infere-se uma verdade geral ou universal. O objetivo
dos argumentos indutivos é levar a conclusões cujo conteúdo é muito mais amplo do
que o das premissas nas quais se basearam. (MARCONI; LAKATOS, 2017, p. 93).
O método histórico foi utilizado para contextualizar as desigualdades raciais no Brasil,
com intuito de construir uma linha temporal que possa explicar a estruturação do racismo,
16
dentro das especificidades do país, e mostrar as lutas dos movimentos negros em busca de
uma educação antirracista para cidadania dos negros brasileiros. Assim,
Portanto, colocando os fenômenos, como, por exemplo, as instituições, no ambiente
social em que nasceram, entre as suas condições “concomitantes”, torna-se mais
fácil sua análise e compreensão, no que diz respeito à gênese e ao desenvolvimento,
assim como às sucessivas alterações; ao permitir a comparação de sociedades
diferentes, o método histórico preenche os vazios dos fatos e acontecimentos,
apoiando-se em um tempo, mesmo que artificialmente reconstruído, que assegura a
percepção da continuidade e do entrelaçamento dos fenômenos. ((MARCONI;
LAKATOS, 2017, p. 114).
A entrevista estruturada foi escolhida devido a característica de ter maior flexibilidade
e possibilidade de obter informações diversas dos entrevistados. A entrevista é do tipo
estruturada para seguir um roteiro pré-estabelecido com intuito de conseguir comparar as
respostas de cada pergunta. De acordo com Marconi e Lakatos (2017, p. 211) a entrevista é:
um encontro entre duas pessoas, a fim de que uma delas, mediante conversação,
obtenha informações a respeito de determinado assunto. É um procedimento
utilizado na investigação social, para a coleta de dados, ou para ajudar no
diagnóstico ou no tratamento de um problema social.
Por fim, com as respostas das entrevistas, a comparação foi construída em forma de
quadros para cada questão e resposta onde as respondentes foram identificadas como
entrevistada 1 e entrevistada 2, e as respostas foram analisadas uma a uma.2.2 CAMPO DE PESQUISA
Duas regiões da cidade foram escolhidas, as Zonas Norte e Sul, em seguida foram
selecionadas 2 escolas - uma particular e uma pública - de nível fundamental, para cada zona,
totalizando 4 escolas que possuem bibliotecas em suas instalações físicas. A escolha das
escolas municipais se deu através da obtenção de uma lista de escolas disponibilizada no site
da Prefeitura de Natal, e as escolas particulares foram selecionadas por uma busca simples no
google.
Em seguida as escolas foram contatadas via e-mail, telefone, Facebook e Instagram,
porém muitas escolas não responderam os pedidos de participação para a pesquisa ou não
aceitaram participar por não ter representantes responsáveis pelas bibliotecas, essas situações
foram identificadas tanto na rede de ensino pública quanto privada.
17
Após fracasso em encontrar uma escola municipal na zona sul e uma escola particular
na zona norte para participar da pesquisa, entramos em contato com a Secretaria de Educação
para descobrir se existia alguma escola municipal com bibliotecário e entrar em contato,
porém a secretaria não soube informar sobre nossos questionamentos, e assim foi decidido
continuar apenas com a Escola Municipal Professora Adelina Fernandes, da zona norte, e com
uma escola particular da zona sul, a Escola Centro Educacional Teresa de Lisieux.
18
3 CONTEXTUALIZANDO O RACISMO NO BRASIL
O ato de classificar é intrínseco aos seres humanos, a todo momento estamos
realizando ações de classificação de diferentes formas, em nosso convívio social, profissional,
e até educacional. Na área da biblioteconomia por exemplo estamos acostumados com a ideia
de classificar devido a necessidade de organizar o conhecimento para possibilitar o acesso à
informação.
É através dessa necessidade de classificar, de categorizar o conhecimento que surge o
conceito de raça, que aparece no século XVIII, na área das ciências naturais, como a zoologia
e a botânica, com a finalidade de classificar as espécies de animais e vegetais. No entanto, na
Europa medieval, o conceito de raça já era utilizado para categorizar hierarquicamente os
seres humanos, com intenção de estabelecer uma relação de dominação de uns sobre os
outros.
Para pensar os passos dados pelas ciências para chegar ao racismo que observamos
hoje no brasil, em específico, é necessário voltar ao ano de 1500, o ano que nasce “o outro”,
ano em que o brasil é invadido pela Europa e é descoberto a existência de novos povos, os
Indígenas. De acordo com Munanga (2003) até o século XV, as diferentes raças eram
explicadas através das escrituras bíblicas, representados pelos 3 Reis Magos que seriam as 3
raças até então reconhecidas, os Semitas, os Brancos e os Negros, deixando assim os
indígenas com sua humanidade em xeque.
Com o iluminismo no século XVIII, surge a necessidade de buscar respostas através
da razão, e de afastar as explicações da natureza e humanidade das mãos da igreja e da
realeza. É neste sentido que as teorias das ciências naturais, como a ideia de raças puras, são
adaptadas para projetar uma explicação científica para as diferenças humanas, porém ser
capaz, dentro dessa explicação, de justificar a hierarquização das raças.
Reconhecer que existem diferenças e similaridades entre os humanos não é um
problema, esse processo se tornou um problema para a humanidade a partir do momento que a
ciência foi usada para credibilizar a teoria da superioridade da raça branca sobre as outras. A
característica de classificar a espécie humana em diferentes raças deveria servir para
reconhecer o desenvolvimento da história e cultura da humanidade, mas através das relações
de poder político-ideológicas se transformou no racismo baseado em teorias biológicas, o
chamado racialismo.
19
A cor da pele foi inicialmente o critério principal para categorizar raças, porém ao
longo do século XIX foram sendo adicionados ao processo de categorização humana, critérios
como formato do crânio, do nariz, entre outros para justificar a inferioridade das raças negra e
amarela. Já na idade moderna o intelectual europeu se deu a razão de se posicionar no topo da
hierarquia racial, o que se configura como um movimento completamente consciente e ligado
aos interesses colonizadores na África e nas Américas, e não uma consequência arbitrária da
pós-escravidão.
Ao passo que o branco valoriza a própria raça e suas características como superiores
relacionando elementos fenotípicos com qualidades morais, culturais e psicológicas, em que
pessoas da raça branca são denominadas bondosas, confiáveis, inteligentes, civilizadas e o
mais importante, a raça branca como propícia a dominar outras raças, a raça negra se
classifica, para o europeu, como o total oposto de todas essas qualidades, são selvagens, sem
inteligência, sem civilidade e etc. Kabengele Munanga (2003, p. 6) vai descrever,
Podemos observar que o conceito de raça tal como o empregamos hoje, nada tem de
biológico. É um conceito carregado de ideologia, pois como todas as ideologias, ele
esconde uma coisa não proclamada: a relação de poder e de dominação. A raça,
sempre apresentada como categoria biológica, isto é natural, é de fato uma categoria
etnosemântica. De outro modo, o campo semântico do conceito de raça é
determinado pela estrutura global da sociedade e pelas relações de poder que a
governam.
Com os avanços científicos do século XX na área da Genética e Biologia molecular, os
princípios da raciologia são eventualmente refutados, porém o dano social, em relação à
percepção mundial dos negros como população e indivíduos, já estava instaurado ao redor do
mundo e é o resquício deste tipo de racismo que se estende aos dias de hoje em diversos
países. Em lugar da perspectiva biológica de raça, já descartada nos estudos modernos, tem-se
a perspectiva das ciências sociais que entende raça como marcas sociais que explicam a
história de uma população.
Diferente de raça, o conceito de etnia é tomado como mais apropriado para se
classificar os seres humanos seguindo a noção de identificação de populações, que definem
que dentro destes marcadores conhecidos como raças branca, preta e amarela podem ocorrer
diferentes etnias. Kabengele Munanga (2003, p. 12) define bem o conceito de etnia como,
“um conjunto de indivíduos que, histórica ou mitologicamente, têm um ancestral comum; têm
20
uma língua em comum, uma mesma religião ou cosmovisão; uma mesma cultura e moram
geograficamente num mesmo território.”
Nesta pesquisa o conceito de raça aqui entendido é o de raça social e não biológico, o
reconhecimento das relações através de raça no Brasil é necessário pois apenas argumentar
que biologicamente os humanos não tem raça não impede de que o racismo vivenciado no
nosso país pelos negros se constituiu dessas teorias científicas um dia aceitas. Desse modo, a
negritude como identidade se forma como processo político necessário para o desenrolar das
lutas pelos direitos dos negros descendentes da diáspora africana que se procedeu na era
escravagista do período colonial e imperial do Brasil, bem como após a abolição. Deste modo
Schucman (2010, p. 49), afirma,
O uso da categoria raça, a meu ver, é necessário tanto para a implementação de
políticas públicas quanto para o reconhecimento positivo da população negra
brasileira, pois se esta população é discriminada através da categoria raça – e,
portanto, do racismo – esta mesma categoria é a única capaz de unificá-los.
No brasil, essencialmente, a escravidão dos africanos durou de 1500 à 1888, são 400
anos de um modelo de sociedade que marcou a construção da identidade do Brasil, bem como
dos outros países da América, e as relações étnico-raciais entre os 3 povos encontrados aqui,
os indígenas e os negros sob a violenta dominação do colonizador branco europeu. Abdias
Nascimento (2017, p. 57), afirma,
A imediata exploração da nova terra se iniciou com o simultâneo
aparecimento da raça negra, fertilizando o solo brasileiro com suas lágrimas,seu sangue, seu suor e seu martírio na escravidão. Por volta de 1530, os
africanos, trazidos sob correntes, já aparecem exercendo seu papel de “força
de trabalho”; em 1535 o comércio escravo para o brasil estava regularmente
constituído e organizado, e rapidamente aumentaria em proporções enormes.
Durante todo o período de escravidão que os africanos foram submetidos no Brasil,
não só o racismo científico, mas também o cristianismo foram ferramentas usadas para o
posicionamento estratégico dos negros na base da pirâmide que representa a hierarquia das
raças, bem como doutrinação dos cativos à uma absurda “aceitação” de sua condição em
nome de Cristo ao mesmo passo em que as expressões religiosas desses povos sequestrados
eram proibidas levando ao apagamento de suas culturas.
Muitas foram as formas de resistência dos negros escravizados à condição a que foram
submetidos nas colônias, e muitos anos antes do Brasil se render às pressões internacionais e
21
ser o último país a abolir a escravidão, os negros já lutavam por si mesmos. Os Quilombos
são as organizações mais famosas e mais comentadas quando se pensa em resistência à
escravidão, sendo o Quilombo do Palmares, sob a liderança de Zumbi no século XVII, em
Alagoas, o mais famoso de todos, porém outras formas de resistência não podem ser
esquecidas, tais como revoltas, rebeliões, assassinatos, e suicídios fazem parte da história de
pessoas muito fortes que morreram lutando pela causa da humanidade.
A abolição da escravidão no Brasil foi decretada em 1888, pela Lei Imperial Nº 3.353,
mais conhecida como Lei Áurea, apesar da forte resistência da elite brasileira, afinal o
trabalho escravo construiu o Brasil e a riqueza de muitas famílias brancas. Da era das
plantações de cana-de-açúcar, através da era da mineração no século XVIII, e durante o ciclo
do café no século XIX o escravizado era visto como essencial para economia do país, por isso
tanta resistência à mudança do modelo, porém também como descartável pelo nível de
crueldade física e falta de zelo por tal “posse”, com que eram tratados. Abdias Nascimento
(2017, p. 59) nos enfatiza muito bem,
[...] Sem o escravo, a estrutura econômica do país jamais teria existido. O africano
escravizado construiu as fundações da nova sociedade com a flexão e a quebra da
sua espinha dorsal, quando ao mesmo tempo seu trabalho significava a própria
espinha dorsal daquela colônia. Ele plantou, alimentou e colheu a riqueza material
do país para o desfrute exclusivo da aristocracia branca. Tanto nas plantações de
cana-de-açúcar e café e na mineração, quanto nas cidades, o africano incorporava as
mãos e os pés das classes dirigentes que não se auto degradam em ocupações vis
como aquela do trabalho braçal. A nobilitante ocupação das classes dirigentes - os
latifundiários, os comerciantes, os sacerdotes católicos - consistia no exercício da
indolência, no cultivo da ignorância, do preconceito e na prática da mais licenciosa
luxúria.
É verdade que a abolição não foi uma decisão da bondosa princesa que um belo dia
decidiu abençoar os negros com sua piedade e libertá-los, no entanto, essa ideia viveu por
muitas décadas no imaginário dos brasileiros, bem como o mito da escravidão nas américas
espanhola e portuguesa como tendo sido versões leves da escravidão, comparadas à américa
inglesa. Abdias Nascimento chama de mito do senhor benevolente, e explica que essas ideias
absurdas, que foram conscientemente inseridas no imaginário da população pelos governantes
e pela elite com intuito de se distanciar da responsabilidade da crueldade que acontecera neste
país, não por culpa, mas por auto preservação, obviamente.
Os apoiadores do mito da escravidão branda apontam para mentiras como a de que
existia muita tolerância religiosa no brasil, que seria apoiada pela igreja cristã e pelos
22
governantes, pois existiam algumas organizações de cunho religioso para os negros, chamadas
“Nações” e “Fraternidades religiosas”, quando na realidade essas organizações eram
permitidas para manter viva a lembrança das diferenças e rivalidades entre as diferentes
culturas africanas em dia para que eles não se unissem contra o verdadeiro inimigo, os seus
sequestradores.
Outra suposta prova de que a escravidão aqui era mais “humanizada”, é na verdade
outro mito, o de que devido à intimidade entre a ama negra que cuidava de bebês brancos,
desde amamentação até ensinar a falar as primeiras palavras, seria indício das relações mais
relaxadas entre os senhores e os negros. Esse mito é muito interessante e nos remete a uma
famosa expressão bem conhecida na cultura brasileira, o “como se fosse da família”, usado
para se referir às empregadas domésticas e outros funcionários do lar. Uma expressão
extremamente carregada de racismo e que primeiramente nunca foi honesta, mas usada
geralmente com intuito ou como argumento para abusar dos direitos básicos do trabalho
doméstico ao mesmo tempo em que manipula com sentimentalismos esses trabalhadores a
aceitarem tratamentos análogos à escravidão sob a ilusão de pertencimento familiar.
Quanto às sobrevivências culturais citadas para provar um "antirracismo” brasileiro,
elas são apenas resultados diretos dos mecanismos de controle social exercidos pelos senhores
sobre seus escravos. (NASCIMENTO, 2017, p. 68)
Através de mentiras a colônia conseguiu esconder do mundo o que realmente se
passava nas terras do brasil, e qual era a real condição de vida dos escravizados e fazer fama
ao redor dessa farsa de uma escravidão justa e civilizada. Tal cultura de disfarçar a crueldade
do sistema escravocrata brasileiro se estende após a abolição durante o início do século XX
com o bastante conhecido mito da democracia racial, mito que estimula o não reconhecimento
de que racismo sequer exista no Brasil, algo que se mostrará extremamente danoso para a vida
dos negros brasileiros desde então.
É importante citar que imediatamente após à abolição se seguiu a proclamação da
república em 1889, e que o número de negros no Brasil era muito superior ao número de
brancos, e em 1890 Deodoro da Fonseca decide fazer um decreto para regularizar a imigração
com intenção explicita de selecionar quem seria a mão-de-obra ideal para substituir os negros
nas propriedades agrícolas e assim por em prática a estratégia do embranquecimento do Brasil
23
através dos imigrantes e da mestiçagem, como podemos ver no artigo primeiro do decreto nº
528 de 28 de junho de 1890,
Art. 1º É inteiramente livre a entrada, nos portos da Republica, dos indivíduos
válidos e aptos para o trabalho, que não se acharem sujeitos à ação criminal do seu
país, excetuados os indígenas da Ásia, ou da África que somente mediante
autorização do Congresso Nacional poderão ser admitidos de acordo com as
condições que forem então estipuladas. (BRASIL, 1890).
Nascimento (2017) afirma que o mestiço era visto como “um degrau na escada da
branquificação sistemática do povo brasileiro, ele é o marco que assinala o início da
liquidação da raça negra no Brasil”. Mesmo assim o mestiço, ou mulato, era visto como
homem de cor, racializado, e recipiente do mesmo racismo dado ao africano. Nascimento
segue dizendo também que a mestiçagem não se dava em sua maioria através de casamentos
interraciais, mas, primeiro com o estupro das escravas durante toda a era da escravidão, e
depois por “concubinagem e de relações fortuitas”, e cita uma fala do escritor José Veríssimo
para ilustrar as expectativas em torno do embranquecimento da população como medida em
prol do desenvolvimento da nação.
Como nos asseguram os etnógrafos, e como pode ser confirmado à primeira vista, à
mistura de raças é facilitada pela prevalência do elemento superior. Por isso mesmo,
mais cedo ou mais tarde, ela vai eliminar a raça negra daqui. É óbvio que isso já
começa a acontecer. (NASCIMENTO, 2017, p. 84).
Para Guimarães (2004) em sua análise dos estudos sobre as relações raciais no Brasil
ao longo do século XX, diversas vertentes tentaramrepresentar o racismo, ou a não existência
deste, no Brasil. Na década de 1930 que perpassa sobre a teoria da chamada “democracia
social e étnica” de Gilberto Freyre, que seria renomeada de “Democracia racial” mais a frente,
que se refere ao mito de que no brasil não existe racismo devido grande número de mestiços,
representantes do novo tipo de brasileiro.
Para Guimarães (2004) ao passo que Freyre alega essa aceitação dos mestiços na
cultura do Brasil, marcado desde a era da escravidão, e que essa mestiçagem seria em si a
cultura brasileira formada, essa teoria foi aceita internacionalmente e serviu para mascarar o
racismo vivido pelos brasileiros em uma forma de Gaslighting a seu tempo sobre a psique dos
negros no Brasil, principalmente no âmbito das denúncias de vitimização pelo racismo.
Outros estudiosos como o médico maranhense Raimundo Nina Rodrigues já deixavam sua
24
contribuição contra a miscigenação e a favor do embranquecimento do Brasil, para ele o
mestiço, ou mulato, era a fonte de toda a imoralidade que se passava no Brasil.
Essa distinção do que realmente acontecia no Brasil no séc. XX pós-abolição com o
tratamento dos negros era tão complexa de se observar devido muitas das teorias sociais
originarem de cientistas americanos, que observavam o racismo da América do Norte, onde o
racismo era explícito e segregacional, enquanto que no Brasil esse racismo é velado ou
negado, com apoio das elites intelectuais que tinha a esperança de embranquecer o país no
período de tempo de 5 gerações de mestiços, conforme cita Nascimento.
Por isso para Guimarães (2004) os estudos sobre racismo no brasil se deram sob bases
teóricas não bem definidas, primeiro, devido aos cientistas quererem que uma teoria fosse
aceita para representar as relações raciais em todas as nações das américas ignorando as
particularidades da formação do brasil. Segundo, pela falta de aprofundamento sobre a origem
das desigualdades raciais, se são decorrentes da classificação de raça, classe, cor, conflitos
ideológicos? Etc. Ou seja, além de identificar as desigualdades é preciso entendê-las. E em
terceiro, devido a definição de racismo no brasil ser muito abrangente, muito generalizada.
Ou seja, sob o rótulo de racismo, são tratados objetos tão distintos quanto os
sistemas de classificação racial, o preconceito racial ou de cor, as formas de carisma
(para usar o conceito de Elias), que podem ser observadas em diversas instituições e
comunidades, a discriminação racial nos mais distintos mercados, e as desigualdades
raciais e sua reprodução. (GUIMARÃES, 2004, p. 29).
Assim é possível identificar que desde os sécs. XIX, com as políticas de imigração, o
desejo é eliminar o negro, através de uma “limpeza étnica lenta”, pois o negro é visto como
um problema para desenvolvimento da nação. Deste modo surge a identificação do brasileiro
mestiço que é extirpado imediatamente de sua identidade negra, porém é vítima do mesmo
racismo antinegro. Apesar das políticas de embranquecimento terem sido explícitas, bem
como a vontade das elites e intelectuais do brasil de “limpar a mancha negra” e de “resolver o
problema”, como cita Abdias do Nascimento, existia, e ainda existe, uma certa tentativa de
alienação dos negros sobre o racismo que sofrem.
Apropriadamente, Guimarães comenta que qualquer teoria de democracia racial é
interrompida quando a democracia política é atacada em 1964 com o golpe militar. Dentro do
imaginário racista brasileiro, observamos a negação do racismo, mas também da discussão
sobre, principalmente se o debate for levantado pelos negros, e essa cultura se mistura com os
25
mitos citados anteriormente, mas também se misturam com os crimes de censura do golpe de
64. Nascimento (2017, p. 94) afirma,
Em verdade, porém, a camada dominante considera qualquer movimento de
conscientização afro-brasileira como ameaça ou agressão retaliativa. [...] A ele não
se permite esclarecer-se e compreender a própria situação no contexto do país; [...]
Como o cientista político Anani Dzidzienyo, tão propriamente conclui: uma opinião
do negro à situação brasileiro enfrentaria dois inconvenientes: uma opinião oficial
que consideraria ‘atividades raciais’ como subversivas, e a atitude geral da
sociedade que as considera divisionistas.
Ora, se foi estabelecido que racismo não existe, pois no brasil não teve um Apartheid
como na África do sul, ou uma política como da era Jim Crow de segregação de raças dos
Estados Unidos, não haveria necessidade se debater sobre o tema, essa prática também nos
remete uma fala bastante famosa no dia a dia dos brasileiros, bem como nas interações em
redes sociais, o de que “apontar o racismo na verdade só faz de você o racista da situação”,
mais uma vez remete ao ato de gaslighting, de fazer a vítima duvidar da sua própria razão.
Essa característica do racismo velado se mostra como uma das mais intensas entre os
elementos que constitui o racismo do Brasil. É assim, fingindo não atacar que atacam, e ao
mesmo passo espera-se passividade, a não reação, pois, “não sou racista, tenho amigos
negros”, tudo isso através das condutas sociais da não aceitação da pele negra retinta, do
cabelo crespo, da perpetuação de que os negros são desprovidos de beleza, de talento para as
artes e que não podem atuar ou aparecer na tv, a não ser que seja como personagens
marginalizados, ou como alvo de piadas sobre ser negro, identificado como racismo
recreativo por Adilson Moreira. Esses estereótipos inundam a mente da sociedade brasileira, e
assim se expressa sem pudor a discriminação racial, que se argumenta apenas como “opinião”
ou "preferência” ou senso de humor.
É preciso entender as diferenças entre racismo, discriminação racial e preconceito
racial. Enquanto que o “preconceito racial” é o julgamento de grupos radicalizados com base
em estereótipos, que são marcadores superficiais e racistas sobre outras raças e etnias e são
prejudiciais para as relações raciais, por isso o preconceito acaba sendo discriminatório. Já a
“discriminação racial” é o tratamento diferenciado das raças, está atrelado ao poder de um
grupo sobre outro e de influenciar negativamente a condição de vida de um grupo racial
dentro da sociedade.
26
A discriminação pode ser direta ou indireta, a direta está relacionada aos crimes de
ódio, quando o racismo é mais evidente e o tratamento diferenciado é nítido, enquanto que a
discriminação indireta se manifesta na ignorância voluntária, do privilégio de escolher não
reconhecer a existência das desigualdades raciais ou de se manter neutro sobre relações
raciais, como o uso do conceito de “colorblindness”, ou seja, a prática de não enxergar as
cores de pele ou raça das pessoas, o que consequentemente leva à não enxergar, e admitir, as
injustiças sofridas pelas pessoas devido sua cor de pele e raça.
Logo, o racismo, que se manifesta pela discriminação racial direta e sistêmica, é
entendido por três concepções que Almeida (2018) avalia como, as formas individualista,
institucional e estrutural. A concepção individualista entende o racismo como um
comportamento individual de pessoas ignorantes que precisam ser repreendidas, essa
concepção não enxerga o racismo na sociedade como um todo, mas apenas em algumas
pessoas/grupos agindo dessa forma.
Já a concepção institucional entende que o racismo se manifesta dentro das
instituições, de forma indireta, menos evidente, influenciando beneficamente uma raça em
detrimento de outra, e que constitui forte característica das relações de poder na sociedade
através das instituições diversas - estado, mídia, escola, etc. Enquanto que a concepção
estrutural do racismo significa que a estrutura social é racista e por isso o racismo se
manifesta em todas as instituições e em todos os indivíduos. Almeida (2018, p. 36) explica
que, “As instituições são apenas a materialização de uma estrutura social ou de um modo de
socialização que tem o racismo como um de seus componentes orgânicos. Dito de modomais
direto: as instituições são racistas porque a sociedade é racista”.
Assim, entender como se dá o racismo institucional, bem como se estrutura na
sociedade, é crucial para a autoconsciência do negro brasileiro, inclusive dos mestiços. O
racismo acontece através da escola, quando os livros didáticos perpetuam microagressões
através de piadas racistas, quando não há presença de livros escritos por negros ou com
protagonistas negros e isso é normalizado, quando não se ensina sobre a cultura africana e
afro-brasileira e das contribuições que pessoas negras fizeram na história da humanidade. O
racismo acontece pelas mãos do estado quando usa da força policial militarizada para represar
as comunidades negras, acontece na mídia que apresenta novelas como espelho do Brasil e o
faz, subalternizando as narrativas das vidas negras, o racismo está ao redor de todos os negros
27
brasileiros todos os dias, no trabalho, na universidade, nos relacionamentos, no lazer, é uma
estrutura tão forte quanto antiga. Abdias do Nascimento (2017, p. 112) reafirma que,
Além dos órgãos de poder - o governo, as leis, o capital, as forças armadas a polícia
- as classes dominantes brancas têm à sua disposição poderosos implementos de
controle social e cultural: o sistema educativo, as várias formas de comunicação de
massas a imprensa, o rádio, a televisão - a produção literária.
É a partir da perspectiva da educação como mecanismo de transformação social, que
podemos entender que a educação antirracista pode ser usada no processo de reparação
histórica ao desmantelar o racismo institucional dentro do sistema educacional. No Brasil a
cultura de meritocracia foi instrumental, e ainda é um conceito muito defendido nos dias de
hoje, para a manutenção das desigualdades raciais no século XX, pois esta ideologia assume
que em uma democracia todos têm as mesmas oportunidades de ascensão social e quem não
consegue sair do ciclo da pobreza não fez por merecer, não se esforçou tanto quanto outros.
Por isso defensores da meritocracia são contra as ações afirmativas como as cotas raciais em
concursos públicos e vestibulares, pois essa perspectiva se recusa a aceitar a influência do
racismo na própria constituição de democracia que alegam existir.
A Educação Antirracista está presente na legislação brasileira em diversas expressões,
através da Constituição Federal, pelo Artigo 5º, inciso XLII, que define racismo como crime
inafiançável e imprescritível, e na prática a criminalização é feita através da Lei do racismo, a
lei nº 7.716 de 5 de janeiro de 1989. Assim também se tem a Lei nº 12.711 de 29 de agosto de
2012, que dispõe sobre a reserva de 50% de vagas em cursos universitários para estudantes
egressos de escola pública e autodeclarados pretos, pardos, indígenas e pessoas com
deficiência (pcd), e a Lei nº 12.288 de 20 de julho de 2010 que instituiu o Estatuto da
Igualdade Racial.
28
4 EDUCAÇÃO ANTIRRACISTA
A educação antirracista se inicia com os movimentos negros, que são movimentos de
protestos, denuncias, e demandas por ações para garantir o fim do racismo e proporcionar a
cidadania dos negros no brasil. Podemos afirmar que os movimentos negros se iniciaram
desde a era da escravidão com as revoltas, rebeliões e fugas para os quilombos pois foram
formas de resistência à crueldade do sistema de escravidão e racismo, e que é no decorrer do
século XX, através, principalmente, de lutas e reivindicações por ações afirmativas em prol do
desenvolvimento das relações étnico-raciais no Brasil se inicia a luta pela educação
antirracista dos brasileiros.
Como cita Almeida (2018) a discriminação pode ser de caráter negativo ou positivo, e
as ações afirmativas se classificam como positivas na sociedade pois são políticas públicas
que direcionam um tratamento diferenciado à um grupo de pessoas, mas com intuito de
erradicar as desigualdades e os preconceitos que afetam a dignidade e a cidadania do grupo ao
qual se destinam as ações afirmativas. Domingues (2008, p. 106),
Mas, afinal, o que são ações afirmativas, que também recebem o nome de políticas
compensatórias? São programas cuja finalidade é eliminar ou minimizar as
desigualdades de oportunidades por meio de políticas públicas (ou privadas)
voltadas para favorecer aqueles grupos que, historicamente, sofreram (e sofrem)
discriminação negativa, como é o caso de negros, mulheres, gays e deficientes
físicos.
É a partir das iniciativas dos movimentos negros e de suas demandas que medidas
institucionais são tomadas pelo governo, em formas de leis, decretos e diretrizes. Desde a
década 1900 já se tem as expressões de pensadores negros capazes de aglomerar cidadãos em
associações diversas, e também de produzir registros e provas das desigualdades que os
negros eram submetidos no brasil pós-abolição, essas produções se manifestaram através dos
jornais e revistas voltados para os negros, e o conjunto dessas produções ficou conhecido
como Imprensa Negra Paulista. De acordo com o portal da Imprensa Negra Paulista elaborado
pela Universidade de São Paulo (USP) (2022),
[...] Nas duas primeiras décadas do século XX, a maior parte dos periódicos foram
elaborados por associações que atuavam como grêmios recreativos, clubes
dançantes, esportivos, dramáticos, literários ou carnavalescos. Dessa forma, boa
parte desses noticiosos tinha como principal finalidade tratar de assuntos
relacionados à vida social dos associados e da população negra em geral. Ao longo
dos anos, cresceu também a preocupação dos grupos que dirigiam esses veículos em
29
denunciar as restrições sociais sofridas pela população negra, traduzidas na diferença
de tratamento e de acesso a oportunidades por causa do preconceito de cor.
Muitos desses jornais e revistas tiveram breve tempo de publicação devido a
precariedade dos meios de produção da época. No Portal da imprensa Negra Paulista da USP
estão disponíveis vinte periódicos, o mais antigo deles é o O Baluarte com data de início em
1903, e os que tiveram maior duração foram: O Clarim d’Alvorada (1924-32), Progresso
(1928-1931), A Voz da Raça (1933-1937) e Novo Horizonte (1946-1961).
Em 1931 é fundada a Frente Negra Brasileira (FNB), a maior entidade pelos direitos
dos negros na primeira metade do século XX, chegando a ter 20 mil sócios. A FNB mantinha
um importante trabalho de assistência aos negros nas mais diversas áreas necessárias que
abarcam a dignidade e cidadania de uma pessoa. Além de ter sido a responsável pela
publicação do periódico A voz da Raça, a FNB desenvolvia projetos culturais como, grupo
musical e teatral, time de futebol, mantinha escola, assistência jurídica, atendimento médico e
odontológico e cursos sobre política, artes e ofícios. “Um dos principais objetivos da Frente
Negra Brasileira era a defesa de uma “Segunda Abolição”, pois a primeira (1888) havia
deixado um legado de exclusão social e pobreza.” (Geledés, 2017).
A FNB foi perdendo força com a polarização das lideranças, enquanto Arlindo Veiga
dos Santos (1902-1978) tinha uma visão ultranacionalista e conservadora, José Correia Leite
(1900-1989) tinha visão socialista. Em 1937, com a instauração do Estado Novo, a Frente
Negra assim como todas as outras organizações políticas, foram extintas, mas com a queda de
Vargas em 1945, os movimentos negros foram se reorganizando e entidades de grande
impacto na história das lutas antirracistas surgiram, como a União dos Homens de Cor (UHC)
em 1943 e o Teatro Experimental do Negro (TEN) em 1944.
A “UHC”, também chamada de Uagacê, foi fundada por João Cabral Alves e se
caracterizava pelo potencial em expandir para outros estados, chegando a ter sedes por 10
estados entre sul, sudeste e nordeste. De acordo com Domingues (2007) a finalidade principal
era “elevar o nível econômico, e intelectual das pessoas de cor em todo o território nacional,
para torná-las aptas a ingressarem na vida social e administrativa do país, em todos os setores
de suas atividades”. Com a ditadura de 64 aUHC, assim como muitos grupos dos
movimentos sociais foram extintos.
30
O Teatro Experimental do Negro, sob a principal liderança de Abdias Nascimento, foi
um marco nos movimentos pela conscientização contra o racismo nas artes devido o objetivo
inicial de formar um grupo teatral de atores negros, mas que além disso acabou evoluindo
com a publicação do jornal O Quilombo, integração de cursos, a fundação do Instituto
Nacional do Negro e do Museu do Negro, promoveu a Convenção Nacional do Negro, no Rio
de Janeiro e São Paulo (1945-1946), bem como o 1º Congresso do Negro Brasileiro no Rio de
Janeiro em 1950. Domingues (2007) cita: "Com a instauração da ditadura militar em 1964, o
TEN ficou moribundo, sendo praticamente extinto em 1968, quando seu principal dirigente,
Abdias do Nascimento, partiu para o auto-exílio nos Estados Unidos.”
As entidades citadas acima, não eram as únicas no país, em nível nacional, em quase
todos os estados, os negros se reuniam e se expressavam contra o racismo e a tentaram
reeducar a sociedade em busca de dignidade para os negros. Com a violência da ditadura os
movimentos negros começaram a se reerguer novamente no final dos anos 1970 para uma
terceira fase de tentar acabar com as desigualdades raciais. Em 1978 é fundado o Movimento
Unificado Contra a Discriminação Racial (MUCDR) que depois tem seu nome simplificado
para Movimento Negro Unificado (MNU).
De acordo com Domingues (2007, p. 113) o MUCDR foi criado em 18 de junho de
1978, em uma reunião de entidades negras de São Paulo como, CECAN (Centro de Cultura e
Arte Negra), Grupo Afro-Latino-América, Câmara do Comércio Afro-Brasileiro, Jornal
Abertura, Jornal Capoeira e Grupo de Atletas e Grupo de Artistas Negros, e o primeiro
protesto planejado foi um ato de repúdio à duas situações, a discriminação racial sofrida por 4
rapazes negros no Club de Regatas Tietê e a morte do jovem Robson Silveira da Luz,
torturado até a morte no 44° Distrito policial de Guaianases. O ato de protesto ocorreu em
julho daquele ano nas escadarias do Teatro Municipal de São Paulo, onde, na ocasião, os
participantes divulgaram uma carta aberta à população em que o grupo identifica a
manifestação como uma campanha de denúncia contra o racismo, a opressão policial, o
desemprego, o subemprego e a marginalização. Domingues (2007, p. 115) afirma que,
No Programa de Ação, de 1982, o MNU defendia as seguintes reivindicações
“mínimas”: desmistificação da democracia racial brasileira; organização política da
população negra; transformação do Movimento Negro em movimento de massas;
formação de um amplo leque de alianças na luta contra o racismo e a exploração do
trabalhador; organização para enfrentar a violência policial; organização nos
sindicatos e partidos políticos; luta pela introdução da História da África e do Negro
31
no Brasil nos currículos escolares, bem como a busca pelo apoio internacional contra
o racismo no país.
Domingues (2007) afirma ainda que com as contestações do MNU e o princípio de
unificar as lutas das minorias junto a dos negros o movimento ganhou bastante força, e novas
medidas foram tomadas, como o fim da identificação com o símbolo da Mãe-preta pois teria
significação de possessividade dos negros, o dia 13 de maio deixou de ser comemorado dia da
abolição e passa a ser chamado de Dia Nacional de Denúncia Contra o Racismo e para a data
de comemoração do MNU é escolhido o dia 20 de novembro, dia da morte de Zumbi, que
passa a ser chamada de Dia da Consciência Negra.
Como é possível observar, as lutas dos negros foram ininterruptas mesmo quando a
democracia em si parecia estar paralisada, os movimentos se reorganizavam e reinventavam,
pois os anos mudavam, mas o racismo não, e as mazelas do povo negro só se intensificava,
principalmente a opressão policial que já se registrava como brutal, mas que depois da
ditatura militar de 1964 se torna ainda mais letal. A ditadura militar acaba em 1985, mas não o
aparato e modo de agir da polícia e de tratar os favelados, principalmente os que são negros.
Em todos os estados do brasil onde vivem negros e brancos se preserva o racismo, devido a
estrutura racista se preservar.
A partir desse histórico de lutas que o Movimento negro, que sempre esteve ligado à
educação dos negros através de cursos diversos, passa também a reivindicar a educação
antirracista curricular dos brasileiros em geral. Com as demandas de ações afirmativas na
forma de cotas raciais para os negros nas universidades, a adesão do ensino da História e
cultura Africana e Afro-brasileira nas escolas de todo o país bem como repensar a literatura
eurocêntrica nas escolas. Domingues (2008) cita que é nos anos 1990 que as entidades negras
começam a promover assistências especializadas, e na área da educação algumas dessas
entidades eram a Associação Afro-Brasileira de Educação Cultural e Preservação da Vida
(Abrevida), em São Paulo; o Educafro, no Rio de Janeiro; o Núcleo de Estudos do Negro
(NEN), em Florianópolis;
Munanga (2007) aponta a pesquisa de Ricardo Henriques de 2001 para demonstrar que
o número de universitários no Brasil correspondia a 97% brancos, 2% negros, e 1% de
“orientais” e observando essa desigualdade Munanga discorre em defesa das cotas raciais
contra-argumentando as maiores reclamações de quem é contra a implementação das cotas.
32
Em 2000 a Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ) foi a primeira a oferecer 50% de
cotas para alunos de escolas públicas em cursos de graduação, e a Universidade de Brasília
(UNB) foi a primeira a adotar as cotas raciais em 2004. Apenas em 2012, a lei 12.711/12, a lei
de cotas, foi aprovada para todas instituições de ensino superior, direcionada a estudantes de
escola pública e pode conter critérios de raça, social e até regional.
Assim devido às lutas dos movimentos negros pelo fim do racismo e das
desigualdades de raça que duraram todo o século XX, bem como exigências por respeito e
equidade feitas à sociedade como um todo e aos governantes, que os movimentos negros
voltados para a educação antirracista conseguem que em 2003 seja criada a Lei 10.639/03.
4.1 LEI Nº 10.639/03 E LEI Nº 11.645/08
A Lei 10.639/03 de 9 de janeiro de 2003, se trata de uma alteração feita na Lei
9.394/96, que estabelece Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), e passa a integrar
no currículo oficial da rede de ensino básica, ou seja, o ensino fundamental e médio, a
obrigatoriedade do ensino de História e Cultura Afro-brasileira, e define oficialmente o dia 20
de novembro como Dia Nacional da Consciência Negra no calendário escolar. Dois artigos
foram adicionados à Lei, foram eles o artigo 26A e 79B,
Art. 1o A Lei no 9.394, de 20 de dezembro de 1996, passa a vigorar acrescida dos
seguintes arts. 26-A, 79-A e 79-B:
"Art. 26-A. Nos estabelecimentos de ensino fundamental e médio, oficiais e
particulares, torna-se obrigatório o ensino sobre História e Cultura Afro-Brasileira.
§ 1o O conteúdo programático a que se refere o caput deste artigo incluirá o estudo
da História da África e dos Africanos, a luta dos negros no Brasil, a cultura negra
brasileira e o negro na formação da sociedade nacional, resgatando a contribuição do
povo negro nas áreas social, econômica e política pertinentes à História do Brasil.
§ 2o Os conteúdos referentes à História e Cultura Afro-Brasileira serão ministrados
no âmbito de todo o currículo escolar, em especial nas áreas de Educação Artística e
de Literatura e História Brasileiras.
Ҥ 3o (VETADO)"
"Art. 79-A. (VETADO)"
"Art. 79-B. O calendário escolar incluirá o dia 20 de novembro como ‘Dia Nacional
da Consciência Negra’.
Art. 2º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação. (BRASIL, 2003).
Após esta alteração da LDB ter sido sancionada em 2003, o Conselho Nacional de
Educação (CNE) aprovou o parecer CNE/CP 03/2004, em março de 2004 e a Resolução em
junho do mesmo ano. São esses dois documentos que constituem a publicação, em outubro de
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9394.htm#art26ahttp://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9394.htm#art79a
33
2004, das “Diretrizes Curriculares Nacionais para a educação das relações Étnico-Raciais e
para o ensino de História e Cultura Afro-brasileira e Africana”, que é um documento
elaborado em parceria do Ministério da Educação (MEC) com a Secretaria Especial de
Políticas de Promoção de Igualdade Racial (SEPPIR).
A Lei 10.639/03 foi um marco para a educação étnica e racial, mas antes dela já
existiam algumas leis municipais que regularizavam o ensino das relações raciais, a educação
contra discriminação e a história das contribuições do povo e da cultura negra, são elas, Lei
Municipal nº 7.6985, de 17 de janeiro de 1994 de Belém, a Aracaju – Lei Municipal nº 2.251,
de 30 de novembro de 1994 de Aracaju, e a Lei Municipal nº 11.973, de 4 de janeiro de 1996
de São Paulo. (BRASIL, 2004).
As Diretrizes têm a finalidade de existir como um guia de implementação da
legislação para as instituições, para a capacitação e especialização de funcionários,
professores, alunos e seus familiares, com o propósito de que as exigências da Lei 10.639/03
não fossem mal aplicadas e assim evitar o fracasso na fase da aplicabilidade. Desse modo, em
2008 a LDB, alterada pela Lei 10.639/03, é alterada novamente pela Lei 11.645/08 que
adiciona os estudos da História e Culturas Indígenas ao currículo nacional, assim o artigo
alterado diz,
Art. 1o O art. 26-A da Lei no 9.394, de 20 de dezembro de 1996, passa a vigorar com
a seguinte redação:
“Art. 26-A. Nos estabelecimentos de ensino fundamental e de ensino médio,
públicos e privados, torna-se obrigatório o estudo da história e cultura afro-brasileira
e indígena.
§ 1o O conteúdo programático a que se refere este artigo incluirá diversos aspectos
da história e da cultura que caracterizam a formação da população brasileira, a partir
desses dois grupos étnicos, tais como o estudo da história da África e dos africanos,
a luta dos negros e dos povos indígenas no Brasil, a cultura negra e indígena
brasileira e o negro e o índio na formação da sociedade nacional, resgatando as suas
contribuições nas áreas social, econômica e política, pertinentes à história do Brasil.
§ 2o Os conteúdos referentes à história e cultura afro-brasileira e dos povos indígenas
brasileiros serão ministrados no âmbito de todo o currículo escolar, em especial nas
áreas de educação artística e de literatura e história brasileiras.” (NR)
Art. 2o Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação. (BRASIL, 2008).
É importante citar que o Dia Nacional da Consciência Indígena é comemorado no dia
20 de janeiro, em homenagem à morte do guerreiro Aimberê Tupinambá, um dos líderes da
confederação dos Tamoios, que morreu em 1567 durante a Batalha de Uruçumirim, e também
é celebrado o Dia do Índio, no dia 19 de abril, devido ao I Congresso Indigenista
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L9394.htm
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L9394.htm#art26a.
34
Interamericano de 1940, mas também é em homenagem ao índio Pataxó Galdino do Santos,
que foi queimado vivo em 20 de abril de 1997.
Com a adição da obrigatoriedade do ensino de história e culturas indígenas, a Lei de
Diretrizes e Bases da Educação Nacional passa, então, a abarcar o ensino antirracista sobre as
duas principais culturas participantes da construção da identidade do Brasil. Assim as Leis
citadas constituem-se como políticas de ações afirmativas que atuam como medidas políticas
educacionais e de reparação, em busca da igualdade racial no país ao ensinar a valorização do
legado e da contribuição cultural dos negros e indígenas na formação do Brasil. Ao trazer a
luta e militância antirracista para o currículo escolar, em forma de educação das crianças e
adolescentes, os novos artigos da LDB existem com propósito de educar para eliminar o
racismo estrutural, agindo dentro das instituições que são racistas.
De acordo com o parecer CNE/CP 03/2004,
Cabe ao Estado promover e incentivar políticas de reparações, no que cumpre ao
disposto na Constituição Federal, Art. 205, que assinala o dever do Estado de
garantir indistintamente, por meio da educação, iguais direitos para o pleno
desenvolvimento de todos e de cada um, enquanto pessoa, cidadão ou profissional.
Sem a intervenção do Estado, os postos à margem, entre eles os afro-brasileiros,
dificilmente, e as estatísticas o mostram sem deixar dúvidas, romperão o sistema
meritocrático que agrava desigualdades e gera injustiça, ao reger-se por critérios de
exclusão, fundados em preconceitos e manutenção de privilégios para os sempre
privilegiados. (BRASIL, 2004, P. 11).
A Lei é justificada como resposta às demandas pelo reconhecimento por parte do
governo das desigualdades raciais na sociedade brasileira, e que o reconhecimento se dá
através de políticas pedagógicas de valorização da diversidade, da desconstrução o mito da
democracia racial, no questionamento de estereótipos racistas, e da desqualificação dos negros
através da normalização de apelidos depreciativos e piadas racistas sobre a fisionomia, textura
do cabelo, e as religiões de matriz Africana. Deve-se respeitar e divulgar o histórico das
resistências individuais e coletivas dos descendentes de Africanos, e instituir condições para o
fim da evasão escolar de jovens negros devido ao racismo.
A respeito da autonomia das instituições de ensino e de como os projetos pedagógicos
devem ser implementados para abarcar o ensino da História e Cultura Afro-brasileira e
Africana, o parecer cita que.
Caberá, aos sistemas de ensino, às mantenedoras, à coordenação pedagógica dos
estabelecimentos de ensino e aos professores, com base neste parecer, estabelecer
conteúdos de ensino, unidades de estudos, projetos e programas, abrangendo os
35
diferentes componentes curriculares. Caberá, aos administradores dos sistemas de
ensino e das mantenedoras prover as escolas, seus professores e alunos de material
bibliográfico e de outros materiais didáticos, além de acompanhar os trabalhos
desenvolvidos, a fim de evitar que questões tão complexas, muito pouco tratadas,
tanto na formação inicial como continuada de professores, sejam abordadas de
maneira resumida, incompleta, com erros. (BRASIL, 2004, p. 17).
As determinações de ações educativas de combate ao racismo exemplificadas no
documento, algumas são: criticar a representação dos negros e minorias nos materiais
didáticos; integrar as experiências dos alunos e professores com as atividades pedagógicas
para construir relações étnico-raciais positivas; proporcionar condições para os professores
discutirem conflitos raciais; valorização da oralidade, da arte e dança africana, bem como
escrita e leitura; ensino da preservação do patrimônio cultural afro-brasileiro; valorização das
contribuições dos grupos étnico-raciais para a construção da nação; e a participação de
representantes dos movimentos negros nos projetos político-pedagógicos.
Desse modo, as diretrizes orientam ainda, sobre o ensino de História e Cultura
Afro-brasileira e Africana, e como deve ser adaptado à cultura diária da escola devendo ser
abordado em todas as disciplinas do currículo escolar, bem como dar evidencia e representar
os negros e suas realizações e contribuições mundiais, do passado, presente e potencial de
contribuir com futuro da sociedade, em perspectivas positivas. Assim,
[...] a educação das relações étnico-raciais, tal como explicita o presente parecer, se
desenvolverão no cotidiano das escolas, nos diferentes níveis e modalidades de
ensino, como conteúdo de disciplinas, particularmente, Educação Artística, Literatura
e História do Brasil, sem prejuízo das demais, em atividades curriculares ou não,
trabalhos em salas de aula, nos laboratórios de ciências e de informática, na
utilização de sala de leitura, biblioteca, brinquedoteca, áreas de recreação, quadra de
esportes e outros ambientes escolares.(BRASIL, 2004. p. 21).
Devido a tantas adaptações, o parecer deixa claro que os mais diversos profissionais da
educação,com apoio dos gestores das instituições, necessitam de aperfeiçoamento sobre a
educação antirracista e as relações étnico-raciais, e que os cursos de licenciaturas, pedagogia
entre outros deveriam passar a adotar na formação de educadores, o ensino das relações
étnico-raciais, mas que as instituições de ensino superior devem ter autonomia para
implementar essas disciplinas. Essas determinações são explicitadas nos parágrafos a seguir.
Introdução, nos cursos de formação de professores e de outros profissionais da
educação: de análises das relações sociais e raciais no Brasil; de conceitos e de suas
bases teóricas, tais como racismo, discriminações, intolerância, preconceito,
estereótipo, raça, etnia, cultura, classe social, diversidade, diferença,
multiculturalismo; de práticas pedagógicas, de materiais e de textos didáticos, na
36
perspectiva da reeducação das relações étnico-raciais e do ensino e aprendizagem da
História e Cultura dos Afro-brasileiros e dos Africanos.
- Inclusão de discussão da questão racial como parte integrante da matriz curricular,
tanto dos cursos de licenciatura para Educação Infantil, os anos iniciais e finais da
Educação Fundamental, Educação Média, Educação de Jovens e Adultos, como de
processos de formação continuada de professores, inclusive de docentes no Ensino
Superior. (BRASIL, 2004, p. 23).
Ressaltando que a orientação é para a educação das relações raciais deve ser parte do
cotidiano das escolas, e desse modo todos os profissionais educadores, e aqui se inserem os
bibliotecários também, devem conhecer as leis 10.639/03 e 11.645/08, e as diretrizes apontam
que centros de informação como a biblioteca devem proporcionar espaços seguros para os
usuários identificarem a valorização da cultura não-branca quando diz que é preciso criar
“centros de documentação, bibliotecas, midiatecas, museus, exposições em que se divulguem
valores, pensamentos, jeitos de ser e viver dos diferentes grupos étnico-raciais brasileiros,
particularmente dos afrodescendentes.”(BRASIL, 2004, p. 24).
É apontado sobre a obrigatoriedade do ensino de história e cultura afro-brasileira que
as diretrizes nacionais devem servir como referência e fornecer critérios para os Conselhos de
Educação dos Estados, Distrito Federal e Municípios possam ter a autonomia de formular suas
próprias diretrizes de acordo com as especificidades da região. Ao entender as propostas das
Diretrizes Curriculares Nacionais para Educação das Relações Étnico-Raciais e para o Ensino
de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana, é possível vislumbrar o potencial de
transformação que a implementação das leis 10.639/03 e 11.645/08 proporcionou no início do
novo milênio.
37
5 A IMPORTÂNCIA DAS RELAÇÕES ÉTINO-RACIAIS NA BIBLIOTECA
ESCOLAR
A Biblioteca Escolar (BE) é elemento importante da composição das instituições de
ensino, esse pensamento é promovido por documentos como o Manifesto da International
Federation of Library Associations and Institutions (IFLA) e UNESCO para Biblioteca
Escolar (1999), que aponta a missão da BE de fornecer serviços e materiais para a
comunidade escolar para cultivar a aprendizagem, formação ética e competente dos
estudantes, bem como dar suporte aos professores. Como apoio ao Manifesto foi criado o
documento Diretrizes da IFLA para a Biblioteca Escolar que a respeito de seu objetivo, indica
que: “As orientações contidas neste documento foram produzidas para informar os decisores a
nível nacional e local em todo o mundo e para dar apoio e orientação à comunidade das
bibliotecas.” (IFLA, 2016, p. 15).
O Manifesto IFLA (1999) aponta que o bibliotecário escolar é o profissional adequado
para fazer o planejamento e a gestão de bibliotecas escolares, estando apoiado por uma equipe
para atender a comunidade escolar. De acordo com as Diretrizes da IFLA a respeito da
necessidade de bibliotecários em sua função dentro de Bibliotecas Escolares.
Os serviços e atividades devem ser concebidos por um bibliotecário escolar
qualificado, trabalhando em estreita cooperação com o diretor ou coordenador, com
os coordenadores de departamento e outros especialistas de aprendizagem na escola,
com os professores de sala de aula, com pessoal de apoio e com os alunos. Sem um
bibliotecário escolar qualificado que selecione recursos educativos adequados e
colabore com os professores para planear a aprendizagem com base nesses recursos,
as melhorias no desempenho dos alunos, que a investigação relata, não são
atingíveis. (IFLA, 2016, p 46).
Sobre as atividades que o bibliotecário escolar deve difundir, as Diretrizes da IFLA
para Biblioteca Escolar apontam a promoção da leitura, competência em informação,
aprendizagem baseada em investigação, integração da tecnologia, formação de professores e
valorização da literatura e cultura. Tomando a perspectiva antirracista dessas atividades,
percebe-se como o ensino das Relações Étnico-Raciais é basilar para qualquer nação e ainda
mais o Brasil, um país com grande diversidade étnica e cultural em sua formação,
especialmente na atividade principal que é a educação pelo incentivo à leitura, como indicam
as Diretrizes,
As atividades de literacia, de incentivo à leitura e fruição de media envolvem
vertentes cognitivas e socioculturais de aprendizagem. Devem ser feitos esforços
38
para garantir que a coleção da biblioteca escolar inclua materiais escritos e criados
local e internacionalmente e que reflitam as identidades nacionais, culturais e étnicas
dos membros da comunidade escolar. O bibliotecário escolar deve assumir a
liderança no sentido de garantir que os alunos tenham oportunidades, em sala de
aula, bem como na biblioteca, para a leitura de materiais que eles próprios
selecionam e para discutir e partilhar com outros o que estão a ler. (IFLA, 2016,
p.47).
Tendo em mente que a Lei 12.244 de 24 de maio de 2010, que dispõe sobre a
Universalização das bibliotecas escolares, sanciona a obrigatoriedade de existência de
bibliotecas nas instituições de Educação Básica, sejam elas particulares ou públicas, é uma
propulsora no reconhecimento da profissão do bibliotecário escolar, ainda assim não é o que
se observa nas instituições de ensino da cidade de Natal, onde as bibliotecas da rede
Municipal não tem bibliotecários formados registrados, como foi constatado no decorrer desta
pesquisa quando entramos em contato com a Secretaria de Educação em 03 de Fevereiro de
2022. Apesar de ter sido instaurada em 2010 a data limite para que o Brasil se adequasse à Lei
foi até o ano de 2020, porém durante essa década indicada, a instabilidade política e
ideológica do Brasil pôs em risco a priorização da Educação influenciando o resultado da
situação atual. A referida Lei indica,
Art. 1o As instituições de ensino públicas e privadas de todos os sistemas de ensino
do País contarão com bibliotecas, nos termos desta Lei.
Art. 2o Para os fins desta Lei, considera-se biblioteca escolar a coleção de livros,
materiais videográficos e documentos registrados em qualquer suporte destinados a
consulta, pesquisa, estudo ou leitura.
Parágrafo único. Será obrigatório um acervo de livros na biblioteca de, no mínimo,
um título para cada aluno matriculado, cabendo ao respectivo sistema de ensino
determinar a ampliação deste acervo conforme sua realidade, bem como divulgar
orientações de guarda, preservação, organização e funcionamento das bibliotecas
escolares.
Art. 3o Os sistemas de ensino do País deverão desenvolver esforços progressivos
para que a universalização das bibliotecas escolares, nos termos previstos nesta Lei,
seja efetivada num prazo máximo de dez anos, respeitada a profissão de
Bibliotecário, disciplinada pelas Leis nos 4.084, de 30 de junho de 1962, e 9.674, de
25 de junho de 1998.
Art. 4o Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação. (BRASIL, 2010).
Pensando na combinação da obrigatoriedade da biblioteca escolar pela Lei 12.244/10,
com a obrigatoriedade do Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira, Africana e Indígena
como

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