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345026215-Candido-2010-Iniciacao-a-literatura-brasileira

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Prévia do material em texto

Autor C and1do. Anton . 1918-
r 11ulo lnic1a~i\o n I11er„cura brasilci 
l l l 11~11111111~ 1111111~ ~II 
4 119 c 189748 
'. 
INICIA<;ÄO A LITERATURA BRASILEIRA 
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~at ,, - 0-\-_....J ___ JLL__io.A.L 1 
1 R.'-~t.. .~.1..o___ -1 
N.F. __ <':?!!.Eti. .... _ --1 . l FORNtC:DGk . .fYl. . ..e_g9~..1.~..s __ , 
L~s-:_? Q..!-s._-:.====-:-.::. - __ J 
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' J 
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1 
~ 
iVEli 10ADE FEDERAL 0C> f'AM 
llU9L 1o·r~CÄ CE,,.TRAl. 
ANTONIO CANDIDO 
INICIA<;:AO A LITERATURA BRASILEIRA 
Ouro sobre Azul 1 Rio de Janeiro 2010 
@ Este resumo 
e dedicado a mem6ria de Joäo Luiz Lafeta 
porque pretendeu ser, como ele foi, 
simples e despretensioso. 
@ fNDICE 
@ Nota previa 9 
@ Tntrodufäo 11 
I. Manifestaföes literarias 17 
II. A configurafäo do sistema literario 33 
III. 0 sistema literario consolidado 65 
@ lndice de nomes 127 
NOTA PREVIA @ 0 que segue e um resumo da lite-
ratura brasileira escrito ern 1987 para leitores estrangeiros, 
como capitulo de uma obra coletiva sobre o Brasil, a ser edi-
tada na Italia no quadro das cornernora<;:öes do 5° Centenario 
do Descobrirnento da Arnerica, tendo corno organizador o 
professor Ricardo Campa. Atendendo a esta circunstäncia, 
o criterio foi dar destaque ao que se pode chamar de mo-
vimento geral da literatura, encarada historicamente, redu-
zindo ao maxirno posslvel 0 numero de autores e de obras . 
citadas, a firn de evitar o tipo catalogo. Tarnbern por isso pu~ 
de lado a pretensäo de inforrnar sobre o estado atual da nossa 
literatura, o que levaria a alinhar uma quantidade de nomes 
amda näo triados pela passagern do ternpo. 0 meu rnarco 
terminal foi o decenio de 1950, depois do qual me limitei a 
dar algumas indica<;:öes. 
Corno a obra italiana acabou näo se concretizando, decidi 
tirar o meu resurno da gavcta e oferece-lo a editora Huma-
nitas, da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciencias Hurna-
nas da Universidadc de Säo Paulo, que o publicou cm i997. 
Reed1tado agora para um publico maior, espero que ajude os 
mtere~sados a apreender um <los modos possiveb de tra<;:ar o 
desenho da literatura bras1leira no ternpo. 
A"oJTONIO CA~I>IDO DE MELLO E SOUZA 
ma10 de 2004 
@ 
9 
INTRODUGÄO @ A literatura do Brasil faz parte das 
literaturas do Ocidente da Europa. No tempo da nossa In-
dependencia, proclamada em 1822, formou-se uma teoria 
nacionalista que parecia incomodada por este dado evidente 
e procurou minimiza-lo, acentuando o que haveria de origi-
nal, de diferente, a ponto de rejeitar o parentesco, como se 
quisesse descobrir um estado ideal de come<;:o absoluto. Tra-
ta-se de atitude compreensivel como afirma<;:äo politica, ex-
primindo a änsia por vezes patetica de identidade por parte 
de uma na<;:äo recente, que desconfiava do pr6prio ser e aspi-
rava ao reconhecimento <los outros. Com o passar do tempo 
foi ficando cada vez mais visivel que a nossa e uma literatura 11 
modificada pelas condi<;:öes do Novo Mundo, mas fazendo 
parte orgänica do conjunto das literaturas ocidentais. 
Por isso, o conceito de "come<;:o" e nela bastante relativo, 
e diferente do mesmo fato nas literaturas matrizes. A lite-
ratura portuguesa, a francesa ou a italiana foram se consti-
tuindo lentamente, ao mesmo tempo em quese formavam os 
respectivos idiomas. Ungua, sociedade e literatura parecem 
nesses casos configurar um processo continuo, afinando-se 
mutuamente e alcan<;:ando aos poucos a maturidade. Näo eo 
caso das literaturas ocidentais do Novo Mundo. 
C..om efeito, no momento da descoberta e durante o pro-
cesso de conquista e coloniza<;:äo, houve o transplante de 
linguas e literaturas ja maduras para um meio fisico dife-
rente, povoado por povos de outras ra<;:as, caracterizados por 
modelos culturais completamente diferentes, incompatfveis 
com as formas de expressäo do colonizador. No caso do Bra-
sil, os povos aut6ctones eram primitivos vivendo em culturas 
rudimentares. Havia, portanto, afastamento maximo entre 
a cultura do conquistador e a do conquistado, que por isso 
sofreu um processo brutal de imposiyäo. Este, alem de geno-
cida, foi destruidor de formas culturais superiores no caso 
do Mexico, da America Central e das grandes civilizayöes 
andinas. 
A sociedade colonial brasileira näo foi, portanto, como te-
ria preferido Certa imaginayäo romäntica nacionalista, um 
12 prolongamento das culturas locais, mais ou menos destrui-
das. Foi transposiyäo das leis, dos costumes, do equipamento 
espiritual das metr6poles. A partir dessa diferenya de ritmos 
de vida e de modalidades culturais formou-se a sociedade 
brasileira, que viveu desde cedo a dificil situayäo de contacto 
entre formas primitivas e formas avanyadas, vida rude e vida 
requintada. Assim, a literatura näo "nasceu" aqui: veio pron-
ta de fora para transformar-se a medida quese formava uma 
z 
sociedade nova. 
Os portugueses do seculo XVI trouxeram formas litenirias 
refinadas, devidas geralmente a influencia italiana do Renas-
cimento, que em Portugal superou a maioria das formas de 
origem medieval, talvez melhor adequadas ao genio nacional 
e sem duvida mais arraigadas na cultura popular. Esta lin-
guagem culta e elevada, nutrida de humanismo e tradiyäo 
greco-latina, foi o instrumento usado para exprimir a reali-
dade de um mundo desconhecido, selvagem em comparn;äo 
ao do colonizador. A literatura brasileira, como as de outros 
paises do Novo Mundo, resulta desse processo de imposi<;:äo, 
ao longo do qual a expressäo literaria foi-se tornando cada 
vez mais ajustada a uma realidade social e cultural que aos 
poucos definia a sua particularidade. De certo modo, po-
deriamos dizer, como um escritor italiano, que a literatura 
brasileira "e a imagem profunda de um mundo que em väo 
chamamos terceiro, pois na verdade e a segunda Europa" 
(Ruggero Jacobbi). 
Portanto, como toda a cultura dominante no Brasil, a lite- 13 
ratura culta foi aqui um produto da coloniza<;:äo, um trans-
plante da literatura portuguesa, da qual saiu a nossa como 
prolongamento. No pais primitivo, povoado por indigenas 
na Idade da Pedra, foram implantados a ode e o soneto, o 
tratado moral e a epistola erudita, o sermäo e a crönica <los 
fatos. 
A partir dai desenvolveu-se o processo de forma<;:äo da 
literatura, como adapta<;:äo da palavra culta do Ocidente, 
que precisou assumir novos matizes para descrever e trans-
figurar a realidade nova. Do seu lado, a sociedade nascente 
desenvolveu sentimentos diversos, novas maneiras de ver o 
mundo, que resultaram numa variante original da literatura 
portuguesa. A hist6ria da literatura brasileira e em grande 
parte a hist6ria de uma imposi<;:äo cultural que foi aos pou-
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Q 
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cos gerando expressäo literaria diferente, embora em corre-
lac;:äo estreita com os centros civilizadores da Europa. 
Esta imposic;:äo atuou tambem no sentido mais forte da 
palavra, isto e, como instrumento colonizador, destinado a 
impor e manter a ordern politica e social estabelecida pela 
metropole, atraves, inclusive, das classes dominantes locais. 
Com efeito, alem da sua func;:äo pr6pria de criar formas 
expressivas, a literatura serviu para celebrar e inculcar os 
valores cristäos e a concepc;:äo metropolitana de vida social, 
consolidando näo apenas a presenc;:a de Deus e do rei, mas o 
monopolio da lingua. Com isso, desqualificou e proscreveu 
14 possfveis fermentos locais de divergencia, como os idiomas, 
crenc;:as e costumes dos povos indigenas, e depois os dos es-
cravos africanos. Ern suma, desqualificou a possibilidade de 
expressäo e visäo de mundo dos povos subjugados. 
Essa literatura culta de senhores foi a matriz da literatura 
brasileira erudita. A partir dela formaram-se aos poucos a 
divergencia, o inconformismo, a contestac;:äo, assim como 
as tentativas de modificar as formas expressivas. A pr6pria 
literatura popular sofreu a influencia absorvente das classes 
dominantes e de sua ideologia.A vista do que ficou dito, podemos discernir na literatura 
brasileira um duplo movimento de formac;:äo. De um lado, 
a visäo da nova realidade que se oferecia e devia ser trans-
formada em "temas", diferentes dos que nutriam a literatura 
da metropole. Do outro lado, a necessidade de usar de ma-
neira por vezes diferente as "formas", adaptando os generos 
as necessidades de expressäo <los sentimentos e da realidade 
local. 
Tudo isso era regido por uma especie de imperativo: ex-
primir o novo sem abandonar o velho, ou seja, manifestar a 
singularidade do Novo Mundo sem perder contacto inspira-
dor com as matrizes do Ocidente, que eram condic;:äo de en-
tendimento entre os homens cultos. Por isso, a critica nacio-
nalista falhou quando viu, por exemplo, no uso das formas 
classicas e da mitologia greco-latina uma diminuic;:äo e uma 
subserviencia. Na verdade, elas eram a maneira de afirmar a 
nossa realidade de "segunda Europa", para repetir o conceito 15 
de Ruggero Jacobbi. 
E preciso, por isso, considerar como produc;:öes da litera-
tura do Brasil tanto as obras feitas pela transposic;:äo pura e 
simples <los modelos ocidentais, quanto as que diferiam de-
les no temario, na tonalidade espiritual, nas modificac;:öes do 
instrumento expressivo. Ambas as tendencias exprimem o 
processo formativo de uma literatura derivada, que acabou 
por criar o seu timbre pr6prio, a medida que a colönia se 
transformava em Nac;:äo e esta desenvolvia cada vez mais a 
sua personalidade. 
De que maneira ocorreu este processo, que näo e neces-
sanamente um progresso do ponto de vista estetico, mas o 
c certamente do ponto de vista hist6rico? Poderiamos tal-
vez esquematiza-lo, distinguindo na literatura brasileira 
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3 
tres etapas: 1. a era das manifestai;öes literarias, que vai do 
seculo XVI ao meio do seculo XVIII; 2. a era de configurai;äo 
do sistema literario, do meio do seculo X VIII a segunda me-
tade do seculo XIX; 3. a era do sistema literario consolidado, 
da segunda metade do seculo XIX aos nossos dias. Entendo 
aqui por sistema a articulac;:äo dos elementos que constituem 
a atividade literaria regular: obras produzidas por autores 
formando um conjunto virtual, e veiculos que permitem o 
seu relacionamento, definindo uma "vida literaria"; publicos, 
restritos ou amplos, capazes de ler ou ouvir as obras, permi-
tindo com isso 
0
quc elas circulem e atuem; tradii;äo, que e 0 
16 reconhecimento de obras e autores precedentes, funcionan-
do como exemplo ou justificativa daquilo quese quer fazer, 
mesmo que seja para rejeitar. 
Na primeira etapa, o Barroco literario e a linha de maior 
interesse. Na segunda, assistimos 1. a transformac;:äo do Bar-
roco; 2. as tentativas de renovac;:äo arcadica e neoclassica; 3. 
a grande fratura do Romantismo e seus prolongamentos. A 
terceira abrange 1. as tendencias finisseculares; 2. outra gran-
de ruptura, que foi o Modernismo <los anos de i920; 3. e as 
tendencias posteriores. 
" E 
MANIFESTA<;:ÖES LITERARIAS 
preciso imaginar o que era o Brasil no seculo XVI, 
para ter uma ideia · do que poderia significar a lite-
ratura transplantada de Portugal. Uma vasta extensäo de 
terras quase totalmente desconhecidas, cujas fronteiras com 
os domfnios espanh6is eram indefinidas, habitada por indf-
genas que pareciam ao conquistador seres de uma especie 
diferente, talvez näo inteiramente humanos. Uma natureza 
selvatica e exuberante, cheia de animais e vegetais ins6litos, 
formando um espa'ro que ao mesmo tempo aterrorizava e 
deslumbrava o europeu. Quanto ao deslumbramento, nada 
mais eloquente do que um <los documentos iniciais sobre 
a nova terra, publicado em 1504 e atribuido a um dos seus 
pnme1ros e mais capazes conhecedores, Americo Vespucio, 
onde se le: "se no mundo existe algum parafso terrestre, com 
certeza näo deve estar longe desses lugares". 
17 
Ao pequeno Reino de Portugal cabia a tarefa sobre-hu-
mana de ocupar, defender, povoar e explorar essa terra in-
cognita, uma das muitas que faziam partc de sua prodigiosa 
expansäo. Essa tarefa se desdobrava em varios aspectos: ad-
ministrativo, econömico, militar, religioso. 
Os homcns que vieram para o Brasil de maneira regular e 
com mente fundadora, a partir de 1530, tiveram inicialmen· 
te necessidade de descrever e compreender a terra e os seus 
habitantes, com um intmto pragmatico nccessario para me· 
lhor dominar c tirar proveito. Ao mesmo tempo, precisaram 
criar os veiculos de comunica<;äo e impor o seu equipamento 
111 ideologko, tendo como base a religiäo cat6lica. 'l'ais homens 
eram administradores e magistrados, soldados e agriculto 
res, mercadores e saccrdotes, aos quais dcvemos os prime1-
ros escritos fcitos aqui. Esses escritos säo dcscri<;öcs do pais e 
seus naturais, relat6rios administrativos ou poemas de fun· 
do religioso, destinados ao trabalho de pregai;äo e convcr-
:,äo <los indios. Dessa massa de escritos destacam-se os <los 
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jesuitas, quc vieram a partir de 1549, e sobretudo os de um 
natural das ilhas Canarias, que ve10 muito JOVem e poderia 
ser cons1derado uma especie de patnarca da nossa hteratura: 
Jose de Anch1eta (1534-1597).1 
1 1 :-;urna smtesc como esta scräo citados apenas os nomes de ma1or relc 
vo em cada fa e, e alguns outros por screm representauvo de tendblc as 
e estilos. Nesta etapa das ·numfesta~öes hteranJs· mencmno os autores 
Homem de boa formac;:äo classica, profundamente identi-
ficado ao pais e aos Indios, devem-se a ele näo apenas relat6-
rios penetrantes sobre a atuac;:äo da sua Ordern, iluminando 
a vida social da colönia, mas obras especificamente literarias, 
em quatro linguas, algumas vezes misturadas: portugues, es-
panhol, latim e tupi. 
A sua principal obra latina e um poema epico sobre OS 
feitos militares do governador-geral Mem de Sa. S6 recente-
mente verificou-se que havia sido impresso em Lisboa no ano 
de 1563, o que Jhe da a posic;:äo de primeiro livro produzido 
no Brasil. Seu tradutor para o portugues, o padre Armando 
Cardoso (1958), assinala a influencia de Virgilio e a pureza 19 
classica do latim de Anchieta, registrando a importäncia de 
uma epopeia feita no calor dos acontecimentos narrados e 
baseada no testcmunho de protagonistas, alem da pr6pria 
expenencia do autor, que colaborou com Mem de Sa. Ao lei-
tor de hoje, impressionam a capacidade narrativa e o estra-
nho gosto pela dcscric;:äo da crueldade. 
Alem dessa obra de maior vulto, Anchieta escreveu poe-
51 s c atos teatrai~ de cunho religioso, sempre com o intuito 
de tornar a fe cat6lica acessivel ao povo, em gerat, e aos indios 
tequ1zados, em parttcular. Usar a lingua espanhola era co-
mum entre os escntores portugueses do tempo. Mas e singu-
r r m do Bra 1 ou aqut produz1ram, stm dtstmguir °' bras1le1ros 
rtugueses que afinal todos eram 
lar a prodm,:äo poetica no idioma dos tupis, grupo linguistico 
que ocupava quase todo o litoral brasileiro no seculo XVI. 
Os jesuitas submeteram esse idioma a disciplina gramatical 
e ele se tornou, com a designac,:äo expressiva da "lingua ge-
ral", o principal veiculo de comunicac,:äo entre colonizadores 
e indigenas; depois, entre os descendentes dos colonizadores, 
muitos deles mestic,:os. A obra de Anchieta e a pratica exten-
siva da lingua geral indicam que poderia ter-se desenvolvido 
no Brasil uma cultura paralela e um bilinguismo equivalente 
ao que ainda existe no Paraguai, devido tambem a catequese 
jesuitica. Essa c6ncorrencia alarmou as autoridades metro-
20 politanas, interessadas em usar o seu pr6prio idioma como 
instrumento de dominio e homogeneizac,:äo cultural, a pon-
to de, no seculo XVIII, proibirem o uso da lingua geral nas 
regiöes onde ela predominava. 
Isto e dito para destacar uma das func,:öes da literatura cul-
ta no Brasil colonial: impor a lingua portuguesa e registra-
-la em escritos que ficassemcomo marcos, ressaltando a sua 
dignidade de idioma dos senhores, ao qua! todos deveriam 
submeter-se, como afinal acabou acontecendo. A näo ser o 
caso das tribos indigenas sobreviventes, e de alguma persis-
tencia da lingua geral na Amazönia, os idiomas indigenas 
foram proscritos, assim como os africanos, que vieram com a 
importac,:äo de escravos. Trata-se de um verdadeiro processo 
de dominac,:äo linguistica, aspecto da dominac,:äo politica, no 
qua! a literatura culta, repito, desempenhou papel importan-
te. Foi pena que a grande percepc;:äo de Anchieta näo tivesse 
seguidores, pois ele combinava a tradic;:äo classica, redefinida 
pelo humanismo do Renascimento, com certos veios mais 
populares da tradic;:äo iberica, visiveis nos autos teatrais e na 
escolha das formas metricas de sua lirica. Alern disso, aco-
lheu e procurou dar dignidade a pr6pria expressäo linguis-
tica do indigena, rnostrando que seria possivel uma cultura 
rnenos senhorial, rnais aberta aos grupos dominados. 
Portanto, o que aqui predominou e deu a tönica foi uma 
literatura de senhores, que transpös o requinte da literatu-
ra metropolitana e nem sempre foi capaz de sentir o carater 
complexo da sociedade nova. Mas e preciso näo encara-la 21 
com espirito de compendio ou manual, isto e, como se as lis-
tas de nomes, obras e temas, pastos em sucessäo no espac;:o 
da pagina, significassem a existencia de uma verdadeira vida 
literaria, que s6 ocorrera a partir do seculo XVIII, quando se 
esboc;:a uma "Republica das Letras". Nos seculos XVI e XVII 
o que havia eram autores ocasionais, ou circunscritos a sua 
regiäo, produzindo obras que na maioria absoluta näo foram 
impressas, inclusive porque o Brasil s6 teve licenc;:a para pos-
suir tipografias depois de i8o8. Algumas dessas produc;:öes fo-
ram editadas em Portugal, rnas outras de grande importäncia 
conheceram apenas a difusäo oral ou rnanuscrita, atingindo 
circulos restritos e so no seculo XIX chegaram ao livro. 
Isolados, separados por centenas e milhares de quilörnetros 
uns dos outros, esses escritores dispersos pelos raros nucleos de ..: 
povoamento podem ser comparados a vaga-lumes numa noite 
densa. Podia haver lugares, como a Bahia, onde se reuniam ho-
mens cultos, sobretudo clerigos e legistas. Podia haver sermöes 
brilhantes que encantavam o audit6rio, ou poetas de merito re-
citando e passando c6pias de seus poemas. No conjunto, eram 
manifestaröes literarias que ainda näo correspondiam a uma 
etapa plenamente configurada da literatura, pois os pontos 
de referencia eram externos, estavam na metr6pole, onde os 
homens de letras faziam os seus estudos superiores e de onde 
recebiam prontos os instrumentos de trabalho mental. 
Durante cerca: de um seculo depois da atividade poetica de 
22 Anchieta, quase näo houve no Brasil a prodw;:äo de escritos onde 
predominasse a imagina<;:äo poetica ou ficcional, excetuando-se 
coisas täo insignificantes quanto 0 primeiro poema epico escri-
to em portugues, a Prosopopeia (1601), de Bento Teixeira (1561-
160 0 ), que s6 tem 0 merito da precedencia. 0 que houve foi uma 
produ<;:äo de crönicas e relatos no sentido ja exposto, segundo 
quatro grandes linhas: informa<;:äo sobre a natureza e os Indios; 
narrativa dos acontecimentos; edifica<;:äo religiosa e catequese; 
defesa da colönia contra invasores estrangeiros, sobretudo fran-
ceses e holandeses. As quatro podem misturar-se na mesma 
obra, e claro, mas sempre ha alguma predominäncia. 
Na primeira linha se enquadram, por exemplo, o Tratado 
descritivo do Brasil em 1587*2 , de Gabriel Soares de Sousa, 
2 I As obras marcadas com asterisco s6 foram publicadas no seculo XIX. 
-
plantador de cana na Bahia, homem culto e perspicaz; e os 
Dialogos das grandezas do Brasil" (compostos pela altura 
de 1618), de outro plantador de cana, Ambrosio Fernandes 
Brandäo. A segunda linha pertence a Hist6ria do Brasil*, 
terminada em 1627, do franciscano frei Vicente do Salvador 
(1564 163?), cronista objetivo e simples. Da terceira linha po-
demos citar a Vida do veneravel padre Jose de Anchieta (1672), 
do jesuita Simäo de Vasconcelos (1596-1671), que e tambem 
autor de uma crönica sobre a a<;äo da sua Ordern no Brasil. 
A quarta linha tem como precursor o poema de Anchieta 
sobre os feitos de Mem de Sa, e nela se enquadram 0 valeroso 
Luczdeno (1648), de frei Manuel Calado (1584-1654), e A nova 23 
Lusitania (1675), de Francisco de Brito Freire (?-1692), obras 
quc podem ter contribuido para desenvolver um esbo<;o de 
~entimento localista entre os colonos, baseado no orgulho 
pelas proezas militares. 
Alguns desses escritores manifestam em grau maior ou 
mcnor o maneirismo do seculo XVI, que aparece inclusive nos 
jogos de palavras e nas antiteses <los despretensiosos poemas 
de Anchieta. Ligando-se a tendencia hiperbolica frequente 
nas descri<;öes da terra, esse espirito de argucia se ajustou 
com facilidade ao Barroco, gerando um veio de exaltada ce-
lebra<;äo do pais, que durante quase tres seculos serviu de 
c:ompensac;äo para o atraso e o primitivismo reinantes. Do 
fundo do seculo XVII ate quase nossos dias, o brasileiro se 
h bituou a mascarar a realidade por meio de imagens e da 
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enfase, que mostravam o seu pais como paraiso terrestre e 
lugar predestinado a um futuro esplendido. 
Isso e visivel na transfigurac;:äo a que a literatura submeteu 
a realidade fisica, substituindo a simplicidade documentaria 
de muitos cronistas por uma linguagem hipertrofiada, que 
embelezou e deu valor simb6lico a flora e a fauna, passando 
delas para os atos do homem. Um exemplo ajudara a com-
preender o que chamo de transfigurac;:äo, processo impor-
tante na formac;:äo da literatura brasileira: o do abacaxi, fruta 
americana que os europeus conheceram com certo pasmo 
e submeteram a um curioso processo de enriquecimento 
24 aleg6rico. Ern muitos cronistas, como os citados, ele e refe-
rido simplesmente como fruta saborosa e rara, mas Simäo 
de Vasconcelos ja o apresenta como fruta regia, armada de 
espinhos defensivos e encimada pela Coroa. E n'As frutas do 
Brasil (1702), do franciscano frei Francisco do Rosario, aale-
goria se eleva a um engenhoso simbolismo moral, pois, diz o 
autor, a sua polpa e doce e agradavel as linguas sadias, mas 
mortifica as que estiverem machucadas, ou seja: ele e como 
a vontade divina, que e ba!samo para as almas arrependi-
das, mas caustica as rebeldes. A partir dai o autor elabora 
um sistema complicado de alegorias teol6gicas, ensopado 
de ret6rica barroca. 0 abacaxi continuou dali por diante a 
sua curiosa carreira, aparecendo em cronistas e poetas, ate o 
seculo XIX, como alegoria e simbolo, valendo por elemento 
representativo do pais. Este pequeno exemplo mostra a im-
portancia do processo transfigurador, que foi favorecido pelo 
Barroco e mais tarde pelo espirito nativista, estendendo-se a 
arcas mais amplas e significativas da realidade. 
No scculo XVII apareceram na zona mais culta da colö-
nia, a Bah1a, duas das maiores figuras da literatura brasileira, 
cuja obra ate hoje permanece viva e presente: Antonio Vieira 
e Grcg6rio de Matos. 
Anton io Vieira (1608-1697) nasceu em Portugal mas veio 
muito novo para o Brasil, onde morreu e onde viveu inter-
mitentemente a maior parte da vida. A outra parte, viveu-a 
na l:uropa. 
Jesuita e catequizador, c contudo o oposto de Anchieta, 25 
que foi beatificado e esta em vias de ser canonizado. Viei-
ra era um homem do mundo, ambicioso e aventureiro, cuja 
\erdadeira vocac;äo foi a politica, tendencia alias frequente 
na sua Ordern. Confessor da rainha de Portugal, conselheiro 
e homem de confianc;a do rei d . Joäo IV, intrigou e armou 
proietos, desempenhou missöes meio secretas na Franc;a, 
Holanda e Itatia, exerceu cargos da sua Ordern no Brasil e 
parece que via na religiäo um lado temporal täo importan-
te quanto o outro. A sua vida foi bastante atormentada.A 
certa altura caiu em desgra\a junto ao novo rei; vindo para 
0 Brasil, fo1 expulso pelo~ colono~ escravag1stas, contra os 
qua1s defendia os ind io~. de volta a Portugal. foi processado 
e lOndenado pela lnquis1c;äo, - mas sempre se rcconstitu iu, 
per egumdo com tenac1dadc certos propos1tos, que revelam 
interessante contraste entre a credulidade messiänica e o 
realismo. Este o fez concebcr planos econömicos avan~ados 
e a aconselhar a alian~a corn os fornecedores disponiveis de 
capitais, os judeus, que sempre defendeu contra a Inquisi~äo, 
preconizando uma politica de toleräncia. Alem disso, era 
obcecado pela prcpara~äo v1sionäria de uma monarquia, a 
portuguesa, predestinada a ser o Quinto Imperio, com sede 
no Brasil. 
Tarnbern como escritor e oposto a Anchieta, po1s em vez 
de ajustar-se a mente do povo e dos ind1os, prefenu impor-
-lhes o estilo rutilante da sua orat6ria, prolixa, densa, cheia 
26 de alusöes alegoricas, nutrida das argucias do raciocinio, 
tendo muitas vezes objetivos temporais sob a supcrficie con-
vencional da doutrina. Corno tinha grande magnetismo, 
despertou sempre o entusiasmo dos ouvintes, fossem eles 
indios, colonos, cortesäos, estadistas, ou Cristina da Suecia e 
os prelados que acorreram para ve-lo pregar em italiano por 
ocasiäo de sua estada em Roma (1669-1675). 
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Os seus sermoes, que ele pr6prio orgamzou na primeua 
edi~äo em quinze volumes, mostram, mesmo sem o calor da 
prcscrn;a, que ele foi o maior orador sacro da lingua. Deixou 
tambem vasta correspond~ncia, da qua! boa parte se preser-
vou e foi editada no seculo XVJll em tres tomos. l:screveu 
ainda relat6rios de grande intcresse e tratados onde da largas 
ao profetismo, como a curiosa Historia do futuro, macabada 
e de publica<;:äo p6stuma. Escritor ardente, correto, a sua Im 
guagem cheia de vigor e harmonia tornou-se um dos mode-
los da escrita classica portuguesa. 
Seu contemporäneo Greg6rio de Matos (1636-1696)3 viveu 
muitos anos na metr6pole, onde se formou em leis, e de volta 
a sua terra. a Bahia, levou uma vida irregular, a que näo falta-
ram escändalos. a prisäo e um exilio na Africa, dando lugar 
a lendas täo tenazes quanto duvidosas. A sua obra poetica e 
das mais altas da literatura brasileira, mas s6 conheceu (par-
cialmente) a forma do livro nos meados do seculo XIX, näo 
tcndo ate hoje sido editada de maneira correta e fidedigna. 
Eie recitava os seus poemas, que cram transcritos por tercei -
ros, ou oferecia os manuscritos a amigos e admiradores, que 27 
os copiavam. 
Nessa obra ha poemas liricos, religiosos e satiricos. que 
constroem um retrato de sua personalidade revolta e um re-
trato do Brasil seiscentista. o ma1s completo ate entäo. Nele. 
näo hä o änimo documentario ou a transfigura~äo hiperb6-
hca, mas o flagrante expressivo ate a caricatura, o ataque se 
elevando a denuncia, a ironia alegre ombreando com a re-
volta amarga, em contraste com a transfigura~äo euf6rica de 
outros autores do tempo. em rela<;äo aos quais a sua poesia 
atmca aparecc como contracorrente desmbtificadora. Eie 
desdcnha as aparencias do mundo e desvenda a sua iniqui -
Os ~ntores scrio designados pelos nomes pelos qu;us säo conhecidos, 
empre os ompletos 
<lade, com um pessimismo rcalista que niio hesita em entrar 
pela obscenidade e a crucza da vida do sexo. Poucos foram 
täo fundo nos aspectos considerados baixos, que ele näo trata 
com a complacencia de um Villon (ao qual foi expressiva-
mente aproximado por Ronald de Carvalho), mas com uma 
especie de 1mpeto justicciro, que forra de inesperado mora-
lismo as suas diatribes. Atraves dessc rebclde apaixonado 
transparcce a 1rregulandade do mundo brasileiro de ent:io, 
com a sodedade onde o branco brutalizava o indio eo negro, 
as autoridades prevaricavarn, os clerigos pe~avam a valer e a 
virtude parccia äs vezes uma farsa dificil de representar. 
28 A poesia rehgiosa e nele marcada pelas tensöes do pecado, 
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enquanto o lirismo amoroso cntra pela idealiza<;äo pctrar-
quiana e camoniana, por meio de uma linguagcm na qual 
os recursos que na satira serviam para efcitos cömicos sc 
tornam veiculos de uma rnmovente pesquba da alma c do 
sentimcnto. E o caso de certos tra<;os qucridos do espirito 
barroco, como a antitese, o jogo de palavras, o equivoco, que 
usa de mancira parecida ade seus mestres espanhois: Gon 
gora e Qucvedo . 
Alem desses dois homcm eminentes, c dos prosadorcs de 
que citamos alguns, o seculo XVII pouco tem a oferecer ao 
leitor de hoje. Anotemos que a vida relig1osa e c1vil continua 
va a fornccer ocasiöes para uma espccie de literatura oficial 
e comemorativa: celebra<;äo de datas da Casa Real, festas de 
santos, chegada ou part1da de d1gnatarios. Nesses momcn 
tos, o~ lctrados da colönia, sobretudo clerigos, produziam 
sermöö, discursos, descri<;öes, sonetos, odes, epistolas, 
mostrando o cunho pesadamente oficial da vida literaria e 
a fun<;äo social das letras, como elemento de solidariedade 
entre os homens cultos e de refon,:o dos valores religiosos da 
met ropole. Essa atividade se intensificou no seculo XVlll, 
quando, a exemplo do que era feito em Portugal, fundaram-
-se aqu1 algumas associa<;öes que tencionavam du rar, as Aca-
dcmias. Nelas, a atividade intelectual ganhou maior solidez 
e constituiu um elemento importante na forma<;äo da vida 
litcrana, pela regulariza<;äo de um pequeno publico. A pro -
du<;äo desses gremios ficou na maior parte manuscrita; so 29 
nos nossos dias foi reunida e publicada em 17 volumes num 
corpo homogeneo por Jose Aderaldo Castello. 
A esse espirito entre devoto e cortesäo se vincula um es-
cntor de ccrto interessc, Manuel Botelho de Oliveira (1636-
1711), excmplo tipico do falseamcnto a que chegou o espirito 
barroco nos seus aspectos menores, quando a argucia virou 
Jogo pedante e a sutile1a um mero exibicionismo, dando a 
ampressäo de que a palavra rodava em falso, a procura de 
nad f: o que vemos quase sempre no material da Acadcmia 
Bra tht dos Esquecidos, fundada na Bahia em 1724, e extin-
ta no ano segumte, depois de intensa atividade. Um dos seus 
fundadores foi Sebastiäo da Rod1a Pita (1660-1738), escritor 
fi cundo como poeta, cronista, orador, que de ccrto modo co -
r a pnmeara era da nossa hteratu ra com a ua f fütoria da 
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America portuguesa (1730). Este livro e marcado pelo änimo 
hiperb6lico e transfigurador com que a natun:za e os fatos 
eram vistos, num exemplo eloquente da fun<;äo que o Barro 
eo exerceu como apoio para a ideologia do nativismo, isto e, 
a forma<;äo do sentimento de apre<;o pelo pais e a tendencia 
para compensar as suas lacunas por meio da deforma<;äo re-
dentora. 
Salvo Jose de Anchieta, que viveu no Sul, quase todos os 
escritores e todos os fatos ltteränos mencionados ate aqui ti-
veram como sede a Bahia, que era entäo a capital do Brasil. 
Lase concentravam a cultura, o maior refinamento <los cos-
30 tumes, o maior podcrio econömico. Portanto, o que vimos 
ate agora foi mais uma literatura local da Bahia, diretamente 
ligada a metr6pole, onde 1am formar-se OS homens cultos. A 
partir da metade do seculo XVIII ocorre uma ~ignificativa 
amplia<;äo de ämbito, com a descoberta das minas de ouro 
e de diamantes em regiöes do Sul e a neccssidade de defi-
nir as fronteiras meridionais com os dominios espanh6is do 
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rio da Prata. 0 eixo polit1co se desloca e o Sul adquire uma 
importäncia que crcscerä ate os nossos dias, predominando 
cada vez mais na vida do pais. No deLenio de 2760 a capital e 
transferida para o Rio de Janeiro, porto de entrada da reg1ao 
das minas, eo governador-geral se torna vice-rei. A v1da ur 
bana tem grande impulso, criando condi~öes para um flores-
cimento cultural que transforma o Rio de Janeiro, modifica 
Säo Paulo e, penetrando fundono interior, ve surg1r na ca 
pitania das Minas Gerais manifesta<;:öes importantes na ar-
quitetura, na escultura, na musica e na literatura, fazendo da 
segunda metade do seculo XVIII um momento de densidade 
cultural, näo concentrada apenas num lugar, mas come<;:an-
do a manifestar-se em outros simultaneamente. Mais ainda: 
o movimento das Academias estabeleceu os primeiros la<;:os 
vish eis entre intelectuais <los diversos pontos da colönia, 
ajudando a formar o sentimento de uma atividade literaria 
comum. 
Em 1758, um jovem do Rio de Janeiro, Feliciano Joaquim 
de ~ousa Nunes (173?·180?), publicou em Lisboa o primeiro 
e unico volume de uma obra que deveria ter sete, Disrnrsos 31 
polltico mora1s, sendo a edi<;:äo confiscada e destru1da por 
ordern do governo. Talvez essa incrivel severidade em rela-
<;:ao a um es..:ritor nada heterodoxo se deva ao fato de, nele, 
aparecer algo novo, embora de maneira discreta o descon-
tentamento do intelectual da colönia. De fato, Sousa Nunes 
msmua que o brasileiro nao tinha oportumdades, sofna o 
menosprezo <los reinö1s e a sua produ<;:äo mental ficava na 
ob cundade. Era sem du' ida uma afirma<;:äo nativista, mar-
ndo o de eio de que fosse reconhecida a expressäo cultural 
d Bra 11. 
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A CONFIGURA<;:AO 
DO SISTI:MA LI I 1'.RARIO 
UliiVERSIDAO! rl!DF.R~!. DO ~1 
BIBl.JOTEC..4 CENTRAl . 
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1 nd1cios como estes mostram quc a partir da metade do seculo XVlll ja se podc fa lar pelo menos do csboc;:o de 
uma hteratura como fato cultural configurado, e näo apenas 
como producröes individuais de pouca repercussäo. A cons-
c1enc1a de grupo por partc dos intelectuais, o rcconhecimen-
to quc passou a cxistir de um passado literario local, a maior 
re~ept1\ 1dade por parte de publicos, embora debeis e pouco 
numcrosos, comec;:am a dcfinir uma articulacräo <los fatos li-
teranos Fsta fo1 a importancia deci iva do scculo XVIII, cuja 
ba e o mov1mento das Academ1as c cujo coroamento serä a 
afirmac;: o estrategica de autonomia no seculo XIX 
A Al dem1a <los Rena c1dos, fundada em 1759 na Bahia, 
pr ent um s1g01ficat1vo elemento novo: cla recruta söcios 
no ..,ul mostrando quc comec;:ava a haver articulac;:öe' entre 
h culto A sua orientac;:äo ainda cabc dentro do 
33 
espfrito ret6rico, que ja näo predomina na Academia Cien-
tifica, fundada em 1771 no Rio de Janeiro, näo por magistra-
dos e proprietarios rurais, mas por medicos interessados no 
conhecimento racional da natureza e sua explorayäo para o 
bem coletivo. Transformada em 1786, com o nome de So-
ciedade Literaria, ela durou ate 1795, quando foi fechada 
sob a alegayäo de que os seus membros pregavam doutrinas 
subversivas, baseadas em Rousseau, Mably e nos enciclope-
distas franceses. Ja entäo os intelectuais da colönia estavam 
acertando o passo com a Filosofia das Luzes, a que se ligou 
de certo modo a transformayäo estetica conhecida em Por-
34 tugal e no Brasil sob o nome de Arcadismo. Ela comeyou em 
Lisboa na Arcadia Lusitana (1756) e teve como objetivo com-
bater o artificialismo, a falsa argucia e o palavreado oco a 
que haviam chegado as tendencias barrocas na sua fase de 
decadencia. A exemplo <los classicos franceses e <los arcades 
italianos, os seus membros procuravam uma dicyäo mais na-
tural e se interessavam pela modernizayäo da sociedade, do 
ensino, do governo. Na pratica, permaneceu muito do espfri-
to barroco, misturado a naturalidade e ao realismo. 
No Brasil, o Arcadismo e contemporaneo da passagem do 
eixo poHtico e econömico para o Sul. No Rio de Janeiro e nas 
cidades da capitania das Minas Gerais ocorre o movimento 
cultural e literario mais caracteristico na segunda metade 
do seculo XVIII e comeyo do seculo XIX, ja ligado a crise do 
estatuto colonial e as aspirayöes de independencia em rela-
i;:äo a metr6pole. Alguns poetas arcadicos seräo processados, 
presos, desterrados devido a sua posii;:äo critica em relai;:äo 
ao governo portugues e a projetos mais ou menos vagos de 
separai;:äo. 
Esse momento e de amadurecimento para todo o Brasil, 
que finalmente adquire um contorno geografico bem pr6xi-
mo do que tem hoje e ve nucleos de povoamento se espalha-
rem por todas as regiöes, embora a populai;:äo fosse rala e 
continuasse concentrada no litoral e adjacencias. Esse ama-
durecimento se reflete na quantidade de homens cultos que 
atuaram aqui e na metr6pole - sacerdotes, naturalistas, ad-
ministradores, matematicos, poetas, publicistas -, formando 35 
o primeiro grande conjunto de brasileiros capazes de ombre-
ar com os naturais de Portugal. 
Na literatura, sobressai um grupo de poetas que nasceram 
ou viveram em Minas Gerais e no Rio de Janeiro, quase to-
dos marcados pelo espirito renovador da Arcadia Lusitana, 
e alguns deles realmente modernos pela escrita e a atitude 
mental. 
Comecemos por um mais velho, que näo se ligou aos ou-
tros e foi sob muitos aspectos retardatario, pois adotou a 
maneira camoniana e näo participou da Ilustrai;:äo: o frade 
agostmiano Jose de Santa Rita Duräo (1722-1784). 0 seu poe-
m' ep1co Caramuru (1781) e mesmo uma resposta ao peque-
no poema Uraguai (1769), onde Jose Basilio da Gama (1741-
1795) manifestava mentalidade ilustrada e antijesuitica. Um 
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e outro expunham pela primeira vez um novo modo de ver o 
confronto entre colonizadores e indfgenas, maneira moder-
na em que sobressai o aspecto de choque das culturas, com 
um espirito de perplexidade ante a destruii;:äo da vida do in-
dio, que ambos haviam aprendido a compreender e respeitar. 
Mas enquanto Basilio da Gama o fez de maneira inovadora, 
num pequeno poema carregado de modernidade para o tem 
po, Duräo se apegou ao modelo tradicional d'Os Lusiadas, 
com a mesma oitava heroica de decassHabos, a mesma di-
visäo em dez cantos, misturando a tradii;:äo renascentista a 
restos do estilo cultista. 
36 Sob certo aspecto, o Caramuru e uma chave de ab6bada 
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formando par com a Hist6ria, de Rocha Pita. Eie faz uma 
especie de balani;:o da colonizai;:äo, no momento em que iam 
aparecer as tendencias nativistas mais atuantes, que leva 
riam a Independencia em i822. E a sua materia smtetiza as 
linhas tematicas que vimos acima: descrii;:äo hiperb61ica da 
natureza; descrii;:äo da vida indigena; celebrai;:äo da defesa 
do pafs contra invasores estrangeiros, vista como epis6dio 
da implantai;:äo da fe verdadeira, a cat6lica, elemento central 
desse poema eminentemente religioso. 
0 Uraguai e, ao contnirio, moderno pelo laicismo, a so 
lui;:äo formal e 0 espirito de adesäo a politica do despotismo 
ilustrado, representado em Portugal pelo governo do mar-
ques de Pombal. A sua maneira de descrever o choque de 
culturas, fatal para a do indio, implica em relai;:äo a este uma 
adesäo simpatica e melancolica, que prenuncia o indianismo 
romantico e amaina a tonalidade epica em favor do lirismo. 
Apesar do tema heroico, tambem na forma predominam os 
matizes liricos, traduzidos num verso branco fluente e me-
lodioso, que parece matriz de versos romanticos. Esses dois 
poetas foram considerados pelos romanticos como fontes da 
poesia "nacional", porque tomaram como personagem o In-
dio, que ia-se tornando aos poucos uma especie de simbolo 
da patria. 
As tendencias ilustradas do governo de Pombal, das quais 
Basilio da Gama foi adepto, tiveram a adesäo de outros escri-
tores brasileiros, que celebraram as suas reformas, como tres 37 
poetas que conviveram em Minas e participaram dos proje-
tos de separa<;:äo politica, conhecidos pelo nome de Inconfi-
dencia Mineira (1789): Claudio Manuel da Costa, Alvarenga 
Peixoto e Tomas Antonio Gonzaga. 0 primeiro suicidou-se 
na prisäo, os dois outros morreram exilados na Africa. 
Claudio Manuel da Costa (1729-1789) e um poeta de tran-
si<;:äo entre Barroco e Arcadismo, que tambem, como Duräo, 
parece remontar ao seculo XVI e aos modeloscamonianos. 
A tradi<;:äo petrarquista e visfvel nos seus admiraveis sonetos 
de toque maneirista, alguns <los quais escritos em italiano, 
lingua que cultivou com destreza. Nos sonetos e nas eclogas, 
surpreendemos uma curiosa impregna<;:äo da natureza ro-
chosa de sua regiäo natal (a das minas de ouro), quese infiltra 
no modelo virgiliano, compondo uma especie de dialogo im-
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plicito entre colönia e metr6pole, barbarie e civili7.a~äo. Isso 
apareceria de forma explicita no poema epico Vila Rica• (c. 
1773), cm que narra o encontro das culturas e a vitoria da or-
dern civil sobrc a confusäo <los aventurciros a busca de ouro. 
Ern Claud10 ocorrc um procedimento tematico de certo 
alcance na forma~äo de uma sensibilidade nacional na lite-
ratura: a da mctamorjose - que consiste em irnaginar que 
acidentc> naturais, como ärvores, rios, montanhas, säo pcr-
sonagens mito16gicas transformadas. Com isso, a realidadc 
do pais e traduzida em termos da tradi~äo clässJC. e d cer 
to modo, se consagra perante a moda literaria do Ocidente. 
JS Este proced1mento e importante na obra brasileira de um <los 
fundadores da Arcädia, Cruz c Silva (1731-1799), que viveu no 
Brasil como magistrado vintc anos da sua vida e aqui produ 
ziu muito, inclusive a seric de poemas dcscritivos, nalguns 
dos quai> aparcce o referido tratamento antropornorfico. 
Esta tendencia terä certo papel nas gcra~öes futuras, em poe 
mas neoclassicos tardios e na obra de alguns rornänt1cos. 
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A realidade da regiäo mineira aparece, mas agora corn fe1 
~äo realista, em alguns poemas de Alvarenga Pcixoto (1744 
1793) e de Tomas Antönio Gonzaga (1744 1810), que sofreram 
a mflucncia de Claud10 Manuel da Costa e tormaram com ele 
um grupo de amigos fraternos. Gonzaga e o ma1s moderno 
deles, o que atingiu os ideais arcadicos de naturalidade na 
turalidade relat1va, e claro, pois 0 ponto de referenc1a era a 
complica~äo extrema do Barroco final. 
A sua obra lirica consiste numa colec;äo de poemas amo-
rosos dcdicados a pastora Marilia, que, ao contrario da pro· 
duc;äo dos outros arcades, tiveram grande voga no Brasil e 
cm Portugal, sendo que muitos deles foram musicados e se 
tornaram canc;öes d1fundidas no povo. Deve se distinguir 
nelc uma parte anacreöntica, em metros curtos, que tem a 
fmolidade amaneirada do Rococ6, e uma parte de analise 
pessoal e debate sobre o destino, escrita quase toda no cär-
cerc em metros longos e com grande densidade espiritual. 
Nesta aparece uma visäo horaciana da v1da, na qual certos 
crlt1cos viram com razäo uma poesia burguesa muito mo-
derna no tempo, voltada para o cotidiano e a consciencia do 39 
eu. Alem disso, hoje se atribui a Gonzaga, com ccrteza quase 
b oluta, a autoria do poema satirico inacabado Cartas c11ile-
na • (1789}. no qual assume posic;äo de revolta aristocratica 
1. ntra c.erto governador de Minas Gerais, populista e ,1cu-
ado por ele de nepotismo c corrupc;äo. E grande a impor-
t nc1a deste poema como dcscric;äo e analise da sociedade 
d tempo, em ver os brancos de boa fatura, valcndo como 
d umento do mconformi mo das elites coloniais contra a 
n trac;ao metropohtana 
e a produc;ao e de fato marcada pelo requinte das 
h1stoncamente 1mporta como maneira de confirmar 
mmenc1a soc1al <los grupos cultos da colönia, ja impa-
om a prepotencia de Portugal e interessados nos mo· 
r oluc1onano <los Estados Umdos e da 1-ranc;a. 
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Mu1to inclinado neste sentido foi um amigo e companhei-
ro de Basilio da Gama, Silva Alvarenga (1749 -1814), que, de-
pois de graduar-se na Universidadc de Coimbra, cm Portu 
gal (como todos os demais), viveu no Rio de Janeiro, onde 
tcvc papcl de mestre e formador de muitos que participariam 
da Indepcndcncia. 
A sua pos1~äo ideolögica e estetica foi bastante definida 
dcsde os tempos de cstudante cm Portugal, quando escreveu 
o poema her6i-cömico 0 descrtor (1774), apoiando a modcr 
niza<;äo <los cstudos universitärios emprccnd1da pclo mar 
ques de Pombal por influcncia do pcnsamento tlustrado. Fm 
40 poemas didäticos, exprimiu uma posu,;äo neod,\ssica eo gos 
to pela manifosta<;äo do sentimentalismo que apareceriam 
na sua obra principal, Glaura (1799), serie de madrigais c de 
pcqucno.s poemas de grandc c fäcil mustCaltdade, a que cha 
mou rondos, construidos segundo um esquema de cstnb1lho 
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obrigatorio, inventado por ele a partir da adapta~äo de mode 
los 1tahanos, sobretudo arias de Mctastas10.1Alem disso, fo1 o 
pnnc1pal animador da Sociedade l itcr:ina, ja citada, espec1e 
de clube liberal que insinuava a mudan<;a do estatuto polltico 
da colön1a. Por isso, foi preso c pnKessado com d1versos ou 
tros companheiros, passando na prisäo quatro anos 
Aderindo as reformas bruta1.s ma.s progress1stas do mar 
que:. de Pombal, os intelectuais brasile1ros se opuseram em 
geral ao retroce.sso que segum ä sua queda. Assim como Al 
varenga cscre' cra 0 descrtor em apoio ä reforma umvers1tä 
na, Francisco de Mclo Franco (1757-1823), medico que foi o 
mtrodutor da pucricultura no mundo luso-brasilciro, satiri-
zou a volta da rotina no pocma 0 reino da estupidez• (1785). 
Ao mcsmo tipo de atitudc ilustrada pertcnce Sousa Caldas 
(1762 1814), adepto das idcias de Rousseau, que foi proces-
sado pela Inquis1c;äo e, apcsar de ter se ordcnado sacerdote 
ma1s tarde, näo abandonou as ideias liberais, que aparecem 
no pocmcto didatico As A\ rs. Escreveu pocmas de rigoroso 
corte neoclassico e, dcpois da ordenac;äo, dedicou-se a poe-
sia rehgio~a. traduzindo partc dos Salmos de Davi, alem de 
ganhar fama como prcgador. Hoje interessam dois escritos 
dclc· uma encantadora epistola cm verso c prosa, escrita na 41 
v1 gern para a Italia, em 1790, ondc toma posic;äo contra a 
ltram dos modclos grcco-latinos, e um livro sob a forma 
d artas, na maior parte perd1das, tlpicas das posic;öes mais 
a anc;adas dos intelectuais brasile1ros as vcsperas da Inde-
pendcnc1a. 
1'.m 1808 contcceu um fato dcc1sivo para o Brasil, o mais 
mportantc, ate entäo, depois de scu descobrimento em 1500: 
d da Fam1ha Real Portuguc~a. acompanhada por parte 
te do func10nahsmo, fugindo a invasäo napoleonica 
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u f z do Rio de Janeiro a sedc da monarquia e acclcrou 
do progresso, mclus1ve mtclcctual. 
d1 er que s6 naquela altura comec;ou para nos a cra 
r fia com a 1mprc sao de livros e o surg11nento de 
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om 1 so, a hegcmoma cultural sam dos comen- = 
tos para ter nas atividadcs laicas o seu ponto de apoio, inclu-
sive grac;as a fundac;äo de escolas tecnicas e supcriores. Ao 
mesmo tempo o pais adquiriu a possibilidade de comunicar-
sc com outros centros de cultura alem de Portugal, e recebeu 
deles contribuic;öes, como uma missäo artistica francesa e a 
visita de viaJantes alemäes, ingleses, franceses, russos, muitos 
deles cicntistas de valor, que escreveram boas dcscric;oes da 
sociedade local e contribuiram para nos tornar conhecidos. 
Eminentes estadistas, funcionarios, escritorcs, s:ibios, 
administradorcs, que antes prestavam servic;o na metr6po 
Je, voltaram ao seu pais; e os que viviam aqui encontraram 
42 maior campo de 3\;'äo. Fm 1816 o Brasil foi clevado ä catcgo 
ria de Reino Unido, e quando o rei d . Joäo VI voltou a Lisboa, 
cm 1821, os brasilciros näo sc conformaram com a perda de 
status. A Independencia foi prodamada no ano seguinte pelo 
principe hcrdeiro, quc ficara como regente e sc tornou impe 
rador com o nome de Pedro 1. 
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~esses acontecimentos os intelectuais tiveram papcl 1m 
portante e a literatura adquiriu novas tonalidades, com a 
poesia patri6tica, o ensa10 politico, o sermao nacionahsta 
fazendo dessa fase entre o firn do seculo XVIII e o adven 
to do Romantismo, nos anos de 1830, um momento de m 
tema participac;äo ideol6gica das letras. Doponto de v1st 
estritamente hterario, a produc;äo foi secundana, para d1zer 
o menos. Poetas rotine1ros, alguns de tipo arcad1co, outro~ 
mais propriamente neoclass1cos, raros denotando trac;o 
que poderiam ser chamados de pre-romanticos. Elementos 
pre-romanticos podem ser considerados o carater afetivo 
que a religiäo foi assumindo (mais estado de alma do que 
devo<;:äo), a languidez sentimental, certa pieguice melanc6-
lica associada ao luar, aos salgueiros e aos lugares sombrios. 
Por outro lado, assume conota<;:äo francamente patri6tica o 
nativismo pitoresco, que vinha do fundo dos tempos colo-
niais, assim como a celebra<;:äo dos feitos militares do pas-
sado. Näo e preciso citar, num resumo como este, os nomes 
secundarios dessa fase de rotina e debil transi<;:äo. Basta dizer 
que com a Independencia desenvolveu-se cada vez mais a 
consciencia de que a literatura brasileira era ou devia ser di- 43 
ferente da portuguesa, pois o criterio da nacionalidade ga-
nhou no mundo contemporaneo uma importancia que supe-
rou as considera<;:öes esteticas. 
Portanto, esse foi um momento de defini<;:öes criticas im-
portantes, tanto mais quanto coincidiram com o Romantis-
mo, que, num pais novo, recem-chegado a independencia 
pohtica, adquiriu o cunho redentor de liberta<;:äo dos pa-
droes classicos, identificados a era colonial. Nesse sentido, 
tnflu1ram OS pontos de Vista criticOS do frances rerdinand 
Denis, autor do primeiro escrito onde se reconhece uma li-
teratura brasileira distinta, o Resume de l'Histoire Litteraire 
du Rresi/ (1826) . Den1s, que viveu aqui alguns anos e se ocu-
pou de assuntos brasileiros pelo resto da vida, manifestava 
0 ponto de v1sta nacmnalista recente: um pais independente 
..... vt:~su.: „ -~ fl~OERAL OQ 't'/U'f"f-· 
te1.101·~cA ~NTfUI. 
possui uma literatura independente. No caso, esta deveria 
afirmar se pda des ... ric;äo da natureza especifica dos tr6picos 
c os tcmas indigenas. Um verdadeiro convite ao exotismo, 
que cabia na mentalidadc romänt1ca e os nossos escntores 
accitaram com entusiasmo. 
Com cfeito, o apclo de Den1s foi ouvido anos depois por 
alguns jO\ens que esta\am estudando em Paris, ondc fun 
daram em 1836 a revista Niteröi, em ... ujo primeiro numero 
aparcccu o manitcsto fundador, escrito por Gonc;alvcs de 
Magalhäcs, precomzando o abandono da mttologia dass1ca 
c dos modelosportugucscs, propondo o indio como tema na 
44 donal, a emoc;äo rcligiosa wmo criterio eo sentimcntahsmo 
como tonalidade. hstava come\ando o nosso Romant1smo, e, 
s1mbolicamcnte, 1sto aconteoa na Franc;a, que scna a part1r 
de entao o principal ponto de rcfercnc1a para os escntores 
brasilei ros. 
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Fntn„• Ar ... adismo c Romantismo ha uma ruptura esteuca 
evidente, mas ha t,1mbem continuidade h1st6nca, p01s am 
bos sao momcntos solidarios na formac;äo do s1stema Litera 
rio e no deseJO de ver uma produ\äo rcgular func1onando na 
patria. Significativamentc, os romänticos consideravam seu 
precursores OS poctas claSslCOS da segunda metade do sfruJo 
XVIII e comec;o do seculo XIX que versavam tema md1gena 
e relig1osos„ 
No Arcad1smo predomma a töm ... a quese pode cons1derar 
mais cosmopolita, intimamentc ligada as modas literana 
da Europa, desejando pertencer ao mesmo passado cultu-
ral e seguir os mesmos modelos, o que permitiu incorporar 
os produtos intelectuais da colönia inculta ao universo das 
formas superiores de expressäo. Ao lado disso, o Arcadismo 
continuou os esboc;:os particularistas que vinham do passado 
Jocal, dando importancia relevante tanto ao Indio e ao con-
tacto de culturas, quanto a descric;:äo da natureza, mesmo 
que fosse em termos classicos, como o recurso a mctamorfo-
c e äs referencias pastorais. 
No Romantismo predomina a tönica Jocalista, com o es-
forc;:o de ser difercntc, afirmar a peculiaridadc, criar uma 
exprcssäo nova e se possivel unica, para manifcstar a singu 45 
landade do pais e do eu. Dai o desenvolvimento da confissäo 
do p1toresco, bem como a transformac;:äo em simbolo na-
onal do tema indigena, considcrado essencial para dcfinir 
rater brasileiro, e portanto lcg1timo, do texto. 
Mas e c.laro que isso continuou a ser feito sob influencia eu-
rop 1a dcvido a nossa ligac;:äo organica com a cultura ocidcn-
1 1 pe ar das afirma.,.oes ut6picas de originalidadc radical. 
n Chateaubriand marcaram o indianismo mais do que 
da Gama ou Duräo, enquanto a poesia rcligiosa e sen-
t 1 egu1u os passo de Lamartine. A alegada indepen-
1t rana fo1 em parte uma subst1tu1c;:äo de intlucncias, 
f ranc;:a tomando o Iugar da metropole portuguesa. 
d ontmu1dade entre Arcadia e Romantismo, näo 
tenha hav1do um momento de transic;:äo onde 
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os primeiros romänticos parecem :ircades retardados, as 
sim como alguns arcadcs pareciam romänticos antccipados. 
Apesar do manifesto de 1836, i.6 dez anos depois surgem 
obras que podem ser consideradas de fato romänt1cas. 
Antes de falar delas, e preciso ins1stir um pouco mais nas 
continuidades, inclusivc porque elas säo a base do que serao 
as transformac;öes. Eo caso da poesia anfigurica, mergulhada 
no absurdo, da qua) temos raros documentos, mas que foi cul-
tiva<la, no comec;o do seculo XIX, por certos poctas populares, 
e, depois de 1840, pelos estudantes da Faculdade de Dire1to de 
Säo Paulo. Atravcs do ahsurdo comunicam-sc os dois momen 
46 tos da literatura brasileira, forman<lo a basc de onde emerg1 
räo poetas de voo mais largo, a exemplo de Sousa Andrade, 
conhec1do como Sousändrade (183_~-1902), em meados do 
seculo XIX. Este foi cm nossos dias restaurado pela crittca de 
vanguarda, como expcrimentador ousado e quase precursor 
cm ruptura com as temlencias dominantes no seu tempo 
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Outro veio e o da poesia satinca, que passa por c1ma das 
modas e das escolas, fora versada por Greg6no de Mato 
no seculo XVII e nunca mais deixou de ser praticada na ua 
facilidade coloquial de censora dos costumes, para no R 
mantismo ter rcprescntantes de interesse, como Lu1s Gama 
(1830-1882). (Um pequeno poema deste, Q~HM SOU L ?, C d 
miravel pela forc;a desmistificadora da comicidade com que 
denunc1a a tohce do preconce1to de cor em nossa soc1ed d 
largamentc mestic;a.) 
Dcssas continuidades que irmanam os periodos por cima 
das fraturas esteticas e ideo16gicas, talvez a mais importante 
seja a da poesia musicada. 0 seculo X\'Ill, em Portugal e no 
Brasil, foi fertil neste terreno, sobretudo com o nascimento e 
a grandc voga das modinhas, can<;öes inspiradas pclas arias 
de opera, cheias de fiorituras, länguidas e sentimentais, que 
avassalaram a sensibilidade dos ärcades e dos pre-romänti-
cos. Ja v1mos que muitos pocmas de Tomas Antonio Gonzaga 
foram musicados, c houve um poeta brasileiro seu contem-
poräneo que praticamente cncarnou o espirito da modinha, 
nJo apcnas porque as compös, mas porque as cantava nos 
aloes de Lisboa: Domingos Caldas Barbosa (1738-1800). 47 
Ora durante o Romantismo deu-se uma invasäo ainda 
ma1 completa da poesia pcla musica, devido näo apcnas 
mprego sistematko <los procedimentos metricos mais 
lod10 os, mas porque generalizou-se o häbito de musicar 
P0 m s eruduos. Este trac;o une os dois periodos e contribui 
m ambos, mas sobretudo no Romantismo, para dar a poe-
penetra<;ao popular maior, quebrando a scpara<;ao 
entre cultos e mcultos num pais onde os homem ins-
m pequena mmona. 
Arcad1smo e Romant1smo säo dois momento:. 
o proce so de forma<;äo do sistcma litcrario, ao 
mpo opostos c complementares. 0 Romant1smo 
mportanc1a h1st6nca, porquc atuou num pais 
de den 1dade cultural aprcciavel em compa-
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rac;:äo com a do seculo anterior. A partir de 1808 foi inmter 
rupto o movimcnto de criac;:äo <los mais diversos instrurncn 
tos culturais, inclusivc as escolas deensino supcrior, que o 
Brasil nao possu1a, obngando os seus filhos a irem cstudar 
na Europa. sobretudo Portugal. Assim e que foram surgin-
do bibliotccas, associac;:ücs c1cntificas e literarias, tipografias 
jornais, revistas, teatros. Ern torno do lnstituto Histonco e 
Geografico. fundado em 1838, e de revistas como a Mmcrva 
Brasilrcnse (1843-1845) c a Guanabara (1851 1855), org.m1 
Laram se, ao lado da pesquisa historica, o dcbate de 1de1as 
e a analise critica, inclusive com a formac;:äo de uma tcoria 
.\!! nacionalista da literatura e com o estudo s1ste111atico do pas 
sado litcrano. 0 segundo imperador, Pedro II (1825 1891) 
que remou de 1840 a 1889, era homcm culto e apa1xonado 
pelo saber, tendo excrddo nao apenas o mecenato, mas um 
estimulo constante para o desenvolvimento das letras e da 
c1encias chcgando ele pr6prio a participar sob pseudommo 
de uma polemh.:a litcrana. 
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No decenio de 1840 apareceu o romance, genero que te 
grandc exito c mostrou exccpcional \'ltalidadc Ao me mo 
tempo floresceu o maior comcdi6grafo bras1lc1ro, Mart 
Pena (1815-1848). Ambos os fatos ennquecem o panoram 
literano, quebrando pela sua tcndencta reahsta o sent1me 
talismo e a idcalizac;:äo romäntka, quc entretanto se mam 
festanam tambem no teatro e na narrat1\a, ape ar de t 
~ na poesta a sua sedc prmc1pal. 
Os primeiros poetas brasileiros considerados romänticos 
säo mediocres. Gonc;alves de Magalhäes (1811-1882) foi a 
princ1p10 um arcade estrito, mas a sua estadia em Paris lhe 
trouxe a revclac;äo das novas tendencias, que abrac;ou com 
entusiasmo, vendo nelas sobretudo religiäo e patriotismo, 
scndo que a forma mais legitima deste estaria no indianis-
mo, tendencia a quc consagrou um fastidioso poema epico 
em dez cantos. Chefe de escola, cioso da sua lideranc;a, foi 
aclamado como fundador da literatura verdadeiramente na-
c10nal e reverenciado por um grupo de fervorosos seguido-
res. Mas na perspectiva de hoje o primeiro poeta romäntico 
de valor e Gonc;alves Di;lS (1823-1864), que e tambem 0 unico 49 
md1amsta de interesse da nossa poesia. 0 seu poemcto 1-JucA 
1 MA, obra de grande qualidade, narra a hist6ria de um 
pn 1one1ro que vai ser sacrificado ritualmente por uma tribo 
n rn1ga 0 relato se desdobra como dcmonstrac;äo de virtuo-
1 mo usando os mais variados metros e sugcrindo com rara 
stna tanto os movimcntos quanto as emoc;öes. 
A u poes1a hnca, na qua] ha mais alguns bons poemas, 
md1amsta ou fora dele, se caracteriza pda seguran-
gua que oube mampular com pureza elegante, äs 
afetada. 0 scus Prmrciros car1tos (1846) o con-
mo grande modelo <los jovens, e <lurante todo 
nti mo fo1 um <los pontos de referencia da pocsia 
tambcm e tud10 o da etnografia e das linguas 
de teatr6logo de valor, com pelo menos uma 
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pec;:a que ainda hoje se representa bem: Leonor de Mendon~a 
(1847). 
Para compreender o indianismo e preciso lembrar o que 
dissemos paginas atras sobre a transfigurac;:äo da natureza, 
exemplificando com o abacaxi. Depois da natureza, trata-se 
agora de uma transfigurac;:äo do aborigene, que nos seculos 
XVI e XVII foi apenas descrito, nem sempre com tolerancia, 
e algumas vezes satirizado (como e o caso de Greg6rio de 
Matos). No seculo XVIII a Academia dos Renascidos (1759) 
deu destaque aos chefes indigenas que desempenharam pa-
pel importante no passado, incorporando-os a tradic;:äo bra-
sileira. Pouco depois, os Indios foram tratados com grande 
simpatia no Uraguai, de Basilio da Gama, e 110 Caramuru, 
onde Duräo ressaltou a organizac;:äo harmoniosa da sua vida. 
Por ocasiäo da Independencia eles ja estavam instalados no 
papel de elemento simb6lico da patria, prontos para o reto-
que decisivo que OS romantiCOS Jhes daräo, assimilando-os 
ao cavaleiro medieval, embelezando os seus costumes, em-
prestando-lhes comportamento requintado e suprema no-
breza de sentimentos. 
Mediante essa transfigurac;:äo, o indianismo foi importan-
te hist6rica e psicologicamente, dando ao brasileiro a ilusäo 
compensadora de um altivo antepassado fundador, que, jus-
tamente por ser idealizado com arbitrio, satisfez a necessi-
dade que um pais jovem e em grande parte mestic;:o tinha de 
atribuir a sua origem um cunho dignificante. Serviu inclusi-
ve para mascarar (como disse Roger Bastide) a herarn;:a afri-
cana, considerada entäo menos digna, porque o negro ainda 
era escravo e näo fora idealizado pelas literaturas da Europa, 
que, ao contrario, fizeram do indigena um personagem cheio 
de encanto e nobreza, como se deu na obra de Chateaubriand 
e, na America do Norte, na de Fenimore Cooper. 
No entanto, esteticamente o indianismo foi bem fraco e se 
desgastou no tempo de uma gera<;:äo. A produ<;:äo que susci-
tou esta esquecida, salvo alguns poemas de Goni;:alves Dias e 
algumas narrativas de Jose de Alencar, figura dominante do 
nosso Romantismo, autor de romances indianistas como 0 
guarani (1857) e Iracema (1865)~ndo que este e mais Ull\ 
poema em prosa. Ambos foram sempre populares e ate hoje 
säo estimados e lidos em larga escala, grai;:as sobretudo a se-
dw;:äo do estilo e a conven<;:äo ao mesmo tempo sentimental 
e heroica que rege a caracteriza<;:äo dos personagens. 0 in-
dianismo foi um fenömeno de adolescencia nacionalista na 
literatura brasileira. 
Talvez tenha sido tambem fenömeno de adolescencia o 
lirismo subjetivo dos sucessores de Goni;:alves Dias, cor-
respondente a fase que OS criticOS portugueses chamam de 
ultrarromantismo. Säo dezenas de poetas de algum valor e 
me1 d' · a uz1a que ainda pode interessar. Com eles a literatura 
brasileira alcani;:ou publicos numerosos, atraidos pelo versa 
~entimental e fäcil, parecendo confissäo sincera de almas ir-
mäs m ·t ' ui as vezes pastos em melodias que aumentavam a 
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sua penetrac;äo, inclusivc pela voga das serenatas. Tanto os 
versos de poetas mais duros, como Magalhäes, quanto os dl· 
poetas extrcmamente tluidos, como Casimiro de Abreu, fo 
ram musicados e conquistaram o pais. 
Alem dessa poesia sentimental, o Romantismo brasilctro 
conhcccu a humoristica e irönica, a satänica e a social, for 
mando uma gama bastante extensa que aumentou a poss1 
bilidade de penetrac;äo junto a püblicos amplos. Muito im 
portante como ambiente que estimulava a produc;äo, e ao 
mesmo tempo fornecia um primeiro ni\cl de receptividade 
critica e afct1va, foram as Faculdades de Dircito, fundadas 
52 uma no Norte, cm Olinda (transferida a seguir para Rec1fe) 
outra no Sul, em Säo Paulo, no ano de 1827, e que foram o 
principais centros de formac;äo das elites intelectuais e polt 
ticas do lmperio e da Rcpublica em sua primcira fase. Sendo 
um grupo me10 aparte, dotado de forte espirito corporat1vo 
os estudantes constituiam um püblico literario privileg1ado e 
uma caixa de ressonäncia para a literatura, quese difundma 
cm parte por meio deles. 
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Tipi eo desse mundo juvenil foi o poeta que talvez sejao ma1s 
interessante do Romant1smo bras1leiro, Ahares de Azevedo 
(1831-1852), menino-prod1gio que teve tempo, na v1da brev 
de se cult1var bastante e produzir uma obra relat1vament 
volumosa, alem de variada, que se publu.:ou depois de sua 
morte com enorme exito. Nela, sobressai o espinto crill o 
indus1ve no enudo pr6pno, p01s ele escreveu ensa10s obr 
temas e autores com o tom declamat6rio caracteristico do 
tcmpo, mas inegavel disccrnimento dos valores literarios. 0 
mcsmo disccrnimento aparece na maneira por que encarava 
a sua propria obra, deixando claro o intuito de criar a contra-
di\äo c o choque de tonalidades, pr6prios do Romantismo. 
Na sua pucsia ha um lado sentimental que näo se eleva muito 
ac1ma dos chavöes correntes na epoca. Mas ha momentos de 
tcnsao dramatica que a diferenciam e, sobretudo, um lado 
de 1ronia e sarcasmo que esta cm grande parte vivopela 
conten\,\O da ideia e a secura frequentemente humoristica 
do vcrso. !~ o lado melhor e duradouro da dualidade anti-
tct1ca quc ele denominava "binomia" e considerava norma 53 
d ua produc;äo poet1ca. 0 poema loE1As is 11\IAS pertence a 
ta vertente, e no impcrfcito mas sugestivo drama em prosa 
Ma arro se reunem todas as suas facetas de leitor de Shakes-
peare, ßyron, Hoffmann, Heine e Musset, com um gosto 
entuado pelo satanismo que fascinou a sua gern\äo. 
0 modo sentimentale intunista, colorido ou näo pelo pes-
imi mo ma1s ou menos satänico, i: um tom geral nesse tem-
p ntr os poetas Jovens (muitos <los quais mortos na quadra 
t anos), e 1s o os tornou populares numa socicdade 
de emoc;oes face1s. Alguns säo quase femminos pela 
n 1a melanc6hca c a delicadeza da expressao, como 
miro de Abreu (1839 1860), que alcanc;ou uma especie 
f 1 o na banahdade e se tornou predileto das lcito-
ao ma1 a pero , Corno O desesperado Junquetra 
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Freire (1832-1855), em cuja obra irregular de frade revolta-
do ha alguns momentos de lancinante emoc;:äo. Esses jovens 
poetas, que se apresentavam como rejeitados pelas conven-
c;:öes e incompreendidos pela sociedade, foram paradoxal-
mente os mais queridos e difundidos no Brasil do seculo 
XIX, chegando as camadas modestas pela onda de recitais e 
serenatas que cobriu o pais. 
Um pouco mais jovem, e tendo vivido mais tempo, Fagun-
des Varela (1841-1875) foi o ultimo dos poetas ultrarromän-
ticos de algum valor, e o que realizou obra mais ambiciosa, 
inclusive um· longo e mediocre poema sobre a catequese, 
Anchieta ou o evangelho na selva (1875). Na poesia lirica ele 
levou ao maximo a fluidez cantante do verso rimado e a me-
lodia do decassilabo solto, isto e, sem rimas. Com isso, e com 
um toque muito pessoal de devaneio, pöde· criar alguns dos 
mais belos poemas do tempo, marcados pela atmosfera de 
magia e encantamento, que se encontram principalmente 
no livro Cantos e fantasias (1865). Uma caracteristica de sua 
poesia e a oposic;:äo entre o universo do campo eo da cidade, 
que naquela altura do seculo ja comec;:ava a crescer de im-
portäncia. Outros trac;:os dele säo o quese poderia chamar de 
patriotismo continental, abrangendo a America, e o come~o 
da poesia de solidariedade em rela~äo aos escravos. Se por 
um lado foi sucessor <los ultrarromänticos, por outro e ante-
cessor do lirismo social que marcara o firn do Romantismo 
no Brasil. 
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Pela altura <los anos de 1850 e 1860, um fato importante foi 
a voga do romance, que serviu de instrumento para revelar 
0 pais atraves da descri<;:äo de lugares e modos de vida. Ha o 
romance de costumes, de um realismo misturado ao destem-
pero melodramatico, ou atenuado pelo bom humor mediano, 
na obra do fecundo Joaquim Manuel de Macedo (1820-1882), 
autor de um <los maiores sucessos de publico da nossa litera-
tura, A moreninha (1844), narrativa ligeira e ingenua de amo-
res convencionais da classe media, que se tornou verdadeiro 
padräo para os escritores mais jovens e deu ao genero uma 
dignidade que consolidou o seu prestigio. Na obra de Macedo 
(mais de vinte romances, quase vinte pe<;:as de teatro, poemas, 55 
obras de divulga<;:äo, humorismo), aparece pela primeira vez 
no Brasil a figura virtualmente profissional do escritor, o ho-
mem que, mesmo näo vivendo da sua obra (o que seria im-
possivel no acanhado meio do Rio de Janeiro daquele tempo), 
se apresenta e e avaliado como produtor regular de textos que 
formam um conjunto, mediante o qual sera aplaudido ou re-
jeitado. 0 seu papel social, sob este aspecto, foi decisivo. 
Diferentes foram a obra eo destino de Manuel Antonio de 
Almeida (1831-1861), que viveu obscuro e morreu cedo, näo 
seguiu modas literarias nem foi reconhecido em vida. Alias, 
parece que näo t' h d fi , . , . 
. lil a gran e con an<;:a nos propnos mentos, 
po1s o seu ' · 1. umco 1vro, Mem6rias de um sargento de milicias, 
que aparece · · 
u pnme1ro sob forma seriada num jornal (1852-
1853), Jepois em vol ( 8 ) . , . , d ume 1 54-1855 , sam anommo, e so e-
00 ~1'..'11,lia 
F=-o(.R~L 
rr:"-'T~Hl. 
pois da sua morte comei;:ou a ter prestigio. Ern compensai;:äo, 
ate hoje, e cada vez mais, e lido e querido pelo publico e a 
critica, atraidos pela bonomia e a simplicidade do realismo 
com que descreve a vida da pequena burguesia no comei;:o 
do seculo XIX, com uma grai;:a irönica, certo desencanto e 
o senso agudo dos caricaturistas. Por näo ser um escritor li-
gado as esferas oficiais, livrou-se da conveni;:äo ret6rica e do 
sentimentalismo de praxe, encarando a realidade de maneira 
direta e expressiva. 
Esses dois autores säo do Rio de Janeiro, onde se situa qua-
se toda a sua· obra. Mas houve simultaneamente a entrada 
56 em cena de uma linha persistente da fici;:äo brasileira, o re-
gionalismo, aplicado em descrever os lugares remotos do in-
terior, os costumes caracteristicos e aquilo que divergia dos 
padröes urbanos. Essa tendencia incorreu nos vicios habitu-
ais do genero, que säo o pitoresco superficial e as conclusöes 
bem-pensantes sobre a pureza rural oposta ao artificialismo 
da cidade. Mas por outro lado teve a vantagem de ser uma 
descrii;:äo extensiva do pais, revelando muita coisa do Brasil 
aos brasileiros, frequentemente presos demais as novidades 
europeias. Bernardo Guimaräes (1825-1884) foi um dos mais 
destacados representantes do regionalismo daquele tempo, 
alem de poeta de certo valor, sobretudo nalguns poemas 
obscenos, caricaturais ou anfiguricos, que formam uma con-
tracorrente em relai;:äo a poesia geralmente bem-comportada 
dos seus pares. 
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Mas a grande figura de fic<;:äo brasileira dessa epoca foi Jose 
de Alencar (i829-1877), ja mencionado como indianista. De 
certo modo ele ocupou o proscenio durante o espa<;:o de uma 
gera<;:äo e, apesar de ter morrido relativamente cedo, foi o pri-
meiro escritor que se impös a opiniäo publica como figura de 
eminencia equivalente aos governantes, aos militares, aos po-
derosos. A sua obra extensa e desigual esteve sempre ligada a 
posi<;:öes te6ricas definidas e, por isso, nos aparece ainda hoje 
como um ato relevante de consciencia literaria e nacional. 
Inspirado pelo exemplo da Comedia humana, de Balzac, 
tencionou representar os diversos aspectos do pais, inclusi-
ve em epocas passadas, atraves de narrativas ficcionais cujo 57 
pressuposto formal era a liberdade da expressäo brasileira em 
rela<;:äo as normas portuguesas. Apesar de conhecer muito 
bem o idioma e escrever com perfeita corre<;:äo, flexibilizou 
a lingua e procurou tonalidades diferentes para descrever a 
natureza e a sociedade. 
A vida colonial foi objeto de diversos romances dele, in-
clusive os dois citados, onde o indio aparece no seu ambiente 
Uracema) ouem contacto com o colonizador (0 guarani). Ern 
As minas de prata (1862-1866) e mais dois romances narrou 
aventuras ligadas a epis6dios hist6ricos. Noutros, tratou da 
vida sentimental com a pieguice corrente no tempo, como e 
0 caso de A pata da gazela (1870) ou Sonhos d'ouro (1872). As 
spciedades rurais do extremo Sul, do Centro e do Nordeste, 
consagrou t • · · 1 b res narrat1vas. Mas aparte ma1s atua da sua o ra 
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e para n6s Perfis de mulher: Diva (1864), sobretudo Lucfola 
(1862) e Senhora (1875). 
Nos dois ultimos, Alencar denota a capacidade de anali-
sar a personalidade em confronto com as condi«;:öes sociais, 
entrando pelo estudo da prostituicyäo e da venalidade matri-
monial com uma fon;:a desmistificadora que era novidade 
na literatura brasileira do tempo. Apesar das concessöes ao 
gosto medio, inclusive a punicyäo dos erros e os finais artifi-
cialmente felizes, consegue elaborar narrativas fortes, com 
situacyöes simb6licas muito eficientes e notavel adequacyäo da 
linguagem. · 
58 Foi tambem autor teatralde algum merito, jornalista, en-
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saista politico de ideias conservadoras, preconizando o for-
talecimento da autoridade pela efetiva participacyäo do impe-
rador nas decisöes polfticas e administrativas. 
0 ultimo poeta romäntico de importäncia foi Castro Alves 
(1847-1871), que superou a plangencia dos ultrarromänticos, 
tanto pela sensualidade exuberante e forcya plastica, quanto 
pelo corte humanitario da sua poesia social. Muito influen-
ciado por Victor Hugo, foi como ele capaz de percorrer uma 
gama extensa, das tonalidades epicas ao lirismo sentimental. 
Mais de um critico viu que havia nele um orador em verso, 
cuja eloquencia arrebatava os audit6rios e desempenhou pa-
pel importante, mesmo depois de sua morte, na campanha 
pela abolicyäo da escravidäo negra, que a partir de 1870 con-
quistou aos poucos a opiniäo publica do pais. Essa eloquencia 
ocorre tambem no calor da sua lirica amorosa e o afasta das 
tonalidades medias do lirismo romäntico. Praticando o jogo 
das antiteses e inflando o verso pela hiperbole, e tambem um 
poderoso criador de imagens. Mas essas qualidades deslizam 
frequentemente para a enfase e a intemperanc;:a verbal, como 
se a sua extrema energia de expressäo o levasse a perder o 
equilibrio. Nele, devemos estar preparados para ver o melhor 
passar de repente para o pior. 
0 unico livro que publicou em vida foi Espumas flutuantes 
(1870). Depois da sua morte foram reunidos os poemas aboli-
cionistas em A cachoeira de Paulo Afonso (1876) e publicado o 
drama politico Gonzag~ ou A revoluräo de Minas (1875). 59 
No decenio de 1870 o quadro cultural do Brasil era bem di-
verso do que fora na primeira metade do seculo, em seguida 
ao descnvolvimento econömico e ao progresso material <los 
anos de 1850 e 1860, prejudicados em parte pela sangrenta 
guerra Contra o Paraguai (1865-1870), que abalou a sociedade 
trad1c10nal e abriu caminho para grandes transformayöes. 
0 Rio de Janeiro foi modernizado; desenvolveu-se a viayäo 
ferrea; houve sensivel atualizayäo da informayäo cientifica 
e filos6fica; aperfeiyoou-se o ensino superior de cunho tec-
nico; a 1mprensa ganhou amplitude e apareceram novas re-
1 ta de excelente nivcl, como a Revista Brasileira (2• fase, 
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9 1881) enquanto a erudi~äo e a pesquisa documentaria, 
nte reduz1das quase apenas a Rev1sta do lnstituto Hist6rico 
G 'grafico Brasilerro, fundada em 1839, recebeu o apoio <los 
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importantes Anais da Brbltoteca Naczonal a partir de 1878. 
Os estudos litcrarios t1veram grande desenvolvimento, com 
edi<;öes <los escritores brasileiros antigos e contcmporäncos, 
muitas delas contendu impurtantes elementos biograficos 
e hist6ricos, devidos a estudiosos <los quais se destaca pela 
sua operosidadc e consuencia Joaquim Norberto (1820 1891) 
A essa altura, Ja havia publicos relativamente dcnsos. uma 
pequcna tradic;äo dos estudos literärius, associac;öes c mo 
vimentu~ mais ou menos duradouros, casas editoras em boa 
atividade, umas imprimindo os livro:. aqui, outras cm Por 
tugal ou na hanc;a, como a mais importantc dclas, Garnier 
60 quc foi um notavel me10 de <lifusäo cultural. Havia inclus1ve 
um comec;o de amadurecimento na consc1encia cntica, que 
passara do nacionalismo ind1scriminado <los prime1ros tem 
pos, baseado sobretudo no louvor e na exigcncia de temar10 
cspecifico, para as tentativas de correladonar a produc;ao lt 
teräria com a sociedade e avaliar as obras scgundo padr 
mais uni'licrsa1:.. 
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Uma curiosa figura des c momento de trans1c;ao 
hanklin Tavora (1842 1888), paladino do regionahsmo 
sob este aspccto, representando uma forc;a de res1stenc1a 
movimento ma1s feLundo da hteratura, que era a expre 
mtegrada, sem preconccuo localista, abcrta para as rel 
normais wrn as culturas rnatrizes da l·uropa. Embora hgad 
ao mov1mcnto cultural de renovac;äo, e embora fosse um d 
diretores da citada Revista Brasileira, como te6nco e c 
romancista e um homem cheio de nostalgias do passado. Na-
tural do Nordeste, escreveu romances localizados no seculo 
XVlll em Pernambuco, nos quais a tönica regional era vista 
na perspectiva da historia, como se ele desejasse manifestar a 
dimensäo completa da sua regiäo. Tavora achava que esta ha-
via produzido uma literatura independente da do Sul, e que 
no Brasil se deveria reconhecer esta dualidade, certamente 
com o intuito de evitar a absorc;:äo das atividades culturais 
das rcgiöes pela predominäncia cada vez mais definida do 
RIO de Janeiro. A posi<yäo restritiva de Tavora e forma ex-
tremada de uma dialetica secular do Brasil: a tensäo entre 
partICulansmo e centralismo, na politica e na cultura. 61 
lnteiramente diverso foi outro regionalista, Alfredo d'Es-
c.ragnolle 'launay (1843-1899), do Rio de Janeiro, escritor de 
ma1or envergadura e forma<yäo cosmopolita, embora pro-
tund mente identificado ao pais, que conheceu bem como 
engenhe1ro militar, combatente da guerra do Paraguai e ad-
mimstrador de provincias. O seu romance Inocencia (1872) e 
talvez o melhor na produ<;:äo regionalista do tempo. Mas ele 
e creveu outros, muito interessantes, sobre a vida dos gran-
de propnetarios rurais e a alta sociedade do Rio de Janeiro, 
ncerrando a carreira com uma curiosa narrativa, No declfnio 
99 obre o descompasso entre a paixäo eo envelhecimen-
A el devemos o hvro mais sugestivo a respeito da guerra 
t ada da Laguna, 1871), memorias, estudos criticos so-
ht r tura e musica. ~a sua obra se manifesta a linha mais 
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equilibrada de uma literatura jovem que deseja se afi 
sem perder contacto com as origens supernacionais. 
Nos anos de 1870 e 1880, como vimos, houve dois m 
mentos de ideias que sacudiram o pais e tiveram grande 
to, tanto na vida mental quanto na vida social: a divulga 
das novas correntes europeias de pensamento e o AboU 
nismo, ou seja, a campanha pela abolü;:äo do regime se 
afinal decretada em 1888 por uma decisäo governam 
que abalou os alicerces da sociedade brasileira, condena 
a monarquia ao alienar o apoio que lhe davam os gr 
proprietarros territoriais, senhores dos escravos. 
62 Para a literatura, esta campanha importa na medida 
que inspirou poemas, como os ja citados de Castro Al\t 
romances, como A escrava Isaura (1875) de Bernardo 
maräes, ou As vitimas algozes (1869), novelas de Joa 
Manuel de Macedo. Alem disso, suscitou discursos, 
saios, artigos sem conta, entre os quais e preciso des 
os de Joaquim Nabuco (1849-1910), figura impressio 
de aristocrata que esposou as causas populares. Escritor 
grande qualidade, seu livro 0 abolicionismo (1883) e um 
exemplos mais altos do ensaio politico no Brasil, ma 
por uma radicalidade generosa que aparece tambem nos 
discursos e conferencias desse momento. Depois da Pr 
mayäo da Republica, em 1889, Joaquim Nabuco passou 
longo periodo de afastamento da vida publica, durante 
qua! escreveu a sua maior obra, Um estadista do imperio, 
trcs ,oJumes (1897-1899), onde, a partir da biografia de seu 
p:u, pohtico eminente, trac;ou do reinado de Pedro II um pa· 
norama admiravel, considerado por muitos a obra-prima da 
h1stonografia brasileira. 
Outra forma de radicalidade foi o movimento das novas 
1de1as filos6ficas e literarias que comec;ou mais ou menos em 
1870 e se estendeu ate o comec;o do seculo XX, tendo como 
nucleo 1mcial a cidade do Recife, capital de Pernambuco, e 
sua Faculdade de Direito. La e em outros centros, como o 
Ccara e sobrctudo o Rio de Janeiro, desenvolveu-se um agu-
do cspmto cntico, aplicado cm analisar de maneira moderna 
soc1edade, a politica, a cultura do Brasil, com inspira<;äo, 
pr me1ro no Pos1tivismo, de Auguste Comte; cm seguida, 
n d1versas modalidadcs de Evolucionismo, das quais tcvc 
qUI ma1or voga a filosofia de Herbert Spencer. Acrescente-se 
d ulgac;ao das novas ciencias como Biologia,

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