Prévia do material em texto
O Estado e a Constituição Núcleo de Educação a Distância www.unigranrio.com.br Rua Prof. José de Souza Herdy, 1.160 25 de Agosto – Duque de Caxias - RJ Reitor Arody Cordeiro Herdy Pró-Reitoria de Programas de Pós-Graduação Nara Pires Pró-Reitoria de Programas de Graduação Lívia Maria Figueiredo Lacerda Produção: Gerência de Desenho Educacional - NEAD Desenvolvimento do material: Sarah Tavares Cortês 1ª Edição Copyright © 2020, Unigranrio Nenhuma parte deste material poderá ser reproduzida, transmitida e gravada, por qualquer meio eletrônico, mecânico, por fotocópia e outros, sem a prévia autorização, por escrito, da Unigranrio. Pró-Reitoria Administrativa e Comunitária Carlos de Oliveira Varella Núcleo de Educação a Distância (NEAD) Márcia Loch Sumário O Estado e a Constituição Para início de conversa… .................................................................. 04 Objetivos .......................................................................................... 05 1. Entes Federativos - Organização Política .................................. 06 2. Administração Pública Direta e Indireta ................................... 11 3. Direitos Humanos e Direitos Sociais ........................................ 16 Referências ....................................................................................... 21 Para início de conversa… Neste capítulo, abordaremos a relação Estado e sociedade civil, problematizando o papel do Estado na sociedade moderna, a partir da perspectiva histórica e crítica. Continuaremos nosso estudo apresentando uma perspectiva formal do Estado, presente na Constituição Federal brasileira e na tradição do direito. Veremos, também, os entes federativos e a organização política do Estado brasileiro, na qual trataremos acerca do conceito de Estado à luz do direito, os poderes que o compõem e suas funções (executivo, legislativo e judiciário), os entes federativos (união, estados e municípios) com suas respectivas atribuições. No tópico seguinte, trataremos sobre administração pública, trazendo a diferenciação entre administração direta e indireta, bem como destacando os princípios que norteiam os atos administrativos (legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência). No último, tópico deste capítulo, vamos analisar a constituição dos direitos humanos, trabalhando acerca do contexto histórico que os fundamentam, perspectivas políticas e sua importância na sociedade atual. Também falamos sobre a relação dos direitos humanos com os direitos sociais, apresentando limites e possibilidades para a defesa da classe trabalhadora e na constituição de políticas sociais coerentes com as necessidades dessa classe. 4 Direito e Legislação Social Objetivos ▪ Conhecer os entes federativos e analisar a organização política. ▪ Analisar a administração pública direta e indireta. ▪ Conhecer o conceito de direitos humanos e direitos sociais. 5Direito e Legislação Social 1. Entes Federativos - Organização Política O conceito de Estado no direito tradicional formal se aproxima de uma perspectiva liberal e neoliberal, conforme estudamos na unidade anterior. O papel do Estado está fundamentado na proteção à propriedade privada, sendo centro do poder da nação, devendo agir com coação (imposição da lei). Vejamos, a seguir, dois conceitos sobre Estado, presentes no direito tradicional formal, extraídos da bibliografia básica da disciplina: Estado é um complexo político, social e jurídico, que envolve a administração de uma sociedade estabelecida em caráter permanente em um território e dotado de poder autônomo. Queiroz Lima definiu-o como “uma nação encarada sob o ponto de vista de sua organização política” e León Duguit considerou-o “força a serviço do Direito”. (NADER, 2014, n.p, grifo do autor) É a organização da Nação em uma unidade de poder, a fim de que a aplicação das sanções se verifique segundo uma proporção objetiva e transpessoal. Para tal fim o Estado detém o monopólio da coação no que se refere à distribuição da justiça. É por isto que alguns constitucionalistas definem o Estado como a insituição detentora da coação incondicionada. Como, porém, a coação é exercida pelos órgãos do Estado, em virtude da competência que lhes é atribuída, mais certo será dizer que o Estado, no seu todo, consoante ensinamento de Laband, tem “a competência da competência”. (REALE, 2002, p.76) A partir dessas definições, vamos entender sobre como se organiza a República Federativa do Brasil em seu âmbito formal, a luz da Constituição Federal de 1988. A princípio é importante compreender que os Poderes da União estão organizados em um sistema tripartite, apresentando três poderes independentes e harmônicos entre si, quais sejam: o Legislativo, o Executivo e o Judiciário (Art 2º). Cada um desses poderes exercem funções, indelegáveis, de representação pública do direito. O Legislativo é responsável pela elaboração 6 Direito e Legislação Social e aprovação das leis; o Executivo, por sua vez, deve administrar o Estado e efetivar o direito instituído; ao Judiciário cabe fiscalizar e relacionar o direito aos acontecimentos da realidade social, aos casos concretos. Essas são as chamadas funções típicas. Não obstante, esses poderes não possuem uma independência absoluta, no âmbito da sua funcionalidade, se organizam em um sistema de “freios e contrapesos”. Esse sistema, visando o princípio da harmonia e o equilíbrio para a realização do bem coletivo, evita o arbítrio dos referidos poderes. Poderemos entender melhor a partir do exemplo abaixo: É possível compreender esse sistema quando, por exemplo, observa-se que, a função do Poder Legislativo é a edição de normas gerais e impessoais, sendo estabelecido um processo para sua elaboração, no qual o Executivo tem um papel importante: participa pela iniciativa das leis, pela sanção ou pelo veto. Mas tal iniciativa legislativa do Presidente da República é contrabalanceada pela prerrogativa do Congresso que pode alterar o projeto por meio de emendas. Contudo, o Executivo detém o poder de veto, podendo aplicá-lo a projeto de iniciativa dos deputados e senadores, como em relação às emendas aprovadas em projetos de sua iniciativa. Por sua vez, o Congresso Nacional, tem o direito de rejeitar o veto, tendo a maioria absoluta dos votos de seus membros, restando dessa forma para o Presidente do Senado promulgar a lei, nos casos em que o Presidente da República não o fizer no prazo previsto. (JUS.COM.BR, n.p, 2015) Portanto, cada um dos poderes exerce em si funções dos outros, as quais se caracterizam como funções atípicas: o Executivo tem como funções atípicas legislar e julgar; o Legislativo tem como funções atípicas administrar e julgar; e o Judiciário tem como funções atípicas legislar e administrar. Isso para evitar o arbítrio do poder, de maneira a garantir a harmonia dos poderes do Estado. Continuando o tema da organização política-administrativa brasileira, compreenderemos acerca dos entes federativos: União, estados-membros, Distrito Federal e municípios. Para melhor compreensão, podemos sistematizar o regime federativo em uma pirâmide que demonstra a hierarquia dos entes federativos, com respectivos poderes que o compõe. 7Direito e Legislação Social União: Nível Federal Estados-membros/Distrito Federal: Nível estadual/distrital Municípios: Nível municipal Congresso nacional bicameral (câmara dos deputados e senado). Executivo federal (presidência da República, ministérios, autarquias, fundações, empresas públicas e de economia mista). Judiciário Federal (Supremo Tribunal, Superior Tribunal de Justiça, tribunais superiores: do trabalho, eleitoral e militar; Tribunais regionais: federal e do trabalho; Auditorias militares, juízes federais, juizados especiais, juízes do trabalho, juízes eleitorais e juntas eleitorais. AssembleiasLegislativas (deputados estaduais), governos estaduais /distritais (governador, secretarias de estado, autarquias, fundações, empresas públicas e de economia mista). Judiciário estadual: (Tribunais de justiça do distrito federal, juízes estaduais e juizados especiais cíveis e criminais. Câmara de Vereadores Prefeituras (prefeito, secretarias municipais, autarquias, fundações, empresas públicas e de economia mista). Figura 1: Pirâmide dos Entes Federativos. Fonte: Adaptado de Simões (2009). Assim, os entes federativos possuem autonomia política, caracterizada pelo poder legislativo próprio. Entretanto, as leis precisam estar orientadas pela Constituição Federal, não podendo contrapor esse fundamento. Ademais, os Estados possuem, também, a repartição jurídica em seu âmbito. O Distrito Federal é um estado-membro anômalo, uma vez que sua estrutura se compõe de competências tanto dos estados, quanto dos municípios, todavia, se aproxima mais com os estados-membro. A Figura 1 introduz um princípio importante, principalmente, quanto à compreensão da política social, acerca do nosso regime federativo: o da 8 Direito e Legislação Social distribuição de competências. Isto é, os bens e as competências de efetivação e controle das políticas estão distribuídos entre união, estados e municípios. Isso é fundante para compreender a complexa relação que envolve da letra do direito à execução deste. A seguir, apresentamos as competências descritas na Constituição Federal, destacando àquelas primordiais para matéria do direito e legislação social. Primeiramente, no artigo 22, veremos o que é competência privada, isto é, exclusiva da União na matéria legislativa. Logo depois, no artigo 24, destacamos o que a CF apresenta como competência concorrente, ou seja, que deve ser legislado nos três âmbitos. Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre: I - direito civil, comercial, penal, processual, eleitoral, agrário, marítimo, aeronáutico, espacial e do trabalho; II - desapropriação; III - requisições civis e militares, em caso de iminente perigo e em tempo de guerra; IV - águas, energia, informática, telecomunicações e radiodifusão; V - serviço postal; VI - sistema monetário e de medidas, títulos e garantias dos metais; VII - política de crédito, câmbio, seguros e transferência de valores; VIII - comércio exterior e interestadual; IX - diretrizes da política nacional de transportes; X - regime dos portos, navegação lacustre, fluvial, marítima, aérea e aeroespacial; XI - trânsito e transporte; XII - jazidas, minas, outros recursos minerais e metalurgia; XIII - nacionalidade, cidadania e naturalização; XIV - populações indígenas; XV - emigração e imigração, entrada, extradição e expulsão de estrangeiros; XVI - organização do sistema nacional de emprego e condições para o exercício de profissões; XVII - organização judiciária, do Ministério Público do Distrito Federal e dos Territórios e da Defensoria Pública dos Territórios, bem como organização administrativa destes (Redação 9Direito e Legislação Social dada pela Emenda Constitucional nº 69, de 2012); XVIII - sistema estatístico, sistema cartográfico e de geologia nacionais; XIX - sistemas de poupança, captação e garantia da poupança popular; XX - sistemas de consórcios e sorteios; XXI - normas gerais de organização, efetivos, material bélico, garantias, convocação e mobilização das polícias militares e corpos de bombeiros militares; XXII - competência da polícia federal e das polícias rodoviária e ferroviária federais; XXIII - seguridade social; XXIV - diretrizes e bases da educação nacional; XXV - registros públicos; XXVI - atividades nucleares de qualquer natureza; XXVII – normas gerais de licitação e contratação, em todas as modalidades, para as administrações públicas diretas, autárquicas e fundacionais da União, Estados, Distrito Federal e Municípios (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998); XXVIII - defesa territorial, defesa aeroespacial, defesa marítima, defesa civil e mobilização nacional; XXIX - propaganda comercial. Art. 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre: I - direito tributário, financeiro, penitenciário, econômico e urbanístico; II - orçamento; III - juntas comerciais; IV - custas dos serviços forenses; V - produção e consumo; VI - florestas, caça, pesca, fauna, conservação da natureza, defesa do solo e dos recursos naturais, proteção do meio ambiente e controle da poluição; VII - proteção ao patrimônio histórico, cultural, artístico, turístico e paisagístico; VIII - responsabilidade por dano ao meio ambiente, ao consumidor, a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico; 10 Direito e Legislação Social IX - educação, cultura, ensino, desporto, ciência, tecnologia, pesquisa, desenvolvimento e inovação (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 85, de 2015); X - criação, funcionamento e processo do juizado de pequenas causas; XI - procedimentos em matéria processual; XII - previdência social, proteção e defesa da saúde; XIII - assistência jurídica e Defensoria pública; XIV - proteção e integração social das pessoas portadoras de deficiência; XV - proteção à infância e à juventude; XVI - organização, garantias, direitos e deveres das polícias civis. Assim, o Brasil é um Estado cujo território se organiza em três entes federados (União, estados-membro e municípios). Veja que somente a União detém a soberania, os estados e municípios dispõe de autonomia nas suas ações, mas estão subordinados à União. Em termos legislativos, todas as prerrogativas legais devem ter por princípio o que preconiza a Carta Magna (como também é chamada a Constituição Federal Brasileira de 1988). Ademais, o exercício do Poder Público está organizado de maneira tripartite: executivo, legislativo e judiciário, os quais possuem funções próprias, realizadas de maneira independente e harmônica. Entendendo um pouco mais sobre como se organiza político e administrativamente o Estado brasileiro, passaremos ao tópico seguinte. 2. Administração Pública Direta e Indireta Começaremos nosso subtema esclarecendo a diferença entre Estado e governo. Segundo Simões (2009, p.42), o Estado é “a unidade da sociedade civil, política e juridicamente organizada, dotada de soberania e, internamente, de autonomia”. O governo, por sua vez, consiste no “modo como essa organização é exercida, pelo partido político ou aliança partidária eleita, nos limites constitucionais” (idem). Assim, o Estado é uma estrutura política e social, de caráter permanente, que se organiza fundamentado juridicamente, no caso do Brasil 11Direito e Legislação Social pela Constituição Federal. O governo forma o corpo administrativo eleito para direcionar as ações e tomar as decisões quanto a regência do país, tem caráter temporário, condicionado ao processo eleitoral. A diferenciação é importante para entendermos o conceito de administração pública, para, então, entendermos as modalidades que a constituem (direta e indireta): A administração pública é o conjunto das atividades dos órgãos federais, estaduais e municipais que desempenham serviços públicos, por meio de agentes públicos, organizados por leis, decretos e normas regulamentares, para cumprimento das respectivas atividades-fins. Nesse conjunto incluem-se os cargos, empregos e funções, de carreira ou isolados, de provimento efetivo ou precário, criados por lei, necessários aos serviços públicos em geral, permanentes e sistemáticos e de rigoroso caráter técnico. A administração, porque subordinada ao poder político, age apenas como instrumento de realização de suas deliberações. Sua função é comparável à de um intermediário: assegurar a eficácia dos direitos entre governantes e os cidadãos. (MEIRELLES apud SIMÕES, 2009, p. 44, grifo nosso) Nesse sentido, não devemos confundir a estrutura da administração públicacom os direcionamentos políticos empregados a partir dos governos. Entretanto, essa administração se torna mais ou menos eficiente partir do investimento que lhe é empregado. Vamos tomar como exemplo a escola pública, uma estrutura que existe para efetivar o direito à educação; os professores e a equipe escolar podem ser contratados (vínculo precário) ou concursados (vínculo estável), estes são os agentes públicos. Essa escola vai dispor de material, recursos físicos e humanos a partir dos investimentos direcionados pelo governo, a partir do direcionamento de maior ou menor valorização do serviço público. O Decreto-Lei nº 200/1967 dispõe sobre a organização da administração pública federal (espelho para estadual e municipal), estabelecendo que compreende esta a administração direta (centralizada) e administração indireta (descentralizada). Essa classificação está relacionada à responsabilidade do Estado e às associações público-privadas estabelecidas para administração dos 12 Direito e Legislação Social serviços de interesse público, sendo importante frisar que independentemente mantém sua natureza pública. A administração pública direta consiste nos órgãos instituídos por lei, que se configuram como centros de competência para executar as funções estatais, tendo como principal foco àqueles serviços de atendimento às necessidades e direitos fundamentais da sociedade. Esses órgãos integram os aparelhos do Estado, são partes da administração direta, por isso, não detém personalidade jurídica. Como analogia, pense que o Estado seria o corpo humano, que é integrado por diversos órgãos vitais e dependentes um do outro para funcionamento (SIMÕES, 2009). Assim, quando o serviço é prestado diretamente por um órgão do Estado, é considerado centralizado. Exemplos de órgãos que compõem a administração direta: Ministérios (saúde, educação, justiça, turismo etc.); Secretarias (municipais e estaduais: saúde, educação etc.), Tribunais de Justiça e Ministério Público. Quando há a necessidade de desmembrar algum órgão e redistribuir o serviço entre vários órgãos da mesma entidade estatal, esse serviço é apenas desconcentrado, ou seja, o serviço continua sendo da administração pública direta (centralizado), sendo apenas diluído em outros órgãos. Um exemplo de desconcentração: quando se criam novos ministérios para atender, com maior eficiência, às demandas da população. No entanto, quando há uma transferência da titularidade e/ou execução para outras pessoas jurídicas, então, ocorre uma descentralização para entidades da administração indireta, que podem ser do próprio Estado (paraestatais) ou particulares (empresas privadas, organizações civis etc.). De acordo com o Decreto-Lei nº200/1967, a administração indireta compreende quatro categorias de entidades, dotadas de personalidade jurídica própria, são elas: Autarquias, Fundações Públicas, Empresas Públicas e Sociedades de Economia Mista. Suas características variam quanto ao objetivo de atuação, forma de criação, personalidade jurídica e composição do capital. O quadro a seguir apresenta uma sistematização das entidades da administração pública e suas respectivas características: 13Direito e Legislação Social ENTIDADE ATUAÇÃO CRIAÇÃO PERSONA JURÍDICA/ CAPITAL EXEMPLO Autarquia Serviços públicos de atividades típicas do Estado Criada por lei específica Direito Público/ capital público Instituto Nacional de Seguro Social (INSS) Fundação Pública Atividade de natureza social Criada ou autorizada por lei específica Direito Público ou Privado/ capital público Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) Empresa Pública Presta serviço público lucrativo ou explora atividade econômica Autorizada por lei específica Direito Privado/ capital público Caixa Econômica Federal, Correios Sociedade de Economia Mista Presta serviço público lucrativo ou explora atividade econômica Autorizada por lei específica Direito Privado/ capital público + privado Petrobrás, Banco do Brasil Quadro 1: Entidades da administração pública indireta. Fonte: BRASIL (1967). Dentro dos estudos que compreendem a administração pública, além do processo de organização, é fundamental conhecermos os princípios que a Constituição Federal estabelece. Os princípios regem e orientam a atividade e a ética da administração pública, independentemente de ser direta ou indireta. Vejamos o que diz a Constituição Federal em seu Art. 37: “A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência” (BRASIL). Portanto, são cinco os princípios fundantes da administração pública, os quais serão explanados com base em Alperstedt (2017). Legalidade: Todos os atos administrativos precisam seguir expressamente o que está previsto por lei, estando, portanto, submissos aos comandos legais e aos interesses coletivos. Isso significa que todo ato administrativo deve ter seu fundamento legal, não podendo ser realizado por pura intencionalidade, seja boa ou ruim. Impessoalidade: A administração deve ter como objetivo a finalidade pública e o interesse coletivo, não podendo se utilizar desta para 14 Direito e Legislação Social promover interesses pessoais. É contrário à impessoalidade, por exemplo, a nomeação de parente ou amigo para cargos sem que tenham competência para exercer; ou, ainda, usar da publicidade de obras ou serviços públicos para promoção pessoal. Moralidade: O princípio da moralidade estabelece a necessidade de conduta ética aos atos administrativos, a partir da moral comum, dos bons costumes da sociedade, de maneira que deve estar associado ao princípio da legalidade, para manter os limites da lei. Trata-se de uma dimensão mais subjetiva, referente aos padrões éticos esperados daqueles que lidam com o interesse e patrimônio público. A inobservância da moralidade administrativa importa em um ato viciado (errado), tornando-se inválido e considerado ilegal. Publicidade: Esse princípio se refere a publicação e divulgação dos atos administrativos, para que sejam de acesso e conhecimento da população, enfatizando seu caráter público. Como exemplos de efetivação desse princípio temos os Diários Oficiais (da União, Estados e Municípios) e o portal da transparência (PORTAL DA TRANSPARÊNCIA, s.d). A exceção a esse princípio está nos casos em que tenham comprovada necessidade de preservação da segurança pública. Eficiência: Compreende o cumprimento, por parte dos agentes públicos, das competências a ele referidas em lei, agindo com celeridade e competência, buscando o melhor resultado, com o menor custo possível, no sentido econômico-jurídico. Exige desfecho satisfatório, em tempo razoável, em prol do interesse público e segurança jurídica. Compreender o significado desses princípios e da organização da administração pública como um todo, adquire significativa importância para entendimento dos fluxos de efetivação do direito, como este sai do papel e se transforma em serviços de atendimento à população. Estar de posse desses princípios é, também, apropriar-se da postura que a lei determina para os governantes e demais agentes públicos, sendo potencial conhecimento para fiscalizar e monitorar, enquanto cidadão e profissional, os atos da administração pública. 15Direito e Legislação Social 3. Direitos Humanos e Direitos Sociais “Os direitos têm sempre sua primeira expressão na forma de expectativas de direito, ou seja, de demandas que são formuladas, em dado momento histórico determinado, por classes ou grupos sociais”. (COUTINHO, 2005, p.5) Começamos este subtema com a citação de Carlos Nelson Coutinho, trazendo a importante reflexão sobre o que mobiliza a instituição de determinado direito: a luta dos homens e mulheres no decorrer da história. Isso quer dizer que o direito não é dadode presente ou uma benfeitoria. Antes de estar positivado (constituído), o direito foi reivindicado na realidade social e tensionado pela luta de classes, na busca por respostas às suas aspirações e necessidades concretas. Portanto, o direito é produto histórico, sendo a própria cidadania construção histórica da humanidade. A partir desse horizonte histórico, o sociólogo britânico Marshall (apud COUTINHO, 2005) apresenta a formação da cidadania a partir da constituição do direito em três níveis, os quais guardam relação com o momento histórico que foi positivado. Assim, seguindo uma ordem cronológica do surgimento desses níveis de cidadania na sociedade moderna, temos primeiro os direitos civis (século XVIII), segundo os direitos políticos (século XIX) e, por fim, os direitos sociais (século XX). No campo dos direitos humanos a expressão das lutas da burguesia revolucionária, com base na filosofia iluminista e na tradição liberal, contra o despotismo dos antigos Estados absolutistas, ofereceu como produto o que se convencionou chamar de primeira geração de direitos humanos. Estes direitos, consagrados no decorrer dos séculos XVIII e XIX, são de duas ordens: os direitos civis e os direitos políticos. Entretanto, essas duas ordens em que se apresentam os direitos do homem se referem igualmente a uma mesma esfera de direitos, qual seja: a dos direitos e garantias individuais. São direitos cujas formulações prescrevem normas para a vida do homem em sociedade e que reservam ao indivíduo uma esfera de liberdades negativas em relação ao Estado (direitos civis) e uma esfera de liberdades positivas com autonomia no Estado (direitos políticos). (BUSSINGER, 1997, p.28) 16 Direito e Legislação Social Os direitos humanos têm o seu marco inicial na França em 1789, a partir da Constituição que aprova a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, formalizando os princípios da liberdade, igualdade e fraternidade, os quais constituíram pauta da Revolução Francesa do século XVIII, na destituição do feudalismo e do poder do alto clero. Assim, são instituídos os direitos civis, ancorados no principal valor moral do liberalismo: liberdade individual. Os direitos civis se referem ao direito à vida, à liberdade de ir e vir, à liberdade de pensamento e à propriedade privada. Ou seja, são direitos que se inscrevem na esfera individual, nas liberdades e orientações pessoais. Portando, “os direitos civis obrigam o Estado a uma atitude de não-impedimento”, impondo limites ao poder estatal. (BUSSINGER, 1997, p.29) Os direitos políticos, por sua vez, têm sua emergência associada ao surgimento do Estado democrático representativo do século XIX. Não obstante, esse direito corresponde a liberdade de participação ativa dos cidadãos na esfera política, isto é, direito de votar e ser votado, também a liberdade de associação e organização em partidos ou movimentos sociais. É importante lembrar que o sufrágio universal (direito ao voto) só foi conquistado no século XX. Por muito tempo, a noção do “voto do cidadão” estava associada ao homem, branco e burguês; mulheres, negros e trabalhadores assalariados não eram considerados cidadãos. A generalização dos direitos políticos é resultado da luta dos trabalhadores pelas garantias desse direito humano, não apenas ao sufrágio, mas aos direitos de organização política e defesa dos seus ideais de classe. Os direitos civis e os direitos políticos, formam o que se convencionou chamar de primeira geração de direitos humanos (Teoria Geracional de Karel Vasak). Na Constituição Federal brasileira de 1988, esses direitos de primeira geração estão fundamentalmente consagrados no art. 5º: “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no país a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade”. 17Direito e Legislação Social Anteriormente à Constituição Federal de 1988, o Brasil vivenciava na sua história o período de ditadura civil-militar. Durante a ditadura, os atos institucionais de opressão a população foram lançados, sendo um dos mais conhecidos e cruéis o AI-5. Dentre as determinações, o AI-5 proibiu manifestações, suspendeu direitos políticos e instalou a censura militar, o que ocasionou um cenário de intensa repressão e tortura em nosso país. A Constituição de 1988 veio como resposta ao período ditatorial. A Constituição Cidadã (como também é chamada), restabelece os direitos humanos e garantias fundamentais, trazendo no artigo 5º a resposta às marcas da ditadura. Nesse artigo, composto por 78 incisos, estão expressos direitos à igualdade, liberdade de pensamento/expressão e repúdio à tortura, direitos negados e duramente punidos pelo regime militar. A segunda geração de direitos humanos corresponde aos direitos sociais, os quais garantem um importante nível de cidadania e se apoiam no princípio da igualdade. Segundo Coutinho (2005, p.12) “os direitos sociais são os que permitem ao cidadão uma participação mínima na riqueza material e espiritual criada pela coletividade”. Os direitos sociais são uma resposta à questão social, expressa na situação de pobreza e precariedade da vida da classe trabalhadora, acirrada pelo sistema capitalista de produção. Na modernidade, entre tais direitos sociais, foi aquele à educação pública e universal, laica e gratuita, o primeiro a ser reconhecido de modo positivo [...]. Mais tarde, sobretudo em nosso século, muitos outros direitos sociais foram se consolidando (à saúde, à habitação, à previdência pública, à assistência, etc.) [...]. Cabe registrar, contudo, que - mesmo nos mais abrangentes tipos de Welfare [Bem-estar] - jamais foi assegurado o direito social à propriedade. (COUTINHO, 2005, p.12-13, grifo do autor) Na Constituição Federal brasileira, os direitos sociais dispõem seus fundamentos no Art. 6º “São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição”. Curiosidade 18 Direito e Legislação Social Assim, os direitos sociais estão voltados à coletividade, ao conjunto dos cidadãos na vida em sociedade. As garantias previstas por esses direitos dependem da intervenção do Estado, criando condições necessárias à sua efetivação. Não obstante, esses direitos são mais ou menos objetivados a partir das demandas que são incorporadas e atendidas pelo Estado. Os direitos humanos ganharam o cenário internacional, com o marco normativo da Declaração Universal dos Direitos do Homem, aprovado na III Assembleia da Organização das Nações Unidas em 1948. A partir dessa convenção, outros documentos internacionais foram construídos com diversos países como signatários, por exemplo: Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos (1966), Pacto Internacional de Direitos Sociais (1966), Declaração dos Direitos da Criança (1959), Convenção para Repressão e Prevenção do Genocídio (1958), Convenção Americana para Direitos Humanos (1969) (BUSSINGER, 2005). Diante de um aparato legislativo que estabelece direitos humanos fundamentais suficientes para uma vida digna e de qualidade por que a nossa sociedade ainda sofre com a pobreza, a violência e outras expressões da desigualdade social? Bobbio (1992), em seu livro A era dos direitos, apresenta uma reflexão sobre a relação dos direitos humanos com o nosso tempo: não basta proclamar o direito, o problema real é o das medidas para efetiva proteção. Ele diz que os direitos humanos representam um importante marco dos “valores comuns”, ou seja, a Declaração representa a universalidade de valores, que apresentam um consenso inédito na história humana. O problema atual consiste em proteger essas garantias alcançadas. De fato, o salto para a efetivação dos direitos não foi completado. Ao contrário,diante da implementação do Estado Neoliberal, principalmente a partir dos anos 1990, vivenciamos uma conjuntura de retração dos direitos sociais, tendo como prioridade do Estado a necessidade de equilibrar o mercado e manter lucrativo o capital. Nesse sentido, os direitos humanos apresentam uma dupla dimensão: ao mesmo tempo em que são objeto da sociedade capitalista, utilizados seja para consenso ou reprodução da classe trabalhadora; representam, também, 19Direito e Legislação Social conquistas da classe trabalhadora, na medida em que sua efetivação significa melhorias substanciais de vida. Iniciamos este subtema com uma citação do Coutinho (2005, p.16), com ele também encerramos a partir da seguinte reflexão: “ a universalização da cidadania é, em última instância, incompatível com a existência de uma sociedade de classes”. Na Teoria Geracional de Karel Vasak, ainda há uma terceira geração de direitos humanos, pautados no princípio da fraternidade. Refere-se aos direitos difusos, que são de titularidade da sociedade como um todo, como por exemplo direito: ao meio ambiente, à paz e à autodeterminação dos povos. No decorrer deste capítulo, navegamos acerca da organização política do Estado, vendo que este divide seu poder em executivo, legislativo e judiciário, observando as funções preponderantes em cada um destes. Ainda no mesmo subtema, conhecemos um pouco sobre os entes federativos e as competências legislativas previstas na Constituição Federal. Continuamos nossa jornada, passando pelo entendimento acerca da administração pública, identificando as características correspondentes a sua constituição como administração direta ou indireta, bem como os importantes princípios constitucionais que regem essa administração. Encerramos adentrando cada vez mais o universo do direito, pelas portas dos direitos humanos, nesse subtema tratamos sobre os direitos civis, políticos e sociais como importantes níveis consolidação da cidadania na nossa sociedade. Comentário 20 Direito e Legislação Social Referências ALPERSTEDT, H. D. Os 5 princípios da administração pública. Disponível em: https://www.politize.com.br/principios-administracao-publica/. Acesso em: 31 ago de 2019. BOBBIO, N. A era dos direitos. Rio de Janeiro: Campus, 1992. BRASIL. Decreto-Lei nº 200/1967. Dispõe sobre a organização da administração federal, estabelece diretrizes para a Reforma Administrativa e dá outras providências. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ ccivil_03/decreto-lei/del0200.htm. Acesso em: 31 ago. 2019. BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/ constituicao.htm. Acesso em: 31 ago. 2019. BUSSINGER, V. V. Fundamentos dos direitos humanos. Revista Serviço Social e Sociedade: Política Social e Direitos, n. 53. São Paulo: Cortez, 1997. COUTINHO, C. N. Notas sobre cidadania e modernidade. Revista Ágora: Políticas Públicas e Serviço Social, n.3., dez., 2005. Disponível em: http:// www.rabaneda.adv.br/download/Ciencias%20Pol%EDticas/NOTAS- SOBRE-CIDADANIA-E-MODERNIDADE-Carlos-Nelson-Coutinho. pdf. Acesso em: 31 ago. de 2019. JUS.COM.BR. Teoria da tripartição dos poderes: funções típicas e atípicas. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/40071/teoria-da-triparticao-dos- poderes-funcoes-tipicas-e-atipicas. Acesso em: 25 de ago. 2019. 21Direito e Legislação Social https://www.politize.com.br/principios-administracao-publica/ http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del0200.htm http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del0200.htm http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm http://www.rabaneda.adv.br/download/Ciencias%20Pol%EDticas/NOTAS-SOBRE-CIDADANIA-E-MODERNIDADE-Carlos-Nelson-Coutinho.pdf http://www.rabaneda.adv.br/download/Ciencias%20Pol%EDticas/NOTAS-SOBRE-CIDADANIA-E-MODERNIDADE-Carlos-Nelson-Coutinho.pdf http://www.rabaneda.adv.br/download/Ciencias%20Pol%EDticas/NOTAS-SOBRE-CIDADANIA-E-MODERNIDADE-Carlos-Nelson-Coutinho.pdf http://www.rabaneda.adv.br/download/Ciencias%20Pol%EDticas/NOTAS-SOBRE-CIDADANIA-E-MODERNIDADE-Carlos-Nelson-Coutinho.pdf https://jus.com.br/artigos/40071/teoria-da-triparticao-dos-poderes-funcoes-tipicas-e-atipicas https://jus.com.br/artigos/40071/teoria-da-triparticao-dos-poderes-funcoes-tipicas-e-atipicas NADER, P. Introdução ao estudo do direito. Rio de Janeiro: Forense, 2013. REALE, M. Lições preliminares de direito. 27 ed. São Paulo: Saraiva, 2002. SIMÕES, C. Curso de direito do serviço social. 3 ed. São Paulo: Cortez, 2009. 22 Direito e Legislação Social Título da Unidade Objetivos Introdução A Relação Estado e Sociedade Civil Para início de conversa… Objetivos 1. O Estado Moderno e os Clássicos da Teoria Política 2. O Estado no Capitalismo Monopolista e a Luta de Classes 3. O Estado Neoliberal Referências O Estado e a Constituição Para início de conversa… Objetivos 1. Entes Federativos - Organização Política 2. Administração Pública Direta e Indireta 3. Direitos Humanos e Direitos Sociais Referências