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HISTORIA_ANTIGA_ORIENTAL

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Prévia do material em texto

autor 
FÁBIO AFONSO FRIZZO DE MORAES LIMA
1ª edição
SESES
rio de janeiro 2016
HISTÓRIA ANTIGA 
ORIENTAL
Conselho editorial luis claudio dallier, roberto paes e paola gil de almeida
Autor do original fábio afonso frizzo de moraes lima
Projeto editorial roberto paes
Coordenação de produção paola gil de almeida, paula r. de a. machado e aline 
karina rabello 
Projeto gráfico paulo vitor bastos
Diagramação bfs media
Revisão linguística bfs media
Revisão de conteúdo alex da silveira de oliveira
Imagem de capa chad mcdermott | shutterstock.com
todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida ou transmitida 
por quaisquer meios (eletrônico ou mecânico, incluindo fotocópia e gravação) ou arquivada em 
qualquer sistema ou banco de dados sem permissão escrita da Editora. Copyright seses, 2016.
Diretoria de Ensino — Fábrica de Conhecimento
Rua do Bispo, 83, bloco F, Campus João Uchôa
Rio Comprido — Rio de Janeiro — rj — cep 20261-063
Sumário
Prefácio 5
1. Paradigmas iniciais 7
1.1 A definição de História Antiga Oriental 8
1.1.1 Pré-história X História 9
1.1.2 Antiguidade x modernidade 11
1.1.3 Oriente X ocidente 12
1.1.4 Conclusão 15
1.2 A História Antiga Oriental e suas fontes 15
1.2.1 As fontes primárias 17
1.2.2 O problema das fontes secundárias na Antiguidade 21
1.3 A História e as outras disciplinas no estudo da Antiguidade 
Oriental 25
1.3.1 Arqueologia e História 25
2. O Mundo Pré-histórico na Antiguidade Oriental 31
2.1 O surgimento da espécie humana 33
2.2 A Revolução do Paleolítico Superior 38
2.3 A Diáspora Humana 41
2.4 A economia e a forma de vida do Paleolítico 43
2.5 A Revolução Neolítica 44
2.6 A revolução urbana 47
2.6.1 De aldeias a cidades: a complexificação e a hierarquização 
da sociedade 48
2.6.2 Os avanços técnicos e tecnológicos: cerâmica e metalurgia 51
3. Mundos da economia 55
3.1 O que é economia? 56
3.2 As condições naturais e os seres humanos no Antigo Oriente 60
3.2.1 As condições naturais 60
3.2.2 Os seres humanos e o povoamento 64
3.3 O modo de produção asiático 65
3.4 A economia mesopotâmica 67
3.5 A economia egípcia 73
3.6 A economia fenícia 82
4. Mundos da política 87
4.1 O que é a Política? 88
4.2 Centralização e fragmentação do poder no Antigo Oriente 90
4.3 O Poder na Antiga Mesopotâmia 94
4.4 O poder no Antigo Egito 104
4.5 O poder entre os antigos hebreus 118
4.6 O Poder na Pérsia Antiga 125
5
Prefácio
Prezados(as) alunos(as),
Este material foi desenvolvido para servir como elemento de apoio e leitura 
complementar para as aulas da disciplina de História Antiga Oriental. O con-
teúdo que nos diz respeito é vastíssimo e bastante díspar, envolvendo várias 
sociedades antigas, que guardam como principal característica compartilhada 
o fato de não serem identificadas com aquilo que se convencionou chamar de 
Ocidente.
As diferenças entre essas sociedades da Antiguidade Oriental tornam extre-
mamente ingrata a tarefa de escrever um manual que dê conta de todas elas. 
Tendo em vista os limites de espaço e profundidade colocados por um material 
como este, escolhemos priorizar os eixos econômico e político da história das 
civilizações apresentadas, buscando identificar os elementos mais importan-
tes para a formação do profissional em licenciatura.
Tendo em consideração as escolhas apresentadas, dividimos o material em 
quatro capítulos. O primeiro é dedicado a discussões teóricas sobre os concei-
tos de História, Antiguidade e Oriente, bem como as características próprias 
desta disciplina. 
O segundo capítulo aborda os debates acerca daquilo que se convencionou 
chamar de pré-história, envolvendo tanto o surgimento dos seres humanos 
quanto os importantes desenvolvimentos sociais ligados ao aparecimento das 
primeiras civilizações. 
No capítulo três, são apresentadas as principais características das estrutu-
ras econômicas das sociedades do Antigo Oriente, destacando uma abordagem 
teórica importante e estudos de caso relacionados a sociedades distintas, como 
Egito e Mesopotâmia, por um lado, e as cidades fenícias por outro. 
Por fim, o último capítulo apresenta os elementos fundamentais de uma 
história política de diversas sociedades estudadas. Desta maneira, abordamos 
tanto uma perspectiva mais voltada para a síntese da história dos povos na An-
tiguidade Oriental quanto uma explicação de suas organizações sociais e dinâ-
micas de poder.
O estudo das sociedades do Antigo Oriente tem uma importância funda-
mental na construção da perspectiva crítica dos sujeitos na atualidade. Em pri-
6
meiro lugar, a partir do questionamento da própria divisão entre aquilo que se 
convencionou chamar de “Ocidente” e de “Oriente”. Além disso, a heterogenei-
dade das experiências sociais naquelas civilizações pode servir como um labo-
ratório de diversidade importante para desnaturalizarmos e criticarmos nossa 
própria realidade.
Bons estudos!
Paradigmas iniciais 
1
8 • capítulo 1
1. Paradigmas iniciais 
O que é a História Antiga Oriental? Nosso primeiro capítulo objetiva resolver 
esta questão. Para isto, vamos analisar rapidamente cada um dos conceitos que 
compõem o título da nossa disciplina, colocando-os em perspectiva. 
Uma segunda pergunta a ser respondida é: quais as especificidades do tra-
balho de pesquisa em História Antiga Oriental? Neste sentido, outra parte do 
capítulo será dedicada à análise das fontes e métodos utilizados em nosso cam-
po de estudo, acentuando suas características próprias. 
Por fim, devemos nos debruçar sobre os contatos interdisciplinares cons-
tantes das pesquisadoras e pesquisadores do Oriente Antigo, destacando a im-
portância do trabalho dos diferentes profissionais no desvendamento do pas-
sado das civilizações que são nosso objeto de estudo. 
OBJETIVOS
•  Compreender o debate da diferenciação entre História e Pré-História;
•  Contextualizar conceitualmente a Antiguidade;
•  Entender a dicotomia Oriente x Ocidente;
•  Compreender o conceito de História Antiga Oriental;
•  Situar-se nos debates acerca das fontes utilizadas na História Antiga Oriental;
•  Entender as peculiaridades da área de pesquisas sobre a Antiguidade Oriental;
•  Discutir o aspecto multidisciplinar dos estudos sobre o Oriente Antigo;
•  Criticar o eurocentrismo presente na nomenclatura História Antiga Oriental;
•  Definir as civilizações estudadas no curso de História Antiga Oriental.
1.1 A definição de História Antiga Oriental
O primeiro passo para iniciar o estudo da História Antiga Oriental é a com-
preensão conceitual do significado de cada um dos termos que compõem o 
nome da disciplina. À primeira vista, isto pode parecer simples, uma vez que 
estas não são palavras extraordinárias de nosso vocabulário. Todavia, a pesqui-
sa mais aprofundada deve ter seu início no que se costuma chamar popular-
mente de “limpeza do terreno” teórico. Ou seja, tendo a compreensão completa 
do que cada categoria significa e quais as relações delas com outros conceitos. 
capítulo 1 • 9
A história da Antiguidade Oriental, por ter como foco aquelas sociedades 
que são conhecidas comumente como “berços da civilização”, dedica-se ao 
período do surgimento das primeiras civilizações humanas. Neste sentido, é a 
disciplina dentro da História que tem espaço para se discutirem inúmeros ele-
mentos do período conhecido como Pré-História. Por isso, o primeiro grande 
debate a ser travado no processo de “limpeza do terreno” conceitual é a oposi-
ção entre História e Pré-História.
A própria forma de dividir o tempo histórico é uma invenção humana relati-
vamente recente se levarmos em conta toda a nossa trajetória no planeta. Para 
além de simples marcos temporais, categorias como “Antiguidade”, “Idade 
Média” ou “Idade Moderna” são campos de discussão na disciplina e, portanto, 
devem ser analisadas cuidadosamente. 
Por fim, deve-se discutir o conceito de Oriente, relacionado diretamente ao 
espaçogeográfico e imaginário conhecido como mundo ocidental, no qual está 
enquadrada a sociedade brasileira.
1.1.1 Pré-história X História
O primeiro homem a usar a expressão “Pré-História” parece ter sido Daniel Wil-
son, em um livro de 1851, chamado The Archaeology and Prehistoric Annals of 
Scotland (Os Anais Arqueológicos e Pré-Históricos da Escócia). A noção de um 
tempo pré-histórico, todavia, é mais antiga e iniciou-se com a formação, em 
1707, da Sociedade de Antiquários de Londres.
Todos os interessados em objetos antigos de diferentes civilizações do pas-
sado eram chamados, a partir do século XVIII, de “Antiquários”. Dedicavam-se 
não apenas à aquisição, mas ao estudo, à avaliação e à discussão de tais objetos. 
A periodização do passado da maneira que conhecemos hoje foi criada 
também no século XVIII. Foram os filólogos, antes mesmo do surgimento dos 
historiadores profissionais, que introduziram a ideia da repartição cronológi-
ca entre uma História Antiga, Medieval e Moderna, que apareceu pela primei-
ra vez nos 38 volumes da Universal History from the Earliest Account of Time 
(História Universal desde o Início dos Tempos), publicados entre 1736 e 1765. 
Somente no século XIX é que a Pré-História entrou como um quarto período 
nesta divisão, no mesmo período do aparecimento da História como uma dis-
ciplina acadêmica.
10 • capítulo 1
O que diferenciava, na cabeça desses homens dos anos 1800, a História da 
Pré-História? A palavra “história” é normalmente usada em pelo menos três 
sentidos, referentes a distintos recortes temporais: 
1. Todo o passado desde o surgimento do universo; 
2. Todo o passado de experiências humanas neste planeta; 
3. O passado de experiências humanas que conhecemos por meio dos re-
gistros escritos. 
Como disciplina, a História se diferencia da História Natural, fazendo dis-
tinção entre o primeiro sentido descrito acima e os demais. Portanto, o objeto 
da análise histórica refere-se apenas àquilo que é humano. Afinal, segundo a fa-
mosa metáfora de Marc Bloch, o historiador é como o ogro da lenda, está onde 
fareja a carne humana. 
Considerando que a História surgiu como campo acadêmico durante o 
século XIX, foi neste momento que os primeiros historiadores começaram a 
restringir o seu âmbito de atuação àquelas experiências humanas do passado 
que nos legaram registros escritos. Com a definição da História como o estudo 
das sociedades humanas a partir de seus testemunhos escritos, a Pré-História 
surgiu, lógica e etimologicamente, com o significado de período anterior à 
História, portanto tudo que precedeu a invenção da escrita.
A Pré-História passou a ser objeto de pesquisa da Arqueologia muito mais 
do que da História, embora, como veremos, a interdisciplinaridade entre as 
duas seja fundamental. O próprio significado da palavra “Arqueologia” vem da 
definição grega de “conhecimento das coisas antigas”. 
A própria trajetória pré-histórica da humanidade foi dividida pelos pesqui-
sadores europeus entre um período pré-histórico e outro do que seria chama-
do de Proto-história, com esta última se referindo ao estudo das culturas que 
não produziram registros escritos, mas que existiam nas franjas das socieda-
des letradas.
A definição de Pré-História, portanto, parte de uma perspectiva europeia da-
tada de um momento histórico específico, no século XIX. Este mesmo período 
foi marcado por relações internacionais de força, nas quais as nações europeias 
invadiram e exploraram violentamente diversas regiões, em especial na África e 
na Ásia. As Ciências Humanas, como a História, a Arqueologia e a Antropologia, 
muitas vezes foram usadas para criar as justificativas necessárias para essa ex-
ploração, apontando a inferioridade de povos entendidos como primitivos. 
capítulo 1 • 11
Um dos elementos que demonstravam uma suposta inferioridade de deter-
minados povos africanos e asiáticos era o fato de serem ágrafos, ou seja, sem 
o desenvolvimento de uma forma de escrita. Assim, o conceito de Pré-História 
passou a estar associado, de alguma maneira, a uma visão preconceituosa, 
como se os povos ágrafos fossem um passo anterior à civilização em uma linha 
evolutiva unilinear que tinha a Europa em seu ponto mais desenvolvido. 
Tal perspectiva não pode ser sustentada se comparada aos indícios de so-
ciedades que, mesmo após o surgimento da escrita, retornaram ao status de 
ágrafas. Há, dessa maneira, exemplos do que poderia ser definido a partir da 
lógica da evolução unilinear como um regresso de uma civilização histórica ao 
estágio pré-histórico.
Há a necessidade de tratar com cuidado a divisão entre Pré-História e 
História, para que não seja atribuído a ela nenhum juízo de valor, muito menos 
aquele posto por uma visão eurocêntrica. Portanto, obedeceremos neste livro 
ao recorte tradicional que identifica o surgimento das diferentes escritas como 
ponto de transição de um período pré-histórico para um período histórico. 
Faremos isto para facilitar o enquadramento do leitor nos conceitos estabeleci-
dos historicamente. Todavia, desejamos marcar criticamente a necessidade de 
rever essas definições a partir de novos paradigmas que não considerem uma 
evolução unilinear. Ainda mais uma que toma a experiência europeia como 
central para todos os períodos da existência humana.
1.1.2 Antiguidade x modernidade
Como visto anteriormente, a divisão tradicional entre os períodos históricos é 
fruto do longínquo século XVIII, embora continue a ser adotada pela historio-
grafia. Divide-se a história entre um período da Antiguidade, uma Idade Média, 
uma Idade Moderna, à qual foi acrescida posteriormente uma Idade Contem-
porânea. O conceito de “antigo” toma sempre como referência um determina-
do momento, para caracterizar outro como ocorrido muito antes. Logo, a His-
tória Antiga refere-se diretamente ao período no qual tal conceito foi criado: a 
Idade Moderna.
Os homens do século XVIII tomaram como perspectiva uma definição 
do tempo histórico tributária das leituras de seus antecedentes renascentis-
tas do século XVI. Durante o Renascimento, intelectuais conhecidos como 
12 • capítulo 1
“humanistas” valorizaram inúmeros aspectos da cultura clássica das civiliza-
ções antigas da Grécia e Roma, resgatando em especial sua literatura, poética 
e oratória.
Como supervalorizaram a cultura da Antiguidade greco-romana, os hu-
manistas classificaram o período de seu enfraquecimento com um momento 
de declínio cultural, identificado como um “tempo de trevas” ou uma “idade 
média” entre os grandes sujeitos do Mundo Clássico e sua retomada pelos 
renascentistas. 
O movimento dos humanistas fez com que a Antiguidade greco-romana 
fosse entendida como o momento de criação do mundo moderno, no qual es-
tavam sendo resgatados os valores clássicos. Grécia e Roma passaram a ser os 
parâmetros básicos para os recortes temporais tradicionais da historiografia. 
Portanto, a história, surgida com a invenção da escrita, teria seu primeiro recor-
te temporal no fim do Mundo Clássico, tradicionalmente associado à desagre-
gação do Império Romano e o início do período “bárbaro”, que marca a Idade 
Média. A data marco para tal processo seria o ano de 476, com a entrega das 
insígnias do Império Romano do Ocidente ao imperador oriental pelos povos 
germânicos que nele se instalaram. 
O que se pode perceber a partir de tais recortes é a repetição de um claro 
padrão eurocêntrico. Ou seja, a história da Europa não só é tomada como a 
ampulheta que referencia os marcos temporais de toda a história da humani-
dade, como sua cultura também é entendida como raiz para toda a civilização 
moderna. 
Essa identificação da Europa como ponto de referência para a história mun-
dial e, em especial, para a civilização moderna liga-se ao debate entre as ideias 
de Oriente e Ocidente.
1.1.3 Oriente X ocidente
O senso comum percebe Oriente e Ocidente como simples indicações geográ-
ficas,equivalentes a leste e oeste. Hoje em dia, o recorte é feito com base nas 
coordenadas longitudinais estabelecidas pelo Meridiano de Greenwich, que se 
convencionou tomar como marco para a numeração das linhas verticais imagi-
nárias que cortam o planeta. É, todavia, necessário pensar na conformação de 
um mundo ou uma cultura oriental em oposição a outra ocidental.
capítulo 1 • 13
 
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Figura 1.1 – Representação da ilha do Meridiano de Greenwich.
Um exemplo claro das contradições entre as coordenadas geográficas toma-
das a partir do Meridiano de Greenwich e as perspectivas acerca das diferenças 
culturais entre Ocidente e Oriente é dado se pensarmos que, a partir da lógica 
puramente geográfica, a França seria um país oriental. Deve-se, todavia, perce-
ber a dificuldade em associar a cultura francesa a dinâmicas culturais orientais. 
Partindo do ponto de vista da identidade e da cultura, Ocidente e Oriente 
só podem ser definidos de maneira relacional. Mas é importante entender que 
esses conceitos se modificam historicamente. Portanto, devemos esclarecer 
que as categorias de Ocidente e Oriente que estão sendo aqui tratadas têm seu 
surgimento intelectual na virada do século XVIII para o século XIX.
O contexto europeu do período foi marcado pela lógica expansionista, que 
demandou a criação de um conhecimento próprio sobre as sociedades para 
as quais as nações europeias estavam se expandindo. Surgiu, assim, o que foi 
chamado de um conhecimento orientalista, ou seja, uma elaboração de aca-
dêmicos europeus sobre a história e a natureza de regiões africanas e asiáticas 
principalmente. 
A base desse conhecimento orientalista foi construída sobre a ideia de in-
ferioridade dos povos conquistados pelos europeus, o que, de diversas manei-
ras, justificava e impulsionava as ações imperialistas, vistas como benéficas. 
Foi a partir dessa lógica que o conceito de Oriente foi determinado de forma 
negativa, ou seja, como tudo aquilo que não era ocidental. Para isso, buscou-se 
englobar, no mesmo conceito, elementos culturais muito distintos, como as 
tradições muçulmanas, hindu e chinesa, por exemplo. 
14 • capítulo 1
Tudo que não fosse diretamente ligado à herança cultural europeia acabou 
por ser associado à ideia de oriente, enquanto as raízes da Europa foram esta-
belecidas na história Greco-Romana clássica e sua união com o cristianismo, 
iniciada no Império Romano e consolidada no período que se convencionou 
chamar de medieval.
A partir da tomada da Europa como medida (e mais especialmente do eixo 
Inglaterra-França-Alemanha-Península Ibérica-Itália) para o mundo ocidental, 
o restante do planeta foi dividido. A América já era um continente cristão que 
teve sua conquista executada séculos antes por alguns desses mesmos povos 
europeus. Portanto, enquadrava-se na cultura ocidental. 
Em contrapartida, as civilizações africanas, asiáticas e até da Oceania foram 
classificadas como orientais e localizadas na medida de sua distância em rela-
ção à Europa. Surgiram, assim, os conceitos de Oriente Próximo, para tratar do 
que hoje seria a Turquia, a região da Síria-Palestina e a antiga Mesopotâmia; 
um Oriente Médio, que acabou sendo vinculado à Península Arábica e ao Irã; e, 
por fim, um Extremo Oriente, onde foram enquadrados todos os demais povos, 
como indianos, chineses, japoneses etc.
Não é coincidência que a disciplina de História Antiga Oriental tenha sur-
gido nesse momento. Uma prova inconteste disso é que o marco desse orien-
talismo moderno é o Description d’Egypte, produzido pela comitiva científica 
de cerca de 160 especialistas (aos quais se somaram aproximadamente 2000 
artistas e técnicos) levados pelo exército napoleônico em sua invasão ao Egito 
e publicado entre 1809 e 1829 em dezenas de volumes. O mesmo impulso 
francês, iniciado por Napoleão, ao estudo da história, geografia e natureza do 
Egito Antigo levou à decifração da escrita hieroglífica atribuída a Jean-François 
Champollion na década de 1820.
Da mesma maneira, foi no século XIX que a presença europeia na região da 
antiga Mesopotâmia despertou a curiosidade acerca das antigas ruínas encon-
tradas por lá e impulsionou os estudos acerca da antiga civilização mesopotâ-
mica e a decifração, em meados do século, da escrita cuneiforme liderada por 
Henry Rawlison.
Sociedades privadas e universidades da Europa começaram a patrocinar 
missões de exploração no Oriente, que incluíam historiadores, linguistas e ar-
queólogos, fossem eles amadores ou profissionais. Dessa maneira, uma série de 
publicações de livros e periódicos impulsionou os conhecimentos orientalistas 
capítulo 1 • 15
sobre diversas sociedades, e seus vestígios materiais inundaram os museus e as 
coleções particulares das grandes nações imperialistas europeias.
Consolidou-se, dessa maneira, o campo de estudos acerca da Antiguidade 
Oriental, no contexto do imperialismo europeu e da construção de um conhe-
cimento orientalista.
1.1.4 Conclusão
Pode-se perceber, acima de tudo, que as definições de “História”, “Antigui-
dade” e “Oriente” têm sua historicidade sendo fruto do contexto europeu do 
século XIX, marcado pelo avanço da perspectiva nacionalista e da expansão 
imperial principalmente sobre a África e a Ásia. Não há, portanto, como negar 
o caráter radicalmente eurocêntrico da perspectiva adotada pela disciplina de 
História da Antiguidade Oriental. Vários preconceitos decorreram dessa tra-
dição e se perpetuaram neste campo de estudos, que nasceu associado a fins 
políticos explícitos.
Cabe aos futuros pesquisadores da área de História Antiga do Oriente a vi-
são crítica sobre a produção nesse campo de estudos, buscando novas formas 
de observar as sociedades classificadas como orientais, que se distanciem de 
uma leitura pejorativa e marcada pela comparação com a história da Europa. 
Seguindo os parâmetros tradicionais da disciplina, o conteúdo exposto nes-
te livro abarcará diferentes civilizações que foram classificadas como parte da 
Antiguidade Oriental. Da pré-história até os últimos séculos antes de Cristo, a 
disciplina se refere, de forma mais ou menos detida, às seguintes civilizações: 
Mesopotâmia, Egito, Hebreus, Fenícios e Persas. 
1.2 A História Antiga Oriental e suas fontes
A História é uma forma de conhecimento retrospectiva e mediada, mas o que 
significa isto? O caráter retrospectivo é dado pelo fato de que o historiador ou 
a historiadora são sempre indivíduos localizados em um tempo futuro ao dos 
acontecimentos que pesquisam. Dessa maneira, nossas análises estão sempre 
voltadas para o passado, ainda que busquemos nele questões relevantes para o 
nosso presente e para a construção do nosso futuro. Em segundo lugar, a His-
tória é uma disciplina que apenas tem acesso ao seu objeto de estudo de forma 
mediada, o que, em outras palavras, significa que dependemos dos testemu-
16 • capítulo 1
nhos deixados, voluntária ou involuntariamente, pelos homens e mulheres do 
passado para tentar construir uma explicação sobre o ocorrido.
O conhecimento histórico é, portanto, baseado em diferentes testemunhos, 
tendo como elemento fundamental o gênero humano. Na metáfora do famoso 
historiador francês Marc Bloch, o (a) profissional de história é como o ogro da 
lenda, farejando carne humana, ou seja, buscando os indícios das atividades 
das sociedades humanas no tempo (BLOCH, 2001: 54).
Como um detetive que não testemunhou o crime que quer desvendar, os 
historiadores encontram-se munidos apenas das pistas deixadas pelos seus in-
vestigados. As evidências podem, todavia, estar direta ou indiretamente ligadas 
ao processo a ser desvendado. Na tradição da nossa disciplina, esses dois tipos 
de indícios são chamados, respectivamente, de fontes primárias e secundárias. 
As fontes primárias são aquelas produzidas pelas sociedades e pelos seus 
indivíduos no decorrer do processo que se está sendo pesquisado. Jáas fontes 
secundárias são aquelas elaboradas posteriormente, mas que se referem ao pe-
ríodo analisado de alguma maneira. Num exemplo simples, pode-se falar que 
inscrições nas paredes de templos egípcios são fontes primárias para o período 
em que foram gravadas. Referências posteriores feitas tanto por egípcios de ou-
tros tempos quanto por pesquisadores de outras origens e diferentes momen-
tos históricos devem ser classificadas como fontes secundárias.
A principal ferramenta para a construção do saber historiográfico são as 
fontes primárias. O estudo de determinada sociedade deve ser feito a partir 
dos testemunhos produzidos pelos seus componentes, no contexto analisado. 
Dessa maneira, o historiador ou a historiadora são dependentes desses vestí-
gios produzidos no passado. Consequentemente, o conhecimento histórico é 
limitado pelos vestígios encontrados, o que significa dizer que há lacunas re-
ferentes à falta de indícios específicos. Por exemplo, a falta de conhecimento 
sobre distribuição demográfica em uma sociedade do Antigo Oriente é fruto da 
inexistência de censos ou outra documentação material que seja significativa 
para compreender tal questão. 
A distribuição dos vestígios do passado não é homogênea. Portanto, há mo-
mentos e locais na história que nos legaram uma quantidade maior de teste-
munhos, bem como tipos distintos deles. Nesse sentido, cabe a nós uma análi-
se mais detalhada das especificidades das fontes utilizadas pela disciplina de 
História Antiga Oriental.
capítulo 1 • 17
1.2.1 As fontes primárias
Considerando o que dissemos acima de que os tipos e quantidades de teste-
munhos deixados pelas sociedades passadas são variáveis, qual é a especifici-
dade da História Antiga Oriental? Logicamente, uma sociedade mais afasta-
da no tempo tende a deixar menos vestígios preservados do que outras mais 
próximas. Por consequência, as lacunas do saber historiográfico tendem a ser 
maiores. 
Essa talvez seja a maior peculiaridade da relação entre o historiador da 
Antiguidade e suas fontes: a relativa escassez de documentação quando com-
parada a períodos posteriores. Mas quais são as razões para isso? Destaca-se 
principalmente a ação do tempo sobre os materiais que servem de suporte aos 
vestígios. Poucas são as atividades humanas que deixam marcas capazes de 
resistir à degradação causada por ações naturais ou mesmo por experiências 
humanas posteriores. Além disso, é importante ressaltar que, salvo raras exce-
ções, como grandes construções religiosas, por exemplo, a imensa maioria das 
fontes não era feita com a intenção de uma durabilidade milenar. 
Embora a escassez de fontes seja uma marca da História Antiga (tanto 
Oriental quanto Ocidental), Moses Finley ressaltou, já na década de 1980, que 
a área dos estudos da Antiguidade passava por grandes transformações em vá-
rios aspectos, como: 
1. Um aumento crescente do volume de dados com a publicação tanto de 
fontes escritas quanto, principalmente, de relatos arqueológicos; 
2. O aprimoramento das técnicas e tecnologias utilizadas na pesquisa, 
proporcionando uma evolução em vários aspectos, como a datação dos vestí-
gios, por exemplo; 
3 O acúmulo de análises historiográficas que levou à modificação da com-
preensão que temos sobre diversas realidades históricas (FINLEY, 1994: 4-6).
Uma pergunta importante a ser feita é: quais são as principais fontes para 
a História Antiga Oriental? Ainda que marcados pela escassez relativa, os estu-
dos sobre a Antiguidade Oriental contam com uma grande pluralidade de tipos 
de testemunhos. Adotando a perspectiva clássica associada à pesquisa histó-
rica, como visto acima, podemos começar pelas fontes escritas, que incluem 
diferentes espécies de relatos de caráter estatal ou privado, como documentos 
18 • capítulo 1
relativos a atividades econômicas, conjuntos de leis, proclamações reais, textos 
religiosos, literatura ficcional, relatos historiográficos e míticos, entre outros. 
Misturam-se às fontes escritas os incontáveis tipos de registros da cultura 
material analisados pela Arqueologia, indo desde os próprios corpos e utensí-
lios mais simples aos maiores monumentos e até mesmo cidades inteiras. 
Cabe ressaltar que, embora os testemunhos que medeiam nossa relação 
com a Antiguidade sejam múltiplos, seu caráter é extremamente fragmentado 
por conta dos fatores já citados, em especial a falta de intenção de durabilidade 
e ação inclemente do tempo. Aquilo a que nós, pesquisadores e pesquisadoras 
do passado, temos acesso é apenas uma parte, muitas vezes desconexa e cons-
tantemente incompleta, do total da documentação produzida.
O caráter fragmentado das fontes acaba por desvelar alguns campos da vida 
social muito mais do que outros. Soma-se a isso o próprio interesse desigual de 
historiadores e arqueólogos pelas diferentes esferas da experiência humana no 
passado. Dessa maneira, o resultado é que nós, por exemplo, sabemos muito 
mais sobre as grandes atividades religiosas dos egípcios do que sobre sua rea-
lidade cotidiana de trabalho. Em contrapartida, temos muito mais acesso às 
concepções mesopotâmicas de propriedade do que aos seus gostos culinários. 
Uma diferença marcante entre aquilo que se convencionou chamar de 
Antiguidade Oriental e sua contraparte do Ocidente em relação à documenta-
ção é a melhor conservação dos diversos tipos de testemunhos em virtude das 
distintas condições climáticas. Enquanto o clima mais frio e úmido da Europa 
mediterrânica tende a destruir materiais com mais facilidade, o clima mais 
seco do Norte da África, da Síria-Palestina e da Mesopotâmia tende a preservar 
matérias orgânicas e de outros tipos por muito mais tempo. Soma-se a isto o 
fato de que, no Egito, por exemplo, muitos testemunhos foram deixados em 
franjas desérticas, que, além do clima seco, permanecem, muitas vezes, desa-
bitadas por séculos.
Mesmo com todas essas peculiaridades, devemos concordar com a afirma-
ção de que a insuficiência de fontes literárias primárias é uma praga persistente 
no que se refere à história da Antiguidade (FINLEY, 1994: 16). Isso não impede 
a constatação de que o surgimento da escrita foi um passo extremamente signi-
ficativo no que se refere à produção de testemunhos. Ou seja, sabemos infinita-
mente mais sobre os períodos tradicionalmente caracterizados como históricos 
em comparação com nossos conhecimentos sobre os momentos pré-históricos 
das mesmas sociedades.
capítulo 1 • 19
Não obstante, é importante ressaltar que, durante toda a Antiguidade, as ci-
vilizações tiveram sua composição estruturada pelo contraste entre um peque-
no grupo de membros especializados que dominavam a escrita e uma enorme 
maioria analfabeta. Isto significa que grande parte da população continuou a 
depender de relatos orais, o que gerou um desequilíbrio no tipo de documentos 
escritos que chegaram até nós, refletindo apenas as experiências de uma parce-
la daqueles povos, em geral seus grupos dominantes.
A partir do cenário dessa “praga persistente” da insuficiência de fontes lite-
rárias primárias, como deve proceder o historiador da Antiguidade Oriental para 
construir uma imagem sobre o passado? O primeiro passo, é claro, está relacio-
nado aos outros testemunhos primários, e isto envolve um contato muito próxi-
mo com outras disciplinas, como a Arqueologia, a Papirologia, a Linguística e a 
Numismática, por exemplo. Marc Bloch dizia que era indispensável ao bom his-
toriador possuir um conhecimento interdisciplinar mínimo para avaliar a docu-
mentação e suas dificuldades, mas que o verdadeiro trabalho deveria ser feito em 
equipe, aliando-se a diferentes especialistas (BLOCH, 2001: 81).
Numismática é a ciência que estuda moedas e medalhas, mesclando aspectos de 
análise histórica, iconográfica e químico-metalúrgica.
O segundo passo para auxiliar a preencher as lacunas deixadas pela docu-
mentação é a utilização de modelos teóricos construídosa partir de analogias 
com realidades sociais semelhantes. Tais realidades podem ser tanto da mes-
ma sociedade em períodos distintos quanto de outras civilizações localizadas 
em pontos diferentes do tempo-espaço. Neste sentido, a interdisciplinaridade 
também é fundamental, e o contato se dá em especial com ciências como a 
Sociologia e a Antropologia.
Ao contrário dos historiadores da Antiguidade, que – em virtude do descom-
promisso com a construção de uma verdade científica – acabavam preenchendo 
as lacunas de seus relatos de maneira mais ou menos ficcional, os pesquisado-
res de hoje precisam justificar suas escolhas. Nesse sentido, deve-se concordar 
com Moses Finley de que “sem um esquema teórico de base conceitual, o teste-
munho escasso e duvidoso se presta à manipulação em todos os sentidos, sem 
qualquer tipo de controle” (FINLEY: 1994: 21).
20 • capítulo 1
Para exemplificar, podemos tomar o modelo abstrato da sociedade palacial 
ou aquele do Modo de Produção Asiático, característicos de inúmeras socieda-
des do Antigo Oriente Próximo. Veremos posteriormente as características re-
lacionadas a esses modelos, mas podemos adiantar a forma como se encaixam 
na dinâmica da pesquisa histórica.
Imaginemos que as poucas fontes sobre a organização de uma sociedade 
em um determinado período deem indícios da cobrança de impostos execu-
tada por templos ou palácios sobre pequenas comunidades camponesas. 
Podemos imaginar apenas alguns tabletes de argila em cuneiforme ou alguns 
papiros que se refiram a essas taxações. Somente esses indícios não são sufi-
cientes para desvendar toda a organização econômica da sociedade, que im-
plica localizar as formas de produção, distribuição e consumo dos sujeitos, 
além de quais grupos sociais desempenham funções nessa economia. Logo, as 
imensas lacunas impediriam de montar um quadro explicativo que situasse as 
poucas evidências em um contexto compreensível. 
A solução para preencher essas lacunas com uma orientação científica é 
a utilização de modelos teóricos. No nosso exemplo, o estudo de sociedades 
semelhantes com documentações mais abundantes e amplas favorece as ge-
neralizações, como a do Modo de Produção Asiático. Cabe ao pesquisador de 
História Antiga o passo de criar hipóteses que sirvam para testar a aplicabili-
dade deste modelo à sociedade específica que estuda, a partir das fontes dis-
poníveis. Portanto, se um determinado papiro ou tablete de argila se encaixa 
e passa a fazer sentido no funcionamento do modelo escolhido, isto auxilia na 
montagem de um cenário mais complexo e menos lacunar do passado. 
Nesse processo, o contato com ciências como a Antropologia, por exemplo, 
é fundamental, uma vez que várias das sociedades de menor complexidade que 
são objeto dos estudos antropológicos podem iluminar aspectos de experiên-
cias históricas da Antiguidade. Por outro lado, tampouco é incomum que estu-
diosos de outras áreas, como a Economia, criem seus modelos teóricos a partir 
de diferentes realidades e trabalhem para testá-los nas sociedades antigas. 
Cabe a ressalva de que esse processo deve ser sempre desenvolvido com cui-
dado, para não forçar as fontes a um modelo pensado a partir de uma sociedade 
muito diferente. Não se pode, por exemplo, olhar para a economia do mundo 
mesopotâmico ou fenício tendo como base a economia capitalista de mercado, 
desenvolvida milênios depois. 
capítulo 1 • 21
De qualquer maneira, vamos analisar a relação da História Antiga Oriental 
com outras disciplinas em uma seção posterior. Antes, todavia, precisamos nos 
dedicar aos problemas relacionados ao uso de determinadas fontes secundá-
rias em contextos muito específicos da análise da Antiguidade.
1.2.2 O problema das fontes secundárias na Antiguidade
Como visto, as fontes escritas foram privilegiadas, por muito tempo, na ela-
boração das narrativas historiográficas. Com a consolidação do campo acadê-
mico profissional de História, a construção do cenário do passado partia da 
documentação escrita sobre ele, em especial de outros relatos historiográfi-
cos precedentes.
No caso da História Antiga, em razão da escassez de fontes escritas, mui-
tas vezes os historiadores tiveram de tomar a documentação secundária como 
principal manancial de informações para alguns períodos. Isto estabeleceu 
uma relação particular com determinados relatos historiográficos produzidos 
na própria Antiguidade e adotados como principais fontes de informação para 
períodos anteriores. Um exemplo análogo pode ajudar a esclarecer a questão.
Imaginemos que um pesquisador futuro queira saber sobre a escravidão 
brasileira entre os séculos XVIII e XIX. Suas fontes primárias seriam, logica-
mente, os documentos produzidos no período, como registros de chegada de 
escravos nos portos brasileiros, anúncios de compra e venda em periódicos da 
época, documentação cartorial de herança das grandes propriedades escravis-
tas ou de batismo dos cativos. Façamos um esforço, porém, para imaginar um 
cenário futuro em que todos esses documentos tenham desaparecido. Logo, 
nosso amigo pesquisador se voltaria para os livros escritos no século XX sobre 
a história da escravidão (portanto, fontes secundárias) para ter alguma ideia do 
que ocorreu no passado mais remoto e escrever sua narrativa.
Ainda que seja incomum que isso ocorra com sociedades do nosso passado 
próximo, muito mais preocupadas com os registros e sua conservação, este não 
é um cenário raro no contexto da análise da Antiguidade. No caso da História 
Antiga Oriental, há exemplos clássicos de historiadores antigos que foram fun-
damentais para o estabelecimento dos relatos acerca do seu passado, como o 
egípcio Mâneton ou o judeu Flávio Josefo.
Mâneton foi um historiador e sacerdote egípcio que viveu no século III 
a.C., no período conhecido como Ptolomaico. Sua principal obra foi intitulada 
22 • capítulo 1
Aegyptiaca (“História do Egito”), escrita em grego aparentemente sob o incen-
tivo do faraó Ptolomeu I. Nela, o autor estabeleceu um relato iniciado na mo-
narquia mitológica dos deuses que primeiro teriam habitado o Vale do Nilo e 
seguindo até a XXXI Dinastia. A metodologia utilizada foi principalmente a das 
listas reais, ou seja, uma listagem histórica dos monarcas, o que era uma tradi-
ção faraônica. Neste sentido, Mâneton utilizou-se de algumas listas produzidas 
anteriormente para informar o seu trabalho. Sabemos através de achados ar-
queológicos que tais listas eram produzidas no Egito desde o Terceiro Milênio 
a.C., como comprova a Pedra de Palermo, uma das prováveis fontes do historia-
dor egípcio.
Período Ptolomaico é como é conhecido o período da história egípcia iniciado com 
o coroamento de Ptolomeu, general de Alexandre, o Grande, como faraó, em 305 a.C., 
e finalizado com a derrota diante dos romanos no governo da rainha Cleópatra VII, em 
30 a.C. Naquele período, o Egito recebeu muitas influências da cultura helênica.
 
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Figura 1.2 – Maior fragmento da Pedra de Palermo, exposto em museu italiano.
capítulo 1 • 23
A Pedra de Palermo é uma pedra de basalto que originalmente deveria ter pouco 
mais de dois metros de altura e 60 cm de largura, gravada com uma lista dos monar-
cas egípcios desde o período Pré-Dinástico até a V Dinastia, contendo também al-
guns eventos associados aos reinados, como guerras e construções de templos. Seu 
nome foi dado pelo fato de que o maior de seus fragmentos encontra-se no Museu de 
Palermo, na Sicília, desde 1877.
Outro historiador a trabalhar fazer sua própria Aegyptiaca foi Hecateu de 
Abdera, um grego contemporâneo de Mâneton que escreveu uma história egíp-
cia com base em informações locais, mas preenchendo as lacunas do passado 
para atender aos critérios estéticos apreciados pelos gregos da época.
O texto original escrito por Mâneton não chegou até nós. Conhecemos seu 
trabalho a partir de outros historiadoresque o utilizaram, principalmente o ju-
deu Flávio Josefo, que viveu no século 1 d.C.
 
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Figura 1.3 – Busto atribuído ao historiador Flávio Josefo. 
Cidadão romano, Josefo (cujo nome original em hebraico era Yosef bem 
Mattityahu) é um dos mais importantes historiadores da Antiguidade, em 
24 • capítulo 1
especial no que se refere à História Antiga Oriental. Além de sua autobiogra-
fia (Vida de Flávio Josefo), escreveu um livro sobre a Guerra dos Judeus, fonte 
primária sobre a rebelião na Judeia contra a dominação romana, e outro sobre 
as Antiguidades Judaicas, que conta uma história do mundo sob a perspectiva 
dos judeus.
A mais conhecida fonte secundária utilizada para a compreensão de diver-
sas sociedades orientais é, todavia, a Bíblia. Em seus inúmeros livros temos não 
somente a história dos hebreus e do cristianismo nascente, mas também refe-
rências a outros povos contemporâneos, como os egípcios e os babilônicos, por 
exemplo. Até a decifração das escritas próximo-orientais, como os hieróglifos 
egípcios ou o cuneiforme mesopotâmico, a maior parte das informações acerca 
dessas sociedades era proveniente da Bíblia e de historiadores do mundo anti-
go como Heródoto ou Flávio Josefo.
A historiografia da Antiguidade Oriental, portanto, utilizou-se por muito 
tempo de fontes secundárias para tentar montar um cenário compreensível 
do passado das suas sociedades. Sabendo-se que a matéria-prima do trabalho 
histórico são as fontes primárias, como deve proceder o historiador ou a histo-
riadora nestes casos? 
A primeira saída para esse dilema está na já afirmada necessidade das tro-
cas interdisciplinares, em especial com a Arqueologia. Mas sobre isso falare-
mos em seguida. No que se refere aos textos posteriores, escritos pelos histo-
riadores da Antiguidade, são necessários cuidados metodológicos para filtrar 
as informações confiáveis referentes ao período que aqueles profissionais bus-
cavam retratar.
O primeiro passo metodológico para a utilização dos relatos historiográfi-
cos do passado como fonte para os objetos que eles buscavam retratar é a análi-
se histórica e literária dessas obras no contexto de sua produção. Isto significa 
dizer que, antes de confiar nas palavras escritas por Mâneton no século III a.C. 
sobre o passado egípcio do século XXX a.C., é necessário entender os motivos 
e os objetivos que o levaram a escrever, bem como as formas literárias por ele 
utilizadas e características dos gostos estéticos de seu tempo.
A análise da forma dos discursos historiográficos dessas fontes secundárias 
serve para compreender os limites dessas fontes no que se refere ao conheci-
mento que buscam retratar. É necessário entender as escolhas que os autores 
buscaram registrar e os silêncios que escolheram produzir. Voltando ao exem-
plo de Mâneton, é importante entender que a forma tradicional dos relatos em 
capítulo 1 • 25
sua sociedade eram as listas reais e, consequentemente, isto impunha clara-
mente a escolha por não escrever sobre diversos outros temas que não as suces-
sões monárquicas.
O procedimento metodológico inclui, em síntese, uma contextualização da 
obra historiográfica, buscando entender: os objetivos pretendidos pelo autor 
em sua sociedade; o próprio método de verificação das suas informações sobre 
o passado; as formas literárias por ele utilizadas; o diálogo que o texto teve com 
seu público; e a sua função na visão de mundo do grupo social no qual o autor 
se insere. A partir desses passos, os especialistas de hoje podem garimpar os 
grãos de informação sobre aquele passado cheio de lacunas.
1.3 A História e as outras disciplinas no estudo da Antiguidade 
Oriental
Como visto, em virtude das peculiaridades de suas fontes, o estudo da Histó-
ria Antiga necessita de um forte contato interdisciplinar com áreas contíguas 
do conhecimento, como a Antropologia, a Linguística, a Papirologia, a Numis-
mática e mesmo áreas mais distantes, como a Medicina Forense, a Geologia, a 
Física e a Química, no caso de estudos laboratoriais. Entretanto, o diálogo mais 
constante e mais próximo é, sem dúvidas, com a Arqueologia. 
Mas que forma têm os diálogos entre a História e a Arqueologia e por que 
eles são fundamentais para a construção de um quadro mais completo sobre 
o passado das sociedades do Antigo Oriente Próximo? Para chegar a essas res-
postas, vamos nos dedicar a entender um pouco da história e das formas de 
trabalhar da Arqueologia.
1.3.1 Arqueologia e História
A partir da década de 1980, o imaginário popular sobre a Arqueologia foi toma-
do pela figura aventuresca daquele que se tornou o mais famoso profissional 
dessa área em nosso tempo: Indiana Jones. Com seu inconfundível chapéu e 
sempre armado de seu chicote, o personagem intercalava uma pequena quan-
tidade de tempo dedicado às salas de aula e às bibliotecas, com uma enorme 
quantia de aventuras em locais pitorescos e perigosos, em busca de objetos sa-
grados, como a arca dos Dez Mandamentos ou o cálice usado por Jesus Cristo 
na última ceia com seus apóstolos. 
26 • capítulo 1
Uma visão romantizada como essa fala muito pouco sobre o atual trabalho 
de arqueólogos e arqueólogas. A Arqueologia surge como prática acadêmica no 
mesmo contexto europeu oitocentista que a História, mas tem suas raízes fin-
cadas em séculos anteriores. 
Com o interesse dos intelectuais renascentistas do século XV pelo Mundo 
Clássico Greco-Romano, iniciou-se uma busca por objetos de arte daquele pe-
ríodo da Antiguidade. No final daquele século, homens poderosos, como os 
papas Paulo II, Alexandre VI e outros membros da nobreza colecionavam e exi-
biam obras de arte antigas, além de patrocinar buscas sistemáticas por tais ob-
jetos. Assim, a finalidade inicial das escavações era a procura por itens de valor 
estético e comercial.
A Arqueologia tem seu nascimento, portanto, associado à História da Arte. 
No século XVI, as grandes monarquias europeias já nomeavam “antiquários” 
oficiais e os nobres disputavam amistosamente para ver quem conseguia mais 
relíquias do passado.
O século XVIII foi o momento de expansão das escavações, com o surgimen-
to de sociedades privadas dedicadas ao estudo dos objetos artísticos antigos. 
A partir desse modelo de exploração das relíquias clássicas greco-romanas, 
iniciou-se também o interesse pelas antiguidades orientais. As culturas do 
Oriente Próximo até então eram conhecidas basicamente através da Bíblia, já 
que os manuscritos e monumentos das civilizações egípcia e mesopotâmica 
ainda não podiam ser lidos.
Como vimos, a pesquisa mais sistemática sobre a história egípcia iniciou-
se com o esforço da missão napoleônica, que culminou na publicação da 
Description de l’Egypte e a decifração da escrita hieroglífica por Champollion. 
Naquela época, o que viria a ser a Arqueologia ainda estava muito associa-
do à aventura de homens europeus por aquele mundo oriental que eles viam 
como um espaço do maravilhoso. Um dos homens reconhecidos como grandes 
precursores da Egiptologia foi, por exemplo, o aventureiro Giovanni Belzoni, 
que cruzava o Egito em busca de antiguidades com o propósito de abastecer as 
coleções europeias. 
capítulo 1 • 27
Figura 1.4 – Giovanni Battista Belzoni.
Giovanni Battista Belzoni fugiu da Itália para a Inglaterra, em 1803, para evitar o 
alistamento no exército. Com um tamanho incomum para a época (quase dois me-
tros), viveu e viajou durante alguns anos trabalhando como ator e homem forte em cir-
cos. Um tempo após chegar ao Egito, Belzoni acabou contratado pelo cônsul britânico 
no Egito para descobrir, coletar e transportar antiguidades, como estátuas colossais 
de Ramsés II. Entre suas muitas descobertas, o “gigante italiano” foi responsável por 
encontrar a tumba de Seti I no Vale dos Reis e a entrada para a pirâmide de Quéfren, 
no interior da qual permanece gravada sua assinatura.
Segundo Bruce Trigger, a Arqueologiamoderna diferenciou-se do 
Antiquarismo no século XIX, a partir de dois movimentos. Por um lado, a in-
venção, na Escandinávia, de novas técnicas de datação para achados arqueoló-
gicos e, por outro, a ampliação dos estudos sobre Pré-História na Inglaterra e 
na França, na esteira dos debates sobre A Origem das Espécies, publicada por 
Charles Darwin em 1859 (TRIGGER, 2004: 71).
28 • capítulo 1
A Arqueologia tornou-se uma ciência voltada para a compreensão do pro-
cesso pelo qual se criou o mundo em que vivemos, tendo como principais ob-
jetos de estudo todas e quaisquer modificações no mundo material resultantes 
da ação humana (CHILDE, 1977). Em outras palavras, os arqueólogos e as ar-
queólogas buscam explicar as sociedades a partir das suas culturas materiais. 
Embora o sentido original da palavra seja relacionado às coisas antigas, a 
Arqueologia volta-se também para as sociedades contemporâneas, tendo como 
principal particularidade seu ponto de partida nas paisagens e nos objetos mo-
dificados pelos seres humanos.
Um dos mais famosos arqueólogos do século XX, o australiano Vere Gordon 
Childe, afirmava que qualquer coisa feita ou desfeita por uma ação humana de-
veria ser considera um artefato. Objetos móveis que poderiam ser recolhidos e es-
tudados em laboratório seriam considerados “restos”, enquanto os muito gran-
des ou completamente ligados a terra seriam designados como “monumentos”. 
Artefatos teriam significados sociais decifráveis pelos arqueólogos primordial-
mente através do contexto nos quais foram encontrados (CHILDE, 1977).
Para entender o papel dos artefatos da cultura material e sua relação com 
as fontes escritas no estudo da Antiguidade Oriental, é preciso discutir quais 
são as relações entre a Arqueologia e a História. Já vimos que os historiadores e 
historiadoras devem ser capazes de trabalhar com diferentes tipos de testemu-
nhos, que incluem também os vestígios materiais. Ressaltamos também a im-
portância do trabalho conjunto e interdisciplinar com diferentes especialistas 
para a construção de um quadro mais complexo sobre o passado.
Devemos, portanto, rechaçar a perspectiva, que foi adotada por muito 
tempo, de que a Arqueologia seria apenas uma espécie de ciência auxiliar à 
História, dedicada a datar e compreender o processo de produção material dos 
objetos. Muitas vezes, a única janela para o passado são os artefatos encontra-
dos e, consequentemente, sua interpretação no contexto das sociedades que os 
produziram é elemento fundamental para responder às perguntas que fazemos 
àquele tempo.
O primeiro elemento importante a ser destacado acerca da relação entre 
testemunhos escritos e registros da cultura material é sobre a materialida-
de do suporte das fontes escritas, ou seja, o fato de que palavras são escritas 
em alguma coisa. Portanto, principalmente para a História Antiga Oriental, a 
Arqueologia é fundamental na descoberta, análise e compreensão da própria 
documentação escrita, seja ela encontrada em monumentos, papiros, tabletes 
de argila ou outros meios.
capítulo 1 • 29
Em segundo lugar, a centralidade de um ou outro tipo de testemunho de-
pende sempre de duas questões fundamentais: 
1. Quais são os tipos e quantidades de fontes disponíveis; 
2. Quais são as perguntas ou questões a serem respondidas por tais tes-
temunhos. Isto significa que os registros arqueológicos são mais importantes 
para determinados períodos ou para algumas questões do que as fontes escri-
tas, relação que se inverte em outras situações.
A primeira questão levantada acima é mais fácil de ser compreendida. 
Quando há uma abundância de cultura material e pouquíssimos documentos 
escritos, a Arqueologia se torna mais central para a compreensão do passado. 
Em determinados casos, há apenas testemunhos materiais e, nessas situações, 
Pedro Paulo Funari destaca que, uma vez que os artefatos não falam por si mes-
mos, é necessária a utilização de determinados modelos construídos a partir de 
outras experiências e com a ajuda de outras disciplinas, como a Antropologia 
(FUNARI, 1988).
A segunda questão, sobre as perguntas feitas aos testemunhos, pode ser 
exemplificada da seguinte maneira. Imaginemos que um pesquisador ou pes-
quisadora interessado nas relações comerciais entre os antigos egípcios e os 
gregos do período micênico. Neste caso, a análise das cerâmicas que eram uti-
lizadas para fazer o transporte dos bens trocados ou mesmo o estudo dos itens 
estrangeiros encontrados em enterramentos pode falar muito mais do que a 
documentação escrita, muito pouco interessada em relatar os pormenores das 
trocas comerciais. 
A relação entre História e Arqueologia, em síntese, é uma relação de com-
plementaridade. Em especial no estudo da Antiguidade Oriental, as duas dis-
ciplinas são os eixos fundamentais para a construção de um cenário complexo 
do passado.
ATIVIDADES
01. No que tange às fontes, apresente as principais peculiaridades do estudo da História 
Antiga Oriental.
02. Relacione o estudo da História Antiga Oriental com o seu contexto de surgimento como 
parte do interesse de diferentes disciplinas acadêmicas na Europa do século XIX.
30 • capítulo 1
03. Disserte sobre a relação entre Arqueologia e História na análise da documentação es-
crita e da cultura material da Antiguidade Oriental.
REFLEXÃO
Neste capítulo buscamos definir os principais conceitos envolvidos no estudo da Antiguidade 
Oriental, atentando para o caráter eurocêntrico desta definição. Em seguida, discutimos as 
peculiaridades das fontes utilizadas nas pesquisas desta disciplina, ressaltando a importância 
do uso de diferentes tipologias de registros entendidos como fontes primárias. O trabalho 
com um conjunto diversificado de fontes visa complementar um quadro de análises no qual 
muitas vezes os registros são escassos, em especial se comparado o caso da Antiguidade 
oriental com o de períodos históricos posteriores. Nesse sentido, buscamos ressaltar a im-
portância da utilização de modelos teóricos para a decifração das lógicas de funcionamento 
do passado, com o auxílio de outras disciplinas, como, por exemplo, a Antropologia. No que 
se refere às fontes secundárias, que são muitas vezes os únicos registros escritos sobre de-
terminados períodos, lembramos do exercício metodológico fundamental em sua utilização. 
Por fim, discutimos a relação entre Arqueologia e História na compreensão dos registros 
referentes à História Antiga Oriental. 
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BLOCH, Marc. Apologia da História. Rio de Janeiro: Zahar, 2001.
CHILDE, V. Gordon. Introdução à Arqueologia. Nem-Martins: Europa-América, 1977.
FINLEY, Moses. História Antiga. Testemunhos e Modelos. São Paulo: Martins Fontes, 1994.
FUNARI, Pedro Paulo. Arqueologia. São Paulo: Ática, 1988.
TRIGGER, Bruce. História do Pensamento Arqueológico. São Paulo: Odysseus, 2004.
O Mundo 
Pré-histórico 
na Antiguidade 
Oriental
2
32 • capítulo 2
2. O Mundo Pré-histórico na Antiguidade 
Oriental
Como surgiram os homens e as mulheres? Como começamos a nos organizar 
e produzir da forma que fazemos hoje? Estas são algumas das perguntas às 
quais buscaremos responder neste capítulo dedicado à Pré-História humana 
no planeta. 
Nos últimos seis milhões de anos, a evolução de diferentes espécies desem-
bocou no aparecimento dos seres humanos como conhecemos hoje. Este lon-
go processo é marcado pelo desenvolvimento lento de inúmeras características 
fundamentais para a conquista humana da Terra.
A humanidade foi capaz de se reinventar, criar novas formas de organiza-
ção e interferir diretamente no mundo natural com uma intensidade crescente. 
Através da tradição social, possibilitada principalmente pelo desenvolvimento 
da linguagem complexa, foi possível garantir que, em alguns milhares de anos, 
nós passássemos de ferramentas de pedra a computadores e naves espaciais, 
de pequenos grupos de caçadores-coletores a cidades de milhõesde habitantes. 
Vejamos alguns dos pontos principais desse longo processo de domínio 
humano. 
OBJETIVOS
•  Compreender o processo de evolução que levou ao aparecimento do gênero humano;
•  Contextualizar as críticas às concepções do senso comum sobre a evolução humana;
•  Entender as principais características que permitiram a superioridade da nossa espécie;
•  Discutir a importância do surgimento da abstração para o desenvolvimento humano;
•  Analisar o processo da diáspora humana e do domínio do planeta;
•  Compreender o conceito de Revolução Neolítica e os processos de invenção da agricultura;
•  Entender o conceito e Revolução Urbana, o surgimento das estruturas de classe e da for-
ma de organização estatal;
•  Contextualizar o processo de invenção da escrita na realidade mesopotâmica do Quarto 
Milênio a.C.
capítulo 2 • 33
2.1 O surgimento da espécie humana
Já observamos, no capítulo anterior, que a diferença entre História e Pré-Histó-
ria é fruto de um contexto específico do século XIX, em que a profissionalização 
da disciplina historiográfica reivindicou para si apenas o trabalho com fontes 
escritas. Isso ressaltou um preconceito eurocêntrico com diversas comunida-
des ágrafas que entraram em contato com o neocolonialismo. Em todo caso, 
vimos que o historiador, assim como o ogro da lenda, fareja carne humana e, 
então, devemos traçar o surgimento de nosso objeto.
No entanto, quando nós, seres humanos, surgimos na Terra? Até o século 
XVII, esse assunto era tratado praticamente só por teólogos, que buscavam tra-
çar o surgimento da humanidade através do estudo do texto bíblico do Gênesis. 
Um dos resultados foi apontado pelo Dr. John Lightfoot, da Universidade de 
Cambridge, em seu livro publicado em 1642. Nele, o autor afirmava que o ho-
mem foi criado pela Trindade em 23 de outubro de 4004 a.C., às nove da manhã 
em ponto. 
A partir dos trabalhos de Charles Darwin e da repercussão do seu livro A 
Origem das Espécies, compreendeu-se que os seres humanos não apareceram 
repentinamente no planeta. Pelo contrário, nós somos a culminação de um 
processo de evolução muito longo e ainda em andamento. De um ser unicelu-
lar, desenvolveram-se milhões de espécies, por meio de uma dinâmica de mu-
tação genética e seleção natural.
As espécies que nos antecederam no processo evolutivo não existem mais. 
Sabemos delas basicamente por seus vestígios materiais fossilizados. Isto sig-
nifica que, ao contrário do que é afirmado pelo senso comum, os humanos não 
evoluíram dos macacos. Nós e os símios (orangotangos, gibões, gorilas e chim-
panzés) somos descendentes de um antepassado comum, que habitou nosso 
mundo há milhões de anos.
34 • capítulo 2
 
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P
IX
A
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Figura 2.1 – 
Imagens como essa são muito comuns para representar a evolução do ho-
mem. No entanto, não estão corretas. Primeiro, por mostrarem o processo evo-
lutivo como uma lógica linear, enquanto ele é cheio de ramificações e espécies 
desaparecidas, sendo mais bem representado por um gráfico em forma de raí-
zes. Em segundo lugar, ilustrações assim deixam de lado as mulheres, como se 
não fizessem parte desse mesmo processo.
Os procedimentos de datação que estabelecem os períodos nos quais as diferentes 
espécies ocuparam o planeta são procedimentos científicos aproximados. Para isso, 
os pesquisadores e pesquisadoras têm de partir dos vestígios materiais fósseis que 
nos restaram. Em sua análise, estão disponíveis métodos de datação relativa, como 
a estratigrafia (que parte das camadas de sedimentação da terra) e a seriação (uma 
comparação com as características de outros itens reconhecidos como de determi-
nado período). Ou, por outro lado, métodos de datação absoluta, como, entre outros, 
aqueles que usam a radioatividade (contada pelo decaimento da taxa de alguns 
isótopos radioativos em minérios, como o Carbono-14) e os que partem de processos 
químicos (como a quantia de flúor absorvida por restos mortais). Todavia, é importante 
ressaltar que a análise parte do que foi encontrado e, dessa maneira, não é definitiva, 
já que novos vestígios podem mostrar a existência de novas espécies em períodos an-
teriores. O estudo da Pré-História humana está em constante evolução, assim como 
os próprios seres humanos.
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Figura 2.2 – Reconstrução de um Homo 
habilis. Fotografia feita pelo Westfälisches 
Museum für Archäologie. .
O surgimento da primeira espécie 
do gênero Homo deu-se por volta de 
2,5 milhões de anos atrás, com o apa-
recimento do Homo habilis, que ha-
bitou a África Oriental e desapareceu 
cerca de um milhão de anos mais tar-
de. Esses indivíduos ainda não eram 
bípedes obrigatórios, mas já andavam 
sobre duas pernas no solo. Ainda que 
seus antepassados utilizassem ele-
mentos naturais como ferramentas 
(como hoje sabemos que muitos ani-
mais fazem), a maioria dos paleoan-
tropólogos defende a hipótese de que 
os Homo habilis foram a primeira es-
pécie a fabricar seus utensílios. A téc-
nica empregada ficou conhecida como 
cultura olduvaiense, a mais antiga ma-
neira de lascar pedras para criar lados 
afiados. 
 
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Figura 2.3 – Reconstrução de uma fêmea da espécie Homo erectus, exibida pelo 
Smithsonian Museum of Natural History.
36 • capítulo 2
Entre 1,9 milhões e 50 mil anos atrás, o Homo erectus, um provável descen-
dente do Homo habilis, habitou toda a África, uma parte da Europa e quase a 
metade da Ásia, sendo, portanto, o primeiro do gênero Homo a migrar para fora 
de nosso continente materno africano. Isto foi possibilitado por características 
físicas diferentes das espécies anteriores, como pernas mais longas e braços 
mais curtos.
A maior conquista dos Homo erectus, também importante para sua expan-
são territorial, foi o domínio do fogo, que permitiu: 
1. Iluminar a noite e diversos abrigos; 
2. Afastar predadores; 
3. Cozinhar alimentos. A cozinha com fogo é uma característica própria 
do gênero humano e que nos proporcionou, por um lado, maior absorção de 
determinados nutrientes e, por outro, maior durabilidade dos alimentos. 
Os Homo erectus também desenvolveram novas técnicas de fabricação de 
ferramentas de pedra, possibilitando equipamentos mais eficientes, com dois 
lados lascados em vez de apenas um. Isto garantiu o uso de pontas afiadas, 
além das lâminas anteriores.
 
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Figura 2.4 – Reconstrução de um Homo 
heidelbergensis. 
O último ancestral conhecido do 
Homo sapiens foi o Homo heidelber-
gensis, que habitou basicamente as 
mesmas regiões do Homo erectus, 
entre 800 e 200 mil anos atrás. Esta es-
pécie foi responsável pelos primeiros 
vestígios de lanças de madeira e fer-
ramentas compostas, possibilitadas 
pelo desenvolvimento da técnica que 
ficou conhecida como cultura mus-
teriense, que garantia equipamentos 
de pedra de formatos e tamanhos va-
riados. Há também indícios frágeis 
de que os Homo heidelbergensis te-
riam construído habitações e obje-
tos decorativos.
capítulo 2 • 37
Alguns pesquisadores defendem a tese de que o Homo heidelbergensis afri-
cano foi o ancestral direto do Homo sapiens, enquanto os indivíduos desta es-
pécie localizados na Europa teriam dado origem aos Homo neanderthalensis.
 
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Figura 2.5 – Reconstituição de um Homo neanderthalensis exibida pelo Smithsonian 
Museum of Natural History. 
Além da Europa, o Homo neanderthalensis (ou Homem de Neandertal) ha-
bitou também uma pequena parte da Ásia no espaço de tempo entre 200 e 25 
mil anos atrás. Esta foi a primeira espécie ancestral no gênero Homo descober-
ta pelos humanos modernos. Seus primeiros fragmentos corpóreos foram en-
contrados em meados do século XIX, antes mesmo da publicação de A Origem 
das Espécies por Darwin.
Os neandertais tinham seus corpos mais bem adaptados ao frio e utilizaram 
sua grande habilidade na produçãode ferramentas com a técnica da cultura 
musteriense para produzir as peças de couro com as quais se protegiam no pe-
ríodo que ficou conhecido como a última Era do Gelo. Outra invenção para isso 
foram os abrigos construídos com carcaças de mamutes.
38 • capítulo 2
Os contextos nos quais seus vestígios foram encontrados mostram que os 
neandertais já tinham um forte comportamento social baseado na dinâmica 
familiar, o que deveria ser demonstrado nas atividades coletivas de caça e nos 
cultos funerários, por exemplo. A existência de crença na vida após a morte e 
os registros do uso de adornos demonstram claramente a existência de uma 
capacidade simbólica, mesmo que limitada.
O Homo neanderthalensis era normalmente considerado um ponto final 
evolutivo. Em contrapartida, sabe-se com certeza que parte da população nean-
dertal conviveu com os Homo sapiens por pelo menos alguns milhares de anos. 
Tal convivência pode ter sido responsável pela eliminação dos Homo neander-
talensis, já que nossa espécie teria sido mais capaz de se adaptar e garantir a 
vitória na competição pelos mesmos recursos necessários aos neandertais. 
Recentemente, todavia, estudos genéticos têm demonstrado que parte da po-
pulação neandertal foi absorvida pelos Homo sapiens europeus, através de re-
produção mista.
Os mais antigos fósseis dos humanos modernos foram encontrados na atual 
Etiópia e datam de aproximadamente 200 mil anos atrás. Anatomicamente nos 
diferenciamos de outras espécies de hominídeos pelo formato do crânio (em-
bora os neandertais apresentassem a mesma capacidade craniana), além de 
uma menor robustez corporal.
Considerando a coexistência com outras espécies do mesmo gênero Homo, 
quais foram as vantagens adaptativas que garantiram ao ser humano moder-
no a continuidade de sua espécie em detrimento das outras? Esta pergunta 
está relacionada a uma série de capacidades desenvolvidas por volta de 60 mil 
anos atrás, no contexto que ficou conhecido como “Revolução do Paleolítico 
Superior”. 
2.2 A Revolução do Paleolítico Superior
A análise da cultura material de nossos antepassados Homo sapiens demons-
tra claramente uma espécie de “grande salto para a frente” entre 70 e 50 mil 
anos atrás na África. Esse foi um momento de explosão criativa que proporcio-
nou uma diversidade inédita nos vestígios arqueológicos. Pesquisas genéticas 
têm apontado para uma modificação no genoma humano, permitindo uma 
enorme expansão de nossa capacidade de abstração e simbolismo e o surgi-
mento de uma linguagem complexa. Alguns estudiosos defendem a ideia da 
capítulo 2 • 39
aplicabilidade do conceito de exaptação, ou seja, do desenvolvimento de uma 
capacidade cerebral latente a partir de algum estímulo, que, neste caso, seria a 
própria linguagem, abrindo as portas para toda a complexidade simbólica que 
alcançamos. 
O uso da linguagem complexa possibilitou o desenvolvimento de formas 
mais eficazes de passagem social dos conhecimentos, garantindo um progresso 
mais acelerado das técnicas e das tecnologias produtivas. Consequentemente, 
os seres humanos passaram a poder contar com ferramentas cada vez mais 
bem acabadas. Além das pedras lascadas, os utensílios começaram a utilizar 
madeira, ossos, cerâmica para fabricar anzóis, redes, arpões e embarcações. 
Em comparação com as espécies anteriores, os enterramentos dos Homo 
sapiens mostram a presença de um culto funerário mais intrincado, com pa-
drões de sepultamento que incluíam mais objetos, fossem adornos ou utensí-
lios diários.
O aspecto mais impactante desse processo revolucionário do paleolítico su-
perior foram certamente os frutos artísticos dessa evolução na capacidade sim-
bólica dos seres humanos. As representações simbólicas devem, logicamente, 
ter-se iniciado com processos simples de abstração relativa a elementos natu-
rais, como os desenhos em paredes de cavernas de vários locais do mundo.
 
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Figura 2.6 – Animais representados nas cavernas de Lascaux, na França, conhecida como 
“Capela Sistina da Idade da Pedra”. 
40 • capítulo 2
A presença de diversas representações de diferentes animais 
e de cenas de caça inicialmente fez com que os pré-historiado-
res considerassem essas imagens como retratos de cenas do coti-
diano dos homens e mulheres daquele período. Uma pesquisa mais 
aprofundada começou a mostrar níveis de abstração mais profundos que
 
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Figura 2.8 – Homem-
leão de Hohlenstein, 
encontrado na Alemanha.
 Ao trabalhar com o argumento do desenvolvimento 
da capacidade de abstração humana, Gordon Childe 
(1966) mostra a sua importância para a evolução e adap-
tação humana, identificando o simbolismo como uma 
espécie de equipamento imaterial. Além de permitir, 
em conjunto com as modificações morfológicas na la-
ringe, o surgimento da linguagem complexa e garantir 
uma comunicação melhor e uma passagem mais efi-
ciente da tradição social, a abstração acaba tendo papel 
fundamental na construção da visão de mundo, das ex-
plicações da realidade e das motivações sociais. O autor 
chega a afirmar que, a partir de determinado momento, 
objetivos abstratos, como o amor e a liberdade, acabam 
por se tornarem mais importantes que outros mais ma-
teriais, como a fome e o medo. A partir disso, localiza-se 
não eram imediatamente derivados da na-
tureza observável, como seres antropomór-
ficos (humanos com cabeça de pássaro, por 
exemplo), entre outros. Essa constatação ge-
rou outra interpretação, na qual as pinturas 
rupestres deveriam ter também significado 
mágico-religioso. 
Outros exemplos dessas formas mais abs-
tratas são as representações figurativas de 
humanos, como as famosas Vênus (figuras 
femininas ligadas ao culto da fertilidade) ou 
esculturas antropomórficas, como o homem-
leão de Hohlenstein (também associado à ado-
ração de aspectos naturais).
 
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Figura 2.7 – Vênus de Willendorf, 
achada na Áustria.
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o papel da ideologia na produção e se entende toda a sua importância como 
elemento integrador da sociedade.
2.3 A Diáspora Humana
A Revolução do Paleolítico Superior, a complexificação dos níveis de abstração 
humana, o surgimento da linguagem complexa, das expressões artísticas e de 
ferramentas (materiais e imateriais) cada vez mais sofisticadas de produção ge-
rou uma capacidade inédita de expansão e adaptação para o gênero humano. 
Não foi coincidência que simultaneamente os Homo sapiens tenham iniciado 
grande diáspora que levou à ocupação de todo o planeta a partir da África.
 
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200 000
70 000
100 000
25 000
40 000
50 000
30 000
15 000
12 000
4500
1500
1500
Homo sapiens
Homo neanderthalensis
Homo erectus
Figura 2.9 – Os caminhos das migrações dos seres humanos modernos na Pré-História. 
A diáspora do Homo sapiens pode ser traçada tanto a partir da descoberta 
de fósseis quanto do mapeamento genético das populações atuais (indicando 
sua maior ou menor proximidade com os ancestrais africanos dos quais todos 
e todas são descendentes). 
Da África, os humanos modernos viajaram pela Síria-Palestina e se dividi-
ram entre grupos que rumaram para Leste, em direção à Península Arábica e 
Ásia, enquanto outros se dirigiram para a Europa. Nesse processo, os Homo 
sapiens conviveram com outros descendentes de espécies anteriores, como os 
Homo heidelbergensis e os neandertais.
42 • capítulo 2
Mesmo que haja um razoável consenso sobre a dispersão para a Ásia, Europa 
e Oceania, a ocupação da América envolve um debate com mais possibilidades 
em diálogo. A teoria mais difundida é a da “Ponte da Beríngia”, segundo a qual 
os seres humanos chegaram à América, há cerca de 10 mil anos, através da Ásia, 
cruzando o estreito de Bering a pé durante uma baixa no nível do mar, decor-
rente de um período de glaciação. Com o aumento no nível das águas, esta pon-
te permanece atéhoje submersa.
Outra das teorias de ocupação da América começou a ser elaborada com 
a descoberta, a partir da década de 1920, de sítios na América do Norte com 
uma cultura lítica que ficou conhecida como “cultura Clovis” e manteve duran-
te bastante tempo o título de mais antigos vestígios humanos do continente. 
Como a datação desta cultura Clovis a localizou num período entre 11 e 9 mil 
anos atrás, isto deveria significar que a travessia pela Beríngia teria ocorrido 
alguns milênios antes, por volta de 14 mil anos atrás.
Descobertas mais recentes de sítios cada vez mais antigos tanto na América 
do Sul quanto na Central e na do Norte têm colocado em questão essas hipóte-
ses. Partindo de indícios linguísticos, etnográficos e biológicos, desenvolveu-
se uma teoria que aponta para uma migração transpacífica para o continente. 
Além da rota da Beríngia, os seres humanos teriam chegado aqui também na-
vegando pelo oceano Pacífico, o que explicaria sítios tão antigos na América do 
Sul. Outra hipótese levantada foi que a migração para o continente teria se dado 
pelas águas congeladas do Atlântico Norte.
Os mapeamentos genéticos atuais têm apontado questões interessantes. 
Primeiramente, confirmam que boa parte da população nativa do continente 
americano é descendente de povos asiáticos. Em contrapartida, os mesmos 
estudos apontaram que deve ter havido uma forte migração europeia para a 
América do Norte.
Por fim, o Brasil se insere nessas discussões a partir dos vestígios encon-
trados no sítio da Pedra Furada, localizado no Parque Nacional da Serra da 
Capivara, no Piauí. As escavações dirigidas pela arqueóloga Niede Guidon mos-
tram indícios de uma ocupação humana na região que data de 25 mil anos atrás. 
Esta datação é, hoje, razoavelmente aceita nos meios acadêmicos. Há, todavia, 
mais questionamentos sobre a afirmação de que determinadas ferramentas 
encontradas na Serra da Capivara teriam aproximadamente 100 mil anos, ou 
seja, período em que o ser humano moderno ainda nem teria deixado a África.
capítulo 2 • 43
Os debates sobre as diásporas dos Homo sapiens são calorosos e há, como 
visto, inúmeras hipóteses. Por mais que os estudos genéticos estejam apresen-
tando um panorama bastante confiável, cabe lembrar que essas discussões 
envolvem questões do nosso presente. A reivindicação de ocupações humanas 
mais antigas é um título em disputa por arqueólogos de todo o mundo, inclusi-
ve por orientar financiamentos de pesquisa e até mesmo dinheiro de turismo. 
Devemos, portanto, analisar cuidadosamente cada uma das teorias e, em al-
guns casos, esperar por confirmações mais sólidas e consensuais.
2.4 A economia e a forma de vida do Paleolítico
Como viviam os seres humanos no planeta durante seus primeiros quase 190 
mil anos? É claro que isso é muito tempo e, consequentemente, inclui muitas 
diferenças. Uma comparação importante deve ser feita para mostrar que mes-
mo a agricultura é uma invenção relativamente recente na história da trajetória 
dos seres humanos modernos. Durante a imensa maioria de nossa presença 
neste planeta, vivemos basicamente como caçadores-coletores.
Em nossos primeiros 190 mil anos, nós, seres humanos, vivemos basicamen-
te da coleta de vegetais e da caça de animais (ou eventualmente do aproveitamen-
to de alguma carcaça abandonada por outro animal caçador), ou seja, homens e 
mulheres eram dependentes do mundo selvagem, tanto animal quanto vegetal.
As sociedades naquele período se estruturaram em grupos que tinham 
como um importante aspecto de união a participação conjunta nos trabalhos 
de coleta e caça. A organização em grupos pequenos garantira uma mobilida-
de maior e uma capacidade mais efetiva de suprir todos os membros. Por isso, 
imagina-se que as sociedades se organizavam em grupos de até 50 pessoas. Não 
há nenhum indício, para aquele período, de hierarquias sociais ou poderes acu-
mulados que mantivessem quaisquer diferenciações relativas, seja em relação à 
produção, seja a outro fato, ainda que existam registros que sugiram a presença 
de especialização do trabalho (como a alta qualidade de algumas ferramentas).
A igualdade social era mantida com o auxílio da fartura relativa aos bens 
disponíveis na época. Ao contrário do que se imagina, os caçadores e coleto-
res não viviam com grandes dificuldades, empenhados sempre numa luta pela 
conquista de alimento. Em contrapartida, pesquisas indicam que a quantidade 
de horas de trabalho necessárias ao sustento das sociedades humanas subiu 
com a introdução da agricultura.
44 • capítulo 2
Outra tendência muito forte no senso comum é a projeção da desigualda-
de e da violência e da dominação executada pelo gênero masculino sobre as 
mulheres na grande maioria das sociedades dos últimos 15 mil anos para as 
populações humanas anteriores. Isto significa dizer que a ideia de um homem 
das cavernas dominador e violento, arrastando sua fêmea, está cada vez mais 
distante do que apontam os estudos mais recentes. As últimas análises de gru-
pos caçadores-coletores têm demonstrado uma forte tendência à igualdade de 
gênero, necessária para a conformação de redes sociais extrafamiliares. Tais 
redes aumentavam consideravelmente as possibilidades de sobrevivência dos 
grupos. Um estudo mais simbólico complementa esse quadro, ao apontar que a 
maioria das mãos pintadas nas paredes de caverna pertencia a mulheres, o que 
talvez indique o início de uma especialização do trabalho e, talvez, até um papel 
acentuado do gênero feminino nas perspectivas mágico-religiosas nascentes.
 
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Figura 2.10 – Cueva de las Manos, pintura rupestre localizada na Província de Santa Cruz, 
na Argentina. 
2.5 A Revolução Neolítica
Entre 10000 e 5000 a.C., os seres humanos passaram por mais um proces-
so que determinou uma mudança completa nas suas possibilidades de futuro. 
Em diferentes locais, muitas vezes de forma independente, deu-se um enorme 
passo no processo humano de controle da natureza, com a domesticação de 
plantas e animais e a consequente invenção da agricultura.
capítulo 2 • 45
Por mais que possa haver um primeiro estranhamento com a ideia de uma 
“invenção” e não uma “descoberta” da agricultura, devemos ser precisos ao in-
dicar que essa nova forma de produção é uma invenção humana. Foi um proces-
so longo, com milênios de anos de observação da natureza e experiências, que 
culminou na revolução neolítica. Foi necessário descobrir quais das espécies de 
animais e vegetais eram domesticáveis, o que, no caso dos primeiros, depende da 
adaptação a dietas mais pobres e da capacidade de reprodução rápida, enquanto 
no caso dos vegetais estava ligado a um ciclo produtivo mais estável e a uma pro-
dutividade alta. Em seguida, iniciou-se o trabalho de seleção artificial dos melho-
res indivíduos entre o gado e as plantas para serem usados na reprodução.
O historiador italiano Mario Liverani (1995) aponta que, entre 10000 e 
7500 a.C., os passos iniciais dessa nova forma de produção, que está em desen-
volvimento, começam a proporcionar suas primeiras grandes consequências. 
Os grupos humanos deixam as cavernas e passam a habitar pequenas vilas com 
casas redondas e é possível observar as primeiras diferenças entre acampamen-
tos fixos, voltados para a agricultura, e outros sazonais, usados para a caça e 
o pastoreio. Nesse contexto, são encontrados os primeiros silos de armazena-
mento de grãos e se notam enterramentos coletivos e individuais.
 
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Figura 2.11 – Vestígios de uma casa natufiana. 
46 • capítulo 2
Os indícios mais antigos dessa nova organização foram achados na Síria-
Palestina, nos grupos que compuseram a cultura natufiense, marcada pela 
produção de ferramentas de pedra específicas para uso na colheita. A crono-
logia da invenção da agricultura não é algo simples e preciso, pois depende ba-
sicamente da análise de ossos de animais ou estudos laboratoriais

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