Prévia do material em texto
Introdução à Biologia Molecular APRESENTAÇÃO MÓDULO 1 MÓDULO 2 CONCLUSÃO DESCRIÇÃO A construção história da Biologia Molecular e seu emprego no estudo das moléculas presentes nas células responsáveis pela manutenção da vida, como o DNA, o RNA e as proteínas. PROPÓSITO Compreender como o RNA e o DNA foram descobertos e a importância destas moléculas para as células procariontes e eucariontes. OBJETIVOS Módulo 1 Descrever a história da Biologia Molecular, a origem da vida e a organização gênica nos organismos Módulo 2 Reconhecer alguns dos mecanismos de regulação da expressão gênica nos procariotos e eucariotos INTRODUÇÃO A Biologia Molecular é a área da Biologia que estuda as moléculas presentes nas células responsáveis pela manutenção da vida. Vamos iniciar nosso aprendizado sobre, possivelmente, as moléculas mais importantes para a existência da vida na Terra: Os ácidos nucleicos RNA e DNA. Você sabia que até mesmo os vírus, microrganismos intracelulares obrigatórios apresentam ácidos nucleicos? Não existe sequer um ser vivo que não tenha moléculas de RNA ou DNA. Vamos explorar um breve histórico sobre como começaram os estudos da Biologia Molecular, passando pela provável origem da vida na Terra, conhecendo as estruturas e composições dos ácidos nucleicos e observando como é dada a organização deste material em diferentes seres vivos. Aprenderemos alguns dos mecanismos de regulação gênica dos procariotos e os eucariotos e por fim noções de epigenética. Vamos juntos? MÓDULO 1 Descrever a história da Biologia Molecular, a origem da vida e a organização gênica nos organismos HISTÓRICO DA BIOLOGIA MOLECULAR Nosso histórico começa em 1869 com um bioquímico suíço chamado Johannes Friedrich Miescher (Figura 1). Em seus estudos, ele buscava determinar quais os componentes químicos que existem dentro dos glóbulos brancos (leucócitos), presentes no pus de feridas, que, de modo geral, possuem um núcleo grande e bem definido. No interior desse núcleo, ele observou uma grande quantidade de um composto ácido que continha átomos de nitrogênio e fósforo, nomeando-o de nucleína por estar localizado no núcleo. Mal ele sabia da importância desta descoberta! Figura 1: Friedrich Miescher. Diversos outros cientistas continuaram investigando o tal composto nucleína, entre eles Albrecht Kossel, que em 1880 demonstrou que na nucleína existiam diferentes bases nitrogenadas. Richard Altmann em 1889 conseguiu purificar a nucleína e nomeou o purificado de ácido nucleico. Com o tempo, os ácidos nucleicos foram ainda mais estudados, pareciam muito importantes já que praticamente todas as células possuíam esse material. Foram descobertas quatro diferentes bases nitrogenadas, as bases púricas: adenina e guanina e as bases pirimídicas: citosina e timina, todas com um glicídio desoxirribose (Figura 2). Figura 2: Nucleotídeo, contendo a base nitrogenada, o fosfato e a pentose. Essas bases podiam estar ligadas entre si, sempre obedecendo a um padrão, onde a adenina se associava à timina por 2 ligações de hidrogênio e a guanina se associava à citosina por 3 ligações, sendo esta interação a mais estável devido à maior quantidade de ligações (Figura 3). Figura 3: Bases nitrogenadas e suas interações por ligação de hidrogênio. O grupamento R nas riboses consiste em um OH e nas desoxirriboses de um H. Entretanto, havia um fato curioso: a presença de uma base diferente, chamada de uracila, em alguns desses materiais. Essa base apresentava uma ribose no lugar da desoxirribose e se ligava à timina no lugar da adenina. As moléculas que continham desoxirribose foram nomeadas de ácido desoxirribonucleico (ADN), em inglês Deoxyribonucleic Acid, o famoso DNA. As moléculas com ribose como glicídio foram nomeadas de ácido ribonucleico (ARN), em inglês Ribonucleic Acid, conhecido como RNA (Figura 4). Figura 4: Todas as bases nitrogenadas. Vamos agora juntar todos os conceitos estabelecidos para entendermos como é a estrutura do DNA e do RNA. Um nucleotídeo é um conjunto formado por uma base nitrogenada, que pode ser uma purina ou pirimidina. Dentre as purinas, temos a adenina e a guanina; entre as pirimidinas, temos a citosina e a timina, no caso de uma molécula de DNA, e o uracil(a), no caso de uma molécula de RNA. A ligação entre as bases é realizada entre a molécula de açúcar, de uma ribose para o RNA ou uma desoxirribose para o DNA, com o grupamento fosfato da base adjacente, na ligação conhecida como ligação fosfodiéster (Figura 5). Figura 5: Ligação fosfodiéster entre nucleotídeos da mesma fita de DNA. A estrutura do DNA se encontra em fita dupla. A união entre as duas fitas se dá por ligações de hidrogênio entre as bases nitrogenadas, como demonstrado na Figura 3. Vamos voltar para a nossa história. Em 1953, uma dupla de cientistas, James Watson e Francis Crick, publicou um artigo na revista Nature chamado de Molecular Structure of Nucleic Acids. Eles eram contrários às ideias que existiam na época a respeito da estrutura do DNA. Entre os modelos antigos, o que mais se destacou foi o de Linus Pauling; ele acreditava que o DNA era interligado pelos grupamentos fosfatos, formando uma coluna. Watson e Crick, baseados em uma foto tirada por Rosalind Franklin, propuseram uma nova estrutura para essa molécula. A estrutura era uma dupla hélice, com as bases nitrogenadas purinas se ligando às pirimidinas no centro da hélice espiralada, sendo muito parecida com a que usamos até hoje (Figura 6). Figura 6: Foto de raios X tirada por Rosalind Franklin, responsável pelas conclusões de Watson e Crick. Com a estrutura do DNA resolvida e com o conhecimento sobre a química dessas moléculas, faltava agora entender a atuação e a organização delas nas células e porque eram tão importantes. Ao longo dos anos, o conhecimento sobre o DNA e o RNA vem crescendo. Hoje, com técnicas de sequenciamento do DNA, podemos, por exemplo, ver rapidamente se algum indivíduo possui propensão a determinado câncer analisando a sua sequência de DNA. Estamos começando a ter mais segurança na edição genética, e um dia poderemos curar doenças que ainda nem se manifestaram. Atualmente, podemos quantificar esse material genético que expressamos para diagnosticar doenças, como a COVID-19, e modificar outros organismos para que produzam nossas proteínas. É dessa forma que algumas das insulinas vendidas na farmácia são produzidas. Existem inúmeras possibilidades decorrentes do desenvolvimento da Biologia Molecular. A origem da vida A origem da vida sempre despertou curiosidade. Ao longo dos anos, existiram diversas teorias, algumas se provaram erradas e outras se mantêm até hoje. Você imagina como a vida começou? Vamos conhecer um pouco dessas teorias? Sabemos que átomos podem fazer ligações de maneira espontânea desde que estejam em um ambiente favorável e tenham afinidade um pelo outro, ou seja, ao se ligarem encontram uma estabilidade, assim são construídas as moléculas. Dentre as teorias existentes, uma delas, a teoria de Oparin e Haldane, era justamente a ideia da formação espontânea de pequenas moléculas orgânicas, as quais, com o tempo, passaram a se organizar de maneira cada vez mais complexa até se replicarem e evoluírem, formando as células primitivas. Em 1953, Stanley Miller tentou provar que era possível existir a criação espontânea de moléculas orgânicas na Terra, desde que o ambiente fosse favorável. Ele fez um experimento simulando como possivelmente era a atmosfera primitiva da Terra, cerca de 4 bilhões de anos atrás. No seu experimento, tinham moléculas, como gás hidrogênio, metano e vapor de água, que eram bastante comuns no ambiente primitivo. Esses gases, na presença de uma descarga elétrica, como um raio, ligavam-se formando diversas moléculas orgânicas, dentre elas os aminoácidos alanina, glicina e ácido aspártico (Figura 07). Figura 7: Experimento de Miller. A teoria de Oparine Haldane continuou ganhando relevância à medida que novos estudos foram realizados, dentre eles os estudos do geólogo Michael Russell. Russell demonstrou que existem fontes de águas termais no fundo dos oceanos aquecidas pelo manto da Terra, que jorram água alcalina. Essas fontes são ricas em minérios de ferro, níquel e enxofre dissolvidos. A reação desses minérios com o gás carbônico, hidrogênio reativo e moléculas de água é capaz de produzir compostos orgânicos, como hidrocarbonetos e até mesmo nucleotídeos! Uma das descobertas mais incríveis sobre essas fontes termais são as reações químicas que lá ocorrem e como a geração dessas moléculas orgânicas acontece. As fontes termais são ricas em minerais, sendo assim, possuem um elemento que pode ser oxidado, como o ferro. O elétron oriundo da oxidação é carregado pelos núcleos metálicos desses minerais até chegar ao aceptor final de elétrons, este pode ser o monóxido ou o dióxido de carbono, que vai ser reduzido gerando a energia necessária para a confecção das moléculas orgânicas. Você já ouviu falar de um mecanismo parecido com esse anteriormente? Onde um elétron percorre uma cadeia até chegar ao seu aceptor gerando energia? Exatamente! É de maneira muito semelhante a esta que diversos seres vivos produzem energia como nós! Esse mecanismo ocorre durante a fosforilação oxidativa nas mitocôndrias, etapa metabólica da nossa respiração celular. Isso mostra um elo entre todos os nossos ancestrais, fortalecendo a hipótese de que a vida se originou dessas fontes de águas termais há muitos anos. No entanto, ainda temos diversas perguntas para serem respondidas. Nos dias atuais, essa é a teoria melhor aceita para a origem da vida (Figura 8). Figura 8: Fonte termal vulcânica, a possível origem da vida. A teoria da panspermia surgiu a partir da observação de compostos orgânicos presentes em meteoritos e ganhou força a partir de 1997 com a análise do Meteorito de Muchinson (Figura 9). Os pesquisadores encontraram diversos aminoácidos e adenina, presente no nosso DNA, que datavam de aproximadamente 7 bilhões de anos, sendo assim mais antigos que nosso próprio planeta, que possui cerca de 4,5 bilhões de anos. Apesar de muito interessante, essa teoria não possui evidências científicas suficientes para explicar a origem da vida no nosso planeta, diferente da teoria de Oparin e Haldane. Figura 9: Fragmento de meteorito. Entretanto, é muito interessante imaginar que, em outros lugares do Universo, existem compostos orgânicos e quem sabe até mesmo vida. Essas amostras extraterrestres evidenciaram também que é possível a criação de matéria orgânica, incluindo bases presentes no DNA e no RNA. Em um mundo onde existiam alguns nucleotídeos, aminoácidos e hidrocarbonetos, essas moléculas começaram a interagir entre si, formando cadeias cada vez mais complexas, ligações entre diferentes nucleotídeos formaram os primeiros RNAs e ligações entre diferentes aminoácidos formaram os oligopeptídeos. A interação entre os oligopeptídeos e o RNA leva a benefícios mútuos, gerando, por exemplo, estabilidade na estrutura de ambos, originando maiores quantidades de determinadas estruturas. Imagine essas diversas interações por milhares e milhares de anos, é natural que, com o tempo, estruturas mais complexas se formem e se mantenham. Hoje em dia, temos o conhecimento que tanto o RNA quanto pequenos peptídeos conseguem realizar reações químicas com diversas funções (neurotransmissores, hormônios, regulação gênica etc). Recentemente, foi descoberto que o RNA seria capaz até mesmo de se autorreplicar, gerando outras moléculas de RNA também capazes de se autorreplicarem, assim a evolução poderia acontecer ainda mais rápido, isso é o chamado “Mundo RNA”. Naquele mesmo ambiente, existiam outros compostos orgânicos, como os primeiros lipídeos oriundos dos hidrocarbonetos formados. Você já jogou um pouco de óleo na água? Sabe que não se misturam certo? Isso se dá a partir da característica anfipática dos lipídeos que, em um ambiente aquoso, tendem a formar micelas, estruturas circulares formadas naturalmente devido à forma que interagem com a água, expondo a parte hidrofílica e escondendo a parte hidrofóbica da água. Atenção Nem todos os lipídeos possuem características anfipáticas, portanto nem todos são capazes de formar estruturas de micelas. Dos lipídeos anfipáticos, o mais importante na formação da membrana celular é o fosfolipídeo. Desse modo, esses lipídeos formavam grandes micelas, originando “membranas” celulares rudimentares com moléculas de RNA em seu interior, surgindo as primeiras células primitivas, com material genético com capacidade replicativa. Hoje em dia, grande parte dos seres vivos ainda possui seu material genético disperso no citoplasma, chamamos esses organismos de procariontes ou procariotos (Figura 10). É importante ressaltar que, ao longo dos anos, o mundo RNA evoluiu, o DNA, constituído de uma dupla fita, é mais estável que o RNA. Sendo assim, possui uma maior confiabilidade para armazenar informações de um determinado ser vivo e tem as informações responsáveis pela manutenção da vida. O DNA passa pelo processo de transcrição que dá origem a um RNA mensageiro (RNAm), este pode ser traduzido e passa a ser uma proteína, unidade que vai realizar as funções que a célula precisa, como catalisar reações, servir para replicar o DNA, formar estruturas etc. Figura 10: Como poderiam ser as primeiras células vivas da Terra. ENTENDENDO MELHOR COMO A VIDA PODE TER SURGIDO Organização do material genético em procariotos Os procariotos são os organismos mais antigos da Terra. Todos são unicelulares e não possuem um núcleo organizado, ou seja, o seu material genético, o DNA, não é separado por uma membrana nuclear, chamada de carioteca, muito parecido com as primeiras células encontradas no nosso planeta. Esses organismos são os mais simples e toda a sua expressão gênica é diferente da nossa. Nós, seres humanos, pertencemos ao grupo dos eucariontes, temos o material genético separado do citoplasma pela carioteca (Figura 11). Figura 11: Núcleo disperso nas células procariontes e núcleo compartimentado pela carioteca nas células eucariontes. Antes de falar da organização do material genético dos procariotos, vamos conhecer alguns conceitos básicos para lembrarmos de certas nomenclaturas: O gene É um segmento codificante do DNA, ou seja, de fato, será transcrito e traduzido. O genoma Contém toda a informação hereditária, todo DNA que será passado da célula mãe para a células filha, incluindo os genes e as sequências não codificantes. O cromossomo É uma estrutura formada por uma molécula de DNA altamente compactada e associada a proteínas auxiliadoras, que ajudam a compactar e descompactar o DNA para facilitar o acesso de outras proteínas a essa região, por exemplo. Os procariotos possuem apenas um cromossomo linear ou circular que contém todo o seu material genético, chamado de DNA cromossomal. Além do cromossomo, eles também podem possuir elementos genéticos móveis (EGM), os responsáveis por transmitir algumas características genéticas a outros indivíduos vizinhos a fim de conferir alguma vantagem ou desvantagem. O cromossomo dos procariotos possui uma quantidade de DNA que pode variar entre 0,16 a 13 Mpb. Apenas para termos um exemplo, o DNA da bactéria E. coli possui cerca de 4,6 Mpb contido em uma célula de 2 μm! Esse volume só é possível devido ao alto grau de condensação do DNA. A condensação é feita através da formação de grandes alças na molécula de DNA, que originam alças menores, possibilitando que o DNA ocupe um menor volume na célula. As alças são formadas com o auxílio das proteínas DNA girase e topoisomerase l, a região formada por este único cromossomo condensado é chamada de nucleoide (Figura 12). Figura 12: Compactação do DNA procarionte. Os EGMs são partes fundamentais do DNA dos procariotos,mesmo não pertencendo ao cromossomo e possuem diversas funções que serão detalhadas posteriormente. É importante saber que existem diferentes tipos de EGMs, vamos estudar os três principais: plasmídeos, bacteriófagos e os transposons. Os plasmídeos são moléculas circulares de DNA fita dupla, independentes do cromossomo e possuem capacidade de replicação autônoma. Seu tamanho é de cerca de 1 a 35 kpb. Cada célula pode conter diversos ou nenhum plasmídeo, com uma ou várias cópias. Os plasmídeos são considerados elementos de herança extracromossômica, já que possuem replicação autônoma, independentemente do cromossomo. Eles também não são vitais, não causam malefícios à célula hospedeira, geralmente, possuem informações que serão aproveitadas para produção de toxinas, pilinas, adesinas e diversos outros tipos de proteínas que podem conferir algum tipo de vantagem para a célula hospedeira. Justamente por isso, podem ser chamados também de elementos genéticos acessórios (Figura 13). Figura 13: Plasmídeo e DNA bacteriano. Os plasmídeos não são normalmente sintetizados, e sim adquiridos através de um fenômeno chamado conjugação bacteriana, onde uma bactéria transfere os seus plasmídeos para outra e mantém uma cópia destes para si. Os plasmídeos são de grande importância na Biologia Molecular pela facilidade de manuseio e replicação. São utilizados como vetores onde uma sequência de interesse é inserida no plasmídeo, o qual é difundido entre os indivíduos de determinada colônia de bactérias. As bactérias, ao se replicarem, possibilitam originar uma grande quantidade de cópias da sequência de interesse. A partir disso, podemos purificar esse material e usar para os mais diversos fins. Exemplo Uma das formas de obtenção e produção de insulina é utilizando os plasmídeos como vetores. Os bacteriófagos podem se inserir no DNA cromossomal e se replicar junto com o organismo. Após a inserção, os genes contidos no bacteriófago são expressos e podem codificar fatores de virulência e toxinas entre outras proteínas. Eles são perigosos porque podem transformar uma bactéria não patogênica em uma bactéria patogênica. Alguns até mesmo podem produzir capsídeo viral e se multiplicar diversas vezes, iniciando um ciclo lítico que termina na eclosão da célula hospedeira (Figura 14). Figura 14: Bacteriófago. Os transposons são pequenas sequências de DNA que serão inseridas de forma aleatória no DNA do organismo hospedeiro, formando novos trechos de genoma, evento chamado de transposição e catalisado por enzimas chamadas de transposases. As transposases são capazes de cortar o DNA na região do transposon, liberando essas sequências, que se difundem pela célula. Os transposons são identificados a partir de mudanças fenotípicas nas bactérias. Como quase todo o DNA bacteriano é codificante, essas inserções podem causar algumas alterações funcionais no procarioto, como a perda de atividade enzimática. Existem três principais subgrupos de transposons: As sequências de inserção (chamadas de IS, do inglês Insertion Sequence) Os transposons compostos (simbolizados pela sigla Tn) Transposons complexos ou elementos TnA Os ISs são os transposons mais simples, podem se inserir tanto no cromossomo quanto nos plasmídeos, possuem cerca de 700 a 2.500 pb e são nomeados pela sigla IS, seguido de um número, por exemplo IS3 ou IS37. Eles contêm os genes responsáveis pelo próprio mecanismo de transposição, que codificam as transposases e possuem sequências muito parecidas em suas extremidades para que a sua respectiva transposase corte essa região, liberando o IS para ser reinserido em um outro sítio. A transposição acontece no momento de abertura da dupla fita de DNA, que antecede a replicação, onde o transposon é inserido na fita de DNA e replicado junto com o DNA do procarioto (Figura 15). Figura 15: Estrutura esquemática do ISs. O segundo subgrupo é formado pelos transposons compostos (Tn), são chamados de transposons compostos porque são formados por duas sequencias de ISs em suas extremidades. Os Tn podem conferir vantagens a bactérias como, por exemplo, o caso do Tn9, que gera resistência ao antibiótico cloranfenicol. Os transposons complexos (TnA), o último subgrupo, possuem cerca de 500 pb. Ao invés de ISs em suas extremidades, possuem pequenas sequências indicando o local de corte pela transposase. Os TnA induzem a replicação do procarioto com objetivo de se multiplicarem. É importante destacar que os EGMs possibilitam que as bactérias troquem informação genética de maneira muito rápida. Desse modo, caso apareça algum desses elementos como, por exemplo, a capacidade de gerar resistência a um antibiótico, logo todas as bactérias daquela colônia também ganham essa mesma resistência. Essas características foram fundamentais para a evolução e manutenção da vida dos organismos procariontes. Organização do material genético em eucariotos Conforme já aprendemos, a maior diferença entre procariotos e eucariotos é a presença da carioteca, uma membrana nuclear que engloba o material genético, isolando o citoplasma, no conjunto chamado de núcleo. O núcleo permite um maior nível de organização celular e modifica a organização e a estrutura gênica. Para começarmos a entender o nível de complexidade da organização do material genético em eucariotos, vamos a algumas contas básicas. Todo o genoma humano possui cerca de 3.2 Gpb, enquanto isso a espécie Polychaos dubium, um pequeno parasita unicelular eucarionte, possui 670 Gpb, ou seja, cerca de 200 vezes maior que o nosso. A esse fenômeno damos o nome de paradoxo do valor C, onde a complexidade do organismo não está associada ao tamanho do seu material genético, uma vez que nós seres humanos somos mais complexos que este parasita. O paradoxo do valor C pode ser explicado pela maneira com que o DNA é codificado e processado. Outro fator relevante é o nível de compactação do DNA. Vamos agora fazer um comparativo entre duas células que já conhecemos os valores de pares de base existentes: a humana, com 3,2 Gpb, e a E. coli, com 4,6 Mpb. O DNA humano é contido em um diâmetro de cerca de 5 a 10 μm, enquanto na E. coli esse valor é de 2 μm, ou seja, um DNA 700 vezes maior ocupando um espaço quase semelhante ao da bactéria. Isso é possível graças a uma diferente forma de estruturação e compactação do DNA. O genoma dos eucariotos é compactado em cinco níveis diferentes. No primeiro, todo DNA, que possui 2 nm, é acoplado a proteínas chamadas histonas, essa estrutura é conhecida como nucleossomo. O nucleossomo possui 11 nm e se compacta formando uma estrutura solenoide de 30 nm. Essas histonas ficam bem juntas formando uma estrutura ainda mais densa como se fossem fibras. Nos terceiros e quartos níveis de compactação, são formadas alças dos solenoides (parecidas com as alças dos procariotos), as quais possuem 300 e 700 nm, respectivamente. No último grau de compactação, ocorre a formação de uma alça ainda maior, 1.400 nm, que dá origem à estrutura chamada de cromátide cromossômica. Duas cromátides unidas por uma estrutura chamada de centrômero formam o cromossomo. O conjunto de cromossomos, ou seja, o DNA e as proteínas acessórias, principalmente, as histonas, formam a cromatina. O cromossomo também possui em suas extremidades os telômeros, que são estruturas fundamentais para a estabilidade do cromossomo e indicadores da idade celular, uma vez que um pequeno trecho desse telômero é perdido devido à forma com que o DNA replica (Figura 16). Figura 16: Compactação do DNA em eucariotos. O grau de compactação do DNA eucarionte pode variar de acordo com a fase do ciclo celular que se encontra, pois a cromatina se organiza de diferentes formas, obedecendo à necessidade de expressão gênica. Quando o DNA está menos condensado (um estado mais aberto), pode ser exposto a toda a maquinaria de transcrição e/ou replicação existente, e a cromatina se encontra em um estadode eucromatina. Quando o DNA está bastante condensado, a célula não consegue expressar ou replicar tal região, e ele se encontra no estado de heterocromatina. Há ainda a heterocromatina constitutiva, formada por trechos que nunca serão transcritos (Figura 17). Saiba mais Normalmente, chama-se estado de eucromatina/heterocromatina porque não é algo fixo. Logo, o mesmo trecho pode ficar ora em estado de eucromatina ora em de heterocromatina. Porém, não é errado chamar apenas de eucromatina ou heterocromatina. Figura 17: Transcrição do DNA descompactado. Os eucariotos possuem também um DNA extracromossomal, presente nas mitocôndrias e nos cloroplastos (nas células vegetais) e completamente independentes do DNA cromossomal. Existem teorias de que essas organelas eram outros organismos que acabaram sendo inseridos nas células eucariontes e lá permaneceram, pois o ambiente era favorável. Em troca do ambiente seguro, eles geravam energia para as células hospedeiras, formando uma relação de simbiose. VERIFICANDO O APRENDIZADO 1. Estudamos as teorias do surgimento da vida e as características estruturais das moléculas que compõem o genoma. Sobre esses assuntos, leia as afirmativas abaixo e responda. I. A teoria de Oparin e Haldane era a mais aceita até a descoberta do meteoro de Murchinson, a partir de então a teoria mais aceita foi a da panspermia. II. A teoria mais aceita atualmente para a origem da vida na Terra é derivada da teoria de Oparin e Haldane, onde a vida surgiu de forma espontânea a partir de pequenas moléculas orgânicas. III. O RNA e o DNA são moléculas capazes de armazenar informação genética, entretanto o DNA é mais estável e se consolidou nesta função. IV. O mundo RNA dependia de organismos complexos. Estão corretas as afirmativas: I e II I e III II e III II, III e IV Responder Comentário 2. Vimos as principais diferenças na organização das células procariontes e eucariontes. Sobre a organização nos eucariotos, como você espera que esteja organizado o DNA de uma célula pronta para se replicar? DNA completamente enovelado em estado de eucromatina. DNA parcialmente desenovelado, em estado de heterocromatina. DNA desenovelado, em estado de eucromatina. DNA desenovelado em estado de heterocromatina. Responder Comentário MÓDULO 2 Reconhecer alguns dos mecanismos de regulação da expressão gênica nos procariotos e eucariotos INTRODUÇÃO Todos os seres vivos estão em um ambiente sujeito a constantes alterações. Às vezes, podem faltar nutrientes, ou a temperatura fica muito alta. Existem inúmeras possibilidades e nossos genes precisam responder a essas variações. Se faltar nutriente, o indivíduo que melhor conseguir economizar recursos, vai sobreviver; já aqueles que continuarem usando normalmente tendem a morrer. Portanto, há uma seleção natural daqueles que conseguem se adaptar rapidamente ao novo meio em detrimento dos que não têm essa habilidade. Você sabe que isso tem a ver com a capacidade dos mecanismos de regulação gênica? Poupar recursos depende que determinados genes que gastam muita energia fiquem menos ativos, mais condensados. Já genes responsáveis pelo armazenamento de recursos, como os que expressam as proteínas promotoras da formação do glicogênio, ficam mais ativos, ou seja, descompactados, para que a maquinaria de transcrição possa acessá-los. É importante ressaltar que existem ainda os genes que são essenciais para a manutenção da vida, chamados de genes constitutivos. Não podemos simplesmente economizar energia expressando uma menor quantidade desses genes, caso contrário, há uma alta possibilidade de isso levar à morte. Vamos agora entender os ajustes finos e as diferentes estratégias entre procariotos e eucariotos com relação à regulação da expressão gênica, começando pelos organismos procariontes. Mecanismos de regulação gênica em procariotos A regulação da expressão em procariotos pode acontecer em diferentes pontos, com maior custo energético, durante a estabilização da proteína, que é o produto da fase de tradução, ou durante a transcrição, com menor custo de energia, pois ainda não ocorreu a tradução do RNAm (RNA mensageiro). A transcrição ocorre a partir do acoplamento da RNA polimerase em uma sequência de DNA, chamada de região promotora. Todos os genes (sequências de DNA codificantes) possuem uma região promotora. Essa região pode inclusive favorecer uma maior ou menor expressão gênica, fazendo um controle negativo ou positivo, dependendo da ligação de determinadas proteínas conhecidas como fatores transcricionais, que inibem ou ativam a expressão gênica. Vamos ver um exemplo mais concreto desse conceito de regulação baseado em fatores transcricionais repressores (controle negativo) ou efetores (controle positivo). Uma regulação negativa pode acontecer de algumas formas. Um fator repressor se liga à região promotora e impede que a RNA polimerase acople na fita de DNA, inibindo a transcrição. Além disso, um fator repressor pode se ligar a um fator efetor, impedindo a sua atuação e diminuindo a expressão de determinado gene. O mesmo conceito pode ser aplicado inversamente, um fator efetor se liga à região promotora aumentando a transcrição ou pode se ligar a um fator repressor e impedir a inibição do gene (Figura 18). Figura 18: Regulação da expressão gênica negativa (esquerda) e positiva (direta). Antes de continuarmos, vamos relembrar a jornada que se inicia na molécula de DNA até a formação de uma proteína. Um complexo proteico chamado RNA polimerase (existem diferentes subtipos de polimerases, para fins didáticos, vamos considerar apenas como RNA polimerase) acopla na região promotora de um gene e começa a construção de um RNAm. Nos procariotos, a região codificante é chamada de operon e é composta por mais de um gene, geralmente, com função final relacionada (de uma mesma via metabólica), ou seja, todos os genes de um determinado operon irão formar proteínas com funções de alguma forma vinculadas umas às outras, como veremos em breve. O RNAm oriundo da transcrição de um operon é formado por mais de um gene e é chamado de RNAm policistrônico. De modo diferente, nos eucariotos, todas as regiões promotoras estão associadas a apenas um gene, logo o RNAm final possui informações apenas deste gene, sendo chamado de RNAm monocistrônico; apesar do RNAm dos eucariotos ser formado por apenas um gene, ele precisa ser processado para continuar a sua jornada (Figura 19). Figura 19: Diferenças no RNAm de eucariontes e procariontes. UTR é uma sigla do termo inglês untranslated region que significa região não codificante. Após a formação e o processamento do RNAm nos eucariotos, ele precisa sair do núcleo para encontrar o ribossomo. Nos procariotos, por não possuir carioteca, o RNAm encontra-se no citoplasma, e um RNAt (RNA transportador) é responsável por levar o RNAm contendo as informações do DNA para o ribossomo, local onde irá iniciar a tradução. O processo de tradução inicia a partir de um código de leitura presente no RNAm (conhecido como códon) e segue com a leitura das bases de três em três nucleotídeos até um determinado ponto onde teremos um códon de parada (Stop códon). Um conjunto de 3 bases de nucleotídeos traduzidas corresponde a 1 aminoácido, e a união dos aminoácidos origina uma cadeia polipeptídica, que é modelada por proteínas conhecidas como chaperonas, dando origem a uma proteína funcional. Vamos entender mais a fundo como o ribossomo traduz 3 bases de nucleotídeos em um aminoácido verificando o exemplo a seguir: Quando um ribossomo identifica os nucleotídeos UUA, insere um aminoácido a leucina a cadeia peptídica que está sendo formada. Os códons e seus respectivos aminoácidos são os mesmo para qualquer organismo, o código genético é universal. Atenção Todos os seres vivos compartilham o mesmo código de códons. Esse é mais um indício da teoria da evolução, segundoa qual todos nós viemos de um mesmo ancestral comum. Agora, podemos continuar falando sobre a regulação gênica dos procariotos. Para facilitar a compreensão, vamos ver um exemplo prático: a regulação do operon Lac da bactéria Escherichia coli. Esse operon é responsável pelo metabolismo da lactose, um açúcar importante para a nutrição dessas bactérias. O operon Lac é composto de diferentes trechos, em sequência, temos: 1. P1, Promotor 1 (promotor do gene I) 2. Gene I (gene repressor) 3. O2, Operador 2 (operador secundário) 4. P2, Promotor 2 (promotor dos genes Z, Y e A) 5. O1, Operador 1 (operador secundário) 6. Gene Z 7. O3, Operador 3 (operador secundário) 8. Gene Y 9. Gene A Os promotores são responsáveis por iniciar a transcrição do gene adjacente. Os operadores são regiões regulatórias, onde podem ativar ou reprimir a transcrição do operon. Nesse caso, o O1 é um sítio em que o repressor Lac se liga e O2 e O3 são operadores secundários. Os operadores sempre se localizam próximos aos genes que regulam. Temos ainda os três genes estruturais LacZ (gene Z), LacY (Gene Y) e LacA (Gene A), que codificam as enzimas β- galactosidase, permease e transacetilase e o Gene 1, que codifica o inibidor do próprio operon, este possui uma região promotora exclusiva para ele (Figura 20). Figura 20: Operon Lac. Por ser um recurso muito valioso, as células tentam tornar o consumo de energia o mais eficiente possível. Na ausência de lactose, não existem motivos para que os genes Z, Y e A sejam expressos, uma vez que são ligados ao metabolismo da lactose, mas a expressão do gene I é constitutiva, ou seja, ele é sempre expresso mesmo quando não tem presença de lactose intracelular. O gene I dá origem a uma proteína repressora do promotor 2 (repressor Lac) que se liga à região do O1, inibindo a expressão de Z, Y e A, mesmo que a RNA polimerase acople em P2 os genes não são expressos. A lactose não atua diretamente no operon Lac, entretanto, quando algumas moléculas de galactose entram na célula, as poucas enzimas β-galactosidase conseguem converter a galactose em alolactose; essa se liga ao repressor Lac, favorecendo uma mudança conformacional da proteína, que leva à desassociação entre o repressor e o operador 1, liberando o funcionamento da RNA polimerase, que transcreve os genes Z, Y e A (Figura 21). Figura 21: Esquema de regulação do operon Lac mediado pela lactose. Pol: RNA polimerase, mRNA lac: mRNA mensageiro lactose. Outra forma de regulação é a dependente de glicose, cuja presença inibe o operon Lac, pois a célula deve priorizar o metabolismo da glicose antes dos outros carboidratos. Quando os níveis de glicose estão baixos, ocorre a ativação do operon Lac, a indução é feita por uma pequena molécula efetora, o cAMP (AMP cíclico), e uma proteína regulatória chamada de CRP (sigla para cAMP receptor protein, ou seja, proteína receptora de cAMP, CRP, também pode ser chamada de CAP, catabolite activator protein). Vamos entender como isso acontece? Na ausência de glicose, a concentração de cAMP aumenta e essa molécula se liga ao CRP (CAP), formando o complexo CRP-cAMP (ou CAP-cAMP). O complexo se liga ao DNA em uma região operadora dependente de CAP-cAMP próxima ao operador 3, ativando a transcrição dos genes Z, Y e A, para a metabolização da lactose. Na presença de glicose, os níveis de cAMP diminuem e não é formado o complexo CAP-cAMP, logo o operon Lac fica inibido. É importante destacar que, quando os níveis de glicose estão altos, a presença de lactose, não leva à expressão dos genes Z, Y, A, devido à ausência do indutor CAP-cAMP. Esse fato é justificado pela necessidade do consumo de glicose antes da lactose (Figura 22). Figura 22: Regulação do operon Lac mediado por glicose. cAMP: AMP cíclico; CAP: proteína receptora de cAMP; Pol: RNA Polimerase; ATP: adenosina trifosfato; P: região promotora. A regulação gênica do metabolismo de lactose para as bactérias E. coli é de grande importância para a sobrevivência. Elas se adaptam ao meio e à presença de diferentes nutrientes, consumindo-os de modo inteligente. Estudar o operon Lac nos possibilita entender os principais métodos de regulação gênica em procariotos, pois ele engloba fatores repressores e efetores em diferentes estratégias e meios nutricionais. Agora, podemos ir adiante e aprender sobre a regulação gênica nos eucariotos. OPERONS MECANISMOS DE REGULAÇÃO GÊNICA EM EUCARIOTOS Os organismos eucariontes podem ser multicelulares, com cada célula com funções diferentes e atuando em locais diferentes. Entretanto, todas as células possuem o mesmo DNA. Vamos considerar a estrutura e a organização dos procariotos, seres unicelulares cujo material genético quase todo é codificante, têm os operons gerando RNAm policistrônico (não existem operons em organismos eucariontes), proteínas interligadas de uma mesma via metabólica sendo expressas, regulações básicas de ativação ou repressão genética e os promotores. As células procariontes funcionam muito bem ao pensar que são unidades individuais, buscando a sobrevivência. De modo diferente, se considerarmos os organismos multicelulares, eles possuem um maior nível de complexidade e, ao mesmo tempo, o percentual de gene codificante e não codificante é muito menor. Nos humanos, cerca de 2% do DNA é codificante. É um pouco contraintuitivo pensar que um organismo mais complexo, onde todas as células, mesmo com funções variadas, possuam o mesmo DNA, e este ainda por cima tem proporcionalmente uma menor porcentagem de genes codificantes. Vamos a um exemplo? Ao pensarmos em especialização celular, uma célula do seu intestino precisa absorver e transportar nutrientes com muita eficiência. Já uma célula da sua pele tem que se multiplicar mais, conferir resistência e acumular queratina. No entanto, ambos os tipos celulares têm os mesmos genes, praticamente todo o DNA é igual! Mas como isso é possível? O segredo desse paradoxo é a regulação gênica e o processamento do RNAm. Para podermos transcrever uma fita de DNA, primeiro, temos o acoplamento da RNA polimerase na fita dupla. Esse DNA precisa estar acessível à maquinaria de transcrição, logo em um estado descompactado. Atenção Durante todo o texto, utilizaremos o termo “maquinaria de transcrição”, o qual é mais correto, uma vez em que, nos eucariotos, apenas a RNA polimerase sozinha é incapaz de iniciar a transcrição, ela necessita do auxílio de fatores gerais de transcrição adicionais. A compactação e descompactação do DNA em eucariotos são dadas pelas proteínas histonas, sendo um tipo de regulação gênica. As histonas ditam a compactação da cromatina e são moduladas por pequenas alterações químicas em sua estrutura, sendo elas: metilação (adição de grupamentos metila favorecem a compactação do DNA pelas histonas, impossibilitando a atuação da maquinaria transcricional) e a acetilação (a adição de grupamentos acetil favorecem a descompactação do DNA, possibilitando a atuação da maquinaria de transcrição. Esse mecanismo é catalisado pelas proteínas histona acetil transferase (HAT) e é reversível) (Figura 23). Assim, uma das maneiras de regular o que vai ser expresso é dependente do padrão de acetilação/metilação de histonas. Figura 23: Acetilação de histonas mediada por histona acetil transferase (HAT). Voltando ao exemplo dado anteriormente, as células do seu intestino certamente possuem trechos do DNA menos compactados do que as células da sua pele. Esses trechos irão expressar proteínas responsáveis pela absorção dos nutrientes. Nas células da pele, os mesmos trechos irão estar com as suas respectivas histonas metiladas, ou seja, mais compactadas. Determinados fatores transcricionais podem promover a acetilação e a metilação das histonas de maneira direcionada, gerando especializações celulares. Em resumo, o padrão de histonas do seu DNA é um dos fatores que faz com que diferentes células tenham funções diferentes.Outro mecanismo de inibição da expressão gênica é dado pela metilação do próprio DNA, mais especificamente na posição 5 do anel de citosina, que dificulta a interação com a RNA polimerase, impedindo a transcrição (Figura 24). Figura 24: Citosina metilada na posição 5 do anel pirimidina. A metilação é a adição de um grupo metil (CH3) de forma covalente. Enzima responsável DNA metiltransferase (DNMT). As citosinas metiladas formam as chamadas ilhas CpG ou ilhas CG (ilhas citosina- guanina); essa metilação não é reparada pela maquinaria de reparo celular, não sendo transcrita e traduzida, constituindo assim partes não codificantes. No entanto, essa metilação pode ser passada para as células filhas no processo de replicação durante a multiplicação celular, garantido a sua hereditariedade. Elas se localizam, principalmente, próximas do sítio de início da transcrição de genes constitutivos. Nos eucariotos, ainda levando em consideração a regulação da transcrição, existem ainda as sequências reguladoras, bastante semelhante aos operadores dos procariotos. No entanto, nos eucariotos, essas sequências podem estar localizadas a milhares de pares de base de distância do promotor. Até agora vimos alguns fatores de regulação associados à transcrição do DNA, mas a expressão gênica dos eucariotos pode ser regulada em diversos outros pontos, como: no processamento pós-transcricional, na degradação do RNAm, na tradução, no processamento pós-traducional e na degradação e transporte da proteína gerada. Como sabemos, os eucariotos são organismos bastante complexos, existem milhares de diferentes interações. A cada dia, os cientistas descobrem novos conceitos e novas formas de regulação gênica. Por isso, vamos focar em algumas das regulações mais relevantes, como o splicing alternativo e a maturação do RNAm, a nível de processamento pós-transcricional, e nos recém- descobertos miRNA (microRNA) e siRNA (small interference RNA), para degradação do RNAm. Agora, já sabemos por que todas as células, mesmo possuindo o mesmo DNA, têm especializações diferentes. Entretanto, falta ainda entender a proporção de DNA codificante e não codificante. Temos apenas 2% de DNA codificante, será que é suficiente para dar conta de toda complexidade de um organismo multicelular? A resposta é sim. Afinal, estamos vivos, não é? A chave para entender esse dilema está no splicing alternativo. Cada célula possui um padrão de splicing (conjunto de informação de como vai realizar esse processo) de acordo com suas funções, originando assim proteínas diferentes a partir do mesmo gene. Após a transcrição do gene, é formado um pré-RNAm, o qual é processado por um complexo de RNA e proteínas chamado de spliciossomo, onde, dependendo do padrão de splicing celular no momento da transcrição, alguns trechos do pré-RNAm são considerados éxons e outros são considerados íntrons. Os trechos íntrons são removidos do pré-RNAm e os trechos éxons são ligados pelo spliciossomo, gerando um pré-RNAm formado apenas com éxons, de acordo com o padrão de splicing (Figura 25). Figura 25: Diferentes isoformas do RNAm. Um mesmo gene pode dar origem a uma enorme quantidade de diferentes RNAm e, por consequência, proteínas diferentes. Desse modo, os eucariotos conseguem com uma quantidade relativamente baixa de genes codificantes gerar um número muito elevado de diferentes proteínas. Junto ao splicing alternativo, o pré-RNAm também precisa passar por um processamento, que o torna capaz de sair do núcleo para chegar ao ribossomo onde será traduzido. O pré-RNAm passa por duas etapas, uma adição do cap 5’, dada pela ligação de um nucleotídeo alterado, e o GMP metilado (Guanosina monofosfato metilada), na ponta 5’ do RNAm, por uma ligação trifosfato. O cap 5’ é fundamental para o reconhecimento do RNAm maduro, a exportação do RNAm para fora do núcleo e o endereçamento do RNAm em direção ao ribossomo. Ele promove a ligação na organela, além de também ter ação protetora. Você sabia A palavra cap significa boné e, nesse caso, pode ser traduzida para capacete 5’. Por isso, o nome cap 5’ ou capacete 5’, uma vez que esse nucleotídeo alterado, protege a perda de informação contida no RNAm oriunda da degradação pela ação de ribonucleases e fosfatases. A segunda etapa do processamento do RNAm é uma adição de uma cauda chamada de “poliA” na extremidade 3’ do RNA. A cauda tem esse nome por ser formada de 80 a 250 resíduos de adenina. A cauda também serve para proteger o RNAm de degradação enzimática durante todo o processo de locomoção em direção ao ribossomo, a cauda poliA é clivada por endonucleases quando o RNAm encontra o ribossomo. Uma vez com a adição do cap 5’ e da cauda poliA, o RNAm se torna maduro e pode ser traduzido pelo ribossoma no citoplasma. A regulação desse processo se dá pela remoção de uma dessas adições. Caso a célula não precise mais de determinada proteína, sinalizações regulatórias são enviadas para o núcleo, onde são removidas e o RNAm agora “não maduro” é degradado (Figura 26). Figura 26: Processamento do RNAm. A última regulação genética que iremos estudar é a mediada por pequenos RNAs: os miRNAs e os siRNA. Os miRNAs apresentam cerca de 19 a 28 pb (pares de base), são endógenos e formados a partir do pareamento imperfeito de uma fita dupla de RNA (double stranded RNA, conhecido como dsRNA). Esse pareamento gera uma estrutura em forma de grampo de cabelo, conhecida como hairpin, que é clivada por uma endonuclease dicer (endonucleases são proteínas que cortam a fita de RNA ou DNA de forma precisa) formando os miRNAs. Os siRNAs, com cerca de 22 a 23 pb, são exógenos (oriundos do RNA viral) ou endógenos (oriundos de retrotransposons) e formados a partir de um pareamento perfeito de uma dsRNA. Também são clivados pela endonuclease dicer, gerando esses fragmentos de siRNA. A regulação é dada pela ligação entre o miRNA ou siRNA no RNAm induzindo a degradação deste ou impedindo sua tradução (Figura 27). Figura 27: Mecanismo de ação do miRNA e siRNA. Os siRNA e miRNA foram recentemente descobertos e possuem um papel muito importante no controle da expressão gênica em eucariotos. No entanto, ainda estamos tentando entender melhor como funcionam, embora suas aplicações médicas pareçam ser muito promissoras. Imagine, por exemplo, uma pessoa que tenha o metabolismo alterado para produzir grandes quantidades de colesterol endógeno. Ela pode ter diversos problemas de saúde oriundos do alto colesterol. No futuro, talvez seja possível construir siRNAs específicos para silenciar a expressão de HMG-CoA redutase, principal enzima da síntese de colesterol endógeno, abrindo possibilidades para uma nova terapia genética. EPIGENÉTICA A genética é o estudo dos genes, das características hereditárias de determinados organismos, guardadas nas moléculas de DNA. A epigenética é o estudo das características que vão acima dos genes, pois “epi” deriva do radical grego que indica a posição superior. Essa ciência estuda as variações nos traços fenotípicos pela ação de fatores externos ou ambientais que afetam a expressão gênica de modo reversível. A compreensão da epigenética pode nos ajudar a estabelecer relações entre a forma com que vivemos e o surgimento de determinadas doenças. Relembrando o que estudamos anteriormente, como um neurônio sabe que tem que ser um neurônio e não um osteoblasto durante o desenvolvimento embrionário? A resposta está nos fatores de transcrição específicos de cada linhagem celular que leva a especialização destas células para a sua forma final e nas marcas epigenéticas no DNA. As marcas epigenéticas são características do material genético que possibilitam ou não sua expressão, seja por metilação do DNA, modificação de histonas (metilação ou acetilação) ou presença de mi e siRNA, que degradam o RNAm. A epigenética é tudo que está acima dos genes e estuda alterações na expressão gênica que não alteram a estrutura primáriada sequência de nucleotídeos. Na verdade, explora modificações no DNA decorrentes da interação do indivíduo com o ambiente. Exemplo Um indivíduo fumante consome grandes quantidades de nicotina, cuja molécula modifica o padrão metilação em diversos genes. Então, os genes que, em condições normais, não estariam sendo expressos passam a ser. E quais são as consequências dessa alteração na expressão gênica? É difícil precisar todas as alterações causadas por determinada substância no nosso organismo, temos milhares de diferentes células expressando diferentes proteínas. Entretanto, a comunidade científica estuda incansavelmente as diversas modificações genéticas causadas por alimentos, comportamentos, drogas etc. Agora, ainda utilizando o caso da nicotina como exemplo, é sabido que o cigarro faz mal à saúde e, segundo estudos, podem reduzir em cerca de 14 anos a expectativa de vida de adultos fumantes. Apenas nos Estados Unidos, o cigarro tem algum tipo de relação com a morte de 400 mil pessoas por ano. As consequências de fumar incluem câncer, doenças cardiovasculares e respiratórias. Muitas grávidas continuam fumando durante a gestação, sendo a causa de morte infantil evitável mais importante. O cigarro consumido pelas mães atrasa o desenvolvimento neural e cardiopulmonar do embrião. Essas crianças também tendem a ter uma maior frequência de doenças respiratórias como asma (Figura 28). No entanto, estudos recentes mostram que mães fumantes podem não só ter os filhos com asma, como também os netos, mesmo que as filhas não fumem. Além disso, foram encontrados alguns mecanismos epigenéticos nos filhos e netos de fumantes. Figura 28: Cigarro. Os conceitos sobre hereditariedade genética evoluíram com o passar dos anos, não apenas os genes são responsáveis por transmitir as informações dos pais para os filhos, mas também os padrões epigenéticos são fundamentais, os quais podem ser passados através de gerações. Marcações no DNA e nas histonas (acetilações e metilações) modificam o padrão de expressão genética, principalmente, no período de desenvolvimento embrionário, causando uma reprogramação gênica. As modificações epigenéticas ocorrem não apenas pela exposição recorrente a determinadas substâncias químicas, mas também devido a fatores ambientais e comportamentais. O holocausto durante a Segunda Guerra Mundial deixou marcas visíveis e invisíveis tanto nos que sofreram o horror nazista quanto em seus filhos e netos. As marcas invisíveis foram reveladas nos cromossomos, que representam um tipo de memória biológica do nosso organismo. Os sobreviventes do holocausto tinham pesadelos frequentes, ansiedade, depressão, dificuldade de ressocialização, entre outros distúrbios psicológicos. De alguma maneira, esses traumas se internalizaram e foram passados adiante, pois os descendentes da guerra tendem a ser mais vulneráveis ao stress e propensos a desordens mentais, evento conhecido como transmissão transgeracional de trauma (TTT). A TTT também já foi descrita na literatura a partir de indivíduos que sofreram abusos, refugiados, vítimas de tortura etc. (Figura 29). Figura 29: Soldado com stress pós-traumático. A compreensão da TTT trouxe avanços na vida de diversas crianças e adultos que passaram por eventos traumáticos, permitindo o diagnóstico e tratamento precoce das consequências do trauma, uma espécie de medicina epigenética. É importante lembrarmos que os mecanismos epigenéticos são maleáveis e podem ser alterados durante a nossa vida, dependendo de fatores químicos e socioambientais, que nos leva a boas perspectivas de tratamento. Diversas outras associações epigenéticas têm sido testadas. Compreender os ajustes finos desses mecanismos pode gerar uma revolução na maneira com que enxergamos a medicina e a genética. Podemos citar alguns exemplos, como: pessoas que sofreram fome durante os anos iniciais de suas vidas possuem um menor risco de câncer colorretal; crianças que passaram por trauma tendem a desenvolver depressão quando adultos devido a uma hipermetilação do gene NR3C1 (responsável pela expressão de receptores ligados ao stress); associação de metilação do DNA, formando ilhas CpG em determinadas regiões, é correlacionada com maior prevalência de diabetes tipo 2 e obesidade em populações árabes, dentre outros estudos. A terapia genética, com o uso de miRNA, siRNA e edição genética parece muito promissora, mas ainda são estudos preliminares e temos muitos mistérios a desvendar (Figura 30). Figura 30: Terapia genética. VERIFICANDO O APRENDIZADO 1. Estudamos as regulações gênicas nos procariotos e vimos que existem operons, que são trechos responsáveis por alguma função biológica. Leia as afirmativas abaixo e responda. I. Considerando o operon Lac, a expressão do gene I é constitutiva, uma vez que não temos lactose sempre no meio intracelular. II. Em procariotos, os genes com funções de uma mesma via metabólica estão localizados próximos uns aos outros em um operon e transcrevem para um RNAm monocistrônico. III. O RNAm monocistrônico é capaz de ser traduzido em diferentes proteínas de uma mesma via metabólica. IV. O operon Lac tem seu funcionamento reprimido na presença de glicose, mesmo que com altas concentrações de lactose. Estão corretas as afirmativas: I, II e III II e III II, III e IV I e IV Responder Comentário 2. A epigenética estuda como componentes externos e ambientais modificam nosso genoma através de determinadas marcações. São exemplos de marcadores epigenéticos que podem modificar a expressão de genes: I. Metilação do DNA, metilação de histonas e presença de miRNAs. II. Acetilação do DNA, splicing alternativo e presença de miRNAs. III. Ubiquitinação de proteínas, metilação de histonas e nicotina. IV. Metilação do DNA, stress e presença de miRNAS. Estão corretas as sentenças: I e II I III e IV II Responder Comentário CONCLUSÃO CONSIDERAÇÕES FINAIS Conhecemos como a Biologia Molecular foi estabelecida como ciência a partir da descoberta do DNA e do RNA, explorando principalmente a sua estrutura e a sua função. Além disso, vimos a teoria mais aceita, atualmente, para explicar como a vida surgiu no nosso planeta. Aprendemos como o material genético nos eucariotos e procariotos e como esses grupos se organizam e os diferentes mecanismos de regulação da expressão gênica. Por fim, todos os conceitos aprendidos sobre os eucariotos foram concatenados para termos uma noção sobre o que é a epigenética. A epigenética é uma ciência recente que estuda o comportamento de todos os componentes que estão presentes influenciando o genoma e, por consequência, influenciando na expressão gênica. PODCAST 0:00 24:46 REFERÊNCIAS AL MUFTAH, W. A. et al. Epigenetic associations of type 2 diabetes and BMI in an Arab population. In: Clinical epigenetics, v. 8, n. 1, p. 13, 2016. ALBERTS, B. Molecular biology of the cell. 2018. AMBROS, V. The functions of animal microRNAs. Nature, v. 431, n. 7006, p. 350-355, 2004. BETZ, F. Managing Science: Innovation, Technology, and Knowledge Management. 2011. BORGES-OSÓRIO, M. R.; ROBINSON, W. M. Genética Humana. 3 ed. Artmed Editora, 2013. COSTA, E. de B. O.; PACHECO, C. Epigenética: regulação da expressão gênica em nível transcricional e suas implicações. In: Semina: Ciências Biológicas e da Saúde, v. 34, n. 2, p. 125-136, 2013. DAHM, R. Friedrich Miescher and the discovery of DNA. In: Developmental biology, v. 278, n. 2, p. 274-288, 2005. DUBEY, R. C. D. K. ATB of microbiology. 1st edition, p.227-229. New Delhi: S. Chand & Company, 2015. GRINDLEY, N. D. F.; REED, R. R. Transpositional recombination in prokaryotes. In: Annual review of biochemistry, v. 54, n. 1, p. 863-896, 1985. HARTL, D.; RUVOLO, M. Genetics. Jones & Bartlett Publishers, 2012. HICKMAN, A. B.; DYDA, F. Mechanisms of DNA transposition. In: Mobile DNA III, p. 529-553, 2015. HUGHES,L. et al. Early life exposure to famine and colorectal cancer risk: a role for epigenetic mechanisms. In: PloS one, v. 4, n. 11, p. e7951, 2009. JACOB, F.; MONOD, J. Genetic regulatory mechanisms in the synthesis of proteins. In: Journal of molecular biology, v. 3, n. 3, p. 318-356, 1961. JOAQUIM, L. M.; EL-HANI, C. N. A genética em transformação: crise e revisão do conceito de gene. In: Scientiae studia, v. 8, n. 1, p. 93-128, 2010. KELLERMANN, N. PF. Epigenetic transmission of holocaust trauma: can nightmares be inherited. In: Isr J Psychiatry Relate Sci, v. 50, n. 1, p. 33-39, 2013. LANE, N. The vital question: energy, evolution, and the origins of complex life. WW Norton & Company, 2015. LEHMAN, N. Cold-hearted RNA heats up life. In: Nature chemistry, v. 5, n. 12, p. 987-989, 2013. LESLIE, F. M. Multigenerational epigenetic effects of nicotine on lung function. In: BMC medicine, v. 11, n. 1, p. 1-4, 2013. MARSHALL, M. First life: The dawn of evolution. In: New Scientist, v. 211, n. 2825, p. 32-35, 2011. MELAS, P. A. et al. Genetic and epigenetic associations of MAOA and NR3C1 with depression and childhood adversities. In: International Journal of Neuropsychopharmacology, v. 16, n. 7, p. 1513-1528, 2013. MILLER, S. L. et al. A production of amino acids under possible primitive earth conditions. In: Science, v. 117, n. 3046, p. 528-529, 1953. NELSON, D. L.; LEHNINGER, A. L.; COX, M. M. Lehninger principles of biochemistry. Macmillan, 2008. PARFREY, L. W.; LAHR, D. J. G; KATZ, L. A. The dynamic nature of eukaryotic genomes. In: Molecular biology and evolution, v. 25, n. 4, p. 787- 794, 2008. SUMNER, A. T. Chromosomes organization and function. In: Blackwell Science Ltd. a Blackwell Publishing company. United Kingdom, v. 1, p. 143-153, 2003. VÁZQUEZ-SALAZAR, A.; LAZCANO, A. Early life: Embracing the RNA world. Current Biology, v. 28, n. 5, p. R220-R222, 2018. WATSON, J. D.; CRICK, F. H. C. Molecular structure of nucleic acids: a structure for deoxyribose nucleic acid. Nature, v. 171, n. 4356, p. 737-738, 1953. EXPLORE+ Para explorar mais os seus conhecimentos a respeito do assunto deste tema, recomendamos as seguintes leituras: Cientistas encontram possível sinal de vida em Vênus, matéria de divulgação científica da revista Exame, escrita pela jornalista Tamires Vitorino. Nessa matéria, é abordada a descoberta do gás fosfina metabólito bacteriano em Vênus, indicando possível sinal de vida. Michael Russell demonstrou que existem fontes de águas termais no fundo dos oceanos, aquecidas pelo manto da Terra, que jorram água alcalina. Essas fontes são ricas em minérios de ferro, níquel e enxofre dissolvidos. Para conhecer mais, leia o livro Questão vital: Por que a vida é como é?, de Nick Lane e Talita Rodrigues. Para conhecer um pouco mais sobre os avanços da epigenética na área biomédica, leia o livro Epigenética aplicada à saúde e a doença de Elsner e Siqueira. Para conhecer um pouco mais sobre a história da Biologia Molecular, visite a matéria do Rogerio Meneghini Os genes e o gene, publicada na revista FAPESP. Qual foi papel de Roselind Franklin no modelo da dupla hélice do DNA de Watson e Crick? Para saber mais, visite o artigo As controvérsias a respeito da participação de Rosalind Franklin na construção do modelo da dupla hélice, de Marcos Rodrigues da Silva. CONTEUDISTA Eldio Gonçalves dos Santos Currículo Lattes Ao clicar nesse botão, uma nova aba se abrirá com o material preparado para impressão. Nela, acesse o menu do seu navegador e clique em imprimir ou se preferir, utilize o atalho Ctrl + P. Nessa nova janela, na opção destino, direcione o arquivo para sua impressora ou escolha a opção: Salvar como PDF. Isolamento de Ácidos Nucléicos APRESENTAÇÃO MÓDULO 1 MÓDULO 2 CONCLUSÃO DESCRIÇÃO Isolamento dos ácidos nucleicos: coleta, transporte e armazenamento de amostras; extração e quantificação de DNA e RNA; síntese de cDNA; desenho experimental. PROPÓSITO Compreender as etapas para o isolamento dos ácidos nucléicos, a partir do desenho experimental até a sua extração e quantificação é o primeiro passo para obtenção de amostras de qualidade para a realização dos métodos moleculares, garantindo, assim, resultados fidedignos. OBJETIVOS Módulo 1 Descrever o desenho experimental e as fases pré-analíticas do isolamento dos ácidos nucleicos Módulo 2 Descrever os procedimentos de extração e quantificação do DNA e RNA e síntese do cDNA INTRODUÇÃO A Biologia Molecular é responsável por estudar as moléculas que realizam a manutenção da vida. São elas: DNA, RNA e proteínas, que têm como função principal, considerando o dogma central da Biologia, armazenar informações e enviar essas informações para a síntese das proteínas que realizaram as funções celulares, respectivamente. Atualmente, os inúmeros avanços obtidos na área médica, na ciência animal e vegetal, são resultado da elaboração de técnicas moleculares que nos proporcionaram novas formas de estudar o DNA e o RNA. Técnicas essas que estão em constante evolução. No entanto, antes de analisar o material genético propriamente dito, é necessário extrair esse material das células. Para isso, é essencial que a coleta, o armazenamento, o transporte e o processo extrativo sejam realizados de maneira satisfatória e que tenhamos uma quantidade de material genético suficiente, de qualidade, livre de contaminantes e íntegro para realizar a análise. Você imagina como é feito o processo extrativo? Será que a extração de DNA ou RNA empregam a mesma metodologia? E o que é cDNA e qual sua importância? Vamos juntos, ao longo desta jornada, explorar todos esses questionamentos, visitando a coleta, transporte e armazenamento do material para análise molecular (fase pré-analítica). Após essa fase, vamos aprender sobre as técnicas de extração de DNA e RNA, quantificação, análise da pureza e, por fim, a síntese do cDNA. Além disso, estudaremos o desenho experimental e entenderemos a sua aplicabilidade, etapas e importância no desenvolvimento e conhecimento científico! MÓDULO 1 Descrever o desenho experimental e as fases pré-analíticas do isolamento dos ácidos nucleicos 1 – DESENHO EXPERIMENTAL O desenho experimental é um planejamento de um estudo realizado em algumas etapas e é uma ramificação do método científico, que é a ferramenta mais poderosa de todas para o avanço tecnológico da humanidade e muda até mesmo a forma que pensamos nas coisas do dia a dia. Veja a aplicação desse método em uma atividade do nosso cotidiano: Clique nas setas para ver o conteúdo. Leonardo tem o hábito de assistir ao telejornal todos os dias. Enquanto assistia ao programa, viu que o prefeito da sua cidade participou de uma pequena entrevista e fez algumas afirmações sobre o funcionamento da prefeitura naquele trimestre. Primeiro, Leonardo deve parar, pensar sobre tal afirmação e aplicar o método científico, observando o que foi falado e questionando “Será que é verdade o que o prefeito falou?” Em seguida, ele estabelecerá hipóteses: “É verdade que tal coisa aconteceu” ou “É mentira que tal coisa aconteceu”. A próxima etapa é realizar um experimento, que nesse caso é a busca de fontes confiáveis de notícia, com credibilidade, para identificar se o que o político falou é verdade ou não, analisar o discurso e, finalmente, Leonardo poderá tomar a sua conclusão baseado no método científico. Pronto! Agora ele pode validar a hipótese “É verdade” ou “É mentira” ao invés de simplesmente aceitar a afirmação dita. O método científico foi utilizado para produzir quase tudo que existe, indo do aparelho em que você está lendo este texto até a cadeira em que está sentado(a). Nós utilizamos esse método muitas vezes de forma inconsciente, mas temos que ter em mente que ele existe e que devemos pensar sempre de forma criteriosa. Resumindo, as etapas do métodocientífico são: observação, questionamento, hipótese, experimento, análise dos resultados e conclusão. Método científico. Fonte: EnsineMe. Agora que já entendemos o método científico, podemos falar sobre desenho experimental. Ele é um conjunto de etapas que devem ser realizadas para conduzir uma hipótese utilizando o método científico, com objetivo de estabelecer um resultado confiável e reprodutível. A reprodutibilidade é um dos pontos mais importantes da ciência. Exemplo Vamos entender melhor com um exemplo: Sua equipe do laboratório desenvolveu uma nova técnica de quantificação de DNA. Você deverá escrever sua metodologia passo a passo, com detalhes dos tipos de solventes necessários, as concentrações, pressão, temperatura de incubação etc. Os dados devem ser claros para que quando outra pessoa ler essa metodologia (por exemplo, alguém do outro lado do mundo, cinco anos depois) ela consiga chegar no mesmo resultado, considerando que todas as condições e manipulação foram realizadas conforme o descrito. As etapas do desenho experimental, são: Escolha uma das Etapas a seguir. 1. Definir a relação causa-efeito 2. Planejamento 3. Execução 4. Análise e interpretação 5. Formular as conclusões A partir do desenho experimental, pretendemos dizer de que modo ou por que causas o fenômeno é produzido. Assim, a partir da ideia de relação de causa- efeito em que se acredita que existe uma relação entre a construção da causa e o efeito observado, formulamos as hipóteses a serem testadas, temos os vários tratamentos (variáveis independentes) e executamos o experimento e observamos os resultados (variáveis dependentes). Se o experimento for bem elaborado e planejado, podemos formular conclusões a respeito da relação de causa-efeito para a hipótese estabelecida. 1.1 – VARIÁVEIS DEPENDENTES E INDEPENDENTES Mas o que são variáveis dependentes e independentes? Para responder a essa pergunta, aprenderemos alguns conceitos essenciais para o desenho experimental! Sempre que fazemos um experimento, queremos verificar os seus resultados. Todos os resultados (outputs) são originados a partir das entradas do experimento (inputs). Considerando que eu quero extrair o DNA com sucesso, meu input vai ser o material coletado, por exemplo, o raspado da face interna da bochecha, e o output vai ser o DNA extraído desse material. Os inputs são suscetíveis às diversas variáveis. Elas são agrupadas em dois grupos: variáveis dependentes e variáveis independentes. Escolha uma das Etapas a seguir. Variáveis independentes Variáveis dependentes Exemplo O experimento será medir a concentração plasmática do meu colesterol. As variáveis independentes, ou seja, as que eu posso controlar, seriam: Fiz jejum? Me alimentei bem? Usei algum medicamento nos últimos dias? Essas perguntas irão influenciar diretamente no resultado do colesterol encontrado, ou seja, na minha variável dependente, que nesse caso é a concentração de colesterol dosada no soro. 1.2 – HIPÓTESE NULA E HIPÓTESE ALTERNATIVA Após os resultados do nosso experimento, baseado nos dados coletados e processos realizados, como garantir que o dado obtido em uma amostra pode ser generalizado para toda a população e verificar se a hipótese inicial estava correta? Resposta Para tentar responder a essas perguntas, os cientistas utilizam modelos estatísticos e testes de hipóteses para analisar os dados e testar a validade desses resultados. Por meio da inferência estatística, os testes de hipótese são utilizados para tomar a decisão de aceitar ou rejeitar uma hipótese estabelecida no início do desenho experimental. Existem dois tipos de hipóteses: a hipótese nula (H0) e a hipótese alternativa (H1). Hipótese nula Indica que não há uma relação causa-efeito. Hipótese alternativa Afirma que existe uma relação causa-efeito, ou seja, rejeita a hipótese nula. Vamos entender melhor a partir de um exemplo: Para provar que existe um padrão, ou seja, uma relação causa-efeito, vamos estudar se, ao falar com um papagaio, ele repete exatamente o que eu falo. Nesse caso, minha hipótese inicial, aquela que eu quero provar, é que o papagaio repete o que eu falo. Para isso, o experimento será falar várias vezes para o papagaio a palavra Vasco e observar o que ele diz. Como resultado, podemos esperar que ele repita a mesma palavra (Vasco) ou não (Flamengo, ou qualquer outra palavra diferente de Vasco). Assim, teremos duas hipóteses: a hipótese nula (aquela em que não há relação causa-efeito), que ele não repete o que falamos, ou seja, ao ouvir Vasco, ele diz Flamengo. Quando isso acontece, dizemos que a H0 é verdadeira; E a hipótese alternativa (aquela que confirma a relação causa-efeito), em que ele repete o que estamos falando, ao ouvir Vasco, ele repete Vasco. Nesse caso, rejeitamos a H0 e a H1 é verdadeira. Objeto com interação. Hipóteses nula e alternativa. Fonte: EnsineMe. 1.3 – TIPOS DE ERROS Todos os experimentos e análises de resultados são passíveis de erros de interpretação e/ou do processo realizado. Os erros são causados quando temos uma interpretação errônea dos dados, o que nos leva a rejeitar uma hipótese verdadeira (falso positivo) ou não rejeitar uma hipótese falsa (falso negativo). Os erros podem ser classificados como tipo 1 e 2, de acordo com a hipótese que será rejeitada. A hipótese nula é verdadeira Decisão Decidimos rejeitar a hipótese nula. Erro tipo 1 (rejeição de uma hipótese nula verdadeira) Decisão corr Aceita-se a hipótese nula. Decisão correta Erro tipo 2 (n Erros do tipo 1 e 2. Vamos voltar ao exemplo anterior para entender melhor esses erros: Como aprendemos anteriormente, ao falar para o papagaio a palavra “Vasco” e ele repetir “Flamengo” ou qualquer outra palavra além de “Vasco”, a hipótese nula é verdadeira (sem relação causa-efeito). No entanto, quando falamos “Vasco” para o papagaio e ele repete outra palavra, enviesados para a obtenção de uma relação de causa-efeito, rejeitamos a H0, mesmo ela sendo verdadeira. Temos um erro do tipo 1 ou falso positivo. Nesse tipo de erro, a hipótese nula é verdadeira (ou seja, ele não repetiu a palavra Vasco) e nós a rejeitamos (pois entendemos Vasco). Vimos também que quando falamos Vasco e ele repete Vasco, a H0 é falsa. Qualquer outra palavra dita pelo papagaio torna a H0 verdadeira, pois ele não repetiu a palavra que queríamos (Vasco). No entanto, se ao falar Vasco ele repetir a exata palavra Vasco, e nós entendermos “Asco” por engano, vamos entender que a H0 é verdadeira, porém, neste caso, a hipótese nula é falsa, uma vez que ele de fato repete a palavra “Vasco”. Esse é um erro do tipo 2 ou falso negativo: aceitamos uma H0 verdadeira (pois entendemos que ele disse Asco), mas, na verdade, a hipótese nula era falsa (ou seja, ele disse “Vasco”). Você sabia Esses conceitos podem ser utilizados em qualquer desenho experimental e são muito comuns na área médica, principalmente em testes de diagnóstico clínico, onde kits de diagnóstico demonstram resultado positivo para uma doença inexistente ou resultado negativo, quando na verdade há presença de doença. Assista ao vídeo abaixo e entenda melhor o desenho experimental. 1.4 – SELEÇÃO DE PARTICIPANTES A seleção dos participantes, população de estudo, deve ser a mais representativa possível, para termos uma menor chance de errar ao generalizar os resultados. A seleção de participantes de um estudo também pode ser chamada de amostragem, que pode ser não probabilística ou probabilística. A não probabilística ocorre quando a probabilidade da seleção de cada participante não é conhecida, a seleção da amostra depende do julgamento do pesquisador e esta pode ser feita pela amostragem por conveniência (o pesquisador escolhe quem está disponível) ou julgamento (o pesquisador escolhe quem ele acha interessante). Já na amostragem probabilística, cada elemento da população possui a mesma probabilidadede ser selecionado para compor a amostra. Nesse caso, a probabilidade da seleção de cada participante é conhecida. Por exemplo, em uma amostra aleatória simples com 10 participantes, a chance de um deles ser escolhido é 1/10, ou seja, 10%. A amostragem probabilística pode ser: Clique na barra para ver as informações. AMOSTRAGEM ALEATÓRIA SIMPLES Participantes são selecionados aleatoriamente em uma determinada população. Em uma população de 12 participantes, eu escolho 9 de forma aleatória, ou seja, ao acaso. Isso poderia ser realizado por sorteio, por exemplo. Amostragem aleatória simples. Fonte: Bakhtiar Zein/Shutterstock.com. AMOSTRAGEM SISTEMÁTICA O primeiro participante é selecionado a partir de um número preestabelecido e os outros participantes são escolhidos seguindo um mesmo coeficiente. Por exemplo, em uma população com 13 participantes, vamos padronizar um coeficiente de 3. Além disso, vamos utilizar a fórmula 1 + (K x N), onde K é meu coeficiente e N o número do participante. Se definimos o primeiro participante como o número 1 (poderia ser qualquer outro), quais seriam os outros participantes? O segundo participante será o número 1 + o coeficiente (3) X a quantidade de participantes já escolhidos, assim teríamos 1 + 3 (coeficiente) X 1 (número já selecionado). Ou seja, o participante seria o número 4. O terceiro participante será o número 1 + 3 x 2 = 7. O quarto 1 + 3 x 3 = 10. O quinto 1 + 3 x 4 = 13, fechando, assim, a amostra. Amostragem sistemática. Fonte: Bakhtiar Zein/Shutterstock.com. Com os conceitos básicos sobre desenho experimental estabelecidos, podemos seguir para as próximas etapas da fase pré-analítica do isolamento de ácidos nucleicos. Os conceitos aprendidos neste tópico são valiosos e podem ser utilizados em qualquer situação da vida, seja ela profissional ou do nosso cotidiano. 2 – COLETA, TRANSPORTE E ARMAZENAMENTO DE AMOSTRAS BIOLÓGICAS DESTINADAS AOS TESTES MOLECULARES Atualmente, o mercado dos testes moleculares está em intensa expansão. O marketing feito pelos laboratórios, as divulgações promovidas por celebridades, as regulações nos preços dos testes, o desenvolvimento de marcadores e os kits acessíveis, entre outros fatores colaboram para o crescimento desse ramo de mercado. São várias as empresas fazendo testes utilizando material genético para diferentes fins, por exemplo, indicar a ancestralidade e a origem genética e apontar marcadores genéticos para doenças, além dos testes laboratoriais para diversos tipos de infecções (incluindo COVID-19). Saiba mais Num passado recente, pensar nesse tipo de tecnologia de diagnóstico era deixado para filmes de ficção científica, aqueles onde um médico high- tech coleta o sangue do paciente, passa em uma máquina e depois de alguns segundos um papel é impresso indicando todas as doenças e quais medicamentos utilizar. Hoje em dia esse tipo de abordagem é real, ou pelo menos bem parecido com filmes, pois a população tem acesso aos testes de forma mais fácil e barata. É importante ressaltar que no Brasil existem algumas empresas com esse perfil! Sempre que pensamos nos testes moleculares, automaticamente temos a ideia de perfeição, por se tratar de tecnologia de ponta, pela propaganda ser sempre bem feita e por ser algo muito misterioso, de entendimento distante do senso comum. Apesar de muitos acharem que os resultados de testes genéticos são absolutos, isso não é uma verdade: eles estão sujeitos a erros assim como qualquer teste de laboratório e a maioria desses erros ocorrem justamente na fase pré-analítica (que compreende desde a coleta do material até o cadastro e armazenamento das amostras no laboratório, antes da análise propriamente dita). Você sabia Diferentes amostras biológicas podem ser coletadas para os testes moleculares, como sangue, escarro, amostra de tecidos, um fio de cabelo, dentre outras. A partir dessas amostras, podemos detectar a presença tanto do nosso material genético (DNA/RNA) quanto o de microrganismos, conseguindo verificar e quantificar a presença de vírus, bactérias, protozoários; analisar a predisposição ou estado de doenças genéticas; e fazer os famosos testes de paternidade. Além disso, é amplamente utilizado em perícias médicas: o jornalista Tim Lopes foi identificado com auxílio dos testes moleculares. É importante destacar que além das amostras biológicas, os testes moleculares podem ser realizados a partir de cultura de células e de microrganismos. Nesses casos, também é essencial os cuidados com a fase pré-analítica, para um resultado de qualidade. A coleta e manipulação de todas essas amostras, assim como na coleta de qualquer material biológico, deve ser realizada seguindo todas as normas de biossegurança, com utilização dos Equipamentos de Proteção Individual, para evitar contaminação. Além disso, as amostras devem estar devidamente identificadas com o nome do paciente e data da coleta, assinatura de quem coletou e um código numérico para dupla verificação. Amostras que não estiverem identificadas corretamente ou aquelas que apresentem características que impossibilitem o teste, como a presença de hemólise no tubo de sangue, devem ser descartadas. Alguns tipos de testes possuem critérios específicos de acordo com o procedimento realizado. É obrigação do laboratório deixar evidente para os pacientes os critérios de aceitação e exclusão de amostras para cada tipo de ensaio. A quantidade de material genético extraído depende diretamente do local de coleta, do número de células presentes e pode variar conforme a idade do paciente, além de depender diretamente das condições de transporte e armazenamento. Atenção Em algumas ocasiões, um resultado negativo em um exame pode ser resultado de um erro durante a fase pré-analítica, uma vez que o material genético tem que estar viável para conseguir realizar as técnicas moleculares que envolvem sua amplificação. É sempre preferível trabalhar com amostras frescas para melhorar o rendimento. Veja alguns cuidados para extração de amostras de DNA e RNA: Clique nas barras para ver as informações. EXTRAÇÃO DE DNA Para extração de DNA, a coleta deve seguir alguns cuidados, pois, no nosso organismo, existem moléculas capazes de degradar o DNA, como as desoxirribonucleases (DNases) que necessitam de íons metal para a sua atividade. Então, para inativação da enzima, pode ser necessária a utilização de agentes quelantes como o EDTA. Ela também é inativada pelo calor durante 10 minutos a 65°C. EXTRAÇÃO DE RNA A coleta de amostras para a extração de RNA requer mais cuidados. O RNA é uma molécula altamente instável e que apresenta grande fragilidade e se degrada rapidamente pela ação de ribonucleases (RNase). Essas enzimas não precisam de cofator para se ativar, são estáveis, ficando ativas mesmo após a fervura e autoclavagem, e estão presentes em uma série materiais biológicos e na nossa pele. É muito importante a adição de agentes estabilizadores de RNA o mais rápido possível e que o recipiente utilizado seja certificado como Ribonucleases (RNase) free, ou seja, livre de agentes degradantes de RNA, estéril, e sempre deve ser manipulado com luvas! Vamos agora conhecer a peculiaridade de algumas amostras destinadas à extração do DNA/RNA. 2.1 – SANGUE E ASPIRADO DE MEDULA ÓSSEA Amostras de sangue e aspirado de medula óssea precisam ser armazenadas junto a agentes anticoagulantes para manter a estabilidade da amostra, impedindo a coagulação sanguínea. Entretanto, a heparina (agente anticoagulante amplamente utilizado) é um potente inibidor de algumas técnicas moleculares, dentre elas o famoso PCR (Polymerase Chain Reaction). Você sabia A impossibilidade do uso de heparina fez com que outros anticoagulantes fossem preferíveis, normalmente são utilizados o EDTA (ácido etilenodiaminotetracético) ou o ACD (citrato de dextrose) para estas amostras. A coleta de amostras com o anticoagulanteEDTA, apesar de ser mais utilizada e indicada para amostras de sangue, também pode interferir em algumas metodologias, já que o EDTA pode inibir drasticamente a atividade da DNA polimerase se estiver em excesso. Quando o objetivo é a análise do DNA, o sangue total é estável por até 24 horas em temperatura ambiente. Na temperatura de 2°C a 8°C é estável por até oito dias. De forma diferente, o plasma fica estável apenas 5 dias na temperatura de 2°C a 8°C, suportando tempos maiores se for congelado e a amostra deve ser transportada em ambiente refrigerado. Além disso, se congelada, é necessário que não haja ciclos de congelamento- descongelamento. Para análise de RNA viral, o sangue deve ser centrifugado e o plasma transferido para outro tubo estéril e livre de RNases em até quatro horas da coleta. Para as amostras de aspirado de medula óssea, a seringa deve conter EDTA e após a coleta o aspirado pode ser armazenado por até 72 horas na temperatura de 2°C a 8°C. Caso seja necessário um maior tempo para o processamento, os eritrócitos precisam ser removidos e a amostra congelada a -20°C, assim a estabilidade do material permanece por meses. Atenção: ela só pode ser congelada após a remoção dos eritrócitos! Saiba mais 1. Para a extração de RNA após a coleta, esta deve ser colocada imediatamente em solução estabilizante de RNA. Caso não tenha essa solução e não seja congelada, ela deve ser transportada em gelo seco e analisada em até 4 horas. 2. O grupamento heme presente nas hemoglobinas pode inibir a reação de PCR, então amostras que tenham algum tipo de hemólise não são satisfatórias para análise. Além disso, caso haja necessidade de remoção dos eritrócitos, esta deve ser feita de forma cuidadosa, para evitar a hemólise e liberação do grupo heme e causar problemas nos testes moleculares. 2.2 – AMOSTRA DE TECIDOS As amostras de tecido são preferíveis quando os agentes etiológicos estão alojados no tecido e/ou o diagnóstico das possíveis infecções seja difícil por meio da simples coleta de sangue. Além disso, essas amostras são a de escolha durante as autópsias e para a análise de tecidos tumorais para comparar o DNA das células tumorais com as normais. Saiba mais Para garantir uma boa análise, é recomendado coletar de 1 g a 2 g de tecido- alvo. No entanto, a quantidade pode variar de acordo com o tecido. Apenas para termos uma ideia, 10 mg de tecido fornece cerca de 10 µg de material genético. Essa quantidade já é suficiente para análise, mas sempre devemos trabalhar com uma margem de segurança, pois possíveis perdas de material podem ocorrer. Para tecidos, o ideal, após a coleta por biópsia, é o rápido congelamento em nitrogênio líquido (-196°C) ou manter esse tecido em solução de preservação de ácidos nucleicos. Não é recomendável manter esse tipo de material em temperatura ambiente por muito tempo. Amostras pequenas devem ser embrulhadas em gaze umedecidas com salina para evitar ressecamento, além da solução de preservação de ácidos nucleicos. Tecidos sólidos apresentam muitas endonucleases e devem ser processados ou congelados o mais rápido possível! Atenção Tecidos de biopsia embebidos em fixadores utilizados para a preservação de tecidos para exame histopatológico não devem ser empregados para os exames de biologia molecular! A estabilidade do tecido depende do tipo de tecido coletado. Observe a estabilidade do DNA nas seguintes condições: Mantido em banho de gelo triturado ou refrigerado em temperatura entre 2°C e 8°C Congelado a -20°C Congelado a -70°C Se houver impossibilidade de congelar ou usar a solução preservadora, a amostra deve permanecer em ambiente com gelo, inclusive no transporte e ser processada em 24 horas para o isolamento do DNA. Quando a amostra for coletada para a extração do RNA, essa amostra deve ser rapidamente congelada em nitrogênio líquido (-196°C) antes de ser congelada a -70°C, processada em no máximo uma hora após a coleta ou colocada em solução estabilizadora do RNA. No momento da extração, as amostras não podem ser descongeladas, e sim homogeneizadas diretamente em solução adequada para a extração (chamado agente de extração, geralmente isotiocianato de guanidina). Os tubos de coleta também devem ser livres de RNases, estéreis e apenas manipulá-los com luvas, para evitar a degradação do RNA. Normalmente, na temperatura de -20°C as RNases ainda estão ativas, assim, é recomendado manter as amostras para análise de RNA em temperaturas ≥ - 70°C. 2.3 – CÉLULAS BUCAIS A coleta das células bucais para a extração de DNA ou RNA pode ser realizada por meio de um raspado de células da parte interna da boca utilizando um swab ou a partir do bochecho. Para extração de RNA essa amostra deve ser inserida em um tubo contendo solução estabilizante de RNA/DNA. De forma diferente, amostras para extração de DNA podem ser secas ou estabilizadas e transportadas à temperatura ambiente. As amostras estabilizadas dentro do tubo possuem validade de até uma semana em temperatura ambiente, podendo ser transportadas sem maiores cuidados. Você sabia Alguns swabs mais longos também podem ser utilizados para coletar material presente na orofaringe e na nasofaringe para o diagnóstico de algumas doenças, em que o agente infectante colonize as vias respiratórias, como o novo coronavírus e o vírus influenza. Atualmente, as empresas enviam os kits de coleta para o paciente realizar o procedimento em casa: o swab deve ser esfregado na parte interna da bochecha, cerca de 10 vezes de cada lado e, em seguida, inserido no tubo que vem no kit contendo a solução estabilizante. Os erros mais comuns que ocorrem nesse tipo de abordagem são: o paciente descartar a solução estabilizante, a contaminação do swab com restos de alimentos, batom e em outros casos até mesmo o paciente não identificar corretamente o tubo. Deve-se evitar a coleta desse material após refeições, pois não é tão raro encontrar, nas amostras encaminhadas para o laboratório, o DNA de galinha nos testes onde supostamente era para ser feita a detecção de DNA de um ser humano. 2.4 – COLETA DE LÍQUIDO CEFALORRAQUIDIANO (LÍQUOR OU LCR) O LCR quando coletado para análise do DNA deve ser coletado em frascos estéreis, transportado na temperatura de 2°C a 8°C e, caso não seja processado rapidamente, congelado na temperatura a partir de -20°C. Para análise de RNA, se o processamento não for realizado em até 4 horas, essa amostra deve ser congelada. No entanto, caso a amostra tenha eritrócitos, esses devem ser removidos antes do congelamento. Outras amostras também são utilizadas para a extração de DNA/RNA. Para conhecer mais sobre esse assunto, visite a revisão Coleta, transporte e armazenamento de amostras para diagnóstico molecular, presente no Explore mais! VERIFICANDO O APRENDIZADO 1. Estudamos as diferenças entre hipótese nula e hipótese alternativa e os possíveis erros gerados a partir da interpretação errada dessas análises. O erro tipo 1 consiste em: Não rejeitar a hipótese nula, uma vez que a hipótese nula é falsa. Não rejeitar a hipótese nula, uma vez que a hipótese nula é verdadeira. Não rejeitar a hipótese nula, uma vez que a hipótese nula e a alternativa são falsas. Rejeitar a hipótese nula, uma vez que a hipótese nula é falsa. Rejeitar a hipótese nula, uma vez que a hipótese nula é verdadeira. Responder Comentário 2. O armazenamento de amostras biológicas é fundamental para uma boa análise. Com base no que estudamos, qual seriam as melhores condições para armazenamento de uma amostra de tecido, por mais de 1 semana, para a extração de RNA? Após a coleta, manter em temperatura ambiente. Após a coleta, um rápido congelamento em nitrogênio líquido (-196°C), seguido do congelamento a -70°C. Após a coleta, colocar o tecido em um pote com formol, congelar em nitrogênio líquido (-196°C), seguido do congelamento a -70°C. Após a coleta, manterna temperatura de 2°C-8°C por 24 horas. Após a coleta, colocar o tecido em um pote com formol, congelar em nitrogênio líquido (-196°C), seguido do congelamento a -20°C. Responder Comentário MÓDULO 2 Descrever os procedimentos de extração e quantificação de DNA e RNA e síntese de cDNA 1 – EXTRAÇÃO DO DNA E DO RNA A PARTIR DAS AMOSTRAS COLETADAS Agora que conhecemos todas as etapas pré-analíticas, estamos prontos para colocar a mão na massa! Vamos então estudar de fato como é feita a extração do DNA e do RNA a partir das amostras coletadas para a obtenção do nosso material genético. No entanto, antes de começarmos a estudar a extração, é interessante relembrar que qualquer técnica ou procedimento utilizado no laboratório – seja ele qual for – é como fazer um bolo, e por isso devemos seguir uma determinada receita. No laboratório, chamamos a receita de POP (procedimento operacional padrão) e temos que ter os ingredientes (os reagentes) e os utensílios para fazer o bolo (os materiais e instrumentos). Ler a receita e fazer o bolo é um processo mecânico, qualquer pessoa com um mínimo de conhecimento e que saiba como manusear os instrumentos consegue seguir o passo a passo, e dependendo da experiência, vai conseguir ter um resultado satisfatório. No fim do procedimento, pode ser que saia um bolo maravilhoso ou pode ser que não saia. Dessa forma, percebemos que é importante saber qual é a função de cada componente do bolo para entendermos o processo como um todo. Caso o bolo saia pequeno, faltou fermento, se ele saiu seco é porque faltou leite, e assim temos uma noção de causa-efeito. O inverso também é válido: podemos saber tudo sobre como funcionam os ingredientes do bolo, o nome da levedura usada no fermento, a temperatura ideal para assar o bolo, qual a importância de cada componente na construção do bolo, mas se não soubermos como mexer o bolo ou como ligar o forno, o processo simplesmente não funciona! Assim como fazer um bolo, é de suma importância primeiro entender os conceitos teóricos da extração do DNA e depois ver como funciona o passo a passo da técnica. Atenção Antes de iniciar nos procedimentos, é importante ressaltar que após a obtenção de nossa amostra, devemos sempre tomar cuidado onde ela será manipulada e com a preparação dos reagentes, evitando, assim, a contaminação com materiais genéticos de outros organismos, ou até mesmo com enzimas que podem vir a degradar o nosso material de estudo e gerar resultados falhos. 2 – PROCEDIMENTOS DE EXTRAÇÃO DE DNA As células eucariontes possuem uma membrana celular, formada por uma bicamada fosfolipídica, além de diversos elementos dispersos no citoplasma, como as proteínas, os carboidratos, as organelas, os lipídios e os elementos minerais (sódio, potássio, sais, magnésio, entre outros). Além disso, a célula eucarionte também possui uma membrana nuclear e dentro do núcleo estão as proteínas, DNA e RNA majoritariamente. Para a extração do DNA, todos os outros elementos são considerados contaminantes, até mesmo o RNA. Assim, a estratégia básica da extração de DNA é, então, separar o DNA de todos esses outros elementos que não são DNA. Existem algumas formas diferentes de se fazer isso, mas alguns procedimentos devem ser feitos independentemente da forma de extração. A partir da amostra de células, a primeira etapa a ser realizada é o rompimento da parede celular (quando as células são de origem vegetal ou fungos), da membrana plasmática e da membrana nuclear, liberando, assim, o material genético. Podemos fazer isso de diversas formas, a saber: com o uso de detergentes capazes de desestabilizar a membrana celular e nuclear, abrasão física, ação de enzimas capazes de degradar a membrana e/ou parede celular, pressão osmótica e aquecimento, entre outras. Quando a intenção é extrair o DNA, junto ao rompimento das membranas é importante adicionar uma enzima capaz de destruir outras proteínas (proteinases), principalmente para inativar todas as DNases, impedindo a degradação do DNA. Em seguida, para remover o RNA, que neste caso é um contaminante, basta adicionar RNase no meio. Nessa etapa já removemos lipídios, proteínas e o RNA, mas ainda faltam os carboidratos e os elementos minerais. Existem algumas formas de se realizar essa etapa, vamos conhecer as 3 principais. São elas: Clique nas barras para ver as informações. ADIÇÃO DE SOLVENTE ORGÂNICO Podemos usar um solvente como o fenol ou o clorofórmio. É importante lembrar que já degradamos lipídeos e RNA, rompemos as membranas e, se for o caso, a parede celular. Mas o que acontece? O fenol ou clorofórmio tornam essas moléculas (assim como os carboidratos e todos os elementos minerais) insolúveis. Após a adição dos solventes, seguida da centrifugação, formam-se duas fases: 1. Fase aquosa: DNA Na fase superior, o DNA, que não é solubilizado nos solventes (fenol ou clorofórmio), vai permanecer na fase aquosa. 2. Fase orgânica Todos os outros elementos irão para a fase orgânica (inferior), como proteínas, lipídeos, RNA degradados, carboidratos e outros elementos minerais solúveis em fenol/clorofórmio. Assim, com auxílio de uma pipeta, podemos transferir a fase aquosa com o DNA para outro tubo. Saiba mais O RNA degradado se torna insolúvel, pois complexa com os outros elementos do citoplasma. Se estiver íntegro, ele pode ir para a fase aquosa, dependendo do pH do solvente orgânico. SOLUÇÃO CONCENTRADA DE NACL O cloreto de sódio concentrado é capaz de precipitar os elementos degradados do citoplasma, deixando o DNA íntegro na fase aquosa. Assim, basta centrifugar e remover a fase aquosa do pellet precipitado, ou seja, recuperar apenas o sobrenadante, pois nele estão nossas substâncias de interesse. COLUNA DE ADSORÇÃO DO DNA O DNA possui carga total negativa vinda do grupamento fosfato. Assim, podemos adicionar uma coluna com carga positiva (normalmente é utilizada uma coluna de sílica) no nosso tubo e centrifugar. Dessa forma, o DNA vai ficar retido na coluna devido à sua carga negativa e os outros elementos irão passar direto pela coluna, ficando no fundo do tubo. Para remover o DNA da coluna, usamos um tampão de eluição carregado negativamente em grande quantidade. Normalmente, são usados os tampões Tris-HCl ou o EDTA. Eles irão competir com o DNA pela ligação na coluna de adsorção e, como estão em grande quantidade, ganham a competição e se aderem à coluna expulsando o DNA. O procedimento é feito também por centrifugação, porém o material que sairá da coluna será rico em DNA. Saiba mais Se estiver íntegro, o RNA pode ser purificado dessa forma! Após a obtenção do DNA por qualquer um desses métodos supracitados, precisamos eliminar qualquer resíduo que por um acaso ainda esteja misturado ao DNA. Para isso, adicionamos isopropanol, que precipita apenas o DNA. Após centrifugação, como o DNA encontra-se precipitado, nosso DNA puro encontra- se no pellet. Você sabia O pellet fica bem aderido no fundo do tubo, podemos lavar o tubo com etanol 70%, por exemplo, para remover todos os reagentes e secar o tubo, que o DNA continua aderido ao tubo. A etapa final consiste em ressuspender DNA, em água ou em tampão de eluição, basta adicionar um pouco do líquido escolhido e forçar a quebra do pellet, no final de todo o protocolo teremos um tubo contendo apenas o DNA puro. Saiba mais O processo de extração de DNA nos plasmídeos é bem semelhante ao processo geral de extração de DNA. No entanto, depois da lise da membrana e precipitação das proteínas citoplasmáticas, é adicionada uma solução de NaOH com pH bastante básico a ponto de desnaturar o DNA cromossomal e o também o próprio DNA plasmidial. Em seguida, é adicionado uma solução ácida neutralizadora que regenera o DNA plasmidial, mas não o cromossomal. Assim, podemos então separar por centrifugação, pois o DNA do plasmídeo fica em suspensão enquanto o DNA cromossomal precipita. Agoraque sabemos os princípios teóricos da extração do DNA, vamos simular uma situação em que estamos no laboratório e temos que extrair o DNA de uma amostra coletada. Para isso, vamos utilizar o protocolo desenvolvido pela EMBRAPA (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária) (Adaptado de OLIVEIRA et al., 2007). Vamos ver se você consegue identificar e entender o passo a passo de um POP utilizado em uma situação real. Parece desafiador, mas não se assuste, vamos juntos. A primeira etapa é conferir todos os reagentes que vamos precisar. São eles: Tampão de digestão. Solução de fenol, clorofórmio e álcool isoamílico (25:24:1). Microtubos de polipropileno; Frascos e bastões esterilizados. Solução Tampão TE (tris-HCL 10 mM; EDTA 1 mM com pH 8.0; tris = hidroximetil aminometano). Etanol 70%; Etanol absoluto; Acetato de amônio 7,5 M; Micropipetas de 1 mL, 200 μL, 100 μL e 10 μL. Centrífuga. Isopor com gelo. Vidraria de laboratório; Banho-maria a 50°C. Após conferimos todo o material, vamos começar a extração do DNA de um tecido de origem animal, e que por isso não apresenta parede celular. Lembre-se de que nossa amostra depois da coleta tem que estar armazenada no gelo, para manter a temperatura entre 2°C a 8°C. Se o tecido for duro, devemos macerar, usando um bastão de vidro, e se tiver grande quantidade de líquidos, a amostra deve ser centrifugada para remover o líquido em excesso. Na primeira etapa da extração, adicionamos o tampão de digestão, na concentração de 1,2 mL de tampão para cada 100 mg de tecido. Em seguida, devemos deixar o tubo em banho-maria a 50°C por cerca de 8 a 16 horas, para garantir a digestão completa das membranas plasmáticas e nucleares e proteínas. No final, o material apresentará um aspecto viscoso. Saiba mais O tempo de incubação no banho-maria varia de acordo com o tamanho da amostra. A segunda etapa é a extração do DNA com fenol e precipitação dos compostos indesejáveis. Para isso, o tubo é retirado do banho-maria e esperamos ele chegar a 37°C para adicionar 5 μL de RNase, e depois incubamos por 15 minutos sob leve agitação. Saiba mais A adição de RNase é opcional, deve ser empregada quando o RNA é considerado um contaminante. Em seguida, a solução de fenol, clorofórmio e álcool isoamílico é adicionada na proporção de 1:1 com a quantidade de amostra do tubo, ou seja, para cada 500 μL de material, adicionamos 500 μL de solução de fenol. É importante atentarmos para o pH da solução de fenol, pois em pH abaixo de 7.0 o DNA é degradado e vai para a interface, região entre a fase orgânica e a fase aquosa, mas é preconizado para extração de RNA. Resumindo: a solução de fenol com pH em torno de 7.0 é usada para extração de DNA e em pH entre 4,5 e 5,5 é usado na extração de RNA, que veremos a seguir. Após a adição do fenol, homogeneizamos e centrifugamos o tubo por dez minutos a 1.700 g. Uma vez com as fases aquosa e orgânica bem definidas, separamos a fase aquosa contendo o DNA e descartamos a fase orgânica com todos os contaminantes. Atenção Nessa etapa, é importante separar bem as fases, pois o fenol pode ser um contaminante, então é recomendado centrifugar duas vezes. A terceira fase é a purificação do DNA por meio da precipitação com etanol. Antes de usarmos o etanol em si, adicionamos meio volume de acetato de amônio 7,5 M e dois volumes de etanol absoluto. Comentário Neste POP do EMBRAPA, o etanol é utilizado como agente precipitante do DNA, entretanto poderíamos utilizar o isopropanol também. Saiba mais A unidade volume é usada para padronizar as quantidades em qualquer sistema, supondo um volume de 500 μL de fase aquosa, meio volume significa 250 μL e dois volumes significam 1.000 μL. O acetato de amônio facilita a precipitação do DNA pelo etanol e o etanol absoluto, além de concentrar o DNA, também ajuda a remover os resíduos remanescentes de fenol e clorofórmio. Centrifugamos a amostra a 1.700 g por cerca dois minutos. Após a centrifugação, será possível visualizar o pellet bem aderido ao fundo do tubo. Removemos toda a solução alcoólica e depois vamos ressuspender o pellet em etanol 70%. Centrifugamos novamente a 1.700 g por dois minutos e tiramos o sobrenadante (uma dica é deixar o tubo aberto por um tempo, para o etanol evaporar por inteiro). Agora com o pellet limpo, a fase final é a adição do tampão TE, para facilitar a dissolução do DNA, ou ainda podemos deixar o tubo em banho-maria a 50°C por algumas horas. Comentário Vale lembrar que nesse exemplo estamos extraindo o DNA a partir de amostras de tecidos. No entanto, existem variações do protocolo. Mesmo que a amostra também seja proveniente de tecido, o protocolo pode ser modificado, com a utilização de outros reagentes. Entretanto, esse é o procedimento básico e em geral usado em laboratórios para extração de DNA. 3 – PROCEDIMENTOS DE EXTRAÇÃO DE RNA O procedimento de extração de RNA é bem parecido com o método de extração de DNA, mesmo o RNA sendo mais frágil e demandando mais cuidados. Todo material que entra em contato com a amostra deve ser tratado com soluções neutralizadoras de RNase e possuir a característica de ser RNase free. Além disso, a amostra deve sempre ser refrigerada em nitrogênio líquido ou gelo para evitar a ação de alguma RNase remanescente. Vamos agora rever as três etapas do protocolo de extração de DNA, ressaltando quais são as diferenças entre a extração do DNA e RNA. Clique nas barras para ver as informações. PRIMEIRA FASE – QUEBRA DA MEMBRANA Pode ser feita de forma mecânica ao invés de utilizar o tampão de digestão, usando um pistilo, bastão ou sonicador. Esta técnica apresenta uma vantagem: por ser mais rápida, diminui a chance de degradação do RNA. SEGUNDA FASE – EXTRAÇÃO DO RNA Não são utilizadas as RNases. A solução de fenol/clorofórmio na extração de RNA deve ter pH ácido (entre 4,5 e 5,5) para que o RNA fique na fase aquosa e o DNA fique na interface (essa fase intermediária só é formada durante a extração do RNA devido ao pH ácido). TERCEIRA FASE – PURIFICAÇÃO DO RNA É muito parecida com a do DNA, a diferença está no armazenamento: para RNA é preferível utilizar nitrogênio líquido. Extração de DNA/RNA 1. Amostra inicial com as células digeridas Adição de solução fenol/clorofórmio 2. Centrifugação da amostra, formando duas fases: orgânica (em amarelo no fundo do tubo) e aquosa (em azul acima da fase orgânica). No tubo A temos DNA e RNA dissolvidos na fase aquosa e no tubo B o DNA degradado fica na interface. 3. A fase orgânica é descartada, permanecendo apenas a fase aquosa no tubo. Adição de acetato de amônio e etanol absoluto 4. Após centrifugar, ocorre a formação de um pellet no fundo do tubo. Todo o líquido restante é descartado. 5. O pellet é ressuspendido em tampão TE e agora o DNA ou RNA pode ser armazenado. Assista ao vídeo abaixo e conheça a importância do DNA na Biologia Molecular, entendendo como o material genético obtido será utilizado. 4 – ARMAZENAMENTO DO DNA E DO RNA PURIFICADOS Após o isolamento (purificação), o DNA e o RNA precisam receber cuidados imediatos. Para o DNA, devemos armazená-lo em um tubo de plástico (preferencialmente de propileno) vedado a fim de evitar evaporação, hidrofóbico, em uma temperatura abaixo de 0°C. Dessa forma, diminuímos a atividade biológica das DNases. O DNA purificado é mantido em solução tampão tris-EDTA, com pH 7,2. A validade do DNA nestas condições é bastante alta. Confira: Temperatura ambiente Temperaturas baixas de 2°C a 8°C Congelado a -20°C Congelado a -70°C Atenção O DNA purificado é bastante resistente, uma vez que a sua solução não contenha água, pois a água quando congela forma cristais que podem danificar os materiais orgânicos. Após a extração do RNA, ele deve ser armazenado como um precipitado em etanol a 70% congelado na temperatura de -70°C. Alguns estudos mostram que após 2 meses,mantido na temperatura de -20°C, o RNA não perde sua integridade. No entanto, é importante destacar que na temperatura de -20°C ainda temos uma atividade RNases, sendo assim mais recomendado o congelamento em temperaturas de -70°C ou inferior. Assim como no DNA, os tubos devem ser de plástico estéril e manuseados com luvas limpas por uma solução de água com dietilpirocarbonato (composto capaz de eliminar RNases dos tubos) ou então por tubos com garantia de serem RNase-free. O etanol auxilia na precipitação do RNA, ajudando a concentrá-lo. Dessa forma, o RNA fica menos suscetível a agentes degradantes. 5 – QUANTIFICAÇÃO, ANÁLISE DE PUREZA E INTEGRIDADE DO MATERIAL MOLECULAR A extração do DNA/RNA é sem nenhuma dúvida um dos processos mais importantes da Biologia Molecular, pois esses materiais servem de matéria-prima para diversas outras técnicas da Biologia Molecular, como a reação da cadeia da polimerase (PCR), sequenciamento, clonagem, hibridização, entre outras. Uma boa extração determina a qualidade do resultado dessas técnicas. O controle de qualidade da extração é dado pela quantificação, pureza e integridade desses materiais. Vamos entender melhor esses procedimentos? Quantificação Na quantificação determinamos a quantidade de DNA/RNA extraído da amostra inicial. A técnica mais utilizada é a fluorometria. Nesta técnica, uma pequena alíquota da amostra é transferida para outro tubo, onde é adicionada uma solução e um agente fluorescente capaz de se ligar entre as bases do DNA e RNA. Quando o agente fluorescente (fluoróforo) se liga a algo (DNA ou RNA), ele emite fluorescência e assim podemos medir, com ajuda de um aparelho (fluorímetro), a quantidade de fluorescência da amostra. A quantidade de fluorescência da amostra é diretamente proporcional, ou seja, quanto maior for a fluorescência, maior é a quantidade de DNA ou RNA. Uma vantagem dessa técnica é que ela é simples e, após a quantificação, sabemos se temos a quantidade de material suficiente para as próximas etapas. Além disso, podemos utilizar diferentes agentes fluorescentes: um específico para DNA e outro específico para RNA. Assim, podemos quantificar o quanto temos de cada um desses materiais moleculares. Quantificação do DNA fluorescente. Na foto temos o gráfico de duas amostras de DNA diferentes. Tradução: dsDNA = double-strand DNA; A1=amostra 1; A2=amostra2. Fonte: Yurij Kot/Wikimedia/Attribution-Share Alike 4.0 International Pureza Na pureza podemos avaliar se um DNA ou RNA apresenta contaminantes. A pergunta aqui é: Será que com o material extraído temos também fenol, álcool, proteínas, RNA (quando o desejo é DNA) e algum reagente residual? Para essa análise, a técnica mais utilizada é a espectrofotometria. Antes de entender a técnica, é importante lembrar que luz visível é uma pequena parte de todo o espectro de radiação eletromagnética existente, compreendendo comprimentos de onda entre 380-750 nm. Os comprimentos de ondas inferiores estão na zona de espectro da ultravioleta (UV) e superiores na zona de infravermelho. Quando uma luz branca passa por um prisma, ela se decompõe em raios de luz de diferentes comprimentos de onda, variando do vermelho ao violeta. Em um arco-íris, por exemplo, enxergamos 7 diferentes cores, cada uma dessas cores representa uma diferente faixa de comprimento de onda. Comprimento de onda no espectro da luz. UV e infravermelho não são visíveis. Fonte: Fulvio314/Wikimedia/Attribution-Share Alike 4.0 International Além disso, é importante relembrar que todo o composto químico apresenta a capacidade de absorver, transmitir ou refletir a luz em um determinado comprimento de onda. Assim, a espectrofotometria tem como princípio básico utilizar a capacidade das moléculas orgânicas de absorverem (absorbância) ou transmitir (transmitância) luz em determinado comprimento de onda, em um equipamento chamado de espectrofotômetro. A partir dela, podemos identificar os componentes em uma solução, pois as biomoléculas apresentam espectros característicos ao UV, visível ou infravermelho. Por exemplo, já é estabelecido que as proteínas absorvem comprimentos de onda de 280 nm; o RNA e DNA absorvem no comprimento de onda de 260 nm e o fenol e outros constituintes no comprimento de onda de 230 nm. Saiba mais Além da possibilidade de indicar a biomolécula presente, podemos quantificá-la. Na prática, a quantidade de luz absorvida é diretamente proporcional à concentração da substância, assim, quanto maior for a concentração, maior é a absorção de luz (medido pela densidade óptica – OD). Confira o passo a passo para a realização dessa técnica: Escolha uma das Etapas a seguir. Etapa 01 Etapa 02 Etapa 03 Etapa 04 Atenção Lembre-se de que isso depende do comprimento de onda que estamos pesquisando (280 nm, 260 nm ou 230 nm)! Novamente, aqui, quanto maior for a absorção de luz, maior a quantidade de determinado material. Na figura a seguir, vemos um resultado de uma análise espectrofotométrica, mostrando um pico de absorção da luz no comprimento de onda 260 nm, o que indica a presença de DNA ou RNA. Resultado de uma análise de espectrofotometria. Fonte: Vossman/Wikimedia/Attribution-Share Alike 4.0 International Com os resultados, podemos verificar a pureza a partir da razão (divisão) da densidade óptica (OD) no comprimento de onda 260 nm pela OD no comprimento de onda 280 nm. Dizemos que o material genético está puro quando essa relação é maior ou igual a 1,8. Valores inferiores a esse indicam contaminação com proteínas e que o processo extrativo não foi realizado de forma correta. Outra forma de verificar essa pureza seria pela razão entre a OD 260 nm OD 230 nm, com material genético considerado puro quando estiver na faixa entre 1,8-2,2. Integridade Integridade avalia se o DNA/RNA extraído está íntegro. Essa avaliação é feita a partir da técnica de eletroforese. A eletroforese é uma técnica com uma enorme quantidade de variações e desdobramentos e é utilizada para os mais variados objetivos. Aqui iremos nos ater ao princípio básico da técnica e a sua aplicação no controle da integridade do material que foi extraído. Esta técnica consiste na migração e separação de moléculas de acordo com a carga após a geração de um campo elétrico. Ela utiliza diferentes meios de suporte, como fitas ou membranas de poliacetato de celulose e géis de agarose, que apresentam poros por onde as moléculas devem passar. Saiba mais No nosso organismo, as moléculas apresentam diferentes cargas. O DNA/RNA, devido ao grupamento fosfato, apresenta carga negativa. Além disso, as moléculas são separadas pelo tamanho. Para isso, uma pequena quantidade de amostra é aplicada em um gel, geralmente a agarose, inerte (que não reage com a amostra) em um poço (local de aplicação da amostra). Em seguida, é gerado um campo elétrico onde um polo do gel fica com a carga negativa (local onde a amostra é aplicada) e outra positiva. Como o DNA/RNA possui carga negativa, migrará para o polo positivo através do gel. No entanto, esse gel apresenta poros, conferindo resistência ao movimento das moléculas. Assim, moléculas mais pesadas e maiores ficarão presas no gel, enquanto as menores e mais leves migram com mais facilidade no gel. Esquema da eletroforese para DNA. Fonte: Cecierj.edu. Após a eletroforese, podemos detectar o DNA/RNA pela coloração (normalmente é utilizado o brometo de etídio, um corante que intercala no DNA) e visualização de bandas de DNA em um equipamento chamado transiluminador. Se a amostra estiver íntegra, verificamos apenas uma marca (banda) intensa no gel de eletroforese. No entanto, caso a nossa amostra esteja fragmentada, essa banda se apresenta “espalhada” (arraste) ao longo do comprimento do gel, indicando que existem diversos fragmentos, ou seja, o DNA/RNA não está íntegro. Bandas bem definidas Bandas com arraste Gel de eletroforese (DNA fragmentado). Fonte: Mohammed_Al_Ali/Shutterstock.com6 – SÍNTESE DE CDNA Como aprendemos anteriormente, existem várias técnicas na Biologia Molecular, PCR, sequenciamento, clonagem e hibridização que são dependentes da matéria-prima (DNA, na maioria dos casos). Essas técnicas podem ser utilizadas para diferentes fins, mas nem sempre a simples extração de DNA/RNA é suficiente para analisar o que se deseja. Vamos supor que queremos verificar se a expressão de uma proteína x está alta ou baixa nas células de um tecido. Para isso, extraímos o DNA e o material purificado representa todo o DNA da célula, incluindo o gene x, responsável pela expressão da proteína x. Entretanto, a detecção do gene x não indica muito sobre a expressão da proteína, uma vez que não conseguimos saber se ele foi transcrito, se o splicing alternativo gerou a proteína correta, se o RNAm foi devidamente processado. Neste caso, o ideal é avaliar o RNAm, já processado, sem a presença de íntrons. Além disso, algumas técnicas utilizam apenas o DNA para realizar a amplificação e detecção, como PCR. Por exemplo, queremos ver se uma pessoa tem uma infecção pelo novo coronavírus (Sars-CoV-2), um vírus de RNA. Nesse caso, a amostra extraída é o RNA viral, mas é inviável a sua detecção, pois precisamos de grandes quantidades de material, preferencialmente de DNA, por ser mais estável. Logo, o material precisa ser multiplicado o suficiente para poder ser devidamente analisado. Para isso, usamos a técnica do PCR, que consiste em amplificar uma amostra de DNA. Então fica uma dúvida: como fazer essa análise, pois segundo o dogma central da Biologia, o DNA é transcrito em RNA e o RNA é traduzido em proteína. Essa questão foi resolvida por meio de outro vírus, o vírus da imunodeficiência humana (HIV), que revolucionou a Biologia Molecular. Vamos entender como? Este é um vírus de RNA, que após a penetração na célula alvo, injeta o RNA viral no citoplasma. Lá, uma proteína do vírus chamada transcriptase reversa converte o RNA em DNA, esse DNA entra no núcleo e outra proteína chamada integrase junta o DNA do vírus com o da célula-alvo. Agora, a célula- alvo é capaz de transcrever o DNA viral (presente no genoma da célula hospedeira) em RNA viral, que forma outro vírus de HIV, e assim continua o processo de infecção. Comentário Nesse processo, algo muito curioso acontece: a transcriptase reversa do vírus é capaz de alterar o dogma central da Biologia, transformando o RNA em DNA. E se usássemos essa polimerase na Biologia Molecular para gerar DNA a partir de, por exemplo, um RNA mensageiro (RNAm)? E assim foi feito. O DNA obtido a partir do RNA é chamado de cDNA (DNA complementar). Recebe esse nome pois é complementar ao RNA molde. A construção do cDNA é feita em um tubo contendo: 1) RNA molde: é a sequência de RNA usada para a construção do cDNA. 2) Transcriptase reversa: é a polimerase capaz de transcrever o RNA em cDNA. 3) Nucleotídeos (A, T, C, G): são unidades funcionais para a síntese do cDNA. 4) Íon bivalente de magnésio (Mg2+): é um cofator essencial para o funcionamento da transcriptase reversa. 5) Primers: são pequenos fragmentos de DNA fita simples que se complementam ao RNA para dar início à transcrição reversa. 6) DNA polimerase: responsável por sintetizar o DNA a partir dos nucleotídeos presentes. A síntese do cDNA começa pelo anelamento do primer no RNA, seguido pelo acoplamento da transcriptase reversa e início da sua atividade, formando o cDNA no sentido 5’ – 3’. Uma fez formado o cDNA, o fragmento de RNA usado como molde é degradado pela RNase H, um domínio do próprio complexo da transcriptase reversa. Síntese do cDNA. Fonte: Lokeshthimmana/Wikimedia/Atribuição-CompartilhaIgual 4.0 Internacional Durante a construção do cDNA, uma etapa crítica para termos um cDNA de boa qualidade é a construção do primer. Existem três estratégias gerais de construção de primers: Clique nas barras para ver as informações. OLIGO DT É o primer formado por vários nucleotídeos do tipo timina que se anela a cauda poli-A do RNAm maduro. Ele é preferencialmente utilizado quando queremos fazer cDNA de RNAm. Para o oligo dT é importante que o RNAm esteja íntegro, uma vez que ele se anela na extremidade 3’ do molde. Se o RNAm estiver fragmentado, o cDNA vai ser feito apenas de um pequeno trecho e talvez seja não funcional. RANDÔMICO Este primer é feito de pequenas sequências aleatórias que se anelam a qualquer RNA presente, incluindo rRNA (RNA ribossomal) e tRNA (RNA transportador). Ele é indicado para amostras de sequência desconhecida ou de difícil manipulação. ESPECÍFICO É o primer construído especificamente para um determinado RNA, sendo utilizado quando se tem um alvo determinado, por exemplo, diagnosticar um RNA viral. O primer é desenhado de forma complementar ao RNA viral. Por isso, ao término da reação, só teremos cDNA se o primer encontrar o seu RNA alvo. Para o primer específico, é fundamental que toda a sequência do DNA/RNA seja conhecida. Atenção É importante ressaltar que os três tipos de primers podem ser combinados, formando um primer com um trecho oligo dT e outro trecho específico. Dessa forma, teremos uma transcrição da porção 3’ de um RNA molde específico ou oligo dT com um randômico, para tentar formar cDNA de qualquer RNAm do material inicial. A combinação de primers depende de criatividade do pesquisador e da sua capacidade de otimizar a síntese do cDNA. Neste ponto, temos então uma fita de cDNA íntegra, recém-formada pela transcriptase reversa e uma fita de RNA ligada ao cDNA parcialmente degradada pela RNase H. Assim, sintetizamos um RNAm maduro, sem a presença de íntrons. Esses fragmentos de RNA serão utilizados como primers de iniciação pela DNA polimerase que irá construir o DNA complementar ao cDNA. Com isso temos finalmente a fita dupla de DNA formada. Formação da fita dupla de cDNA. Fonte: EnsineMe. Na figura vemos que o RNAm se liga ao primer oligo dT. Em seguida, a transcriptase reverse sintetiza uma fita de cDNA (sequência de bases representada pela linha azul), a partir do primer oligo dT ligado ao RNAm. A RNAse H quebra o RNAm associado ao cDNA recém sintetizado. Os dNTPs presentes no meio reacional são usados para a construção de uma nova fita de DNA complementar ao cDNA, pela ação da DNA polimerase. Com isso, a fita dupla de cDNA é formada. A construção de cDNA tem como funções principais: Possibilitar a construção de uma biblioteca genômica, estabelecendo relações de quais genes podem expressar quais proteínas, o que pode ser aplicado para elaboração de terapias, estudo de espécies, doenças etc. Possibilitar a amplificação de RNA pela PCR. Determinar o nível de expressão gênica de uma determinada proteína no organismo. O cDNA pode ser utilizado na clonagem, criação de bibliotecas, testes de microarranjo, detecção de SNP etc. VERIFICANDO O APRENDIZADO 1. Vimos que existem diferentes técnicas para avaliação da qualidade das amostras de DNA e RNA obtidas. Além disso, vimos que uma das técnicas é a mais utilizada para quantificar as amostras. Sobre esse assunto, marque a alternativa correta: Espectrofotometria: conseguimos quantificar a partir do valor de luz refratada. Eletroforese: quantificamos a partir do tamanho da banda final gerada. Fluorometria: quantificamos a partir da intensidade da fluorescência. PCR: quantificamos a partir da quantidade de DNA final gerado. Precipitação em NaCl: quantificamos a partir do tamanho do pellet gerado. Responder Comentário 2. A síntese de cDNA é fundamental para determinadas análises, como medir a expressão de determinado gene. Com base no que estudamos, qual dos itens abaixo não é necessário para a construção do cDNA? Transcriptase reversa Nucleotídeos Solução de fenol/clorofórmio RNA molde Mg2+ Responder Comentário CONCLUSÃO CONSIDERAÇÕES FINAIS Ao longo desta jornada, aprendemos que é possível usar ométodo científico para quase todas as ações do nosso dia a dia. Vimos também que o desenho experimental é uma ramificação do método científico. Visitamos todas as suas etapas, variáveis, hipóteses, erros e o tipo de amostragem que devemos utilizar para chegar a uma conclusão confiável. Com o desenho experimental em mente, partimos para as etapas pré-analíticas de transporte, coleta e armazenamento do material biológico seguido da extração de DNA e RNA e o controle de qualidade do purificado obtido. Por fim, entendemos a importância do cDNA e a técnica de construção do cDNA. Esse foi, sem dúvida um marco que possibilitou o aprofundamento de diversas técnicas da Biologia Molecular. Ao longo dos anos, a Biologia Molecular está sendo desenovelada, mostrando a sua face e permitindo que você adentre ainda mais em seus conceitos. Agora é com você continuar esta jornada! PODCAST 0:00 21:56 REFERÊNCIAS AL SOUD, W. A.; RADSTROM, P. Purification and characterization of PCR- inhibitory components in blood cells. In: J Clin Microbiol, v. 39, p. 485-93, 2001. AUSUBEL, F. M. Current protocols in molecular biology ‒ 1987‒1988. Hoboken, NJ: John Wiley & Sons, 1987. BELOTSERKOVSKII, B. P. et al. Polypropylene tube surfaces may induce denaturation and multimerization of DNA. In: Science, v. 271, p. 222, 1996. FEIGELSON, H. S. et al. Determinants of DNA yield and quality from buccal cell samples collected with mouthwash. In: Cancer Epidemiology and Prevention Biomarkers, v. 10, n. 9, p. 1005-1008, 2001. GUBLER, U.; HOFFMAN, B. J. A simple and very efficient method for generating cDNA libraries. In: Gene, v. 25, n. 2-3, p. 263-269, 1983. LAZAR, J.; FENG, J. H.; HOCHHEISER, H. Research methods in human- computer interaction. Burlington, Massachusetts: Morgan Kaufmann, 2017. MELO, M. R. et al. Coleta, transporte e armazenamento de amostras para diagnóstico molecular. In: Jornal Brasileiro de Patologia e Medicina Laboratorial, v. 46, n. 5, p. 375-381, 2010. NUOVO, G. J. In situ detection of PCR-amplified DNA and cDNA: a review. In: Journal of Histotechnology, v. 17, n. 3, p. 235-246, 1994. OLIVEIRA, M. C. de S. et al. Fundamentos teórico-práticos e protocolos de extração e de amplificação de DNA por meio da técnica de reação em cadeia de polimerase. Embrapa Pecuária Sudeste - Livro científico, 2007. RODRIGUES JR, J. F. Pesquisa Experimental. 2018. In: Escrita Científica USP, S.d. SANTELLA, R. M. Approaches to DNA/RNA extraction and whole genome amplification. In: Cancer Epidemiology and Prevention Biomarkers, v. 15, n. 9, p. 1585-1587, 2006. SHOKERE, L. A.; HOLDEN, M. J.; JENKINS, G. R. Comparison of fluorometric and spectrophotometric DNA quantification for real-time quantitative PCR of degraded DNA. In: Food control, v. 20, n. 4, p. 391-401, 2009. VISVIKIS, S.; SCHLENCK, A.; MAURICE, M. DNA extraction and stability for epidemiological studies. In: Clinical Chemistry and Laboratory Medicine (CCLM), v. 36, n. 8, p. 551-555, 1998. EXPLORE+ Para saber mais sobre os assuntos tratados neste tema, assista: Ao vídeo Como é feito um TESTE DE DNA? Ao vídeo Eletroforese horizontal de DNA em gel de agarose. Leia: Aprenda a fazer extração de DNA em casa, Hemocentro da FMRP-USP, e conheça a técnica de extração utilizando cebola e materiais que temos dentro de casa. O artigo Coleta, transporte e armazenamento de amostras para diagnóstico molecular, de Murilo Rezende Melo e colaboradores (2010). CONTEUDISTA Eldio dos Santos Currículo Lattes Ao clicar nesse botão, uma nova aba se abrirá com o material preparado para impressão. Nela, acesse o menu do seu navegador e clique em imprimir ou se preferir, utilize o atalho Ctrl + P. Nessa nova janela, na opção destino, direcione o arquivo para sua impressora ou escolha a opção: Salvar como PDF. < Sequenciamento, Clonagem e Técnicas de Hibridização MÓDULO 0 MÓDULO 1 MÓDULO 2 CONCLUSÃO DESCRIÇÃO Introdução aos métodos de sequenciamento de material genético, tecnologia do DNA recombinante e técnicas de hibridização de ácidos nucleicos. PROPÓSITO Compreender as metodologias de estudo e análise da sequência de DNA, uma ação importante para entender a sua manipulação para fins de biotecnologia, bioinformática, diagnóstico e outras aplicações, como pesquisa. OBJETIVOS Módulo 1 Distinguir as características dos principais métodos de sequenciamento do DNA Módulo 2 Reconhecer as principais técnicas de clonagem molecular, suas formas de uso e suas vantagens e desvantagens Módulo 3 Identificar os métodos de hibridização de ácidos nucleicos, suas diferenças e aplicações na rotina do biologista molecular INTRODUÇÃO As características hereditárias são passadas de geração em geração através do material genético, codificado em nosso DNA. Existe um grande interesse em conhecermos a fundo o nosso DNA, que tem sido alvo de estudos cada vez maiores e mais profundos desde sua descoberta, na década de 1950. O conhecimento do DNA humano e de outros organismos trouxe consigo múltiplas aplicações, que vão do conhecimento em si ao entendimento de doenças genéticas, estudo comparativo entre espécies, ferramentas em biotecnologia e bioinformática e discussões éticas. Tudo isso foi possível graças às técnicas em biologia molecular que precederam e inspiraram o desenvolvimento do sequenciamento, como as técnicas de restrição enzimática, de clonagem molecular e de hibridização. Atualmente, elas são protagonistas e trabalham em conjunto para o avanço da ciência, da biotecnologia e da saúde humana e animal. MÓDULO 1 Distinguir as características dos principais métodos de sequenciamento do DNA PRINCÍPIOS DO SEQUENCIAMENTO A quantidade de conhecimento que temos sobre o genoma humano e de outras espécies aumentou extraordinariamente a partir do desenvolvimento de tecnologias de sequenciamento do DNA. A maior iniciativa para sequenciamento de genomas foi o Projeto Genoma Humano, que gerou uma quantidade de informação gigantesca. Atualmente, sabemos que o genoma humano tem mais de 3 bilhões de pares de bases e que 99,9% da população humana compartilha o mesmo DNA. Ainda assim, não sabemos a função de aproximadamente metade dos genes descobertos. A informação genética está contida no DNA (ácido desoxirribonucleico), uma longa molécula que é formada por nucleotídeos. Para entendermos como as técnicas a serem exploradas neste conteúdo funcionam, precisamos relembrar alguns conceitos-chave do DNA e da biologia molecular. DNA: construção complexa O primeiro deles é a ideia de que o DNA é uma construção complexa, como uma casa luxuosa. Por mais luxuosas que sejam, as casas são feitas de tijolos, que são as unidades mínimas na nossa metáfora. No DNA, as unidades básicas são os nucleotídeos. Cada nucleotídeo tem três regiões principais: 1 Um açúcar chamado de desoxirribose (por não conter oxigênio no segundo carbono da ribose). No terceiro carbono da desoxirribose, temos um álcool orgânico (grupamento hidroxila) importante para a replicação. 2 No quinto carbono da ribose, temos um grupamento fosfato. 3 No primeiro carbono da ribose, temos uma base nitrogenada (Adenina, Timina, Citosina, Guanina - A, T, C, G). (Figura 1). Figura 1. Os nucleotídeos. As bases nitrogenadas são a principal diferença entre os nucleotídeos de DNA e são as responsáveis por codificar a informação genética. Afinal, precisamos ter pelo menos algumas letras diferentes para codificarmos uma informação no texto complexo que é o nosso genoma. Em uma fita dupla de DNA, as bases nitrogenadas estão livres e pareiam entre si − purinas (A e G) com pirimidinas (T e C) −, graças ao que chamamos de complementariedade das fitas de DNA. Isso garante que a informação genética seja estável e permite a replicação (ou duplicação) do DNA com o mínimo de erros possível. Veja o esquema mostrando a estrutura do DNA e pareamento das basespor complementariedade. Note as pontes de hidrogênio duplas (seta azul) entre Adenina e Timina, e triplas (seta preta) entre Citosina e Guanina. Figura 2. Pareamento das bases nitrogenadas. Replicação do DNA O segundo conceito que precisamos revisar é o da replicação do DNA. A DNA- polimerase é uma enzima capaz de sintetizar uma nova fita de DNA a partir de um DNA molde. Suas principais funções são reconhecer o nucleotídeo lido na fita molde, pareá-lo com seu nucleotídeo complementar e fazer a junção desse segundo nucleotídeo à fita que está sendo sintetizada. Atenção Essa junção do nucleotídeo é feita a partir da energia presente no grupamento trifosfato no quinto carbono do nucleotídeo livre e a hidroxila livre do terceiro carbono da desoxirribose do nucleotídeo que já faz parte da fita em síntese. Essa ligação é chamada de fosfodiéster e é uma ligação covalente, ou seja, forte e difícil de ser quebrada. Agora que sabemos esses aspectos do DNA e de sua replicação, podemos conhecer as técnicas para identificação dos nucleotídeos que os formam. SEQUENCIAMENTO SANGER ORIGINAL Uma das primeiras técnicas de sequenciamento de DNA a ganhar grande espaço no mundo científico foi desenvolvida na década de 1970 pelo cientista Frederick Sanger e, até os dias atuais, o chamado Sequenciamento Sanger é uma das técnicas mais robustas e precisas em uso. Nesse método, Sanger e seus colegas usaram nucleotídeos especiais, com duas grandes diferenças dos nucleotídeos normais que encontramos nas células: os nucleotídeos que Sanger usava eram marcados com radioisótopos, de forma que eles pudessem identificar qual base nitrogenada foi adicionada; já as desoxirriboses foram modificadas pela retirada da hidroxila no terceiro carbono, o que impede a adição de nucleotídeos novos pela polimerase. Por isso, o Sequenciamento Sanger leva o nome oficial de terminação de cadeia, ou dideoxy (pela falta de duas (di-) hidroxilas, no segundo e terceiro carbonos da ribose – os ddNTP). Figura 3. Representação esquemática de um Didesoxinucleotideo (ddNTP), sem um OH no carbono 3 (cinza) e um desoxinucleotídeo (dNTP). Em um Sequenciamento Sanger, precisamos amplificar o DNA-alvo a ser sequenciado. Normalmente, usamos um produto de PCR como amostra, pois precisamos de grande quantidade de DNA-alvo. Mesmo assim, o Sequenciamento Sanger exige uma reação de amplificação independente, e, por isso, é classificado como um sequenciamento por síntese – SpS. A amplificação feita no Sequenciamento Sanger original contava com uma DNA- polimerase e seu tampão, iniciadores (oligonucleotídeos curtos que se ligam especificamente ao DNA-alvo a ser amplificado), desoxirribonucleotídeos trifosfato (dNTPs) e ddNTPs. Como a marcação radioativa era a mesma para cada nucleotídeo, a identificação de qual ddNTP havia sido adicionado se dava pela separação física, em tubos diferentes, dos ddNTPs marcados. Assim, o Sanger original tinha quatro tubos diferentes, cada um contendo polimerase, iniciadores, tampão, os 4 nucleotídeos (dNTPs) e um didesoxinucleotídeos (ddNTP), marcado com radioatividade. Exemplo Por exemplo, em um dos quatro tubos, tínhamos dATP (desoxirribonucleotídeo trifosfato de adenina), dCTP (desoxirribonucleotídeo trifosfato de citosina), dTTP (desoxirribonucleotídeo trifosfato de timina) e dGTP (desoxirribonucleotídeo trifosfato de guanina) e um didesoxirribonucleotideo trifosfatado de guanina (ddGTP) marcado com radioisótopo; nos outros, estavam presentes os mesmos dNTPS e em cada um ddNTP diferentes (adenina, tirosina e citosina). A cada ciclo de amplificação, os dNTPs são adicionados até que o ddNTP marcado com radioisótopo seja adicionado, o que faz com que a adição de nucleotídeos à fita nova seja parada apenas para aquela fita. As outras fitas que estão sendo sintetizadas na mesma reação continuam sendo sintetizadas até que o ddNTP seja adicionado. Dessa forma, temos sequências de DNA de diferentes tamanhos, todas terminando em um ddNTP marcado com radioisótopo. Assim, sabemos qual ddNTP terminou a cadeia, pois eles estão em tubos separados! Da mesma forma que revelamos o resultado de uma PCR convencional separando o produto amplificado em um gel de agarose através da eletroforese e corando-o com um agente intercalante de DNA que seja fluorescente, a revelação do Sequenciamento Sanger também se baseava na separação por eletroforese e revelação. Quando o gel de agarose polimeriza, forma uma malha frouxa, que não é estreita o suficiente para separar sequências com diferenças de até um único nucleotídeo (ou ddNTP, no caso do Sequenciamento Sanger) que precisamos detectar. Então, usamos outro tipo de gel, ou polímero: a poliacrilamida, feita a partir da polimerização da acrilamida/bisacrilamida, que nos dará uma malha muito mais intricada (forma poros regulares e de tamanho uniforme) e capaz de distinguir pequenas diferenças no tamanho do DNA. Cada um dos quatro tubos de sequenciamento diferentes, contendo os ddNTPs marcados, usará um poço no gel de poliacrilamida para sua resolução. Esperamos que, em cada tubo, os ddNTPs tenham sido usados mais de uma vez. Então, desejamos ver múltiplas bandas em cada uma das linhas do gel correspondentes a cada ddNTP utilizado. Além disso, como a intenção do gel é a separação dos produtos por tamanho quando submetidas a uma corrente elétrica, as moléculas de DNA menores migram mais rapidamente pelo gel e, por isso, estão localizadas mais abaixo do que as moléculas maiores. Finalmente, a revelação é feita através da emissão de radioatividade, que ficava impressa em um filme de raios X, e, em seguida, a sequência é montada a partir dos tamanhos de DNA obtidos (Figura 4). Figura 4. Sequenciamento Sanger manual e imagem real do sequenciamento. A partir da Figura 4, vemos que cada ddNTP marcado com radioisótopos foi colocado em tubos separados e, após eletroforese em gel de poliacrilamida, foram obtidos diferentes tamanhos de DNA. Após revelação (Figura 4, à direita), a sequência é montada de forma manual a partir desses tamanhos. Automação do Sequenciamento Sanger A técnica original de sequenciamento Sanger era bastante trabalhosa e exigia um nível de complexidade muito grande. Além de serem quatro tubos, os ddNTPs radioativos precisavam ser manipulados em ambiente controlado por oferecerem risco à saúde dos trabalhadores, e tudo era feito manualmente, inclusive a interpretação do gel de poliacrilamida para determinação da sequência. Isso trazia imensas limitações ao uso do sequenciamento. Por isso, os pesquisadores automatizaram o sequenciamento para reduzir custos, riscos e tempo de execução, além de, claro, aumentar a precisão na determinação das bases em sequência. Para que a automatização fosse bem-sucedida, entretanto, eles precisaram modificar algo crucial: o uso de radioisótopos. Por serem a maior limitação da técnica, eles foram substituídos por fluoróforos. O uso destes na marcação dos ddNTPs concedeu outra grande vantagem: além de serem mais seguros, podem ser utilizados vários fluoróforos que se excitam e emitem fluorescência em comprimentos de onda diferentes ao mesmo tempo. Isso permite que vários fluoróforos sejam usados na mesma reação, abolindo o uso de quatro tubos. Com cada ddNTP marcado com fluoróforo de cor diferente, o sequenciamento é mais seguro e mais barato, pois já não precisamos lidar com a segurança extra contra a radioatividade e reduzimos a reação a um único tubo. Com o uso de quatro fluoróforos, um para cada ddNTP e em um único tubo de amplificação, outra limitação ao uso do sequenciamento foi superada: a forma de leitura. Relembrando Na técnica original Os resultados eram lidos manualmente, combinando os fragmentos de tamanhos diferentes em ordem até que o quebra-cabeça fosse montado. E, em muitos casos, não era trivial diferenciar qual era a próxima banda, especialmente quando a sequência era mais longa e ainda demandavamuito tempo para a leitura e a interpretação. Além disso, o gel de poliacrilamida várias vezes não era preciso na diferenciação dos tamanhos de DNA e apresentava baixa resolução durante a leitura. Na automação A leitura dos fragmentos com terminação em ddNTPs marcados com fluoróforos passou a ser feita por eletroforese em capilar, ou seja, em um tubo extremamente fino contendo um polímero semelhante à poliacrilamida pela qual cada fragmento passa, um de cada vez. À medida que cada fragmento passa pelo capilar, um laser incide sobre a sequência, e os ddNTPs marcados emitem fluorescências em comprimentos de onda diferentes que são detectadas por um aparelho. Os aparelhos mais modernos conseguem sequenciar cerca de 900 pares de base (pb) em uma cadeia, e possuem múltiplos capilares para a leitura de dezenas de amostras diferentes. O aparelho também processa e filtra a fluorescência de ruído (ou background) de cada ddNTP lido e nos fornece uma representação gráfica da sequência e de sua qualidade. A representação gráfica é o resultado que iremos analisar, e seu nome oficial é eletroferograma. Este consiste em picos coloridos, em que a altura do pico representa a qualidade da leitura – picos mais altos possuem melhor qualidade e são mais confiáveis (ou seja, a probabilidade de a fluorescência da detecção estar errada é muito pequena), e cada cor representa uma base nitrogenada diferente detectada por fluorescências distintas (Figura 5). Figura 5. Esquema do Sequenciamento Sanger automatizado. Sequenciamento de Nova Geração (Next Generation Sequencing) Enquanto a técnica de Sanger era aperfeiçoada e automatizada, outros esforços para sequenciamento de DNA apareceram. Durante essa época, surgiu o pirosequenciamento, capaz de detectar a produção de um fosfato livre – ou pirofosfato –, decorrente da adição de um nucleotídeo. O pirofosfato é produzido quando o trifosfato da extremidade 5’ de um nucleotídeo é clivado e dá energia à ligação fosfodiéster catalisada pela DNA polimerase. Assim, o pirosequenciamento também é um sequenciamento por síntese (SpS), como o Sanger. Porém, dispensa o uso de ddNTPs marcados com radioisótopos ou fluoróforos, assim como eletroforese em capilar. O pirofosfato é detectado ao ser convertido em ATP por uma enzima (ATP sulfurilase). O ATP é, então, usado pela luciferase, uma segunda enzima que oxida a luciferina, um substrato em oxiluciferina, e, durante essa transformação, ocorre a formação de luz, que pode assim ser quantificada. No pirosequenciamento, cada dNTP é adicionado separadamente à reação, de forma que se saiba qual foi o nucleotídeo inserido que gerou luz. Os nucleotídeos que não foram usados são degradados por uma terceira enzima, a apirase. O ciclo se repete com o próximo nucleotídeo (Figura 6). Figura 6. Esquema das etapas da reação de pirosequenciamento. A partir da Figura 6, observamos que o DNA genômico é clivado, ligado a adaptadores e imobilizado em microesferas (beads), nas quais acontecerá a amplificação do DNA por PCR em emulsão (que vamos entender a seguir). No sequenciamento, vemos cada novo nucleotídeo adicionado pela DNA polimerase e detectado pela emissão de luz decorrente da liberação de um pirofosfato. Com a criação do pirosequenciamento, surgiu uma nova geração de sequenciamento (NGS – Next Generation Sequencing). Nessas metodologias, usamos o conceito de formação de bibliotecas de DNA para o sequenciamento. Vamos entender como: 1 As bibliotecas são formadas por meio da “quebra” do DNA extraído, seja por ele ter sido digerido em pequenos fragmentos usando enzimas, seja por ter sido clivado usando métodos físicos, como a sonicação. 2 O DNA fragmentado é ligado a adaptadores, que são pequenas sequências sintéticas, conhecidas e exógenas, usadas na identificação das amostras. Cada extremidade (5’ e 3’) do DNA fragmentado em uma biblioteca se liga a um adaptador distinto, com sequências de DNA diferentes. O uso de adaptadores permitiu o sequenciamento de regiões do DNA que não tínhamos conhecimento suficiente para desenharmos oligonucleotídeos iniciadores, e foi desenvolvido ainda na era Sanger. 3 Os adaptadores imobilizam o fragmento de DNA e auxiliam o início da síntese, pois se ligam por complementariedade a oligonucleotídeos iniciadores aderidos a microesferas, de forma que cada microesfera tenha apenas um fragmento de DNA ligado a ela. 4 Cada microesfera será depositada em um micropoço (em um microchip), local onde ocorrerá uma PCR diferente, chamada de PCR em emulsão (ou em gotícula de óleo-água). 5 Assim, cada microesfera terá várias cópias idênticas do mesmo DNA. Isso é importante para amplificação do sinal emitido pelo pirofosfato, que precisa ser suficiente para que nossos métodos de detecção disponíveis consigam captar esse sinal. 6 Em seguida, as fitas duplas ligadas à microesfera são desnaturadas em fitas simples, e estarão prontas para iniciarmos a reação de sequenciamento. 7 Na etapa de sequenciamento, um único dNTP é adicionado por vez à reação. Assim, quando o dNTP complementar à sequência-molde é adicionado pela polimerase, o pirofosfato liberado na formação da ligação fosfodiéster dá energia para a reação luminosa ocorrer, que é, por sua vez, detectada por um sensor. Esse sistema permite a existência de milhares de microesferas, cada uma com uma sequência de DNA única, amplificada e sequenciada. Assim, milhões de pares de base podem ser sequenciados muito mais rapidamente do que pelo método de Sanger. O mesmo princípio de criação de bibliotecas de DNA com o uso de adaptadores, imobilização e sequenciamento por síntese foi aperfeiçoado e modificado posteriormente. Um dos métodos mais famosos e mais usados é o sequenciamento Illumina/Solexa. Nessa técnica, a biblioteca de DNA é ligada aos adaptadores. Vamos entender como isso é feito: 1 Os fragmentos de DNA são anelados a iniciadores aderidos a uma placa (chamada de célula de fluxo ou flowcell) por meio dos adaptadores, e a síntese por ponte de DNA começa usando dNTPs normais. 2 Na síntese por ponte, cada extremidade do DNA contém adaptadores diferentes capazes de se anelar aos primers complementares já aderidos à placa. 3 A DNA polimerase sintetiza todas as fitas complementares, formando agrupamentos (ou clusters, em inglês) de DNA idênticos, que são desnaturados em fitas simples e usados como molde para a etapa do sequenciamento (Figura 7). Veja a representação esquemática da amplificação por ponte da técnica de sequenciamento Illumina/Solexa: Após formação da biblioteca de DNA ligada a adaptadores (rosa e verde), o DNA-alvo é fragmentado e ligado aos iniciadores aderidos na placa através de complementariedade com os adaptadores, para que a amplificação por ponte aconteça. Figura 7. Esquema da amplificação pela técnica de sequenciamento Illumina/ Solexa. Na foto, os adaptadores estão em verde e rosa. O sequenciamento em si é efeito de forma semelhante ao Sanger, em que didesoxinucleotídeos (ddNTPs) marcados com fluoróforos são adicionados à reação, causando a terminação da polimerização. No caso do sequenciamento Illumina, os nucleotídeos marcados com fluorescência são terminadores reversíveis da polimerização, ou seja, após uma simples lavagem, o sequenciamento pode continuar com a incorporação de novos nucleotídeos marcados com fluoróforos feita pela DNA polimerase. A fluorescência de cada ciclo é obtida em diferentes comprimentos de onda para cada ddNTP e é detectada pelo aparelho sequenciador, que decodifica o sinal. Cada corrida pode ter milhões de clusters diferentes, o que nos gera uma quantidade gigantesca de dados (Figura 8). Figura 8. Esquema do sequenciamento Illumina. Atenção Talvez esta tenha sido a maior vantagem dos sequenciamentos de nova geração: a introdução de métodos de alto rendimento, o que significa um sequenciamento de um número gigantesco de bases, de forma muitomais rápida do que o Sequenciamento Sanger. Contudo, as NGS possuem desvantagens, como perda de precisão quando as sequências são muito repetitivas em um único nucleotídeo, pois é difícil para o aparelho saber quantas bases idênticas foram adicionadas em um ciclo apenas, já que o pico de luz fica bem mais extenso ou mais longo. Nesses casos, podemos usar o Sequenciamento Sanger, que é mais confiável para determinação de sequências repetitivas por também separar as moléculas de DNA por tamanho. Outra desvantagem do NGS é o tamanho máximo das sequências lidas: enquanto no Sequenciamento Sanger lemos cerca de 900 pb, nos primeiros NGSs, as leituras eram bem mais curtas – inicialmente, apenas 30 a 40 bases eram lidas por fragmento. Atualmente, na terceira geração de NGS, existem equipamentos capazes de ler sequências maiores, de 200 a 300 pb. Novas tecnologias capazes de sequenciar até 50 kbp em uma leitura contínua, assim como técnicas para sequenciamento em tempo real, também foram desenvolvidas e estão constantemente sendo aprimoradas. Toda essa capacidade de sequenciamento introduziu outra questão importante: como unir esses pequenos fragmentos e reconstituir a sequência contínua original de milhões de pares de base, como as que existem nos organismos vivos? Com o desenvolvimento tecnológico que permitiu os sequenciamentos de alto rendimento, vimos o desenvolvimento de softwares e algoritmos especializados na resolução do quebra-cabeças gerado ao produzirmos centenas de milhões de sequências. Com o estudo da genômica e da transcriptômica, um campo novo de intercessão entre biologia e informática cresceu muito: a bioinformática. Neste vídeo, você conhecerá um pouco sobre os métodos de NGS de terceira geração. Para aprender sobre como o quebra-cabeças do genoma é montado em maiores detalhes, acesse nossa seção Explore +. VERIFICANDO O APRENDIZADO 1. O sequenciamento do DNA permitiu grande quantidade de conhecimento sobre o genoma de diversas espécies. Sobre os métodos de sequenciamento, é correto afirmar que: O método mais antigo, conhecido como pirosequenciamento, utiliza a liberação de um pirofosfato terminador de cadeia para revelar qual nucleotídeo foi adicionado. Um dos métodos mais confiáveis de sequenciamento é o pirosequenciamento, pois consegue identificar regiões com nucleotídeos repetitivos com alta resolução. Os sequenciamentos de nova geração (NGS) não são tão confiáveis quanto o Sequenciamento Sanger, porém produzem grande quantidade de informação em um intervalo de tempo muito curto. O sequenciamento Illumina e o pirosequenciamento não fornecem muita informação, pois sequenciam apenas algumas dezenas de pares de base por corrida. Com a chegada de NGS, o Sequenciamento Sanger se tornou obsoleto e não tem mais utilidade para a maioria das aplicações em ciência, saúde e biotecnologia. Responder Comentário 2. Sobre o Sequenciamento Sanger, é correto afirmar que: Utiliza a terminação da cadeia em ribonucleotídeos marcados com radioisótopos, o que limita a aplicação do método. Utiliza didesoxirribonucleotídeos marcados com fluoróforos, que são identificados ao longo da cadeia durante a síntese. Parte do princípio de separação das moléculas de DNA em gel de agarose e revelação dos nucleotídeos por emissão de luz ultravioleta. Foi automatizado, de forma que a terminação da cadeia por nucleotídeos modificados e marcados possa ser identificada mais rapidamente. Depende da leitura de lasers, que excitam os radioisótopos a emitirem radiotividade no comprimento de onda a ser detectado. Responder Comentário MÓDULO 2 Reconhecer as principais técnicas de clonagem molecular, suas formas de uso e suas vantagens e desvantagens TECNOLOGIA DO DNA RECOMBINANTE A tecnologia do DNA recombinante é uma ferramenta com grande aplicação em biotecnologia. É usada para transferir uma informação genética de um organismo para outro, pela união de duas fitas de DNA de origens diferentes e sua inserção em um organismo hospedeiro (Figura 9). A tecnologia do DNA recombinante consiste na união de duas fitas de DNA. Também é conhecido como clonagem molecular, pois nesse processo temos a expansão de organismos hospedeiros idênticos geneticamente, ou clones, todos contendo o DNA recombinante. Com o uso da tecnologia do DNA recombinante, conseguimos produzir proteínas humanas em larga escala, para terapia, diagnóstico e até prevenção de doenças. Exemplo Por exemplo, a clonagem molecular permite: que bactérias sintetizem insulina humana, usada no tratamento de diabetes mellitus tipo I; usar genes inseridos em plasmídeos como forma de amplificarmos o gene e usá-los como curva de quantificação em uma qPCR; fabricar vacinas contra o papilomavírus humano (HPV) usando apenas a proteína externa do vírus produzida em levedura. Além disso, podemos alterar geneticamente organismos complexos, como plantas e animais, ao introduzirmos genes de outras origens – os transgenes, gerando os organismos transgênicos – ou modificando genes que já existem em determinado organismo. Criamos, assim, os chamados organismos modificados geneticamente (GMO, genetically modified organisms). Entretanto, com essa capacidade, vieram muito questionamentos éticos sobre o que podemos e devemos modificar nos organismos. Para dominarmos essa poderosa ferramenta, precisamos conhecer alguns pontos-chave sobre a informação que queremos transferir, sobre as formas de transferência e sobre o sistema para onde estamos transferindo a informação genética. A informação que queremos transferir, nesse caso, é uma sequência de DNA de interesse, que pode ser tanto um gene, uma região regulatória, ou pequenas sequências que determinam epítopos antigênicos que não serão expressos, que chamamos de inserto. A forma de transferência dessa sequência é o que chamamos de vetor. Assim como uma encomenda precisa ser transportada por caminhão, moto, navio ou avião para chegar até seu destino, a sequência genética precisa de uma forma de transporte até o organismo-alvo. O sistema de utilização é o nosso organismo final, que apresente a capacidade de expressar determinado gene ou seja modificado geneticamente, o qual chamamos de hospedeiro (Figura 10). Figura 10. Esquema das partes essenciais da clonagem molecular: sequência de interesse (ou inserto), vetor (plasmídeo) e hospedeiro (bactéria). Vamos conhecer cada etapa da clonagem molecular passo a passo: Passo 1: Isolamento do fragmento de interesse O primeiro passo para clonagem molecular é a identificação do gene ou da sequência de DNA que queremos clonar, que, como já aprendemos, é chamada de inserto. Para isso, podemos partir de uma sequência já conhecida. Nas últimas duas décadas, uma quantidade gigantesca de informação genética foi produzida, e existem diversas ferramentas de informática disponíveis na internet para conhecermos a sequência exata de genes e regiões não codificantes de diversos organismos. A maior plataforma pública e gratuita que armazena sequências de DNA (e cDNA, caso estejamos interessados em RNA) e mais conhecida é o GenBank (ou banco de genes, em tradução livre), do Instituto Nacional de Saúde dos Estados Unidos da América (NIH – National Health Institute). Atenção Caso seu gene de interesse não esteja entre as sequências armazenadas e disponíveis ao público, você poderá sequenciar a região. Nesse caso, basta amplificarmos a sequência ou a região próxima que a flanqueie (ou seja, as regiões que estão antes e depois de determinada sequência) por PCR. Após a amplificação, iremos separar as sequências obtidas na PCR por eletroforese em gel de agarose e observar se existem vários produtos ou apenas um. Caso tenhamos apenas um produto, podemos purificar a PCR e extrair apenas o DNA amplificado – ou seja, remover todo tampão, enzima Taq e os iniciadores, que poderiam interferir no sequenciamento. Caso maisde uma banda esteja visível no gel de agarose, precisaremos cortar a banda de tamanho desejado e purificá-la a partir do gel. Assim, eliminamos produtos de PCR inespecíficos e impedimos que eles influenciem nosso Sequenciamento Sanger, o que será feito a seguir. Mas o que fazer caso não haja informação suficiente sobre o organismo estudado sequer para desenhar iniciadores para a PCR? Nesse caso, pode-se usar novas tecnologias de sequenciamento, conhecidas como sequenciamento de nova geração, que usam adaptadores para amplificar o genoma. Uma vez que tenhamos nosso inserto amplificado e sua sequência conhecida, podemos colocá-lo (ou inseri-lo) no nosso vetor. Passo 2: Escolha do vetor e estratégia de inserção Uma vez determinada com exatidão a composição da sequência, precisamos observar seu tamanho. Assim como usamos meios de transporte diversos para diferentes tamanhos de encomendas, precisamos escolher qual o melhor vetor para transportar a sequência. Os vetores são pequenos DNAs autorreplicantes e circulares que conseguem ser transferidos para dentro das células. Existem diversos tipos de vetores, baseados em seu tamanho total, no tamanho da sequência de DNA recombinante que pode transportar e organismos em que podem ser usados. Os vetores mais conhecidos são os plasmídeos, que são pequenos DNAs circulares autorreplicantes, de origem bacteriana, que podem ser transportados para dentro e para fora da célula. Eles ocorrem na natureza e acredita-se que sejam originados de restos de genomas bacterianos que mantêm todos os elementos necessários à sua própria replicação e que foram absorvidos por outra bactéria. Assim, os plasmídeos são considerados elementos genéticos móveis, ou seja, eles podem ser transferidos (ou transportados) de uma célula a outra, ou adquiridos a partir do ambiente. Normalmente, as bactérias conseguem sobreviver sem plasmídeos – por isso, são considerados como extracromossomais –, mas, por vezes, a informação codificada neles oferece vantagem em ambientes seletivos. Exemplo Por exemplo, um plasmídeo pode ter uma sequência de DNA que codifique uma proteína de canal, que, por sua vez, confere resistência a certo antibiótico. Ao entrar em uma célula que esteja sob pressão seletiva pelo tal antibiótico – ou seja, uma célula que esteja lutando para sobreviver ao antibiótico –, a aquisição desse plasmídeo conferirá resistência, e a bactéria poderá sobreviver facilmente. Como comentamos anteriormente, os plasmídeos são autônomos em sua replicação e, por isso, precisam ter determinados elementos que permitam sua duplicação e expressão independentemente do momento em que a célula se encontre. Um plasmídeo criado em laboratório com o mínimo de informação necessária para ser funcional contém três regiões: 1 A origem de replicação, que a DNA-polimerase da sua célula-hospedeira bacteriana reconhece e onde todos os fatores necessários à abertura da forquilha de replicação se ligam. 2 Um gene de resistência a antibiótico, que auxilia na seleção das bactérias que contêm o plasmídeo. 3 O sítio múltiplo de clonagem (multiple cloning site – MCS), que deve incluir um promotor gênico, diversos sítios de restrição por diferentes enzimas e um terminador (Figura 11). Figura 11. Representação esquemática de um vetor comum, o plasmídeo. Atenção Lembre-se de que essas são as regiões mínimas à replicação em uma bactéria e que seu organismo hospedeiro pode ser um eucarioto (leveduras, células animais e vegetais), que pode requerer outras regiões para replicação do plasmídeo e sua expressão. Por exemplo, devemos sempre priorizar o uso de promotores gênicos derivados de leveduras, caso nosso sistema hospedeiro seja a levedura, e de usar promotores e potenciadores preferencialmente virais para células de mamífero, em adição à origem de replicação e um marcador de seleção de eucariotos. Os plasmídeos são amplamente usados em biotecnologia e em clonagem molecular, por serem resistentes ao ambiente, facilmente inseridos dentro de células procarióticas (bactérias) e eucarióticas (como leveduras, células animais e vegetais) e de fácil manipulação. Os plasmídeos podem ter tamanho total entre alguns milhares a dezenas de milhares de pares de base e podem conter insertos de tamanhos variados, desde que o tamanho total do plasmídeo permaneça inferior a 10 mil pares de base (10 kb), muito embora alguns plasmídeos permitam insertos de até 15 kb. Existem situações em que pode ser necessário usar insertos maiores, e, nesses casos, outros sistemas podem ser usados. Por exemplo, o sistema de cosmídeos permite insertos de até 50 kb, pois sua composição genética é uma mistura entre plasmídeos e bacteriófagos. Entretanto, cosmídeos exigem que seu genoma seja empacotado, ou seja, que uma camada de proteína chamada capsídeo viral recubra o DNA do cosmídeo, para protegê-lo e para que haja infecção de novas células. Outras opções são os cromossomos artificiais bacterianos (Bacterial Artificial Chromosome – BAC) ou de levedura (Yeast Artificial Chromosome – YAC), para insertos de tamanho superior a 100 kb. Passo 3: Estratégias de clonagem Uma vez que conheçamos a sequência do nosso inserto, e tenhamos escolhido o vetor que melhor se adeque às nossas necessidades, podemos começar a clonagem. Para isso, vamos explorar duas estratégias principais. A primeira baseia-se na digestão do DNA e utiliza as chamadas enzimas de restrição. A segunda, mais recente, utiliza apenas PCR. Vamos explorá-las com detalhes a seguir. Clonagem por restrição As enzimas de restrição são capazes de reconhecer sequências internas e muito especificas do DNA fita dupla e cortá-lo ao clivarem a ligação fosfodiéster entre dois nucleotídeos, e, por isso, são classificadas como endonucleases − endo = interno; nucle = núcleo (relativo ao DNA); ase = enzimas. Elas são encontradas na natureza em bactérias e funcionam como um sistema de defesa bacteriano contra DNA invasores potencialmente perigosos, como o DNA de bacteriófagos (vírus que infectam e matam as bactérias). Existem dois tipos de enzimas de restrição, baseado em como o corte, ou clivagem, do DNA é feito: Clique nas barras para ver as informações. BLUNT END (EM TRADUÇÃO LIVRE, “EXTREMIDADE PLANA” OU “LISA”). A endonuclease pode reconhecer o seu sítio de clivagem e cortar as duas fitas de DNA no mesmo ponto. STICKY END (EM TRADUÇÃO LIVRE, “EXTREMIDADE GRUDENTA, PEGAJOSA”). A enzima pode cortar o DNA fita dupla com uma diferença de poucos nucleotídeos entre as fitas complementares, deixando esses poucos nucleotídeos em fita simples, o que torna muito mais fácil o pareamento por complementariedade entre as bases nitrogenadas. Esse método é preferível ao primeiro (Figura 12). Figura 12. Ilustração representando clivagem por enzima de restrição “sticky” ou “pegajoso” e clivagem “blunt”, ou “plano”. Para usar o método de clonagem por enzimas de restrição, tanto nosso inserto quanto nosso vetor precisam ter sítios de clivagem pela enzima de restrição de nossa escolha. É de extrema importância que o sítio de restrição (ou clivagem) no vetor seja único, caso contrário ele será digerido em diversos fragmentos não funcionais, e nossa clonagem não funcionará (Figura 13). Figura 13. Ilustração exemplificando sítio de clivagem para enzimas de restrição “sticky” (esquerda) e “blunt” (direita). Na foto, são exemplificadas enzimas de restrição. Caso nosso inserto não possua o sítio de restrição naturalmente em suas extremidades, podemos colocar a sequência que a enzima reconhece nas extremidades durante a amplificação por PCR. Para isso, basta acrescentarmos o sítio de restrição às extremidades dos iniciadores. Em seguida, faremos a digestão do inserto e do vetor pela mesma enzima de restrição em microtubos separados. A reação de digestão é normalmente feita a 37°C por uma hora, muito embora a reação possa ser deixada de um dia para o outro para aumentara digestão. Uma vez que a restrição tenha acontecido, veremos se o vetor foi linearizado – lembre-se de que ele era circular – pela eletroforese em gel de agarose. Esperamos ver apenas uma banda, mais abaixo que a banda do plasmídeo não digerido, pois o DNA linear migra mais rapidamente que o circular. Se virmos mais de uma banda no gel, será porque nossa enzima de restrição encontrou mais de um sítio de clivagem no vetor. Isso pode ser o que você deseja, caso queira remover uma sequência primeiro para, depois, colocar seu inserto no local. Para evitar que o vetor digerido volte a ser um círculo (já que as extremidades digeridas são complementares entre si, especialmente se uma única enzima de restrição para as duas extremidades estiver sendo usada), devemos usar fosfatases, para remover o fosfato nas extremidades 5’, o que impede a circularização espontânea. Atenção Lembre-se de usar a fosfatase apenas no tubo do vetor, e não no do inserto. Essa é uma boa forma de controle de qualidade da nossa digestão e para assegurar que nossa clonagem será bem-sucedida. Em seguida, precisamos fazer a ligação entre as extremidades do nosso inserto e as do vetor linearizado – ou seja, precisamos colocar o inserto no vetor. As “pontas grudentas”, em que há alguns poucos nucleotídeos com bases nitrogenadas livres, conseguem parear por complementariedade. Assim, a extremidade 5’ do inserto pareará com a extremidade 3’ do vetor e a extremidade 3’ do inserto com a 5’ do vetor. No entanto, o pareamento das bases não será suficiente para que uma ligação estável aconteça, pois a complementariedade das bases se dá por pontes de hidrogênio facilmente desfeitas pelo calor. Para termos uma ligação estável, precisamos que ela seja covalente, o que significa que precisamos fazer a ligação fosfodiéster entre as extremidades 5’ e 3’ das duas fitas pareadas. Para isso, usamos uma enzima chamada DNA ligase (Figura 14). Figura 14. DNA ligase que forma ligação fosfdiéster entre as fitas complementares do vetor e do inserto, após digestão por enzimas de restrição. Clonagem livre de restrição A segunda estratégia que podemos usar é chamada de clonagem livre de restrição (restriction free cloning – RFC). Clique nas informações a seguir. 1 2 3 Atenção Na prática, é importante que as duas regiões dos iniciadores senso e antissenso tenham aproximadamente a mesma temperatura de anelamento para que a PCR funcione. Usaremos esses oligonucleotídeos para amplificar o inserto e, ao mesmo tempo, adicionar a ele uma região de complementariedade ao vetor. Existe ainda a possibilidade de seu inserto ser pequeno o suficiente para estar contido dentro de iniciadores um pouco mais longos, o que reduz a RFC a apenas uma PCR. A ciclagem da PCR em si é praticamente a mesma que qualquer outra, com temperaturas de desnaturação, anelamento e extensão padrões – lembrando que o tempo de extensão depende do tamanho do amplicon a ser gerado. Como queremos amplificar um vetor de clonagem com milhares de pares de base, cada extensão deverá ter 1 minuto por kb – ou seja, para um plasmídeo de 7 kb, serão 7 minutos de extensão por ciclo. Como em uma PCR convencional, validaremos a reação vendo o amplicon de tamanho desejado na eletroforese em gel de agarose. Clique nas informações a seguir. 1 2 3 4 Figura 15. Representação esquemática da clonagem livre de restrição. A partir da Figura 15, podemos ver que os iniciadores usados na primeira PCR (amplificação de inserto) possuem regiões sobrepostas para posterior anelamento ao vetor (2º PCR). Uma vez que tenhamos inserido nossa sequência de interesse em um vetor, quer usando enzimas de restrição, quer não, precisamos verificar se nosso inserto está presente. Para isso, fazemos uma PCR com um iniciador senso que se anele próximo ao sítio de clonagem e um iniciador antissenso que se anele à sequência do inserto. Esperamos que essa PCR de detecção do DNA recombinante funcione e nos dê uma banda única, do tamanho esperado para o intervalo entre os primers. Esse é o controle de qualidade da clonagem, que vamos repetir mais à frente. Estamos prontos, então, para colocar esse vetor recombinante dentro de uma bactéria. Essa etapa é necessária para que mais vetores sejam produzidos, mesmo que nosso hospedeiro final não seja a bactéria. Assim, conseguiremos quantidade de vetores suficientes para outros hospedeiros. Passo 4: Transformação, seleção dos clones recombinantes e multiplicação Para colocar nosso vetor recombinante dentro de uma célula, usamos uma técnica chamada de transformação − processo de aquisição horizontal de DNA exógeno do meio ambiente que algumas bactérias possuem. A principal bactéria usada em clonagem molecular é a Escherichia coli, um bacilo Gram-negativo com fácil multiplicação e manutenção em cultura, alta eficiência de transformação e que possui cepas usadas em laboratório que não são patogênicas. No entanto, a E. coli não é naturalmente capaz de adquirir DNA a partir do meio. Para ser passível de transformação, precisamos fazer como que a E. coli seja competente. Conseguimos isso ao congelarmos instantaneamente as células, usando nitrogênio líquido e na presença de tampão rico em cálcio, que fará com que a parede celular da E. coli fique permeável e apresente pequenos orifícios para a entrada do DNA durante a transformação. Após tornarmos a E. coli competente para a entrada do DNA exógeno na célula, podemos transformar nosso vetor recombinante. A transformação bacteriana mais comumente usada é a de choque térmico. As células que estão congeladas serão descongeladas e misturadas com o DNA do vetor plasmidial. Tudo isso deve ser feito em gelo; caso contrário, a célula perderá sua competência. Após curta incubação em gelo, fazemos o choque térmico ao colocarmos as bactérias na temperatura de 42°C por menos de 1 minuto, seguido de banho de gelo por mais uns poucos minutos. Então, fazemos a semeadura das bactérias transformadas em placa de cultivo bacteriano seletivo. No dia seguinte, após deixarmos nossa placa em incubadora de 37°C, veremos o surgimento de colônias, cada uma correspondendo à expansão clonal de um único transformante − bactéria que foi transformada (Figura 16). Figura 16. Representação da transformação bacteriana. Ao analisarmos a Figura 16, vemos que, após congelamento instantâneo de bactéria sensível a antibiótico (1), a parede celular fica permeável (2). Assim, o plasmídeo é incubado com a bactéria e pode entrar mediante o choque térmico (3). Os clones que tiveram uma transformação bem-sucedida são capazes de crescer sob seleção, ou seja, tornam-se resistentes ao antibiótico presente na placa pela aquisição do plasmídeo (4). A transformação é diretamente proporcional à quantidade de DNA plasmidial: quanto mais DNA, maior o número de colônias no final. Por isso, tenha em mente que DNA em excesso pode ser tão prejudicial quanto em escassez, pois pode não ser possível diferenciar as colônias bacterianas no final nem separar seus clones. Entretanto, é importante sabermos que a transformação para clonagem tem eficiência muito mais baixa do que a transformação apenas para expansão do vetor (ou seja, apenas para aumentarmos a quantidade que temos de determinado plasmídeo). Por isso, normalmente tentamos obter e usar o máximo de DNA para a transformação durante a clonagem. A entrada do vetor na E. coli competente precisa distinguir a célula na qual a transformação foi bem-sucedida da que não foi. Portanto, usamos alguns marcadores de seleção que estão presentes nos vetores e que farão a distinção entre as bactérias. O marcador de seleção mais usado é o antibiótico ampicilina. A ampicilina é um antibiótico derivado da penicilina, capaz de matar bactérias e usado em infecções bacterianas comuns. As espécies de E. coli são sensíveis à ampicilina, o que significa que essas bactérias morrem na presença do antibiótico. Vamos aprendermais sobre esse assunto no tópico a seguir. Clique nas barras para ver as informações. SELEÇÃO POR ANTIBIÓTICO A maioria dos plasmídeos usados em clonagem molecular possuem o gene que codifica resistência ao antibiótico ampicilina. Dessa forma, apenas as E. coli que adquiriram o vetor serão resistentes à ampicilina e capazes de crescer em cultura. Portanto, usamos as colônias de clones bacterianos que cresceram em ampicilina, pois apenas estes apresentam o vetor (rever Figura 16). Entretanto, precisamos, ainda, checar se nosso vetor está vazio ou se contém nosso inserto. Para isso, selecionaremos várias colônias para verificarmos mais uma vez se a clonagem molecular funcionou, usando a PCR de detecção do DNA recombinante. Apenas os clones cuja banda do vetor-inserto estiver presente serão usados para purificação do plasmídeo. A purificação do plasmídeo recombinante é uma extração de DNA por coluna, a partir de bactérias, podendo ser feita rapidamente com uso de kits. Uma vez purificado, um bom controle de qualidade é enviar o plasmídeo para Sequenciamento Sanger, a fim de verificarmos se nosso inserto está incorporado de forma correta no vetor e se nenhuma mutação indesejada ocorreu durante a duplicação bacteriana. SELEÇÃO AZUL-BRANCA Neste método de clonagem, é possível distinguir visualmente não apenas quais colônias de clones bacterianos tiveram o plasmídeo transformado com sucesso (com o uso de antibióticos), mas também quais clones tiveram o inserto integrado ao vetor com sucesso. Para entender como isso funciona, vamos conhecer alguns detalhes. Clique nas informações a seguir. 1 2 3 4 5 6 7 8 Figura 17. Esquema simplificado da seleção azul-branca. As colônias cujo inserto foi integrado ao plasmídeo crescem na cor branca. Saiba mais A purificação do plasmídeo recombinante poderá ser feita e, apesar de não ser absolutamente necessária, é recomendável fazer o sequenciamento do inserto. Neste vídeo, você conhecerá um pouco sobre a clonagem molecular. VERIFICANDO O APRENDIZADO 1. A tecnologia do DNA recombinante possui muitas aplicações em medicina, agronegócios e biotecnologia. Sobre DNA recombinante, é incorreto afirmar que: As bactérias podem ser usadas como fábricas para proteínas de origens exógenas. O DNA recombinante consiste na união de sequências de DNA de duas ou mais origens diferentes. Podemos produzir vacinas seguras e eficazes a partir de leveduras, por meio da recombinação de DNA. A diabetes mellitus do tipo I pode ser controlada pelo o do uso de insulina produzida por tecnologia do DNA recombinante. A clonagem molecular não é útil na modificação de organismos pluricelulares, pois não gera organismos estáveis. Responder Comentário 2. Para a clonagem molecular, precisamos de um inserto, um vetor e um hospedeiro. Sobre a clonagem molecular, é correto afirmar que: Os plasmídeos são vetores autorreplicativos nos quais inserimos um DNA exógeno a ser clonado. Chamamos de transformação o processo de transformar organismo selvagem em geneticamente modificado. Bactérias não são bons organismos hospedeiros, pois são incapazes de fazer transformação. As enzimas de restrição são usadas na clonagem para sintetizar novas sequências de DNA, pela sua capacidade sintetase. Os clones são selecionados baseados em sua semelhança fenotípica em microscopia ótica. Responder Comentário MÓDULO 3 Identificar os métodos de hibridização de ácidos nucleicos, suas diferenças e aplicações na rotina do biologista molecular TÉCNICAS DE HIBRIDIZAÇÃO As técnicas de hibridização consistem na identificação de sequências de DNA fita simples ou RNA específicas por meio de seu pareamento por complementariedade – ou hibridização – com sequências sintéticas. O termo hibridização pode ser, por vezes, equivalente ao pareamento por complementariedade. Assim, pode-se dizer que os oligonucleotídeos iniciadores hibridizam com o DNA-alvo em uma PCR. Para definirmos melhor o conteúdo a ser abordado neste módulo, vamos falar de técnicas de hibridização que não se baseiam na amplificação do DNA pela Taq polimerase. Para detectar o DNA fita simples ou RNA nesse grupo de técnicas, usamos oligonucleotídeos marcados, chamados de sondas. Na maioria das aplicações de técnicas de hibridização, desenhamos sondas que cubram a maior extensão possível de nosso gene, sequência ou mensageiro de interesse. Tais sondas podem ser curtas ou longas, e são normalmente marcadas com isótopos radioativos, enzimas, anticorpos, substratos ou com fluoróforos, dependendo da técnica em questão. Dessa forma, podemos classificar os métodos de revelação em métodos diretos e indiretos: Clique nas barras para ver as informações. DIRETOS Em métodos diretos, as sondas são marcadas diretamente com o emissor de sinal (por exemplo, radioisótopos ou fluoróforos) e são, portanto, proporcionais à quantidade de moléculas existentes na amostra analisada. INDIRETOS Em indiretos, as sondas estão marcadas com agentes intermediários que são usados para aumentar o sinal emitido (como enzimas, substratos e anticorpos). Técnicas de transferência (blottings) Existe um grupo de três técnicas de hibridização chamadas blots (manchas, em inglês), que são baseadas na separação das macromoléculasalvo (DNA, RNA ou proteínas), desnaturação e transferência para uma membrana porosa que permitirá a hibridização com as sondas para revelação. Vamos conhecer cada uma dessas técnicas em detalhes a seguir. Southern blotting Criada pelo bioquímico britânico Edwin Southern, em 1975, recebe o seu nome. Nessa técnica, identificamos sequências específicas de DNA. Clique nas informações a seguir. 1 2 3 Atenção Lembre-se de que a eletroforese separa as moléculas de DNA de acordo com o tamanho através da sua migração pelo gel em direção ao polo positivo (ou cátodo), que acontece quando ele é submetido à corrente elétrica em tampão aquoso. Após a separação por eletroforese e leitura em transiluminador ultravioleta, o DNA é desnaturado (em fitas simples) em solução alcalina por cerca de meia hora, e então é neutralizado de volta a pH 7. Então, podemos proceder para a transferência do DNA do gel para a membrana porosa, feita de nitrocelulose ou nylon. Para isso, precisamos montar uma espécie de sanduíche, no qual as duas “fatias de pão” são placas de vidro, cada uma acompanhada por papel absorvente do lado de dentro, e o gel em contato com a membrana porosa como “recheio”. O sanduíche deve sempre ser montado dentro de uma cuba contendo o tampão de transferência, de forma que todos os componentes fiquem encharcados e nenhuma bolha de ar fique presa. Isso porque as bolhas de ar impedem a transferência, formadas quando o tampão aquoso é submetido a corrente elétrica – por isso, usamos papel absorvente para manter a membrana e o gel em contato com o tampão durante todo o período de transferência, que pode levar mais de três horas dependendo do tamanho dos fragmentos digeridos. Após a transferência, o DNA fica fixado na membrana, que pode ter seus sítios de ligação inespecífica bloqueados e pode ser armazenada por longos períodos em geladeira. Atenção Para a etapa de hibridização propriamente dita, usamos sequências conhecidas, as sondas. As sondas são complementares às sequências-alvo e se anelam a elas, fazendo parte do sistema de detecção do sinal. Tanto as sequências-alvo quanto as sondas podem ser feitas de DNA ou de RNA. Originalmente, eram usadas sequências de RNA produzidas em células a partir de DNA recombinante e tratadas momentaneamente com radioisótopos – por isso, a técnica era chamada de hibridização, pelo uso de híbridos de DNA-RNA. Com o uso de oligonucleotídeos sintéticos, as sondas de DNA têm substituído as de RNA, pois são mais estáveis que as últimas. A membrana deve ficar imersa em solução contendo a sonda, em agitação, por pelo menos uma hora. Após essa incubação,a membrana é lavada, e todas as sondas que não se ligaram por complementariedade ao DNA desnaturado em fita simples serão removidas do sistema, restando apenas aquelas que se anelaram ao DNA. Figura 18. Etapas de separação, transferência e hibridização do Southern Blotting, para identificação de DNA. A leitura da hibridização dependerá da forma como as sondas foram marcadas. Caso tenhamos usado radioisótopos, precisamos revelar usando filmes de raios X, em que a radioatividade marcará uma impressão. Caso decidamos usar sondas fluorescentes, colorimétricas ou quimioluminescentes, precisamos revelá-las de acordo. Essas últimas opções são preferíveis à primeira, por serem mais seguras para o manipulador e o meio ambiente. Na revelação colorimétrica, a sonda está marcada com um substrato que é usado por uma enzima, em uma etapa adicional, para produção de um composto colorido. Assim, a posição da sonda pode ser visualizada a olho nu. As sondas fluorescentes precisarão de leitura em aparelho especializado, que excitará o fluoróforo e permitirá a identificação do local onde a sonda está. No método quimioluminescente, temos uma enzima que catalisa uma reação, cujo produto emite luz em determinado comprimento de onda (dependendo de qual enzima reveladora for usada) e, por isso, também precisamos de aparelho para leitura da reação. Neste vídeo, você conhecerá um pouco sobre as técnicas de hibridização. Northern blotting O Northern blotting é uma técnica de hibridização para identificação de sequências específicas de RNA, dentre uma mistura complexa de ácidos nucleicos, cujo nome é derivado da técnica desenvolvida para DNA (Southern blotting). O Northern blotting pode ser usado para avaliar a presença e a quantidade da expressão de determinado gene, assim como avaliar se o mRNA está associado a proteínas, após a purificação das últimas. Os mesmos princípios da técnica de Southern blotting são usados para o Northern blotting. Conheça: 1 Iremos desnaturar e separar o RNA total extraído por eletroforese em gel de agarose contendo formaldeído − um composto químico que usamos para fixação e preservação da amostra, que é especialmente útil quando trabalhamos com RNA. 2 Em seguida, iremos transferi-lo do gel para a membrana de nitrocelulose ou nylon. Para isso, montamos o mesmo sanduíche, contendo a membrana e o gel no meio, dentro de folhas de papel absorvente e com as placas de vidro como “pão”. 3 Após a transferência ocorrer e fixarmos o RNA, passamos à etapa de hibridização das sondas e revelação do resultado, de acordo com a marcação das sondas usadas (Figura 19). Figura 19. Esquema ilustrando a técnica de Northern blot. HIBRIDIZAÇÃO IN SITU A hibridização in situ (in situ hybridization – ISH) foi uma das primeiras técnicas de biologia molecular a ser aplicada ao diagnóstico clínico de doenças. Ela permite a detecção e a quantificação de ácidos nucleicos em cortes histológicos especiais e cultivos celulares e nos informa onde o ácido nucleico investigado está localizado dentro da célula e do tecido. A ISH tem sido usada para diagnóstico citogenético e de doenças infecciosas, como no caso da infecção pelo papilomavírus humano (HPV), causador do câncer do colo do útero, em cérvice uterina. Outros exemplos de aplicação da ISH incluem a detecção de cromossomos aberrantes, com alterações como duplicações, deleções e inserções genômicas que não deveriam existir e que podem causar doenças, como ocorre na distrofia muscular de Duchenne, na fibrose cística e em alguns tipos de câncer. A ISH originalmente usava isótopos radioativos para marcação das sondas. Porém, com o desenvolvimento de marcadores fluorescentes mais seguros, a ISH evoluiu para FISH (fluorescent in situ hybridization, ou hibridização in situ fluorescente). As outras abordagens de leitura do sinal vistas nos blottings, como quimioluminescência e colorimetria, também podem ser usadas em ISH, porém são menos difundidas que a FISH. Já que trabalhamos com tecidos ou células em cultivo, a leitura dos resultados normalmente é feita em microscopia. Para isso, precisamos ter um microscópio de fluorescência, capaz de excitar os fluoróforos e detectar o local de emissão da fluorescência com a precisão necessária ao sistema. Nesse caso, podemos usar microscópio com precisão na casa de nanômetros, ou seja, na casa de bilionésimo de um metro, algo em torno de 0,000000001 metro (Figura 20). Figura 20. Representação esquemática das etapas da hibridização in situ fluorescente. O primeiro ponto que avaliamos em uma IHS ou FISH é o desenho da sonda. Caso queiramos identificar uma sequência, um gene ou um mRNA longo, podemos usar dezenas de sondas curtas, de cerca de 20 pb cada uma, que se anelem ao longo da sequência-alvo. Isso dá grande especificidade ao método, além da ótima sensibilidade dada pelo aumento do sinal emitido, já que todas estarão marcadas. Caso desejemos detectar uma região muito curta, na qual não poderemos sintetizar e anelar dezenas de sondas diferentes, podemos usar uma técnica chamada de branched-FISH (ou FISH ramificado). Nessa técnica, usamos oligonucleotídeos que tenham duas regiões: 1 A primeira é complementar à sequência-alvo, presente no tecido ou na célula. 2 E a segunda região, mais longa, é usada como alvo para as sondas marcadas se anelarem. Com isso, conseguimos aumentar o sinal de detecção da sequência-alvo. Como em outras técnicas de hibridização, na ISH ou FISH, precisamos desnaturar o DNA fita dupla em fitas simples. Como agora estamos trabalhando com tecidos ou células fixados e aderidos a uma lamínula de microscopia, não podemos usar agentes que destruam o tecido, como acontece se tratarmos ele com tampões extremamente alcalinos. Atenção Por isso, a desnaturação do DNA normalmente é feita por calor controlado, de forma a não destruirmos a célula ou o tecido. Se nosso ácido nucleico-alvo for RNA, não poderemos usar calor, então utilizamos um composto químico chamado de formamida para desnaturação de proteínas que possam estar ligadas ao RNA, liberando-o para a hibridização. Precisamos ainda considerar como as sondas entrarão nas células, e isso depende diretamente do material que estamos usando e da natureza das células. Se estivermos fazendo FISH para células ou tecidos de mamíferos, permeabilizamos as membranas plasmáticas usando álcool (etanol) e detergentes suaves (Triton 0.1%). Caso trabalhemos com leveduras, precisamos permeabilizar uma estrutura mais resistente, a parede celular, o que fazemos usando digestão enzimática da parede. Finalmente, podemos fazer a hibridização, ao incubar nossa amostra fixada, desnaturada e permeabilizada com as sondas marcadas. Após lavagens para remover o excesso de sondas, podemos montar nossa lâmina de microscópio e observar a presença de nosso DNA ou RNA-alvo ao excitarmos os fluoróforos das sondas e detectarmos o sinal emitido por eles. Em muitos casos, vamos querer obter imagens e salvá-las, para não somente detectar a presença ou ausência do sequência-alvo, mas também quantificar o sinal e sua intensidade, determinar sua localização, analisar os dados e emitir os resultados (Figura 21). Figura 21. Esquema ilustrando a FISH usando como agente desnaturante a formamida e um sistema de revelação pelo método indireto (com a utilização de um anticorpo). VERIFICANDO O APRENDIZADO 1. As técnicas de hibridização de DNA e RNA foram umas das primeiras a serem usadas e aplicadas em biologia molecular. Sobre hibridização, selecione a opção correta: As técnicas de blotting baseiam-se na separação de DNA ou RNA amplificados in vitro e na transferência para membranas de nitrocelulose. O northern blot foi desenvolvido para separação e identificação de proteínas, DNA e RNA, podendo ser usado igualmente para as três moléculas. As amostras usadas em técnicas de hibridização devem estar frescas e as células, vivas,senão a técnica não irá funcionar. As moléculas-alvo de hibridização precisam estar fixadas em suporte de vidro, encharcadas em tampão, para que a hibridização aconteça. A hibridização corresponde ao anelamento por complementariedade entre uma sonda marcada e o ácido nucleico da amostra. Responder Comentário 2. A hibridização in situ (ISH) é usada no diagnóstico de diversas doenças genéticas e infecciosas. A respeito da ISH e suas variações, é incorreto afirmar que: As sondas são desenhadas de forma a cobrirem a menor área possível do gene ou sequência-alvo. As sondas são marcadas com radioisótopos, enzimas, substratos ou fluoróforos para posterior identificação. As ISH são úteis para a detecção, localização e quantificação da sequência-alvo. A hibridização in situ fluorescente (FISH) exige leitura em microscópio de fluorescência para obtenção dos resultados. Na FISH, usamos agentes desnaturantes dos ácidos nucleicos, como o calor, e fixadores, como o formaldeído. Responder Comentário CONCLUSÃO CONSIDERAÇÕES FINAIS Neste tema, aprendemos como as grandes contribuições do conhecimento do genoma humano e de outros organismos foram feitas pelas técnicas moleculares. Vimos também o sequenciamento, um conjunto de diferentes técnicas que visam descobrir a sequência de nucleotídeos presentes no DNA. Dentre esse conjunto de técnicas, exploramos o sequenciamento Sanger e o sequenciamento de nova geração. Visitamos também a tecnologia do DNA recombinante, aprendendo todas as etapas da clonagem molecular, a escolha do segmento de interesse, do vetor, da estratégia de inserção e de clonagem (por restrição ou livre de restrição), a transformação, seleção dos clones recombinantes e sua multiplicação. Por fim, entendemos as técnicas de hibridização, que consistem na identificação de sequências de DNA fita simples ou RNA específicas pelo pareamento por complementariedade com sequências sintéticas, abordando as técnicas de transferências, Southern blotting e Northern blotting. Além disso, conhecemos a técnica de hibridização in situ. Ao longo desta jornada, vimos como o sequenciamento, a clonagem e a hibridização de ácidos nucleicos permitiram avanços importantes na ciência e como esses conhecimentos são aplicados em saúde, agropecuária e biotecnologia. PODCAST Entrevista da conteudista com o especialista André Lima e Camila Cunha. 0:00 18:03 REFERÊNCIAS ADDGENE. Plasmids 101: A Desktop Resource (3rd Edition). Consultado em meio eletrônico em: 30 out. 2020. BAJPAI, B. High Capacity Vectors. Advances in Biotechnology. 1-10. 2013. CRONAN, J.E. Escherichia coli as an Experimental Organism. In: eLS, John Wiley & Sons, Ltd., 2014. FARACK, L.; ITZKOVITZ, S. Protocol for Single-Molecule Fluorescence In Situ Hybridization for Intact Pancreatic Tissue. STAR Protocols (1)1, 2020. GRIFFITHS, JAF. Recombinant DNA. Encyclopædia Britannica. 2020. Consultado em meio eletrônico em: 28 out. 2020. HEATHER, J. M.; CHAIN, B. The sequence of sequencers: The history of sequencing DNA. Genomics. 1(107),p 1-8. 2013. HUBER, D. et al. Fuorescence in situ hybridization (FISH): History, limitations and what to expect from micro-scale FISH? Micro and Nano Engineering: 1 (2018) 15–24. LIAO, Y. et al. RNA Isolation and Northern Blot Analysis. Bio-protocol 4(6), 2014 Consultado em meio eletrônico em: 6 nov. 2020. SACRAMENTO STATE. Southern blotting: Probe labeling & Detection. Consultado em meio eletrônico em: 6 nov. 2020. SCITABLE BY NATURE EDUCATION. Plasmid definition. Consultado em meio eletrônico em: 30 out. 2020. SOUTHERN, E. Southern blotting. Nat Protoc 1, 518–525 (2006). VAN DEN ENT, F.; LOWE., J. RF cloning: A restriction-free method for inserting target genes into plasmids. J. Biochem. Biophys. Methods 67 (2006) 67–74. EXPLORE+ Para saber mais sobre os assuntos tratados neste tema, assista ao vídeo: Aulas sobre sequenciamento, no canal de Siomar Soares, da Universidade Federal do Triângulo Mineiro (UFTM). Pesquise na internet: O tópico de Biotecnologia e Clonagem de DNA, em conteúdo de biologia, no site da Khan Academy. CONTEUDISTA Camila Freze Baez Currículo Lattes Ao clicar nesse botão, uma nova aba se abrirá com o material preparado para impressão. Nela, acesse o menu do seu navegador e clique em imprimir ou se preferir, utilize o atalho Ctrl + P. Nessa nova janela, na opção destino, direcione o arquivo para sua impressora ou escolha a opção: Salvar como PDF. Amplificação in Vitro de Dna APRESENTAÇÃO MÓDULO 1 MÓDULO 2 MÓDULO 3 CONCLUSÃO DESCRIÇÃO Técnicas de amplificação e detecção de ácidos nucleicos in vitro e introdução de suas aplicações em rotina laboratorial. PROPÓSITO Compreender a teoria por trás da amplificação de ácidos nucleicos in vitro em suas diferentes formas e entender quais são suas vantagens, desvantagens e aplicações em contextos diversos é importante para o profissional de laboratório, pois lhe fornecerá poderosa ferramenta de trabalho. OBJETIVOS Módulo 1 Reconhecer elementos fundamentais à amplificação de ácidos nucleicos in vitro Módulo 2 Diferenciar as variações entre cada técnica de PCR Módulo 3 Identificar aplicações apropriadas ao uso de cada método INTRODUÇÃO Os ácidos nucleicos são as estruturas fundamentais que carregam informações genéticas. Você já parou para pensar como certas características físicas passam dos pais para os filhos? Traços físicos como formato do rosto, altura, cor da pele e dos olhos são traduções de informações transmitidas às gerações futuras dos ácidos nucleicos. No corpo humano e na maioria dos seres vivos, encontramos dois tipos de ácidos nucleicos: o ácido desoxirribonucleico (ADN – também conhecido pela sigla em inglês, DNA), e o ácido ribonucleico (ARN, ou RNA, em inglês). Cada uma dessas moléculas – DNA e RNA – tem funções diferentes dentro da menor unidade viva conhecida, a célula. O DNA possui fita dupla, sendo mais estável e resistente que o RNA. Por isso, a célula utiliza o DNA para armazenar as informações genéticas em longo prazo. Já o RNA, normalmente, em fita simples e mais instável, tem como principal função intermediar a informação entre o DNA e as unidades efetoras da maioria das funções celulares, as proteínas. Formato do rosto e altura, por exemplo, são decorrentes da estrutura óssea que, em grande parte, é feita de proteínas. O papel das proteínas não se limita apenas em traços físicos, mas também em funcionais. Dogma central da Biologia Molecular: DNA replica-se em DNA e é transcrito em RNA, que é traduzido em proteína. Você deve estar se perguntando: o que isso tem a ver com a amplificação de ácidos nucleicos? Em uma célula viva e saudável, as enzimas fazem toda a amplificação do DNA por conta própria em um ambiente extremamente complexo e controlado – do pH e nível de oxigênio disponível, ao momento que a célula está em seu ciclo de vida. São dezenas de enzimas envolvidas na síntese de novas moléculas de DNA, tantas que os cientistas ainda não compreendem completamente todas as etapas envolvidas nesse processo. Apesar de toda a complexidade da duplicação do DNA in vivo, já somos capazes de sintetizar pequenos trechos do DNA em um tubo de ensaio. Incrível, não? Vamos ver com detalhes como isso é possível neste material. MÓDULO 1 Reconhecer elementos fundamentais à amplificação de ácidos nucleicos in vitro PRINCÍPIOS DA PCR CONVENCIONAL Para entendermos como funciona a amplificação de DNA in vitro, devemos primeiro relembrar algumas informações sobre o DNA e o RNA: suas funções, composições, similaridades e diferenças. Tanto o DNA quanto o RNA são formados por nucleotídeos, que são como os tijolos dos ácidos nucleicos e, consequentemente, do material genético. A partir da junção de tais tijolos, formamos as estruturas de DNA e RNA. Mas como são esses tijolos? Em primeiro lugar, os nucleotídeoscontêm um açúcar chamado ribose. Essa ribose é uma das formas mais simples dos carboidratos – a forma mais conhecida de um açúcar simples é a glicose. É na ribose que reside a principal diferença entre DNA e RNA: o RNA possui uma molécula de oxigênio ligada ao segundo carbono da ribose que o DNA não possui – por isso, o DNA é chamado de desoxirribonucleico. O segundo componente são as bases nitrogenadas. Para o DNA, existem quatro tipos diferentes de bases nitrogenadas: Adenina (A) Citosina (C) Guanina (G) Timina (T) Para o RNA, as bases nitrogenadas A, C e G são as mesmas, mas, em vez de T, existe uma Uracila (U). Essas bases são as responsáveis pela informação genética. Imagine escrever um texto codificado, tão complexo quanto um ser humano, usando apenas uma das letras do teclado do computador. Como seria possível entender a informação que você quis codificar? Agora, se você escrever um texto com pelo menos duas letras (ou números) do teclado, usará um código binário. Isso também acontece com a informação genética: a célula utiliza essas cinco bases nitrogenadas para codificar, em sequência, uma informação preciosa. Finalmente, os nucleotídeos possuem grupamentos fosfatos no quinto carbono da (desoxir)ribose, que são capazes de interagir com a hidroxila (álcool orgânico) presente no terceiro carbono da (desoxir)ribose, fazendo a ligação entre um nucleotídeo com o próximo. Essa ligação é conhecida como fosfodiéster, sendo considerada o “cimento” dos nossos “tijolos”: a partir dela, longas sequências de DNA ou RNA são formadas. É importante manter em mente que o grupamento fosfato confere carga negativa à molécula de DNA (Figura 1) – vamos voltar a falar a respeito disso mais à frente. Figura 1: Esquema da estrutura básica dos desoxirribonucleotideos, compostos por fosfato, desoxirribose e base nitrogenada. A interação entre a hidroxila no carbono 3 da (desoxir)ribose e o fosfato de outro nucleotídeo no carbono 5 deixam as bases nitrogenadas livres para interação com outras bases nitrogenadas, normalmente, do tipo oposto. As principais bases nitrogenadas (A, T, C, G, U) são divididas em dois grupos químicos, de acordo com o número de anéis aromáticos que possuem: Clique nas informações a seguir. Pirimidinas Purinas As bases interagem entre si, mas entre grupos opostos: ou seja, Pirimidinas pareiam com Purinas, de acordo com as cargas livres de cada base. Desse modo, A interage com T, pois ambas têm duas cargas livres para interação, e C interage com G através de três cargas. Essas interações são chamadas de pontes de hidrogênio e são consideradas fracas por serem facilmente quebradas por agentes físicos, como a temperatura, e químicos, como o pH (Figura 2). Veja o esquema mostrando a estrutura do DNA e o pareamento das bases por complementariedade. Note as pontes de hidrogênio duplas (seta verde) entre Adenina e Timina, e as triplas (seta preta) entre Citosina e Guanina. Figura 2: Pareamento de bases nitrogenadas. No entanto, essas pontes de hidrogênio são importantes para manter a sequência de DNA livre de erros e garantem à molécula uma de suas características fundamentais: a complementariedade. É a partir dessa complementariedade que as enzimas responsáveis pela síntese do DNA e do RNA, as polimerases, sabem qual nucleotídeo adicionar para manter a mesma mensagem na hora de duplicar o DNA. Ao mesmo tempo, é a característica que dá ao DNA seu formato em fita dupla. Chamamos essa característica de replicação semiconservada. Importante Se olharmos para essa fita dupla em um sentido único, da esquerda para a direita, por exemplo, veremos que uma das fitas se encontra com o carbono 5 da desoxirribose livre na extremidade à esquerda, enquanto a outra fita tem o carbono 3 da desoxirribose livre à esquerda. Isso acontece porque, para interagirem, as duas fitas precisam estar em sentidos opostos – por isso, nós as chamamos de fitas antiparalelas. Esse sentido de interação por complementariedade traz à tona outra característica do DNA: sua replicação deve ser feita de forma semidescontínua. Reação em cadeia pela polimerase: amplificando DNA in vitro Em uma célula viva, as enzimas polimerases têm ao seu dispor todos os itens necessários para duplicar o DNA, de nucleotídeos a todas as enzimas (Figura 3). Figura 3: Representação do complexo de replicação do DNA em uma célula. Imagine quão complexo seria reproduzir o ambiente celular em um tubo de ensaio! Precisamos utilizar os conhecimentos da físico-química do DNA e os princípios básicos de sua replicação para simplificação e adaptação da técnica in vitro. A primeira característica do DNA que é importante na sua replicação in vitro é a complementariedade entre fitas antiparalelas: as bases nitrogenadas de uma fita interagem especificamente com as bases correspondentes da outra fita (A-T, C-G) por meio de interações frágeis que podem ser desfeitas pelo calor. Ao aquecermos a solução acima de 90 oC, podemos desfazer essas interações e abrir a fita dupla em duas fitas simples. Isso deixa as bases nitrogenadas expostas para interagirem e, ao abaixarmos a temperatura, conseguimos fazer com que a fita dupla se refaça e a informação seja mantida. Vamos ver como esse processo funciona passo a passo mais à frente. A segunda característica importante para a replicação do DNA in vitro é a síntese enzimática pela polimerase. Essa enzima lê cada base nitrogenada da fita simples como se fosse um molde, e adiciona a base nitrogenada complementar na fita que está sendo sintetizada através da ligação fosfodiéster. In vivo, a polimerase inicia a duplicação do DNA sozinha, pois ela não consegue abrir a fita dupla em fitas simples, identificar o local certo de início de replicação ou adicionar os primeiros nucleotídeos. A célula utiliza enzimas para abrir a fita dupla, as helicases, e adição dos primeiros nucleotídeos é feita por outra enzima, chamada primase. Na amplificação do DNA in vitro, chamada de reação em cadeia da polimerase (em inglês, polymerase chain reaction – PCR), a abertura do DNA em fitas simples é feita através de calor. Para isso, utilizamos uma enzima termorresistente chamada de Taq polimerase. Além disso, usamos pequenas sequências de nucleotídeos em fitas simples e complementares à sequência- alvo do DNA a ser amplificado. Essas sequências sintéticas são chamadas de iniciadores ou oligonucleotídeos (oligo = poucos), algo em torno de 20 nucleotídeos, que, em inglês, são chamados de primers. Normalmente, são usados dois oligonucleotídeos por reação: um chamado senso, que se liga ao DNA molde fita simples no sentido 3’→5’; e um antissenso, que se liga à fita no sentido 5’→3’. Lembre-se de que o sentido de duplicação contínua do DNA ocorre apenas no sentido 5’→3’, pois o trifosfato (na posição 5) do nucleotídeo livre dará a energia necessária à ligação fosfodiéster com o carbono 3 da ribose do nucleotídeo que já estará na fita. Isso acontece em ambas as fitas (paralela 5’→3’ e antiparalela 3’→5’), e ambos os oligonucleotídeos são sintetizados em laboratório no sentido 5’→3’. Os oligonucleotídeos iniciadores irão demarcar a região do genoma a ser amplificada. Essa informação é importante para dar especificidade à PCR! Etapas da reação em cadeia da polimerase Agora, já compreendemos que a fita dupla de DNA se abre em duas fitas simples quando aquecida próximo a 100 oC, e sabemos que a reação de síntese de novas fitas de DNA é feita por meio de uma enzima termorresistente chamada Taq polimerase. Também descobrimos que a enzima precisa de oligonucleotídeos iniciadores que se ligam por complementariedade ao DNA-alvo desnaturado em uma fita simples. Agora, podemos entender como essa última se desenvolve. Assim como em qualquer receita de bolo, uma PCR precisa de seus ingredientes básicos – ou reagentes mínimos – para a síntese de DNA acontecer. Desse modo, adicionamos esses ingredientes a um microtubo.Os reagentes mínimos necessários para a amplificação são: O DNA molde, dupla fita, extraído a partir de amostras biológicas. Os oligonucleotídeos sintéticos que são complementares à região do DNA molde a ser amplificado. A Taq polimerase, termorresistente. Cátions de magnésio (Mg2+), cofator necessário ao funcionamento eficaz da polimerase. Os desoxirribonucleotídeos trifosfatados (dNTPs – dATP, dGTP, dCTP, dTTP) – lembre-se de que os três que a reação fosfodiéster catalisada pela Taq polimerase aconteça. A água ultrapura, livre de contaminantes de DNA, RNA e de nucleases. (Figura 4). Figura 4: Esquema dos reagentes necessários a uma reação em cadeia da polimerase (PCR). O microtubo com esses poucos reagentes é, então, submetido a diversos ciclos de elevação e redução da temperatura do qual a PCR consiste. A primeira etapa de qualquer PCR consiste na abertura da fita dupla de DNA em suas fitas simples pelo aquecimento da reação a, pelo menos, 95 oC, por um tempo prolongado – algo em torno de 5 a 10 minutos. Esse tempo é necessário para abrir por completo as fitas de DNA que podem estar muito concentradas, superenoveladas e ser muito longas. Em seguida, começam os ciclos. Cada ciclo contém, pelo menos, 3 etapas: desnaturação, anelamento e extensão (Figura 5). Note na ilustração a desnaturação das fitas duplas de DNA em fitas simples, o anelamento dos iniciadores à sequência-alvo por complementariedade e a extensão pela Taq polimerase. Figura 5: Ilustração das etapas da PCR. Clique nas barras para ver as informações. DESNATURAÇÃO É a primeira etapa de cada ciclo em que a temperatura é aquecida a 95 oC por cerca de 1 minuto. O tempo de desnaturação pode variar de acordo com cada reação e genoma. Por exemplo, genomas ricos em CG precisam de tempo e temperatura maiores para desnaturar, pois C faz pontes triplas com G, enquanto genomas ricos em AT precisam de tempos menores por possuírem ligações duplas. ANELAMENTO A segunda etapa de cada ciclo é o anelamento. A temperatura será reduzida para cerca de 50 a 65 oC por, aproximadamente, 30 segundos. Essa redução da temperatura deve ser feita com exatidão para que os iniciadores se liguem especificamente à fita simples de DNA. Se a temperatura for baixa demais, a fita se renatura e a PCR não acontece, ou ainda outros fragmentos do DNA extraído podem se ligar inespecificamente e sua reação não funcionará apropriadamente. Se for alta demais, os oligonucleotídeos se ligarão apenas parcialmente, ou até mesmo não se ligarão, e a eficiência da sua reação será gravemente comprometida. Você pode estar se perguntando como saber exatamente a temperatura a ser usada. A resposta certa dependerá de vários fatores, como o tamanho do seu oligonucleotídeo, seu conteúdo de CG, e a concentração de sais no tampão de PCR. De modo geral, quanto maior o tamanho e o conteúdo de CG, maior será a temperatura de anelamento. Uma vez que os oligonucleotídeos tenham se anelado à fita de DNA molde, a Taq polimerase reconhecerá esse local e fará a extensão da fita dupla. Como a Taq polimerase é termorresistente, a elevação da temperatura a 95 oC não a destrói – na realidade, ela funciona melhor em temperaturas mais elevadas. No caso da maioria das polimerases disponíveis comercialmente, a melhor temperatura de adição de nucleotídeos em uma PCR é, em torno, de 70 oC a 72 oC. Atenção O tempo de extensão depende da velocidade da polimerase usada e do tamanho da sequência entre os oligonucleotídeos. Uma reação para amplificar menos de 500 pares de bases que utilize uma polimerase com uma velocidade de incorporação de nucleotídeos mediana deve ter um tempo de extensão de 30 a 40 segundos. Após o término da extensão, a reação é aquecida novamente a > 95 oC, para que as fitas duplas recém-sintetizadas sejam separadas, e o ciclo desnaturação- anelamento-extensão se repita de 30 a 40 vezes. No final, é recomendável ter um ciclo final de extensão maior para garantir que a síntese de todas as fitas seja concluída. Após o término, a reação deve ser mantida refrigerada para preservar o material amplificado. A PCR acontece em equipamentos que, como um ferro de passar, aquecem e resfriam rapidamente: os termocicladores. Esses aparelhos foram um grande avanço para as ciências biológicas e permitiram a grande difusão da PCR em diversas áreas. Graças a eles, uma PCR convencional média dura de 1 hora e meia a 2h. A cada ciclo, a quantidade de sequência-alvo – aquela contida entre os iniciadores senso e antissenso, conhecida como amplicon – dobra. Dessa forma, se, no primeiro ciclo, tínhamos apenas uma cópia de tal sequência (limite teórico da PCR), ao final do primeiro ciclo, teremos 2 cópias; no final do terceiro ciclo, 4; depois, 8, e então 16, e assim sucessivamente. A cada ciclo, vemos um aumento exponencial do número de cópias da sequência-alvo. Assim, no final de 30 ciclos, teremos algo na ordem de 1 bilhão de cópias da mesma sequência! Um número tão grande de uma mesma sequência vai ser muito mais facilmente identificado posteriormente (Figura 6). Figura 6: Esquema da amplificação exponencial do DNA-alvo por ciclo a partir de uma cópia, em aparelho termociclador. Via de regra, podemos subdividir a PCR em duas categorias: PCR qualitativa, em que todos os ciclos ocorrem em um termociclador comum, precisa de etapas posteriores para revelar o resultado. Nesse tipo, o resultado se dá pela constatação da presença ou ausência do produto alvo da amplificação. Abordaremos alguns outros tipos de PCR que se encaixam nessa categoria. PCR quantitativa, também conhecida como em tempo real, em que os ciclos se dão em um aparelho capaz de ler automaticamente a amplificação e, assim, é capaz de quantificar em tempo real. Existem dois métodos que são mais comuns para a quantificação. Nesse caso, não há necessidade de revelação posterior à reação, o que a torna mais rápida. Eletroforese em gel de agarose: separando e revelando o resultado Após a amplificação da sequência-alvo pela polimerase, temos um microtubo com nosso DNA amplificado em um tampão de reação que é transparente como a água. Naturalmente, não podemos observar a olho nu o resultado da reação: é necessário revelá-la. Para isso, precisamos manter em mente que, após uma PCR bem-sucedida, temos uma sequência de DNA em um tamanho exato graças ao anelamento específico dos oligonucleotídeos à sequência-alvo. Portanto, precisamos separar as sequências por tamanho para verificarmos se o tamanho corresponde ao do nosso produto. Também vamos precisar de algo que revele a localização do DNA, ou um agente revelador especial. Dica Para separar o DNA de acordo com seu tamanho, usamos uma espécie de malha gelatinosa chamada de matriz ou gel de agarose. Você deve estar familiarizado com a gelatina que fazemos na cozinha, certo? A agarose funciona de maneira semelhante: é um polissacarídeo que se dissolve em líquido aquoso quando aquecido e, quando resfriado, se solidifica, ou polimeriza. Ao polimerizar, a agarose forma uma malha com pequenos orifícios que permitirão a passagem do DNA, de forma que moléculas menores de DNA passarão com maior facilidade e mais rapidamente, enquanto moléculas maiores de DNA terão maior dificuldade de passar e, por isso, demorarão mais tempo para viajarem pela malha. Assim, podemos separar as moléculas de DNA de acordo com tamanho. Dependendo do tamanho do nosso DNA amplificado, poderemos usar uma malha mais fechada ou mais aberta simplesmente variando a concentração da agarose que usamos para fazer o gel. O DNA será inserido no gel de agarose através de pequenos orifícios chamados de poços, feitos com um pente com pequenos dentes largos. Para podermos visualizar a passagem do tampão da PCR pelo gel de agarose, usamos corantes como o azul de bromofenol, o qual é mais denso do que o tampão de corrida e faz com que o DNA se assente no fundo do poço, o que é necessário para que a separação funcioneadequadamente. Montagem de gel de agarose e uso de pentes para formação de poços para aplicação do produto de PCR. Uma vez que o gel de agarose esteja pronto e que o DNA tenha sido pipetado nos poços do gel com o corante azul, podemos começar a eletroforese. Para a eletroforese, precisaremos ainda de uma cuba, ou recipiente que contenha entradas para corrente elétrica, uma fonte elétrica e um tampão ionizável. A eletroforese parte do princípio de que um tampão, quando submetido a uma corrente elétrica, tem suas moléculas ionizadas migrando em direção a um dos polos: as moléculas negativas migram para o polo oposto, o cátodo, e as moléculas positivas migram para o polo negativo, o ânodo. No caso do DNA, seu grupamento fosfato lhe dá carga negativa, fazendo que o DNA migre para o polo positivo (cátodo) quando em solução submetida à corrente elétrica. Como o DNA está no fundo do gel de agarose graças ao corante mais pesado que o tampão eletroforético, ele passa por dentro da agarose e, assim, será separado de acordo com seu tamanho pela trama do gel. Por sua vez, o corante azul, também de carga negativa e de tamanho muito inferior à complexa molécula de DNA, migrará pelo gel mais rapidamente, servindo apenas como marcador da velocidade de migração, e não da posição do DNA. Representação esquemática de uma eletroforese em gel de agarose. Para sabermos o tamanho e a posição do DNA, precisaremos de um marcador de tamanho molecular do DNA que consiste em sequências de DNA de tamanhos conhecidos, como se fosse uma escada cujos degraus representam os tamanhos. Ele é um parâmetro para estimarmos o tamanho das sequências de DNA que amplificamos – coloquialmente, chamamos essas sequências em gel de agarose de bandas. Também precisamos de um revelador da localização do nosso produto amplificado no gel de agarose. Esse reagente, chamado de fluoróforo, é uma molécula capaz de fluorescer quando excitada no comprimento de onda correto. Em gel de agarose, usamos fluoróforo que intercale especificamente com o DNA. A molécula mais comumente utilizada é o brometo de etídio, que é capaz de se intercalar com qualquer fita dupla de DNA. Sua capacidade de se ligar ao DNA o torna potencialmente tóxico, carcinogênico e teratogênico, e precisamos manter nossa segurança e as boas práticas laboratoriais para evitar de nos contaminarmos com ele. Existem diversas formas de se utilizar brometo na revelação do gel, podendo ser adicionado antes da solidificação do gel (antes da eletroforese) ou depois da eletroforese, com uma incubação extra. Finalmente, o brometo de etídio é excitado no comprimento de onda ultravioleta em um equipamento chamado transiluminador. Ao ser excitado, o fluoróforo emite fluorescência e dá a localização das bandas de DNA amplificado de acordo com o marcador de tamanho molecular. Imagem de um gel de agarose e sua revelação por fluorescência do brometo de etídio em luz ultravioleta. Dependendo da técnica de PCR utilizada, assim como do objetivo da PCR, seu resultado pode ser uma única banda de DNA no gel de agarose ou múltiplas bandas. Algumas vezes, resultados inesperados também podem aparecer, como múltiplas bandas de DNA, onde apenas uma banda única era esperada. Cada situação demandará a experiência e o conhecimento do profissional para interpretação e resolução de possíveis problemas. Existem alternativas ao uso do gel de agarose para separação de ácidos nucleicos. Um exemplo é o gel de acrilamida/bisacrilamida, usado para separar sequências de DNA com alta resolução, de forma que bandas com até um nucleotídeo de diferença em tamanho possam ser diferenciadas. O gel de acrilamida/bisacrilamida também permite a separação de RNA e proteínas. No entanto, exige revelação por sistemas diferentes, mais complexos, que nem todos os laboratórios possuem estrutura para execução. Além de mais tóxica que a agarose, a montagem do gel e sua corrida eletroforética também são mais trabalhosas. Desse modo, o gel de agarose corado por brometo de etídio é a técnica de revelação de PCR mais utilizada. PCR E ELETROFORESE VERIFICANDO O APRENDIZADO 1. Vimos que a PCR é uma ferramenta molecular para amplificação do DNA in vitro. Sobre a PCR, é correto afirmar que: A polimerase utilizada é capaz de adicionar todos os nucleotídeos necessários, de maneira inespecífica. A especificidade da reação é por oligonucleotídeos iniciadores para demarcar a sequência e permitir que a polimerase inicie a síntese. A PCR ocorre de forma linear, ou seja, nenhuma etapa de variação de temperatura se repete. A Taq polimerase é uma enzima sensível ao calor e deve ser adicionada a cada novo ciclo. Apenas nucleotídeos com hidroxilas no terceiro carbono da ribose são adicionados pela Taq polimerase. Responder Comentário 2. A PCR contém diversas etapas, desde pipetagem da reação até sua leitura. Considerando as etapas, é incorreto afirmar que: A temperatura de desnaturação deve ser alta o suficiente para separar as fitas duplas de DNA em fitas simples. A Taq polimerase é termorresistente e sua temperatura ótima de síntese de DNA é próxima a 70oC. Após a amplificação, podemos facilmente visualizar o resultado, pois se trata de reação colorimétrica. Para identificarmos se nossa sequência-alvo foi amplificada, devemos separar as moléculas de acordo com o tamanho, através de eletroforese em gel de agarose, e depois revelar, usando intercalantes de DNA fluorescentes em ultravioleta. A eletroforese usa a carga negativa do DNA para fazê-lo migrar através do gel e em direção ao cátodo, quando submetido à corrente elétrica. Responder Comentário MÓDULO 2 Diferenciar as variações entre cada técnica de PCR VARIAÇÕES DA TÉCNICA DE PCR Existem situações em que a PCR qualitativa e convencional pode não ser a técnica ideal para o nosso objetivo. Podemos nos deparar com casos em que a concentração do DNA total da amostra é muito baixa, o que pode limitar o uso do produto amplificado em outras aplicações, como o sequenciamento. Em determinadas ocasiões, queremos saber o quanto de determinada sequência temos em nossas amostras. Em outras situações, podemos estar interessados no produto da expressão de um determinado gene, e precisamos olhar para o RNA mensageiro ao invés do DNA, já que os níveis de DNA de uma célula são mantidos constantes, salvo raras exceções. Dica Como você pode ver, existem diversos outros interesses, e uma PCR convencional dará apenas a base para que variações mais complexas, específicas e úteis sejam desenvolvidas, validadas e usadas. Reação de transcrição reversa Como já sabemos, a DNA polimerase é capaz de sintetizar uma nova fita de DNA a partir de uma fita de DNA molde. Afinal, ela é uma DNA polimerase DNA- dependente. Mas, em muitas ocasiões, é necessário investigar a expressão de um gene, ou até mesmo diagnosticar doenças causadas por vírus que não têm material genético feito por DNA. Nesses casos, a molécula a ser detectada e quantificada indiretamente é o RNA. A Taq polimerase, no entanto, não é capaz de reconhecer ou de adicionar nucleotídeos a riboses; ela só trabalha com desoxirriboses. Como conseguimos resolver esse problema? Resposta Pelos organismos que conseguem sintetizar DNA a partir de RNA! Assim como o SARS-CoV2, coronavírus causador da COVID-19, existem outros vírus de genoma RNA. Os primeiros vírus a serem estudados pela humanidade foram os de genoma RNA chamados de retrovírus. Esses vírus têm algo de especial: a capacidade de inverter a ordem DNA → RNA → proteína do dogma central da Biologia Molecular, usando uma enzima para sintetizar um DNA complementar (cDNA) ao seu genoma RNA. Isso mesmo, os retrovírus usam o RNA de seu genoma como molde para síntese de DNA. Os retrovírus possuem uma enzima capaz de sintetizar DNA a partir de RNA cujo nome oficial é DNA polimerase RNA-dependente. Corriqueiramente, ela é chamada de transcriptasereversa, ou TR, pois faz o reverso da transcrição: sintetiza DNA a partir do RNA. Uma vez que os pesquisadores conseguiram isolar a TR, ela passou a ser usada para reações in vitro. Na maioria dos casos, é usada uma TR purificada a partir de vírus aviários, de forma que as TR não representam nenhum risco de infecção ao manipulador e são seguras para diagnóstico e pesquisa. Assim como uma reação pela polimerase, a reação de transcrição reversa (RT) precisa de alguns fatores elementares. O primeiro fator necessário é o RNA de polaridade positiva (RNA+) de qualidade, o que requer muito cuidado na manipulação e extração do material. Esse RNA é assim chamado por possuir o mesmo sentido de transcrição e tradução que um RNA mensageiro (mRNA), mas expande o entendimento para vírus que nem sempre tem seu RNA+ diretamente traduzido na célula, como, por exemplo, os próprios retrovírus. Além do RNA+, a RT também precisará da enzima transcriptase reversa para fazer a síntese de cDNA a partir do RNA+. Assim como as primeiras DNA-polimerases usadas na PCR mais rudimentar, a TR não é resistente à temperatura. Dessa forma, a reação de transcrição reversa deve preceder a PCR, pois a TR é inativada pelas temperaturas de desnaturação. Da junção de reação de transcrição reversa (RT) seguida por PCR, vem o termo RT-PCR. A TR precisará de pequenos oligonucleotídeos, menores ainda que os usados em uma PCR convencional, para iniciar a transcrição. Esses oligonucleotídeos têm, em média, apenas 6 bases e, por isso, são chamados de hexâmeros. Eles podem ser específicos para uma determinada sequência de RNA, ou podem ser uma sequência curta rica em timinas (poli-T) que se anelará à cauda poli-A do mRNA, ou podem ser aleatorizados, sendo este último o mais usado por permitir a síntese e o armazenamento do cDNA derivado de diversas sequências diferentes. Clique nas informações a seguir. Primeiro caso Segundo caso Terceiro caso Ao contrário da PCR, que contém ciclos que se repetem várias vezes para a amplificação de determinada sequência, a RT é linear: cada etapa acontece apenas uma vez, o que não permite amplificação de sinal. Primeiro, a reação começa com o anelamento dos hexâmeros ao RNA+ por poucos minutos. Na maioria dos casos, não há necessidade de temperaturas altas de desnaturação, pois o RNA+ já é uma fita simples. Contudo, podem ocorrer estruturas secundárias no RNA que precisam de temperaturas moderadas para desnaturação. (Figura 7) Veja na imagem a desnaturação de eventuais estruturas secundárias do RNA, seguido por anelamento dos hexâmeros iniciadores à sequência-alvo por complementariedade e síntese de cDNA pela transcriptase reversa. Figura 7: Ilustração das etapas da reação de transcrição reversa (RT). Em seguida, o tubo será aquecido ou resfriado até a temperatura de extensão pela TR. Diferentemente da PCR convencional, a RT possui diversas TR de origens diferentes que podem ser usadas. Assim, os protocolos variam entre diferentes marcas de enzimas. Em alguns casos, a RT pode ter apenas essas duas temperaturas, de anelamento e extensão, de 25 e 37 oC, respectivamente. O cDNA produzido pode ser armazenado por meses a anos em geladeira (4 oC) ou freezer (-20 oC), ou usado imediatamente como molde em uma PCR – a chamada RT-PCR. (Figura 8) Figura 8: Resumo esquemático dos reagentes necessários, das etapas e da amplificação do cDNA em uma RT-PCR. Nested-PCR A PCR convencional é muito útil, mas, às vezes, não consegue amplificar uma determinada sequência que esteja presente em pouquíssima quantidade. Quando há dificuldade em se amplificar o DNA alvo na PCR convencional, o gel de agarose pode não ter capacidade suficiente para evidenciar o amplicon. Nós chamamos essa capacidade de o resultado representar a realidade de sensibilidade. Em outras palavras, a sensibilidade da PCR reflete a capacidade de detecção do sinal do DNA-alvo, em amostras que possuem o DNA-alvo na realidade. Normalmente, a PCR tem ótima sensibilidade por aumentar exponencialmente a sequência-alvo. No entanto, em alguns casos, a sensibilidade da PCR convencional pode não ser suficiente, pois existe uma saturação da reação por volta do 35º ciclo: atingimos um platô em que não há aumento do número de fitas devido ao esgotamento dos reagentes. Então, ter mais de 40 ciclos em uma PCR não oferecerá nenhum benefício, porém, pode aumentar as chances de produtos inespecíficos que atrapalharão a interpretação. (Figura 9). Observe no gráfico que a quantidade de DNA, detectada por fluorescência, aumenta exponencialmente até chegar a um platô, em que não há mais aumento significativo de DNA a cada ciclo. Figura 9: Gráfico representativo das qPCR. A solução para PCR com baixa sensibilidade é relativamente simples: usar uma fração da primeira reação como molde para uma segunda PCR, em uma técnica conhecida como nested-PCR. Para isso, utilizamos dois pares de iniciadores, sendo o par de primers para a primeira reação chamado de iniciadores externos, e os primers usados na segunda PCR conhecidos como internos. Dessa maneira, a segunda PCR sempre gera um produto menor que a primeira reação, e conseguimos aumentar o número de ciclos de amplificação de, no máximo, 40 (na PCR convencional) para entre 60 e 80 ciclos no total de ciclos combinados nas duas reações subsequentes. Consequentemente, aumentamos a quantidade de DNA amplificado obtido ao final da segunda PCR. Caso seja utilizada corretamente, a adição de etapa nested pode melhorar muito a sensibilidade e a especificidade da PCR. Para isso, são necessários alguns cuidados especiais. O primeiro deles está no desenho da reação, que deve ser pensada como um conjunto. A primeira PCR deve possuir oligonucleotídeos que, ao se anelarem a uma determinada região, permitam que a polimerase produza um amplicon longo e específico o suficiente para ser usado como DNA-molde na segunda reação. Saiba mais Isso significa que, caso desejemos amplificar sequências altamente repetitivas, precisaremos levar em consideração uma primeira PCR cujo amplicon contenha regiões específicas ao redor das repetições para que haja uma boa reação secundária. Isso porque, essa última precisa de iniciadores que se anelem especificamente à região que foi amplificada anteriormente. Contudo, devemos evitar o uso dos mesmos oligonucleotídeos da primeira reação, já que podem reduzir a eficácia da segunda reação, além de gerar produtos inespecíficos. Outro cuidado recomendável para a segunda reação é a purificação do produto da primeira reação antes de utilizá-lo na segunda, o que evita contaminações entre amostras, reduz o risco de inespecificidade e aumenta a eficácia da segunda PCR (Figura 10). Note o uso de iniciadores externos na primeira reação, amplificando um produto que será usado como molde de amplificação na segunda reação, que usa iniciadores internos. Figura 10: Representação esquemática de uma nested-PCR. PCR quantitativo em tempo real – qPCR Até agora, todas as técnicas que discutimos precisam da eletroforese em gel de agarose para separação dos produtos da PCR e posterior revelação das bandas através de agentes intercalantes do DNA que emitem fluorescência; por exemplo, o brometo de etídio, quando submetido à luz ultravioleta. Esses tipos de PCR são categorizados como qualitativos e podem ser muito úteis, especialmente, quando o DNA amplificado for utilizado em outra técnica subsequente. Entretanto, existem situações em que a PCR qualitativa se torna pouco informativa. Exemplo Quando queremos determinar se um tratamento está surtindo efeito na redução de um marcador genético específico. Nesse caso, a PCR convencional e suas variações vistas até agora não informam o suficiente para tomada de decisões. Precisamos, assim, de técnicas que revelem a quantidade de certa sequência específica de DNA com o máximo de precisão possível. Entra em cena a PCR quantitativa (qPCR). A qPCR tem acapacidade de quantificação da sequência-alvo e de leitura em tempo real dos resultados, sem necessidade de revelação posterior. Isso porque, ela possui dois fatores adicionais a uma PCR qualitativa: a adição de fluoróforos à própria reação e o uso de um termociclador capaz de detectar o sinal fluorescente. Dessa forma, a cada novo ciclo de desnaturação-anelamento- amplificação, ocorre aumento da quantidade de DNA-alvo e da emissão de fluorescência proporcional à quantidade de DNA sendo sintetizada naquele ciclo. Para que a fluorescência seja detectada, a qPCR exige a utilização de termocicladores que contenham lasers para excitação do fluoróforo e detectores da fluorescência. Esse aparelho é mais sofisticado, mais caro e mais complexo do que um termociclador convencional, porém, seus resultados podem ser igualmente mais informativos e precisos. Outra diferença da qPCR é que, em alguns casos, podemos ter uma temperatura única para anelamento e extensão: todas as duas acontecem a 60 oC (Figura 11). Figura 11: Exemplo dos ciclos de temperatura usados em SYBR qPCR contendo a fase de amplificação e a fase de curva de dissociação. Existem duas técnicas de qPCR largamente usadas: SYBR Green e TaqMan. Elas diferem especialmente na forma como a fluorescência é emitida e na especificidade do sinal fluorescente. As formas de quantificação são, por outro lado, semelhantes. Vamos explorar as duas em mais detalhes? SYBR Green O SYBR é fluoróforo que, como o brometo de etídio, é capaz de intercalar em fitas duplas de DNA. Quando está associado ao DNA, o SYBR pode ser excitado em comprimento de onda azul, e então emite fluorescência verde. Quando não está ligado ao DNA fita dupla, o SYBR tem sua fluorescência drasticamente reduzida. Por sua capacidade de fluorescer quando ligado ao DNA fita dupla, ele também é usado como um sistema alternativo na revelação da PCR convencional em gel de agarose, já que é menos tóxico que o brometo de etídio. Quando adicionado à qPCR, o SYBR emitirá o máximo de fluorescência na fase de extensão, pois esse é o momento em que há maior número de bases pareadas em fitas duplas. O aparelho termociclador irá incidir um laser, excitando o SYBR a emitir fluorescência verde. Essa fluorescência será detectada pelo aparelho, que mostrará a quantidade de fluorescência por ciclo. A cada novo ciclo, maior será a fluorescência emitida, pois maior será a quantidade de DNA fita dupla sendo sintetizada. Desse modo, a progressão de fluorescência será proporcional à quantidade de DNA amplificado a cada ciclo, até que a reação atinja sua saturação, e um platô após a curva de crescimento exponencial será observado (Figura 12). Repare que, quando não está ligado ao DNA dupla fita, devido à sua desnaturação, o SYBR não emite fluorescência. Ao ligar-se à fita dupla de DNA, durante a sua extensão, a fluorescência é emitida. Figura 12: Esquema ilustrando a teoria por trás da fluorescência do SYBR. É importante considerarmos que essa interação entre o SYBR e a fita dupla de DNA não é controlada – o SYBR irá se intercalar com qualquer fita dupla de DNA. Isso faz com que a emissão de fluorescência seja menos específica: como em uma reação convencional, apenas os oligonucleotídeos iniciadores são responsáveis pela especificidade. Assim, outras formas de controle da reação foram criadas para garantirmos que o sinal fluorescente usado na quantificação corresponde apenas ao produto desejado. Portanto, adicionamos um passo a mais a qPCR: a curva de dissociação (melting curve). Nessa etapa, o termociclador aquecerá a PCR lentamente, para medir em qual temperatura 50% das fitas duplas de DNA sintetizadas se dissociam. Essa dissociação será medida, mais uma vez, através da fluorescência pelo SYBR. Essa temperatura dependerá de dois fatores principais: o conteúdo CG e o tamanho da sequência. Por isso, reações de SYBR tem amplicons com tamanho limitado em cerca de 100 nucleotídeos em média. Em uma curva de dissociação boa e específica, todas as moléculas amplificadas irão se dissociar na mesma temperatura e, assim, só um pico é observado no gráfico. Em uma qPCR por SYBR sem especificidade, mais de um pico será visto na curva de dissociação, e a reação precisará ser ajustada. Esse é um importante nível de controle de qualidade da reação que não deverá ser ignorado. Note na figura a seguir, a existência de um único pico (a 76,49 °C) indica que há apenas um produto amplificado, o que confirma a especificidade da qPCR. Figura ilustrativa: Exemplo de resultado de uma curva de dissociação dos produtos de uma qPCR por SYBR Green. QUANTIFICAÇÃO ABSOLUTA POR SYBR TaqMan Outra forma bastante comum de qPCR é chamada de TaqMan, cujo nome vem da referência ao jogo de videogame dos anos 1980, PacMan. Assim como na técnica SYBR, a quantificação em tempo real na TaqMan ocorre através da emissão e detecção de fluorescência a cada ciclo de amplificação. Entretanto, a TaqMan difere do SYBR na forma como a emissão da fluorescência acontece. No TaqMan, além de todos os reagentes que uma PCR convencional possui, temos a presença de uma sequência extra, complementar à região interna dos iniciadores. Essa sequência extra é conhecida como sonda e é curta, com tamanho aproximadamente igual ao dos oligonucleotídeos iniciadores, e possui temperatura de anelamento pouco superior à deles. A sonda contém uma molécula fluorescente na extremidade 5’, e uma outra molécula na extremidade 3’, que bloqueia a emissão de fluorescência. A existência de uma sonda que se anela à região alvo a ser amplificada não representa muito, se a molécula fluorescente não for liberada de seu bloqueador. Para isso, a enzima Taq polimerase usada na TaqMan é diferente das outras Taq polimerases. Ela adiciona nucleotídeos (polimerização), como as demais polimerases, e remove nucleotídeos (função exonuclease). A remoção de nucleotídeos é fundamental para a detecção da fluorescência, pois, quando a enzima chega ao nucleotídeo da sonda que contém o fluoróforo e o remove da sequência, o fluoróforo estará livre de seu bloqueador e poderá emitir fluorescência detectável (Figura 13). A cada novo ciclo da PCR, as fitas duplas serão desnaturadas, os iniciadores e a sonda se anelarão, e a TaqMan polimerase fará síntese do DNA. Com remoção dos nucleotídeos da sonda, o fluoróforo nela contida é liberado para emitir fluorescência proporcional a cada nova sequência-alvo sintetizada. Repare na ilustração que a sonda anelada entre os dois iniciadores é clivada pela TaqMan polimerase durante a extensão do DNA, permitindo a emissão de fluorescência. Figura 13: Representação esquemática da qPCR pelo método de TaqMan. Saiba mais A TaqMan apresenta uma vantagem extra para especificidade da reação: o anelamento da sonda é específico para a região alvo a ser amplificada. A especificidade dada pela sonda é tamanha que diferenças de apenas um nucleotídeo podem ser detectadas – essas mutações são conhecidas como single nucleotide polymorphism (SNP). Assim sendo, a TaqMan dispensa técnica complementar para avaliação da especificidade, como a curva de dissociação, o que a faz mais rápida do que a técnica de SYBR. Entretanto, as sondas tornam a reação mais cara. Outra vantagem que a TaqMan traz em relação ao SYBR é a capacidade de múltiplas detecções na mesma reação com maior precisão e confiabilidade. Veremos isso em mais detalhes à frente. Tanto a técnica de SYBR quanto a TaqMan são capazes de quantificar o DNA ou cDNA. A técnica como a quantificação é obtida varia, mas a maioria das análises posteriores podem ser usadas igualmente – uma vez que resultados confiáveis tenham sido obtidos através de rigoroso controle de qualidade. Quantificação Na qPCR, cada ciclo desnaturação-anelamento-extensão produzirá fluorescência, que será detectada pelo aparelho. Primeiro, deve-se ajustar o programa do aparelho para que ele saiba qual laser e quais filtros usarpara a excitação de cada fluoróforo e em qual espectro da emissão ele deverá buscar o sinal para detecção. Em outras palavras, você é o responsável em dizer ao aparelho o que ele deve fazer. Em seguida, o aparelho determinará, nos ciclos iniciais de amplificação, qual é o nível em que o sinal obtido é superior ao sinal de ruído. Como a qPCR utiliza fluoróforos para a quantificação, por vezes existe um “vazamento” de fluorescência no início da reação que não está relacionada com a amplificação da sequência-alvo em si. Esse sinal inespecífico, geralmente, obtido nos primeiros ciclos, chamamos de sinal de ruído, ou background, em inglês. O ruído vai ser utilizado para determinar o limiar de detecção. O primeiro ciclo em que a fluorescência de uma determinada amostra ultrapassa o limiar de detecção acima do ruído é chamado de valor de Ct. Esse valor é importante por estar diretamente relacionado à quantidade inicial de DNA-alvo da amostra amplificada. A relação entre concentração inicial de DNA-alvo na amostra e Ct é inversamente proporcional, o que significa que, quanto menor for o Ct de uma amostra, maior a quantidade de DNA que ela originalmente continha. Outros dois parâmetros usados pelo aparelho para ajustar a reação internamente são a ROX, um fluoróforo passivo usado como referência, e o Rn, que representa um ajuste entre o sinal do fluoróforo de escolha (SYBR ou da sonda TaqMan) e a referência ROX. A maioria dos reagentes para qPCR já possuem ROX adicionados ao tampão, cabendo a nós apenas a observação para eventual detecção de anomalias que podem invalidar a reação. Mais uma vez, a qPCR tem que manter padrões rígidos de controle de qualidade para que diferenças mínimas na quantidade sejam confiáveis. Com todos esses fatores ajustados corretamente, os aparelhos mais modernos detectarão o sinal emitido a cada ciclo e darão, em tempo real, o resultado na tela do computador ao qual ele precisa estar ligado para funcionar, em um gráfico chamado de curva de amplificação. Veja o exemplo de gráfico de amplificação para o gene Suc2 da Saccharomyces cerevisae. Note a reta paralela ao eixo x (horizontal), que representa o valor de limiar de detecção / quantificação. Abaixo dela, temos o ruído da reação. As curvas amarelas e vermelhas representam a quantificação das amostras e, como você pode observar, existem 4 amostras em duplicata; a com maior quantidade de DNA é a mais à esquerda no gráfico, com menor Ct. Você consegue dizer qual é o Ct da amostra mais concentrada? Figura 14: Gráfico de amplificação. Existem duas formas de se quantificar o produto amplificado: Pela curva padrão Em muitos casos, a quantificação absoluta do DNA alvo na amostra é necessária. Para isso, devemos ter em mãos uma curva padrão, com concentrações conhecidas do DNA alvo. Essa curva pode ser comprada de laboratórios especializados em sua fabricação ou produzida por nós mesmos, através de clonagens e purificação. A partir da concentração mais alta, faremos uma diluição seriada. Para isso, colocamos uma fração da solução de maior concentração em um tubo contendo apenas água, e depois deste tubo para outro com apenas água, e assim sucessivamente até termos pelo menos 5 pontos de curva. Diluição seriada usando a escala em mililitro (mL) para a nossa metodologia é utilizado em microlitro (µL). Em seguida, informamos ao aparelho em quais posições cada concentração da curva está, de forma que o próprio computador calcule os parâmetros de qualidade da curva. Com esses valores, o computador calcula a quantidade de DNA existente nas nossas amostras de concentração desconhecida. Alguns dos principais valores dados pela curva padrão que usamos para determinar a concentração da amostra-teste são a linearidade da curva e a eficiência de amplificação. Repare na imagem a seguir que existem 5 quantidades diferentes da curva padrão (em vermelho), obtidas pela diluição seriada, e três amostras desconhecidas (em azul) cuja quantidade de DNA foi calculada a partir de seus Cts e com base na linearidade da curva padrão. Exemplo de curva padrão para quantificação absoluta do DNA. Linearidade da curva Matematicamente conhecida como R2,, deve ser superior a 0.985 para que a reação seja aceitável, e a quantificação de sua amostra-teste seja calculada com máximo de precisão. Usando fórmulas de linearidade, calculamos o valor preciso de DNA-alvo na amostra antes da amplificação começar, baseado no Ct de cada uma. Eficiência de amplificação Com ela, a cada ciclo, espera-se que a quantidade de DNA-alvo amplificado dobre, o que significaria uma eficiência de 100% da reação. Porém, devido a pequenos erros, podemos considerar aceitáveis eficiências que variem entre 90 e 110%. Esses parâmetros serão mais robustos com uso de replicatas. Por quantificação relativa, ou método de delta-delta-CT (ou ΔΔCt) Nesse método, você precisará quantificar dois DNA-alvos diferentes: o DNA de interesse, cuja quantidade é desconhecida na amostra, e o DNA de referência. A determinação da quantidade de um DNA-alvo de interesse é feita a partir da subtração (ou seja, o delta) do Ct (ciclo em que a amostra ultrapassou o limiar) pelo Ct do outro DNA quantificado na amostra, o de referência. Isso porque, a quantidade do gene de interesse pode variar de acordo com diversos fatores biológicos, mas também pode ser devido à quantidade de material usado na extração. Nesse caso, o ideal é fazer uma normalização pela quantidade de cDNA total e, para isso, usamos um cDNA de referência, que, geralmente, é um gene constitutivo expresso em níveis estáveis nas células. O segundo delta, ou a segunda subtração, é feita entre a diferença da primeira subtração na amostra- teste e uma amostra controle, usada como calibradora. A amostra calibradora também precisará ter passado pela primeira subtração; ou seja, também terá sido normalizada. Dessa forma, temos: êΔCt = Ctgene alvo – Ctgene de referência Seguido por êêΔΔCt = (Ctgene alvo – Ctgene de referência)calibrador – (Ctge ne alvo – Ctgene de referência)amostra Essas subtrações são possíveis apenas quando as curvas de quantificação dos dois DNAs-alvo têm eficiência entre 90-110%, e não devem diferir em mais de 10% entre si. Por isso, curvas padrão iniciais para cada gene devem ser construídas para se verificar as eficiências da reação, antes de procedermos para a técnica de quantificação relativa. Se quisermos comparar a expressão de dois genes entre uma amostra e um calibrador, usamos um método especial. Você consegue identificar qual? A pista mais importante é: você está investigando a expressão gênica, e não a existência do gene em si. Portanto, você não está olhando diretamente o genoma, mas um produto dele. Qual produto do DNA podemos detectar via PCR? Resposta Se você respondeu RNA, acertou! Nesse caso, o nome correto e completo da técnica utilizada é RT-qPCR: uma reação de transcrição reversa acoplada a uma reação em cadeia da polimerase quantitativa. PCR em multiplex Até agora, falamos sobre detectar apenas um DNA-alvo por reação, seja de PCR convencional, nested-PCR, RT-PCR ou qPCR. Contudo, podemos detectar mais de um alvo por reação. Precisaremos ajustar as reações separadamente, utilizando pares de oligonucleotídeos iniciadores específicos para cada produto desejado, e depois fundir as duas PCRs em uma. Esse tipo de PCR em que mais de um produto alvo é identificado chamamos de multiplex – múltiplos produtos são detectados, e até quantificados. Em uma PCR convencional, vamos utilizar todos os reagentes que já conversamos e, é claro, os quatro (ou mais) oligonucleotídeos necessários, sendo cada par correspondente à sua sequência-alvo. O mais importante para fazermos um multiplex em uma PCR convencional é que os amplicons tenham tamanhos distintos o suficiente para serem separados pelo gel de agarose para que os sinais de ultravioleta não sejam confundidos. Normalmente, os produtosmenores de 1000 pares de base (pb) devem ter mais de 200 pb de diferença. Para produtos maiores de 1000 pb, a diferença entre os produtos também deve ser maior. Atenção Lembre-se de que você deverá levar em consideração o tamanho do maior produto para o tempo de extensão. Outro fator ao qual você deverá estar atento é a temperatura de anelamento dos múltiplos pares de iniciadores, que devem ter temperaturas o mais próximas possível. Em uma qPCR por TaqMan, a amplificação e quantificação de diferentes sequências na mesma reação é possível ao utilizarmos duas (ou mais) sondas distintas, cada uma capaz de hibridizar especificamente a sua sequência-alvo, e ambas marcadas com fluoróforos que se excitem e emitam fluorescência em comprimentos de onda diferentes. Exemplo Você poderá usar um fluoróforo que seja excitado no comprimento de onda azul e emita fluorescência no espectro verde, e outro fluoróforo que seja excitado e floresça no comprimento vermelho, e assim por diante. Por outro lado, reações multiplex quantitativas usando o sistema SYBR são mais difíceis. Isso porque a emissão de fluorescência pelo SYBR é inespecífica e ocorre sempre que o fluoróforo intercala com fitas duplas do DNA. Assim, a reação multiplex fica limitada e, muitas vezes, não é possível distinguirmos entre os sinais dos diferentes produtos. Em alguns casos, entretanto, a distinção é possível graças à curva de dissociação. Isso ocorre quando os produtos distintos têm sequências diferentes o suficiente para terem temperaturas de dissociação de 50%. Então, observamos dois picos na curva de dissociação, em temperaturas diferentes. No entanto, sequências distintas sem diferença suficiente em seus conteúdos CG não poderão ser multiplexadas, pois não veremos diferenças em suas curvas de dissociação. VERIFICANDO O APRENDIZADO 1. A PCR é uma técnica muito útil, especialmente, por ter variações que podem ser ainda mais informativas. Sobre as variações da PCR, assinale a alternativa correta: Na nested-PCR, fazemos duas reações em um único tubo, amplificando regiões diferentes que geram produtos de tamanhos distintos. O SYBR é um fluoróforo presente em PCR multiplex que dá maior estabilidade à reação. Na RT-PCR, ocorrem duas reações subsequentes: uma de síntese de cDNA a partir de RNA, e outra de amplificação da sequência-alvo presente no cDNA. Uma PCR multiplex consiste em utilizar duas reações subsequentes, sendo que o produto amplificado da primeira serve como molde para amplificação na segunda. A reação de transcrição reversa utiliza uma polimerase especial, capaz de sintetizar RNA a partir de DNA. Responder Comentário 2. Vimos que podemos quantificar uma ou mais sequências de DNA- alvo através de qPCR. Considerando o material estudado, escolha a alternativa correta: A quantificação do DNA ou cDNA na amostra se dá através da intensidade do sinal total, detectado pelo aparelho, dependendo apenas da fluorescência de ROX. O SYBR e um fluoróforo que se liga de forma inespecífica ao DNA dupla hélice e, com isso, a curva de dissociação informa qual é a quantidade de DNA para cada amostra. A quantificação na técnica TaqMan é proporcional à fluorescência emitida na remoção de nucleotídeos da sonda marcados com fluoróforos, o que permite a realização de reações quantitativas multiplex. A quantificação do DNA alvo pode ser feita pelo uso de curva padrão, em que as diferenças entre Cts de dois genes é subtraída da diferença entre amostras-teste e amostra de calibração. A quantificação de uma sequência em amostra-teste, de concentração desconhecida, é feita por ΔΔCt, a partir da linearidade da diluição seriada. Responder Comentário MÓDULO 3 Identificar aplicações apropriadas ao uso de cada método APLICAÇÕES DA PCR Até agora, vimos os reagentes necessários à amplificação exponencial de uma sequência específica de DNA até termos milhões e bilhões de cópias da mesma exata sequência, ou amplicon, que pode ser visualizada a partir de técnicas especiais. Também vimos algumas variações da PCR que a tornam ainda mais relevante e útil em diversos contextos. Mas, afinal, para que precisamos de tantas sequências idênticas? Quais são as aplicações disso? Vamos ver um pouco sobre alguns exemplos delas para ilustrar melhor o quão útil a PCR é. A PCR e as suas variantes em ciências forenses A primeira, e talvez uma das mais famosas para o grande público, é a aplicação forense. Você já deve ter entrado em contato com a identificação de um criminoso a partir do seu DNA deixado na cena do crime, seja por ter assistido a alguma série policial seja por ter lido alguma reportagem da vida real. Isso só é possível porque cada ser humano possui um genoma completamente único, exceto de gêmeos idênticos. Em nosso genoma, temos regiões especiais nas quais um cientista forense pode olhar para confirmar a origem do DNA. Chamadas de marcadores moleculares, elas são conhecidas pela alta frequência de polimorfismos genéticos – regiões com grande variação na sequência de DNA entre indivíduos sem causar nenhum tipo de interferência funcional, pois são mais frequentes em regiões não codificantes. Atenção Um dos principais marcadores moleculares utilizados em análises forenses são as repetições curtas em tandem (ou STRs – short tandem repeats, em inglês). As STRs variam em tamanho e em conteúdo entre as pessoas e oferecem grande precisão na identificação de indivíduos se a detecção de várias STRs for usada em conjunto. As regiões de interesse são amplificadas por PCR e, em seguida, o perfil genético pode ser visualizado por separação das bandas em gel de agarose e coloração por brometo de etídio. Existem casos em que é necessário aumentar o material genético a ser usado para, assim, aumentarmos o sinal durante a revelação. Nesse caso, o perito pode optar pelo uso de uma nested-PCR, lembrando que os primers externos e interno precisam de regiões não repetidas para se anelarem. Um cientista forense, além de fazer a extração do DNA e sua amplificação por PCR, fará a identificação de indivíduos através do seu perfil genético. Ilustração de um gel de agarose mostrando múltiplas bandas e representando os marcadores moleculares. A PCR e as variações usadas no diagnóstico de doenças genéticas Existe uma gama de aplicações de PCR e suas variações na Medicina, de prevenção ao diagnóstico, acompanhamento e prognóstico, ou evolução, de doenças. Ao amplificarmos certas regiões do DNA, podemos identificar a presença ou ausência de sequências que deveriam ou não existir em determinado contexto. Seu uso pode auxiliar, ou até mesmo determinar, o diagnóstico de diversas doenças que variam desde genéticas a infecciosas. As doenças genéticas podem ser muito complexas em sua apresentação e possuir diferentes perfis – autossômico dominante ou recessivo, ligado ao cromossomo X, multifatoriais e multigênicas. O uso da PCR no diagnóstico dessas doenças pode ser feito de diversas maneiras, dependendo de qual é a doença e de seu perfil genético. O PCR multiplex pode ser utilizado para verificar qual alelo está sendo expresso, dentre dois alelos distintos, em uma mesma reação e assim ajudar no reconhecimento de pequenas mutações que levariam ao desenvolvimento de uma doença genética. Mas temos outras aplicações, usando PCR convencional. Vamos usar a doença de Huntington como exemplo. Nessa doença genética autossômica dominante, ocorre um excesso de repetição de três nucleotídeos (CAG) do DNA que codifica uma proteína chamada Huntingtina. Esse excesso leva a uma doença neurodegenerativa sem cura que causa perdas motoras, cognitivas e psiquiátricas ainda na idade adulta, apesar de poder aparecer em forma juvenil também. A PCR torna-se uma importante ferramenta diagnóstica, pois, ao amplificar sequências próximas da região de repetição, pode nos dizer seu tamanho e, assim, informar o risco e até o prognósticoda doença em si. Em um gene saudável, é normal ter cerca de 20 repetições (CAG); em pessoas portadoras de Huntington, o número de repetições aumenta para 35 ou mais. De modo geral, quanto maior o número de repetições, maior o risco de aparecimento e de progressão da doença. Essa gradação de fenótipo – no caso da doença de Huntington, de sintomas – é algo conhecido em genética como penetrância. Atenção Lembre-se de que, para regiões repetitivas, é necessário usar iniciadores que se anelem próximo a STRs, mas não nas STRs em si, pois isso geraria inespecificidade e muitas bandas em um gel de agarose. A PCR e as variações usadas no diagnóstico de doenças infecciosas Outro exemplo diagnóstico que você já pode ter ouvido falar é o uso da PCR para diagnóstico de doenças infecciosas. Ao utilizar a técnica para amplificar o DNA (ou RNA) de algum agente infeccioso, podemos diagnosticar uma infecção, já que o material genético de tal agente não deveria estar presente naquela amostra biológica. Sua simples presença pode indicar o agente etiológico e, assim, descobrir a causa da doença. A PCR é especialmente útil no diagnóstico de organismos fastidiosos, que não crescem bem em cultivo, como o Mycobacterium tuberculosis, por possuir alta sensibilidade e especificidade. Em outros casos, a presença do material genético de um determinado microrganismo não é suficiente para seu diagnóstico como agente causador da doença, e testes complementares a PCR podem ser necessários, assim como técnicas de PCR mais elaboradas que darão maiores informações. Temos, como exemplo, o diagnóstico molecular de COVID-19. O SARS-CoV2, assim como os demais coronavírus, tem RNA fita simples como material genético. Dessa forma, usamos a transcrição reversa para sintetizarmos um cDNA viral, e o utilizamos em qPCR – ou seja, fazemos uma RT-qPCR. Esse é considerado o melhor teste, ou padrão-ouro, para a identificação de casos ativos de infecção pelo SARS-CoV2. Isso porque, o material genético viral é identificado de forma relativamente rápida – entre coleta, extração, RT e qPCR, o resultado pode sair em algumas horas. Além disso, esse método é muito sensível e específico, conseguindo detectar nas amostras pequenas concentrações do vírus (carga viral). A RT-qPCR também é utilizada no diagnóstico e acompanhamento de outras infecções virais. A efetividade do tratamento para HIV pode ser monitorada através de RT-qPCR, sendo esperadas reduções drásticas na carga viral após introdução da terapia. O mesmo princípio de quantificação de cDNA obtido por transcrição reversa também é aplicado em tratamentos oncológicos, especialmente, em leucemias e linfomas: o oncologista pode requerer uma RT-qPCR para acompanhamento de determinado marcador gênico do câncer em questão. Nos dois casos, a redução (ou não) das sequências alvo na RT-qPCR ao longo do tempo podem ser cruciais no tratamento e evolução do paciente. A PCR convencional multiplex também pode ser utilizada no diagnóstico diferencial entre dois patógenos que possam causar os mesmos sintomas, mas que exigem abordagens clínicas diferentes. Exemplo Um paciente transplantado renal pode apresentar alteração em exames bioquímicos que levem o nefrologista a pensar em duas possibilidades: na primeira, uma infecção por um vírus sem gravidade pode estar acontecendo no órgão, e nenhum tratamento seria necessário; na segunda, pode estar acontecendo uma infecção viral grave no rim transplantado que poderia rapidamente levar à perda do órgão e até mesmo ao óbito do paciente. Nesse último caso, seria necessário reduzir as drogas que suprimem o sistema imunológico e impedem que o paciente rejeite o rim novo, para que o próprio sistema imunológico consiga combater a infecção viral – o que leva ao risco de o paciente rejeitar o órgão enxertado. Uma PCR multiplex poderia identificar a presença ou ausência de dois ou mais tipos de genomas virais na urina ou sangue do paciente, acelerando o diagnóstico e a tomada de decisão por parte do médico nefrologista. A PCR e as suas variantes em pesquisa científica Outro campo que utiliza a PCR é a pesquisa científica. Em diversas ocasiões, a PCR pode ser utilizada para manipulação genética de organismos simples, como bactérias, leveduras e células em cultivo. Nesse contexto, podemos usar a PCR para, por exemplo, clonarmos um gene. Fazemos isso ao amplificarmos a sequência gênica que desejamos clonar usando oligonucleotídeos longos que têm duas regiões distintas. A primeira região liga-se ao gene que queremos manipular – deletar, adicionar ou mutar – no organismo alvo; a segunda é a região que se liga ao DNA molde do vetor dentro do qual queremos colocar nosso gene clonado. O vetor é, em muitos casos, uma sequência independente do genoma do organismo alvo, mas que é capaz de se replicar autonomamente quando inserido na célula. Um exemplo de vetores muito usados são os plasmídeos, pequenos DNA circulares autorreplicantes e transferíveis de uma célula a outra, comuns em bactérias. Figura 14: Representação esquemática de uma técnica de clonagem por restrição, com a inserção (ou clonagem) de um gene de origem diferente, que foi amplificado por PCR, ao vetor original. Normalmente, usamos a clonagem por PCR em duas etapas: uma para amplificarmos o gene alvo que queremos clonar; na segunda etapa, usamos o produto amplificado, juntamente com o vetor, para inserirmos o gene clonado no vetor. Outra forma de clonagem inclui o uso de enzimas de restrição para cortar o DNA em pontos específicos, após amplificação por PCR. Saiba mais A pesquisa científica é uma área de atuação muito grande e, por vezes, ela está interessada em entender mecanismos complexos de regulação genética sob diversas condições. A RT-qPCR é uma ferramenta muito útil nesse caso, para a avaliação dos níveis de expressão de genes em células submetidas a diversas condições diferentes. É comum utilizarmos a quantificação relativa (em que comparamos a quantidade de um gene de interesse com um gene constitutivo de expressão estável) para avaliarmos como o metabolismo celular pode mudar mediante o meio que se encontra. Em geral, você pode considerar que qualquer aplicação que determinado método ou técnica tenha em rotinas laboratoriais das mais diversas áreas não apenas é usada em pesquisa científica, como, provavelmente, foi originada de uma. QUANTIFICAÇÃO RELATIVA DE GENES POR RT-qPCR E SEU USO EM PESQUISA VERIFICANDO O APRENDIZADO 1. A respeito da aplicação da PCR e de suas variações em ciências forenses, é correto afirmar que: A nested-PCR não é útil, uma vez que o material genético é encontrado em abundância em situações forenses. A PCR pode nos dar informações importantes, mas não pode determinar a identidade de indivíduos. As STRs são regiões cuja variabilidade as tornam úteis para distinguir indivíduos geneticamente. A qPCR é uma ferramenta necessária para amplificação do material genético de uma amostra antes de seu sequenciamento. O sequenciamento do genoma não é uma ferramenta viável para a identificação de indivíduos, além de ser trabalhoso e caro. Responder Comentário 2. Escolha a alternativa incorreta: A RT-qPCR é a técnica considerada ideal para diagnóstico do SARS-CoV2. Podemos usar PCR convencional para amplificar um gene e cloná-lo em um vetor, e modificarmos geneticamente um organismo simples. Pelo uso de diferentes sondas marcadas com sinais diferentes, a qPCR-TaqMan pode ser usada na identificação e quantificação de mutações em diferentes alelos. As técnicas moleculares são de pouca importância na rotina clínica, pois são demoradas e de aplicações muito restritas. O tamanho de STRs é relevante no diagnóstico de doenças genéticas, pois as STRs sempre estão localizadas em regiões não-codificantes. Responder Comentário CONCLUSÃO CONSIDERAÇÕES FINAIS Vimos que a amplificação de DNA in vitro é feita pela reaçãoem cadeia da polimerase, em que a variação cíclica de temperatura permite a desnaturação, o anelamento e a extensão de sequências-alvo específicas, de acordo com aquelas que desejamos detectar. Como estudado, os oligonucleotídeos iniciadores se ligam à fita simples de DNA que foi aberta por desnaturação por complementariedade entre as bases nitrogenadas. Essas últimas são elementos fundamentais dos nucleotídeos por conterem a informação genética. As variações da PCR são úteis de diferentes formas, e devemos conhecê-las para podermos escolher qual a melhor técnica para cada caso: para aumentar a quantidade final de DNA-alvo amplificado, para síntese de cDNA a partir de RNA polaridade positiva, para quantificação de DNA ou cDNA e para diferenciação rápida entre diferentes produtos de amplificação. Além disso, aprendemos algumas das diversas aplicações que a PCR e as suas variações têm em áreas da ciência, como na forense, na pesquisa e na clínica, participando do diagnóstico, acompanhamento e prognóstico. Agora você está pronto para continuar progredindo no conhecimento da Biologia Molecular, uma área empolgante e que se torna, a cada dia, mais importante para diversas áreas das ciências biológicas. PODCAST 0:00 11:29 REFERÊNCIAS ASSOCIAÇÃO BRASIL HUNTINGTON. O que é a Doença de Huntington. In: ABH. Consultado em meio eletrônico em: 18 out. 2020. CABELLO, G. M. K. Genética Clínica: Métodos de diagnóstico. In: DBBM FIOCRUZ. Consultado em meio eletrônico em: 18 out. 2020. DOLINSKY, L. C.; PEREIRA, L. M. C. V. DNA forense: Artigo de revisão. In: Saúde & Ambiente em Revista, 2(2), p11-22, 2007. NELSON, D. L. Princípios de bioquímica de Lehninger. Porto Alegre: Artmed, 2014. NEW ENGLAND BIOLABS’ FEATURE ARTICLES. Polymerase Fidelity: What is it, and what does it mean for your PCR? In: NEB. Consultado em meio eletrônico em: 18 out. 2020. REAL-TIME PCR BASICS. TaqMan vs. SYBR Chemistry for Real-Time PCR. In: ThermoFisher Scientific website. Consultado em meio eletrônico em: 18 out. 2020. VANDESOMPELE, J. Q. PCR Guide por Eurogentec – plataforma GenEx. In: Gene Quantification. Consultado em meio eletrônico em: 18 out. 2020. ZHAO, M.; et al. Improved high sensitivity screen for Huntington disease using a one-step tripletprimed PCR and melting curve assay. In: PLoS ONE. Consultado em meio eletrônico em: 18 out. 2020. EXPLORE+ Para aprofundar os seus conhecimentos no assunto deste tema: Acesse o conteúdo de Biologia (DNA como o material genético: Replicação do DNA) no portal da Khan Academy para maiores detalhes e vídeos sobre replicação do DNA. Assista ao vídeo “4. Teste de Paternidade”, no canal do Youtube de Carlos Simeão, material produzido pela USP-UNIVEST. Você aprenderá mais sobre a variabilidade genética estudada em análises forenses e em testes de paternidade. Assista ao vídeo “Técnicas de Biologia Molecular – PCR- Animação 3D”, no canal do Youtube de Carlos Simeão, material produzido pela USP-UNIVEST. Você irá conhecer o passo a passo da técnica de PCR. Aprendemos a tão famosa técnica de PCR, para conhecer mais sobre a história do PCR leia o texto O desenvolvimento da reação em cadeia pela polimerase (PCR). Conhecemos algumas técnicas de PCR, para apreender um pouco mais sobre esse assunto leia Outras aplicações da PCR e as suas variações. CONTEUDISTA Camila Freze Baez Currículo Lattes Ao clicar nesse botão, uma nova aba se abrirá com o material preparado para impressão. Nela, acesse o menu do seu navegador e clique em imprimir ou se preferir, utilize o atalho Ctrl + P. Nessa nova janela, na opção destino, direcione o arquivo para sua impressora ou escolha a opção: Salvar como PDF. Farmacogenética MÓDULO 0 MÓDULO 1 CONCLUSÃO DESCRIÇÃO Apresentação da farmacogenética como a ciência das respostas distintas a fármacos e suas implicações e aplicações clínicas. PROPÓSITO Conhecer as bases da genética aplicadas à farmacologia e reconhecer o impacto de sua aplicação em distúrbios genéticos da cinética e na ação dos fármacos, como bagagem fundamental para os profissionais atuantes, direta ou indiretamente, na elaboração de novos fármacos e nos estudos de aplicações da medicina moderna e personalizada. OBJETIVOS Módulo 1 Identificar os principais eventos genéticos e as implicações éticas da farmacogenética Módulo 2 Reconhecer as principais relações genes-fármacos em farmacogenética INTRODUÇÃO A humanidade é composta por bilhões de indivíduos, cada um de nós diferente dos demais. Nossas características culturais, sociais, afetivas e físicas nos dão a ideia de indivíduos e, ao mesmo tempo, de coletividade. Uma das principais fontes das diferenças entre nós está profundamente conectada ao nosso organismo: a informação genética. Literalmente, cada pessoa se difere da outra em nível genético, com a exceção de gêmeos idênticos (sendo talvez a única). Sociedades e culturas sempre se desenvolveram por meio das trocas comerciais e genéticas, o que causou nossa variabilidade genética e permitiu nossa evolução. Cada indivíduo possui, dessa forma, uma miríade de genes que podem ser muito semelhantes ou distintos do seu vizinho, e isso pode afetar diretamente como a saúde de cada um funciona e nossas respostas a diferentes medicamentos. A seguir, exploraremos como o ramo que estuda a relação entre a genética e a farmacologia surgiu, suas ideias e técnicas principais, e suas aplicações clínicas e científicas. MÓDULO 1 Identificar os principais eventos genéticos e as implicações éticas da farmacogenética HISTÓRIA DA FARMACOGENÉTICA E CONCEITOS BÁSICOS A farmacogenética é uma ciência recente que busca explicar variações na resposta a medicamentos e drogas de caráter hereditário e populacional. O entendimento de que indivíduos diferentes podem apresentar respostas variáveis ao mesmo medicamento, por outro lado, não é novo. Remonta à Grécia Antiga e seus filósofos, precursores de muitos conceitos-chave que temos hoje na filosofia e medicina ocidentais. Saiba mais Na época, já se reconhecia que a ingestão de determinados alimentos, como o feijão-fava, poderia causar o adoecimento e ser potencialmente fatal para algumas pessoas, enquanto para outras não apresentava qualquer problema após a ingestão. Por milênios, a exata causa de certas pessoas reagirem diferentemente a determinados compostos químicos permaneceu oculta. Foi apenas no início do século passado que começamos a desvendar a explicação para tal fenômeno, com a redescoberta dos trabalhos de Gregor Mendel (século XIX) sobre a herança genética. Gregor Mendel. Mendel observou que fatores hereditários eram transmitidos às gerações futuras por meio dos gametas (células reprodutivas maduras) e postulou três leis principais: Clique nas barras para ver as informações. LEI DA DOMINÂNCIA Explica o porquê de certa característica física predominar sobre outra, após cruzamento de dois indivíduos com características discordantes ou após cruzamento de indivíduos com característica dominante, porém híbridos geneticamente (também chamados de heterozigotos). A característica que se manifesta mais frequentemente é chamada de dominante, e a que se manifesta menos frequentemente é chamada de recessiva. LEI DA SEGREGAÇÃO Definida pela existência de pares de informações hereditárias (ou alelos) para cada característica, que são separadas durante a produção de gametas, de forma que cada gameta apresente apenas uma cópia de informação para cada característica. LEI DA SEGREGAÇÃO INDEPENDENTE Explica que cada par de alelos é segregado de forma independente de outros alelos, tornando os fenótipos independentes. Herança Mendeliana. Seus achados foram tão fundamentais para o campo, que Mendel é considerado o pai da genética. Após a redescoberta dos trabalhos de Mendel, no início do século XX, foram criados os termos: Clique nas informaçõesa seguir. Gene Genótipo Fenótipo Genética Posteriormente, características hereditárias mais complexas, como a existência de níveis de dominância e penetração, fenótipos determinados por múltiplos alelos, além da existência de regulações genéticas em diversos níveis, entre muitos outros tópicos de estudo, enriqueceram nossa compreensão da genética. Por outro lado, a ideia de que fármacos e outros compostos químicos têm efeitos distintos entre indivíduos de acordo com sua herança genética começou a ser formulada. Em 1931, o médico britânico Archibald Garrod postulou a “química individual”, conceito sobre o qual escreveu em seu livro Os Erros Inatos do Metabolismo (The Inborn Errors of Metabolism, em tradução livre). Em sua obra, ele elabora a ideia de que todas as doenças são fruto de erros em alguma etapa dos processos químicos do corpo, hipótese derivada de seus estudos de hereditariedade dos processos bioquímicos. Essa seria a explicação para a observação de que “uma dose que é inócua para a maioria das pessoas, pode apresentar efeitos tóxicos em alguns indivíduos, enquanto outros demonstram tolerância excepcional à mesma droga’”. Após a publicação do livro de Garrod, outros dados começaram a dar forma e vislumbrar como a genética está ligada às doenças e às diferentes reações a drogas. Larry Snyder foi um dos primeiros a associar uma reação adversa a um composto orgânico com uma condição genética: algumas pessoas apresentavam inabilidade de sentir o gosto amargo de feniltiocarbamida (phenylthiocarbamide — PTC) em padrão autossômico recessivo. Em 1937, foi descrita a indução farmacológica de porfiria (uma doença de manifestação cutânea), que hoje sabemos que pode ser induzida por vários medicamentos. Durante a Segunda Guerra Mundial, foi visto que a primaquina, um antimalárico, era capaz de induzir doença hemolítica de soldados americanos afrodescendentes. Anos depois, a hemólise desencadeada pela primaquina foi elucidada como uma alteração metabólica das hemácias devido à deficiência de uma enzima (glicose-6-fosfato desidrogenase — G6FD) que protege as hemácias contra danos oxidativos e destruição prematura. A farmacogenética começou a se tornar uma ciência independente e a ganhar foco na década de 1950, quando várias observações sobre a interação entre drogas e alterações genéticas foram feitas. Exemplo Por exemplo, em 1953, cientistas observaram que a isoniazida, um antibiótico usado no tratamento da tuberculose, poderia sofrer metabolização por acetilação (e inativação) de forma mais rápida ou lenta em diferentes pacientes, alterando a efetividade da terapia. Muitos outros relatos de reações distintas a fármacos foram feitos, de diferentes velocidades de metabolização a reações fatais a anestésicos. Na mesma época, houve uma revolução no conhecimento da genética, com as descobertas de que a hereditariedade dos organismos está contida no DNA (ácido desoxirribonucleico), sua estrutura e como a informação nele contida (genótipo) se converte — ou se traduz — em uma função ou estrutura responsável pelo fenótipo. Fita de DNA em frasco de medicamento. No final da década de 1950, o médico russo Arno Motulsky refinou o conceito de que fatores genéticos que controlam as enzimas estariam por trás da variabilidade de respostas aos fármacos. Seu trabalho em genética humana e médica levou à sua indicação pelo Conselho sobre Drogas da Associação Médica Americana para resumir os dados da época sobre genética e fármacos. Ele foi o primeiro a formular o entendimento de que variações genéticas devem levar à seleção de drogas de acordo com as necessidades pessoais, conceito base para o desenvolvimento da medicina personalizada (MP). O termo farmacogenética foi cunhado por ele e por Friedrich Vogel, com quem escreveu o livro Genética Humana: Problemas e Abordagens (Human Genetics: Problems and Approaches). Um dos marcos históricos foi a identificação de alterações no metabolismo da debrisoquina (um anti-hipertensivo) e da esparteína (um “cardiotônico” e antiarrítmico), a característica genética associada a essas alterações e, principalmente, do gene que a causava: o da enzima citocromo P450 família 2 (cytochrome P450, ou CYP), subfamília D, polipeptídeo 6 (ou apenas CYP2D6), entre a década de 1970 e 1980. Posteriormente, ficaria provado que o CYP2D6 estaria envolvido no metabolismo de mais de 60 fármacos. Outro grande marco foi atingido nessa época, com os estudos populacionais. Pesquisadores demonstraram que uma parte de indivíduos pertencentes a determinado grupo étnico poderia ter maior ou menor sensibilidade, diferentes taxas de metabolização e distintas reações a fármacos. Tomando como exemplo o estudo que viu doença hemolítica em afro-americanos após uso de antimalárico, outros estudos surgiram mostrando que populações do leste asiático apresentam metabolismo alterado de barbitúricos, e que populações de origens africanas e chinesas diferem das de origem europeia na velocidade de metabolização de debrisoquina, dentre muitos outros. Como podemos ver, as primeiras relações entre fármacos e genética foram determinadas principalmente por meio da variabilidade de parâmetros farmacocinéticos. Os pesquisadores olhavam respostas distintas à determinada droga e avaliavam as velocidades de absorção, eliminação e as concentrações plasmáticas do fármaco ativo de pessoas com respostas “normais”, em comparação com aquelas que apresentavam resposta clínica alterada. Em seguida, os cientistas relacionavam a observação farmacocinética com uma alteração metabólica determinada geneticamente que alterasse esses parâmetros. Já no final da década de 1980, pesquisadores identificaram que variações genéticas em proteínas-alvo de determinados fármacos poderiam reduzir sua eficácia, sem, contudo, alterar parâmetros farmacocinéticos. Um dos primeiros relatos de alterações genéticas afetando a farmacodinâmica (ou seja, o mecanismo de ação de um determinado fármaco) surgiu com a observação de que determinados indivíduos apresentavam resistência hereditária a certos anticoagulantes, especialmente à varfarina. No entanto, foi apenas no século XXI que o gene em si foi identificado. Outros medicamentos que possuem efeitos adversos promovidos por alteração genética na farmacodinâmica incluem anti-hipertensivos, anticoagulantes, antidepressivos e muitos outros. Assim, considerando os mecanismos farmacocinéticos e farmacodinâmicos de variação genética afetando a resposta aos fármacos, podemos classificar o uso da farmacogenética em três categorias: Predição da dosagem de fármacos de forma individual, baseada nas características metabólicas de cada pessoa. Predição de ausência completa de resposta ao medicamento. Predição de risco de toxicidade caso o fármaco seja usado. Com o passar das décadas, mais e mais evidências comprovavam que as diferentes respostas a medicamentos seriam decorrentes não só de alterações genéticas pontuais, mas sim de múltiplos fatores genéticos que interagem entre si, além de fatores ambientais como a nutrição e idade. Em 2002, foi criado um projeto ambicioso para catalogar as variações genéticas mais comuns. O chamado HapMap foi concluído em 2009 e gerou um banco de dados extenso, gratuito e de acesso livre para cientistas do mundo inteiro. Apesar de seu principal objetivo ter sido a identificação de variantes genéticas envolvidas em doenças humanas, o HapMap também é útil na predição da resposta farmacogenética. O HapMap, somado aos estudos de genômica que têm sido desenvolvidos desde o início do século XXI, permitiu que a farmacogenética ganhasse contorno mais holístico (global) com o desenvolvimento da farmacogenômica. E qual é a diferença entre farmacogenética e farmacogenômica? Por vezes, os termos farmacogenética e farmacogenômica são usados de forma intercambiável. Farmacogenética Remete a como um gene específico influencia a resposta a um fármaco.Farmacogenômica Enquanto a farmacogenômica explora como um conjunto de genes pode influenciar a resposta a um ou vários fármacos da mesma classe. A farmacogenômica trouxe novos níveis de compreensão de como fármacos e drogas interagem com organismos vivos complexos. As interações entre variantes genéticas e fatores externos têm sido objeto de estudos em um campo novo e particularmente promissor da Medicina, a chamada medicina personalizada. Mas, para entendermos com profundidade como fatores hereditários influenciam na resposta aos fármacos, precisamos primeiro conhecer alguns princípios básicos da genética molecular. DESCOBRINDO E ENTENDENDO A FARMACOGENÔMICA A especialista Camila Baez abordará o histórico da farmacogenômica, sua importância e aplicações e as perspectivas futuras. CONCEITOS EM GENÉTICA MOLECULAR Como sabemos, os seres vivos apresentam padrões de hereditariedade. Existem características físicas (e metabólicas) que são passadas de geração em geração. Para entendermos a existência de variações genéticas em nível molecular que afetam a farmacocinética e a farmacodinâmica, precisamos revisar alguns conceitos básicos de genética molecular. Apesar dos grandes avanços em genética feitos por Mendel e outros cientistas, o meio bioquímico pelo qual os fatores hereditários existiam permaneceu um mistério até meados do século XX, quando o ácido desoxirribonucleico foi identificado como o responsável pela informação genética. O que é DNA? Clique na figura abaixo. Representação da estrutura genética do DNA Os humanos possuem duas cópias da maioria dos genes presentes em cromossomos homólogos (ou seja, que apresentam estruturas genéticas e físicas muito semelhantes), e, por isso, somos chamados diploides — em contraste, nossos gametas têm apenas uma cópia de cada cromossomo e, por isso, são chamados haploides. A cópia que cada cromossomo homólogo tem de um determinado gene é chamada de alelo. Portanto, alelos são versões alternativas de sequências genéticas localizadas no mesmo lócus em cromossomos homólogos. Geralmente, um alelo contém uma versão — ou um genótipo — que predomina sobre o outro alelo, determinando, assim, o fenótipo, ou seja, é dominante sobre outro alelo, o recessivo. Ploidia e alelos. POLIMORFISMOS GENÉTICOS Um dos momentos cruciais para a variabilidade genética é a duplicação do DNA. Quando a célula está no momento certo para a multiplicação, o DNA é duplicado pela DNA polimerase em um processo conhecido por replicação e que pode ser dividido em três etapas: Representação do complexo de replicação do DNA em uma célula. Clique nas informações a seguir. Helicase Primase DNA polimerase Atenção De certa forma, a DNA polimerase lê o DNA fita simples e duplica sua informação em uma nova fita. Por vezes, no entanto, a DNA polimerase adiciona nucleotídeos errados à fita nascente de DNA, gerando o que chamamos de mutações. O que são mutações? Clique na figura abaixo. As mutações gênicas podem ser categorizadas em mutações pontuais por substituição de bases (com ou sem alteração na sequência de proteínas), inserções e deleções de pequenos trechos do genoma. Ainda, as mutações podem acontecer tanto em células somáticas quanto em células germinativas (ou gametas). Exemplos de tipos de mutações. Algumas mutações são prejudiciais às células e estão associadas a doenças genéticas que, de forma geral, são raras. Por outro lado, as demais mutações podem permanecer na composição genética das populações, alterando a sequência de DNA original de alelos, e constituindo uma variante. Conforme um alelo variante é passado através das gerações e sua proporção na população aumenta, passamos a ter o chamado polimorfismo genético. Por outro lado, chamamos de “alelo selvagem” ou “comum” o alelo polimórfico que corresponde à maioria populacional, e que normalmente não está envolvido com nenhum fenótipo farmacogenético. ATIVIDADE DE REFLEXÃO DISCURSIVA Como ocorre o polimorfismo genético? RESPOSTA A vasta maioria dos polimorfismos é do tipo mutações gênicas pontuais sinônimas (ou silenciosas, que não trocam aminoácidos nas proteínas) ou não sinônimas (que resultam na alteração da sequência da proteína), ambas conhecidas como SNPs (single nucleotide polymorphisms — polimorfismos de nucleotídeos simples). Atualmente, mais de 14 milhões de SNPs são conhecidos, o que representa mais de 0,3% de bases trocadas de um total de 3 bilhões de pares de base presentes no genoma humano. No entanto, a maior parte dessas mutações não têm efeito conhecido. Em farmacogenética, estamos particularmente interessados em polimorfismos que alterem a sequência de aminoácidos de proteínas, o que pode resultar em alterações na interação com fármacos, porém há exemplos de SNPs que não alteram a proteína e influenciam na resposta das proteínas. SNP não-sinônimos. Ainda assim, mutações em regiões não codificadoras, como promotores e íntrons (regiões não codificadoras intercaladas no meio das regiões codificadoras de um gene — os éxons), também podem influenciar na expressão da proteína e são alvo da farmacogenética — apesar de serem consideravelmente mais raras e de interpretação mais difícil. Por serem largamente frequentes nas diversas populações humanas sem, na maioria das vezes, causar nenhum fenótipo prejudicial, os polimorfismos podem permanecer indetectáveis clinicamente até que determinada droga seja utilizada. Na maioria dos casos, no entanto, os polimorfismos não correspondem a nenhuma alteração. Pelo contrário, eles são, de certa forma, o que nos dá a beleza da diversidade genética. Junto com nossa capacidade técnica de conhecer o genoma humano em profundidade para estudarmos a farmacogenética e farmacogenômica de forma mais detalhada, vimos surgir desafios éticos importantes, como discutiremos a seguir. QUESTÕES ÉTICAS DA FARMACOGENÉTICA A descoberta dos fenômenos biológicos relacionados às interações entre o perfil genético de indivíduos a medicamentos específicos que hoje conhecemos como farmacogenética foi possível graças ao progresso científico. O surgimento de ferramentas para exploração em detalhes dos mecanismos de funcionamento das drogas (para além dos efeitos observados pelos pacientes ou usuários), a capacidade de identificar variações genéticas nas populações, e, é claro, a observação de que diferentes grupos ou indivíduos reagem de formas distintas a um mesmo medicamento ou droga foram fundamentais. Tais ferramentas têm sido continuamente melhoradas e substituídas por técnicas ainda mais eficazes na identificação dos eventos genéticos que possam contribuir para um efeito farmacológico adverso. A contínua evolução científica, logicamente, veio com alguns ônus, especialmente trazendo à tona questões éticas relevantes. Quais seriam essas questões éticas? Um dos principais pontos éticos que levam ao questionamento do uso da farmacogenética em rotina clínica é sua acessibilidade. Décadas de investimento em pesquisa e desenvolvimento de fármacos melhores para cada grupo genético representaram um custo que, em última instância, é frequentemente repassado ao paciente. O que vemos na prática é que os pacientes e familiares de maior renda conseguem acesso às terapias mais personalizadas, enquanto aqueles de menor renda não possuem qualquer amparo. Tal desigualdade é vista, inclusive, no nível das nações: países com Índice de Desenvolvimento Humano elevado apresentam muito mais oportunidades de terapia por farmacogenética do que os de IDH inferiores. De fato, os países de IDH alto também possuem número muito maior de pesquisas genéticas voltadas à farmacologia do que os demais. Isso em si induz a um viés: a maior parte das doenças investigadas pela farmacogenética são doenças prevalentes em países ricos, pouco se conhecendo sobre variações farmacogenéticas em países empobrecidos, com especial ausência de estudos em minorias étnicas.No mapa-múndi podemos observar as diferenças entre os IDH ao redor do mundo. IDH ao redor do mundo. Contudo, é entendido pela Organização Mundial da Saúde que o acesso à saúde e sua promoção sejam universais. Esse assunto leva a alguns questionamentos: Como podemos garantir que pessoas localizadas em países com IDH desiguais tenham o mesmo acesso a terapias personalizadas e de alta performance, como a farmacogenética e farmacogenômica prometem? Como dizer que buscamos a igualdade na medicina se nem ao menos investimos o mesmo tempo e dinheiro em investigar doenças genéticas e farmacogenéticas que acometem apenas populações empobrecidas — e, é lógico, oferecer-lhes a mesma dedicação no desenvolvimento de medicamentos eficazes? Como podemos resolver essa desigualdade tão grave, quando não conseguimos nem garantir que pacientes oriundos do mesmo país de altíssimo IDH tenham o mesmo direito e acesso à farmacogenética independentemente de sua condição financeira? Infelizmente, não há resposta clara e objetiva para solução dessas questões, uma vez que a farmacogenética em si exige uma gama de recursos altamente especializados, como exames de diagnóstico, clínicas e hospitais para aplicação e acompanhamento de terapias mais complexas, institutos de pesquisa para conhecimento das doenças e desenvolvimento de medicamentos, e pessoal médico e de saúde altamente treinados. Mesmo que consideremos aquele seleto grupo que tem acesso à farmacogenética, outras questões fundamentais surgem quando pensamos no conteúdo da informação que clínicas e institutos têm a respeito da genética de uma grande população: o que eles podem fazer com tamanha informação? Mesmo em países de alto IDH, questionamentos quanto à confidencialidade e privacidade da informação genética dos usuários e pacientes têm sido levantados. Uma das principais preocupações quanto à informação genética é a de quebra da confidencialidade e privacidade por empresas de seguro ou planos de saúde, empregadores e outras instituições e indivíduos que possam levar à discriminação contra alguém que possua uma condição genética. Exemplo Planos e seguros de saúde podem aumentar os valores de mensalidade e coparticipação de exames e terapias, ou até mesmo se recusarem a oferecer cobertura e serviços a pacientes baseados em perfis genéticos mais “dispendiosos”. Seria um futuro perturbador se não fizesse parte do passado: na década de 1970, populações afro-americanas em alguns estados dos EUA foram compelidas a fazerem triagens para doenças genéticas e posteriormente discriminadas por empregadores e seguradoras de saúde caso apresentassem doença ou fossem portadoras do gene para a doença. Foi apenas em 2008, após diretrizes internacionais terem sido estabelecidas, que o congresso americano aprovou a lei-ato de não discriminação quanto à informação genética (Genetic Information Nondiscrimination Act — GINA). O objetivo do ato é coibir os estados de requererem testagens genéticas, proibir os seguros de saúde de cometerem discriminação genética (como critério de elegibilidade para o seguro ou para determinação do preço do prêmio), e protegendo funcionários contra exigências de empregadores (como requerimento de testes genéticos) ou de usar informações genéticas em tomadas de decisão (contratações, demissões e promoções). Os esforços internacionais contra a discriminação genética, entretanto, haviam começado cerca de uma década antes da GINA ser aprovada nos EUA. Com o progresso no conhecimento da genética de diversas populações humanas obtido pelo Projeto Genoma Humano, e a produção de quantidades gigantescas de dados genéticos, discussões internacionais foram iniciadas para disposição de mecanismos que impedissem a discriminação genética. Na virada do milênio, a Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (UNESCO) aprovou a Declaração Universal sobre o Genoma Humano e os Direitos Humanos (1997), complementada pela Declaração Internacional sobre os Dados Genéticos Humanos (2004). A redução de um indivíduo à sua condição genética, seja ela considerada favorável ou desfavorável em qualquer ângulo, é eticamente reprovável e cientificamente errada. Ainda mais que, atualmente, é reconhecido que a maioria das doenças genéticas têm influência multifatorial em diferentes níveis. Resumindo Em outras palavras, a mera presença de um determinado genótipo associado a uma condição considerada hereditária nem sempre é determinante para que ela ocorra, pois outros vários fatores podem influenciar sua ocorrência. Reduzir indivíduos à sua informação genética pode não só acentuar racismo e preconceitos que precisam ser removidos das sociedades, como gerar outras marginalizações. VERIFICANDO O APRENDIZADO 1. Gregor Mendel é considerado o pai da genética, porém, apenas décadas após a publicação de seus trabalhos, desvendamos como a herança genética é codificada. Sobre variabilidade genética, é correto afirmar que: Erros da helicase ao abrir a forquilha de replicação são a principal fonte de mutações, uma vez que há incorporação de nucleotídeos fora da ordem original. Polimorfismos são alterações genéticas graves, frequentemente manifestadas como doenças genéticas e incompatibilidade com a vida. A incorporação errada de nucleotídeos pontuais pela DNA polimerase é a principal fonte de mutações e, consequentemente, de polimorfismos do tipo SNP. A incorporação errada de nucleotídeos pontuais pela primase é a principal fonte de mutações e, consequentemente, de polimorfismos do tipo SNP. Mutações são extremamente comuns no genoma humano e normalmente são benéficas à saúde humana. Responder Comentário 2. Leia o fragmento retirado do 6º Artigo da Declaração Internacional sobre os Dados Genéticos Humanos (UNESCO): “(a) Do ponto de vista ético, é imperativo que os dados genéticos humanos e os dados proteômicos humanos sejam recolhidos, tratados, utilizados e conservados com base em procedimentos transparentes e eticamente aceitáveis. (...)” Com base em nossos estudos, é considerado ético: Usar informações genéticas para cálculo do valor de seguros ou planos de saúde. Garantir a contratação de um potencial funcionário baseado em dados genômicos. Garantir que candidatos a emprego ou a seguros ou planos de saúde façam exames genéticos. Garantir que estudos e dados genéticos estejam disponíveis para as diferentes populações. Permitir a divulgação de informações genéticas individuais e coletivas, contanto que sejam negociadas financeiramente. Responder Comentário MÓDULO 2 Reconhecer as principais relações genes-fármacos em farmacogenética Com as evidências acumuladas de que polimorfismos genéticos frequentemente afetam a resposta a fármacos em diferentes populações, a farmacogenética e farmacogenômica vêm crescendo em conhecimento e atenção. Respostas inadequadas a medicamentos levaram a graves distúrbios e à morte de pacientes no passado, o que seria completamente inaceitável nos dias de hoje, com as ferramentas e o conhecimento disponíveis. Atenção Ainda assim, estimam-se milhares de mortes ao ano por reações adversas a medicamentos, potencialmente preveníveis com o uso da farmacogenética. Somado a isso, anos ou décadas de estudos no desenvolvimento farmacológico são, por vezes, desperdiçados ao não contemplarem os perfis genéticos populacionais. Múltiplos fatores têm influenciado a decisão sobre diferentes tratamentos, dentre ambientais, nutricionais, idade, gênero, e genéticos, e, se usados em conjunto, podemos maximizar a eficácia das terapias e ao mesmo tempo reduzir os riscos de reações adversas. Nesse sentido, a farmacogenética e a farmacogenômica enriquecem grandemente o processo de tomada de decisão clínica a respeito do melhor tratamento individual. Hoje, vemos começar um novo e excitante campo de intercessão entre clínica, diagnóstico genético, fatores ambientais efarmacologia: a medicina personalizada. MEDICINA PERSONALIZADA A medicina personalizada, também conhecida como medicina de precisão, baseia-se na ideia de utilizarmos a informação genética e o uso de biomarcadores como preditores para a melhor decisão terapêutica para cada paciente. Como a medicina personalizada pode ajudar? Clique na figura abaixo. Em alguns setores da medicina, essa revolução já começou. A MP já mostra impacto na medicina preventiva, com o diagnóstico de predisposições genéticas a doenças que pode auxiliar na prevenção ou no tratamento precoce de enfermidades. Além disso, a MP tem se desenvolvido simultaneamente às técnicas de diagnóstico molecular de polimorfismos mais rápidas, precisas e baratas, que permitem a determinação de fatores genéticos com a agilidade necessária, “da bancada à beira-do-leito”. Pacientes com doenças graves e com risco de morte também têm sido beneficiados com uma abordagem personalizada de seu tratamento. Em muitos casos, a ideia de usarmos um mesmo tratamento na mesma dosagem para todos, no estilo “tamanho único”, tem prejudicado o prognóstico e, em pacientes terminais, a sobrevida e a qualidade de vida após um diagnóstico sombrio. Uma das áreas que mais se desenvolveu da MP e que exemplifica bem como ela pode melhorar diversos aspectos da terapia e bem-estar do paciente é o tratamento oncológico, em que a susceptibilidade de diversos tumores a drogas começa a ser diagnosticada a partir das alterações moleculares específicas de cada paciente. A imagem a seguir ilustra como a farmacogenética pode ajudar a definir o melhor fármaco, dosagem e interações de acordo com as características genéticas da população. Tamanho único. A MP tem enfrentado dificuldades em sua universalização. ATIVIDADE DE REFLEXÃO DISCURSIVA E quais seriam os desafios da medicina personalizada? RESPOSTA Aliadas à abordagem multifatorial da MP, a farmacogenética e a farmacogenômica contribuem grandemente ao apontarem genes relevantes ao funcionamento de medicamentos. A variação na resposta a fármacos devido a polimorfismos genéticos, apesar de não ser completamente absoluta, causa perdas econômicas e sociais enormes. Aprendemos que as variações genéticas podem influenciar na dosagem, na susceptibilidade e na toxicidade de fármacos. Nesse contexto, existem diversas formas em que a genética pode induzir a respostas distintas a medicamentos, como alterações no metabolismo, no transporte, e no alvo de fármacos, que podem ser enzimas, receptores, transportadores e outras moléculas efetoras. Assim, podemos classificar o uso da farmacogenética relacionado à farmacocinética e à farmacodinâmica. FARMACOGENÉTICA E FARMACOCINÉTICA A maioria dos fármacos ingeridos passa por etapas até sua eliminação: Primeiro são absorvidos Distribuídos Metabolizados (antes ou depois de agirem em seus alvos farmacológicos) Por fim, excretados Apesar de todas as etapas serem potencialmente variáveis entre indivíduos, a metabolização é um dos processos mais complexos e mais frequentemente observado em associação com alterações farmacológicas. O metabolismo de drogas e fármacos pode ocorrer antes ou depois da ação farmacológica. Alguns medicamentos são ministrados na forma de pró- fármacos, formas inativas de medicamentos que são metabolizados em fármacos ativos por meio da bioativação. Outros medicamentos são processados de forma a perderem a atividade, aumentarem a solubilidade e serem mais facilmente excretados. Entre as principais alterações sofridas pelos fármacos durante seu metabolismo, temos a oxidação, redução, hidrólise (também conhecidas como reações de fase I), e os de conjugação (ou de fase II, como acetilação, glicuronidação, sulfatação, metilação, entre outros). A maioria dos processos de biotransformações ocorre no fígado, o grande centro metabólico do nosso organismo, embora outros órgãos também metabolizem drogas, como os rins e os pulmões. O metabolismo de fármacos pelo fígado acontece em grande parte pela superfamília de enzimas citocromo P450, ainda que outras enzimas metabólicas também sejam relevantes em farmacogenética. Para estudarmos em detalhes as aplicações das enzimas, precisamos primeiro entender como polimorfismos podem influenciar o metabolismo de fármacos e drogas. Como aprendemos, a maioria dos genes presentes no genoma humano apresentam dois alelos, um em cada cromossomo homólogo. Podemos considerar que, de acordo com o tipo e a quantidade de alelos afetados por polimorfismos, teremos diferentes fenótipos. Dessa forma, podemos classificar os fenótipos de metabolização de fármacos em 4 tipos: Clique nas informações a seguir. Metabolizadores pobres (MP) Metabolizadores intermediários (MI) Metabolizadores normais (MN) Metabolizadores rápidos (MR) Tipos de metabolizadores. Cada tipo de metabolizador terá um risco diferente: em metabolizadores mais lentos (como MP ou MI), existe um risco aumentado de efeitos adversos em decorrência do acúmulo de fármacos que, em doses padrões, não causariam dano. Os MR, por outro lado, podem não experimentar os efeitos terapêuticos da dose-padrão porque o medicamento está sendo metabolizado e excretado muito rapidamente. No caso da administração de pró-fármacos, os MR correm risco de efeitos adversos e superdosagem, por produzirem o fármaco ativo mais rápido sem, contudo, eliminá-lo rapidamente, enquanto os MP não observam os efeitos terapêuticos desejados. Por isso, a investigação farmacogenética do metabolismo de drogas e fármacos pode orientar a prescrição de dosagens adequadas para cada caso, de acordo com o perfil metabolizador. FARMACOGENÉTICA E SUPERFAMÍLIA CYP As CYP são enzimas que contêm o grupamento químico heme (que contém ferro em seu interior) presente em diversos tecidos e que catalisam a oxidação de compostos. As CYP são classificadas de acordo com as similaridades genéticas em famílias (denominadas por números) e subfamílias (denominadas por letras). Clique nas setas para ver o conteúdo. Classificação das CYP. Apesar de termos mais de 50 enzimas CYP, apenas 6 delas metabolizam cerca de 90% dos fármacos, e são importantes porque possuem diversos polimorfismos descritos, sendo o grupo de enzimas mais bem estudado quanto às aplicações em farmacogenética. Representação da CYP2D6. Uma das primeiras descrições da farmacogenética se deu com a identificação da CYP2D6 como responsável pela divergência no metabolismo da debrisoquina e esparteína. Hoje, conhecemos mais de 80 alelos polimórficos diferentes para CYP2D6, com fenótipos que variam de MP a MR. Os polimorfismos em CYP2D6 afetam o metabolismo de mais de 60 medicamentos, e perfis MP podem ser identificados geneticamente com quase 100% de precisão. Dentre as diversas drogas metabolizadas por CYP2D6, a metabolização ultrarrápida da codeína aumenta em até 30 vezes a quantidade de morfina. O relato do falecimento de um bebê após superdosagem por morfina ingerida por meio do leite de sua mãe metabolizadora ultrarrápida mostra quão grave perfis MR podem ser. Outras drogas metabolizadas por CYP2D6 incluem anti-hipertensivos como o metoprolol, antidepressivos tricíclicos e inibidores seletivos da recaptação da serotonina, e medicamentos contra o câncer. Representação da CYP3A4. Uma das enzimas CYP mais abundantes no fígado, a CYP3A4 é responsável pelo metabolismo de mais de 50% dos medicamentos usados atualmente. Cerca de 20 alelos polimórficos foram identificados para CYP3A4, a maioria deles relacionados à redução da atividade enzimática e mais frequentes em caucasianos do que em asiáticos e africanos. CYP3A5, por outro lado, é extremamente variável. Os fenótipos dos polimorfismos de CYP3A4 e CYP3A5 são mais extensos quando há combinação de alelos variantes das duas enzimas. Isso é devido ao fato de ambas metabolizarem alguns dos mesmos substratos, o que faz com que sejam frequentemente referidas como CYP3A4/5.Portanto, apesar de muitas classes de fármacos serem metabolizados por essas enzimas, os fenótipos de polimorfismos isolados não estão claros em muitos casos, o que reflete a importância da farmacogenômica na integração gênica das diferentes combinações de polimorfismos. Outras enzimas da superfamília CYP com importantes aplicações farmacogenéticas incluem a CYP2C9 e a CYP2C19. Clique nas barras para ver as informações. CYP2C9 Possui mais de 60 alelos polimórficos, alguns deles mais frequentes em populações europeias, enquanto outros são mais comuns em populações de origem africana. A CYP2C9 corresponde a cerca de 20% das enzimas citocromo hepáticas e metaboliza aproximadamente 10% dos fármacos comercializados, dentre os quais se destacam os anti-inflamatórios não esteroidais, antidiabéticos, antiepiléticos e anticoagulantes. Um dos anticoagulantes metabolizados pela CYP2C9, a varfarina, possui janela terapêutica estreita. Isso traz risco de hemorragias graves e potencialmente fatais em função das diferenças na velocidade de metabolismo da varfarina pela CYP2C9. Portanto, o diagnóstico farmacogenético é fundamental no uso desse anticoagulante. CYP2C19 A enzima CYP2C19, por outro lado, não possui tantos alelos polimórficos, nem afeta o metabolismo de tantas drogas quanto a CYP2D6 e CYP2C9. No entanto, polimorfismos nessa enzima, que reduzem sua atividade, afetam o metabolismo de inibidores da bomba de prótons, usados no tratamento de úlceras pépticas e distúrbios gástricos. Além disso, polimorfismos em CYP2C19 afetam a bioativação de um antiplaquetário, Clopidogrel, em sua forma ativa. Outros fármacos que podem ter seu metabolismo alterado por variações em CYP2C19 incluem medicamentos neurotrópicos, antifúngicos e anticâncer. Enzimas CYP e suas funções no corpo humano FARMACOGENÉTICA E ENZIMAS DE FASE II Vimos duas das primeiras enzimas descritas como responsáveis pela alteração da resposta a fármacos: a deficiência da glicose-6-fosfato desidrogenase ligada à hemólise após administração de primaquina e a velocidade de metabolização da isoniazida por acetilação. Hoje, sabemos que a primaquina é metabolizada pelas enzimas CYP e resulta em um metabólito tóxico que provoca estresse oxidativo e, em pacientes com deficiência funcional da G6FD, as hemácias estão mais vulneráveis à lise por estresse oxidativo. A velocidade de metabolização da isoniazida, por outro lado, é determinada por enzimas chamadas de N- acetiltransferases (NATs). Pacientes com alelos polimórficos da enzima NAT2 podem ser classificados em acetiladores rápidos (AR) ou lentos (AL). Pelo menos três polimorfismos por SNP estão associadas a AL, que são muito mais frequentes na população árabe do que na caucasiana e asiática. Complicações decorrentes das altas concentrações plasmáticas de isoniazida e outros medicamentos acetilados como a hidralazina (vasodilatador e anti-hipertensivo) e a procainamida (um antiarrítmico) em AL incluem síndromes autoimunes induzidas por medicamentos, hepatotoxicidade e neuropatia. Outro grupo de enzimas envolvido no metabolismo e eliminação de drogas e que foram mais bem estudadas do ponto de vista farmacogenético são as metiltransferases. Dentre elas, a tiopurina metiltransferase (TPMT) possui polimorfismos que alteram sua capacidade de metilar tiopurinas, uma classe de nucleotídeos modificados com função pró-fármaco. Estrutura química de fármacos tiopurinas. Quando bioativadas, as tiopurinas são convertidas em compostos tóxicos e, por isso, são usadas na supressão de células imunológicas em leucemias, linfomas e terapias imunossupressoras em transplante e doenças autoimunes. Existem apenas 3 alelos principais associados a mais de 90% dos metabolizadores pobres (MP) da TPMT, que ocorrem em menos de 1% da população caucasiana. MPs podem sofrer de toxicidade à medula óssea (toxicidade hematopoiética) por acúmulo de tiopurinas, reduzindo o número total de células sanguíneas, tanto hemácias quanto leucócitos. O paciente sofre de cansaço extremo, falta de ar, e risco aumentado a infecções que podem levá-lo rapidamente ao óbito. Atenção Por isso, a recomendação é que pacientes com distúrbios imunológicos que necessitem de tiopurinas sejam testados geneticamente e, caso tenham fenótipo MP para TPMT, tomem apenas uma fração da dose padrão do fármaco. FARMACOGENÉTICA E TRANSPORTADORES As variações genéticas envolvidas na farmacocinética não se restringem a polimorfismos em enzimas. Os processos de absorção e eliminação de substâncias afetam diretamente sua concentração, aumentando ou diminuindo- a. As principais proteínas envolvidas nesse processo são as transportadoras, presentes em grande número nos epitélios intestinais, endoteliais e renais, e nas células hepáticas. Essas proteínas presentes nas membranas plasmáticas medeiam o transporte de solutos através das membranas biológicas e são grandes reguladoras da homeostase celular, tecidual e do organismo. Entre as principais famílias de transportadores, está a dos transportadores de efluxo ABC (adenosine-triphosphate binding cassete (ABC), um dos responsáveis pelo fenótipo de resistência a múltiplas drogas — multiple drugs resistence (ou MDR)). Transportadores de efluxo ABC. O gene ABCB1 é um dos mais polimórficos dentre os transportadores, com mais de 50 SNPs e ao menos 3 eventos de inserção ou deleção descritos. Polimorfismos em ABCB1 que reduzam sua capacidade transportadora de efluxo (ou seja, de saída das células) podem causar aumento da concentração plasmática de digoxina (um digitálico e glicosídeo cardiotônico usado no tratamento de insuficiência cardíaca) por redução da eliminação renal. O uso desse digitálico com janela terapêutica muito estreita, aliado a polimorfismos em ABCB1, está associado a risco aumentado de morte súbita por doença cardíaca durante tratamento com digoxina. Outros medicamentos com eliminação reduzida incluem inibidores da protease viral (usados na terapia antirretroviral contra o vírus da imunodeficiência humana (HIV)), e estatinas (usadas no controle da hipercolesterolemia). Por outro lado, variações genéticas em ABCC1/2 têm sido associadas com alteração da excreção biliar de estatinas e quimioterápicos de diferentes ações (como tamoxifeno — um análogo de estrogênio usado na terapia do câncer de mama; e metotrexato, um antifolato usado na quimioterapia de leucemia). Os transportadores conhecidos como SLC (solute carriers, ou carreadores de soluto, em português) compreendem mais de 300 transportadores de membrana que movimentam íons que não podem passar pela membrana livremente por serem hidrossolúveis. Envolvidos na entrada de moléculas nas células (influxo), os alelos polimórficos de SLCs têm sido associados à redução da entrada de fármacos nos hepatócitos, gerando acúmulo plasmático. Um exemplo de medicamento afetado por variações genéticas em SLCs é o acúmulo de pravastatina plasmática, com redução de sua função farmacológica, que ocorre nos hepatócitos. Representação ilustrando exemplos de carreadores de solutos SLC. FARMACOGENÉTICA E FARMACODINÂMICA O estudo da farmacodinâmica se propõe a explorar os mecanismos de ação moleculares, bioquímicos e fisiológicos de drogas nas células e no organismo. Os fármacos podem ter diversos alvos terapêuticos, sendo mais frequentes as proteínas que atuam como receptores celulares de membrana, enzimas e canais iônicos. Variações genéticas que resultem na alteração dessas proteínas, ou até mesmo em outras proteínas que interagem com elas, podem levar a alterações farmacológicas. Portanto, as diferenças na farmacodinâmica também são objeto de estudo da farmacogenética. Farmacogenética e polimorfismos de receptores e transportadores Os receptores de membrana plasmática correspondem a cerca de 50% dos alvos farmacológicos. Presentes na superfície das células e expressos de forma específica para cada tecido e tipo celular, os receptoressão a interface de contato entre o meio extracelular e o interior da célula. Quando interagem com seus ligantes, os receptores promovem respostas intracelulares específicas, conhecidas como transdução de sinais. Receptores podem alterar muitos aspectos do metabolismo celular, incluindo a vida ou a morte da célula. Portanto, têm sido amplamente usados como alvos farmacológicos para modulação da resposta celular, seja para amplificação, redução, ativação, inativação ou diferenciação. Para entendermos melhor os efeitos dos polimorfismos em receptores, precisamos observar seu funcionamento. Representação do funcionamento de receptores de membrana plasmática. Um dos receptores mais estudados quanto à variabilidade genotípica são os adrenorreceptores do tipo β (ou receptores β-adrenérgicos), responsivos às catecolaminas (adrenalina e noradrenalina) quando a resposta simpática de “luta-ou-fuga” é desencadeada. A ação dos adrenorreceptores β envolve diversos tecidos e atua no aumento da frequência cardíaca, aumento da força de contração cardíaca e relaxamento de musculatura lisa (vascular e respiratória), com o intuito de aumentar a velocidade e força da resposta muscular esquelética (seja para luta, seja para fuga). A principal categoria de fármacos que agem em receptores β são antagonistas, os chamados β-bloqueadores, que são usados no tratamento de doenças cardiovasculares e respiratórias como hipertensão, insuficiência cardíaca e asma. Exemplo Metoprolol, atenolol e carvedilol, são exemplo comuns de fármacos β- bloqueadores. O gene do receptor adrenérgico β1 (ADRB1) possui polimorfismos que afetam a ação farmacológica dos β-bloqueadores. Dois polimorfismos SNP são frequentemente vistos em conjunto formando um haplótipo (S49-R389) em ADBR1: um localizado na porção extracelular do receptor, e outro na porção intracelular. O haplótipo produz maior resposta a agonistas que o alelo selvagem, o que leva a um risco de morte três vezes maior em pacientes portadores de doenças cardíacas. Esses dois SNP de ADBR1 também apresentam maior resposta a β-bloqueadores, e têm sido associados a menor risco de morte em portadores do haplótipo com doenças cardíacas ― ou seja, os β-bloqueadores promovem um efeito protetivo contra o haplótipo. Outro grande ramo da farmacogenética compreende medicamentos psiquiátricos, e, em especial, os receptores de serotonina. A serotonina, também conhecida como 5-HT (sigla em inglês para 5-hidroxitriptamina), é um neurotransmissor envolvido em diversos processos cognitivos, como na regulação do humor e emoções. Processos que envolvam a inibição da serotonina têm sido associados a quadros como a depressão, ansiedade, e outros transtornos relacionados. Por isso, existem medicamentos antidepressivos cujo objetivo é evitar que a serotonina seja recapturada, de forma que ela permaneça na sinapse, local entre os neurônios em que ela exerce seus efeitos; outros fármacos funcionarão como antagonistas ou agonistas seletivos, dependendo do receptor de serotonina em questão. Uma das classes de fármacos importantes do ponto de vista farmacogenético são os inibidores seletivos de recaptação da serotonina (ISRS): em certas situações, para que a concentração sináptica da serotonina seja mantida elevada, bloqueamos a recaptura da serotonina no neurônio pré-sináptico, permitindo que ela aja no neurônio pós-sináptico. No entanto, o principal transportador de serotonina (da sigla em inglês, SERT) é codificado pelo gene polimórfico SLC6A4. Uma inserção-deleção polimórfica no promotor desse gene, conhecida como 5-HTTLPR-L, tem maior resposta a ISRS, já que sua expressão é duas vezes maior do que a outra variante (5-HTTLPR-S). Farmacogenética e variações em enzimas-alvo Já estudamos como polimorfismos em enzimas podem alterar a forma e a velocidade de metabolização de fármacos. No entanto, as enzimas também são alvos farmacológicos, sendo seu antagonismo (ou bloqueio) o principal mecanismo farmacológico. Conheça dois exemplos de enzimas que podem ter sua susceptibilidade a drogas alterada devido a polimorfismos: Clique nas informações a seguir. Exemplo 1 Exemplo 2 É interessante notarmos que, mesmo sendo raro, mutações em regiões não codificadoras também podem influenciar a expressão de genes, a farmacodinâmica e a farmacogenética. Além disso, a varfarina se torna um excelente exemplo de como a farmacogenômica é fundamental na predição de doses, pois combina alterações genéticas importantes tanto no metabolismo quanto no alvo terapêutico. FARMACOGENÉTICA NA ONCOLOGIA A especialista Camila Baez falará sobre a importância da farmacogenética na terapia oncológica. VERIFICANDO O APRENDIZADO 1. Um dos objetivos em se estudar interações entre genes e respostas a fármacos é para tentar personalizar a abordagem terapêutica de acordo com a necessidade. Sobre a farmacogenética, é incorreto afirmar que: Visa identificar polimorfismos que alterem a capacidade de metabolização de fármacos. A variação na concentração de enzimas pode afetar a biodisponibilidade de fármacos. Os principais polimorfismos observados são os SNP (polimorfismos de nucleotídeos simples). A velocidade de eliminação de fármacos é irrelevante para a farmacogenética. Polimorfismos em proteínas-alvo farmacológicos são um dos mecanismos estudados pela farmacogenética. Responder Comentário 2. Polimorfismos em diferentes genes podem ter efeitos distintos no metabolismo e resposta de fármacos. Baseado nisso, assinale a afirmação correta: As enzimas CYP são um dos principais alvos farmacológicos que podem ter respostas alteradas devido a SNPs. A acetilação e metilação são etapas da eliminação de compostos que podem sofrer alterações devido a polimorfismos. Os transportadores são alvos farmacológicos normalmente afetados por polimorfismos. Os polimorfismos em enzimas só são relevantes caso alterem a capacidade de metabolização e eliminação de fármacos. A farmacogenética da varfarina se restringe a alterações no nível de algesia do paciente, sem relação com gravidade. Responder Comentário CONCLUSÃO CONSIDERAÇÕES FINAIS A farmacogenética surgiu com a observação de que indivíduos têm reações distintas a compostos químicos, como drogas e medicamentos. Após décadas de estudo e o desenvolvimento de técnicas de biologia molecular eficazes, descobrimos que a variabilidade genética entre indivíduos e populações afeta como cada organismo absorve, metaboliza e excreta fármacos. A ação dos fármacos em cada organismo também pode variar de acordo a genética. Do conhecimento acumulado sobre as interações entre polimorfismos e respostas distintas a drogas emerge uma prática mais personalizada da medicina e a prevenção de reações adversas graves e até fatais. PODCAST Agora, a especialista Camila Freze Baez encerra o tema falando um pouco mais sobre a prática da farmacogenética. 0:00 14:15 REFERÊNCIAS ALTMAN, R.; FLOCKHART, D.; GOLDSTEIN, D. Principles of Pharmacogenetics and Pharmacogenomics. Cambridge: Cambridge University Press, 2012. DNA FROM THE BEGINNING. Concept 13: Mendelian laws apply to human beings. Consultado na Internet em: 5 abr. 2021. EL SHAMIEH, S.; ZGHEIB, N.K. Pharmacogenetics in developing countries and low resource environments. Hum Genetics. Publicado em: 9 fev. 2021. Consultado na Internet em: 15 jun. 2021. GONG, L. et al. The Role of Pharmacogenetics in Precision Medicine. Pharmacy Times, n. 7. vol. 82, jul. 2016. HEDIGER, M. A.; CLEMENÇON, B.; BURRIER, R. E.; BRUFORD, E. A. The ABCs of membrane transporters in health and disease (SLC series): introduction. Mol Aspects Med. abr. – jun. 2013. IRIART. Medicina de precisão/medicina personalizada: análise crítica dos movimentos de transformação da biomedicina no início do século XXI. Cad. Saúde Pública, 2019; 35(3):e00153118. JARVIK, G. P. Arno G. Motulsky, MD (1923–2018): Holocaust survivorwho cofounded the field of medical genetics. Genet Med. 20, 477–479 (2018). KALOW, W. Pharmacogenetics and pharmacogenomics: origin, status, and the hope for personalized medicine. Pharmacogenomics J., 6, 162–165 (2006). KHOURY M. J. et al. A population approach to precision medicine. Am. J. Prev. Med. 2012;42(6):639-645. doi:10.1016/j.amepre.2012.02.012. LAM, Y. W. F. Principles of Pharmacogenomics: Pharmacokinetic, Pharmacodynamic, and Clinical Implications. In: Pharmacogenomics. 2. ed. (s.l): Academic Press, 2019. LIN, L. et al. SLC transporters as therapeutic targets: emerging opportunities. Nat. Rev. Drug. Discov., n. 14. 2015. LUNDSTROM, K. An overview on GPCRs and drug discovery: structure- based drug design and structural biology on GPCRs. G Protein-Coupled Receptors in Drug Discovery. Methods in Molecular Biology, 552, 51–66, 2009. MEDLINE PLUS WEBSITE. What is the International HapMap Project. Consultado na Internet em: 7 abr. 2021. MEDLINE PLUS WEBSITE. Thiopurine S-methyltransferase deficiency. Consultado na Internet em: 10 abr. 2021. MORAIS, L. S. et al. Perspectivas internacionais e nacionais sobre a privacidade do uso e acesso de Informações Genéticas. In: XI Semana de Extensão, Pesquisa e Pós-Graduação ‒ SEPesq Centro Universitário Ritter dos Reis, 2015. NATIONAL HUMAN GENOME RESEARCH INSTITUTE. Genetic Discrimination . Consultado na Internet em: 9 abr. 2021. NATIONAL INSTITUTES OF HEALTH (US). Understanding Human Genetic Variation. National Institutes of Health (US), 2007. Consultado na Internet em: 15 jun. 2021. NIEMEIJER, M. N. et al. ABCB1 gene variants, digoxin and risk of sudden cardiac death in a general population. Heart, n. 101, dez. 2015. NUSSBAUM, R. L. et al. Thompson & Thompson – Genética Médica. 7. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2008. OWEN R. P. et al. VKORC1 pharmacogenomics summary. Pharmacogenet. Genomics, out. 2010. PALLASCH, T. J. Principles of pharmacotherapy: VI. Pharmacogenetics. Anesth. Prog. 1989;36(6):249-251. POLYMORPHISM. In: Britannica, 2021. Consultado na Internet em: 15 jun. 2021. SCITABLE – NATURE EDUCATION. Cells Can Replicate Their DNA Precisely. Consultado na Internet em: 6 abr. 2021. US FOOD & DRUG ASSOCIATION. Personalized medicine: a biological approach to patient treatment. Consultado na Internet em: 10 abr. 2021. VOGENBERG F. R. et al. Personalized medicine part 1: evolution and development into theranostics. P&T. 2010;35(10):560-576. Consultado na Internet em: 15 jun. 2021. EXPLORE+ Para saber mais sobre os assuntos tratados neste conteúdo, leia: Sobre ética e a farmacogenética, “Declaração Internacional sobre os Dados Genéticos Humanos”, da UNESCO. Sobre a medicina personalizada, farmacogenética e farmacogenômica: “Farmacogenética e a Medicina Personalizada”, de Miguel Brito, na revista Saúde & Tecnologia. “Farmacogenética e farmacogenômica: evidências de como a genética pode influenciar a eficácia de fármacos e a busca por novos alvos farmacológicos”, de Renata F. Pessôa, Flávio E. Nácul e François Noël, Infarma. CONTEUDISTA Camila Freze Baez Currículo Lattes Ao clicar nesse botão, uma nova aba se abrirá com o material preparado para impressão. Nela, acesse o menu do seu navegador e clique em imprimir ou se preferir, utilize o atalho Ctrl + P. Nessa nova janela, na opção destino, direcione o arquivo para sua impressora ou escolha a opção: Salvar como PDF. Teste de Conheciment o avalie sua aprendizagem BIOLOGIA MOLECULAR E FARMACOGENÉTICA Lupa Calc. ARA0482_202208870961_TEMAS Aluno: EDUARDO ANTONIO VIEIRA Matr.: 202208870961 Disc.: BIO MOL E FARMAC 2022.2 (G) / EX Prezado (a) Aluno(a), Você fará agora seu TESTE DE CONHECIMENTO! Lembre-se que este exercício é opcional, mas não valerá ponto para sua avaliação. O mesmo será composto de questões de múltipla escolha. Após responde cada questão, você terá acesso ao gabarito comentado e/ou à explicação da mesma. Aproveite para se familiarizar com este modelo de questões que será usado na sua AV e AVS. AMPLIFICAÇÃO IN VITRO DE DNA 1. Em algumas situações, a obtenção de DNA a partir de RNA transcrito é importante, como, por exemplo, na construção de bibliotecas. Considerando os conceitos relacionados a essa estratégia e a figura acima, que mostra uma das possíveis estratégias para síntese de DNA a partir de RNA, assinale a opção correta. A reação mostrada na etapa demonstra a desnaturação da fita de mRNA. A reação mostrada na etapa 3 ilustra a atividade da enzima transcriptase reversa. A reação mostrada na etapa 4 ilustra a atividade da enzima DNA polimerase. Na etapa 4, para que ocorra a reação, é suficiente a adição dos nucleosídios representados por A, U, C, G. O DNA obtido pelo método ilustrado é denominado tDNA. Data Resp.: 01/10/2022 13:29:00 Explicação: A resposta correta é: A reação mostrada na etapa 4 ilustra a atividade da enzima DNA polimerase. 2. SNPs são empregados amplamente para a identificação humana e possuem diferenças relevantes. A análise dos SNPs também pode estar associada aos fenótipos individuais, havendo uma possibilidade futura de identificação de traços físicos como, por exemplo, a cor da íris. Os SNPs são: Heterozigotos Elementos repetitivos do genoma nuclear Homozigotos Sequências presentes somente no DNA mitocondrial Polimorfismos de nucleotídeo único; uma variação na sequência de DNA Data Resp.: 01/10/2022 13:39:01 Explicação: A resposta correta é: Polimorfismos de nucleotídeo único; uma variação na sequência de DNA. INTRODUÇÃO À BIOLOGIA MOLECULAR 3. A origem da vida é uma das questões mais polêmicas e que intrigam a humanidade. Como a vida originou-se na Terra? Na tentativa de responder essa questão, surgiram várias hipóteses. (Origem da Vida. Disponível em:https://www.biologianet.com/origem-universo-vida. Acessado em 21/09/2022). Uma das hipóteses se baseia na ideia da formação espontânea. Assinale a alternativa que contém o nome dessa teoria. Lamarckismo. Criacionismo. Darwinismo. Teoria de Oparin e Haldane Teoria da panspermia. Data Resp.: 01/10/2022 13:51:32 Explicação: Dentre as teorias existentes, uma delas, a teoria de Oparin e Haldane, era justamente a ideia da formação espontânea de pequenas moléculas orgânicas, as quais, com o tempo, passaram a se organizar de maneira cada vez mais complexa até se replicarem e evoluírem, formando as células primitivas. A teoria da panspermia surgiu a partir da observação de compostos orgânicos presentes em meteoritos e ganhou força a partir de 1997 com a análise do Meteorito de Muchinson. Os pesquisadores encontraram diversos aminoácidos e adenina, presente no nosso DNA, que datavam de aproximadamente 7 bilhões de anos, sendo assim mais antigos que nosso próprio planeta, que possui cerca de 4,5 bilhões de anos. Apesar de muito interessante, essa teoria não possui evidências científicas suficientes para explicar a origem da vida no nosso planeta, diferente da teoria de Oparin e Haldane.O criacionismo é uma hipótese defendida por religiosos que afirmam que Deus criou o Universo e todos os seres nele viventes, a partir do nada, conforme está descrito no ¿Gênesis¿, livro presente na Bíblia. Essa hipótese é comumente ligada à crença religiosa, não sendo aceita pela comunidade acadêmica. O Darwinismo e o Lamarckismo são teorias da evolução das espécies. 4. Os organismo mais antigos da Terra são unicelulares e não possuem um núcleo organizado. Esse organismos são chamados de eucariotos. carioteca. procariotos. cromossomo. gene. Data Resp.: 01/10/2022 13:53:04 Explicação: Os procariotos são os organismos mais antigos da Terra. Todos são unicelulares e não possuem um núcleo organizado, ouseja, o seu material genético, o DNA, não é separado por uma membrana nuclear, chamada de carioteca, muito parecido com as primeiras células encontradas no nosso planeta. Esses organismos são os mais simples e toda a sua expressão gênica é diferente da nossa. O gene é um segmento codificante do DNA e o cromossomo é uma estrutura formada por uma molécula de DNA altamente compactada e associada a proteínas auxiliadoras, que ajudam a compactar e descompactar o DNA para facilitar o acesso de outras proteínas a essa região ISOLAMENTO DE ÁCIDOS NUCLÉICOS 5. Para selecionar uma amostra aleatória de tamanho n de uma população formada por N unidades, que são numeradas de 1 a N segundo uma certa ordem, escolhe-se aleatoriamente uma unidade entre as k primeiras unidades da população, onde k = N / n e seleciona-se cada k-ésima unidade da população em sequência. Esta técnica de amostragem denomina-se amostragem: Probabilística Por etapas Sistemática Aleatória simples Não-probabilística Data Resp.: 01/10/2022 13:54:43 Explicação: A resposta correta é: Sistemática 6. Após completar a extração do DNA de uma amostra de sangue não há como saber se a extração foi devidamente realizada a não ser que se faça um controle de qualidade do material extraído. Com relação ao controle de qualidade podemos afirmar que: A espectrofotometria mede a quantidade de luz, na faixa de 260 nm, absorvida pelo DNA e RNA, desta forma é capaz de quantificar e identificar a pureza da amostra. É composto por três etapas: quantificação, coloração e validação. Deve ser realizado a partir da observação, estabelecimento de hipóteses, análise, conclusões e divulgação de um relatório final. A etapa de quantificação apenas pode ser realizada com o uso da técnica de fluorometria. A eletroforese é feita para medir a integridade do extraído e tem como princípio diferenciar a solubilidade de cada componente. Data Resp.: 01/10/2022 14:03:07 Explicação: A resposta correta é: A espectrofotometria mede a quantidade de luz, na faixa de 260 nm, absorvida pelo DNA e RNA, desta forma é capaz de quantificar e identificar a pureza da amostra. SEQUENCIAMENTO, CLONAGEM E TÉCNICAS DE HIBRIDIZAÇÃO 7. O desenvolvimento da engenharia genética permitiu a retirada de genes de uma espécie e a posterior introdução deles em outro indivíduo de espécie diferente. Com essa ferramenta em mãos, o homem foi capaz de reproduzir genes de interesse. COSTA, Marco Antônio F.; COSTA, Maria de Fátima B. Biossegurança de OGM: uma visão integrada. Rio de Janeiro: Publit, 2009, p. 154, com adaptações. Com base nos conceitos de organismos geneticamente modificados (OGMs), assinale a alternativa correta. Organismos que tiveram genes alterados apenas quanto à respectiva posição ou expressão são transgênicos O setor da saúde não apresenta qualquer tipo de questionamento em relação ao uso dos OGMs, considerando os inúmeros benefícios trazidos por eles para o setor. Os OGMs, na respectiva totalidade, são considerados transgênicos. Os OGMs são organismos cujo material genético (RNA ou DNA) tenha sido modificado por qualquer técnica. Os transgênicos são produzidos através da alteração de genes em organismos adultos, sendo a modificação genética transmitida de uma célula a outra através de transformação. Data Resp.: 01/10/2022 14:04:54 Explicação: A resposta correta é: Os OGMs são organismos cujo material genético (RNA ou DNA) tenha sido modificado por qualquer técnica. 8. A hibridização in situ é uma ferramenta diagnóstica de doenças genéticas, como a distrofia muscular de Duchenne, e infecciosas, como a infecção por papilomavírus humano (HPV) em colo uterino. Sobre as técnicas de hibridização in situ, é incorreto afirmar que: Permite a identificação com precisão do local na célula ou tecido em que a sequência-alvo está; Exigem leitura através de microscópios especializados. São feitas em tecidos e células fixadas e permeabilizadas, para preservação das estruturas celulares e entrada das sondas, respectivamente; As sondas podem ser marcadas com enzimas, fluoróforos e radioatividade; Utilizam sondas de anticorpos, capazes de reconhecer a sequência-alvo; Data Resp.: 01/10/2022 14:04:58 Explicação: A resposta correta é: Utilizam sondas de anticorpos, capazes de reconhecer a sequência-alvo; EM2120427FARMACOGENÉTICA 9. Questões éticas envolvendo a farmacogenética e farmacogenômica incluem os pontos abaixo, exceto: A existência de resolução que proíbe a aplicação da farmacogenética. A redução de indivíduos ao seu mero perfil genético. A discriminação genética de portadores de doenças e polimorfismos farmacogenéticos. A inequidade no acesso a tratamento farmacogenético. A inequidade nas populações-alvo de pesquisa em farmacogenética. Data Resp.: 01/10/2022 14:05:01 Explicação: A resposta certa é:A existência de resolução que proíbe a aplicação da farmacogenética. 10. Assinale a opção de fármaco que apresenta tanto alteração farmacogenética por metabolismo e polimorfismo de proteína alvo: Omeprazol. Clopidogrel. Varfarina. Carvedilol. Digoxina. Data Resp.: 01/10/2022 14:05:20 Explicação: A resposta certa é:Varfarina. Não Respondida Não Gravada Gravada Exercício inciado em 01/10/2022 13:20:54. 1 - Introdução à Biologia Molecular 2 - Isolamento de Ácidos Nucléicos 3 - Sequenciamento 4 - Amplificação in Vitro de Dna 5 - Farmacogenética Teste de Conhecimento de BIOLOGIA MOLECULAR E FARMACOGENÉTICA