Prévia do material em texto
D997i Dym, Clive L. Introdução à engenharia : uma abordagem baseada em projeto / Clive L. Dym, Patrick Little, com Elizabeth J. Orwin e R. Erik Spjut ; tradução João Tortello. – 3. ed. – Porto Alegre : Bookman, 2010. 346 p. : il. ; 25 cm. ISBN 978-85-7780-648-5 1. Engenharia. 2. Engenharia – Design. I. Little, Patrick. II. Orwin, Elizabeth J. III. Spjut, R. Erik. IV. Título. CDU 62:658.512.2 Catalogação na publicação: Renata de Souza Borges CRB-10/1922 1 Projeto de Engenharia O ser humano projeta coisas desde que nos podemos “lembrar” ou descobrir pela arqueologia. Nossos primeiros ancestrais projetaram facas de pedra e outras ferramentas primitivas para ajudar a atender suas necessidades básicas. Suas pinturas na parede contavam histórias e tornavam suas cavernas visualmente mais atraentes. Dada a longa história de pessoas projetando coisas, é interessante perguntar o que um engenheiro que projeta a estrutura de um prédio faz diferente de um decorador que projeta sua decoração. Usaremos este capítulo para definir alguns conceitos do projeto de engenharia e para começar a desenvolver um vocabulário e um entendimento co- mum do que queremos dizer com projeto de engenharia. 1.1 Onde e quando os engenheiros projetam? Existem muitas indagações que poderíamos fazer sobre engenheiros que projetam e provavel- mente existem mais respostas do que perguntas. O que significa para um engenheiro projetar algo? Quando os engenheiros projetam coisas? Onde? Por quê? Para quem? Um engenheiro poderia trabalhar em uma grande empresa que processa e distribui vários produtos alimentícios, onde poderia ser solicitado a projetar um recipiente para um novo suco de frutas. Ele poderia trabalhar em uma construtora, projetando parte da ponte de uma estrada incorporada em um grande projeto viário. Um engenheiro poderia trabalhar em uma empresa automobilística que quisesse desenvolver um novo conceito para o grupo de instrumentos de seus carros, talvez para permitir que os motoristas verificassem diversos parâmetros sem tirar os olhos da estrada. Ou então, um engenheiro poderia trabalhar em uma escola que quisesse projetar instalações especializadas para melhor atender os alunos com incapacidades ortopédicas. Essa lista poderia ser facilmente ampliada; portanto, é interessante perguntar: existem elementos comuns nas situações dos engenheiros ou nas maneiras como fazem seus projetos? Na verdade, existem características comuns tanto em suas situações como em seu trabalho de projeto e essas características tornam possível descrever um processo de projeto e o contexto no qual ele ocorre. Podemos começar identificando três “papéis” desempenhados quando o projeto de um produto ocorre. Obviamente, existe o projetista. Em seguida, existe um cliente, a pessoa, grupo ou empresa que deseja a concepção de um projeto, e existe o usuário, a pessoa (ou o Projeto de Engenharia O que significa projetar algo? Como o projeto de engenharia difere de outros tipos de projeto? 1 26 Introdução à Engenharia conjunto de pessoas) que realmente utilizará o que está sendo projetado. Para o engenheiro, o cliente poderia ser interno (por exemplo, a pessoa que decide que a empresa alimentícia deve começar a comercializar um novo suco de frutas) ou externo (por exemplo, o órgão do gover- no que contrata o novo sistema viário). Além disso, embora o projetista possa se relacionar de forma diferente com os clientes internos e externos, em qual- quer caso é o cliente que apresenta um problema ou uma exposição de projeto a partir do qual tudo mais deriva. As exposições do projeto estrutural podem ser orais e frequentemente são muito curtas. Essas duas qualidades sugerem que a primeira tarefa do projetista é esclarecer o que o cliente realmente quer e transformar isso em uma forma útil para ele, como projetista de engenharia. Falaremos mais sobre isso no Capítulo 3 e mais adiante, mas queremos enfatizar que um projeto é motivado por um cliente que deseja algum tipo de equipamento, sistema ou processo. O usuário é o terceiro agente ou envolvido no esforço de projeto. Nos contextos men- cionados anteriormente, os usuários são, respectivamente, os consumidores que adquirem o novo suco de frutas, os motoristas que estão no novo sistema viário interestadual, os moto- ristas da nova linha de automóveis e os alunos com deficiências ortopédicas (e seus professo- res). Os usuários têm participação no processo de projeto, pois um produto não seria vendido se seu projeto não atendesse suas necessidades. Assim, o projetista, o cliente e o usuário formam um triângulo, como mostrado na Figura 1.1. O projetista precisa entender o que o cliente quer, mas o cliente também precisa entender o que seus usuários precisam ou o que o mercado quer e comunicar isso ao projetista. No Capítulo 2, descreveremos os processos de projeto que modelam o modo como o projetista pode interagir e se comunicar com o cliente e com os usuários em potencial para ajudar a informar seu próprio pensamento de projeto, e identificaremos algumas ferramentas (discutidas nos Capítulos 3 a 5) que podem ser utiliza- das para organizar e refinar seu pensamento. Além disso, existe um envolvido que ainda não mencionamos: o público. Isso acontece em parte porque o público está implicitamente incorporado na noção de usuário. É interessan- te incluir a noção de um público que é afetado por um projeto tanto quanto (ou mais do que) os usuários que já identificamos, pois isso sugere que podemos confrontar as questões éticas em tais projetos estruturais. Vamos explorar melhor isso no Capítulo 12. Também é importante notar que, frequentemente, o cliente fala em nome dos usuários pretendidos, embora ninguém que tenha sentado na poltrona apertada da classe econômica de um avião tenha perguntado às em- presas de aviação e aos fabricantes de avião quem eram seus clientes! Conforme descrito anteriormente, os projetistas de engenharia trabalham em muitos ti- pos diferentes de ambientes, incluindo pequenas e grandes empresas, empreendimentos em início de atividade, governo, organizações sem fins lucrativos e firmas de serviços de engenha- ria (uma das quais é a consultoria de projeto industrial). Sem considerar os salários e privilé- O projeto é motivado por um cliente. O projetista e o cliente precisam entender o que um usuário quer em um projeto. Cliente Projetista Usuário Figura 1.1 O triângulo projetista-cliente-usuário. Existem três partes envolvidas em um esforço de pro- jeto: o cliente, que tem objetivos que o projetista precisa esclarecer; o usuário do equipamento projeta- do, que tem seus próprios requisitos; e o projetista, que deve desenvolver especificações de modo que algo possa ser construído para satisfazer a todos! Patricia Realce Patricia Realce Patricia Realce Patricia Realce Projeto de Engenharia 27 gios do trabalho nesses diversos lugares para realizar o projeto, os projetistas provavelmente verão diferenças no tamanho de um projeto, no número de colegas na equipe de projeto e no acesso às informações relevantes sobre o que os usuários querem. Em projetos grandes, muitos dos projetistas trabalharão em segmentos tão detalhados e confinados que grande parte do que descrevemos neste livro talvez não pareça imediatamente útil. Assim, os projetistas da pilastra de uma ponte, do tanque de combustível de um avião ou dos componentes da placa-mãe de um computador provavelmente não estarão preocupados com o quadro mais geral do que os clientes e usuários desejam, pois o contexto do projeto em nível de sistema já foi estabelecido quando esse grau do projeto é atingido. Na realidade, conforme explicaremos no Capítulo 2, esses tipos de problemas de projeto são a parte do processo chamada de projeto detalhado, na qual as escolhas e os procedimentos são bem entendidos, pois as questões mais gerais do projeto já foram resolvidas. Contudo, mesmo para projetos grandes, a resposta à exposição de projeto de um clientecomeça com o projeto conceitual. Algum raciocínio sobre o tamanho e a missão do avião terá de ser feito para identificar as restrições envolvidas no projeto do tanque de combustível, enquanto os parâmetros de desempenho que a placa-mãe do computador deve exibir serão determinados por meio de alguma avaliação do mercado e do preço do computa- dor em questão. Frequentemente, os projetos grandes e complexos levam a interpretações muito dife- rentes das exposições do projeto do cliente e das necessidades do usuário. Basta contemplar os muitos tipos diferentes de arranha-céus de nossas principais cidades para ver como os arquitetos e engenheiros estruturais concebem diferentes maneiras de alojar pessoas em escritórios e apartamentos. Diferenças visíveis também surgem no projeto de aviões (Figura 1.2) e no projeto de cadeiras de rodas (Figura 1.3). Cada um desses equipamentos pode re- sultar a partir de uma exposição de projeto simples e comum: os aviões são “equipamentos que transportam pessoas e bens pelo ar” e as cadeiras de rodas são “equipamentos pessoais móveis para transportar pessoas incapazes de usar as pernas”. Contudo, os diferentes pro- dutos que têm surgido representam diferentes conceitos do que os clientes e os usuários queriam (e do que os projetistas entenderam que eles queriam!) desses equipamentos. Os projetistas precisam esclarecer o que um cliente deseja e transformar esses desejos em um produto de engenharia. O triângulo projetista-cliente-usuário também nos induz (a) a reconhecer que os interes- ses dos três participantes podem divergir e (b) a considerar que as consequências dessa diver- gência podem significar mais do que problemas financeiros resultantes do fracasso em aten- der as necessidades dos usuários. É por isso que a interação de vários interesses gera uma interação de várias obrigações, e essas obrigações podem estar em conflito. Por exemplo, o projetista de um recipiente de suco de frutas poderia conside- rar latas de metal, mas latas “esmagadas” facilmente podem ser um perigo se surgirem bordas afiadas durante o esmagamento. Poderia haver compromis- sos entre as variáveis de projeto, incluindo o material do qual um recipiente é feito e a espessura do recipiente. As escolhas feitas no projeto final poderiam refletir facilmente diferentes avaliações dos possíveis perigos à segurança, os quais, por sua vez, poderiam estabelecer a base de problemas éticos em potencial. Os problemas éticos, que discutiremos no Capítulo 12, ocorrem porque os projetistas têm obrigações não somente com os clientes e usuários, mas também com sua profissão e, conforme detalhado nos códigos de ética das sociedades de engenharia, com o público em geral. Assim, os problemas éticos sem- pre fazem parte do processo de projeto. Outro aspecto da prática de projeto de engenharia, cada vez mais comum em projetos e empresas de todos os tamanhos, é o uso de equipes para fazer o projeto. Muitos problemas de engenharia são inerentemente multidisciplinares (por exemplo, o projeto de instrumentação médica); portanto, há necessidade de entender os requisitos dos clientes, dos usuários e das Os projetistas têm obrigações com a profissão e com o público. 28 Introdução à Engenharia tecnologias em muitos ambientes diferentes. Isso, por sua vez, exige que sejam montadas equipes para tratar desses diferentes conjuntos de necessidades ambientais. Claramente, o uso difundido de equipes afeta o gerenciamento dos projetos estruturais, outro tema recorrente deste livro. O projeto de engenharia é um assunto multifacetado, e de modo algum pensamos que o leitor compreenderá realmente essa atividade maravilhosamente complexa lendo este curto livro (ou realizando um único projeto estrutural). Entretanto, achamos que podemos fornecer alguns esquemas dentro dos quais o leitor pode pensar produtivamente sobre algumas das questões conceituais e das escolhas resultantes feitas muito cedo no projeto de muitos tipos diferentes de produtos de engenharia. 1.2 Um vocabulário elementar para projeto de engenharia Já está claro que a palavra projeto é usada como substantivo (s) e como verbo (vb). O Webster’s New Collegiate Dictionary define as duas utilizações como: projeto • s: um plano ou esquema mental no qual são esboçados meios para atingir um fim; a organização de elementos que entram nas produções humanas (como de arte ou maquinário). projetar• vb: conceber e planejar na mente; criar para uma determinada função ou fim. Os pontos por trás dessas duas definições são claros: projetar está relacionado a pessoas planejando e criando maneiras de produzir coisas que atinjam alguns objetivos conhecidos. Existem muitas definições diferentes para projeto de engenharia na literatura e uma variação considerável nas maneiras pelas quais as ações e os atributos de projeto são descritos Figura 1.2 Alguns “equipamentos que transportam pessoas e bens com segurança pelo ar”; isto é, aviões. Nenhuma surpresa aqui, certo? Já vimos muitos aviões (pelo menos em fotos ou filmes), e mes- mo estes, embora de épocas e origens diferentes, mostram que foram projetados para cumprir missões muitos distintas. Projeto de Engenharia 29 pelos engenheiros. Assim, definiremos agora o que queremos dizer com projeto de engenha- ria e, depois, passaremos a definir alguns dos termos relacionados, comumente utilizados por engenheiros e projetistas. 1.2.1 Nossa definição de projeto de engenharia A definição formal de projeto de engenharia a seguir é a mais útil para nossos objetivos: Projeto de engenharia• é um processo sistemático e inteligente no qual os projetis- tas geram, avaliam e especificam estruturas para equipamentos, sistemas ou processos cuja(s) forma(s) e função(ões) atende(m) os objetivos dos clientes e as necessidades dos usuários, enquanto satisfazem um conjunto de restrições especificadas. Figura 1.3 Uma coleção de “equipamentos pessoais móveis que transportam pessoas incapazes de usar as pernas”; isto é, cadeiras de rodas. Aqui, assim como acontece com os aviões, vemos algumas diferenças nítidas nas configurações e nos componentes dessas cadeiras de rodas. Por que as rodas são tão diferentes? Por que as cadeiras de rodas são tão diferentes? Patricia Realce 30 Introdução à Engenharia É importante reconhecer que, quando estamos projetando equipamentos, sistemas e pro- cessos, estamos projetando artefatos: objetos artificiais feitos pelo ser humano, as “coisas” ou os dispositivos que devem ser projetados. Na maioria das vezes, são objetos fí- sicos, como aviões, cadeiras de rodas, escadas, telefones celulares e carburado- res. Entretanto, nesse sentido, produtos “de papel”, como desenhos, plantas, software de computador, artigos e livros, também são artefatos, assim como os arquivos eletrônicos “temporários” que se tornam “reais” quando exibidos na tela de um computador. Neste texto, usaremos as palavras equipamento ou sis- tema indistintamente, como objetos de nosso projeto. Recorrendo ao nosso dicionário, notamos (e, em seguida, comentamos) as seguintes definições: forma• s: a feição e estrutura de algo, conforme distinguido de seu material Portanto, o que queremos dizer com forma é muito simples e seu significado no contex- to da engenharia é coerente com seu uso mais comum. função• s: a ação para a qual uma pessoa ou coisa é especialmente adequada ou usada, ou para a qual uma coisa existe; uma de um grupo de ações relacionadas, colaborando para uma ação maior Falando de modo simples, as funções são as coisas que um equipamento ou sistema projetado deve fazer. Conforme descrevemos nas Seções 2.3 e 4.1, as funções de enge- nharia envolvem a transferência ou o fluxo de energia, informações e materiais. Obser- ve também que concebemos a transferência de energia muito amplamente: isso inclui forças de apoio e transmissão, o fluxo de corrente, o fluxo de carga, etc. meio• s: uma entidade, instrumento ou método usado para atingir um fim Embora não seja reconhecidoexplicitamente em nossa definição de projeto de enge- nharia, o meio é importante, pois neste contexto se refere a uma maneira de fazer uma função acontecer. objetivo• s: algo para o qual o esforço é dirigido; um propósito ou fim da ação Em nosso contexto, objetivo está de acordo com sua utilização comum. restrição• s: o estado de ser verificado, restrito ou forçado a evitar ou executar alguma ação Esta definição também é o que esperaríamos do uso padrão. É interessante salientar que as restrições são extremamente importantes no projeto de engenharia, pois elas impõem limites absolutos que, se violados, significam que um projeto proposto é simplesmente inaceitável. Antecipando outro ponto que enfatizaremos novamente (no Capítulo 3), note que os objetivos de um projeto são totalmente independentes das restrições impostas ao projeto. Os objetivos podem ser completamente atingidos, podem ser atingidos até certo ponto ou podem não ser atingidos. Por outro lado, as restrições são binárias: ou são satisfeitas ou não são sa- tisfeitas; são preto ou branco e não existem estados intermediários. Assim, se estivéssemos projetando um debulhador de milho para fazendeiros nicaraguenses, para ser construído de forma não dispendiosa a partir de materiais nativos (locais), um objetivo poderia ser que ele fosse o mais barato possível, enquanto uma restrição poderia ser que não custasse mais de US$20.00. Fazer o debulhador a partir de materiais nativos poderia ser um objetivo, se essa fosse uma característica desejada, ou uma restrição, se fosse absolutamente obrigatória. Nossa definição de projeto de engenharia diz que os projetos emergem a partir de um processo inteligente e sistemático. Isso não é para negar que o projeto é um processo criativo. Contudo, ao mesmo tempo, existem técnicas e ferramentas que podemos usar para apoiar nossa criatividade, para nos ajudar a pensar mais claramente e para tomar me- lhores decisões pelo caminho. Essas ferramentas e técnicas, que compõem grande parte do Projeto de engenharia é um processo pensado para gerar estruturas, sistemas ou processos que atinjam os objetivos determinados, enquanto respeitam as restrições especificadas. Projeto de Engenharia 31 assunto deste livro, não são fórmulas ou algoritmos. Em vez disso, são maneiras de fazer perguntas e de apresentar e examinar as respostas à medida que o processo de projeto se desenrola. Também apresentaremos algumas ferramentas e técnicas para o gerenciamento de um projeto estrutural. Assim, ao demonstrarmos maneiras de pensar sobre um projeto à medida que ele se desenvolve em nossa mente, também falaremos sobre maneiras de aplicar os recursos necessários para concluir um projeto estrutural em tempo e dentro do orçamento. 1.2.2 As suposições por trás de nossa definição de projeto de engenharia Existem algumas suposições implícitas por trás de nossa definição de projeto de engenharia e dos termos nos quais ela é expressa. É interessante torná-las explícitas. Primeiramente, o projeto é um processo pensado que pode ser entendido. Sem querer arruinar a mágica da criatividade ou desmerecer a importância da inovação no projeto, as pessoas pensam enquanto projetam. Portanto, é importante ter ferramentas para apoiar esse pensamento, para apoiar a decisão de projeto tomada e o gerenciamento do projeto estrutural. (Uma evidência que apoia essa hipótese óbvia é que foram escritos programas de computador para simular processos de projeto. Não poderíamos escrever tais programas se não pudéssemos enunciar e descrever o que se passa em nossa mente quando projetamos as coisas.) A noção de que existem métodos formais para serem usados ao se gerar alternativas de projeto está fortemente relacionada com nossa inclinação ao pensar sobre projeto. Isso poderia parecer bastante óbvio, pois não tem muito sentido considerar novas maneiras de ver problemas de projeto ou de falar sobre elas – a não ser que possamos explorá-las para projetar de forma mais eficiente. Forma e função são duas entidades relacionadas, apesar de independentes. Isso é impor- tante. Frequentemente, refletimos sobre o processo de projeto no início, quando nos sentamos para desenhar ou esboçar algo, o que sugere que a forma é um ponto de partida típico. Contu- do, devemos lembrar que a função é um aspecto completamente diferente de um projeto, que pode não ter uma relação óbvia com a feição ou a forma. Em particular, embora frequente- mente possamos deduzir o propósito de um objeto ou equipamento a partir de sua forma ou estrutura, não podemos fazer o inverso; isto é, não podemos in- ferir automaticamente a forma que um equipamento deve ter somente a partir da função. Por exemplo, podemos ver um par de placas conectadas e deduzir que os dispositivos que as conectam (por exemplo, pinos, porcas e parafusos, rebites, grampos, etc.) estão fixando equipamentos cuja função é ligar os membros indivi- duais de cada par. Entretanto, se fôssemos começar com uma exposição do propósito de que desejamos fixar uma placa na outra, não existiria um vínculo ou inferência que pudéssemos usar para criar uma forma ou feição de um dispositivo de fixação. Ou seja, saber que quere- mos obter a função de fixar duas placas não nos leva a (nem mesmo sugere) uma das formas de emendas, grampos, rebites ou cola. A relação entre forma e função é importante na compreensão dos aspectos criativos do projeto. Se pudermos enunciar sistematicamente todas as funções que um equipamento deve executar, então poderemos ser criativos no desenvolvimento das formas dentro das quais es- sas funções podem ser executadas. Nesse sentido, o uso de processos pensados e organizados complementa o lado criativo do projeto. Existem comparativos disponíveis para avaliar como esperamos que um projeto se com- porte e para medir implicitamente o progresso feito em direção a um projeto bem-sucedido. Esses comparativos derivam de um processo de questionamento (consulte o Capítulo 2) que começa com o projetista: Projeto é um processo pensado que pode ser entendido. A forma não pode ser inferida a partir da função. 32 Introdução à Engenharia transformando os desejos do cliente em • objetivos para o equipamento ou sistema que está sendo projetado; estabelecendo um conjunto de • métricas que podem ser usadas para avaliar ou medir até que ponto um projeto proposto satisfará os objetivos do cliente; estabelecendo as • funções que um projeto bem-sucedido executará; e estabelecendo os • requisitos que expressam, em termos de engenharia, os atributos do projeto e seu comportamento; isto é, as funções do projeto. Vamos definir formalmente os dois novos termos que acabamos de apresentar; ou seja, métrica e requisitos. Nossas definições, embora apresentadas em formato padrão de dicio- nário, representam uma mistura das definições reais do dicionário com nosso entendimento das “melhores práticas” de projeto de engenharia, de acordo com o que é feito atualmente no setor. Assim: métrica• s: um padrão de medida; no contexto do projeto de engenharia, uma escala na qual o cumprimento dos objetivos de um projeto pode ser medido e avaliado A métrica fornece escalas ou réguas nas quais podemos medir até que ponto os ob- jetivos são atingidos. Para fornecer um exemplo verdadeiramente simples, vamos su- por o objetivo de ser capaz de saltar 10 metros. Uma métrica para um salto daria 1 ponto para cada metro saltado, de modo que um salto de 2 metros valeria 2 pontos, enquanto um salto de 8 metros valeria 8 pontos e assim por diante. Conforme discu- tiremos detalhadamente no Capítulo 3, nem todos os objetivos são quantificados com essa facilidade e nem todas as medidas são feitas tão facilmente. Portanto, existem questões interessantes que devem ser consideradas quando falamos sobre métrica em profundidade. requisito(s)• s: coisa(s) desejada(s) ou necessária(s); coisa(s) fundamental(is) para a existência ou ocorrência de algo; no contexto do projeto de engenharia,as exposições de engenharia das funções que devem ser exibidas e dos atributos que devem ser exibi- dos por um projeto Os requisitos de projeto, frequentemente chamados de especificações de projeto, são expressos de várias maneiras, dependendo da natureza dos requisitos que o projetista escolhe para enunciar. Conforme explicaremos no Capítulo 5, os requisitos de projeto podem especificar: valores para atributos de projeto em particular, procedimentos usa- dos para calcular atributos ou o comportamento do projeto, ou níveis de desempenho do comportamento funcional que devem ser obtidos pelo projeto. Vamos explorar extensi- vamente a natureza dos requisitos (ou especificações) de projeto no Capítulo 4. A meta de um projeto bem-sucedido é um conjunto de planos para fazer o equipamento projetado. Esse conjunto de planos, frequentemente chamado de especificações de fabrica- ção, pode incluir desenhos, instruções de montagem e listas de peças e materiais, assim como muito texto, gráficos e tabelas que explicam o que é o artefato, por que ele é o que é e como pode ser alcançado ou realizado. Isso acontecerá seja o artefato um objeto físico, uma descrição de processo ou alguma representação tempo- rária. Além disso, as especificações de fabricação devem ser claras, inequí- vocas, completas e transparentes. Isso porque as especificações de fabricação devem, por si só, permitir que alguém que não seja o projetista (ou outros envolvidos no processo de projeto) faça o que ele pretendia, de modo a executar o que foi pretendido. Essa é uma faceta da prática de engenharia moderna que representa um desvio em relação a um tempo (há muito tempo) quando frequentemente os engenheiros eram artífices que faziam o que projetavam. Esses fabricantes-projetistas podiam se permitir uma margem As especificações de fabricação permitem a implementação independente do envolvimento do projetista. Projeto de Engenharia 33 de manobra ou abreviações em seus planos de projeto, pois, como fabricantes, sabiam exa- tamente o que pretendiam enquanto projetistas. Atualmente, é raro os engenheiros fazerem o que projetaram. Às vezes os projetos são “lançados pelo muro” para um departamento de manufatura ou para um fabricante que age inteiramente de acordo com “o que está nas especi- ficações”. Porém, cada vez mais os problemas de manufatura são tratados durante o processo de projeto, o que significa que os engenheiros de manufatura e até os fornecedores se tornam parte da equipe de projeto, o que também significa que existem mais necessidades de que os projetistas sejam bons comunicadores! Frequentemente acontece de a manufatura ou o uso de um equipamento destacar defi- ciências que não foram antecipadas no projeto original. Muitas vezes os projetos produzem consequências não antecipadas que podem se tornar critérios de avaliação ex post facto. Por exemplo, o automóvel oferece o transporte pessoal pretendido. Por outro lado, alguns consi- deram o automóvel uma falha, por causa de sua contribuição para a poluição do ar e para os congestionamentos de tráfego. Além disso, a mudança nas expectativas sociais têm imposto uma reestruturação importante de muitos atributos e comportamentos dos automóveis. Por fim, nossa definição de projeto de engenharia e das suposições relacionadas que identificamos claramente conta muito com o fato de que a comunicação é vital para o proces- so de projeto. Algum conjunto de linguagens ou representações está inerente e inevitavelmen- te envolvido em cada parte do processo de projeto. Desde a comunicação original de um problema de projeto, até a especificação de requisitos e de es- pecificações de fabricação, o equipamento ou sistema que está sendo projeta- do deve ser descrito e “discutido” de muitas maneiras. Assim, a comunicação é um problema-chave. Não que a solução e a avaliação do problema sejam menos importantes; elas são extremamente importantes. Mas a solução e a avaliação do problema são feitas em níveis e em estilos – sejam idiomas falados ou escritos, números, equações, regras, gráficos ou figuras – que são apropriados para a tarefa imediata que está em mãos. O trabalho bem-sucedido no projeto está inextricavelmente vinculado à capacidade de se comunicar. A comunicação é um problema-chave no projeto. Encerra aqui o trecho do livro disponibilizado para esta Unidade de Aprendizagem. Na Biblioteca Virtual da Instituição, você encontra a obra na íntegra.