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Transtorno do Espectro Autista Professora Me. Larissa Kühl Izidoro Pereira Reitor Prof. Ms. Gilmar de Oliveira Diretor de Ensino Prof. Ms. Daniel de Lima Diretor Financeiro Prof. Eduardo Luiz Campano Santini Diretor Administrativo Prof. Ms. Renato Valença Correia Secretário Acadêmico Tiago Pereira da Silva Coord. de Ensino, Pesquisa e Extensão - CONPEX Prof. Dr. Hudson Sérgio de Souza Coordenação Adjunta de Ensino Profa. Dra. Nelma Sgarbosa Roman de Araújo Coordenação Adjunta de Pesquisa Prof. Dr. Flávio Ricardo Guilherme Coordenação Adjunta de Extensão Prof. Esp. Heider Jeferson Gonçalves Coordenador NEAD - Núcleo de Educação à Distância Prof. Me. Jorge Luiz Garcia Van Dal Web Designer Thiago Azenha Revisão Textual Beatriz Longen Rohling Caroline da Silva Marques Carolayne Beatriz da Silva Cavalcante Geovane Vinícius da Broi Maciel Jéssica Eugênio Azevedo Kauê Berto Projeto Gráfico, Design e Diagramação André Dudatt Carlos Firmino de Oliveira 2022 by Editora Edufatecie Copyright do Texto C 2021 Os autores Copyright C Edição 2022 Editora Edufatecie O conteúdo dos artigos e seus dados em sua forma, correção e confiabilidade são de responsabilidade exclusiva dos autores e não representam necessariamente a posição oficial da Editora Edufatecie. Permi- tidoo download da obra e o compartilhamento desde que sejam atribuídos créditos aos autores, mas sem a possibilidade de alterá-la de nenhuma forma ou utilizá-la para fins comerciais. Dados Internacionais de Catalogação na Publicação - CIP P436t Pereira, Larissa Hühl Izidoro Transtornos do espectro autista / Larissa Hühl Izidoro Pereira. Paranavaí: EduFatecie, 2022. 112 p. : il. Color. 1. Transtornos do espectro autista. 2. Crianças com transtorno do espectro autista – cuidado e tratamento. I. Centro Universitário UniFatecie. II. Núcleo de Educação a Distância. III. Título. CDD : 23 ed. 616.85882 Catalogação na publicação: Zineide Pereira dos Santos – CRB 9/1577 UNIFATECIE Unidade 1 Rua Getúlio Vargas, 333 Centro, Paranavaí, PR (44) 3045-9898 UNIFATECIE Unidade 2 Rua Cândido Bertier Fortes, 2178, Centro, Paranavaí, PR (44) 3045-9898 UNIFATECIE Unidade 3 Rodovia BR - 376, KM 102, nº 1000 - Chácara Jaraguá , Paranavaí, PR (44) 3045-9898 www.unifatecie.edu.br/site As imagens utilizadas neste livro foram obtidas a partir do site Shutterstock. AUTOR Professora Me. Larissa Kühl Izidoro Pereira ● Mestre em Educação pela Universidade Estadual de Maringá (UEM); ● Graduação em Pedagogia pela Universidade Estadual de Maringá (UEM); ● Docente da Unespar – Campus Paranavaí – Colegiado de Pedagogia; ● Durante a graduação foi bolsista do grupo PET-Pedagogia (Programa de Edu- cação Tutorial), no período de 2009 a 2011; ● Participou do projeto Brincadeiras, vinculado ao PCA (Programa multidisciplinar de Estudo, Pesquisa e Defesa da Criança e do Adolescente) nos anos de 2010 e 2011; ● Participou do grupo de estudos nudisex, coordenado pela Prof.Dr. Eliane Rose Maio Braga, professora com quem desenvolveu uma Pesquisa de Iniciação Científica (PIC), intutulada “Como o brinquedo influência as crianças na for- mação de gênero?”, temática aprofundada em sua pesquisa de conclusão de curso (TCC) defendida no final de 2011, “A influência da formação de gênero no momento da brincadeira: aspectos com professoras da Educação Infantil; ● Atuou no ano de 2012 como professora na educação infantil na escola Criarte; ● No ano de 2013 ingressou no Mestrado em Educação da Universidade Estadual de Maringá, orientada pela professora Dr. Eliane Rose Maio finalizando em abril de 2015 com a dissertação intitulada “Lei Maria da Penha: Análise dos livros de registros, referentes aos boletins de ocorrência da cidade de Maringá (2006- 2007). O que a educação escolar tem a ver com isso?”; ● Tem experiência na educação básica, com primeiro, segundo e terceiro ano do ensino fundamental, no Município de Maringá, concursada como professora 20 h desde 2013; ● Assumiu a direção escolar no ano de 2017, sendo eleita pela comunidade es- colar e funcionários para continuar na gestão escolar nos próximos 2 anos. (Por questões pessoais de mudança de cidade, atualmente não está mais no cargo.). ● Experiência como tutora da Educação à Distância da UEM, desde 2014 até 2018. Participou do processo seletivo para professora PSS da Unespar, campus de Paranavaí, ao qual assumiu o cargo em setembro de 2019, ministrando aulas para graduação dos cursos de licenciatura. CURRÍCULO LATTES: http://lattes.cnpq.br/1728602615742205 APRESENTAÇÃO DO MATERIAL Seja muito bem-vindo (a)! Prezado (a) aluno (a), se você se interessou pelo assunto desta disciplina, isso já é o início de uma grande jornada que vamos trilhar juntos a partir de agora. Proponho, junto com você, construir novos conhecimentos sobre o Transtorno do Espectro Autista. Vamos com- preender as principais características da criança com TEA. Além de estudar a fundo sobre seu desenvolvimento, intervenções, campos de estudo, tipos de tratamento. Ao final dessa disciplina, você terá ampliado seu conhecimento sobre a criança com TEA, podendo contribuir ativamente para o desenvolvimento e aprendizagem desse aluno no ambiente escolar. Sabemos que a Educação Inclusiva faz parte do atual contexto educacional, entre as dificuldades de aprendizagens, deficiências e transtornos, será abordado o Transtorno do Espectro Autista (TEA), que é um transtorno do desenvolvimento neurológico. A criança com TEA apresenta características variadas que comprometem, desde as suas relações pessoais até sua comunicação, além de afetar áreas emocionais, cognitivas, motores e sensoriais. Na Unidade I, vamos estudar sobre o histórico do autismo, o diagnóstico da crian- ça com TEA, bem como quais são os tipos de tratamentos e intervenções mais usados. Questionamentos relacionados ao uso de medicamentos também serão respondidos. Essa unidade é o início para você compreender o que é o Autismo. Já na Unidade II você irá estudar sobre a equipe multidisciplinar, vimos brevemente na unidade I sobre sua importância para o pleno desenvolvimento da criança com TEA, agora, vamos aprofundar esse conhecimento, estudando especificamente cada profissional que compõe a equipe multidisciplinar. Depois, na Unidade III avançaremos para a interação social da tríade família, escola e autismo. Como cada área interfere no desenvolvimento da criança com TEA, como elas devem caminhar com o mesmo objetivo, você irá perceber como esses aspectos precisam estar correlacionados, por fim, abordaremos sobre o TEA e o mercado de trabalho. Em nossa Unidade IV, vamos finalizar o conteúdo dessa disciplina aprofundando nosso conhecimento sobre a avaliação, o diagnóstico e tratamento da criança com TEA, você estudou brevemente sobre o diagnóstico na unidade I, agora é o momento de conhecer as diferentes correntes de avaliação, quais são seus processos formativos e o tratamento. Aproveito para reforçar o convite a você, para que percorra junto conosco essa jor- nada de conhecimento. Esperamos contribuir para seu crescimento pessoal e profissional. Muito obrigado e bons estudos! SUMÁRIO UNIDADE I ...................................................................................................... 3 Aspectos Psicológicos Relacionados ao Autismo UNIDADE II ................................................................................................... 25 Equipe Multidisciplinar UNIDADE III .................................................................................................. 50 Interação Social: Família / Escola / Autista UNIDADE IV .................................................................................................. 77 Avaliação, Diagnóstico e Tratamento 3 Plano de Estudo:● Diagnóstico: reconhecimento e detecção; ● Tratamento e intervenção: principais abordagens clínicas do TEA; ● Intervenções Frequentes: Uso De Hormônios, Aprimoramento De Funções Comunicativas, Intervenções Clínicas Psicanalíticas, Procedimentos Multiprofissionais, Uso De Ambientes Digitais De Aprendizagem Adaptados. Objetivos da Aprendizagem: ● Conceituar e contextualizar historicamente quando o TEA foi citado pela primeira vez, e sua trajetória desde então; ● Compreender como a definição do TEA sofreu alterações nos documentos norteadores de diagnóstico - CID e DSM; ● Conhecer como cada modalidade terapêutica trabalha no TEA; ● Estabelecer a importância da Epidemiologia no TEA; ● Abranger as intervenções frequentemente mais utilizadas. UNIDADE I Aspectos Psicológicos Relacionados ao Autismo Professora Me. Larissa Kühl Izidoro Pereira 4UNIDADE I Aspectos Psicológicos Relacionados ao Autismo INTRODUÇÃO Olá aluno (a), espero que esteja bem! Os desafios e possibilidades em torno da inclusão escolar do aluno com TEA são enormes, pois, além de ser uma criança que exige atendimento individualizado, são neces- sárias atenções e estratégias diversificadas, para que você, futuro professor (a) possa con- tribuir ativamente para a formação dessa criança, é necessário conhecer as características do TEA, suas limitações e possibilidades, através de muitos estudos, leituras e analises, para assim, conhecer um pouco mais dessa realidade, afinal, a educação inclusiva é um direto e está em todas as escolas. Nesta primeira unidade vamos estudar sobre o diagnóstico da criança com TEA. Em seguida, mergulharemos nos tipos de tratamento e intervenções mais utilizadas nas abordagens clínicas, além de compreender sobre os usos de hormônios, aprimoramento de funções comunicativas, clínicas psicanalíticas, procedimentos multiprofissionais e o uso de ambientes digitais de aprendizagem adaptados. Desejo a você um excelente estudo! Aproveite. 5UNIDADE I Aspectos Psicológicos Relacionados ao Autismo 1. DIAGNÓSTICO: RECONHECIMENTO E DETECÇÃO Diferente da meningite ou de uma infecção de garganta, o autismo não pode ser diagnosticado em laboratório. Como muitas síndromes psiquiátricas (depressão, transtorno obsessivo compulsivo, entre outros), o autismo é diagnosticado pela observação e avalia- ção do comportamento. Nesse sentido, muitas vezes, o diagnostico pode ser confuso, pois as observações e avaliações são subjetivas e os comportamentos variam de uma pessoa para outra (TEMPLE e PANEK, 2015, p. 26). Sabe-se que o Autismo é uma condição que afeta a vida de milhares de pessoas ao redor do mundo. O termo, vem do grego autós, que significa “de si mesmo”, foi empregado pela primeira vez pelo psiquiatra suíço Eugene Bleuler, em 1908, para descrever a fuga da realidade para um mundo interior observado em pacientes esquizofrênicos. No ano de 1940, o psiquiatra infantil Leo Kanner publicou o artigo “Autistic Distur- bances of Affective Contact” 1 na revista The Nervous Child. Apresentando estudos de caso de onze crianças, que, segundo ele, compartilhavam um conjunto de sintomas – que hoje sabemos estar relacionados ao autismo (TEMPLE e PANEK, 2015, p. 28). A mais notada era a incapacidade de se relacionar com pessoas, característica que distinguia de outras patologias como a esquizofrenia, por exemplo. Ele observou que as crianças apresentavam dificuldades em “adotar uma atitude antecipatória que assinalasse ao adulto a vontade de ser pego no colo (ex.: inclinar o rosto, estender os braços e após, acomodar-se ao colo); um “fechamento autístico extremo”, que levava a criança a negligen- ciar, ignorar ou recusar tudo o que vinha do exterior” (BOSA, 2002, p. 23). 1 Distúrbios autísticos do contato afetivo 6UNIDADE I Aspectos Psicológicos Relacionados ao Autismo O médico também observou um atraso no desenvolvimento da linguagem oral (em- bora não em todas as crianças), além das crianças não utilizarem a linguagem como instru- mento para receber e transmitir mensagens aos outros. A fala consistia principalmente para nomear objetos, cores, alfabeto, repetir canções, muitas vezes as palavras eram ouvidas e repetidas, as crianças também falavam em terceira pessoa (pronome reverso – falando de si mesma) (BAPTISTA e BOSA, 2002, p. 23). A entonação também não combinava com o contexto linguístico, (como responder com entonação de pergunta). As palavras também eram usadas em seu sentido literal, inflexíveis. A memória das crianças foi considerada excelente, principalmente a capaci- dade para recordar acontecimentos ocorridos há vários anos, decorar poemas, nomes, esquemas complexos e sequencias. “Kanner (1943) acreditava no bom potencial cognitivo dessas crianças, as quais mostravam fisionomias notadamente inteligentes” (BAPTISTA e BOSA, 2002, p. 23). Baptista e Bosa (2002) reforçam que, [...] para esse autor, a insistência obsessiva na manutenção da rotina, levan- do a uma limitação na variedade de atividades espontâneas, era uma das características chave no autismo. A isso somava-se a inabilidade no rela- cionamento interpessoal: “há nelas uma necessidade poderosa de não se- rem perturbadas. Tudo o que é trazido para a criança do exterior, tudo o que altera o seu meio externo ou interno representa uma intrusão assustadora.” (BAPTISTA e BOSA, 2002, p. 23-24). Ou seja, se algo em alguma situação é mudado, mesmo que seja um pequeno detalhe, a situação deixa de ser idêntica, não sendo mais aceita. Kanner (1943) assinalava que tudo que não sofria alterações quanto a aparência e posição, mantendo sua identidade era bem aceito pela criança, inclusive esses objetos eram de interesse, podendo passar horas brincando. Pois, segundo o especialista, conferia à criança uma sensação gratifi- cante de onipotência e controle, justificando porque as crianças ficavam em êxtase com a habilidade de fazer rodar objetos, ou até mesmo em seu próprio corpo, balançando-se e fazendo movimentos rítmicos. Hoje é compreendido que “o senso de previsibilidade e con- trole sobre as situações facilita a adaptação e a aprendizagem de indivíduos com autismo e têm implicações para intervenções” (BAPTISTA e BOSA, 2002, p. 24). Nessa mesma época, em 1944, Hans Asperger na Áustria, publica o artigo “Psi- copatologia autista da infância”, descrevendo quatro crianças com características seme- lhantes às descritas por Kanner (1943), inclusive usando o mesmo termo, autista, para descrever seus sintomas. Mesmo sendo publicados em anos próximos, as descrições só foram comparadas em 1981. (ASSUMPÇÃO e PIMENTEL, 2000). 7UNIDADE I Aspectos Psicológicos Relacionados ao Autismo As descrições de Asperger (1944) apresentaram características que não foram levantadas por Kanner, como a dificuldade das crianças que observava em fixar o olhar durante situações sociais, fez ressalvas sobre as peculiaridades dos gestos, carentes de significados e caracterizados por estereotipias. Em relação ao convívio social, Asperger enfatiza a forma ingênua e inapropriada das crianças em aproximar-se das pessoas. Notou, ainda, dificuldade dos pais em constatar comprometimentos nos três primeiros anos de vida da criança (BAPTISTA e BOSA, 2002, p. 25). SAIBA MAIS A primeira criança diagnosticada com autismo foi Donald, filho de Oliver Triplett Jr. e Mary. O pai enviou uma carta para o médico Leo Kanner, descrevendo detalhadamente os primeiros cinco anos de vida de seu filho. Ele relatou que seu filho parecia não querer ficar perto da mãe, e permanecia totalmente alheio a todos à sua volta, tinha ataque de raivas frequentes, e achava objetos giratórios infinitamente fascinantes. Mesmo com esses problemas de desenvolvimento, Donald apresentava talentos incomuns, com dois anos memorizou o salmo 23, cantou sozinho e com afinação perfeita músicas que havia ouvido de sua mãe uma única vez. Tinha ouvido absoluto. A revista BBC News Brasil encontrou Donald em 2007, com 82 anos, vivendoem sua própria casa, em uma pequena cidade onde todos os conheciam, tinha um Cadillac para percorrer as redondezas e um hobby: o golfe. Sozinho, ele rodou os Estados Unidos e conheceu outros países. Fonte: DONVAN, I. Z. Como toda uma cidade ajudou o primeiro menino diagnosticado com autismo a superar obstáculos e ser feliz. BBC News Brasil. Abril, 2016. Disponível em: https://www.bbc.com/por- tuguese/noticias/2016/04/160402_primeiro_menino_diagnostico_autismo_rb .Acesso em: 02 maio. 2021. https://www.bbc.com/portuguese/noticias/2016/04/160402_primeiro_menino_diagnostico_autismo_rb https://www.bbc.com/portuguese/noticias/2016/04/160402_primeiro_menino_diagnostico_autismo_rb 8UNIDADE I Aspectos Psicológicos Relacionados ao Autismo Os sintomas da criança com TEA raramente são perceptíveis durante os primeiros 6 meses de vida, e costumam surgir em torno dos oito a doze meses. Aproximadamente um terço das crianças que terão autismo apresentam desenvolvimento normal até o final da primeira infância. A severidade do transtorno varia de modo considerável, alguns conseguem de- senvolver a fala por exemplo, outros não. Independente, para a maioria “os desafios são contínuos ao longo de toda a vida, mas toda criança faz progressos e adquire habilidades, embora com ritmos muito variados” (BERNIER; DAWSON e NIGG, 2021). No período da década de 50, houveram muitos conflitos sobre a natureza do autis- mo, será que era desencadeado por fatores biológicos, sociais, de comportamento? A tese mais comum para responder essas perguntas era a que considerava o autismo um distúrbio que seria causado por pais emocionalmente distantes, hipótese criada por Leo Kanner (1943) chamada de “mãe geladeira”. No entanto, nos anos 60, crescem as evidências sugerindo que o autismo era um transtorno cerebral presente desde a infância e encontrado em todos os países e grupos socioeconômicos e étnico-raciais. Leo Kanner (1943) tentou se retratar e, mais tarde a teoria mostrou-se totalmente infundada (JUNIOR e PIMENTEL, 2000). 9UNIDADE I Aspectos Psicológicos Relacionados ao Autismo 2. TRATAMENTO E INTERVENÇÃO: PRINCIPAIS ABORDAGENS CLÍNICAS DO TEA De acordo com Klin (2006), as concepções de Leo Kanner (1943) passam a terem alterações a partir de Rivto (1978), que relaciona o autismo a um déficit cognitivo, consi- derando-o não como uma psicose, mas sim, um distúrbio do desenvolvimento.Klin (2006) pontua que Rivto (1978) propõe uma definição do autismo com base em quatro critérios: 1) atraso e desvio sociais não só como função de retardo mental; 2) problemas de comu- nicação, novamente, não só em função de retardo mental associado; 3) comportamentos incomuns, tais como movimentos estereotipados e maneirismos; e 4) início antes dos 30 meses de idade (KLIN, 2006, p. 64). 2.1 Principais abordagens clínicas, CID e DSM As controvérsias sobre a definição do autismo foram refletidas na própria história dos dois sistemas de classificação de transtornos mentais e de comportamento – CID (The International Statistical Classification of Diseases and Related Health Problems – ICD), publicados pela Organização Mundial da Saúde, e o Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais – DSM (Diagnostic and Statistical Manual for Mental Disease) da Asso- ciação Psiquiátrica Americana (APA). (JUNIOR; PIMENTEL, 2000). Os manuais citados acima são usados por clínicos como um sistema comum para diagnosticar saúde mental e transtornos do desenvolvimento. 10UNIDADE I Aspectos Psicológicos Relacionados ao Autismo O Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais (DSM) é um guia para diagnosticar uma ampla gama de condições que afetam a saúde mental e o desenvolvimento. Elaborado logo após a Segunda Guerra Mundial para padronizar a terminologia psiquiátrica, e atualmente publicado pela American Psychiatric Association (APA), o manual tem sido revisado de modo significa- tivo com o passar dos anos e, agora, inclui condições que afetam o desenvol- vimento do cérebro e o comportamento em crianças (BERNIER; DAWSON e NIGG, 2021, p. 10). Esses manuais fornecem as nomenclaturas e os critérios padrões para os diag- nósticos dos transtornos mentais estabelecidos. Historicamente, as controvérsias sobre o conceito de autismo estavam relacionadas a distinção entre autismo, psicose e esquizofre- nia. As primeiras edições do CID não fazem qualquer menção ao autismo. A oitava edição o traz como uma forma de esquizofrenia e a nona edição, como psicose infantil. Foi apenas na década de 80 que o autismo foi retirado da categoria de psicose ou esquizofrenia. Na terceira edição do DSM (DSM-III), a nomenclatura passou a ser “autismo infantil”. Em 1987, a APA publicou uma edição revisada (DSM-III-R) na qual o termo “trans- torno autista” foi apresentado com alguns critérios mais formalizados com base em novas análises estatísticas (BERNIER; DAWSON e NIGG; 2021). Em 1994 foi publicado o DSM-IV, mantendo o transtorno autista, mas unido a con- dições associadas sob o termo abrangente de “Transtornos Invasivos do Desenvolvimento” (TID). Tanto o CID-10 como o DSM-IV estabelecem como critério para o transtorno autista o comprometimento em três áreas principais: alterações qualitativas das interações sociais recíprocas; modalidades de comunicação; interesses e atividades restritos, estereotipados e repetitivos. (p. 28-29) Nessa qualificação estavam incluídos o transtorno autista, síndrome de Asperger e TID não especificado – esses três subgrupos se transformariam no futuro “espectro”, além de síndrome de Rett e o transtorno desintegrativo da infância. “Assim, por quase duas décadas, de 1994 a 2013, tentamos estudar e tratar o autismo dentro de três subcategorias oficiais: transtorno autista, síndrome de Asperger e TID” (BERNIER; DAWSON e NIGG, 2021, p. 10). Atualmente o Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais está em sua quinta edição – DSM-V, publicado em 2013. Nessa nova versão as subcategorias foram eliminadas, como a síndrome de Asperger versus transtorno autista, passando a ser um único transtorno do espectro autista, “ampliando os critérios para autismo e simplificando a tarefa diagnóstica do clínico.” (p.11) Os critérios atuais continuam os mesmos, desafios de comunicação e interação social e comportamentos restritos e/ou repetitivos que aparecem no início da vida e causam prejuízos significativos. 11UNIDADE I Aspectos Psicológicos Relacionados ao Autismo QUADRO 1 – ANTIGA CLASSIFICAÇÃO VERSUS ATUAL CLASSIFICAÇÃO DOS TRANSTORNOS INVASIVOS DO DESENVOLVIMENTO Fonte: A autora (2021). No DMS-V o autismo está no grupo de transtornos do neurodesenvolvimento, re- cebendo o nome de Transtorno do Espectro Autista (TEA). Assim, o TEA é definido como um “distúrbio do desenvolvimento neurológico que deve estar presente desde a infância, apresentando déficit nas dimensões sociocomunicativa e comportamental” (JUNIOR e KUCZYNSKI, 2015, p. 13). De acordo com o DMS-V, o TEA se caracteriza por um quadro clinico com prejuízos na interação social, nos comportamentos não verbais, dificuldade no contato visual, na postura e na expressão facial, perdas na comunicação (verbal e não verbal) podendo existir atraso ou ausência da linguagem. O DSM-V descreve também o uso da linguagem e com- portamentos estereotipados (como correr em círculos, sacudir uma mãozinha, movimentar os braços como que batendo asas), a dificuldade no estabelecimento de relações sociais, preferindo realizar suas atividades sozinhas, o que acarreta em obstáculos para iniciar ou manter relações sociais. “possuem dificuldades com a teoria da mente, que é a capacidade de entender o que o outro sente ou colocar-se no lugar dele, pouco compreendendo ex- pressões faciais” (MEDEIROS D.; MEDEIROS T. e MEDEIROS D., 2021). O DMS-V divide o TEA em graus: nível 3, nível 2 e nível 1. 12UNIDADE I Aspectos Psicológicos Relacionados ao Autismo TABELA 1 – GRAUSDO AUTISMO Gravidade do TEA Comunicação Social Comportamentos repetitivos e interesses restritos Nível 3 “exigindo apoio muito substancial” Graves déficits em comunicação verbal e não verbal, ocasionando graves prejuízos no funcionamento social; interações sociais muito limitadas e mínima resposta social ao contato com outras pessoas, Preocupações, rituais imutáveis e comportamentos repetitivos que interferem muito no funcionamento em todas as esperas. Intenso desconforto quando rituais ou rotinas são interrompidas, com grande dificuldade no redirecionamento dos interesses ou de dirigir para outros rapidamente. Nível 2 “exigindo apoio substancial” Graves déficits em comunicação social verbal e não verbal que surgem sempre, mesmo com suportes, em locais limitados. Ob- servam-se respostas reduzidas ou anomalias ao contato social com outras pessoas. Preocupações ou interesses fixos frequentes, óbvios a um observa- dor casual, e que interferem em vários contextos. Desconforto e frustação visíveis quando rotinas são interrompidas, o que dificulta o redirecionamento dos interesses restritos. Nível 1 “Exigindo apoio” Sem suporte local, o déficit social ocasiona prejuízos. Dificuldades em iniciar relações sociais e claros exemplos de respostas atípicas e sem sucesso no relacionamento social. Observa-se interesse dimi- nuído pelas relações sociais. Rituais e comportamentos repetiti- vos interferem, de modo acentua- do, no funcionamento em vários contextos. Resiste às tentativas de interrupção dos rituais e ao redi- recionamento de seus interesses fixos. Fonte: SCHMIDT, 2014, p. 11. Os autores Baptista e Bossa (2002) lembram que independente do sistema de classificação ou a abordagem teórica usada para o TEA, as crianças com autismo irão apresentar dificuldades nos relacionamentos, na linguagem-comunicação, na capacidade simbólica e comportamentos estereotipado. Os estudos iniciais de Kanner e Asperger foram fundamentais e alguns aspectos são utilizados até hoje. 13UNIDADE I Aspectos Psicológicos Relacionados ao Autismo Finalmente, cabe ressaltar a mudança na forma de conceber o autismo, passando da condição de “doença” com identidade definida e distinta dos quadros envolvendo problemas orgânicos para a de “síndrome” (conjunto de sintomas). Dessa forma, quando se fala em transtornos ou síndromes autís- ticas, quer-se designar a “tríade de comprometimentos” independentemente da sua associação com aspectos orgânicos. Em outras palavras, a síndro- me do autismo identifica um perfil comportamental com diferentes etiologias (GILLBERG, 1990 apud BAPTISTA e BOSSA, 2002, p. 31). Os cientistas acreditam que o autismo ocorre ao longo de um espectro porque suas características assumem diversas formas, e que os caminhos causais para isso são distintos, envolvendo diferentes sistemas biológicos e diferentes contribuições genéticas e ambientais. Reconhecer o autismo em um amplo espectro permite que os clínicos possam usar imagem cerebral, genética e outras abordagens cientificas para entender a variabili- dade do TEA. Além de, com essas informações é possível “elaborar planos de tratamentos que irão beneficiar uma população diversificada no espectro e planejar intervenções ino- vadoras e que, por fim, serão mais individualizadas para determinada criança” (BERNIER; DAWSON e NIGG, 2021, p. 12). 2.2 Epidemiologia – Estudo da difusão do autismo O número de crianças diagnosticadas com autismo tem aumentado a cada ano, de acordo com um estudo realizado nos Estados Unidos - Autism and Developmental Disabilities Monitoring (ADDM), a prevalência de TEA em crianças de 8 anos nos Estados Unidos aumentou de 1/150 no ano de 2000, para 1/88 em 2008 e 1/68 no ano de 2012. No Brasil, em 2010, a estimativa foi de 500 mil autistas9. O TEA é diagnosticado em todos os grupos raciais, étnicos e socioeconômicos. No Brasil, em 2010, a estimativa foi de 500 mil autistas. O TEA é diagnosticado em todos os grupos raciais, étnicos e socioeconômicos (ALMEIDA; MAZETE; BRITO e VASCONSELOS, 2018, p. 72). No Reino Unido a prevalência de crianças com autismo é de 4 a 5 a cada 10 mil crianças, porém, esse número aumenta de 15 a 20 em cada 10 mil se as características autistas no que se refere a “tríade” forem incluídas (social, comunicação e atividades res- tritas/repetitivas). No Brasil considerando apenas a forma típica da síndrome cerca de 600 mil pessoas possuem TEA (BOSA, 2002, p. 31). O número de meninos com autismo é maior do que meninas, em uma proporção de 2 a 3 homens para 1 mulher. Os autores também apresentam um aumento em crianças diagnosticadas com a autismo, sendo que em 2005, a partir das análises sobre as publica- ções do TEA, o número de crianças era aproximadamente de 60 para cada 10 mil. Em 2009 esse número passou de 70 para cada 10 mil crianças. Porém não há como esses números serem exatos (JUNIOR e KUCZYNSKI, 2015, p. 12). 14UNIDADE I Aspectos Psicológicos Relacionados ao Autismo A chance de o irmão de uma criança autista também ser é 20 vezes maior, pois a prevalência passa de 0,5% para 10,1%. Se dois irmãos tiverem TEA, a chance do terceiro ter vai para 25%. Do número total de autistas, entre 30% e 50% possuem deficiência inte- lectual. O TEA também pode estar associado a um transtorno mental, em aproximadamente 70%. O risco de epilepsia entre autistas é maior entre aqueles com deficiência intelectual (ALMEIDA; MAZETE; BRITO e VASCONSELOS, 2018, p. 72). 2.3 Modalidades terapêuticas Cada criança com TEA irá apresentar necessidades e habilidades individualizadas, que precisam estar de acordo com a funcionalidade, dinâmica familiar e quantidade de recursos que podem ser oferecidos, por isso, é necessária uma avaliação terapêutica per- sonalizada, possibilitando um plano individual de intervenção. Veremos posteriormente2 em nossos estudos de maneira mais aprofundada como esses diagnósticos podem ser obtidos. O modelo terapêutico Denver de Intervenção precoce para Crianças Autistas, tra- balha com estimulação intensiva e diária baseada em Análise do Comportamento Aplicado (ABA)3 visando promover interações sociais positivas e naturalistas com objetivo de aumen- tar a motivação da criança para as competências sociais, aprendizagem e desenvolvimento da comunicação receptiva e das habilidades cognitivas e motoras (SPB, 2019). Ou seja, ABA é uma ciência que analisa o comportamento, o modelo Denver enqua- dra-se dentro do ABA, porém a maneira de aplicar o método é mais naturalista. A terapia ABA é uma intervenção que tem mostrado bastante efetiva para tratamento de crianças com TEA. A Estimulação Cognitivo Comportamental baseada no ABA é um programa com- portamental, reconhecido e muito utilizado que busca desenvolver habilidades sociais e comunicativas, partindo das estratégias de reforço. A sociedade Brasileira de Pediatria (2019) apresenta outros tipos de modelos tera- pêuticos, como, O “Coaching Parental”, que tem como princípio orientar familiares e pais, na busca de estratégias para o comportamento dos cuidadores, adequações de rotina e correspon- sabilização para estimulação da criança. O método Picture Exchange Communication System ou em português Sistema de Comunicação por Troca de Figuras (PECS) é um método alternativo de comunicação por meio de troca de figuras, gestos, sinais e símbolos para pessoas com TEA que não desen- volvem a linguagem verbal, como para aqueles que apresentam dificuldades ou limitação na fala. Nessa abordagem, a criança pode escolher a imagem que representa o objeto pretendido por ela e dar nas mãos do profissional para que o mesmo a entregue o objeto físico, permitindo a comunicação da criança dentro do contexto social. 2 No capítulo IV da nossa apostila, intitulado “Avaliação, diagnóstico e tratamento” 3 Em inglês o termo é Applied Behavior Analysis 15UNIDADE I Aspectos Psicológicos Relacionados ao Autismo O desenho pode ser linear em preto e brancoou colorido, apresentado atra- vés de fotografias, devendo estar ao alcance da criança em qualquer ambien- te de sua casa, podendo, ainda, ser utilizado um feltro para prender a figura no quadro (LOCATELLI e SANTOS, 2016, p. 210). O Treatment and Education of Autistic and Related Communication Handcapped Children ou Tratamento e Educação para Crianças Autistas e com outros prejuízos na comunicação (TEACCH) é um programa que combina diferentes materiais visuais para organização do ambiente físico por meio de rotinas e sistemas de trabalho, tornando o ambiente mais compreensível, esse método visa a independência e o aprendizado, sendo bastante utilizado no campo da educação. A Terapia de integração sensorial é para crianças com TEA que apresentam alte- rações no processamento sensorial, para ocorrer precisa envolver a equipe de saúde, a equipe pedagógica e a família. As estratégias utilizadas podem envolver os recursos de um acompanhante terapêutico e também aparelhos de alta tecnologia, como jogos e aplicativos elaborados especialmente para o desenvolvimento das habilidades comunicativas. REFLITA Você já parou para pensar sobre os custos e acessos das terapias e intervenções neces- sárias para crianças com TEA? Muitas famílias encontram dificuldades para tratamentos. Fonte: Sem cura e com tratamento caro, autismo é desafio para pais e instituições sociais. Profissão repórter, g1. 2019. Disponível em: https://g1.globo.com/profissao-reporter/noticia/2019/06/20/sem- -cura-e-com-tratamento-caro-autismo-e-desafio-para-pais-e-instituicoes-sociais.ghtml.Acesso em: 27 set. 2021. https://g1.globo.com/profissao-reporter/noticia/2019/06/20/sem-cura-e-com-tratamento-caro-autismo-e- https://g1.globo.com/profissao-reporter/noticia/2019/06/20/sem-cura-e-com-tratamento-caro-autismo-e- 16UNIDADE I Aspectos Psicológicos Relacionados ao Autismo Os tratamentos para TEA que estão baseados empiricamente (ou seja, na ciência) para trabalhar com as questões centrais do autismo – desafio na comunicação social e os comportamentos repetitivos e restritos são os que estão baseados no comportamento, ou seja, são aqueles que se fundamentam nos princípios da ABA (BERNIER; DAWSON e NIGG, 2021, p. 95). De acordo com esses autores: Por exemplo, reforço positivo se refere ao princípio de que, quando um com- portamento é seguido por uma recompensa, com todas as outras coisas sen- do iguais, há mais probabilidade de que ele seja repetido. Igualmente, quan- do nenhuma recompensa é oferecida após um comportamento, este tende a desaparecer com o tempo. As terapias comportamentais usam esses princí- pios simples de aprendizagem para promover habilidades de comunicação social e reduzir comportamentos problemáticos, até que, um dia, os novos comportamentos de alguma forma se tornem, até certo ponto, automáticos ou naturais para a criança. Os princípios podem ser simples, e o tratamento pode realmente funcionar – mas a aplicação requer grande habilidade, pois você deve saber o que é motivador para determinada criança e quais estraté- gias serão mais efetivas (BERNIER; DAWSON e NIGG, 2021, p. 95). De acordo com Bernier, Dawson e Nigg (2021) a plasticidade do cérebro é a res- ponsável para que as intervenções baseadas no comportamento melhorem as condições de comunicação social e reduzem os comportamentos desafiadores e disruptivos. TABELA 2 - ABA: TRATAMENTOS COMPORTAMENTAIS QUE TIRAM PROVEITO DA PLASTICIDADE DO CÉREBRO ABA significa “análise comportamental aplicada”. A maioria dos tratamentos baseados empiricamente usa os princípios da ABA, mesmo intervenções baseadas no jogo, como a ESDM. Os princípios da ABA incluem as regras que regem como ocorre a aprendizagem. Por exemplo, o reforçamento positivo está baseado no princípio de que, quando um comportamento é seguido por uma recompensa, ele terá mais probabilidade de ser repetido. Igualmente, quando retiramos uma recompensa depois de um comportamento, esse comportamento tende a se extinguir ou a enfraquecer com o tempo. Assim, terapias ABA são aquelas que usam esses princípios para promover comportamentos desejados (como a interação social) e reduzir comportamentos problemáticos (como explosões agressivas). Fonte: BERNIER; DAWSON e NIGG, 2021, p. 107. 17UNIDADE I Aspectos Psicológicos Relacionados ao Autismo É importante enfatizar que independentemente do método utilizado para interven- ção da criança com TEA é necessário levar em conta as necessidades individuais de cada um. Os tipos de especialidades variam, assim como os níveis de intensidade. Por exemplo, um autista entre severo e moderado aprenderá a engolir a saliva em um tratamento com fonoaudiólogo, enquanto um autista leve poderá trabalhar a modulação do tom de voz, me- lhorar sua capacidade de verbalizar as palavras. Diante disso, fica claro que as estratégias de tratamento precisam ser planejadas de acordo com as necessidades da criança. 18UNIDADE I Aspectos Psicológicos Relacionados ao Autismo 3. INTERVENÇÕES FREQUENTES: USO DE HORMÔNIOS, APRIMORAMENTO DE FUNÇÕES COMUNICATIVAS, INTERVENÇÕES CLÍNICAS PSICANALÍTICAS, PROCEDIMENTOS MULTIPROFISSIONAIS, USO DE AMBIENTES DIGITAIS DE APRENDIZAGEM ADAPTADOS A Sociedade Brasileira de Pediatria (2019) retrata que ainda não há tratamentos farmacológicos para os sintomas centrais do TEA. Em adultos existem dados que compro- vam o uso de agentes serotoninérgicos ajudam nos comportamentos repetitivos. Os antipsicóticos risperidona e aripiprazol mostraram uma modesta eficácia no manejo de comportamentos repetitivos, esses são os únicos medicamentos com indicação da Food and Drug Administration dos Estados Unidos para os sintomas relacionados ao TEA. Mostraram-se eficazes na redução de alguns comportamentos como a automutilação e a agressão, sintomas que podem interferir drasticamente na aprendizagem de outras habilidades. O uso da ocitocina mostrou uma importante ação para pacientes com déficits de cognição social, porém os estudos ainda não são randomizados em grande escala em longo prazo. Nesse sentido, a SBP (2019) reforça que: [...] para cada comorbidade, apesar de não existir medicação para os sinto- mas centrais do TEA, pode- -se tentar um tratamento farmacológico a fim de melhorar comportamentos específicos e assim trazer algum benefício para os sintomas centrais e ajudar na intervenção da equipe interdisciplinar. Comor- bidades importantes de tratamento são ansiedade, movimentos repetitivos estereotipados, sintomas do transtorno obsessivo-compulsivo, impulsividade, depressão, oscilações no humor, agitação, hiperatividade e agressividade (SBP, 2019, p. 18). 19UNIDADE I Aspectos Psicológicos Relacionados ao Autismo Os remédios que podem ser usados para tratar essas comorbidades são os antie- piléticos, antipsicóticos atípicos, estimulantes do sistema nervoso central, antidepressivos e estabilizadores de humor. Alguns estudos ainda novos têm como proposta terapêutica o uso de esteroides, porém, os primeiros resultados foram encorajadores. Há também propostas de intervenção nutricional, como as dietas de isenção de glúten e/ou caseína e a suplementação de vita- minas e ômega-3 (SPB, 2019, p.18). Todos os medicamentos citados podem apresentar efeitos colaterais, por isso é im- prescindível que eles sejam usados com acompanhamento e em consulta com um médico especializado no transtorno. Em alguns casos a criança com TEA não irá apresentar sintomas que necessitam de tratamento com psicofármacos. O uso da melatonina tem sido associado a melhorar o sono das crianças que possuem dificuldade nesse aspecto, o que tem acarretado em melhoras no comportamento diurno. Alguns probióticos estão sendo utilizados com base no eixo cérebro-intestino na busca de restaurar a microbiota de pacientes com TEA que apresentam distúrbios gastrointestinais ligados a disbiose, que pode contribuir para os qua- dros de irritabilidade, raiva, comportamentosagressivos e distúrbios do sono (ALMEIDA; MAZETE; BRITO e VASCONSELOS, 2018, p. 77). 3.1 Procedimentos multiprofissionais Já vimos que o TEA possui uma complexa natureza etiológica, por isso, para o tratamento apresentar os melhores resultados é necessário que a criança seja incluída em equipes de reabilitação interdisciplinar, com especialistas de várias áreas, como, psi- copedagogos, médicos, fonoaudiólogos, terapeutas ocupacionais, psicólogos, terapeutas comportamentais. Mesmo o autismo sendo um comprometimento permanente, a maioria dos indiví- duos apresentam melhoras no relacionamento social, na comunicação e nas habilidades de autocuidado quando crescem. Entre vários fatores que acarretam essa melhora, desta- cam-se a presença de alguma linguagem de comunicação perto dos cinco ou seis anos de idade, o nível intelectual não-verbal, a gravidade da condição e a resposta à intervenção educacional (KLIN, 2006). Esses ganhos acontecem geralmente quando a criança frequenta a escola primária e principalmente quando são feitas intervenções estruturadas, individualizadas e intensivas (KLIN, 2006). É necessário, acima de tudo: 20UNIDADE I Aspectos Psicológicos Relacionados ao Autismo saber o que tratar, tendo claro o papel de cada profissional numa equipe inter- disciplinar, em que tal criança ou adolescente sejam observados, tratados e conduzidos mediante olhares aconselhadores para a otimização de sua rede neural (SCHMIDT, 2014, p. 37). Além disso, pais, profissionais e pacientes precisam estar em sintonia, com os mesmos objetivos, além da escola em que a criança frequenta. Para Schmidt (2014, p. 37) essa sintonia perpassa os profissionais do corpo docente da escola, chegando até os colegas, “que muitas vezes, por desconhecer o que de fato ocorre com esse aluno incluído, o submetem ao papel de vitimizado (bullying). 3.2 Intervenções clínicas psicanalíticas Você já viu nessa unidade que o autismo já foi considerado esquizofrenia ou psi- cose. Na análise dos autores Junior e Francisco (1997) compreende-se por psicose um distúrbio maciço da realidade, envolvendo uma desorganização da personalidade. Já as primeiras definições de esquizofrenia, foi demência precoce e depois alterações especificas no pensamento, nos sentimentos e nas relações com o mundo externo, as vezes crônico ou com ataques intermitentes. Como dito anteriormente, Kanner (1943) destacou o comportamento dos familiares das crianças autistas que observou, relatando uma certa frieza nas relações entre os casais e os filhos. Para o autor, tanto questões inatas (biológicas) como a qualidade nas relações parentais (fatores ambientais) são consideradas. Vários teóricos psicanalistas apresentam propostas de explicação para o autismo, Margareth Mahler foi quem estudou as psicoses infantis, descrevendo as psicoses autísti- cas e simbióticas de desenvolvimento, a psicanalista Melanie Klein (1965) também auxiliou na compreensão das raízes históricas dos termos psicose e esquizofrenia ao autismo (JUNIOR e PIMENTEL, 2000). Mahler (1975) teve grande importância, segundo Kanner (1943) para as investiga- ções clínicas, em que propõe dois tipos de psicose infantil, o autismo infantil – em que a mãe é percebida como representante do não eu e a psicose simbiótica, em que a mãe não é percebida como distinta, mas sim confundindo com ele. Para Klein (1965 apud BOSA e CALLINAS) o autismo era explicado em termos de inibição do desenvolvimento: cuja angustia decorria do intenso conflito entre instinto de vida e de morte. Supunha, tal como Kanner (1943), que tal inibição seria de origem constitu- cional a qual, em combinação com as defesas primitivas e excessivas do ego, resultaria no quadro autista. O bloqueio da relação com a realidade e do de- senvolvimento da fantasia, que culminaria com um déficit na capacidade de simbolizar, seria então, central à síndrome (BOSA e CALLIAS, 2000, p. 169). 21UNIDADE I Aspectos Psicológicos Relacionados ao Autismo Diante disso, o tratamento psicanalítico busca oferecer condições para que a crian- ça autista constitua a noção dela mesma e dos outros, os fatores de desenvolvimento seja na fala ou cognitivo não atrapalham essa relação analítica da criança autista. O método psi- canalítico leva em conta dois aspectos distintos, a singularidade de cada relação analítica e as peculiaridades do mundo interno de uma criança em desenvolvimento (CAMARGOS e WALTER, 2005). 3.3 Uso de ambientes digitais de aprendizagem adaptados O questionamento sobre o uso de tecnologia na vida das crianças é tema cada vez mais recorrente, perguntas como “será que se meu filho jogar determinado jogo no videogame irá ficar violento?”, ou “tem problema o meu filho assistir tv a noite antes de dormir?”. No caso das crianças com TEA também há dúvidas e questões sobre o uso da tecnologia, tanto para aspectos positivos, como negativos. Os avanços da tecnologia oferecem uma promessa para novos tipos de diagnós- ticos e tratamentos para TEA, porém, “a interação genuína sempre será a melhor maneira de engajar as crianças e ajudá-las a se desenvolver e aprender” (BERNIER; DAWSON e NIGG, 2021, p. 182). Nada substitui a interação com o outro. Os autores destacam alguns estudos realizados nos Estados Unidos em que crian- ças com TEA usam a mídia eletrônica sem interação com os pais ou cuidadores, ou seja, estão assistindo TV ou usando outras mídias sozinhas, sendo uma experiencia menos social do que para outras crianças que fazem isso com a família. Diante dos estudos é possível afirmar que as crianças com TEA usam as mídias eletrônicas de maneira diferente dos demais. “Para crianças com autismo, o tempo de tela é frequentemente uma atividade solitária, menos orientada socialmente do que para outras crianças” (BERNIER; DAWSON e NIGG, 2021, p. 183). A comunicação aumentativa e alternativa (CAA) é uma ampla categoria de inter- venções projetadas para auxiliar a linguagem e a comunicação por meio de sinais visuais ou auditivos. Ela investiga o autismo desde a década de 1980, e suas primeiras abordagens incluíam ensinar as crianças a usarem placas gráficas, uma pessoa apontava para um símbolo na placa para se comunicar ou entre- gava um símbolo gráfico em troca de uma atividade ou objeto. Por exemplo, se uma criança queria um copo de leite, ela puxava sua placa gráfica cheia de imagens de objetos e atividades e simplesmente apontava para a figura do copo de leite (BERNIER; DAWSON e NIGG, 2021, p. 196). 22UNIDADE I Aspectos Psicológicos Relacionados ao Autismo Já vimos que essa abordagem com figuras apresenta o nome de Sistema de Comunicação por Troca de Figuras (PECS), e pode ser eficaz no apoio à comunicação, porém, os autores destacam que crianças que usam PECS para se comunicarem não usam a linguagem verbal mais efetivamente após a prática. “Pesquisas mostraram que a CAA pode ajudar seu filho a comunicar o que deseja e precisa no momento, mas não promove seu uso da linguagem falada posteriormente” (BERNIER; DAWSON e NIGG, 2021, p. 196). Diante dessa breve discussão os autores concluem que os novos métodos de tec- nologia para o tratamento de autismo são fascinantes e alguns muito promissores, porém, a maioria não apresenta comprovação de benefícios para serem colocados em prática. Sabemos que as telas vieram para ficar, porém, é importante saber o que a criança está tendo acesso, além de ter consciência de que restringe as oportunidades de interação social direta. 23UNIDADE I Aspectos Psicológicos Relacionados ao Autismo CONSIDERAÇÕES FINAIS Nesta unidade nós vimos sobre o conceito histórico do autismo, e o longo caminho de estudos percorridos até o momento. O autismo é uma síndrome intrigante, desafiando o conhecimento sobre a natureza humana. Sua definição sofreu alterações no CID e também no DSM no decorrer dos anos, são desdobramentos nos critérios e instrumentos de diag- nósticos da etiologia multifatorial,incluindo fatores genéticos, ambientais e epigenéticos que colocam o TEA em uma posição de destaque nos últimos anos. As possibilidades de intervenção para TEA são inúmeras e o trabalho da equipe multidisciplinar é fundamental para o desenvolvimento da criança. O aumento do número de crianças diagnosticadas com TEA nos oferece um cenário futuro em que todas as insti- tuições deverão criar condições para trabalhar com essas crianças. Na próxima unidade veremos como cada profissional da equipe multidisciplinar contribui para o desenvolvimento da criança com TEA, além dos aspectos teóricos e práti- cas da avaliação diagnóstica na educação, estudos que contribuirão ainda mais para o seu conhecimento e formação. Te encontro lá! 24UNIDADE I Aspectos Psicológicos Relacionados ao Autismo MATERIAL COMPLEMENTAR LIVRO Título: Um antropólogo em Marte Autor: Oliver Sacks. Editora: Companhia das Letras. Sinopse: Escrito pelo neurologista anglo-americano Oliver Sacks, baseado em seis estudos de casos clínicos extraordinários do autor sobre indivíduos com condições neurológicas paradoxais, e como esses indivíduos cujas vidas muitas vezes são pressionadas com situações limites, trágicas e dramáticas podem nos ajudar a compreender melhor o que somos, podendo nos levar a um estado de desenvolvimento pessoal e profissional. FILME / VÍDEO Título: Arthur e o infinito Ano: 2012. Sinopse: Marina e César são os pais de duas crianças, Sofia de 10 anos e Arthur, de 6 anos. Quando Arthur tinha um ano e meio de idade, começou a apresentar um comportamento diferente das outras crianças, como por exemplo a sua comunicação era precária, parecia não ouvir quando seus pais o chamavam e quase não tinha contato visual. Essas características levaram os pais a procurarem médicos e especialistas. A longa busca dos pais só terminou quan- do Arthur completou seis anos, e foi diagnosticado como autista. Marina sente maior responsabilidade sobre o menino e decide se dedicar unicamente a tentar desenvolve-lo o máximo possível. A família passará por momentos difíceis e desafiadores, onde Marina colocará em questão a sua capacidade de lidar com seu filho. Link do vídeo: https://www.youtube.com/watch?v=33Fv3_0s0rE 25 Plano de Estudo: ● A importância da presença de uma equipe multidisciplinar: Terapeuta ocupacional, Psicólogo, Neuropsicólogo, Fonoaudiólogo, Educador, psicopedagogo; ● O diagnóstico e as intervenções necessárias; ● Compreender os profissionais da equipe multidisciplinar: Terapeuta Ocupacional e fisioterapia: a importância da psicomotricidade; ● Estabelecer a importância do psicólogo e do neuropsicólogo na intervenção da criança com TEA; ● O papel do fonoaudiólogo, do educador e psicopedagogo; ● Aspectos teóricos e práticos da avaliação diagnóstica e multidisciplinar na educação. Objetivos da Aprendizagem: ● Compreender a importância da equipe multidisciplinar; ● Contextualizar algumas áreas profissionais que fazem parte da equipe multidisciplinar, como, Terapeuta ocupacional, Psicólogo, Neuropsicólogo, Fonoaudiólogo, Educador, psicopedagogo; ● Estabelecer a importância do diagnóstico e ● das intervenções realizadas a partir dele. UNIDADE II Equipe Multidisciplinar Professora Me. Larissa Kühl Izidoro Pereira 26UNIDADE I Aspectos Psicológicos Relacionados ao Autismo 26UNIDADE II Equipe Multidisciplinar INTRODUÇÃO Olá, tudo bem? Você viu brevemente na Unidade I sobre a equipe multidisciplinar na intervenção do TEA, nesta unidade, vamos aprofundar esse assunto. Você irá conhecer cada profis- são que engloba a equipe multidisciplinar, que são: o Terapeuta ocupacional, Psicólogo, Neuropsicólogo, Fonoaudiólogo, Educador, Psicopedagogo entre outros. Você vai perceber como o trabalho de cada profissional é fundamental para o TEA. Para melhor compreensão das áreas você irá estudar sobre os aspectos teóricos e práticos da avaliação diagnóstica e multidisciplinar na educação. Desejo a você um ótimo estudo! 27UNIDADE I Aspectos Psicológicos Relacionados ao Autismo 27UNIDADE II Equipe Multidisciplinar 1. A IMPORTÂNCIA DA PRESENÇA DE UMA EQUIPE MULTIDISCIPLINAR: TERAPEUTA OCUPACIONAL, PSICÓLOGO, NEUROPSICÓLOGO, FONOAUDIÓLOGO, EDUCADOR, PSICOPEDAGOGO Como você já sabe, o Transtorno do Espectro Autista possui uma complexa natureza etiológica, e como explicado brevemente na unidade I, a equipe multidisciplinar faz toda dife- rença na aprendizagem e desenvolvimento da criança com TEA. As abordagens multidiscipli- nares precisam ser efetivadas, visando não somente a questão educacional e da socialização, mas também a questão médica e a tentativa de estabelecer quadros clínicos bem definidos, com princípios precisos e abordagens terapêuticas eficazes (JUNIOR e PIMENTEL, 2000). Com maior precisão de diagnóstico, resultadas das pesquisas clínicas, um “grande número de sub síndromes ligadas ao complexo “autismo” devem ser identificadas nos pró- ximos anos, de forma que os conhecimentos sobre a área aumentem de modo significativo em um futuro próximo” (JUNIOR e PIMENTEL, 2000, p. 39). Os autores também reforçam sobre como o desenvolvimento dessas pesquisas biológicas e cognitivas podem contribuir de forma efetiva para pouco a pouco o autismo ser melhor compreendido e analisado. Enfatizando que apenas com uma visão médica, a partir de modelos científicos claros é que “poderemos contribuir para o estudo da questão, ao mesmo tempo em que nos dispomos a pensar realisticamente o problema dessa população afetada” (JUNIOR e PIMENTEL, 2000, p. 39). 28UNIDADE I Aspectos Psicológicos Relacionados ao Autismo 28UNIDADE II Equipe Multidisciplinar Outro ponto a destacar é que as terapias sem objetivo bem definido trazem pouco ou nenhum resultado. É fundamental que o tratamento seja feito em conjunto, em que, médicos, família, escola e demais terapias necessárias para o paciente com TEA estejam em plena sintonia. Os autores Silvia; Gaiato e Reveles (2012, p. 106) apresentam alguns pontos importantes para que a criança autista tenha um bom desenvolvimento. Eles chamam de “10 mandamentos para o bom desenvolvimento da criança com autismo” apresentados no quadro abaixo. TABELA 1 - 10 MANDAMENTOS PARA O BOM DESENVOLVIMENTO DA CRIANÇA COM AUTISMO 1. Tratamento individualizado A criança com autismo necessita passar por uma avaliação multidisciplinar e ter cada uma das suas áreas de comprometimento investigada de manei- ra criteriosa pelos profissionais. Somente a partir disso é que o planejamento terapêutico será esta- belecido. A única maneira de se tratar uma criança com autismo é com personalização das atividades e dos treinos. Cada criança tem maior ou menor fa- cilidade com alguma área, por isso não precisamos perder tempo com aquilo que ela já domina. Cada sessão da terapia deve ser pensada e moldada especificamente para aquela criança, sempre com foco em avanços para as próximas etapas. 2. Currículo adaptado É importante que as crianças com autismo estejam na escola e participem dela integralmente. Diversas atividades podem ser adaptadas para que ela faça as mesmas atividades dos colegas em sala de aula. Assim, ela se sentirá melhor e mais estimulada. Provavelmente a criança com autismo precisará de outros recursos para aprender as mesmas coisas que os demais alunos. A confecção de materiais concretos e visuais personalizados pode garantir uma verdadeira inclusão. Para personalizar as atividades escolares, podemos lançar mão de variados recursos: dividi-las em pequenas etapas, traduzi-las em figuras para melhor compreensão do conteúdo escolar, dentre outros. 29UNIDADE I Aspectos Psicológicos Relacionados ao Autismo 29UNIDADE II Equipe Multidisciplinar 3. Hiper investimento em comunicação O treino em comunicação é muito importante e, para isso, é preciso empregar o maior número possível de recursos, e agir com rapidez. O inves- timento nessa área trará consequências sociais muito positivas, jáque a criança conseguirá intera- gir e entender melhor seus pares. Mesmo que ela encontre dificuldades, a estimulação na linguagem jamais deve ser interrompida. Se a criança não conseguir desenvolver uma linguagem falada, ou- tras estratégias devem ser traçadas para garantir que ela consiga se expressar, como, por exemplo, comunicação por trocas de figuras. 4. Ensino sistematizado e estruturado Na escola, a criança que possui menos dificulda- des que devem ser acompanhadas e amparadas, caso precise de algum reforço. Porém, aquela com autismo mais grave precisa de um ensino sistema- tizado, com estruturação de suas atividades e de sua rotina, e pautado em técnicas cientificamente comprovadas. Os professores devem ser orienta- dos e preparados tanto pedagógica quanto psico- logicamente. 5. Engajamento (mínimo de 20 horas semanais) Estudos científicos têm mostrado que, além do pe- ríodo escolar, a criança com autismo deveria passar por mais quatro a cinco horas por dia em terapias e treinamentos. Estes podem ser realizados tanto por profissionais especializados em cada área quanto pelos pais, quando bem-orientados. 6. Práticas adequadas para o desenvolvimento A utilização de todos os recursos disponíveis rela- cionados a socialização, aquisição de linguagem e comunicação, e adequação de comportamentos deve ser feita para garantir o bom desenvolvimento dessa criança. Para isso, a família deve contar com uma rede de apoio social de modo que consiga co- locar em prática as habilidades aprendidas. 30UNIDADE I Aspectos Psicológicos Relacionados ao Autismo 30UNIDADE II Equipe Multidisciplinar 7. Contato com crianças “típicas” (sem autismo) A observação e a imitação são pré-requisitos so- ciais. É importante que a criança tenha em seu ambiente modelos típicos para aprender e imitar. O contato com crianças “típicas” propicia estimula- ções diferentes daquelas obtidas em terapia. 8.Atividades físicas A criança deve ter acesso irrestrito às práticas es- portivas e de lazer, nas quais consiga desenvolver sua motricidade e coordenação motora de maneira adequada. Além disso, as práticas esportivas são um bom caminho para ter acesso à socialização. 9.Envolvimento familiar A criança com autismo só consegue se desenvolver se estiver verdadeiramente integrada no ambiente familiar. A compreensão de suas dificuldades e a tentativa de buscar estratégias para superá-las de- vem ser o lema de toda a família. 10.Psicoeducação familiar A família deve estar bem-orientada pelos profis- sionais que atendem a criança e ser incentivada a buscar conhecimentos sobre o tema por meio de livros, filmes e grupos de apoio. Muitas vezes as fa- mílias funcionam como multiplicadores dos ganhos da criança e podem ser um instrumento importante para potencializar o tratamento, pois condutas ade- quadas propiciarão melhor desenvolvimento dos comportamentos das crianças. Fonte: SILVIA, A. B. B.; GAIATO, M. B.; REVELES, L. T. Mundo singular, entenda o autismo. Fortanar, p. 106-108. 2012. Um ponto importante precisa ser considerado quando analisamos a tabela acima, os autores usam como base para seus estudos a terapia comportamental, visto que é a mais indicada com comprovações científicas para crianças com transtorno do desenvolvimento. Nessa linha, as técnicas utilizadas nesta abordagem psicoterápica é a Análise Aplicada do Comportamento (ABA). Independente da linha terapêutica, o fundamental para o desenvolvimento da crian- ça com TEA é o trabalho em equipe, em que cada um tenha em mente que fazer a sua parte bem-feita é contribuir para o desempenho do trabalho do outro. “Transpor as dificuldades do autismo é uma busca incessante em direção à superação de nossos próprios limites” (SILVIA, GAIATO e REVELES, 2012, p. 39). No próximo tópico vamos ver como cada te- rapia específica pode contribuir para o desenvolvimento da criança com TEA, caso seja necessário para seu quadro. Venha comigo! 31UNIDADE I Aspectos Psicológicos Relacionados ao Autismo 31UNIDADE II Equipe Multidisciplinar 2. O DIAGNÓSTICO E AS INTERVENÇÕES NECESSÁRIAS O conceito do espectro autista nos ajuda a compreender que empregamos termos comuns para pessoas muito diferentes. O diagnóstico de autismo não quer dizer que todas as crianças autistas possuem o mesmo comprometimento ou necessidades, ao contrário, nos remete a um conjunto de diferentes individualidades, com níveis evolutivos, necessida- des educativas e terapêuticas bem diferentes. A ideia de considerar o autismo como um “contínuo”, mais do que como uma categoria que define um modo de “ser”, ajuda-nos a compreender que, ape- sar das importantes diferenças que existem entre diferentes pessoas, todas elas apresentam alterações, em maior ou menor grau, em uma série de as- pectos ou “dimensões”, cuja afecção se produz sempre nos casos de trans- torno profundo do desenvolvimento (ÁNGEL, 2007, p. 241). A autora apresenta seis fatores principais que precisam ser analisados individual- mente na pessoa com TEA: TABELA 2 – FATORES PRINCIPAIS 1. A associação ou não do autismo com atraso mental mais ou menos grave. 2. A gravidade do transtorno que apresentam. 3. A idade – o momento evolutivo – da pessoa autista. 4. O sexo: o transtorno autista afeta com menos frequência, porém com maior gravida- de de alteração, as mulheres do que os homens. 5. A adequação e a eficiência dos tratamentos utilizados e das experiências de apren- dizagem. 6. O compromisso e o apoio da família. Fonte: ÁNGEL, 2007, p. 241. 32UNIDADE I Aspectos Psicológicos Relacionados ao Autismo 32UNIDADE II Equipe Multidisciplinar De acordo com a autora os sintomas específicos que a pessoa com TEA apresenta dependem desses seis fatores, alguns não são independentes entre si, mas não podem ser reduzidos uns aos outros. Os profissionais que trabalham com crianças com TEA precisam desenvolver um planejamento que contemple as necessidades de cada paciente. A partir daí é possível organizar a rotina das intervenções com objetivos, recursos e estratégias para atender individualmente cada caso (BLANCO, 2007). Para que isso ocorra de maneira efetiva, os profissionais precisam conhecer todas as possibilidades de aprendizagem da criança com TEA, quais fatores que podem favore- cer a sua evolução e as demandas específicas daquela criança. Por isso, só após entender a situação de cada um é que o profissional irá conseguir colaborar com o processo de desenvolvimento e construção pessoal de cada um desses indivíduos (BLANCO, 2007). Conhecendo as capacidades e habilidades de cada criança com TEA, os profissio- nais poderão assim trabalhar com segurança, reconhecendo as demandas e traçando um planejamento pertinente para cada caso. Os profissionais precisam identificar as possibilidades de adaptação ao ambiente, o uso de recursos e estratégias frente à diversidade de habilidades e necessidades da criança com TEA. Após o reconhecimento das necessidades individuais apresentadas, é fundamental que os ambientes em que a criança circule estejam preparados e que o ensino seja estruturado, com estratégias, técnicas, adaptações que deem suporte às diferentes necessidades de cada criança. Reforçar as habilidades por eles apresentadas é uma ótima estratégia e ampliação da aprendizagem, já que a criança tem como desejo natural explorar os ambientes. Essas estratégias devem ser planejadas pelos profissionais que atendem a criança, sendo definidos, mais uma vez, de acordo com as necessidades individuais (ROCHA; NARENE; CAPOIANCO; APARECIDA; BRITO e SANTOS, 2018). 33UNIDADE I Aspectos Psicológicos Relacionados ao Autismo 33UNIDADE II Equipe Multidisciplinar 3. COMPREENDER OS PROFISSIONAIS DA EQUIPE MULTIDISCIPLINAR: TERAPEUTA OCUPACIONAL E FISIOTERAPIA: A IMPORTÂNCIA DA PSICOMOTRICIDADE A história da psicomotricidade está relacionada com a história do estudo do corpo humano e da busca pela compreensão de como se processam asemoções, as sensações e a relação entre o corpo e a alma. A psicomotricidade é um campo transdisciplinar que estuda as relações entre o psiquismo e a motricidade, considerando as funções cognitivas, socioemocionais, simbólicas, psicolinguísticas e motoras integradas, gerando a capacidade da pessoa agir em um contexto psicossocial (LEITE, 2019). A psicomotricidade está relacionada com o movimento organizado e integrado, “de acordo com as experiências vividas pelo sujeito, considerando-se sua individualidade, linguagem e socialização” (LEITE, 2019, p. 26). Para o autor, a psicomotricidade é alcançada pelo amadurecimento e está sustenta- da em três pilares: o movimento, o intelecto e o afeto, que são complementares, integrados e indissociáveis, resultando em harmonia e satisfação pessoal. O movimento está relacionado com a descoberta da criança em conhecer as funções de seu próprio corpo, primeiro por meio da observação e depois da experiência, assim, ela vai descobrindo sentimentos e emoções. Além de que, toda atividade motora está relacionada com o desenvolvimento intelectual, social e moral da criança (LEITE, 2019, p. 27). 34UNIDADE I Aspectos Psicológicos Relacionados ao Autismo 34UNIDADE II Equipe Multidisciplinar O pilar intelecto, para Leite (2019) está relacionado com a compreensão do quanto a pessoa conhece em oposição àquilo que sente e deseja, é o entendimento, a faculdade de pensar e adquirir conhecimento iniciando em uma baixa complexidade até chegar na alta complexidade mental. “A inteligência envolve a lógica, a abstração, a memorização, a compreensão, o autoconhecimento, a comunicação, o aprendizado, o controle emocional, planejamento e a resolução de problemas” (LEITE, 2019, p. 33). Podemos dizer então, que a psicomotricidade está integrada às funções cognitivas, socioemocionais, simbólicas, motoras e psicolinguísticas. Sem o intelecto, esses processos não seriam possíveis. Afeto deriva de um estado da alma, um sentimento, está relacionado à afetividade e afetivo, compreendido na psicologia como a capacidade da pessoa em experimentar o conjunto de fenômenos afetivos, emoções, sentimentos. “A afetividade consiste na força exercida por esses fenômenos no caráter de uma pessoa” (LEITE, 2019, p. 36). O vínculo entre professor-aluno, terapeuta-criança é fundamental para o processo de desenvolvimento e aprendizagem. É necessário que a criança seja vista e atendida na sua forma integral, levando em consideração os aspectos emocionais, motores, culturais e sociais. A terapia precisa ser prazerosa para criança na maior parte do tempo, haverá momentos em que a criança será resistente, principalmente quando novos objetivos forem introduzidos, porém, um bom profissional, deve ser capaz de tornar a terapia divertida e envolvente. O terapeuta precisa ser sensível às necessidades e as preferências da criança (BERNIER; DAWSON e NIGG, 2021, p. 118). Muitas crianças com TEA possuem aversão ou interesses sensoriais, inclusive as sensibilidades sensoriais foram acrescentadas no DSM-5 como um dos critérios de diag- nóstico. Em algumas situações, essas sensibilidades podem se tornar problemáticas. É importante ressaltar, que, quando falamos em sensibilidade sensórias, estamos abordando desde sensibilidade no paladar, como ruídos, luzes, uso de roupas. A terapia ocupacional também contribui para reduzir as aversões sensoriais. Por exemplo, trabalhar o uso de fones de ouvido para reduzir os sons do ambiente, usar uma variedade de exposições táteis para a criança adaptar-se às sensações. É comum também que a criança com TEA apresentam dificuldade na motricidade fina e ampla, a criança pode ser desajeitada ou não muito coordenada, além dos desafios com as habilidades motoras finas, como movimentos de pinça, manusear lápis ou usar instrumentos como tesouras. 35UNIDADE I Aspectos Psicológicos Relacionados ao Autismo 35UNIDADE II Equipe Multidisciplinar Fisioterapia e terapia ocupacional são abordagens de tratamento bem apoia- das para abordar esses desafios. A melhora nas habilidades motoras amplas ajuda seu filho a se entrosar nas atividades rotineiras na escola ou na área de recreação. Ser incapaz de correr, brincar de pega-pega ou pular em uma casinha inflável com seus pares reduz suas oportunidades de se envolver com eles, de praticar as principais habilidades sociais trabalhadas na terapia e, por fim, de construir a competência social que serve como o fundamento para a aprendizagem (BERNIER; DAWSON e NIGG, 2021, p. 120). Nesse sentido, garantir que a criança tenha habilidades motoras apropriadas pode contribuir com a sua capacidade de se envolver com os outros, como brincar, realizar ativi- dades escolares, entre outras. O fisioterapeuta, assim como o terapeuta ocupacional, possibilita melhorias mo- toras e mentais, a partir de técnicas que estimulem a proximidade ao paciente, diálogo, integração social e a independência da criança. Ele consegue atuar na prevenção e melho- ria de situações patológicas. Esse trabalho acontece por avaliações musculoesqueléticas, relacionadas à ergonomia, diagnósticos, aplicação de exames, prescrição e planejamento. Atuando, assim, na promoção da qualidade de vida e reabilitação do paciente (MAIA; MOU- RA; MADEIROS; CARVALHO; SILVA e SANTOS, 2015). A fisioterapia é de fundamental importância para pessoas com TEA, no tratamento dos acometimentos motores e na prevenção de agravos ao estado da criança. Entre as estratégias existentes para tratar crianças com TEA, há a sigla mnemônica SPECTRUM: Sequência prática, Percepção, Equilíbrio, Coordenação, Tônus, Resistência, Uniformidade, Marcos motores, desenvolvido para facilitar a avaliação, o raciocínio clínico e as tomadas de decisão sobre as abordagens terapêuticas das crianças com TEA (MENDONÇA et al., 2015). As intervenções da terapia ocupacional e da fisioterapia irão contribuir para in- gressão da criança com TEA ao convívio social, treinando habilidades de concentração, melhorando ou excluindo movimentos anormais, contribuindo para o autocontrole corporal, além das habilidades motoras, equilíbrio e coordenação também serem trabalhadas. 36UNIDADE I Aspectos Psicológicos Relacionados ao Autismo 36UNIDADE II Equipe Multidisciplinar 4. ESTABELECER A IMPORTÂNCIA DO PSICÓLOGO E DO NEUROPSICÓLOGO NA INTERVENÇÃO DA CRIANÇA COM TEA O psicólogo, com sua formação específica e definida, também faz parte da equipe multidisciplinar necessária para contribuir no desenvolvimento da pessoa com TEA. Seu conhecimento na área do desenvolvimento humano possibilita condições para detectar as áreas defasadas e comprometidas, para tanto, o relato e observações da família são fundamentais para o processo. É importante que o psicólogo esteja atualizado com os trabalhos e pesquisas recentes para orientar a família. A sua sensibilidade diante da criança e do nível de comprometimento desta é importante para que ele saiba adequar propostas terapêuticas que realmente a beneficiem (ELLIS, 1996 apud SOUZA et al., 2004). A autora Amiralian (1986) apresenta importantes discussões sobre a contribuição da psicologia para pessoas com deficiência, espectro ou transtornos, independente dos ní- veis de desenvolvimento, todas elas precisam desenvolver seus sentimentos de autovalor e autoconfiança, assim como confiar no outro, buscar sua independência. Mesmo com as limitações de cada um, o dever do psicólogo, da equipe multidisciplinar, do educador, dos pais, é ajudar essa pessoa a acreditar em si mesmo, a buscar o sentido de realização e sentimentos de autovalor. 37UNIDADE I Aspectos Psicológicos Relacionados ao Autismo 37UNIDADE II Equipe Multidisciplinar FIGURA 1 – AUTOCONHECIMENTO A neuropsicologia é uma área interdisciplinar, composta por profissionais das áreas da saúde e educação, com o intuito de investigar as bases cerebrais do comportamento humano, contribuindo para o diagnósticoe intervenção em problemas cognitivos, compor- tamentais e emocionais (HAASE, 2014). Essa ciência aplicada busca a interação existente entre a expressão comportamen- tal e as disfunções cerebrais, utilizando como método de investigação a avaliação, obser- vação e testes específicos para analisar o comprometimento ou preservação das funções corticais, para assim, embasar a equipe multidisciplinar tanto de maneira qualitativa como quantitativa (CZERMAINSKI, 2012). Nesse sentido, a neuropsicologia tem como objeto principal o funcionamento cog- nitivo, emocional, familiar, acadêmico e social de crianças e adolescentes que apresentam lesões do cérebro (paralisia cerebral, meningoencefalite, traumatismo cranioencefálico etc.) ou transtornos do desenvolvimento (deficiência intelectual, autismo, síndromes genéticas, TDAH, transtornos específicos de aprendizagem etc.) (HAASE; OLIVEIRA; PINHEIRO; ANDRADE; FERREIRA; DE FREITAS e TEODORO, 2016). A avaliação neuropsicológica também é utilizada como um instrumento para avaliar as funções executivas da criança, contribuindo para o desenvolvimento e formulação de estratégias para alcançar os objetivos traçados pela equipe multidisciplinar. Essa avaliação é realizada no primeiro encontro com o paciente, através de observação comportamental com a criança e perguntas estruturadas para os cuidadores (SOUZA et al., 2021). Além do diagnóstico, a avaliação também é fundamental para obter um repertório inicial - linha de base, para cada aspecto identificado na criança. A neuropsicologia contribui de forma significativa nos contextos psicológicos, com informações para compreensão do funcionamento cerebral e dos processos cognitivos, onde o neuropsicólogo tem a função de relacionar as observações do comportamento com os critérios necessários para fechar o diagnóstico. 38UNIDADE I Aspectos Psicológicos Relacionados ao Autismo 38UNIDADE II Equipe Multidisciplinar 5. O PAPEL DO FONOAUDIÓLOGO, DO EDUCADOR E PSICOPEDAGOGO Como você já sabe, o TEA envolve uma ampla gama de distúrbios neurodesenvol- vimentais, tendo como eixos centrais três grandes áreas: dificuldades de interação social, dificuldades de comunicação verbal e não verbal e padrões restritos e repetitivos de com- portamento (FERNANDES; CARDOSO; SASSI; AMATO e SOUSA-MORATO, 2008). Nesse sentido, a comunicação para pessoas com TEA é um grande desafio e está diretamente relacionada com o nível de comprometimento da criança, nos casos mais graves a dificuldade é ainda maior para conseguir efeitos desejáveis no mundo físico. No nível intermediário carecem da competência necessária para desenvolver as atividades co- municativas que apresentam finalidade de compartilhar a experiência interna. No TEA grau leve, as crianças conseguem realizar funções comunicativas que permitem compartilhar experiência, a dificuldade está em conseguir uma comunicação com flexibilidade espontâ- nea, fluida (COOL; MARCHESI e PALACIUS, 2007). Segundo os autores, conforme a tradição estabelecida na psicologia do desenvolvimen- to, a comunicação é uma conduta que apresenta três propriedades essenciais: É uma atividade intencionada. Refere-se a algo, ou seja, é intencional. Realiza-se por meio de significantes. De acordo com Cool, Marchesi e Palacius (2007) as condutas comunicativas apa- recem nas crianças normais no último trimestre do primeiro ano de vida, com diversas funções significativas, duas que se sobressaem por sua importância: A função de intercam- biar o mundo físico ou conseguir algo dele, e a função de intercambiar o mundo mental do colega de interação, compartilhando uma experiência interior. 39UNIDADE I Aspectos Psicológicos Relacionados ao Autismo 39UNIDADE II Equipe Multidisciplinar As manifestações comportamentais que definem o TEA incluem comprome- timentos qualitativos no desenvolvimento sociocomunicativo, bem como a presença de comportamentos estereotipados e de um repertório restrito de interesses e atividades, sendo que os sintomas nessas áreas, quando to- mados conjuntamente, devem limitar ou dificultar o funcionamento diário do indivíduo (APA, 2013, p. 25). Nesse aspecto, a atuação de um educador e/ou psicopedagogo é essencial para manter o diálogo e a ação mediadora. A linguagem deve ser vista não apenas como um código ou conjunto de regras gramaticais, mas também como uma atividade dialógica e cognitiva, esse novo aspecto amplia o universo de investigação da linguagem, incluindo comportamentos não verbais no fenômeno da linguagem (CAMPELO; LUCENA; LIMA; ARAÚJO; VIANA; VELOSO; CORREIA e MUNIZ, 2009). Os meios comunicativos são divididos em verbais (VE), que envolvem pelo menos 75% dos fonemas da língua, os vocais (VO), envolvendo todas as outras emissões e ges- tuais (GE) relacionados aos movimentos do corpo e do rosto. As crianças autistas utilizam mais a comunicação gestual, menos verbal e poucas vocalizações (CAMPELO; LUCENA; LIMA; ARAÚJO; VIANA; VELOSO; CORREIA e MUNIZ, 2009). É interessante comentar que no trabalho com crianças autistas, o fonoaudió- logo deve ter em mente que se trata de um quadro clínico objeto de contra- dições e frequentes mudanças na sua descrição e categorização. O olhar do fonoaudiólogo deve extrapolar os limites dos meros sintomas apresentados pelos indivíduos, buscando-se sentido e interpretação (CAMPELO; LUCENA; LIMA; ARAÚJO; VIANA; VELOSO; CORREIA e MUNIZ, 2009, p. 02). A linguagem precisa ser vista como um instrumento da ação e interação da criança sobre o ambiente e sobre os outros. A terapia fonoaudiológica é comumente citada para a intervenção na área de linguagem dentro da equipe multidisciplinar para atender as crian- ças com TEA. Alguns estudos têm enfatizado a importância da intervenção fonoaudiológica precoce no autismo. Considerando a linguagem como a principal forma de interação social, a terapia fonoaudiológica é considerada fundamental, pois trabalha diretamente com os aspectos mais relevantes da patologia (GONÇALVES e CASTRO, 2013). 40UNIDADE I Aspectos Psicológicos Relacionados ao Autismo 40UNIDADE II Equipe Multidisciplinar SAIBA MAIS De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), uma em cada cento e ses- senta crianças em todo o mundo tem algum Transtorno do Espectro Autista (TEA). A condição afeta como a pessoa vê, ouve, sente e interage com o mundo ao seu redor, em diferentes graus. Pode dificultar a comunicação, a interpretação de sinais. Assim como na população em geral, algumas pessoas autistas são bastantes sociáveis, outras são mais tímidas e retraídas. Como as pessoas autistas têm mais dificuldade em interpretar o comportamento e a linguagem corporal dos outros, elas podem não conseguir iden- tificar quando é apropriado iniciar, terminar ou entrar em uma conversa. Convidá-las a contribuir para uma discussão e fazer perguntas diretas pode ajudar. Fonte: BBC. Dez coisas que pessoas autistas querem que os outros sabem sobre elas. BBC News Brasil. 2020. Disponível em: https://www.bbc.com/portuguese/geral-54312657. Acesso em: 10 out. 2021. O processo de aprendizagem ocorre de maneira peculiar e com ritmo diferenciado para todos os indivíduos, essa diferença é ainda mais evidente nas crianças com TEA. Para compreender como ocorre a aprendizagem na criança é necessário conhecer suas habilidades, capacidades e limitações dentro do seu desenvolvimento global, para assim ser estruturado um plano educacional individualizado (CALDAS, 2020). Dentro da aprendizagem, o que funciona para uma criança com TEA pode não funcionar para outra. É necessário grande perseverança por parte dos profissionais no planejamento das ações. Para que a aprendizagem aconteça de maneira efetiva são “ne- cessárias estratégias estruturadas, aplicadas com sistematicidade observando as caracte- rísticas individuais levantadas durante o processo de avaliação e conhecimento da criança” (CALDAS, 2020, p. 68). https://www.bbc.com/portuguese/geral-54312657 41UNIDADE
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