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EduFatecie E D I T O R A Economia Brasileira Contemporânea Professora Ma. Daniela Carla Monteiro 20 by Editora EduFatecie Copyright do Texto © 20 Os autores Copyright © Edição 20 Editora EduFatecie o download da obra e o compartilhamento desde que sejam atribuídos créditos aos autores, mas sem a EQUIPE EXECUTIVA Editora-Chefe Prof Sbardeloto Tatiane Viturino de Oliveira www.unifatecie.edu.br/ editora-edufatecie edufatecie@fatecie.edu.br André Dudatt Revisão Textual Kauê Berto Web Design Thiago Azenha Reitor Prof. Me. José Carlos Barbieri Vice-Reitor Prof. Dr. Hamilton Luiz Favaro Pró-Reitora Acadêmica Prof. Ma. Margareth Soares Galvão Diretor de Operações Comerciais Prof. Me. José Plínio Vicentini Diretor de Graduação Prof. Me. Alexsandro Cordeiro Alves da Silva Diretora de Pós-Graduação e Extensão Prof. Ma. Marcela Bortoti Favero Diretor de Regulamentação e Normas Prof. Me. Lincoln Villas Boas Macena Diretor Operações EAD Prof. Me. Cleber José Semensate dos Santos CAMPUS SEDE Avenida Advogado Horácio Raccanello Filho, 5950 Novo Centro – Maringá – PR CEP: 87.020-035 SEDE ADMINISTRATIVA Avenida Advogado Horácio Raccanello Filho, 5410 CEP: 87.020-035 (44) 3028-4416 www.unifcv.edu.br/ As imagens utilizadas neste livro foram obtidas a partir do site ShutterStock Dados Internacionais de Catalogação na Publicação - CIP M775e Monteiro, Daniela Carla Economia brasileira contemporânea / Daniela Carla Monteiro. Paranavaí: EduFatecie, 2021. 88 p. : il. Color. ISBN 978-65-87911-67-0 1. Economia - Brasil. 2. Desenvolvimento econômico I. Centro Universitário UniFatecie. II. Núcleo de Educação a Distância. III. Título. CDD : 23 ed. 330 Catalogação na publicação: Zineide Pereira dos Santos – CRB 9/1577 AUTORA Professora Ma. Daniela Carla Monteiro ● Mestra em Economia Regional - Universidade Estadual de Londrina. ● Bacharel em Ciências Econômicas - Universidade Estadual de Maringá. ● Especialista em Direito do Estado - Universidade Estadual de Londrina. ● Professor Formador EAD - UniCesumar. ● Professor de graduação na Faculdade Cidade Verde (FCV). Possui graduação em Ciências Econômicas pela Universidade Estadual de Maringá (UEM-2002), Especialização em Direito do Estado - área de concentração em Direito Admi- nistrativo pela Universidade Estadual de Londrina (UEL - 2006) e Mestrado em Economia Regional pela Universidade Estadual de Londrina (UEL - 2013). É professora Adjunta do Departamento de Ciências Econômicas da Faculdade Cidade Verde (FCV) e professora Formadora (EAD) no Centro Universitário de Maringá (Unicesumar). Endereço para acessar este CV: http://lattes.cnpq.br/0168207316464790 APRESENTAÇÃO DO MATERIAL Olá, querido (a) acadêmico (a), seja muito bem-vindo (a) ao livro de Economia Bra- sileira Contemporânea. É com imenso prazer que lhe apresento este livro, que preparei com muito carinho e dedicação. Me chamo Daniela Carla Monteiro, sou formada em Ciências Eco- nômicas pela Universidade Estadual de Maringá e sou Mestra em Economia pela Universidade Estadual de Londrina. Como você pôde perceber, a economia, sem dúvida nenhuma, é uma das minhas grandes paixões. Logo, falar de economia, pesquisar sobre economia e escrever sobre economia para os meus alunos é uma tarefa muito prazerosa que me enche de orgulho. Seria impossível, diante da proposta de elaboração desta obra, esgotar todo o con- teúdo que compreende a economia brasileira contemporânea. Por isso, procurei trabalhar o contexto e as características mais importantes de cada período abordado. Sem dúvida nenhuma, posso afirmar que a economia brasileira contemporânea te deixará inquieto, ou seja, te despertará inúmeras curiosidades. É possível que muitas das políticas econômicas aqui apresentadas ainda estejam vivas na memória de muitos brasileiros, tamanha a sua magnitude, por isso aproveite e converse sobre elas com seus avós, pais, tios e amigos. Em se tratando da estrutura geral do livro, para que você tenha uma noção do que será estudado, farei uma breve apresentação das quatro unidades que compreendem esta obra. Na unidade I, denominada de Economia Brasileira, subdividida em 5 subitens, você estudará: (a) Conceitos e ambientação da economia brasileira contemporânea; (b) A crise de 1930 e o avanço da industrialização brasileira, (c) Anos 1950: Getúlio Vargas e os desafios da indústria pesada; (d) Plano de Metas de Juscelino Kubitscheck: planejamento estatal e consolidação do processo de substituição de importações; e (e) A crise de 1962-1967, o PAEG e as bases do milagre econômico. Na Unidade II, por sua vez, denominada de Desenvolvimento econômico, subdividida em três tópicos, você estudará: (a) A Ditadura Militar no Brasil, (b) A Década Perdida; e (c) Os Planos de Estabilização instituídos no Brasil após 1985 até 1989. Sequencialmente, na unidade III, batizada de Perspectivas e novos modelos econômicos, subdividida em três tópi- cos, você estudará: (a) A abertura comercial que ocorreu na primeira metade dos anos 1990; (b) O Plano Real e seus desdobramentos; e (c) O governo de Fernando Henrique Cardoso. Por fim, na unidade IV, cuja denominação dada foi Economia Contemporânea, subdividida também em 3 partes, você aprenderá sobre: (a) O primeiro e Segundo governo Lula; (b) Sobre as crises e desdobramentos do Governo Dilma Rousseff; e sobre o (c) Governo de Michel Temer. Para fechar a minha apresentação geral do livro, gostaria de deixar registrado aqui uma pequena dica, que traz grandes resultados. Dedique-se a ler e a interagir com os textos, a fazer anotações, a esclarecer suas dúvidas, a verificar as indicações de leitura, a realizar novas pesquisas sobre os assuntos abordados, a responder às atividades propostas, entre outros. Todo e qualquer conhecimento adicional contribui para a construção e para a consolidação de sua formação. Um forte abraço e até breve! Professora Me. Daniela Carla Monteiro SUMÁRIO UNIDADE I ...................................................................................................... 4 Economia Brasileira UNIDADE II ................................................................................................... 27 Desenvolvimento Econômico UNIDADE III .................................................................................................. 46 Perspectivas e Novos Modelos Econômicos UNIDADE IV .................................................................................................. 68 Economia Contemporânea http://revista.fct.unesp.br/index.php/Nuances/article/viewFile/3486/3076 http://revista.fct.unesp.br/index.php/Nuances/article/viewFile/3486/3076 4 Plano de Estudo: ● Conceitos e ambientação da Economia Brasileira Contemporânea; ● A crise de 1930 e o avanço da industrialização brasileira; ● Anos 1950: Getúlio Vargas e o desafio da indústria pesada; ● Plano de Metas de Juscelino Kubitschek: planejamento estatal e consolidação do processo de substituição de importações; ● A crise de 1962 – 1967, o PAEG e as bases do milagre econômico. Objetivos da Aprendizagem: ● Conceituar e contextualizar a Economia Brasileira Contemporânea; ● Compreender a crise de 1930 e o avanço da industrialização brasileira; ● Estudar a Gestão Getúlio Vargas nos anos 1950 e o desafio da indústria pesada; ● Aprender sobre o Plano de Metas de Juscelino Kubitschek: planejamento estatal e con- solidação do processo de substituição de importações; ● Contextualizar a crise de 1962 – 1967, o PAEG e as bases do milagre econômico. UNIDADE I Economia Brasileira Professora Ma. Daniela Carla Monteiro 5UNIDADE I Economia Brasileira INTRODUÇÃO Olá, caro (a) acadêmico (a), seja bem-vindo (a) ao livro de Economia BrasileiraContemporânea. Nesta unidade, você estudará as principais características da economia brasileira de 1930 a 1967. Em outras palavras, você estudará a crise de 1930 e o avanço da industrialização brasileira; A Gestão Getúlio Vargas nos anos 1950 e o desafio da indústria pesada; O Plano de Metas de Juscelino Kubitschek: planejamento estatal e consolidação do processo de substituição de importações; e A crise de 1962 – 1967, o PAEG e as bases do milagre econômico. A aprendizagem em questão é fundamental para o entendimento da economia bra- sileira contemporânea, bem como para uma melhor compreensão dos assuntos que serão estudados nas unidades posteriores, ao passo que é necessário que você compreenda com precisão de onde partimos, ou seja, qual era o nosso tipo de economia, qual era o nosso carro-chefe em termos de produtos, qual era a nossa variável chave, para quem esse pro- duto era vendido, quais eram as vantagens e desvantagens do modelo de desenvolvimento que se tinha, quais foram as políticas implementadas em defesa do modelo em questão, quais foram os casos que levaram ao esgotamento do referido modelo, entre outros. Assim, visando atingir os objetivos de aprendizagem elencados para esta unidade, a mesma foi dividida em cinco tópicos. No primeiro tópico, será conceituado e contex- tualizado Economia Brasileira Contemporânea. No segundo tópico, por sua vez, você compreenderá a crise de 1930 e o avanço da industrialização brasileira. Por conseguinte, no terceiro tópico, você estudará a Gestão Getúlio Vargas nos anos 1950 e o desafio da indústria pesada. No quarto tópico, aprenderá sobre o Plano de Metas de Juscelino Kubits- chek: planejamento estatal e consolidação do processo de substituição de importações. Por fim, no quinto e último tópico aprenderá sobre a crise de 1962 – 1967, o PAEG e as bases do milagre econômico. Bons estudos e um forte abraço! Professora Me. Daniela Carla Monteiro. 6UNIDADE I Economia Brasileira 1. CONCEITOS E AMBIENTAÇÃO DA ECONOMIA BRASILEIRA CONTEMPORÂNEA Escrever sobre economia brasileira sem dúvida nenhuma está entre as minhas grandes paixões. Essa paixão não vem apenas da minha formação enquanto economista, mas também do meu olhar e do meu posicionamento como cidadã ativa neste país. Nesta obra, você perceberá que estudar economia brasileira, ao contrário do que muitos alunos acreditam, é muito mais do que estudar história. É estudar as nossas bases, as nossas raízes, as nossas primeiras escolhas em termos produtivos, entre outros. Assim sendo, pode-se dizer que ao estudar economia brasileira você também esta- rá estudando a história da sociedade brasileira, pois ao compreender o passado econômico do Brasil você compreenderá como a nossa sociedade se formou e evoluiu. Desta forma quero que você esteja preparado para uma viagem incrível no tempo onde será possível aprender sobre como nossa economia caminhou até aqui. Atualmente a economia brasileira apresenta um perfil sólido, no entanto, nem sempre foi assim. Grande exportadora, desde a sua formação, de uma série de produtos, contribuiu e ainda contribui com os exportáveis para o desenvolvimento econômico. Em se tratando de importações, não é diferente e tais importações, assim como as exportações, impactaram e impactam a economia brasileira, ao passo que adquire-se bens em outros países em detrimento de uma aquisição que poderia acontecer no mercado doméstico. E aí? Preparado para nossa viagem? Iniciaremos falando da crise de 1930 e o avanço da industrialização brasileira. Posteriormente vamos estudar os anos 50 e por con- seguinte o Plano de Metas de Juscelino Kubitscheck. Por fim, nesta unidade, trataremos da crise de 1962-1967, o PAEG e as bases do milagre econômico. Coloque seu cinto, iniciando nosso voo em 3,2,1... Boa viagem ! 7UNIDADE I Economia Brasileira 2 . A CRISE DE 1930 E O AVANÇO DA INDUSTRIALIZAÇÃO BRASILEIRA Desde o início do período Colonial (1500) até a República Velha (1930), a economia brasileira dependeu de suas exportações. Tais exportações restringiam-se à commodities agrícolas, tais como: fumo, borracha, algodão, açúcar, café, entre outros. Sem dúvida, esse contexto definia o Brasil como uma economia agroexportadora. Agro, porque a commodity era agrícola e exportadora, porque praticamente tudo que se produzia era para fins de exportação. É fato que em alguns períodos, determinadas commodities agrícolas, ocupavam lugar de destaque. Ou seja, em determinados períodos, que também podem ser chamados de ciclos, tínhamos a “commodity agrícola” da vez. Você se lembra por exemplo do ciclo do açúcar? Tenho certeza que sim! Como o Brasil produziu e comercializou açúcar, não é mesmo? E o ciclo do café? Você se lembra? Sem dúvida o que você aprendeu sobre esse ciclo deve ainda estar bem mais fresquinho em sua memória, afinal ele foi o último ciclo desse modelo de desenvolvimento. Não há como não nos lembrarmos das nossas aulas de história no ensino médio sem nos lembrarmos das políticas que foram implementadas nesse ciclo, entre elas, a política de preços mínimos que retomarei um pouco mais adiante. Tendo entendido e relembrado as principais características da economia brasileira nesse período, destaca-se que o bom desempenho de nossa economia no referido modelo não estava atrelado a ótima qualidade de nossos produtos e muito menos ao montante produzido para fins de exportação. Em outras palavras, o bom desempenho dependia ex- clusivamente das condições do mercado internacional de produtos exportados. 8UNIDADE I Economia Brasileira Você tem alguma ideia do porquê? A resposta para essa questão é bem óbvia. No entanto, para que você compreenda bem o porquê dessa dependência considere que a variável-chave para o bom desempenho era o preço internacional do café. Pois bem, se o preço internacional do café estava favorável, a economia brasileira, por conseguinte teria um bom desempenho. Por outro lado, se o preço internacional do café estivesse desfavo- rável, por conseguinte o bom desempenho estaria comprometido. Em se tratando da demanda, o contexto não era muito diferente, ou seja, a depen- dência para fins de procura era decorrente do comportamento mundial. Isto é, aumentava quando o crescimento mundial era favorável e se retraia quando por motivos de crises ou guerras o crescimento mundial se estagnava ou até mesmo decrescia. Você consegue mensurar, diante dessas informações, o tamanho da vulnerabilidade da economia brasileira na década de 30? Pasme! Instabilidades externas afetavam direta- mente as exportações brasileiras. No entanto, você deve estar se perguntando: Professora, e as outras atividades econômicas brasileiras? Não poderiam elas suprir as deficiências da economia nos momentos de instabilidade? Meu caro (a) aluno (a), não tínhamos outras atividades econômicas. É isso mesmo, você não leu errado, não tínhamos! Não foi por acaso que o modelo que aqui estudamos, em- pregado até 1930, foi batizado como modelo de desenvolvimento voltado para fora e neste tipo de modelo todas as outras atividades brasileiras dependiam do sucesso do ciclo exportador. Observe que numa economia primária exportadora, o efeito do setor agroexportador sobre os demais setores da economia depende do efeito multiplicador desse setor sobre os demais setores. Geralmente, neste tipo de economia, os chamados demais setores, dada a sua baixa produtividade, não tem dinamismo próprio. Em suma, o dinamismo da economia brasileira até 1930 era decorrente do setor agroexportador que além de propiciar uma considerável condição de vulnerabilidade a nos- sa economia, pelos motivos já elencados, propiciava elevada rentabilidade e concentração de recursos produtivos, o que por sua vez explica a desigualdade na distribuição da renda que existiu e que ainda existe em nosso país. De acordo com Gremaud et al (2020, p. 363): No caso brasileiro,os problemas históricos de distribuição de renda e proprie- dade também podem ser associados à estrutura fundiária concentrada desde o início da colonização e às condições do mercado de trabalho: escravidão durante quase 300 anos e, depois de sua abolição, dificuldade na incorpora- ção dessa mão de obra ao mercado em função de preconceitos e do excesso de oferta no mercado de trabalho. Pois bem, tendo lhe apresentado essas questões, não poderia deixar de te apre- sentar a pauta de exportações do Brasil no período que estamos analisando. Observe com 9UNIDADE I Economia Brasileira calma o gráfico abaixo e verifique que nossa economia era uma grande exportadora de bens tipicamente agrícolas, com destaque para o café que, conforme já mencionei no início desse tópico, era a “bola da vez”. GRÁFICO 01: PAUTA DE EXPORTAÇÕES BRASILEIRAS - 1900 Fonte: Gremaud et al (2020, p. 364). Não obstante, têm-se à pauta de importações, que é tão importante quanto a de exportações. Sabe-se que pelas características do modelo que vigorava, qual seja, modelo agroexportador, a pauta era basicamente compreendida de produtos não disponíveis no país. 10UNIDADE I Economia Brasileira GRÁFICO 02: PAUTA DE IMPORTAÇÕES BRASILEIRAS – 1902 – 1903 Fonte: Gremaud et al (2020, p.365). Você conseguiu notar que a pauta além de bem diversificada correspondia a es- trutura de consumo de nossa economia? Querido (a) aluno (a), importávamos produtos como arroz, farinha de trigo, charque, entre outros. Por isso, chamo a sua atenção para a essencialidade da pauta e mais uma vez, te convido a refletir acerca da vulnerabilidade que este tipo de economia nos proporcionava. Afinal, quedas na exportação implicavam em quedas no volume de importáveis e assim as condições de consumo da economia brasileira ficavam totalmente comprometidas. 1.1. O esgotamento do Modelo Agroexportador As condições do mercado cafeeiro, entre os anos de 1851 e 1908, va- riaram muito, ou seja, enfrentaram momentos de ascensão e queda. Mas afi- nal, o que provocou tantas oscilações? Tais oscilações podem ser explicadas de duas formas, quais sejam: (1) Pela ótica da demanda; e (2) Pela ótica da oferta. Iniciarei pela ótica da demanda: Explica-se as oscilações pela ótica da demanda por meio dos ciclos que a economia mundial enfrentou. Em outras palavras, crises ou guerras, por exemplo, determinaram as oscilações da demanda por café em determinados ciclos. Já pela ótica da oferta têm-se geadas e pragas que reduziram a oferta e o investimento em novos cafezais, em decorrência de momentos em que a demanda estava em alta, aumen- 11UNIDADE I Economia Brasileira tando-a. Registre-se que ocorreu um descompasso entre o plantio e a produção, vez que neste período o espaço de tempo entre plantar e colher era de quatro anos. E é exatamente neste descompasso que um dos maiores problemas do ciclo ca- feeiro começou a acontecer. O que ocorria era o seguinte: Quando a demanda estava alta e quando o preço estava atrativo, plantava-se novos cafezais, que só estariam prontos para a colheita em quatro anos. No entanto, ao final desses quatro anos nem sempre o mercado estava atrativo em termos de preço e demanda. Assim sendo, é importante esclarecer ainda que investimentos em novos cafezais só cessaram quando o mercado começou a sinalizar excesso de oferta, por meio de queda nos preços. 12UNIDADE I Economia Brasileira 3. ANOS 1950: GETÚLIO VARGAS E O DESAFIO DA INDÚSTRIA PESADA Como vimos, o desenvolvimento industrial brasileiro foi propiciado pelo processo de substituição de importações (PSI) que, por sua vez, enfrentou dificuldades em decorrência de estrangulamentos cambiais. Nessa direção, por conseguinte, a lógica do processo de substituição de importa- ções foi a necessidade de avanços e aprofundamento do referido processo, para que assim o Brasil passasse a produzir internamente os bens de produção. É importante salientar que os anos 50 foram marcados pela Guerra Fria e que diante de um contexto de guerra, tais como a supracitada, países como o Brasil foram deixados à “própria sorte”. Você deve estar se perguntando: Como assim, foram deixados à própria sorte? SAIBA MAIS A Guerra Fria foi uma disputa entre as duas superpotências da época: Estados Unidos (EUA) e União Soviética (URSS). Este período de intensa hostilidade começou em 1947 e foi até 1989, e não contou com um conflito armado direto entre as duas potências. Por isso o nome: Guerra Fria, ou seja, o conflito não chegou a “esquentar” e ir para o campo de batalha. Mas isso não significa que não houve combates indiretos. A União Soviética tinha, em geral, objetivos mais tangíveis, como o território, enquanto os Estados Unidos tinham objetivos mais intangíveis, buscando estabelecer os rumos gerais da política internacional. Fonte: POLITIZE! Guerra Fria: a guerra ideológica entre duas potências. Disponível em: https://www. politize.com.br/guerra-fria/ Acesso em 01 Mar 2021. http://www.politize.com.br/eleicoes-presidenciais-dos-eua-em-10-passos/ https://www.politize.com.br/guerra-fria/ https://www.politize.com.br/guerra-fria/ 13UNIDADE I Economia Brasileira Meu caro (a) aluno (a), o Brasil foi deixado à própria sorte porque passou a depender de forma rigorosa do mercado e dos movimentos privados de capitais para o financiamento de seus déficits em transações correntes e de seus projetos desenvolvimentistas. De volta ao poder por meio de eleições livres, Vargas tentou novamente uma su- peração nacionalista dos estrangulamentos do Processo de Substituição de Importações (PSI) e das dificuldades à afirmação de um projeto nacional, embora existissem em suas propostas contradições e limitações. Faz-se relevante mencionar ainda que a economia brasileira no início da década de 1950, em decorrência das tentativas de Vargas de implantar as bases de uma indústria pesada no país, passou a apresentar resultados interessantes no conjunto da produção industrial, tanto no que diz respeito ao departamento produtor de bens de capital e bens intermediários, quanto ao departamento de bens de consumo. O projeto de Vargas vetou as possibilidades de financiamento externo ou a partici- pação de capitais estrangeiros na forma de investimentos diretos, daí vem a denominação “projeto nacionalista”. Ou seja, o financiamento ocorreu internamente - impulsionado pela política de valorização cambial e pela transferência dos excedentes do setor agroexportador para a indústria - pelas altas taxas de lucro da indústria. Em se tratando dos projetos de infraestrutura de transporte e energia, bem como de implantação industrial, faz-se relevante destacar que eles foram financiados pelo Banco Nacio- nal de Desenvolvimento Econômico, popularmente conhecido como BNDE, criado em 1952. O período, mais especificamente 1953, é relevantemente marcado pela Instrução 70 da Superintendência da Moeda e do Crédito (SUMOC), que por sua vez, condicionava as importações aos interesses industriais, mediante leilões de divisas com câmbio diferen- ciado de acordo com a essencialidade da importação. É fato que os leilões foram uma importante fonte de arrecadação para o Estado. Ademais, mantiveram a política cambial de favorecimento das indústrias substitutivas de importações. Assim sendo, pode-se dizer que as tentativas de implantar o departamento produtor de bens de capital e de bens intermediários, enfrentou dificuldades típicas de um projeto nacionalista. Ademais, é importante deixar registrado também que os empresários ficaram totalmente descontentes com o aumento dos custos de importações decorrentes da desva- lorização cambial. Por outro lado, os trabalhadores procuraram, em decorrência do avanço da industrialização, participar dos ganhos de produtividade. 14UNIDADE I Economia Brasileira Capitalizada politicamente pela oposição, a novacrise que atingiria a agricultura cafeeira, foi creditada ao governo. E assim, o desfecho da crise política foi o suicídio de Vargas e a morte de um projeto nacional que mal chegou a ser implementado. A burguesia industrial não sustentou politicamente o governo e as limitações da acumulação financeira nacional resultaram em transformações limitadas na estrutura pro- dutiva, impedindo a abertura de caminhos autônomos para o desenvolvimento nacional. Tais transformações, entretanto, seriam fundamentais para o posterior processo de industrialização, ainda que que não fosse mais de cunho nacionalista, ou seja, o capital privado estrangeiro seria o carro-feche dessa industrialização. Com o suicídio de Vargas, Café Filho, vice-presidente, assume o governo (154 - 1955) e assim, num curto espaço de tempo têm-se implementadas, políticas econômicas distintas, administradas por dois ministros das Fazenda: Eugênio Gudin, conhecido pelo seu traço ultraliberal e José Maria Whitaker, banqueiro. REFLITA Você sabia que a carta-testamento original deixada por Getúlio Vargas está exposta à visitação no Museu da República, no Rio de Janeiro? Fonte: a autora Gudin não acreditava em propostas desenvolvimentistas, ou seja, defendia uma linha contrária à linha de pensamento e gestão de Vargas. Posicionava-se como defensor de uma política ortodoxa, cujas prioridades estariam voltadas para o controle da inflação por meio do controle de emissão de moeda e de crédito. Sem dúvida nenhuma, a principal ação de Gudin foi a Instrução 113 da Supe- rintendência da Moeda do Crédito – SUMOC, que permitia que empresas estrangeiras instaladas no Brasil importassem máquinas e equipamentos sem cobertura cambial. Esse foi o mecanismo que Gudin encontrou para eliminar os obstáculos, até então existentes, à livre entrada de capital estrangeiro. Mas atenção! A Instrução 113 da SUMOC não se estendia às empresas nacionais. Desta forma, é fato que as empresas nacionais ficavam em desvantagem, afinal concorriam em condições de inferioridade e quase sempre importando máquinas e equipamentos obsoletos. 15UNIDADE I Economia Brasileira Gudin buscou ainda cortar gastos públicos, com destaque para investimentos, e colocou em prática uma política de contração monetária e creditícia. Gudin perdeu seu cargo em abril de 1955, por questões políticas, quando assume Whitaker. Whitaker, assume com um cenário de “crise bancária”, em decorrência da política con- tracionista adotada por Gudin. A crise de liquidez foi resolvida por intermédio do Banco do Brasil. O novo Ministro da Fazenda, propôs então uma intensa reforma cambial, cujo objetivo era unificar dez taxas distintas, quais sejam: cinco de importações; quatro de ex- portações e uma de mercado livre. Se essa proposta de reforma fosse aceita e implementada, a política desenvol- vimentista que impulsionava o processo de substituição de importações - PSI, estaria derrotada. Os principais candidatos à presidência não apoiaram a proposta. A plataforma política, por exemplo, de Juscelino Kubitscheck tinha, entre outros, como proposta intensi- ficar o Processo de Substituição de Importações. Diante da falta de sustentação política para as suas propostas, o Ministro foi exone- rado, sem colocar suas propostas em prática, entre elas: (a) implementar a reforma cambial; e (b) defender os interesses da cafeicultura. 16UNIDADE I Economia Brasileira 4. PLANO DE METAS DE JUSCELINO KUBITSCHEK: PLANEJAMENTO ESTATAL E CONSOLIDAÇÃO DO PROCESSO DE SUBSTITUIÇÃO DE IMPORTAÇÕES Em se tratando de planejamento estatal, sem dúvida nenhuma ou sem medo errar, pode-se dizer que o Plano de Metas, implementado por Juscelino Kubitschek, foi um caso bem-sucedido de formulação e implementação de planejamento. O supracitado planejamento estatal, contrariamente ao projeto nacionalista ideali- zado por Vargas, articulou consideráveis somas de investimentos privados, tanto de origem externa quanto de origem interna. Em outras palavras, o planejamento estatal, consubstan- ciado no Plano de Metas, atuou com a predominância de capital externo, tendo o capital nacional assumido um papel menos representativo no processo. Nessa direção, investimentos estatais em infraestrutura e empresas estatais do setor produtivo passaram a estar a serviço da acumulação privada. Isto posto, quero te fazer um convite, ou seja, quero te convidar a voltar rapidamente às suas aulas de história do ensino médio, onde tenho certeza de que você aprendeu sobre o slogan “50 anos em 5”. A ideia aqui é te fazer relembrar como teve início essa proposta de planejamento estatal. Pois bem, o planejamento estatal começou no momento em que praticamente toda a economia mundial enfrentava duros anos da Grande Depressão. Assim sendo, a palavra “planejamento” passou a fazer parte dos debates em economias capitalistas que até então não eram centralmente planejadas. 17UNIDADE I Economia Brasileira E assim, impulsionados pela macroeconomia Keynesiana e com a evolução dos modelos de crescimento, o planejamento estatal passou a ser uma realidade em todo o mundo. Em outras palavras, iniciou-se a atividade de planejamento no país. Durante o governo Vargas (1951 -1953) foi constituída a Comissão Mista Brasil Estados Unidos (CMBEU), cuja finalidade era elaborar projetos que por sua vez seriam financiados pelo Eximbank e pelo Bird. Ademais, em 1953, foi constituído o Grupo Misto BNDE-Cepal que era a base do Plano de Metas. O objetivo do Grupo Misto BNDE-Cepal era levantar os principais pontos de estrangulamento da economia brasileira, além de iden- tificar áreas industriais com demanda reprimida. Desta forma, em posse do diagnóstico, era de competência das comissões a pro- positura de projetos e planos direcionados a superação dos pontos de estrangulamentos identificados. Tais projetos e planos deveriam considerar ainda as repercussões e as ne- cessidades criadas pela introdução de novos ramos industriais. O Plano de metas (1956 - 1960) continha um conjunto de 31 metas, entre elas a meta- -síntese: a construção de Brasília. A maior parte dos investimentos do governo foram destina- dos aos setores de energia, transporte, siderurgia e refino de petróleo. Ademais, é importante registrar ainda que foram concedidos subsídios e estímulos à expansão e diversificação do setor secundário, produtor de equipamentos e insumos com alta intensidade de capital. SAIBA MAIS Em 1956, com um terreno demarcado no interior de Goiás, o então presidente da Repú- blica, Juscelino Kubitschek, encaminhou ao Congresso Nacional a “Mensagem de Aná- polis”, que propunha o nome Brasília para a nova capital, entre outros assuntos ligados à construção da cidade. Em 1957, o projeto urbanístico de Lucio Costa foi escolhido como vencedor dentre 26 concorrentes ávidos para o projeto de construção da nova capital. Em 1957, Juscelino sancionou a lei que determinava a fundação de Brasília três anos depois. Fonte: Matias (2021). E assim, para que políticas aplicáveis às atividades industriais privadas fossem formuladas, criou-se grupos executivos que nada mais nada menos eram colegiados compostos por representantes públicos e privados. A título de exemplo, pode-se citar: (a) https://brasilescola.uol.com.br/historiab/juscelino-kubitschek.htm 18UNIDADE I Economia Brasileira GEIA – Automobilístico; (b) GEIMAR – Máquinas agrícolas e rodoviárias; e (c) GEMF – Exportação de minério de ferro. Em se tratando de gastos públicos e privados, registra-se que o Plano de Metas os financiava por meio da expansão dos meios de pagamento e de crédito, via empréstimos do BNDE. Já o crédito privado, por sua vez, para fins de capital de giro das empresas foi estimulado por meio de repasses do Banco do Brasil, que por conseguinte pressionou adicionalmente oDéficit Público. Tais escolhas resultaram em inflação doméstica, que se manteve elevada durante todo o governo JK. Por outro lado, entre (1957-1961), o produto interno bruto (PIB) cresceu à taxa anual de 8,2%, o que resultou em um aumento de 5,1% ao ano na renda per capita, superando assim o objetivo estabelecido no Plano de Metas (LACERDA, 2010). Isto posto, quero que você observe agora o desenvolvimento industrial, cujo cres- cimento foi liderado por dois setores, quais sejam: (a) o produtor de bens de capital; e o (b) produtor de bens de consumo duráveis. E pasme! meu querido (a) aluno (a), as taxas anuais de crescimento foram, entre 1955 - 1962, da ordem de 26,4% e 23,9%, respectivamente (LACERDA, 2010). É importante ressaltar que o supracitado crescimento se estruturou em um tripé formado por (a) empresas estatais; (b) por capital privado estrangeiro; e (c) por capital privado nacional. Diante desse cenário, quero chamar a sua atenção ainda para as chamadas transformações estruturais, transformações estas que implicaram em oligopolização da economia brasileira. Em outras palavras, oligopolizou-se a economia brasileira quando os principais ramos industriais passaram a ser constituídos por um reduzido número de grandes empresas. O período foi marcado ainda pela mudança da estratégia de investimentos das grandes corporações estrangeiras, que davam início à transnacionalização e viam o Brasil, pelo tamanho de seu mercado interno, como um espaço privilegiado para a atuação de empresas multinacionais. E não deu outra! As empresas multinacionais passaram a dominar amplamente a produção industrial brasileira, em especial os setores mais dinâmicos da indústria de trans- formação. O motivo? O motivo é muito simples. Em decorrência das escalas de produção e da intensidade de capital que se fazia necessário foi inevitável a supremacia do capital externo. Em outras palavras, coube ao capital nacional um mero papel de coadjuvante de fornecedor de insumos e componentes. 19UNIDADE I Economia Brasileira Por outro lado, em setores como mineração, agricultura e serviços em geral, em decorrência de questões legais ou até mesmo por estratégia de investimentos das multina- cionais, foi bem restrita a participação estrangeira. Esse contexto tornou a economia brasileira uma das mais abertas e internacionali- zadas do mundo. Mas afinal, a estrutura industrial brasileira se consolidou? Vamos por partes. Primeiramente é importante deixar claro que o Plano de Metas estimulou decisivamente o PSI, especialmente no setor de bens de consumo duráveis e em importantes áreas do setor de bens de capital. Em segundo lugar, destaca-se também que a economia brasileira, na América Latina, foi a que mais avançou com o PSI. No entanto, no início dos anos 60 hipóteses sobre o esgotamento do PSI, começaram a ser levantadas, em decorrência da diminuição dos seus efeitos sobre a dinâmica industrial. Embora a produção de bens de capital e intermediários tivesse crescido de forma relevante, não cresceu o suficiente para possibilitar autonomia do processo de acumulação, ao passo que o mercado brasileiro era relativamente pequeno e não sustentava as escalas de produção requeridas para a fabricação de bens de alta tecnologia. Desta forma, as indústrias concentravam seus esforços na produção de bens mais leves, deixando os mais pesados por conta das importações, gerando assim uma nova dependência financeira e tecnológica com relação aos países desenvolvidos. Os saldos comerciais começaram a tornar-se negativos em 1958 e a situação foi agravada em decorrência dos curtos prazos dos vencimentos dos empréstimos externos, o que por sua vez resultou no rompimento entre o governo JK, o FMI e o Banco Mundial. Apesar da aposta liberal feita pelo governo com relação ao capital estrangeiro, os organismos internacionais, tais como FMI e Banco Mundial, não aprovavam os pilares do PSI, quais sejam: (a) protecionismo; e (b) controle das importações. Ademais, também não estavam de acordo com a condução da política macroe- conômica – grandes déficits fiscais – e a política monetária expansionista, que não se preocupava com as taxas de inflação que eram crescentes no período. Por conseguinte, incorreu-se em queda no ritmo de crescimento industrial a partir de 62, que culminou numa crise que revelou a importância assumida pela acumulação industrial no processo de desenvolvimento econômico do país, na medida em que o cresci- mento do PIB se torna diretamente vinculado ao crescimento da produção industrial. Desta forma, o nível de investimentos passa a ser a variável fundamental para explicar os movimentos cíclicos da economia. Então, voltando ao questionamento acerca da consolidação da estrutura industrial brasileira, a resposta é: não, a estrutura industrial brasileira não consolidou-se, pelo menos, não totalmente. 20UNIDADE I Economia Brasileira 5. A CRISE DE 1962 – 1967, O PAEG E AS BASES DO MILAGRE ECONÔMICO Após um intenso período (1956-1962) de crescimento do PIB, a economia brasileira passou a sofrer uma considerável desaceleração, que por sua vez, perdurou até 1967. A taxa média de crescimento do PIB despencou, chegando à metade daquela alcançada no período anterior. Diante deste cenário, a inflação atingiu uma taxa anual de 90% em 1964. Mas afinal, o que propiciou tal cenário? São inúmeras as explicações para a ex- pressiva diminuição do ritmo de crescimento, entre elas: (a) a complexidade do modelo histórico; (b) a combinação de questões econômicas estruturais com políticas econômicas conjunturais; e (c) a tradição estruturalista que via tal condição como uma crise cíclica decorrente dos investimentos do Plano de Metas. Pois bem, diante de tais explicações é importante esclarecer que sobre a questão estrutural atuavam ainda fatores conjunturais, entre eles a ascensão inflacionária e a políti- ca antiinflacionária recessiva do Plano Trienal. Assim sendo, tratou-se de uma crise cíclica que se agravou em decorrência de ins- tabilidades políticas e pelas políticas de estabilização recessivas, tais como o Plano Trienal e o próprio Programa de Ação Econômica do Governo, popularmente conhecido como PAEG. Isto posto, vamos nos aprofundar um pouco mais sobre as origens da supracitada crise política. Nessa direção, primeiramente, é importante que você saiba que durante o rápido governo de Jânio Quadros, institui-se para enfrentamento dos problemas – acelera- 21UNIDADE I Economia Brasileira ção inflacionária; déficit fiscal; e pressão sobre o balanço de pagamentos – herdados por Jk uma política econômica bastante conservadora. Ademais, com o intuito de diminuir a pressão dos subsídios cambiais sobre o déficit público, em março de 1961, foi feita uma desvalorização cambial de 100%. No entanto, em agosto de 1961, o presidente renunciou abruptamente, o que por sua vez culminou na interrupção de sua política econômica. A posse de seu vice, João Goulart, aconteceu em meio a imposições parlamenta- ristas, resultado do veto dos militares. No final de 1962, Celso Furtado apresentou o Plano Trienal. O referido plano era uma resposta política do governo à aceleração inflacionária e à deterioração econômica externa. Adotou-se para combater a inflação políticas fiscal e monetária de cunho contra- cionista. Elevou-se a carga tributária e os gastos do governo em investimentos e subsídios foram reduzidos. Contraiu-se ainda o crédito ao setor privado. Em suma, implementou-se uma política de contenção de gastos públicos e de liquidez. A tentativa de estabilização não deu certo, resultando em crescimento negativo do PIB per capita. De acordo com Lacerda (2010, p. 77) a economia cresceu apenas 0,6% em 1963, com inflação anual de 83,25%. O fim do governo ocorreu com o golpe militar de 1964. O regime militarassumiu a direção do Brasil comprometendo-se com a superação das políticas populistas de João Goulart. E assim nasceu o Plano de Ação Econômica do Governo – PAEG, que conseguiu reduzir a taxa de inflação de 90% em 1964, para menos de 30% em 1967 (LACERDA, 2010). No entanto, atenção! É importante que você saiba que entre os feitos do PAEG estão transformações institucionais, consubstanciadas nas reformas bancária e tributária e na centralização do poder político e econômico. Registre-se ainda que o PAEG mantinha objetivos básicos do discurso desenvol- vimentista, entre eles: (a) retomada do desenvolvimento, via aumento dos investimentos; (b) estabilidade dos preços; (c) atenuação dos desequilíbrios regionais; e (d) correção dos déficits do balanço de pagamentos. REFLITA Você sabia que as prioridades imediatas do PAEG eram controlar a inflação e normalizar as relações com os organismos financeiros internacionais? Fonte: a autora. 22UNIDADE I Economia Brasileira Isto posto, é importante que você entenda que neste momento o diagnóstico da inflação brasileira era embasado na ortodoxia monetarista, qual seja: o excesso de de- manda seria causado pela monetização dos déficits públicos, pela expansão do crédito às empresas e pelos aumentos salariais superiores ao aumento da produtividade. Diante deste contexto, executou-se uma política monetária restritiva, com controle de emissão monetária e de crédito; e, especialmente, foi implementada uma dura política de contenção salarial. A política de contenção de salários foi considerada uma verdadeira derrota dos assalariados em geral e acabou provocando um efetivo arrocho salarial. Em se tratando das políticas monetária e creditícia, segundo Lacerda (2010), foram do tipo stop-and-go, ou seja, alternou-se períodos de expansão da moeda e do crédito com outros de forte contração monetária, o que por sua vez afetou fortemente a atividade econômica, culminando em falências e desemprego. Nessa direção, faz-se relevante destacar ainda que a reforma bancária de 1965 criou a estrutura básica do Sistema Financeiro Nacional, onde instituiu-se o Banco Central e o Conselho Monetário Nacional. Por outro lado, com a criação das Obrigações Reajus- táveis do Tesouro Nacional (ORTN), institui-se a correção monetária, que possibilitou a convivência com taxas elevadas de inflação. Ademais, a criação do Sistema Financeiro de Habilitação (SFH) e do Banco Nacional da Habitação (BNH) possibilitou o fomento extraordinário da construção habitacional e do sa- neamento básico, usando recursos da poupança e do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço. Em termos de reforma tributária (1967), aumentou-se a arrecadação e a mesma foi centralizada no governo federal. Além dos impostos, adquiriu grande importância fundos parafiscais como Fundo de Garantia por Tempo de Serviço, o Programa de Integração Social (PIS) e o Programa de Assistência ao Servidor Público (Pasep). Em suma, o PAEG foi avaliado como um programa de estabilização positivo, embo- ra o mesmo tenha gerado custos para uma relevante parcela da população. Positivo porque reduziu a inflação para 20% a.a. e porque executou um amplo conjunto de transformações institucionais fundamentais para o grande crescimento econômico que se seguiria. Por outro lado, as críticas se mantiveram concentradas no diagnóstico da inflação (considerada de demanda), que culminou numa política recessiva com altos custos sociais. 23UNIDADE I Economia Brasileira CONSIDERAÇÕES FINAIS Caro (a) acadêmico (a), Estamos terminando nossa primeira unidade do livro de Economia Brasileira Con- temporânea. Vamos relembrar aqui, ainda que brevemente, tudo o que estudamos? Você se lembra que, num primeiro momento, aprendemos o conceito e a contextua- lização de Economia Brasileira Contemporânea? A partir desse aprendizado você conseguiu compreender de que maneira a economia brasileira caminhou até 1967? Pois bem, essa é a nossa história, a nossa base, o alicerce que sustentou todo o desenvolvimento posterior. Você se lembra também que aprendemos sobre a crise de 1930 e o avanço da in- dustrialização brasileira, bem como a Gestão Getúlio Vargas nos anos de 1950 e o desafio da indústria pesada? Consegue a partir de agora compreender os malefícios e os benefícios desse período? Vale relembrar que as políticas de defesa do café acabaram implicando em superprodução e em o que Celso Furtado chamou de socialização das perdas, ao passo que o sistema como um todo acabou pagando a conta por meio de um efeito inflacionário expressivo. Por fim, aprendemos nessa unidade sobre o Plano de Metas de Juscelino Kubits- check: planejamento estatal e consolidação do processo de substituição de importações e sobre a crise de 1962 – 1967, o PAEG e as bases do milagre econômico. Quanta coisa não é mesmo? Quantos detalhes caracterizam o período estudado. Espero que esse estudo tenha sido proveitoso e que você tenha gostado de apren- der sobre a economia brasileira. Vamos para a unidade II? O roteiro é outro, mas a viagem continua sendo fantástica. Nesta nova unidade vamos tratar dos planos de desenvolvi- mento, do milagre econômico brasileiro, de alguns choques externos e por fim de algumas crises, tais como da dívida externa e fiscal do Estado Um forte abraço! Professora Me. Daniela Carla Monteiro. 24UNIDADE I Economia Brasileira LEITURA COMPLEMENTAR Carta-testamento de Getúlio Vargas: 63 anos de um marco nacional “A carta-testamento é um documento digno de ser lido, porque ele é generoso; ele é um texto humano; muito forte”, exaltava Leonel Brizola, durante a disputa da eleição para prefeito da Cidade do Rio de Janeiro, em 2000. O discurso abordava a importância do documento deixado pelo ex-presidente da República, Getúlio Vargas, antes do suicídio, que ocorreu em 24 de agosto de 1954, no Palácio do Catete, no Rio de Janeiro, com duas versões: uma manuscrita e outra datilografada. Representativo e impactante, esse posicionamento sempre foi ratificado e ecoado por trabalhistas em cada parte do país. Ao contextualizar o indicativo da carta, Brizola mostrava o inconsequente ataque que o trabalhista sofria no período. “Havia um ambiente já de golpe de estado, por causa da Petrobras, dos conflitos, tudo isso aí. Ele sentiu. E não quis ser humilhado. Ele ia ser humilhado. Ia ser derrubado. Pressão americana muito grande; cresce no estrangeiro, em outros países. E ele se suicidou e deixou aquela carta.” “O dia 24 de agosto foi um dia que vocês não têm uma ideia do que foi. O povo, cho- cado com a morte do presidente, porque aquilo vinha de uma campanha, de uma pressão de campanha terrível, que ele, naquela manhã deu fim à sua vida. E aquilo veio”, explicou, ao completar: “Ele entregou a carta-testamento para João Goulart e mandou que ele saísse daqui, porque ele achava que eles iam destruir a carta-testamento. Mas houve ação de muitos companheiros naquela hora, e fizeram a Rádio Nacional ler a Carta-testamento. Bom, foi um estouro.” Segundo o líder pedetista, a divulgação da morte potencializou a reação da po- pulação. “Vocês sabem que o povo saiu em fúria pelas ruas, por toda a parte, quebrando tudo. Compreendeu? Quebrando tudo. Quebraram os jornais inimigos, os jornais de Cha- teaubriand; queimaram consulados americanos; o que era firma americana, quebraram tudo, incendiaram. O próprio Exército só depois, mais tarde (quando amainou um pouco a situação) é que saiu nas ruas.” O ex-senador e antropólogo, Darcy Ribeiro, ratificava que Getúlio foi o maior dos estadistas brasileiros. “Foi também o mais amado pelo povo e o mais detestado pelas elites. Tinha de ser assim. Getúlio obrigou nosso empresariado urbano de descendentes de senhores de escravos a reconhecer os direitos dos trabalhadores. Os politicões tradicio- 25UNIDADEI Economia Brasileira nais, coniventes, senão autores da velha ordem, banidos por ele do cenário político, nunca o perdoaram”, indicou. Para ele, Getúlio governou o Brasil durante 15 anos sob a legitimação revolucioná- ria, foi deposto, retornou, pelo voto popular, para mais cinco anos de governo. “Enfrentou os poderosos testas-de-ferro das empresas estrangeiras, que se opunham à criação da Petrobras e da Eletrobrás, e os venceu pelo suicídio, deixando uma carta-testamento, que é o mais alto e mais nobre documento político da história do Brasil”, acrescentou, ao consi- derar o documento essencial na história brasileira contemporânea. Darcy relata ainda que o efeito do suicídio de Getúlio foi uma revirada completa. Segundo ele, a opinião pública, antes anestesiada pela campanha da imprensa, percebeu que se tratava de um golpe contra os interesses nacionais e populares. “Era a direita que estava assumindo o poder e que Getúlio fora vítima de uma vasta conspiração. Os testas- -de-ferro das empresas estrangeiras e o partido direitista, que esperavam apossar-se do poder, entraram em pavor e refluíram. As forças armadas redefiniram sua posição, o que ensejou condições para a eleição de Juscelino Kubitscheck”, ponderou. No relato do enterro, uma passagem emocionante. “O translado do corpo de Ge- túlio, do Palácio do Catete até o Aeroporto Santos Dumont foi a maior, a mais chorosa e mais dramática manifestação pública que se viu no Brasil. Pode-se avaliar bem o pasmo e a revolta do povo brasileiro ante esta série de acontecimentos trágicos, que induziram seu líder maior ao suicídio como forma extrema de reverter a sequência política que daria fatalmente o poder à direita Fonte: Ribeiro (2017) 26UNIDADE I Economia Brasileira MATERIAL COMPLEMENTAR LIVRO Título: Economia Brasileira Autor: Antônio Corrêa de Lacerda Editora: Saraiva – 4. Ed. 2010 Sinopse: Partindo da economia colonial, passando pela expansão cafeeira e abordando o processo de substituição de importações, desde as origens do processo de industrialização até o II PND, Economia Brasileira abrange todos os tópicos essenciais para a compreensão do atual estágio do país. Tendo como enfoque a co- bertura do programa da disciplina, sem se deter exageradamente em aspectos inerentes a outras matérias, discute detalhadamente, de forma sem similar em outros livros-texto da matéria, o período recente. De forma didática e clara, os autores elucidam questões como a crise e a hiperinflação dos anos 1980 e os desequilíbrios gerados, bem como as iniciativas heterodoxas de combate à in- flação, e os anos 1990, com a implementação de políticas de mo- dernização que incorporam os princípios de rigidez orçamentária, abertura comercial e estabilização da moeda, além de apresentar um retrato minucioso do Brasil atual, ilustrado com os principais indicadores socioeconômicos. A alta qualidade do texto, a atuali- zação de todos os dados estatísticos e a abordagem inovadora e profunda da matéria, expostas de maneira absolutamente sucinta e fácil, fruto da reconhecida capacidade dos autores, todos com relevantes contribuições acadêmicas, fazem de Economia Brasi- leira uma nova e definitiva referência na área. FILME/VÍDEO Título: Getúlio Ano: 2014 Sinopse: Getúlio Vargas passa seus 16 últimos dias pressionado por uma crise política em decorrência das acusações de que teria ordenado o atentado contra Carlos Lacerda. O presidente avalia os riscos existentes até tomar a decisão de se suicidar. 27 Plano de Estudo: ● Ditadura Militar no Brasil; ● Década perdida; ● Planos de estabilização instituídos no Brasil após 1985 até 1989. Objetivos da Aprendizagem: ● Apresentar como se instituiu e se desenvolveu a ditadura militar no Brasil; ● Compreender a década perdida; ● Analisar os planos de estabilização instituídos no Brasil após 1985 até 1989. UNIDADE II Desenvolvimento Econômico Professora Ma. Daniela Carla Monteiro 28UNIDADE II Desenvolvimento Econômico INTRODUÇÃO Olá, caro (a) acadêmico (a), seja bem-vindo (a) a segunda unidade do Livro de Economia Brasileira Contemporânea. Nesta unidade, você estudará o crescimento econô- mico alcançado durante a ditadura militar, os retrocessos enfrentados na década de 80 e os Planos de Estabilização instituídos no Brasil após 1985 até 1989. A aprendizagem em questão é fundamental para o entendimento da economia brasileira contemporânea, bem como para uma melhor compreensão dos assuntos que serão estudados nas unidades posteriores. O período aqui estudado, ainda é muito vivo na memória de muitos brasileiros. Começando pelo período da ditadura, não há como não trazer à tona discussões que envolvem crescimento econômico de um lado e repressão e autoritarismo de outro. Ademais, não há como não se tratar de uma década, que ficou co- nhecida como a década perdida, justamente após a economia brasileira ter experimentado taxas consideráveis de crescimento. Por fim, mas não menos importante, não há como não discutir cada um dos planos de estabilização instituídos no Brasil após 1985 até 1989. Assim, visando atingir os objetivos de aprendizagem elencados para esta unidade, ela foi dividida em três tópicos. No primeiro tópico, será abordado o período que foi marcado pela ditadura militar. Neste tópico, você aprenderá sobre quem apoiou o golpe de 64, quem foram os presidentes militares, quais foram as consequências da ditadura, entre outros. No segundo tópico, por sua vez, você aprenderá sobre o período que ficou conhecido como a década perdida. Por fim, no terceiro e último tópico, você aprenderá acerca dos planos de estabilização instituídos no Brasil após 1985 e até 1989, quais sejam: (a) Cruzado I e II; (b) Plano Bresser; e (c) Plano Verão. Espero que você absorva o máximo de conhecimento possível sobre esses períodos tão importantes para a nossa história, pois o conhecimento adquirido aqui será fundamental não somente para você se tornar um bom economista, mas também para você conhecer, enquanto cidadão ativo em nosso país, os importantes acontecimentos que marcaram a nossa história. Bons estudos e um forte abraço! Professora Me. Daniela Carla Monteiro. 29UNIDADE II Desenvolvimento Econômico 1. DITADURA MILITAR NO BRASIL A ditadura militar esteve presente no Brasil de 1964 a 1985. Instaurada por meio de um golpe organizado por militares, pelo empresariado brasileiro e com o apoio dos Estados Unidos da América, este regime depôs o então presidente João Goulart. A ditadura militar no Brasil, ainda é lembrada pelo autoritarismo e pela repressão que se instituiu nos 21 anos de sua vigência. Além da derrubada do supracitado presidente, o golpe previa ainda o cercea- mento do projeto trabalhista, projeto este que visava desenvolvimento e bem-estar social. João Goulart assumiu a presidência do Brasil enquanto vice-presidente porque o então Presidente Jânio Quadros abriu mão de sua gestão em agosto de 1961. A Constituição federal vigente no período, ou seja, a Constituição de 1946, previa que o vice-presidente deveria assumir a gestão do país em caso de renúncia. No entanto, os militares foram contrários a tal determinação, o que por sua vez resultou em uma campanha que ficou co- nhecida como campanha da legalidade ao passo que os militares insistiam em não acatar o que a Constituição Federal previa. Nessa direção, Jango só chegou ao poder porque a referida campanha garantiu a sua posse. Mas, sua posse aconteceu mediante algumas restrições, pois após o risco de se vivenciar uma guerra civil, optou-se pela adoção de um regime parlamentarista. Em outras palavras, permitiu-se a posse de João Goulart, no entanto, essa posse foi permitida me- diante um regime parlamentarista que por sua vez reduzia os direitos políticos do então presidente. Em janeiro de 1963, retornou ao Brasil o presidencialismo e assim Jango co- 30UNIDADE II Desenvolvimento Econômico meçoua governar com mais autonomia e colocou em prática uma agenda reformista. Jango propunha reformas estruturais e essas reformas ficaram conhecidas como reformas de base. Mas afinal, o que exatamente as reformas de base pretendiam? As reformas de base pretendiam promover mudanças em áreas consideradas essenciais, entre elas a educacional, a habitacional e a agrária. Ao contrário do que muitos acreditam, a área mais debatida, principalmente pelo fato dela interferir em interesses de grandes latifundiários, foi a agrária. Desta forma, pode-se afirmar que a área agrária foi a que mais desgastou o governo Jango. Em outras palavras, a questão agrária selou o destino do então presidente, pois seus apoiadores, por não concordarem com suas propostas de reforma agrária, deixa- ram de apoiá-lo e passaram a pertencer à oposição. Mas, atenção, não se deve atribuir somente às reformas de base toda responsabi- lidade ao desgaste atribuído ao governo Jango. A título de exemplo, pode-se citar a lei de remessas de lucros que foi criada em 1962 e que também desagradou interesses americanos no Brasil, daí é que vem o apoio dos Estados Unidos da América ao golpe de 1964. Em outras palavras, os Estados Unidos da América apoiou o golpe de 1964, porque viu seus interesses serem fortemente afetados pela supracitada lei. A lei em questão proibia que as empresas estadunidenses, instituídas no Brasil, enviassem mais de 10% dos lucros obtidos. João Goulart tinha fama de comunista, principalmente pelo fato de o mesmo rela- cionar-se com sindicalistas. Ademais, as propostas de Goulart eram vistas como propostas radicais, propostas estas que objetivavam promover desenvolvimento e conter desigualda- des. Assim sendo, é fato que as escolhas de Goulart não agradavam o empresariado brasi- leiro ao passo que este grupo acreditava que as propostas de Goulart atingiam diretamente os seus interesses, principalmente quando o assunto era política trabalhista. E assim, a oposição, agora pertencente ao partido União Democrática Nacional (UDN), articulou-se para retomar o poder a qualquer custo. REFLITA Você sabia que os EUA consideravam parte das políticas propostas por Jango, políticas de cunho comunista? Fonte: a autora. 31UNIDADE II Desenvolvimento Econômico Mas afinal, quem pagou essa conta? Ou seja, quem financiou a articulação que derrubou o presidente? A resposta para esta questão é muito simples, isto é, os financia- mentos foram realizados por duas instituições, quais sejam: o instituto brasileiro de ação democrática e instituto de pesquisa e estudos sociais. O primeiro instituto contribuiu com investimentos em candidatos conservadores; o segundo, por sua vez, investiu em mate- rial publicitário acerca de como andava o país. Registre-se que o instituto de pesquisa e estudos sociais era mantido financeiramente pelo empresariado brasileiro. Não obstante, é importante deixar claro que os Estados Unidos da América também apoiaram financeira- mente o golpe contra Jango. No entanto, não foi só com o dinheiro dos Estados Unidos da América que se pode contar, ou seja, os militares também contaram com o apoio militar dos estadunidenses, caso a ação preparada contra Jango não desse certo. A gota d’água para o golpe se deu através de um comunicado pelo presidente em um comício da central do Brasil onde João Goulart afirmou categoricamente que as reformas por ele proposta aconteceriam por bem ou por mal, o que por sua vez fez com que os grupos que se posicionavam contra o presidente começassem a agir. Desta forma, para conter o presidente foi organizada uma passeata denominada de família com Deus pela liberdade. Esta passeata foi realizada em São Paulo e contou com um considerável número de pessoas. Essa considerável adesão à passeata, deixou claro a existência de milhares de adeptos àqueles que se declararam opositores de João Goulart. SAIBA MAIS Cada vez mais temerosos das atitudes de Goulart, os militares, liderados pelo chefe do Estado-Maior do Exército, general Castelo Branco, implementaram no final do mês de janeiro, à revelia do presidente, um Acordo Militar com os Estados Unidos. Esse acordo, sob a forma de um ajuste pormenorizado, previa a necessidade de assistência ao Brasil para enfrentar ameaças, atos de agressão ou quaisquer outros perigos à paz e à segu- rança, conforme os compromissos assinalados na carta da Organização dos Estados Americanos (OEA). Fonte: JOÃO Goulart. 2001. Disponível em: https://cpdoc.fgv.br/producao/dossies/Jango/biografias/joao_ goulart. Acesso em: 07 maio 2021. 32UNIDADE II Desenvolvimento Econômico E assim, em 31 de março de 1964, iniciou-se uma rebelião militar. Essa rebelião foi crescendo dia após dia e o presidente se manteve inerte, o que fez com que parlamentares se reunissem e consolidassem o golpe, declarando assim “vaga” a cadeira da presidência. O primeiro presidente, provisório, que tivemos nesse processo foi Ranieri Mazzi. Em eleições diretas, foi escolhido como presidente da ditadura Humberto Castello Branco que governou de 1964 a 1967. Posteriormente tivemos, Artur Costa e Silva (1967-1969); Emílio Gastarrazu Médici (1969-1974); Ernesto Geisel (1974-1979); e João Figueiredo (1979 – 1985). O mapa mental abaixo, apresenta de forma simples e descomplicada, etapas desse importante regime. FIGURA 01: AS PRINCIPAIS ETAPAS DO REGIME MILITAR Fonte: SILVA, Daniel Neves. “Ditadura Militar no Brasil”; Brasil Escola. Disponível em: https://brasilescola.uol.com.br/historiab/ditadura-militar.htm. Acesso em 19 de abril de 2021. Isto posto, saliento que muitos foram os acontecimentos que marcaram a ditadura militar, acontecimentos esses que entraram para a nossa história e que ainda vivem na memória de muitos brasileiros. Entre esses acontecimentos estão: (a) repressão, repressão esta justificada em nome da segurança nacional, (b) tortura contra opositores, entre outros. Em termos econômicos, as fases, gestão e atuação de cada militar que governou o Brasil, 33UNIDADE II Desenvolvimento Econômico foi bem diferente, ou seja, cada uma teve a sua particularidade. E assim, ao final desses 21 anos em que o Brasil manteve-se nas mãos de militares, tivemos: (a) Inflação elevada; (b) Endividamento; e (c) Desigualdade social considerável. O percurso para alcançar tal saldo foi: (1) Contenção de gastos, entre 1964 e 1967, que repercutiu em desaquecimento do consumo e arrocho no salário dos trabalhadores; (2) O período denominado de milagre econômico, entre 1968 – 1973, onde viven- ciou-se expansão do crédito e do consumo, crescimento econômico considerável e realiza- ção de grandes obras públicas; (3) Continuidade da política advinda do período do milagre, entre 1974-1980, com proposta de diversificação de matriz energética e desenvolvimento industrial, via endivida- mento governamental; e (4) Tentativas frustradas, entre 1980-1985, de controlar a inflação e a dívida externa. 34UNIDADE II Desenvolvimento Econômico 2. DÉCADA PERDIDA (1979 – 1989) Década perdida, este foi o nome dado à década de 80. Mas na final porque a dé- cada de 80 foi chamada assim? Muitos acontecimentos tanto no Brasil quanto no exterior impactaram a economia brasileira e foi justamente esses impactos que denominaram a supracitada década. Registre-se que neste período tentativas de se implementar políticas de cunho monetário para estabilizar a economia fracassaram e assim a tão sonhada estabiliza- ção não aconteceu. Ademais o período foi marcado ainda por uma estagnação econômica, estagnação essa marcada por um tímido crescimento do PIB, inflação elevada, retração da produção industrial, entre outros. Não obstante, outros países latino-americanos enfrentaram a mesma dificuldade, isto é, os problemas enfrentados pelo Brasil no período em questão foram exatamente os mesmos problemas enfrentados por outras nações latino-americanas.REFLITA Você sabia que a Década Perdida se tornou um grande marco no Brasil, principalmente por ter sucedido o período que ficou conhecido como “milagre econômico brasileiro” ? Fonte: a autora. 35UNIDADE II Desenvolvimento Econômico Mas afinal, quais eram exatamente esses problemas? Pode-se dizer que os proble- mas enfrentados pelo Brasil e por outras economias se resumiam em alta volatilidade dos mercados e intensificação da desigualdade social, em decorrência do acentuado processo inflacionário vivenciado. Registre-se ainda que a década perdida é caracterizada por taxas de juros internacionais elevadas que implicaram em aumento da dívida entre Brasil e Esta- dos Unidos, isto é, vivenciou se aumento do déficit público, da dívida interna pois o governo adotou uma política fiscal expansionista que contribuiu para tal feito. Nessa direção, pode-se dizer que na década perdida o Brasil vivenciou aconteci- mentos muito ruins, entre eles, diminuição do PIB, desemprego, aumento da dívida externa, inflação e queda da renda per capita. Desta forma, a situação pela qual o Brasil passou, pode ser considerada como uma situação muito desconfortável. E assim, o final da década perdida, entre outros, foi marcado pela ampliação do processo de abertura da economia brasileira. Ademais, no último ano da supracitada década, o Brasil voltou a votar, e escolheu como presidente da república Fernando Collor de Mello, governo que estudaremos nas próximas unidades. 36UNIDADE II Desenvolvimento Econômico 3. PLANOS DE ESTABILIZAÇÃO INSTITUÍDOS NO BRASIL APÓS 1985 ATÉ 1989 3.1. Plano Cruzado O plano Cruzado foi um plano de estabilização instituído em fevereiro de 1986, sob a gestão do presidente José Sarney. O objetivo da instituição do plano era controlar a infla- ção. Inicialmente o plano foi bem sucedido, o que significa dizer que a inflação cedeu e caiu, no entanto, logo voltou a crescer. Atribui-se a essa retomada da aceleração inflacionária a ausência de reformas monetárias, fiscais e estruturais necessárias. Registre-se ainda que a demanda agregada aumentou além da capacidade de produção da economia. Considerado um plano heterodoxo, adotou as medidas discriminadas no Quadro 01. QUADRO 01: PRINCIPAIS MEDIDAS DO PLANO CRUZADO Medidas Descrição Introdução de nova moeda A unidade do sistema monetário brasileiro passou a ser o cruzado, em substituição ao cruzeiro. A conversão de valores expressos em cruzeiros para cruzados foi fixada à razão de mil cruzeiros para cada cruzado. 37UNIDADE II Desenvolvimento Econômico Regra de conversão de obrigações contratuais Critérios distintos foram aplicados para as obriga- ções contratadas com cláusulas de indexação e àquelas que não previam tal cláusula. No caso de obrigações sem cláusula de indexação, ficou esta- belecido que, a partir do dia 3 de março de 1986, o cruzado teria uma valorização diária de 0,45% em relação ao cruzeiro, equivalente a uma inflação mensal de 14,42% da antiga moeda. Para as obri- gações com cláusula de indexação, a conversão foi efetuada em duas etapas. Na primeira, os valo- res em cruzeiros foram atualizados para cruzeiros do dia 28 de fevereiro de 1986, mediante a aplica- ção pro rata da correção monetária. Na segunda etapa, os valores assim obtidos foram convertidos para cruzados à razão de um cruzado para cada mil cruzeiros. Esse procedimento foi usado para a conversão dos saldos das cadernetas de poupan- ça, do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) e do Fundo de Participação PIS/PASEP. Congelamento de pre- ços Todos os preços foram congelados, e nomeou-se também como agente fiscalizador qualquer pes- soa do povo. O congelamento poderia ser suspen- so por ato do Poder Executivo. Desindexação A Obrigação Reajustável do Tesouro Nacional (ORTN), que era corrigida mensalmente pela taxa de inflação, foi extinta. Em seu lugar foi criada a Obrigação do Tesouro Nacional (OTN), cujo valor foi congelado até o dia 3 de março de 1987. O uso de cláusula de correção monetária nos contratos com prazos inferiores de um ano foi proibido. A correção monetária para a caderneta de poupança e para os fundos de poupança forçada (FGTS e PIS/PASEP) foi mantida. Conversão dos salários para cruzados Os salários foram convertidos para cruzados pelos seus valores reais médios, de acordo com o Índice Nacional de Preços ao Consumidor (IPCA), do Ins- tituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Ao valor real médio foi acrescido um abono de 8%. O valor fixado para o salário mínimo incorporou um abono de 16%. Indexação dos salários Os salários foram indexados de acordo com uma escala móvel, que reajustaria automaticamente o salário toda vez que a inflação acumulada alcan- çasse 20%. Nas datas-base do reajuste de cada categoria profissional, os salários teriam um rea- juste de, no mínimo, 60% da variação acumulada de 60% da inflação, medida pelo índice de preços ao consumidor do IBGE. 38UNIDADE II Desenvolvimento Econômico Conversão dos alu- guéis, prestações do Sistema Financeiro de Habitação e mensalida- des escolares Estes preços foram convertidos para cruzados de acordo com o princípio do valor real médio. Política cambial A taxa de câmbio foi utilizada como âncora do sis- tema e o seu valor foi fixado em 13 cruzados e 80 centavos por dólar. Porém, este valor não foi congelado, pois o Banco Central do Brasil poderia alterá-lo a qualquer momento. Fonte: adaptado de Modiano (1986). Mas afinal, o que foi que deu errado? De acordo com especialistas e estudiosos do assunto, o que deu errado no Plano Cruzado foi a forma como a inflação foi diagnosticada pela equipe econômica. Em outras palavras, o remédio (medidas) era bom, mas a doença era outra. Diagnosticaram a inflação como sendo do tipo inercial, mas não se preocuparam com a política fiscal, pois na visão inercialista da inflação o déficit público e o financiamento não se relacionavam com a questão inflacionária. SAIBA MAIS Após os primeiros meses do Plano Cruzado, o estrangulamento no abastecimento de alguns produtos assumiu tamanha intensidade, que seria duvidoso atribuí-lo apenas à expansão do consumo. Seguramente, decisões empresariais contribuíram para tal de- sequilíbrio. Outro fato marcante foi a persistência de expressivos superávits comerciais, colaborando para a sustentação do clima otimista e atendimento aos compromissos com a dívida externa. Até setembro de 1986, o desempenho da Balança Comercial difundiu a crença na possi- bilidade de o país honrar o serviço da dívida, sem comprometer o ritmo de crescimento econômico. Esse otimismo não era compartilhado por toda a equipe governamental, pois o pacote de julho, já incluía, entre suas justificativas, a preocupação com o compor- tamento projetado das contas externas. Fonte: Averbug (2005, p. 226). 39UNIDADE II Desenvolvimento Econômico Desta forma, tendo o plano cruzado fracassado, um novo pacote econômico foi anunciado, cuja denominação foi Plano Cruzado II. E assim novas medidas foram anuncia- das, sendo elas: (a) Medidas de estímulo à poupança; (b) Medidas fiscais com correção de preços; (c) Outras medidas fiscais; (d) Medidas de estímulo à exportação; (e) Medidas de desindexação; e (f) Medidas de redução da participação do estado na economia. Tais medidas também fracassaram. O motivo? O motivo foi que novamente as origens do processo inflacionário não foram atacadas, isto é, não estancou-se o financia- mento do déficit público via emissão de moeda e não alterou-se os regimes: cambial, fiscal e monetário. O Plano apenas se preocupou em conter a inflação congelando os preços. 3.2. Plano Bresser O Plano Bresser foi criado com o intuito de resolver dois grandes problemas, até então não solucionados pelos planos antecessores, quais sejam: (a) déficit público; e (b) infla- ção. Nessadireção, o plano foi lançado por Bresser Pereira, então Ministro da Fazenda, em junho de 1987. O plano compreendia tanto componentes heterodoxos quanto componentes ortodoxos. Mas afinal, quais foram as principais medidas adotadas pelo supracitado plano? O Quadro XX, apresenta as 10 principais medidas que caracterizaram o plano Bresser. QUADRO 02: PRINCIPAIS MEDIDAS ADOTADAS POR MEIO DO PLANO BRESSER Congelamento de salários por três meses; Congelamento de preços por três me- ses; Mudança de base do índice de preços ao consumidor (IPC); Desvalorização cambial; Congelamento de aluguéis; Criação da URF (união Referencial de preços) que corrigia salários com base na inflação dos três meses anteriores; Aumento de tributos; Eliminação de subsídio do trigo; 40UNIDADE II Desenvolvimento Econômico Adiamento em obras de grande porte planejadas; Retomada de negociações com o Fundo Monetário Internacional (FMI), suspendendo a moratória. Fonte: Elaborado pela autora a partir de Gremaud et al (2020) Tais medidas não foram suficientes para que os objetivos do plano fossem atingidos. Em outras palavras, as supracitadas medidas não foram capazes de conter a inflação e contro- lar o déficit público, o que levou Bresser a deixar o cargo que ocupava em dezembro de 1988. 3.3. Plano Verão Em 14 de Janeiro de 1989, Maílson da Nóbrega, ministro da fazenda, lançou o Plano Verão. Esse plano compreendia medidas de cunho econômico cujo fim era controlar a inflação. Tratava-se de um ano eleitoral, fato este que desfavorecia ainda mais o plano. Dentre as principais medidas adotadas com o Plano Verão, têm-se: (a) Congelamento de preços, salários e câmbio; (b) Elevação da taxa interna de juros; (c) Proposta de ajuste fiscal; (d) Desindexação parcial; (e) Criação da moeda cruzado novo, com corte de três zeros; e, (f) Introdução de uma nova indexação diária. O plano foi bem sucedido? A resposta é sim e não. Sim, mas por apenas um in- tervalo de tempo muito curto. Taxas de juros elevadas, não foram capazes de impedir um aumento do consumo, reflexo de um comportamento preventivo decorrente da falta de credibilidade da política econômica. O cenário de incertezas, associado às eleições e a entrada da nova Constituição Federal, que vigora até os dias atuais, fez com que o governo José Sarney se acostumasse a conviver com a inflação (em torno de 45% a.m.), deixando essa responsabilidade para a próxima gestão. Em suma, o Plano Verão manteve preços e salários estáveis por dois meses, não realizou o pagamento da dívida externa, reduziu o superávit comercial e gerou déficit no Balanço de Pagamentos. 41UNIDADE II Desenvolvimento Econômico CONSIDERAÇÕES FINAIS Caro(a) acadêmico(a), estamos terminando a segunda unidade do livro de Economia Brasileira Contemporânea. Vamos relembrar aqui, ainda que brevemente, tudo o que estu- damos? Você se lembra que, num primeiro momento, você aprendeu sobre a ditadura militar no Brasil? Dos apoiadores do golpe de 64, quem mais lhe chamou a atenção? Empresários, imprensa, classe média ou os Estados Unidos da América? E com relação aos presidentes militares, qual deles foi o mais marcante para você? Grande parte dos alunos acabam se lembrando mais do governo Médici, vez que foi sob a gestão dele que o milagre econômico brasileiro aconteceu. A partir desse aprendizado, você consegue avaliar com mais precisão os avanços e retrocessos proporcionados por esse regime? Tenho certeza que sim! Você também se lembra que sequencialmente aprendeu sobre a década de 1980, que ficou conhecida como década perdida? A denominação dada a essa década foi decorrente da estagnação que a economia viveu no período supracitado. Ou seja, na década de 80 observou-se uma forte retração da produção industrial, bem como um menor crescimento econômico. Por conseguinte, foi alarmante o comportamento de indicadores que retrataram o subdesenvolvimento, tais como mortalidade infantil, falta de saneamento básico, desnutrição, entre outros. Por fim, mas não menos importante, você aprendeu sobre os planos de estabilização que se instituíram entre 1985 e 1989, quais sejam: (a) Cruzado I e Cruzado II; (b) Bresser; e (c) Verão. Embora as medidas propostas para esses planos se diferenciassem, o objetivo era exatamente o mesmo para todos eles, controlar a inflação que assolava o nosso país. Isto posto, chegamos ao fim de mais uma unidade. E aí? Preparado para unidade 3? Na unidade 3 você conhecerá mais alguns planos de estabilização e o plano que final- mente deu certo, ou seja, o plano que colocou a inflação brasileira em patamares estáveis. Tenho certeza que você vai adorar conhecer como foi a idealização do Plano Real. Até lá! Um forte abraço! Professora Me. Daniela Carla Monteiro. 42UNIDADE II Desenvolvimento Econômico LEITURA COMPLEMENTAR Comportamento da Economia durante o Plano Cruzado Irreconhecível! Essa seria a exclamação de quem comparava a realidade brasileira de antes e depois de 28 de fevereiro de 1986. A mudança de expectativa foi fulminante, graças à credibilidade inspirada pelo Plano, criando-se um arcabouço de apoio popular im- penetrável a qualquer contestação mais incisiva à nova política de estabilidade monetária. A percepção desfavorável quanto às perspectivas do país foi substituída pela confiança no futuro, materializando, na população, a mais rápida e profunda alteração de humor recen- temente verificada. As avaliações críticas efetuadas por alguns sindicatos, grupamentos políticos e núcleos acadêmicos não alcançavam ressonância e mostravam-se pálidos ante as manifestações de aprovação. Figuras do antigo regime desculpavam-se por não terem tido ideia semelhante, admitindo que o governo anterior não dispunha de credibilidade necessária para implantar política tão audaciosa. Esse primeiro impacto positivo foi consolidado em decorrência da queda da infla- ção: a taxa mensal em fevereiro de 1986 havia chegado a 22,4%, baixando nos três meses seguintes para 5,5%, -0,6% e 0,3%. Sob esse clima, várias transformações surgiram no organismo econômico. A primeira, ocorreu nos hábitos de poupança. Com o fim da corre- ção monetária e dos rendimentos insuflados pela elevada inflação, os frequentadores das múltiplas modalidades de captação de poupança (salvo a bolsa de valores) transferiram seus ativos financeiros a outras destinações, tais como aumento do consumo, compra de imóveis e mercado de ações. Os recursos canalizados à bolsa de valores poderiam ter sido fonte de financiamen- to ao investimento se utilizados na compra de ações primárias, resultantes de novos lan- çamentos. Porém, privilegiaram aquelas já em poder do público, promovendo apenas uma transferência de posse e tendência à valorização das cotações. Se essa valorização tivesse perdurado por longo tempo, talvez conseguisse induzir mais empresas a recorrerem ao aumento de capital, via lançamento de ações, como forma de financiar seus investimentos. O governo tentou convencer a população de que, por exemplo, a caderneta de pou- pança não havia perdido rentabilidade e de que os antigos elevados índices de valorização eram ilusórios, pois apenas refletiam a inflação. Entretanto, os primeiros meses do cruzado presenciaram a migração das disponibilidades das famílias em direção, principalmente, ao consumo, o que redundou em incremento também na demanda por bens intermediários. 43UNIDADE II Desenvolvimento Econômico Reagindo de maneira inversa à imaginada pela maioria dos observadores, que anteviam um arrefecimento da demanda familiar, a população transformou-se em um con- sumidor quase compulsivo. A previsão de arrefecimento provinha da suposta eliminação de compras efetuadas precipitadamente pelos assalariados, à época de inflação elevada, em consequência da convicção de que os produtos encareceriam. Mas ocorreu exatamente o contrário, em
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