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Laura R. T6 1 FPM VI Acidentes por Submersão INTRODUÇÃO Mais de 370 mil mortes todos os anos em decorrência de afogamento No Brasil, é a segunda causa de óbito entre crianças de 1 a 4 anos e terceira causa na idade de 10 a 19 anos O afogamento constitui importante causa de morbidade: sequelas neurológicas, como estado vegetativo persistente ou tetraplegia espástica, ocorrem em 5 a 10% dos casos de afogamento na infância DEFINIÇÃO E TERMINOLOGIA Afogamento: processo que resulta em comprometimento respiratório pela aspiração de líquido que ocorre por submersão ou imersão da vítima. A vítima pode sobreviver (afogamento não fatal) ou não (afogamento fatal). Resgate: vítima que é retirada da água sem sinais de aspiração líquida e “já cadáver”, quando não há chances de se iniciar a reanimação (sinais evidentes de morte, como rigidez cadavérica, livores, decomposição corporal ou tempo de submersão > 1h) O esquema de classificação é morte, morbidade ou não morbidade EPIDEMIOLOGIA Está entre as 3 principais causas de morte em crianças de 5 a 14 anos Menores de 1 ano: geralmente em casa, banheiras, baldes e vasos sanitários De 1 a 4 anos: geralmente em casa ou até 20 m dela: piscinas, espelhos d’água, tanques, etc Adolescentes e adultos: longe de casa: rios, lagos ou oceano durante atividades recreativas, como passeios de barco ou mergulho Fatores de risco: idade mais jovem, incapacidade de nadar, falta de cercas na piscina e de supervisão adequada, uso de álcool e/ou drogas, condições médicas como epilepsia, arritmias (incluindo sd. Do QT longo), cardiomiopatias, etc... FISIOPATOLOGIA A vítima consciente geralmente luta para permanecer na superfície da água, com os braços estendidos lateralmente e a cabeça esticada, no intuito de manter a VA fora da água É incapaz de gritar ou acenar por ajuda Durante esse processo inicial, que dura de 20 a 60 segundos, pode haver ingestão de água e aspiração, com tosse reflexa e até laringoesparmo (nesse caso, a hipóxia que se segue levará ao relaxamento da laringe e maior aspiração líquida) Conforme submerge, ainda consciente, a vítima faz apneia voluntária que se mantém até atingir um nível de hipercarbia, momento em que apresentará inspirações involuntárias e maior aspiração líquida O pulmão é o órgão de maior comprometimento, iniciando o processo de hipóxia. Embora existam diferenças osmóticas entre água doce e salgada, a aspiração de ambos os tipos causa graus semelhantes de lesão pulmonar, destruindo e lavando o surfactante. Haverá alteração na permeabilidade dos capilares pulmonares, com o extravasamento de líquidos para os alvéolos e espaço intersticial: shunt, edema pulmonar não cardiogênico, alveolite, broncoespasmo, atelectasias e diminuição da complacência pulmonar caracterizam o quadro que pode evoluir para síndrome da angústia respiratória aguda (SARA) A hipertensão pulmonar pode ser exacerbada pela liberação de mediadores inflamatórios Em uma pequena porcentagem de pacientes, a aspiração de vômito, areia, lodo, água estagnada e esgoto pode resultar na oclusão dos brônquios, broncoespasmo, pneumonia, formação de abscesso e dano inflamatório às membranas capilares alveolares. Pneumonia é uma consequência rara e é mais comum com submersão em água doce e quente estagnada (agentes não habituais encontrados: Aeromonas, Burkholderia e Pseudallescheria). Como a pneumonia é incomum no início do tratamento de lesões por submersão, o uso de terapia antimicrobiana profilática não mostrou qualquer benefício. A pneumonite química é uma sequela mais comum do que a pneumonia, especialmente se a submersão ocorrer em uma piscina clorada ou em um balde contendo um produto de limpeza A hipóxia prolongada leva à intensa vasoconstrição periférica e diminuição do débito cardíaco. As vítimas costumam ficar hipotérmicas, causando alterações de fluido extravascular e aumento da diurese, resultando em hipovolemia Durante o afogamento, há inicialmente hipertensão e taquicardia com ativação do SNS. Com o agravamento da hipóxia, acidose e hipotermia, haverá bradicardia, hipertensão pulmonar e diminuição do débito cardíaco Atividade elétrica sem pulso (AESP) geralmente se instala culminando em parada cardiopulmonar por assistolia. Podem ocorrer arritmias Laura R. T6 2 BBPM VI A lesão cerebral hipóxica é a principal causa de morbimortalidade e começa dentro de aproximadamente 5 minutos de oxigenação cerebral inadequada. A privação inicial de oxigênio é intensificada pelo comprometimento cardiovascular, causando lesões isquêmicas de diferentes intensidades no cérebro: zonas terminais vasculares, o hipocampo, córtex insular e os gânglio da base são particularmente suscetíveis Essas lesões isquêmicas primárias são geralmente reversíveis em crianças, com adequada ressuscitação, mas podem levar a alterações na memória, distúrbios nos movimentos e coordenação. Alguns poucos minutos a mais de hipóxia podem levar a um estado de coma vegetativo A instabilidade autonômica (tempestade diencefálica/hipotalâmica) é comum após lesão cerebral traumática, hipóxica ou isquêmica grave. Esses pacientes frequentemente apresentam sinais e sintomas de hiperestimulação do sistema nervoso simpático, com taquicardia, hipertensão, taquipneia, diaforese, agitação e rigidez muscular. Convulsões podem ser o resultado de hipóxia cerebral aguda, mas também podem estar incitando eventos que levam à perda de consciência e à incapacidade de proteger as vias aéreas A maioria dos afogamentos ocorre em água mais fria do que a temperatura termoneutra: assim, receptores de frio respondem com hiperventilação, aumento do débito cardíaco, vasoconstrição periférica e hipertensão A hipotermia também leva a alterações de fluido extravascular e aumento da diurese, resultando em hipovolemia Além disso, há diminuição do limiar de hipercapneia e estimulação direta no centro respiratório, fazendo com que as inspirações involuntárias ocorram mais precocemente. Afogamentos em águas muito frias (< 10°C) apresentam características fisiopatológicas específicas como disfunção miocárdica e arritmias induzidas por frio A deglutição de água durante o processo de afogamento pode aumentar o risco de vômito, espontaneamente ou durante a ressuscitação, e levar à aspiração de conteúdo gástrico. Também pode ser a responsável por alterações eletrolíticas encontradas em algumas vítimas, principalmente crianças pequenas É importante ressaltar que as condições médicas predisponentes (hipoglicemia, intoxicação, convulsões e arritmias cardíacas) ou concomitantes (cabeça, coluna cervical e multissistema) associadas à fisiopatologia do afogamento podem complicar o quadro clínico. Reflexo do mergulho: um dos mecanismos propostos para explicar por que algumas vítimas de afogamento sobrevivem após longos períodos de submersão. TRATAMENTO PRÉ-HOSPITALAR Objetivo: restaurar a ventilação e circulação o mais rápido possível As manobras de reanimação deverão ser iniciadas imediatamente ao se encontrar uma vítima afogada: o Se a vítima estiver em apneia, deve-se iniciar a ventilação (boca-a-boca, boca-boca-nariz, dispositivos como bolsa-válvula-máscara) imediatamente Laura R. T6 3 BBPM VI HOSPITALAR Objetivo: reverter hipoxemia, restaurando a oxigenação adequada e ventilação Toda vítima que apresentou algum grau de aspiração líquida deverá ficar pelo menos de 4 a 6 horas (para alguns autores, 8 horas) em observação, monitorada para piora respiratória, mesmo que tenha poucos ou nenhum sintoma aparente VIAS AÉREAS E VENTILAÇÃO Em pacientes hipoxêmicos que não requerem intubação imediata, oxigênio suplementar deve serfornecido para manter a SpO2 acima de 90 ou 92%. A ventilação com pressão positiva não invasiva (CPAP ou BPAP) pode ser usada, monitorando possível hipotensão pelo aumento da pressão intratorácica e vômito, por distensão abdominal. As indicações para intubação são: o Sinais de deterioração neurológica ou incapacidade de proteger as vias aéreas. o Incapacidade de manter PaO2 > 60 mmHg ou saturação de oxigênio (SpO2) > 90%, apesar do uso de um sistema de fornecimento de oxigênio de alto fluxo ou ventilação não invasiva. o Parada respiratória ou parada cardiorrespiratória. Se a IOT for realizada, uma sonda orogástrica deve ser colocada para aliviar a distensão Além dos sinais vitais e reavaliação clínica frequentes, a monitoração do paciente deve incluir saturação de oxigênio e CO2 expirado, traçado eletrocardiográfico, pressão arterial, volume de diurese (por sondagem vesical) CIRCULAÇÃO Acessos venosos periférico ou intraósseo são preferíveis por serem de rápida obtenção A reposição volêmica dever ser feita com soluções cristaloides, em bolos de 20 mL/kg (lembrar que o afogado é um hipovolêmico). A correção da acidose geralmente ocorre com a melhora na ventilação e volemia, sem necessidade de correção de bicarbonato A disfunção cardíaca pode prevalecer mesmo após a ventilação e reposição volêmica adequadas, sendo necessário o uso de drogas inotrópicas, sendo a dobutamina a de escolha inicial o A Dobutamina aumenta o volume sistólico e o débito cardíaco. Diminui a pressão ventricular de enchimento (reduz a pré-carga) e as resistências vascular pulmonar e sistêmica total Indivíduos em PCR: se a temperatura da vítima estiver abaixo de 30°C, tando as medicações quanto a desfibrilação são ineficazes. Se indicada, faz-se uma tentativa de desfibrilação, mantendo a RCP até a temperatura aumentar de 32°C DEMAIS MEDIDAS Roupas úmidas devem ser removidas e o reaquecimento iniciado em pacientes hipotérmicos Os métodos mais comuns incluem reaquecimento externo (cobertores quentes, almofadas de aquecimento, calor radiante, ar quente forçado) e interno (oxigênio umidificado aquecido, soro aquecido endovenoso ou lavagem gástrica, irrigação peritoneal/pleural, diálise). O objetivo é evitar uma queda adicional na temperatura central e estabelecer uma taxa de reaquecimento segura e estável, mantendo a estabilidade cardiovascular: reaquecer o paciente 1 a 2°C por hora até 33°C, ou no máximo 36°C. A hipertermia deve ser evitada, pois, entre outras coisas, aumenta as demandas metabólicas cerebrais e diminui o limiar de convulsão Uma avaliação global do paciente deve ser realizada a procura de lesões traumáticas e estudos de imagem apropriados obtidos conforme indicado Situações sugestivas de trauma raquimedular: o Afogamento em local raso o Politrauma o Mergulho de altura o Esportes radicais o Dor em coluna vertebral o Trauma craniano ou facial Exames iniciais como gasometria arterial e glicemia, radiografia de tórax e eletrocardiograma são essenciais no paciente sintomático. Hemograma, eletrólitos séricos, ureia, creatinina, TGO, TGP, lactato, provas de atividade inflamatória, troponina, triagem sanguínea e urinária para álcool e drogas ilícitas podem ser solicitadas. Exames radiológicos adicionais são indicados na presença de lesões traumáticas. Pacientes com rebaixamento do nível de consciência mantido após estabilização são submetidos a exames de imagem (tomografia ou ressonância magnética cerebral). A radiografia de tórax ou tomografia computadorizada na apresentação pode variar de normal a edema pulmonar peri-hilar localizado ou difuso. Broncoespasmo é frequentemente observado em vítimas de afogamento não fatal, e o manejo é semelhante ao da asma aguda. O uso de antibióticos profiláticos não está indicado (exceção de afogamentos em águas altamente contaminadas, como o rio Tietê em São Paulo). Em caso de Laura R. T6 4 BBPM VI evolução sugestiva de pneumonia, a antibioticoterapia deve ser dirigida a patógenos transmitidos pela água, como Aeromonas, Pseudomonas, Burkholderia e Pseudallescheria). O cateterismo da artéria pulmonar pode ser útil para direcionar a reposição de fluidos e suporte inotrópico. Não evidências para uso de ECMO. Não há evidências para uso de surfactante exógeno A internação com monitoração é recomendada para aqueles pacientes que sofreram uma exposição hipóxica significativa (submersos por mais de 1 minuto, ou que apresentaram apneia, cianose ou que necessitaram de RCP) ou aqueles que após o período de observação têm uma necessidade persistente de oxigênio ou permanecem sintomáticos. A admissão na UTI deve ser considerada para pacientes que necessitaram de ressuscitação pulmonar ou cardíaca, experimentaram hipotermia moderada a grave ou tiveram uma radiografia de tórax ou gasometria arterial anormais. PROGNÓSTICO 4 resultados podem ocorrer no afogamento pediátrico: recuperação completa (neurologicamente intacta), comprometimento neurológico, estado vegetativo persistente e morte O tempo de submersão é o principal fator preditivo de prognóstico: < 5min com resultados favoráveis, >25 mim resultados invarialmente fatais PREVENÇÃO Cercas de proteção de piscina Coletes salva-vidas Aulas de natação (treinamento de segurança na água) Supervisão constante de um adulto e presença de salva- vidas
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