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INTRODUÇÃO ÀS CIÊNCIAS SOCIAIS E POLÍTICAS
Juliane Scariot
SUMÁRIO
Esta é uma obra coletiva organizada por iniciativa e direção do CENTRO SU-
PERIOR DE TECNOLOGIA TECBRASIL LTDA – Faculdades Ftec que, na for-
ma do art. 5º, VIII, h, da Lei nº 9.610/98, a publica sob sua marca e detém os 
direitos de exploração comercial e todos os demais previstos em contrato. É 
proibida a reprodução parcial ou integral sem autorização expressa e escrita.
CENTRO UNIVERSITÁRIO UNIFTEC
Rua Gustavo Ramos Sehbe n.º 107. Caxias do Sul/ RS 
REITOR
Claudino José Meneguzzi Júnior
PRÓ-REITORA ACADÊMICA
Débora Frizzo
PRÓ-REITOR ADMINISTRATIVO
Altair Ruzzarin
DIRETOR DE ENSINO A DISTÂNCIA (EAD) 
Rafael Giovanella
Desenvolvido pela equipe de Criações para o Ensino a Distância (CREAD)
Coordenadora e Designer Instrucional 
Sabrina Maciel
Diagramação, Ilustração e Alteração de Imagem
Igor Zattera, Julia Oliveira, Thaís Munhoz 
Revisora
Luana dos Reis
O MUNDO DAS CIÊNCIAS SOCIAIS 4
A TRANSIÇÃO MEDIEVO-MODERNIDADE 5
O PROBLEMA DA SOCIOLOGIA 10
O OLHAR ESTRANHADOR 15
A INTERAÇÃO SOCIAL 20
AS TIPIFICAÇÕES 21
A INSTITUCIONALIZAÇÃO 24
A CONSTRUÇÃO DOS PAPÉIS SOCIAIS 26
A DOMINAÇÃO LEGÍTIMA 28
A CONSTRUÇÃO DA IDENTIDADE SOCIAL 33
A SOCIALIZAÇÃO 34
A CONSTRUÇÃO DA PRÓPRIA HISTÓRIA 36
BRASILEIRO: O HOMEM CORDIAL 42
O CONTROLE SOCIAL E O DESVIO 44
RELAÇÕES SOCIAIS COMPLEXAS 49
A DIVISÃO DO TRABALHO 50
AS CONCEPÇÕES DE MARX 54
A VIDA MENTAL DO CIDADÃO CONTEMPORÂNEO 56
A POLÍTICA 62
 OS CONCEITOS DE TOCQUEVILLE 63
A TEORIA DAS ELITES E OS PARTIDOS POLÍTICOS 66
A POLIARQUIA DE ROBERT DAHL 68
MÉTODOS DE PESQUISA EM CIÊNCIAS SOCIAIS 73
O ARTESANATO INTELECTUAL 74
EXEMPLOS METODOLÓGICOS 76
3INTRODUÇÃO ÀS CIÊNCIAS SOCIAIS E POLÍTICAS
APRESENTAÇÃO
Olá, aluno! Seja bem-vindo à disciplina de Introdução às ciências sociais 
e políticas.
Nascemos, vivemos e morremos em uma sociedade. Nossos comportamen-
tos, nossa forma de vestir, o estilo de nossas casas, nossos costumes, nossa le-
gislação, nossa forma de punir, etc. Tudo isso está imerso em questões sociais. 
Essa disciplina propõe “desnaturalizar” as construções sociais, torná-las objeto 
de estudo e reflexão. Para atingir essa meta, teremos 6 capítulos.
No primeiro capítulo, estudaremos o mundo das Ciências Sociais, ou seja, 
as condições que tornaram possível o surgimento da Sociologia e seu objeto de 
estudo. Também falaremos sobre o “olhar estranhador”, cuja finalidade é a des-
naturalização de práticas sociais institucionalizadas. No capítulo 2, falaremos 
sobre a interação social, partindo da interação em si, das tipificações, passando 
pela institucionalização dos hábitos socialmente partilhados, chegando à cons-
trução do gênero e aos tipos de dominação considerados socialmente legítimos. 
O capítulo 3 focará na construção da identidade social. Falaremos dos pro-
cessos de socialização cujo início ocorre na infância, com a socialização primária. 
Depois, abordaremos aspectos da memória individual e social, que culminam na 
construção da identidade; veremos o brasileiro como um “homem cordial”, com 
dificuldade para separar as esferas pública e privada. Para encerrar esse capítulo, 
abordaremos o controle social e a rotulação dos transgressores como “outsiders”.
No quarto capítulo, analisaremos a manutenção da sociedade. De início, falaremos das concepções 
de Durkheim sobre coesão social e das implicações da divisão do trabalho, em especial, para a orienta-
ção quanto ao tempo e para o próprio capitalismo. Também, veremos por que a ética protestante im-
pulsionou o capitalismo no Ocidente. Examinaremos as principais concepções de Marx no tocante à luta 
de classes e à postura do proletariado. Encerraremos esse capítulo examinando as alterações na vida 
mental do cidadão metropolitano, exposto a excessivos estímulos, dando ênfase à atitude “blasé”.
No capítulo cinco, falaremos sobre política a partir de textos de Tocqueville, Michels e Dahl. O 
principal assunto será a democracia, que servirá de ponto de partida para discutir como combater a 
tirania da maioria, por que os partidos políticos se distanciam de seus ideais originais e o que devem 
garantir as democracias reais. Por fim, no capítulo seis, falaremos dos métodos de pesquisa, isto é, 
sobre a postura do cientista social, sobre a observação participante e as pesquisas de opinião. Espero 
que você se encante com o mundo das Ciências Sociais!
4
O MUNDO DAS 
CIÊNCIAS SOCIAIS
Como surgiram e o que são as Ciências Sociais?
5INTRODUÇÃO ÀS CIÊNCIAS SOCIAIS E POLÍTICAS
 SUMÁRIO
As Ciências Sociais, em especial a Sociologia, ganharam força no final 
do século XIX, a partir de transformações sociais que trouxeram as ques-
tões humanas (e não as divinas) ao centro dos estudos. Anteriormente a 
esse período, a preocupação com o comportamento dos indivíduos em so-
ciedade e a influência da sociedade no comportamento dos indivíduos, es-
tava vinculada a outros saberes, não constituindo uma ciência autônoma.
 Assim, iniciaremos compreendendo quais foram as condições que 
permitiram o surgimento das Ciências Sociais. Na sequência, também ve-
remos qual é o objeto de estudo da Sociologia e qual deve ser a postura do 
sociólogo, visto que seu objeto de estudo inclui a si mesmo, enquanto ser 
social, parte de uma sociedade. Pronto(a) para começar? Vamos lá!?
A TRANSIÇÃO MEDIEVO-MODERNIDADE
Na antiguidade, o ser humano era definido como um animal político 
e só tinha sentido como cidadão, como participante nas decisões políticas 
da cidade. Da mesma forma, na Idade Média, a noção de pessoa dependia 
da noção de grupo. Nesta época, as comunidades eram pequenas, de forma 
que todos se conheciam, conheciam as ancestralidades e sabiam detalhes 
da vida pessoal dos demais membros. Como lembra Alan Dawe (1980), não 
havia separação entre as esferas pública e privada: todos sabiam de tudo.
“Essa inseparabilidade entre a pessoa e o grupo reflete muito bem o padrão de vida 
na aldeia medieval típica. Era uma comunidade fechada e estática, não-penetrada 
por ideias novas, não-afetada por nenhum tipo de movimento, não-sujeita a qualquer 
mobilidade geográfica e social. A vida era tão regular e previsível quanto as estações do 
ano. Era uma comunidade pequena, onde todos se conheciam e onde, portanto, tudo 
o que uma pessoa fazia era do conhecimento de todas as outras. Era uma comunidade 
na qual a vida, desde o nascimento até a morte, era vivida em público, e, portanto, 
não havia nem mesmo a possibilidade de se conceber a distinção entre as dimensões 
pública e privada da vida, que é parte tão grande da moderna concepção do indivíduo. 
Além disso, era também uma comunidade não-diferenciada, na qual todos dependiam 
do grupo para a realização de todas as suas necessidades. Em outras palavras, não havia 
divisão do trabalho. E isso, é claro, é de grande importância, pois da divisão do trabalho 
depende a diferenciação da biografia e da experiência que produz o senso da diferença 
em relação aos outros, e que é a essência da moderna concepção do indivíduo. Sem 
ela, experiência, biografia e vida pessoal continuam indiferenciadas de uma pessoa para 
outra. Sem ela, portanto, não pode haver uma concepção do ‘indivíduo em si mesmo’” 
(Trecho do texto “Teorias da ação social”, de Alan Dawe).
6INTRODUÇÃO ÀS CIÊNCIAS SOCIAIS E POLÍTICAS
 SUMÁRIO
Na Filosofia, o principal problema da Idade Média era conciliar a fé com a razão, enquan-
to no aspecto prático, o divino explicava tudo. A vida era da forma que era “porque Deus quer”, 
gerando conformismo e aceitação por parte da população. Assim, o homem medieval vivia em 
um mundo imutável, aceitando de forma acrítica sua posição e compreendendo-se apenas como 
integrante de um grupo. O Estado e a Igreja somavam forças para a manutenção dessa situação.
A Idade Média costuma ser chamada de Idade das Trevas, justamente pela ausência de 
inovação nas áreas das artes e do conhecimentoem geral. O conformismo com “os planos 
divinos” dificultava a inovação e a exploração de novos horizontes. Assim, por um longo 
período, tudo permaneceu como estava. 
O germe da mudança foi cultivado de uma forma lenta e culminou na alteração do ob-
jeto de estudo, que deixou de ser a divindade e passou a ser o homem. É neste contexto que 
surge nosso atual conceito de indivíduo, tomado em si mesmo e completamente descolado 
da noção de grupo. Tendo relevância em si mesmo, enquanto unidade autônoma, e não ape-
nas como parte de um grupo.
Na Idade Média, a noção de pertencimento ao grupo era muito forte, era o que definia 
o sujeito. Importava mais saber se o sujeito era senhor feudal, vassalo ou do clero, do que 
saber se era João, Antônio ou José. Sequer poderíamos falar em biografia no sentido con-
temporâneo, afinal, o foco da observação estava no grupo e não nas ações individuais.
7INTRODUÇÃO ÀS CIÊNCIAS SOCIAIS E POLÍTICAS
 SUMÁRIO
No plano social, o final da Idade Média é marcado pela mudan-
ça na forma de produção: o trabalho feito por todos começa a ser di-
vidido de forma a especializar determinadas pessoas em determina-
das partes do processo. Dessa forma, o modo de produção capitalista 
difunde-se, assim como a divisão do trabalho e a industrialização. 
Isso contribui para o surgimento de uma nova classe: a burguesia, 
composta pelos donos do capital, que exploravam esse novo modelo. 
Esse cenário contribui para o declínio do poder do clero e dos 
senhores feudais, além de criar as condições para o desenvolvimen-
to das cidades e do predomínio do estilo de vida urbano. Entretanto, 
por óbvio, essa transição não foi pacífica, mas marcada pela disputa, 
principalmente na esfera política. Conservadores, revolucionários e 
reformistas disputavam espaço.
Importante frisar que, com o surgimento do Protestantismo, 
começamos a separar a vontade divina da vontade humana, trans-
formando o homem em protagonista de sua história, livre para fa-
zer as suas escolhas e arcar com as consequências disso. Dessa for-
ma, ainda que não completamente desvinculado do divino, há uma 
emancipação do homem. A título exemplificativo, lembramos que 
a concepção protestante de vocação implica descobrir e trabalhar 
algo já dado por Deus.
8INTRODUÇÃO ÀS CIÊNCIAS SOCIAIS E POLÍTICAS
 SUMÁRIO
É nesse cenário que o ser humano começa a elaborar explicações ra-
cionais sobre fenômenos psíquicos, sobre o próprio ser humano e sobre 
as sociedades. Surge o Iluminismo como uma tentativa de racionalizar o 
que antes era explicado por meio da divindade: leva-se luz às trevas. 
Em meio aos inúmeros novos saberes humanos, surge a Sociolo-
gia, entendida como o estudo das sociedades, uma tentativa de com-
preender esse período de transformação. O neologismo “Sociologia” 
foi empregado pela primeira vez por Auguste Comte, em 1838, em que 
pese o estudo de temas sociológicos ser bem anterior. Em 1377, Ibn 
Khaldun descreve o conceito de coesão social (“asabiyyah”) no livro 
Muqaddimah, e, em 1813, Henry de Saint-Simon propõe uma ciência da 
sociedade (THORPE et al, 2016, p. 18).
Como positivista, Auguste Comte dedicou-se à fundamentação da 
Sociologia como ciência, à qual se aplicam regras como as da física. Em 
seu “Curso de filosofia positiva”, Comte, na condição de pai da Socio-
logia, descreve a evolução científica desta nova área, justificando a sua 
autonomia. Já Émile Durkheim, outro nome fundamental para a solidi-
ficação da Sociologia como disciplina autônoma, propõe uma aborda-
gem mais interpretativa e não tão calcada em leis. Aliás, Durkheim deu 
o primeiro curso de Sociologia, em 1887, na Universidade de Borde-
aux, na França - instituição responsável pelo primeiro departamento 
de Sociologia da Europa, criado em 1895.
9INTRODUÇÃO ÀS CIÊNCIAS SOCIAIS E POLÍTICAS
 SUMÁRIO
Também é importante mencionar a criação 
da disciplina de Antropologia Social, em 1908, em 
Liverpool, na Grã-Bretanha. Já a Sociedade Ale-
mã de Sociologia foi fundada em 1909. No caso do 
Brasil, a Escola Livre de Sociologia e Política de 
São Paulo foi criada somente em 1933.
Nessa breve cronologia, você pode perceber 
que as Ciências Sociais englobam tanto a Socio-
logia quanto a Antropologia e a Ciência Política, 
todas analisadas no nosso curso e mutuamente 
implicadas. Em que pese as ciências sociais estu-
darem o ser humano, é necessário diferenciá-las: 
a Sociologia estuda o ser humano em interação 
social; a Antropologia estuda a evolução humana, 
seja biologicamente, seja culturalmente; a Ciên-
cia Política estuda as relações humanas no campo 
da política e do poder. Assim, nesse primeiro mo-
mento, focaremos na Sociologia.
Émile Durkheim
10INTRODUÇÃO ÀS CIÊNCIAS SOCIAIS E POLÍTICAS
 SUMÁRIO
O PROBLEMA DA SOCIOLOGIA
Na obra “O problema da Sociologia”, o sociólogo alemão Georg Simmel defende que o 
conceito fundamental da Sociologia seria a interação social. Essa interação social nada mais 
é que a ação recíproca entre indivíduos. Quando interagimos em sociedade, acabamos in-
fluenciando outras pessoas, deixando algo nosso e retendo algo alheio.
Como exemplo dessa ação recíproca, imagine-se saindo de casa no limite do horário 
de um determinado compromisso, mas ao tentar sair com o carro da garagem, você desco-
bre que há outro veículo obstruindo a sua saída. Considerando que não há saída alternativa, 
você procura o dono do veículo nos comércios próximos, sem sucesso. Depois de 10 minutos, 
o motorista aparece e, sem trocar nenhuma palavra com você, retira o carro que obstruía a 
sua saída. Nesse exemplo banal, fica claro que a interação social não depende unicamente 
da comunicação verbal, pois é possível que os indivíduos se afetem (como ocorreu no nosso 
exemplo) sem conversar. Isso é a ação recíproca entre indivíduos, exposta por Simmel.
11INTRODUÇÃO ÀS CIÊNCIAS SOCIAIS E POLÍTICAS
 SUMÁRIO
A Sociologia não é, na concepção de Simmel, o estudo do ser humano isolado “em sua 
bolha”, mas do ser humano em interação. São essas interações que dão vida ao processo so-
cial, ou seja, evidenciam que a sociedade não é algo estático, mas está em constante transfor-
mação. Assim, há uma configuração social momentânea, chamada de “forma social”, apesar 
desse processo contínuo. Para dar essa noção de mudança constante, de que não um todo fixo 
e acabado, Simmel prefere o termo “sociação” a sociedade, dando a ideia de movimento, de 
“ação social” (não no sentido beneficente, mas como ações praticadas na esfera social).
As imagens sugerem diferentes tipos de interação: cooperativa (todos 
juntos limpando) ou competitiva (qual das crianças tem mais força).
12INTRODUÇÃO ÀS CIÊNCIAS SOCIAIS E POLÍTICAS
 SUMÁRIO
Interessante perceber que a interação social pode assumir diversas modalidades: 
conflituosa, cooperativa, competitiva, submissa, etc. Pense em uma família: podemos ter 
conflitos entre os integrantes, podemos ter todos cooperando para atingir um objetivo 
comum, podemos ter filhos competindo por desempenho acadêmico ou atenção dos pais, 
podemos ter uma pessoa do casal que é submissa a outra, etc. Uma mesma pessoa pode ter 
diferentes modalidades de interação social conforme o ambiente ou o interlocutor.
Ainda, as interações podem ser formais ou informais, afinal, você não interage da 
mesma forma com um amigo em uma festa e com um recrutador em uma entrevista de 
emprego. Variamos o grau de formalidade de acordo com o ambiente e a necessidade (in-
clusive social). A inadequação no grau de formalidade pode influenciar a própria intera-
ção. Como exemplo, pense naquelas pessoas que possuem o hábito de chamar qualquer 
menina de “flor” ou “meu anjo”. Ora, chamar uma desconhecida assim pode soar mal, 
inclusive pode ser entendido como assédio (no sentido popular do termo).
Curiosidade: há interações sociais juridicamente institucionalizadas como 
formais. O exemplo mais claro é o casamento. No Brasil, o casamentocivil é um ato extremamente ritualizado e deve ser realizado em local 
com portas abertas, para garantir o livre acesso de qualquer pessoa. Além 
disso, a perfectibilização do ato exige que ambos os noivos respondam 
“SIM” à pergunta sobre o casamento ser de livre e espontânea vontade. Se 
a resposta for qualquer outra (exemplo, “é, né, já que ‘tamo’ aqui…”) o ato 
deve ser suspenso e sequer pode ser realizado no mesmo dia.
13INTRODUÇÃO ÀS CIÊNCIAS SOCIAIS E POLÍTICAS
 SUMÁRIO
Também devemos perceber que as interações sociais possuem diversos graus de intimidade, 
indo de anônima a íntima. As interações em redes sociais, em que pese o distanciamento físico das 
partes, costumam ser íntimas, tornando pública inclusive a vida privada. Entretanto, as intera-
ções via internet, inclusive as redes sociais, permitem ao interessado o anonimato. A criação de 
pseudônimos, comum no mundo virtual, pode servir como meio de uma interação anônima, mos-
trando outra faceta do indivíduo.
Podemos afirmar que todo o ser humano se define pelas interações sociais. Conseguimos com-
preender quem é o ser humano, em determinada época e local, por essas interações. Dessa forma, 
para Simmel, o problema de estudo da Sociologia é a própria interação social, esse emaranhado de 
ações e reações humanas, reciprocamente se influenciando.
Importante mencionar que não há grandes diferenças entre as Ciências Sociais e as Ciências Na-
turais. Não há diferenças metodológicas ou hierarquia de valor científico entre as referidas ciências: 
ambas são igualmente válidas quando seus conhecimentos são elaborados com rigor metodológico. 
A grande diferença entre essas ciências está no fato da realidade social, objeto de estudo das Ciências 
Sociais, ter um significado prévio para o cientista social. Você, como cientista social, nasceu e cresceu 
em uma sociedade, está habituado a determinadas interações sociais e precisa reconhecer isso.
Para um cientista natural, um átomo, por exemplo, não tem um significado prévio; é possível 
isolar o átomo e estudá-lo independentemente dos valores e das idiossincrasias do cientista. Já o 
cientista social, por estudar a sociedade, está incluso em seu próprio objeto de estudo, fato que re-
quer cuidados adicionais durante a pesquisa. 
Os constructos de segundo grau são construídos a partir de informações 
extraídas da sociedade pelo cientista social, que também é um ator social.
14INTRODUÇÃO ÀS CIÊNCIAS SOCIAIS E POLÍTICAS
 SUMÁRIO
Alfred Schutz lembra que o cientista social parte de constructos 
de primeiro grau, os quais poderíamos comparar com o senso comum, 
mas a Sociologia não é o compartilhamento ou a difusão de opiniões do 
senso comum. A ciência social é desenvolvida a partir de constructos de 
segundo grau (“constructo dos constructos feitos pelos atores no cená-
rio social”), ou seja, a partir da observação e da explicação do compor-
tamento dos atores sociais. 
Para Schutz, o cientista social parte de sua compreensão subjetiva 
do mundo intersubjetivo e cria um sistema teórico com hipóteses veri-
ficáveis. Dessa forma, o constructo de segundo grau é objetivo e respeita 
as regras procedimentais das ciências empíricas. Em resumo, a Sociolo-
gia é uma ciência que interpreta a realidade social subjetivamente expe-
rienciada pelo pesquisador e outros atores sociais.
Podemos inferir que a compreensão sociológica se dá em dois ní-
veis: primeiro o senso comum, com sua concepção do mundo social e 
cultural; depois uma tentativa de objetivar o significado subjetivo das 
ações dos indivíduos. Cabe ao cientista social reconhecer que seu objeto 
de estudo já tem um significado prévio para ele e para os outros atores 
sociais. Assim, o resultado de sua pesquisa deve ser objetivo, indo além 
de sua compreensão pessoal do mundo social. Por isso, a importância do 
rigor metodológico e do pesquisador se desfazer de seus preconceitos.
Durkheim, um dos fundadores da Sociologia, propõe 
que os fatos sociais existem fora das consciências indivi-
duais, como algo objetivo, que pode ser isolado e estudado. 
Aliás, o fato social caracterizar-se-ia por ser geral, externo 
e coercitivo. Vamos às explicações: geral, pois não é particu-
lar, não se refere a apenas um indivíduo; externo, pois não é 
íntimo; coercitivo porque obriga os indivíduos. 
Como exemplo de fato social, Durkheim cita o desem-
penho do papel de esposo ou cidadão e o cumprimento dos 
compromissos firmados. Vamos pensar no desempenho do 
papel de filho: esse fato social não exige uma determinada 
postura? Independentemente do que você pensa, não há uma 
força externa a você e a todas as outras pessoas (portanto, 
geral) que impõe coercitivamente uma determinada condu-
ta como certa? Mesmo que alguém tenha sido abandonado 
quando criança, há uma certa “pressão” social para que o 
filho cuide dos pais na velhice. 
Agora, você consegue perceber como o objeto da So-
ciologia, embora vivenciado subjetivamente, pode ser obje-
tivado? Podemos falar um pouco mais da postura do cientis-
ta social e de sua metodologia de “estranhamento”.
15INTRODUÇÃO ÀS CIÊNCIAS SOCIAIS E POLÍTICAS
 SUMÁRIO
O OLHAR ESTRANHADOR
Por estar inserido no seu objeto de estudo, o cientista social precisa ter uma postura 
atenta, reconhecendo seus preconceitos e tentando manter-se imparcial. Além disso, a 
reflexão crítica deve “desnaturalizar” as experiências do senso comum, exercitando o 
“olhar estranhador”. Essa postura consiste em estranhar aquilo que vivenciamos como 
“natural”, na tentativa de colocar-se como um observador externo.
Podemos estranhar qualquer prática social, desde as ações mais cotidianas e apa-
rentemente simples. Como exemplo, podemos pensar no ato de beber café: o olhar 
estranhador pode nos levar a questionar o porquê da cafeína ser tolerada enquanto o 
canabidiol, encontrado na maconha, é criminalizado. Você já pensou em quais são as 
razões sociais para a proibição ou a permissão de uso de uma determinada substância? 
Outro exemplo é o vestuário. Para nós, brasileiros, o uso de saia por homens é algo exó-
tico, além de ser motivo para piadas. Entretanto, para outras culturas, a peça pode ser vista 
com naturalidade, como é o kilt usado pelos irlandeses. A própria monogamia imposta pela 
legislação brasileira pode ser estranha para quem vive em países islâmicos, adeptos da poli-
gamia (união conjugal de um homem com uma pluralidade de mulheres) ou em tribos africa-
nas adeptas da poliandria (união conjugal de uma mulher com uma pluralidade de homens).
Pelos exemplos, resta evidente que o olhar estranhador é facilmente utilizado quando 
nos deparamos com práticas sociais diferentes das que estamos inseridos.
16INTRODUÇÃO ÀS CIÊNCIAS SOCIAIS E POLÍTICAS
 SUMÁRIO
Contudo, essa prática torna-se mais complexa quando estamos diante de nossa 
própria sociedade, de um caldo cultural que já nascemos imersos. Como exemplo do 
choque cultural entre índios e europeus, vamos apresentar dois textos, parte das obras 
“O Papalagui”, de Erich Scheurmann, e “Dos Canibais”, de Michel de Montaigne.
No trecho da obra “O Papalagui”, um índio samoano descreve, à sua maneira, 
uma cidade europeia. Compara as habitações com um marisco de casca dura, descre-
ve as construções de edifícios como pedras articuladas na forma de baús e entende as 
portas como folhas de madeira. O estilo de vida também é estranhado, seja pela quan-
tidade de pessoas (muitas famílias, “aigas”), seja pela antipatia entre vizinhos. Neste 
trecho, resta claro como estranhamos culturas diferentes da nossa e como utilizamos 
elementos da nossa cultura para descrever e interpretar as outras culturas.
“O Papalagui mora, como o marisco, numa casca dura; e vive no meio de pedras, 
tal qual a escalopendra entre fendas de lava, com pedras em volta, dos lados 
e por cima. A cabana em que mora parece-se com um baú de pedra em pé, 
com muitos compartimentos e furos. A gente desliza para dentroe para fora da 
casca de pedra apenas por um lugar que o Papalagui chama entrada quando 
vai para dentro, e saída quando vem para fora, embora ambas as coisas sejam 
absolutamente uma só e a mesma. Neste lugar, existe uma grande folha de 
madeira que se tem de empurrar com força para entrar na cabana. Mas isto é 
só para começar: tem-se de empurrar ainda outras folhas para estar, de fato, 
na cabana. Quase todas as cabanas são habitadas por mais pessoas do que as 
que moram numa só aldeia samoana; por isto, tem-se de saber exatamente o 
nome da aiga que se quer visitar. Cada aiga tem para si uma parte especial do 
baú de pedra, ou em cima, ou embaixo, ou no meio, à esquerda, à direita, ou 
mesmo na frente. E cada aiga não sabe nada da outra, nada mesmo, como se 
entre elas não houvesse um muro de pedra, mas, sim, Manono, Apolima, Saváii 
e numerosos mares. É muito comum nem saberem o nome umas das outras; 
e se se encontram no buraco por onde entram e saem, cumprimentam-se 
de má vontade, ou resmungam qualquer coisa, tal qual insetos hostis, dando 
a impressão de estarem zangadas por terem de viver perto uma das outras” 
(Trecho de “O Papalagui”, de Erich Scheurmann).
17INTRODUÇÃO ÀS CIÊNCIAS SOCIAIS E POLÍTICAS
 SUMÁRIO
“creio que não há nada de bárbaro ou de selvagem nessa 
nação, a julgar pelo que me foi referido; sucede, porém, 
que classificamos de barbárie o que é alheio aos nossos 
costumes; dir-se-ia que não temos da verdade e da razão 
outro ponto de referência que o exemplo e a ideia 
das opiniões e usos do país a que pertencemos. Neste, 
a religião é sempre perfeita, perfeito o governo, perfeito 
e irrepreensível o uso de todas as coisas. Aqueles povos 
são selvagens na medida em que chamamos selvagens 
aos frutos que a natureza germina e espontaneamente 
produz; na verdade, melhor deveríamos chamar selvagens 
aos que alteramos por nosso artifício e desviamos da 
ordem comum. Nos primeiros, as verdades são vivas e 
vigorosas, e as virtudes e propriedades mais úteis e naturais 
do que nos últimos, virtudes e propriedades que nós 
abastardamos e acomodamos ao prazer do nosso gosto 
corrompido. E, todavia, em diversos frutos daquelas regiões, 
que se desenvolvem sem cultivo, o sabor e a delicadeza 
são excelentes ao gosto, comparando-os com os nossos” 
(Trecho da obra “Dos canibais”, de Motaigne)
18INTRODUÇÃO ÀS CIÊNCIAS SOCIAIS E POLÍTICAS
 SUMÁRIO
SÍNTESE
Neste capítulo, vimos que a Sociologia sur-
giu na transição da Idade Média para a Modernida-
de, sendo que o neologismo “Sociologia” e as pri-
meiras cátedras da disciplina são do século XIX. O 
principal objeto de estudo sociológico é a interação 
social, denominada por Georg Simmel como “so-
ciação” (ação realizada em âmbito social que in-
terfere no outro). Essas interações sociais podem 
ser de diferentes formas, como competitivas, coo-
perativas, submissas, etc. 
O cientista social é também um ator social, por 
isso ele precisa ir além dos constructos de primei-
ro grau (senso comum) e elaborar seus constructos 
de segundo grau, revestidos de cientificidade. Para 
Durkheim, o cientista social investiga fatos sociais, 
caracterizados por coercibilidade, exterioridade e 
generalidade. Ainda, como recurso metodológico, é 
fundamental que o pesquisador social exercite seu 
“olhar estranhador”, colocando, em perspectiva, 
práticas sociais tidas por naturais.
No trecho “Dos canibais”, Montaigne deixa claro que tende-
mos a classificar como bárbaros os povos e os costumes que são di-
ferentes dos nossos. Nossos hábitos são vistos como bons e adequa-
dos, enquanto outros povos são tidos por selvagens – pelo menos a 
uma primeira análise, pois uma análise mais acurada pode ver lógi-
ca e virtude em tais hábitos. 
Pensemos no exemplo das relações conjugais: poligamia e po-
liandria podem nos ser repulsivas simplesmente porque nossa so-
ciedade não adota essa lógica. Da mesma forma, estranhamos ho-
mens de salto alto ou vestido. Montaigne chama a atenção para o 
fato de que o outro, enquanto desconhecido, é classificado como 
bárbaro ou selvagem simplesmente por destoar de nosso padrão 
conhecido. Os estudos sociológicos têm por finalidade salientar o 
aspecto “construído” de todos esses hábitos, indistintamente. 
Agora lhe convido a exercitar o olhar estranhador, a espantar-
-se com suas próprias práticas sociais, a estranhar aquilo que você 
aprendeu como natural. Vamos começar a fazer Ciência Social?
Seu “mundo social” não é natural: 
estranhe-o!
19INTRODUÇÃO ÀS CIÊNCIAS SOCIAIS E POLÍTICAS
EXERCÍCIOS SUMÁRIO
1. Explique o que significa afirmar que, na Idade Média, havia insepa-
rabilidade entre os conceitos de pessoa e grupo.
2. O que Georg Simmel entende por “sociação”?
3. Explique o que são constructos de segundo grau:
4. Para Durkheim, o que significa dizer que um fato social é coercitivo?
5. Descreva uma prática social utilizando o “olhar estranhador”.
Gabarito:
1. Na Idade Média não existia a noção de indivíduo, a pessoa somente tinha sentido 
enquanto pertencente a um determinado grupo.
2. Sociação significa uma ação social, ou seja, a ação praticada na esfera social e capaz de 
gerar influência sobre outras pessoas.
3. Constructos de segundo grau são análises sociológicas que partem de algo do senso 
comum (chamados de constructos de primeiro grau).
4. Para Durkheim, um fato social é coercitivo porque gera uma sensação de obrigação sobre 
os atores sociais.
5. O “olhar estranhador” é um recurso para estranharmos práticas aceitas pela sociedade 
como “naturais”. Um exemplo é o chimarrão: “faziam um recipiente, similar a um copo, 
com um vegetal seco. Depois enchiam parcialmente o recipiente com uma erva seca e 
moída. Deixavam essa erva todo de um lado para no outro colocar água quente. Depois 
introduziam uma espécie de canudo de metal para tomar a bebida. Quando um terminava 
o líquido existente nesse curioso recipiente, enchiam novamente e ofereciam a outra 
pessoa que estava ali. Era um ritual frequente, sem vinculação a um momento especial, no 
qual todos compartilhavam esse único copo, utilizado apenas para esse ritual específico”.
20
A INTERAÇÃO SOCIAL
Noções básicas que permeiam as interações.
21INTRODUÇÃO ÀS CIÊNCIAS SOCIAIS E POLÍTICAS
 SUMÁRIO
Agora que já vimos que a Sociologia estuda a interação social, precisamos entender como 
essas interações constroem e alteram os atores e o mundo social. Para isso, teremos duas unida-
des: essa, centralizando o estudo no mundo social, no “todo”; a próxima, abordando a constru-
ção da identidade dos atores sociais, analisando “as partes” dessa interação social.
Esta unidade será dividida em 4 partes. Iniciaremos analisando as diferentes tipificações 
sociais e como elas afetam nossa interação. Depois, veremos a institucionalização, ou seja, o pro-
cesso de repetição social de uma prática à cristalização de uma prática social, tida como “natu-
ral” às gerações seguintes. A terceira parte da unidade debaterá a construção dos papéis sociais, 
focando em questões de gênero. Por fim, examinaremos três tipos de dominação legítima. Sem 
mais delongas, vamos interagir?
AS TIPIFICAÇÕES
Quando falamos do problema da Sociologia, vimos que as interações sociais podem ser for-
mais, informais, íntimas, anônimas, conflituosa, cooperativa, entre tantos outros tipos; essas 
classificações referem-se ao resultado da interação interpessoal. Agora, analisaremos como a 
percepção de cada indivíduo sobre o outro pode influenciar no resultado da interação social.
A interação social tem um caráter subjetivo, ou seja, cada sujeito interpreta a interação e 
os atores sociais de seu jeito. Provavelmente, você já tenha vivido uma situação juntamente com 
alguém que interpretou a situação de uma forma completamente diferente de você. Assim, por 
exemplo, alguém sério e que fala pouco pode ser considerado reservado por uns e antipático por 
outros:eis o caráter subjetivo da interação social. 
Na interação social, apreendemos o outro por meio de tipificações, por rotulações 
padronizadas. Aqui não estamos falando de preconceitos - em que pese estes ficarem evi-
dentes nas tipificações - estamos falando de um mecanismo inerente à interação social 
e cuja modificação pode ocorrer na própria interação, em fração de segundos. É comum 
formarmos uma imagem de alguém que não conhecemos pessoalmente e revisarmos essa 
ideação assim que a interação social começar. Você nunca viu alguém e pensou, “deve ser 
um arrogante”, mas quando conheceu percebeu que era muito simpático? A tipificação é 
isso, essas etiquetas que “colamos” e “descolamos” mentalmente nas pessoas.
22INTRODUÇÃO ÀS CIÊNCIAS SOCIAIS E POLÍTICAS
 SUMÁRIO
Vamos a um exemplo de tipificação: 
Mulher
Jovem
Loira
Bonita
Empoderada
Mulher
Jovem
Vítima de violência
Frágil
23INTRODUÇÃO ÀS CIÊNCIAS SOCIAIS E POLÍTICAS
 SUMÁRIO
Perceba que a tipificação consiste em rótulos que colocamos nas pessoas a partir 
de nossa percepção, mas tais rótulos podem sofrer alteração a partir da interação en-
tre os interlocutores. A interação social é um processo de via dupla: rotulamos e revi-
samos a rotulação de nosso(s) interlocutor(es) continuamente, da mesma forma que 
ele(s) faz(em) isso em relação à gente. Esse processo é constante.
Em resumo, as tipificações são formas de entender o outro por padronizações, mas elas são 
constantemente negociadas, ou seja, essa tipificação é uma perpétua construção. Dessa forma, 
interações sociais do tipo face a face permitem maior volatilidade nessa “negociação”. Dito de 
outra forma, na interação face a face, a subjetividade do outro nos é mais acessível, permite-nos 
verificar reações a nossas ações e, com isso, vamos rapidamente mudando nossa percepção do 
outro, rapidamente mudando nossas tipificações. Há uma modificação recíproca na interação.
As interações distanciadas, mais anônimas, são marcadas pelos estereótipos, como exem-
plo, podemos pensar que todo o carioca é malandro. Já as interações face a face são mais flexí-
veis, pois, como já dissemos, a subjetividade de nosso interlocutor nos é mais acessível, permi-
tindo uma compreensão individualizada e pormenorizada, sem a necessidade de estereótipos.
Por fim, importante mencionar que a maioria dos nossos contemporâneos - pessoas 
com as quais dividimos os mesmos espaços e tempo - tem a interação social marcada pelo 
anonimato. Em uma época caracterizada pela velocidade, muitas interações sociais são su-
perficiais e anônimas. Como exemplo, podemos pensar nas compras: a popularização das 
compras pela internet permite que todo o processo (da escolha do produto até a entrega) seja 
realizado sem a necessidade de interação face a face entre comprador e vendedor. Apesar de 
habitarmos o mesmo espaço, na mesma época, somos apenas “o outro” em uma interação 
social, via de regra, anônima.
Compartilhando um experimento: como professora no ensino 
superior presencial propus uma dinâmica de rotulação no 
primeiro dia de aula de Sociologia, em um curso novo na 
instituição. Separei a turma em 2 grupos, aqueles que nunca 
haviam me visto (maioria da turma) e aqueles que já haviam 
ouvido falar de mim ou me conheciam. Para estimular a reflexão 
sobre as tipificações, fui para a aula de camiseta, calça jeans 
e tênis - em que pese normalmente não me vestir assim, pois 
também trabalho como advogada. Os estudantes podiam me 
rotular em todos os aspectos e, se possível, justificar a aplicação 
dos rótulos. Enchi o longo quadro com essas rotulações, e o 
exercício foi surpreendente. Em que pese estar no curso de 
Direito, ninguém me rotulou com essa formação. Será que somos 
levados pelas aparências?
Como são as suas interações virtuais? Íntimas ou anônimas?
24INTRODUÇÃO ÀS CIÊNCIAS SOCIAIS E POLÍTICAS
 SUMÁRIO
A INSTITUCIONALIZAÇÃO
Outro aspecto interessante, na interação social, é a institucionalização. Aliás, você já 
se perguntou como surgem instituições como as escolas ou os tribunais? Você já percebeu 
que as instituições são criações humanas decorrentes do mundo social, cuja manutenção 
pressupõe o ser humano, visto não serem autônomas? Esse é o tema do nosso estudo agora.
Quando falamos em condutas humanas, sejam ações, sejam abstenções, estamos fa-
lando também em decisões. Pense em você: como foi o processo de decisão acerca da gra-
duação que você faria? E do cardápio da janta de ontem? E sobre escovar ou não os dentes 
depois da última refeição feita? 
Você já deve ter percebido que o processo decisório não é sempre igual, e há ações que se-
quer sentimos a carga decisória. No caso das ações frequentemente repetidas, há a formação de 
um padrão, de um hábito, cuja consequência é libertar o indivíduo da carga decisória e economizar 
esforço. Sabe quando você “liga o piloto automático”? Isso também pode ocorrer no plano social.
Ações socialmente repetidas podem formar um hábito, tornando-se “naturais”, em 
que pese serem criações humanas. Esse hábito social pode evoluir para a institucionalização 
da prática. Essa institucionalização caracteriza-se pela reciprocidade, ou seja, por ser parti-
lhada pelos atores sociais; pela tipificação, pois pressupõe que os indivíduos na posição “a” 
terão uma resposta social “x”; pela historicidade, visto sua solidificação depender de um 
processo histórico de compartilhamento; pelo controle social, pois a mera existência de uma 
instituição já implica controle.
Vamos tomar como exemplo a instituição da prisão como pena: você consegue perceber 
que ela não é natural? A pena de prisão somente surgiu na passagem do século XVIII para o 
XIX, pois, anteriormente, a prisão tinha mera finalidade de custódia do acusado ou conde-
nado (FOUCAULT, 2012), entretanto, hoje, podemos considerar “natural” a prisão-castigo, 
visto a sua institucionalização.
A repetição de uma prática social consente a sua solidificação, permitindo aos indi-
víduos experimentar essa prática social como se ela possuísse existência própria, exterior 
aos indivíduos. Assim, as novas gerações são socializadas de forma a aceitar o mundo social 
como “natural” e não como “construído”. Eis o paradoxo da institucionalização: uma cria-
ção humana não é percebida como tal, pois é tida como “natural”.
25INTRODUÇÃO ÀS CIÊNCIAS SOCIAIS E POLÍTICAS
 SUMÁRIO
O exercício do olhar estranhador pode realçar o aspecto “construído” das instituições 
sociais, pois, via de regra, as entendemos como naturais e não refletimos sobre elas. Esta-
mos imersos em um mundo social que é assim e age coercitivamente sobre os atores sociais. 
Vamos a outro exemplo, a frequência de crianças à escola. Hoje, no Brasil, se um pai ou uma 
mãe decidir ensinar o filho em casa, sem a frequência à escola, será acionado judicialmente, 
pois isso não é permitido, ou seja, as instituições obrigam os atores sociais a uma postura 
“x” (toda a criança deve frequentar a escola).
Em resumo, a institucionalização é decorrência da repetição de condutas, as quais pas-
sam a ser consideradas “naturais”, por serem hábitos sociais. Dessa forma, o passar do tempo 
contribuiu para a prática institucionalizada ser partilhada entre os atores sociais e cristali-
zar-se. A partir disso, a instituição exerce certo controle social, como se fosse sobre-huma-
na, como se existisse objetivamente, independentemente dos seres humanos.
Agora, pense na quantidade de práticas institucionalizadas aceitas como naturais en-
quanto são meras construções sociais. Para citar outro exemplo, o sistema jurídico brasi-
leiro, até 2011, somente aceitava como casamento a união entre um homem e uma mulher; 
a partir de 2013 permitiu-se, por orientação federal, o casamento entre pessoas do mesmo 
sexo, mudando o conceito de casamento para uma união entre 2 pessoas. Recentemente, o 
Brasil já teve registros de uniões estáveis plúrimas, por exemplo, um homem e duas mulhe-
resformando uma única família; embora ainda não reconhecido como casamento, esse tipo 
de união pode indicar uma mudança social na instituição “casamento”. 
26INTRODUÇÃO ÀS CIÊNCIAS SOCIAIS E POLÍTICAS
 SUMÁRIO
A CONSTRUÇÃO DOS PAPÉIS SOCIAIS
Quando falamos em sociedade, falamos em uma realidade objeti-
va experienciada subjetivamente pelo indivíduo. Dito de outra forma: 
mesmo que você não existisse, há algo chamado “sociedade”, há ins-
tituições, entretanto, você só conhece a sociedade pelas suas próprias 
vivências, isto é, subjetivamente.
Vimos que as tipificações institucionais se caracterizam pela his-
toricidade, ou seja, as instituições possuem uma história, cujo início 
– via de regra – antecede a existência de um indivíduo em particular, 
e essa história seguirá após a morte desse indivíduo. Dessa forma, por 
exemplo, a instituição “escola” tem uma história que antecede a sua 
existência, prezado estudante, e, bem provavelmente, a escola conti-
nuará a existir após você morrer.
Chamamos a atenção para o fato de uma instituição – seja ela qual 
for – possuir uma história que ultrapassa a biografia de uma pessoa, afi-
nal, a solidificação de um hábito social e sua transformação em algo ins-
titucionalizado requer um longo tempo, perpassando gerações. Assim, 
a vida de um indivíduo é um mero episódio dentro da história social das 
instituições, mesmo que aquele indivíduo específico não compreenda o 
alcance ou a finalidade das instituições sociais. Inegavelmente somos 
atores sociais, mesmo que não reflitamos sobre a dinâmica da sociedade.
Na condição de atores sociais, também somos produto da sociedade, ou seja, há uma relação dialética 
entre o indivíduo e o mundo social, de forma a ambos serem reciprocamente influenciados. Aliás, você já pen-
sou qual é a influência da sociedade na escolha da sua formação acadêmica? Engana-se quem pensa inexistir 
esse tipo de influência. Apenas para citar um exemplo, muitas pessoas escolhem sua formação pela procura 
ou carência de profissionais daquela área. Além disso, não posso escolher uma formação que não seja ofere-
cida no mercado, como graduação em técnicas de tortura. O mundo social cria e extingue profissões, de forma 
a afetar as possibilidades individuais de escolha profissional.
De uma forma geral, a construção do papel social de cada indivíduo insere-se na relação dialética já 
mencionada, com indivíduo e sociedade reciprocamente se influenciando. Pense no papel “filho”: atualmen-
te, exigimos de quem desempenhar esse papel social respeito para com seus pais e auxílio a estes na velhice. 
De outro lado, esperamos dos pais que sejam provedores dos filhos menores de 18 anos, fornecendo alimento, 
educação e carinho. Perceba o fato dessas questões sociais serem, inclusive, amparadas pelo sistema jurídico, 
ao ponto de dívida de alimentos ser causa de prisão por dívida.
No âmbito do gênero, também há construções sociais, “o que é uma mulher?” ou “como deve se portar 
um homem?”, são questões cujas respostas ratificam a relação dialética entre indivíduo e sociedade. Simone 
de Beauvoir traz a ideia do “torna-se mulher” (BEAUVOIR, 1970, p. 172), evidenciando como a “criação” pode 
moldar o indivíduo a determinados parâmetros.
Independentemente do que você pensa, é inegável a diferenciação na criação de meninas e meninos. 
Apesar de bebês, independentemente do sexo, terem necessidades semelhantes, culturalmente, as meninas 
usam vestuário na cor rosa e são “adornadas” com brincos, laços e tiaras. De outro lado, os meninos usam 
azul e têm adornos bem mais restritos, sem a colocação de brincos.
27INTRODUÇÃO ÀS CIÊNCIAS SOCIAIS E POLÍTICAS
 SUMÁRIO
Aliás, você já pensou por que há uma tolerância e até um estímulo social à 
perfuração das orelhas das meninas, enquanto isso não é exigido aos meninos? 
Ora, a colocação de brincos não é uma forma de intervenção no corpo de outra pes-
soa? Não seria uma forma de lesão corporal (afinal não foi consentido pela crian-
ça)? E por que não há punição para esse tipo de ação? O exemplo é singelo, mas 
demonstra como a sociedade molda “o homem” e “a mulher” desde a infância.
Apesar de muitos combaterem ideias do tipo: “homem não chora”, “me-
nina não joga futebol”, “menino não brinca de boneca”, etc., é inegável seu en-
raizamento social. A construção social das atribuições esperadas do homem e 
da mulher, respectivamente, são decorrência de um longo processo e, por esta 
razão, são de lenta alteração. Como já vimos, hábitos sociais são transmitidos de 
geração em geração e sua cristalização requer que a nova geração perceba aquele 
hábito como “natural”.
Em síntese, em que pese a árdua luta pela igualdade entre homens e mu-
lheres, a simples criação de legislação impondo direitos iguais não implica na 
adoção social dessa postura. A alteração da construção social do estereótipo de 
homem ou de mulher depende de mais tempo, para que haja cristalização social. 
Contudo, a sociedade continuará construindo papéis sociais, por isso, a impor-
tância de entender que a mulher – assim como o homem – é uma construção 
social: a forma como você se porta não depende só de você, mas também do gru-
po no qual você é socialmente construído. 
28INTRODUÇÃO ÀS CIÊNCIAS SOCIAIS E POLÍTICAS
 SUMÁRIO
A DOMINAÇÃO LEGÍTIMA
Seguindo as nossas reflexões sobre a atuação do grupo sobre o indivíduo, agora ana-
lisaremos as formas de dominação legítima, conforme expostas por Max Weber. Aqui se 
faz necessária uma pequena explicação prévia: Weber desenvolve um recurso metodológico 
chamado de “tipo ideal”.
O tipo ideal é uma construção intelectual do pesquisador, que consiste em selecionar 
os elementos mais importantes para a caracterização de algo, exagerando-os. Dito de outra 
forma, o pesquisador – a partir de vivências e pesquisas reais – seleciona características 
para definir um modelo ideal, chamado de “tipo ideal”.
Objetos de estudo - realidade estudada
Aplicação do 
tipo ideal a 
um objeto 
específico: “isso 
é uma cadeira?”
TIPO IDEAL
Utopia criada a partir da realidade estudada
Para exemplificar, pense que seu objeto de estudo seja a democracia: você passa um 
tempo analisando a democracia brasileira, depois a norte-americana, na sequência, a fran-
cesa e sucessivamente. A partir desses vários objetos de estudo reais, você elabora um ideal 
de democracia, que não existe na realidade, mas que você criou a partir da seleção e exagero 
de elementos das democracias reais que você estudou. Isso é um tipo ideal.
Este método weberiano sintetiza o próprio conhecimento, cuja função não é copiar 
perfeitamente a realidade, mas reduzir, selecionar e exagerar certos aspectos, para que pos-
samos apreender! Assim, o tipo ideal mostra-se como uma utopia, visto ser irrealizável em 
sua totalidade. Simultaneamente, essa construção intelectual serve para confrontar a reali-
dade analisada, verificando em que medida ela se aproxima ou distancia-se do ideal.
29INTRODUÇÃO ÀS CIÊNCIAS SOCIAIS E POLÍTICAS
 SUMÁRIO
Perceba que o tipo ideal tem uma base na realidade estudada, mas não é um mero resumo 
dela. Ao contrário, mostra-se como uma construção do pesquisador e, por isso, uma utopia que 
seleciona e exagera determinados aspectos. Esse recurso teórico pode servir para confrontar 
casos específicos, como foi o nosso exemplo da cadeira. Assim, contribui para a compreensão 
de fenômenos complexos.
A partir desse recurso teórico chamado “tipo ideal”, Weber analisa os tipos puros de domi-
nação legítima, ou seja, dominações aceitas pela sociedade, não vistas como arbitrárias. Aqui a 
expressão “dominação” refere-se a uma probabilidade de obediência a determinadas ordens, a 
uma crença acerca da submissão legítima. Nesse sentido, foram analisadas três modalidades de 
dominação legítima: a legal, a tradicional e a carismática. Vamos analisar cada uma delas???
a. Dominação legal: baseia-se na ideia de que o superior ordena e os profissionaisobedecem. 
Tudo está fundado em uma legislação ou estatuto, por isso, é impessoal: não importa quem 
ordena, importa se ocupa o cargo com essa atribuição. Tem como seu tipo mais puro a domi-
nação burocrática. Aliás, você já parou para refletir como a burocracia afeta a sua vida?
 Quando um bebê nasce, há a emissão de uma declaração de nascido vivo, para que se faça 
a certidão de nascimento. Depois vem o RG, o CPF, a carteira de motorista – mas esta somente 
depois dos 18 anos – a carteira de trabalho, os contratos, etc. Se quiser tornar-se administrador, 
deve graduar-se em Administração e solicitar a inscrição no CRA (Conselho Regional de Adminis-
tração) do seu domicílio; se quiser abrir uma empresa, deve se sujeitar a toda a legislação vigente, 
com contrato social ou estatuto, alvará, Plano de Prevenção Contra Incêndios (PPCI) e todas as 
demais peculiaridades. Percebeu como a burocracia nos domina? 
30INTRODUÇÃO ÀS CIÊNCIAS SOCIAIS E POLÍTICAS
 SUMÁRIO
 Na área jurídica isso fica mais intenso ainda: apenas o Estado pode acusar, julgar e 
punir alguém. Mesmo que uma determinada comunidade identifique um culpado de crimes 
graves, não há a opção de “fazer justiça com as próprias mãos” e, se você tentar, comete 
crime. Se alguém lhe deve dinheiro e você pegar um bem dessa pessoa, comete ilícito, pois 
apenas o Estado pode fazer isso legitimamente. Por quê? Burocracia. E nós aceitamos essa 
dominação, que está na estrutura do Estado e das empresas privadas.
b. Dominação tradicional: é baseada na crença da santidade de ordenações e poderes se-
nhoriais. Quem ordena é o senhor e o súdito obedece. A relação é pessoal, pois o senhor 
possui uma dignidade vinculada à sua santidade, enquanto o súdito lhe deve fidelidade. 
O tipo mais puro de dominação tradicional é a patriarcal, na qual, as regras são baseadas 
na tradição. Também serve como exemplo o Estado feudal.
c. Dominação carismática: funda-se no carisma do líder, cujos dotes parecem sobrenatu-
rais. Os apóstolos ou seguidores, em uma terminologia mais atualizada, seguem o líder 
por suas características pessoais, independentemente de aspectos legais. Em seu tipo 
mais puro, a dominação carismática mostra-se autoritária e dominadora, pois o reco-
nhecimento do líder é visto como uma obrigação. Como exemplos, podemos pensar em 
“profetas” e políticos populistas.
31INTRODUÇÃO ÀS CIÊNCIAS SOCIAIS E POLÍTICAS
 SUMÁRIO
A partir das suas vivências, você consegue 
indicar alguma relação de dominação 
legítima? 
Esses três tipos de dominação são socialmente aceitos, por isso 
não os vincule a um agressor, afinal, a dominação legítima encontra – 
via de regra – obediência espontânea e sem violência. Quem obedece, 
obedece pela legislação, pela tradição ou pelo carisma, não pelo medo. 
Por isso, a legitimidade desses tipos de dominação. 
Claro que autores como Maquiavel farão uma leitura diferen-
te de Weber, defendendo a legitimidade da dominação realizada pelo 
príncipe (governante) em relação aos governados. Maquiavel entende 
que o príncipe pode fazer qualquer coisa para tomar e manter o poder, 
inclusive mentir e cometer violências, afinal, sua ética não é a mesma 
do povo em geral.
A visão maquiavélica legitima a dominação por parte dos gover-
nantes e a submissão da população em geral. Dessa forma, a visão polí-
tica de dominação legítima seria muito mais abrangente do que o mo-
delo weberiano, mas a política será o objeto do nosso capítulo 5. Dito 
isto, encerramos esse primeiro momento de análise da interação social.
SÍNTESE
Neste capítulo, vimos que a interação social sofre interferências de tipificações, sendo que as interações 
anônimas são fortemente marcadas por essas tipificações, enquanto há rápida revisão na interação face a face. 
Além disso, o mundo social é marcado pela criação de instituições, entendidas como hábitos partilhados de 
forma intergeracional. Assim, em que pese serem criações humanas, as instituições são sentidas como natu-
rais e com existência própria.
No que tange à construção dos papéis sociais, vimos que homens e mulheres nascem e crescem em um 
caldo cultural, cuja consequência é a construção do “homem” e da “mulher”; por isso, fala-se em “tornar-se”. 
Por fim, vimos que a interação social pode conter relações de dominação legítima, cujos tipos ideais, Weber de-
fine como dominação legal, tradicional e carismática.
32INTRODUÇÃO ÀS CIÊNCIAS SOCIAIS E POLÍTICAS
EXERCÍCIOS SUMÁRIO
1. Explique o que são tipificações e qual é a sua relevância nas intera-
ções sociais:
2. Como hábitos podem tornar-se instituições sociais?
3. O que significa dizer que uma mulher não nasce, torna-se?
4. O que é um tipo ideal?
5. Cite, explique e exemplifique um tipo de dominação legítima.
Gabarito:
1. As tipificações são rotulações que realizamos nas pessoas na interação social. Elas 
são uma forma de apreender o outro, sendo confirmadas ou modificadas conforme as 
interações vão ocorrendo.
2. Os hábitos podem tornar-se instituições sociais quando são partilhados socialmente, 
quando uma nova geração é socializada já os compreendendo como “naturais”.
3. Dizer que uma mulher não nasce, torna-se, significa que o gênero é uma construção 
social. Cada sociedade cria uma espécie de “estereótipo” de mulher, definindo o 
comportamento que a sociedade espera dela.
4. Um tipo ideal é uma construção teórica, criada a partir da seleção e do exagero de 
características encontradas em exemplos reais. O tipo ideal não é encontrado na realidade.
5. A dominação legal é um tipo de dominação legítima baseada em leis e regulamentos. 
Um exemplo é a dominação do empregador sobre o empregado.
33
A CONSTRUÇÃO DA 
IDENTIDADE SOCIAL
Quem somos?
34INTRODUÇÃO ÀS CIÊNCIAS SOCIAIS E POLÍTICAS
 SUMÁRIO
Nesta unidade, continuaremos a analisar a interação social, agora sob a perspec-
tiva do indivíduo. Iniciaremos abordando o processo de socialização, em seus aspectos 
primário e secundário, ou seja, desde o nascimento até as socializações posteriores. De-
pois, analisaremos a construção da história do indivíduo, os ritos de passagem, a me-
mória coletiva e suas peculiaridades, inclusive quanto à formação de falsas memórias.
Também vamos conhecer o conceito de “homem cordial”, uma forma de carac-
terizar o brasileiro e compreender alguns traços estereotipados, como a receptivida-
de. Por fim, examinaremos a noção de desvio e de controle social: veremos como você 
pode ser classificado como “outsider” e qual é a vinculação disso com a transgressão 
de uma norma social.
A SOCIALIZAÇÃO
Quando pensamos em um frágil bebê humano recém-nascido, fica evidente o grau de 
socialização inato que possuímos: zero. É inegável que somos seres sociáveis, em que pese 
esse processo de socialização iniciar na infância e perdurar por toda a vida do indivíduo.
De plano, é importante esclarecer o significado de socialização: um processo pelo 
qual o indivíduo torna-se membro de uma determinada sociedade. A título exempli-
ficativo, podemos pensar na socialização exigida pelo ingresso da criança em escola 
regular ou pelo início de um novo emprego. A cada inserção em um novo grupo, além 
da noção de pertencimento, temos uma nova socialização.
Por óbvio, a primeira socialização – chamada de socialização primária – ocorre na infância 
e é a mais fundamental, por ser a primeira. Esse processo é marcado pelo alto grau emocional e 
pelos aprendizados proporcionados pelos “outros significativos”. Esses “outros significativos” 
são os familiares que a criança encontra quando vem ao mundo, como pais, tios, avós e irmãos; 
eles contribuirão para a visão de mundo da criança.
35INTRODUÇÃO ÀS CIÊNCIAS SOCIAIS E POLÍTICAS
 SUMÁRIO
Sabidamente, a definição dos “outros significativos” é aleatória, mas impacta muito 
na socialização da criança: classe social, profissão, grau de instrução, religião e posição po-
lítica são alguns elementos que, apesar de pertencerem aos outros significativos,influen-
ciam na socialização primária. Assim, esse pequeno mundo social faz com que a criança 
absorva e interiorize os papéis destes “outros significativos”; ela entende este como “o” 
mundo – e não um mundo – pois é isso que ela conhece.
Com o passar do tempo, em meio a um processo dialético, a criança assume a sua pró-
pria identidade e espaço dentro dessa sociedade familiar. Além disso, a criança passa a abs-
trair papéis e atitudes dos “outros significativos”, apreendendo normas gerais e passando a 
relacionar-se com “outros generalizados”. Como exemplo, podemos pensar em uma crian-
ça que desperdiça comida durante as refeições e percebe a reclamação dos pais; com o tempo 
ela percebe a relação entre o desperdício de comida e a reclamação, para depois generalizar: 
toda vez que há desperdício, há reclamação, ou tristeza. Sem desperdício, sem reclamação!
Os “outros significativos” compõem nosso primeiro grupo 
social, são os pais, irmãos, avós, etc.
Os “outros generalizados” são outros atores sociais, 
pertencentes a grupos sociais variados – não à família.
Em resumo, o aprendizado iniciado na sociedade familiar é generalizado. A criança pas-
sa a sentir-se membro da sociedade, embora não ocorra correspondência perfeita entre a re-
alidade objetiva existente e a realidade subjetiva vivenciada pelo indivíduo. Reitere-se à per-
cepção inicial acerca da sociedade familiar ser “o” mundo, afinal, isso faz com que o mundo 
interiorizado na socialização primária permaneça mais enraizado e seja de difícil alteração. 
Quando falamos em socialização secundária, falamos em qualquer processo de socia-
lização que não seja a primária. Como exemplo, citamos a internalização dos “submundos” 
institucionais, ou seja, aqueles baseados em instituições, como é o caso daqueles ligados ao 
trabalho. Tornar-se operário, professor ou militar, implica uma socialização secundária, 
um “fazer parte” daquele grupo específico.
36INTRODUÇÃO ÀS CIÊNCIAS SOCIAIS E POLÍTICAS
 SUMÁRIO
A socialização secundária sempre será contrastada com a primária, afinal, esta 
possui maior carga emocional e, em certo momento, representava o mundo – apenas, 
posteriormente, percebemos que a sociedade familiar é um mundo, mas ela já terá dei-
xado suas marcas significativas. Nossos “submundos” – como é o caso do mundo do 
trabalho –, mostram-se realidades parciais colocadas ao lado do mundo familiar, in-
clusive com menor grau de identificação. 
A passagem do mundo familiar para os outros mundos sociais pode ser marcada 
por ritos de passagem. Dessa forma, a sociedade define coletivamente rituais que mar-
carão a história individual, como pode ser o caso da festa de 15 anos, do alistamento 
eleitoral, etc. Aliás, esse será um dos temas abordados na sequência!
A CONSTRUÇÃO DA PRÓPRIA HISTÓRIA
Abordaremos os aspectos ligados à construção da própria história do indivíduo. Aqui se 
torna importante mencionar novamente a obra “O príncipe”, de Maquiavel. Nessa obra, o fi-
lósofo afirma que metade de nossas ações depende da sorte (chamada por ele de “fortuna”), 
enquanto a outra metade, ou próximo disso, depende de cada um de nós (MAQUIAVEL, 2007, p. 
120). Assim, resta clara a existência de condicionantes sociais influenciadoras de nossa biogra-
fia, contudo, há uma boa parcela dessa biografia dependente da postura individual.
37INTRODUÇÃO ÀS CIÊNCIAS SOCIAIS E POLÍTICAS
 SUMÁRIO
O fato de você ter nascido no Brasil, no ano de 2000, ou na França, em 1800, afetará o 
seu campo de possibilidades, mas não define a sua biografia, embora o Brasil do ano 1500 
não permitisse que seus nativos escolhessem seus youtubers. Na concepção maquiavélica, 
esses condicionantes aleatórios como tempo, espaço e tecnologia disponível, representam 
apenas a metade da sua história. O restante é você quem faz, quem escreve!
Devemos reconhecer que seu projeto de vida, individualmente falando, está inseri-
do em um campo maior, com limitações históricas e culturais. Nesse sentido, os projetos 
individuais não constituem meros projetos internos, pois inscritos em dada época e local. 
Everett Hughes propõe uma conjugação entre o ciclo da vida, a nossa trajetória pessoal e o 
tempo no qual vivemos. Assim, apesar de cada sociedade possuir pontos de inflexão relati-
vamente previsíveis, cada indivíduo tem sua carreira singular. 
Culturalmente, há a definição de um calendário, marcando a vida coletiva. Por exem-
plo, nós brasileiros temos o carnaval (normalmente em fevereiro), a Páscoa celebrada com 
ovos de chocolate, o Natal com sua tradicional troca de presentes, janeiro e julho com suas 
férias escolares, maio com o dia das mães, junho com o dia dos namorados, etc. Todo ano 
esse calendário tende a repetir-se.
Perceba que o calendário acaba incorporando a própria história social: em sete de 
setembro, no Brasil, temos o feriado da Independência da República – uma forma de 
lembrar a data; em oito de março comemoramos o dia da mulher, lembrando operárias 
queimadas em uma fábrica nos Estados Unidos. Assim, o calendário absorve a história e 
relaciona pessoas e instituições.
38INTRODUÇÃO ÀS CIÊNCIAS SOCIAIS E POLÍTICAS
 SUMÁRIO
Ao lado do calendário social, há ritos de passagens individuais. A título ilustrativo, 
podemos pensar no batismo, na formatura, na festa de 15 anos, no serviço militar, no 
trote no início da faculdade, no casamento, etc. Esses e outros ritos de passagem marcam 
uma mudança de estado, por exemplo, de solteiro para casado, com sua própria unida-
de familiar. Entretanto, ao longo do tempo os ritos de passagem sofrem alterações. Você 
consegue citar um exemplo?
No caso do Brasil, o casamento (inegavelmente um rito de passagem) já foi considera-
do uma união indissolúvel. Hoje, o divórcio pode ocorrer até administrativamente e surgiu 
aí uma “nova tendência”: a festa de divórcio. Já ouviu falar dessa festa promovida pela mu-
lher recém-divorciada? Quem sabe surja aí um novo rito de passagem!
Por falar em términos, os atos fúnebres também marcam um ritual de passagem. O 
corpo morto, as flores, o preto, o silêncio, tudo tem um simbolismo. Marca o término da 
existência física daquela pessoa, traz um novo “status” ao eventual cônjuge – viúvo(a) –, 
permite registrar na nossa memória que realmente aquela pessoa partiu. Aliás, falando em 
memória, você consegue perceber uma ligação entre memória e identidade social?
39INTRODUÇÃO ÀS CIÊNCIAS SOCIAIS E POLÍTICAS
 SUMÁRIO
A identidade, enquanto princípio estudado já na filosofia Antiga, busca a permanên-
cia de algo, de uma base idêntica e imutável, apesar de todas as variações existentes. Pen-
se na sua identidade, naquilo que lhe caracteriza apesar de todas as suas variações físicas: 
nessa multiplicidade de aparências, há uma essência? Independentemente da resposta 
dada, é inegável a existência de algum grau de mudança ao longo de nossa existência.
Quando falamos em memória individual e analisamos a si mesmos, é possível perceber 
uma constante reorganização das memórias. Conforme o contexto, há o acionamento de re-
cordações, deixando claro que a memória individual não é apenas um amontoado de fatos, mas 
são instrumentos para (re)construção da própria identidade. É nesse sentido que podemos res-
significar acontecimentos.
O fato de não lembrarmos de absolutamente tudo evidencia a seletividade da memória: alguns 
acontecimentos são esquecidos e outros, lembrados. Como já dito, há uma construção da memória 
individual, assim como da memória coletiva, mas essa construção pode sofrer interferências.
40INTRODUÇÃO ÀS CIÊNCIAS SOCIAIS E POLÍTICAS
 SUMÁRIO
Michel Pollak menciona um interessante exemplo: moradores da Normandia 
“lembravam” de alemães com capacetes pontudos na Segunda Guerra Mundial, em 
que pese essa descrição corresponder à Primeira Guerra Mundial, época sequer viven-
ciada por aquelas pessoas. Dessa forma, resta claro que o compartilhamento social de 
memórias pode gerar, no indivíduo,falsas memórias, as quais estão muito além de 
constituírem meros enganos: há acontecimentos vividos por tabela.
A noção de pertencimento a determinado grupo faz com que as memórias coleti-
vas sejam partilhadas. Isso permite viver acontecimentos por tabela, sem efetivamente 
ter participado da situação real, o indivíduo apropria-se da narrativa do grupo. Dessa 
forma, podemos inclusive conhecer pessoas e personagens sem nunca os ter visto. 
As memórias contêm marcos, pontos solidificados impossíveis de alteração, mas 
possuem conteúdos variáveis e passíveis de reconstrução. É possível criar “lugares da 
memória” cuja correspondência real sequer existe. Ainda assim, nossa memória per-
mite a revisitação a tais locais. 
Toda a memória, seja individual, seja coletiva, é 
mutável!
A memória coletiva permite que certos acontecimentos sejam 
vividos por tabela.
41INTRODUÇÃO ÀS CIÊNCIAS SOCIAIS E POLÍTICAS
 SUMÁRIO
Em síntese, nossa memória pode estar ancorada em fatos – ver-
dadeiros – ou em projeções e transferências. Por essa razão, mesmo 
inexistindo má-fé, a memória individual ou coletiva pode conter en-
ganos, afinal, ela está sendo permanentemente construída.
Além disso, a memória é rearranjada para construir a identidade 
do indivíduo e daquela sociedade. Essencialmente se objetiva garantir 
a unidade física, a continuidade no tempo e a coerência. Destarte, a 
própria reconstrução (seja enquanto indivíduo, seja como sociedade) 
implica uma ideia de unicidade, ou seja, apesar dos acontecimentos 
variados, há continuidade e coerência na narrativa. 
Memória e identidade não são essências imutáveis, mas elemen-
tos constantemente negociados, administrados pelo indivíduo e pelo 
grupo. A interpretação de acontecimentos e a criação de laços simbó-
licos evidencia a tentativa de demonstrar continuidade. Queremos dar 
coerência à história, ver ligações entre os acontecimentos.
Aliás, você conseguiria escrever a “história da sua vida” em uma 
página? Que acontecimentos você priorizaria? Quais seriam os ele-
mentos coletivos indicados na sua narrativa pessoal? Vamos “resga-
tar” a sua memória? Pega papel e caneta e vamos lá! Essa é uma das 
atividades de síntese da Unidade.
42INTRODUÇÃO ÀS CIÊNCIAS SOCIAIS E POLÍTICAS
 SUMÁRIO
BRASILEIRO: O HOMEM CORDIAL
Ao falar de si, da identidade individual e coletiva, mostra-se importante resgatar um con-
ceito de um antropólogo brasileiro chamado Sergio Buarque de Holanda: o conceito de “homem 
cordial”. Esse homem cordial seria o estereótipo do brasileiro, algo que nos caracteriza, afinal, 
fomos criados em um ambiente social marcado pela cordialidade, mas o que é isso?
“Cordial” vem do latim “cordialis”, “relativo ao coração”. Isso significa que o homem 
cordial é movido pelo coração, é marcado pelas emoções transbordantes, pela espontaneidade. 
Se isto é bom? É o que vamos analisar na sequência.
A cordialidade está vinculada às emoções, mas não apenas às emoções positivas. Da mesma 
forma que a cordialidade acentua as amizades, acentua as inimizades. A grande característica do 
brasileiro é não separar a esfera pública da esfera privada. Chamamos as pessoas por apelidos 
– mesmo sem intimidade com elas – (“Chico”, “Zé”, “Maju”), usamos diminutivos (“Fernan-
dinha”, “Pedrinho”), omitimos o nome de família (sobrenome ou patronímico), damos ênfase 
nas relações de parentesco ou amizade. Essa última característica fica evidente quando, mesmo 
a um(a) desconhecido(a) chamamos de “tio(a)”, “amigo(a)” ou “vizinho(a)”.
Outros exemplos da cordialidade do brasileiro podem ser encontrados na religião. O ca-
tolicismo brasileiro possui intimidade com o sagrado – veja-se o grau de “ousadia” nas ações 
praticadas contra as imagens de Santo Antônio?! Certamente você conhece alguém que já recor-
reu às simpatias e, quiçá, colocou o Santo de ponta à cabeça para ver seu pedido atendido. 
43INTRODUÇÃO ÀS CIÊNCIAS SOCIAIS E POLÍTICAS
 SUMÁRIO
Além disso, temos o sincretismo religioso: o brasileiro não vê problemas em ir à 
missa, frequentar um terreiro de umbanda e tomar passe no centro espírita; na maior 
parte das vezes, ele sequer percebe que isso significa negar todas as doutrinas... Há 
uma recusa à racionalidade e uma exaltação aos sentimentos, própria da nossa cultu-
ra. Somos avessos ao ritualismo e ao formalismo.
A tradicional frase, “Você sabe com quem está falando?”, via de regra, demonstra uma ten-
tativa de tirar proveito de uma relação familiar ou mesmo de um cargo exercido pela pessoa. 
Também temos uma confusão entre as esferas pública e privada, afinal, não é porque sou filha de 
um vereador que tenho autorização para descumprir a legislação, por exemplo. 
Em resumo, a cordialidade do brasileiro, além da receptividade e do acolhimento, implica difi-
culdade na separação das esferas pública e privada. É difícil comportar-se de forma diversa nos am-
bientes social e familiar, pois vemos a sociedade como uma extensão da nossa família. Somos avessos 
ao formalismo e adeptos de contratações baseadas “na confiança” – devemos reconhecer que isso 
pode trazer sérios problemas. Por exemplo, você já demitiu ou foi demitido por um amigo ou fami-
liar? Essa reação também representa a cordialidade, a passionalidade do brasileiro – nossa, no caso.
Exemplo real: em determinada audiência de conciliação entre 2 
vizinhas – uma brasileira e outra taiwanesa – foi obtido um acordo 
de respeito entre elas. O acordo levou bastante tempo para ser 
realizado e, ao final da audiência, a brasileira decidiu abraçar a 
taiwanesa. Resultado: o conflito recomeçou, afinal a taiwanesa não 
estava acostumada a esse tipo de contato... Foram mais uns 10 
minutos para a brasileira entender que, culturalmente, a taiwanesa 
via aquilo como violência/assédio. Felizmente o acordo se manteve, 
sem abraços!
Aliás, você já reparou a dificuldade que os políticos brasileiros têm para separar 
as esferas pública e privada? Mesmo com lei antinepotismo distribuem-se cargos aos 
familiares, como se o Estado fosse uma extensão da família. Por mais que a Consti-
tuição Federal coloque a impessoalidade como princípio orientador da Administração 
Pública, a todo momento, vemos tentativas de pessoalizar: “fulano foi nomeado para 
secretário porque o prefeito confia nele (não por ser capaz); foi Beltrano que fez o 
hospital (não” na gestão de Beltrano”), entre tantos exemplos.
44INTRODUÇÃO ÀS CIÊNCIAS SOCIAIS E POLÍTICAS
 SUMÁRIO
O CONTROLE SOCIAL E O DESVIO
Para a institucionalização, entendida como uma prática social 
reiterada e partilhada coletivamente, ao longo da história, é uma 
forma de controle social. Escolas, polícias e prisões são exemplos 
de instituições criadas para o controle social. Nosso estudo iniciará 
com um conceito arquitetônico, desenvolvido pelo jurista e filósofo 
inglês Jeremy Bentham, analisado pelo filósofo francês Michel Fou-
cault: o panóptico. A estrutura panóptica, originalmente, foi criada 
para descrever um modelo de prisão com vigilância constante.
A prisão panóptica englobava uma torre central com vidros 
espelhados, na qual ficavam os vigias, e celas individuais em uma 
construção anelar que circundava a torre central, cuja frente à tor-
re era de vidro, permitindo ao vigia ver todo o interior de cada cela. 
Tentava-se fazer o prisioneiro introjetar as normas sociais ao in-
cutir nele a ideia de que poderia ser objeto de vigilância naque-
le exato momento, porque a parede de vidro permitia a visualiza-
ção de tudo o que ocorria no interior da cela, enquanto as pessoas 
(vigias), na torre, ficavam resguardadas de eventuais observações 
graças ao sistema de espelhamento. Assim, com um pequeno pas-
seio, um vigia poderia observar todos presos, em celas construídas 
nos 360º ao redor da torre central.
Ao analisar os dispositivos de poder, 
Foucault defende que o panoptismo é o re-
sultado de uma sociedade disciplinar, cuja 
história anterior nos remete ao sistemautilizado para controle da peste já no século 
XVII. Foucault descreve, a partir de arqui-
vos militares da época, como funcionava o 
sistema de policiamento na referida época. 
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Fechamento da cidade e da “terra”, proibição de sair sob pena de morte, fim de todos os animais errantes; divisão 
da cidade em quarteirões diversos onde se estabelece o poder de um intendente. Cada rua é colocada sob a 
autoridade de um síndico; ele a vigia; se a deixar, será punido de morte. No dia designado, ordena-se todos que 
se fechem em suas casas: proibindo sair sob pena de morte. O próprio síndico vem fechar, por fora, a porta de 
cada casa; leva a chave, que entrega ao intendente de quarteirão; este a conserva até o fim da quarentena. Cada 
família terá feito suas provisões; mas para o vinho e o pão se terá preparado entre a rua e o interior das casas 
pequenos canais de madeira, que permitem fazer chegar a cada um sua ração, sem que haja comunicação 
entre os fornecedores e os habitantes; para a carne, o peixe e as verduras, utilizam-se roldanas e cestas. Se for 
absolutamente necessário sair das casas, tal se fará por turnos, e se evitando qualquer encontro. Só circulam os 
intendentes, os síndicos, os soldados da guarda e entre as casas infectadas, de um cadáver a outro os “corvos” que 
tanto faz abandonar à morte: é “gente vil que leva os doentes, enterra os mortos, limpa e faz muitos ofícios vis e 
abjetos”. Espaço recortado, imóvel, fixado. Cada qual se prende a seu lugar. E, caso se mexa, corre perigo de vida, 
por contágio ou punição” (Trecho da obra “Vigiar e punir”, de Foucault).
https://universodafilosofia.com/2017 /12/o-panoptico-de-foucault-em-vigiar-e-punir/
45INTRODUÇÃO ÀS CIÊNCIAS SOCIAIS E POLÍTICAS
 SUMÁRIO
No trecho citado, resta claro o entendimento de que o controle da peste depen-
dia do isolamento da população, ou seja, era necessário isolar para controlar. Foucault 
observa, nesta ideia, o embrião da sociedade disciplinar, a qual se utiliza da vigilância 
constante para fabricar indivíduos. O filósofo francês entende a sociedade disciplinar 
como um resultado de processos socioeconômicos (em especial, o aumento popula-
cional), jurídico-políticos (com a ascensão da burguesia) e de novos conhecimentos.
Isolamento vivenciado em 2020.
Os princípios basilares da sociedade disciplinar possibilitaram o desenvolvimento do pa-
noptismo. Como já dito, a noção panóptica surgiu na arquitetura prisional, defendendo a vigi-
lância constante como forma de transformar “criminosos” em cidadãos cumpridores da lei. En-
tretanto, essa noção expandiu-se para todos os ambientes sociais, seja na arquitetura, seja com 
a utilização de dispositivos de vigilância. 
O panoptismo tradicional possuía um ponto específico e conhecido de vigilância: a torre 
central. Atualmente, poderíamos comparar a torre com uma câmera de segurança ostensiva, 
marcada pela conhecida advertência: “você está sendo filmado”. Contudo, essa forma tradi-
cional de vigilância tem perdido espaço para outros sistemas, aos quais Baumann compara com 
ervas daninhas, cujo crescimento ocorre de forma não esperado. 
Como exemplo dessa nova forma de vigilância, pense 
no monitoramento realizado graças aos smartphones: sua 
localização pode ser definida ainda que o GPS esteja des-
ligado, isso apenas para citar um exemplo. As cidades 
possuem uma complexa rede de monitoramento, a 
exemplo daquelas que utilizam programas de re-
conhecimento facial a partir das imagens capta-
das pelas câmeras de rua, visando a identifi-
cação de transgressores. Ainda assim, via de 
regra, andamos pelas ruas sem sequer notar 
que estamos sob essa vigilância constante.
46INTRODUÇÃO ÀS CIÊNCIAS SOCIAIS E POLÍTICAS
 SUMÁRIO
As questões levantadas no parágrafo anterior são abordadas pelo sociólogo nor-
te-americano Howard Becker na obra “Outsiders”. Becker reconhece que todos os 
grupos sociais fazem regras definindo condutas certas e erradas, criando um padrão 
de conduta socialmente aceito. Dessa forma, o desvio é algo criado pela sociedade, ou 
seja, não há algo inerente a todos os transgressores, tampouco a transgressão consti-
tui uma patologia ou um desvio da média.
Na concepção de Becker, o transgressor ou outsider é aquele que recebeu um rótu-
lo social. Esse processo de rotulação depende, em parte, do ato praticado e, em parte, da 
reação social a esse ato. Como exemplo, podemos pensar na venda de produtos falsifi-
cados; a referida conduta é criminalizada pela legislação brasileira em que pese, muitos 
não rotularem o vendedor de produtos contrafeitos como “transgressor”. Essa mesma 
percepção é extensiva àqueles apostadores do jogo do bicho ou usuários de máquinas 
caça-níqueis - condutas tipificadas na lei de contravenções penais. Em resumo, a mera 
transgressão a uma norma social definida como delito não torna o sujeito “outsider”.
Ser “outsider” implica um processo de rotulação social, ou seja, ser socialmente 
reconhecido como tal. Becker ilustra esse processo com um exemplo de um relaciona-
mento sexual entre parentes, fato socialmente rotulado como incestuoso em determi-
nada ilha. No exemplo, resta claro que o problema não era o fato em si, mas a repercus-
são social, a qual poderia culminar inclusive no suicídio das partes envolvidas. Assim, 
é possível perceber que a imposição das regras sociais não é automática, depende do 
tempo, das consequências e, principalmente, das pessoas. 
Quando falamos em transgressores, não caracterizamos esses indivíduos. Aliás, você já 
refletiu sobre quem é socialmente considerado “transgressor”? Haveria algo inerente a todos 
eles? Há uma patologia social que os caracteriza? Eles são pessoas anormais cujo comporta-
mento destoa da média socialmente esperada? 
47INTRODUÇÃO ÀS CIÊNCIAS SOCIAIS E POLÍTICAS
 SUMÁRIO
Em resumo, “outsider” é quem recebeu socialmente o rótulo de transgressor, ainda que 
não concorde com a sua rotulação, ainda que veja razões justificáveis para sua conduta. A 
transgressão é um fato social normal (não patológico), pois cada sociedade cria suas regras 
sociais e haverá quem, por algum motivo, desrespeite tais regras. Entretanto, o desrespeito às 
regras sociais não garante o rótulo de outsider, exige-se ainda a rotulação social. Essa é a ex-
plicação para a rotulação ser um processo e não uma simples consequência da transgressão.
SÍNTESE
Neste capítulo, vimos que a socialização é um processo iniciado na infância, com a 
socialização primária, e continuado por toda a vida do indivíduo com outras socializa-
ções, chamadas de secundárias. Essas socializações secundárias podem ocorrer na esco-
la, no trabalho, na academia e em tantos outros grupos dos quais o indivíduo participa 
com os “outros generalizados”. 
A integração a outros grupos sociais pode ser marcada por rituais de passagem, como 
é o caso do batismo ou do trote universitário. Os rituais de passagem marcam uma mudan-
ça de status, integrando a biografia individual a elementos sociais. Inevitavelmente, a bio-
grafia do indivíduo vai se misturando com a história coletiva. O resgate dessas memórias 
– individual e coletiva – não constitui a busca por algo rígido, mas de algo constantemente 
rearranjado, visando dar sentido à história e criando uma identidade.
No caso dos brasileiros, o elemento identitário característico é a cordialidade, enten-
dida como passionalidade. O conceito sociológico de “homem cordial” remete não somente 
rápida abertura à amizade, mas também a uma profunda dificuldade em separar as esferas 
pública e privada. Por fim, analisamos o controle social, ou seja, como a sociedade controla 
ações individuais. Examinamos um modelo arquitetônico chamado panóptico, cuja propos-
ta central é o isolamento e a vigilância constante. Além disso, vimos que o crime é uma cria-
ção social e a consideração de alguém como desviante (“outsider”) não depende

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