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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS FICHAMENTO 6: OBJETOS DE DESEJO - DIFERENCIAÇÃO EM DESIGN (ADRIAN FORTY) ALUNA: GABRIELA AMORIM DE ARAUJO DISCIPLINA: HISTÓRIA SOCIAL DOS MEIOS O texto fala sobre como o design foi importante para a existência de diversos modelos de um mesmo produto, oferecendo para os usuários uma grande variedade de possibilidades. É importante ressaltar que no século XIX, apenas o fato de que os fabricantes e os clientes queriam ter o poder de escolha foi suficiente para desencadear uma produção de uma única mercadoria com designs diferentes. Além disso, os diferentes tipos de modelo dos objetos também colaboraram para reforçar as distinções dentro da sociedade. As distinções entre os produtos eram determinadas de acordo com a forma que os fabricantes e os próprios clientes pensavam que a estrutura social era organizada. “Essas distinções, que poderiam ser identificadas em muitos outros produtos, baseiam-se no pressuposto de que as pessoas em cada categoria de idade, sexo, classe ou posição social se viam como diferentes das de outras categorias, e queriam que isso se refletissem nos bens que compravam e usavam.” (FORTY, 1986) O estudo do design confirma essas diferenciações dentro da sociedade, além de deixar explícito o que as pessoas pensavam sobre cada categoria. Adrian Forty começa falando sobre a diferenciação de produtos por gênero - masculino e feminino - ser a mais comum no panorama histórico do vestuário e a mais fácil de identificar essa distinção. O motivo disso foi discutido por diversos intelectuais, mas o que melhor se encaixa para abranger não apenas roupas, mas também artigos de uso pessoal, é a existência de convenções sociais e a forma como as funções sociais dos homens e das mulheres eram muito diferentes no século XIX. “A exclusão gradual das mulheres de classe média e alta da vida ativa política e comercial a partir do século XVI atingiu um ponto, na metade do século XIX, em que sua vida pública estava restrita às funções ‘sociais’ de receber e retribuir visitas.” (FORTY, 1986) Isso se dá pela característica patriarcal da sociedade da época - que também pode ser relacionada com os dias atuais, já que muitas famílias ainda possuem o pensamento conservador de que as mulheres não podem trabalhar e devem apenas exercer a função de donas de casa. A distinção entre os produtos masculinos e femininos se dava pelas constituições sociais que lhes foram colocadas, por exemplo: a mulher era considerada frágil, delicada, sensível e emocional, enquanto o homem era visto como forte, vigoroso, racional e capaz de “esconder” os sentimentos. Isso era explícito no design dos objetos de forma que os femininos eram mais delicados e tinham mais detalhes que os masculinos, que até hoje é possível perceber na fabricação de determinados produtos, principalmente na distinção de cor - rosa para mulher e azul para homens, por exemplo. “...as escovas masculinas eram caracteristicamente ovais, com pouco ou nenhum ornamento; as femininas, mesmo a um preço equivalente, tinham cabos e eram, em geral, entalhadas ou gravadas. Nos relógios de pulso, a disparidade de tamanho era maior do que a existente entre o pulso do homem e o da mulher, e os femininos tinham usualmente linhas e mostradores mais delicados.” (FORTY, 1986) Atualmente, apesar da sociedade ser mais progressista, essas características de gênero conservadoras ainda perpetuam pelo mundo e, nesse texto, é possível observar como o design colaborou para reforçar essas concepções do que é masculino e feminino, de forma que se existia no mercado produtos diferentes para homens e mulheres, então realmente existia essa distinção. “As caraterísticas não existiam como realidades, mas como ideias; para viver tranquilamente com elas, as pessoas precisavam de provas de sua verdade. A ficção, a educação e a religião contribuíram todas para isso, e o mesmo fez o design.” (FORTY, 1986) A infância também é um dos tópicos que Forty utiliza para falar da diferenciação por meio do design de objetos. Antes do século XIX, as crianças não eram tão “afastadas” dos adultos por meio de roupas e artigos - inclusive, em alguns retratos de séculos anteriores, as crianças ganhavam destaque igual ao dos adultos, sendo vestidas como tal. O que contribuiu para que essa distinção começasse a ganhar espaço nas mercadorias foi o início de uma visão da criança como inocente, ingênua e virtuosa. “A crença progressiva na bondade absoluta da infância culminou nas descrições tremendamente sentimentais da inocência infantil que se encontram na literatura da virada do século XIX para o XX; somente com as descobertas da psicanálise as ideias sobre a natureza da infância começaram a mudar.” (FORTY, 1986) Apesar de já existirem antes, a mobília infantil só começou a ser produzida em maior escala, em formas e aparências com diferenciação mais explícita no final do século XIX. Os móveis tinham como objetivo atender às necessidades específicas da infância, mas também eram mais higiênicos que os que antes eram utilizados, além de serem fáceis de limpar. Como decoração, esses objetos tinham cores que eram consideradas adequadas para o público infantil e desenhos de animais com algumas características humanas. “Quando aves e mamíferos apareceram na porcelana para adultos, a associação tendia a ser com a caça, mas os motivos nas porcelanas infantis eram diferentes, pois os animais eram antropomorfizados e as crianças deveriam ter empatia por eles.” (FORTY, 1986) A produção de móveis e objetos exclusivos para crianças existe até hoje, como as cadeiras infantis em restaurantes e o hábito de montar o quarto do bebê com objetos específicos para a idade - que ainda possuem desenhos de animais e cores pastéis. As classes sociais também foram diferenciadas por meio do design, apesar de serem mais difíceis de reconhecer em um panorama histórico, visto que essa distinção era marcada pelos padrões de consumo, e não pela caraterística dos objetos. Porém, o vestuário foi uma das formas de fazer essa diferenciação, principalmente pela qualidade do tecido das roupas - “Os vestidos de algodão estampado usados pelas mulheres trabalhadoras eram, em geral, de segunda mão ou descartados. Era mais comum que as pessoas da classe operária usassem roupas de lã, em vez de algodão.” (FORTY, 1986). Sendo assim, o mercado foi dividido entre roupas que eram produzidas visando a classe trabalhadora e outras para a classe média e alta, sendo os da primeira feitos em escala maior. Isso pode se relacionar aos dias atuais com as lojas de departamento como Renner, C&A e Riachuelo, que produzem em grande escala e são mais acessíveis. Além disso, alguns designs foram reproduzidos em tecido barato quando se tornaram “comuns” à classe alta - que logo compravam roupas novas - e permitia que a classe mais baixa pudesse seguir a moda da época. Em comparação com a atualidade, é possível identificar esse mesmo comportamento devido ao consumismo: para pessoas com maior poder aquisitivo, usar uma roupa uma única vez já a torna inútil, o que faz com que essa peça seja logo descartada e outra adquirida. Além disso, muitas tendências da moda surgiram com essa distinção da classe média para a trabalhadora. Em geral, o design das roupas para a classe mais rica era extremamente refinado e de qualidade, enquanto o das para a classe mais baixa era grosseiro e com qualidade inferior. Além disso, a classe alta tinha o “poder” de determinar se uma peça de roupa era julgada de forma positiva ou não. Isso se relaciona com os dias atuais, no qual vivendo em uma época na qual os influenciadores digitais que possuem grande visibilidade na mídia conseguem tornar algo que antes era considerado feio ou ultrapassado em tendência. O vestuário começou a possibilitar ainda mais a disparidade entre classes sociais especificamente quando as relações de patrão e empregado se consolidaram na sociedade. É sobre isso que o autor fala no tópico de“Patrão e criado”: como a existência de uma hierarquia nas relações de trabalho fizeram com que as diferenças no design se tornassem mais visíveis e deixassem claro a classe social de cada indivíduo. Para ilustrar essa relação trabalhista, Forty retrata que o fácil acesso da classe trabalhadora às roupas semelhantes às de suas patroas, fez com que as mulheres mais abastadas tivessem medo de serem confundidas com suas criadas, assim como no incômodo que sentiam com o desejo de independência que partia dos empregados. Isso fez com que fosse estabelecida uma vestimenta própria para os criados. “...a diminuição do preço dos tecidos de algodão estampados e o fato de os estampadores reproduzirem os desenhos da moda em tecidos baratos possibilitaram que as criadas se vestissem com roupas que podiam ser confundidas com os vestidos vistosos do guarda-roupa de suas patroas. Diante dessa perspectiva, e com criadas que buscam maior independência, as patroas começaram a insistir que elas usassem uniformes, em particular as copeiras, que seriam vistas pelas visitas. A partir da década de 1860, tornou-se normal que as criadas vestissem vestidos pretos, com toucas e aventais brancos.” (FORTY, 1986) A dinâmica comportamental passou a ter uma configuração diferente nas casas dos patrões visando que essa diferenciação dos criados fosse ainda maior. “... jamais deveriam dar alguma coisa com as mãos aos patrões e visitantes, mas usar sempre uma bandeja de prata. As restrições em relação a quando as criadas podiam sair de casa e a quem poderia visitá-las reforçavam o sentimento de que elas eram propriedade do empregador.” (FORTY, 1986) Além disso, o espaço físico das casas também mudou, sendo configurado de forma que haviam dependências de empregados separadas das dos patrões. Isso pode ser relacionado com os dias atuais, visto que ainda existem os denominados “banheiros de empregada” em moradias e tratamento diferenciado para domésticas, como se alimentar em horários e cômodos diferentes dos chefes. Essa separação lembra também um pouco da segregação racial do fim do século XIX - como o apartheid, na África do Sul, e após a Guerra Civil nos Estados Unidos -, no qual negros usavam banheiros, bebedouros, etc, diferentes dos que os brancos utilizavam. Para concluir o texto, o autor fala sobre a variedade dos produtos e como esse movimento de produzir vários modelos de um mesmo produto poderia ser explicado. Uma primeira possibilidade é o grau de escolha que gerava um sentimento de segurança quanto à individualidade de cada consumidor. “Um canivete de aparência masculina poderia reforçar a visão do comprador de si mesmo como másculo, mas, enquanto fosse o único canivete masculino disponível, o objeto não faria nada para que ele se sentisse diferente dos outros homens.” (FORTY, 1986) A segunda possibilidade vem do desejo de obter maior lucro por parte dos fabricantes, já que previam que se oferecessem variedades da mercadoria, os clientes seriam persuadidos a comprar mais de uma. “Variações sutis no que era essencialmente o mesmo produto poderiam persuadir as pessoas a comprar um segundo ou terceiro artigo quando um teria sido suficiente para suas necessidades.” (FORTY, 1986) Já a terceira possibilidade é que os fabricantes pensavam que, com um mesmo produto sendo produzido com designs diferentes, eles teriam maiores chances de agradar os clientes e, assim, converter em uma compra. “Os fabricantes tinham uma possibilidade maior de descobrir, digamos, uma escova de cabelo que fosse perfeitamente adequada aos pressupostos da masculinidade se começassem oferecendo grande número de designs, em vez de poucos ou apenas um.” (FORTY, 1986) Além disso, Forty afirma que os fabricantes chegaram à conclusão de que quanto maior a variedade, maiores eram as vendas e, consequentemente, maior o lucro. Isso pode ser visto na sociedade atual, onde existem diversos modelos de um mesmo produto e, mesmo oferecendo a mesma coisa, os indivíduos continuam comprando. Com isso, é possível dizer que o capitalismo ajudou no desenvolvimento do design, assim como o design colaborou para a consolidação do capitalismo, gerando um tipo de ciclo. Sendo assim, se houvesse mais opções de design, o consumo era maior, o que alimentava ainda mais a produção de outros modelos. Para concluir, é importante salientar que a diversificação de designs ao longo da história ainda não possui uma explicação que cobre todos os casos. “Alguns viram o desenvolvimento de designs novos e diferentes como consequência da evolução de novas necessidades (...). Outros historiadores atribuíram essa criação ao desejo dos designers de expressar sua engenhosidade e talento artístico.” (FORTY, 1986)
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