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CONTEÚDO DE PROVA 2021 Na Europa não houve uma arte moderna uniforme. Houve, sim, um conjunto de tendências artísticas — muitas vezes provenientes de países diferentes — com propostas específicas, embora as aproximasse certos traços, como o sentimento de liberdade criadora, o desejo de romper com o passado, a expressão da subjetividade e certo irracionalismo. Paris era o principal centro cultural europeu da época e o lugar de onde as novas ideias artísticas se irradiavam para o resto do mundo ocidental. Essas tendências, que surgiram na Europa antes, durante e depois da Primeira Guerra Mundial, foram consideradas correntes de vanguarda. O FUTURISMO: ARTE EM MOVIMENTO. Após a publicação, em 1909, do Manifesto Futurista, que define o perfil ideológico do movimento, Marinetti lançou, em 1912, o Manifesto técnico da Literatura Futurista, cujas propostas representam uma verdadeira revolução literária. Entre elas, destacam-se: ● Destruição da sintaxe e a disposição das “palavras em liberdade’; ● Emprego de verbos no infinitivo, com vistas à substantivação da linguagem; ● Abolição dos adjetivos e dos advérbios; ● Uso de substantivo duplo, em lugar de substantivo acompanhado de adjetivo (praça-funil, mulher-golfo, por exemplo); ● Abolição da pontuação, que seria substituída por sinais da matemática (-,+,:, =,<,>) e pelos sinais musicais: ● Destruição do eu psicologizante. Evidentemente, nem todas essas propostas se firmaram na literatura. Contudo, o verso livre ficou como uma das mais importantes contribuições do Futurismo e do Cubismo às correntes contemporâneas. Embora a área de maior penetração do Futurismo tenha sido a literatura, o movimento também encontrou ecos na pintura e na escultura, particularmente nas obras de Carlos Carrà, Umberto Boccioni, Gino Severini, Luigi Russolo e Giacomo Balla. Nas telas futuristas são comuns elementos que sugerem a velocidade e a mecanização da vida moderna. As propostas técnicas do Futurismo italiano tiveram adeptos em todo o mundo, entre os quais o escritor norte-americano Walt Whitman, o poeta português Fernando Pessoa e os poetas brasileiros Mário de Andrade e Oswald de Andrade.Veja, por exemplo, como nos seguintes versos do poema "Ode Triunfal”, de Fernando Pessoa, manifestam-se certos traços da poesia futurista, como o tom exaltado e exclamativo, a negação do passado e a exaltação das máquinas. O CUBISMO: A SIMULTANEIDADE DE PERSPECTIVAS. O movimento cubista teve início na França, em 1907, com o quadro Les demoiselles d’Avignon, do pintor espanhol Pablo Picasso. A partir de então, em torno de Picasso e do poeta francês Apollinaire formou-se um grupo de artistas que cultivaria as técnicas cubistas até o término da Primeira Guerra Mundial, em 1918. A convivência entre escritores e artistas plásticos deste grupo favoreceu uma rica troca de ideias e técnicas, de modo que os poetas se familiarizaram com técnicas pictóricas, enquanto os pintores assimilam idéias filosóficas e poéticas. Os pintores cubistas opõem-se à objetividade e à linearidade da arte renascentista e realista. Buscando novas experiências com a perspectiva, procuram decompor os objetos representando-os em diferentes planos geométricos e ângulos retos, em espaços múltiplos e descontínuos, que se interceptam e se sucedem, de tal forma que o espectador, com o seu olhar, possa remontá-los e ter uma visão do todo, de face e de perfil, como se tivesse dado uma volta em torno deles. Outra técnica introduzida pelos cubistas é a colagem, que consiste em montar a obra a partir de diferentes materiais, como figuras, jornais, madeira, etc. Na literatura, essas técnicas da pintura correspondem à fragmentação da realidade, à superposição e simultaneidade de planos — por exemplo, reunião de assuntos aparentemente sem nexo, mistura de assuntos, espaços e tempos diferentes. O poeta Apollinaire realizou, com base na disposição espacial e gráfica do poema, experiências que despertaram grande interesse. No Brasil, nas décadas de 1950-60, essa técnica influenciou o surgimento do Concretismo. Assim, a literatura cubista apresenta características como ilogismo, humor, anti-intelectualismo, instantaneísmo, simultaneidade, linguagem predominantemente nominal. As principais expressões do Cubismo europeu foram, na pintura, Picasso, Léger, Braque, Gris e Delaunay; na literatura, Apollinaire e Blaise Cendrars. Entre os modernistas brasileiros da década de 1920 podem ser notadas influências cubistas. Observe no poema de Oswald de Andrade a seguir, por exemplo, a presença de elementos como a fragmentação da realidade, a predominância de substantivos e flashes cinematográficos. Hípicas Saltos records cavalos da Penha Correm jóqueis de Higienópolis Os magnatas As meninas E a orquestra toca Chá Na sala de Cocktails. (Pau-Brasil 2. ed. São Paulo: Globo:2003. p. 173) O EXPRESSIONISMO: LIBERDADE NA EXPRESSÃO DO MUNDO INTERIOR. No começo do século XX, surgiu um grupo de pintores, chamados expressionistas na Alemanha e fauvistas na França, que, curiosamente, tinha como objetivo combater o Impressionismo, tendência da qual eles provinham. O Impressionismo consiste em uma corrente da pintura que valoriza a impressão, ou seja, é uma arte sensorial e subjetiva quanto ao modo de captação da realidade. Na relação entre o artista impressionista e a realidade, o movimento de criação vai do mundo exterior para o movimento de criação do mundo exterior para o mundo interior. Já no Expressionismo ocorre o oposto: O movimento de criação parte da subjetividade do artista, do seu mundo interior, em direção ao mundo exterior. Assim, para o artista expressionista, a obra de arte é reflexo direto de seu mundo interior e toda a atenção é dada à expressão, isto é, ao modo como forma e conteúdo livremente se unem para dar vazão às sensações do artista no momento da criação. Essa liberdade de expressão assemelha-se à que os futuristas pregavam com seu lema “ palavras em liberdade”. Durante e depois da Primeira Guerra, o Expressionismo assumiu um caráter mais social e combativo, denunciando os horrores da guerra, as condições de vida desumanas das populações carentes, etc. Segundo o crítico de arte Giulio Argan. “ O expressionismo se põe como antítese do impressionismo, mas o pressupõe: ambos são movimentos realistas, que exigem a dedicação total do artista à questão da realidade, mesmo que o primeiro a resolva no plano do conhecimento e o segundo no plano da ação”. ( Arte moderna,. São Paulo: Companhia das letras, 1993. p. 227) entre os principais fundamentos do Expressionismo destacam-se: ● A arte não é imitação, mas criação subjetiva, livre. A arte é expressão dos sentimentos. ● A realidade que circunda o artista é horrível e, por isso, ele a deforma ou a elimina, criando a arte abstrata. ● A razão é o objetivo de descrédito. ● A arte é criada sem obstáculos convencionais, o que representa um repúdio à repressão social ● A intimidade e a vivência da dor derivam do sentido trágico da vida e causam uma deformação significativa, torturada. ● A arte se desvincula do conceito de belo e feio e torna-se uma forma de contestação. Destacam-se, entre os artistas ligados ao Expressionismo: Na pintura, Kandinsky, Paul Klee, Chagall, Munch; na arquitetura, Erich Mendelsohn; na literatura, August Stramm, Kasimir Edschmid e, mais tarde, Herman Hesse e Tomos Mann; no teatro, Kayser e Brecht ( fase inicial); na música, Schoenberg; no crime, Wiene. Na literatura, o Expressionismo geralmente apresenta estas características: ● Linguagem fragmentada , elíptica, constituída por frases nominais (basicamente aglomerados de substantivos e adjetivos), às vezes até sem sujeito; ● Despreocupação quanto à organização do textos em estrofes, ao emprego de rimas ou à musicalidade; ● Combate à fome, inércia e aos valores do mundo burguês. Eis um fragmento do poema expressionista “O meu tempo”, do poeta alemão Wilhelm Klemm: __________________________ Cantos e metrópoles, lavinas febris, Terras descoradas, polos sem glória, Miséria,heróis e mulheres da escória, Sobrolhos espectrais, tumulto em carris. Soam ventoinhas em nuvens perdidas. Os livros são bruxas.Povos desconexos. ____________________ A alma reduz-se a mínimos complexos. A arte está morta. As horas reduzidas. ( Apud. Lúcia Helena. Movimentos da Vanguarda europeia. São Paulo: Scipione,1993.p.33) ____________________________________________________________ O DADAÍSMO: A ANTIARTE. Durante a Primeira Guerra Mundial, a Suíça, por ter se mantido neutra no conflito, recebeu artistas e intelectuais de todos os pontos da Europa. Abrigando-se em Zurique, alguns desses “ fugidos da guerra” reuniram-se no Cabaret Voltaire, ponto de encontro e espaço cultural onde nasceu o movimento dadaísta. ____________________________________________________ ___________________________________________ O QUE SIGNIFICA DADÁ? Segundo Tristan, o Líder dadaísta, a palavra dadá não significa nada: Encontrei o nome casualmente ao meter uma espátula num tom fechado do Petit Larousse e lendo logo, ao abrir-se o livro, a primeira linha que me saltou à vista: DADÁ. Eis, também, um fragmento do Manifesto do Senhor Antipirina, a primeira exposição pública do pensamento dadaísta: Dadá permanece no quadro europeu das fraquezas, no fundo é tudo merda, mas nós queremos doravante cagar em cores diferentes para ornar o jardim zoológico da arte de todas as bandeiras dos consulados. __________________________________________ Criado a partir do clima de instabilidade, medo e revolta provocado pela guerra, o movimento dadá pretendia ser uma resposta à nítida decadência da civilização representada pelo conflito. Dessa postura provêm a irreverência, o deboche, a agressividade e o ilogismo dos textos e manifestações dadaístas. Os dadás entendiam que, com a Europa banhada em sangue, o cultivo da arte não passava de hipocrisia e presunção. Por isso, adotaram procedimentos que tinham em vista ridicularizar, agredir e destruir a arte. Muitas foram as atitudes demolidoras dos artistas dadaístas a partir de 1916: noitadas em que predominavam palhaçadas, declarações absurdas, exposições inusitadas, além dos espetáculos-relâmpago que faziam de improviso nas ruas, em meio a urros, vaias, gritos, palavrões e à total incompreensão da plateia. Quanto às obras artísticas, especificamente, é pequena a produção do Dadaísmo suíço. Mas o movimento foi reforçado pelas montagens e colagens de Max Ernst e Hans Arp, feitas com diferentes materiais, e pela técnica do ready- made consiste em extrair um objeto do seu uso cotidiano e, sem nenhuma ou com pequenas alterações, atribuir-lhe um valor. Ficaram famosos certos objetos, como um urinol de porcelana, uma roda de bicicleta enxertada numa cadeira, um rolo de corda, uma ampola de vidro, um suporte para garrafa, todos elevados por Duchamp à condição de objetos de arte. Na literatura , o Dadaísmo caracteriza-se pela agressividade, pela improvisação, pela desordem, pela rejeição a todo tipo de racionalização e equilíbrio, pela associação de palavras (técnica da “ escrita automática”, que seria mais tarde aproveitada pelo Surrealismo) e pela invenção de palavras com base na exploração apenas do seu significante. Um exemplo dessas propostas é o poema fonético “Die Schlacht” ( “ A batalha”), de Ludwig Kassak; Entre os dadaístas têm destaques também Francis Picabia, Philippe Soupault e André Breton. A orientação anarquista e niilista, bem como a falta de um programa de arte, não permitiu ao movimento longo duração. Tristan Tzara e André Breton desentenderam-se. Como a guerra terminara já havia alguns anos, era hora de reconstruir o que fora demolido: a Europa e a arte. Tzara insistia em manter a linha original do movimento; Breton, rompendo com o Dadaísmo, abandonou o grupo para criar o movimento surrealista, uma das mais importantes correntes artísticas do século XX. O SURREALISMO: O COMBATE À RAZÃO. O movimento surrealista teve início na França, a partir da publicação do Manifesto do Surrealismo (1924), de André Breton. Diversos pintores aderiram ao movimento, interessados nas propostas de Breton, que, tendo sido psicanalista, procurava unir arte e Psicanálise. Duas foram as linhas de atuação do Surrealismo no seu início: As experiências criadoras automáticas e o imaginário extraído do sonho. Freud, na psicanálise, e Bergson, na filosofia, já haviam destacado a importância do mundo interior do ser humano, as zonas desconhecidas ou pouco conhecidas da mente humana. Encaravam o inconsciente, o subconsciente e a intuição como fontes inesgotáveis e superiores de conhecimento do homem , ponto , assim, em segundo plano o pensamento sensível, racional e consciente. O automatismo artístico consiste em extravasar sem nenhum controle da razão ou do pensamento os impulsos criadores do subconsciente. O artista, ao proceder assim, põe na tela ou no papel seus desejos interiores profundos, sem se importar com coerência, significados, adequação, etc. Na literatura, esse procedimento recebeu o nome de escrita automática. A outra linha de atuação surrealista, a onírica, busca a transposição do universo dos sonhos para o plano artístico. O sonho, na concepção de Freud, é a manifestação das zonas ocultas da mente, o inconsciente e o subconsciente. Os surrealistas pretendiam criar uma arte livre da razão, que correspondesse à transferência direta das imagens artísticas do inconsciente para a tela ou para o papel, uma arte produzida num estado de consciência em que o artista estaria “sonhando acordado”. Nessas duas linhas de pesquisa e trabalho são frequentes o Ilogismo, o devaneio, o sonho, a loucura, a hipnose, o humor negro, as imagens surpreendentes, o impacto do inusitado, a livre expressão dos impulsos sexuais, etc. O surrealismo teve repercussão em vários domínios da arte. Na literatura, destacam-se André Breton, Louis Aragon, Antonin Artaud, nas artes plásticas, Salvador Dalí, Max Ernst, Joan Miró, Jean Arp. No cinema, a principal expressão é o cineasta espanhol Luis Buñuel, que, juntamente com Salvador Dalí, criou o roteiro dos primeiros filmes surrealistas: O cão andaluz e Idade do ouro, de 1929. Buñel, que morreu em 1913, dirigiu vários filmes marcantes, entre eles A bela da tarde, O discreto charme da burguesia, O fantasma da liberdade, O anjo exterminador e Esse obscuro objeto do desejo. A rejeição do Surrealismo ao mundo burguês, racional, mercantil e moralista levaria alguns membros do grupo a ter ligações com o comunismo. Para alcançar o objetivo maior do movimento— amor, liberdade e poesia —, acreditavam ser necessária uma transformação radical da sociedade, por meio da qual se pudesse pôr fim ao modo de produção capitalista e à estrutura de classes sociais. A adesão desses membros, particularmente de André Breton, às ideias socialistas provocou no movimento uma cisão interna, que se agravou com a Segunda Guerra Mundial ( 1939-1945) e colaborou para a desarticulação do grupo. Embora o Surrealismo tenha oficialmente desaparecido com a Segunda Guerra, resquícios do movimento ou tentativas de recuperá-lo são vistos até os dias de hoje em diferentes linguagens artísticas, o que comprova sua força criadora e a contemporaneidade de suas propostas. No Brasil, vários escritores foram influenciados pelas ideias surrealistas, tais como Mário de Andrade, Oswald de Andrade, Murilo Mendes e Jorge de Lima. Algumas das características surrealistas, como o ilogismo, o absurdo, as imagens surpreendentes, a atmosfera onírica, podem ser observadas, por exemplo, no poema a seguir, de Murilo Mendes. PRÉ-HISTÓRIA. Mamãe vestida de rendas Tocava piano no caos Uma noite abriu as asas Cansada de tanto som, Equilibrou-se no azul, De tonta não mais olhou Para mim, para ninguém! Cai no álbum de retratos. (in: Antonio Candido e J.A. Castello. Presença da literatura brasileira. ed. São Paulo/Rio de Janeiro.Difel,!979. p. 185.) VANGUARDA BRASILEIRA O Modernismo brasileiro iniciou-se oficialmente em 1922, com a realização da Semana de Arte Moderna. Porém, desde a década de 1910 já vinhamocorrendo manifestações artísticas de um grupo que formava a vanguarda modernista brasileira, entre eles os escritores Mário de Andrade, Oswald de Andrade, Ronald de Carvalho, Manuel Bandeira, Juó Bananére (pseudônimo de Alexandre Marcondes Machado) e dos pintores Anita Malfatti e Di Cavalcanti. Entre os fatos que precederam a Semana de Arte Moderna destacam-se a criação da revista de artes O Pirralho, dirigida por Oswald de Andrade e Emílio de Menezes, em 1911; a exposição de obras do pintor russo Lasar Segall, em 1913; a participação do poeta brasileiro Ronald de Carvalho, em 1915, na fundação da revista Orpheu, que deu início ao Modernismo em Portugal; a publicação, 1917, de várias obras de poesia, entre elas. Há uma gota de sangue em cada poema, de Mário de Andrade (que usou o nome Mário Sobral), e A cinza das horas, de Manuel Bandeira. Contudo, o fato mais marcante desse período foi uma exposição da pintora paulistana Anita Malfatti, realizada em 1917, que provocou críticas por parte do escritor e crítico do jornal O Estado de S. Paulo Monteiro Lobato uma violenta crítica, intitulada “ Paranóia ou Mistificação?”. Veja um fragmento deste artigo: Há duas espécies de artistas: Uma composta dos que veem normalmente as coisas e em consequência disso fazem arte pura, guardando os eternos ritmos da vida, e adotados para a concretização das emoções estéticas, os processos clássicos dos grandes mestres. [...] A outra espécie é formada pelos que vêem, anormalmente a natureza, e interpretam-na à luz de teorias efêmeras, sob a sugestão estrábica de escola rebeldes, surgidas cá e lá como furúnculos da cultura excessiva.São produtos do cansaço e do sadismo de todos os períodos de decadência: são frutos de fins de estação, bichados ao nascedouro.[...] Estas considerações são provocadas pela exposição da Sra.Malfatti, onde se notam acentuadíssimas tendências para uma atitude estética forçada no sentido das extravagâncias de Picasso e companhia[...] ______________________________________________________ Anita Malfatti: o Salto no escuro. É provável que, em 1917, a própria Anita Malfatti não tivesse consciência do significado histórico que sua exposição ganharia. A verdade é que ela, então com 28 anos, assumiu sozinha a liderança da renovação das artes plásticas no Brasil. Infelizmente, talvez por não ter preparo ou maturidade suficiente para suportar as críticas de Lobato e de outros intelectuais, bem como as pressões familiares e insegurança financeira, a pintora aos poucos abandonou o espírito vanguardista e experimental de seus trabalhos iniciais e passo a fazer uma pintura bem-comportada, com características impressionantes e realistas. Assim, perdeu o papel de liderança que naturalmente conquistara. __________________________________________ A SEMANA DA ARTE MODERNA Não se sabe ao certo de quem partiu a ideia de realizar uma mostra de artes modernas em São Paulo. Contudo, há o registro de que, já em 1920, Oswald de Andrade prometera para 1922 — anos do centenário da Independência — uma ação dos artistas novos “ que fizesse valer o Centenário!”. O certo é que, em 1921, o grupo modernista que realizaria a Semana estava completamente organizado e amadurecido para o evento. No mesmo ano, chegou da Europa Graça Aranha, escritor consagrado e membro da Academia Brasileira de Letras. Entusiasmado com as vanguardas artísticas europeias, com as quais tivera contato, Graça Aranha apoiou o grupo paulista.Era o impulso que faltava.A Semana de Arte Moderna ocorreu entre 13 e 18 de fevereiro de 1922, no Teatro Municipal de São Paulo, com a participação de artistas do Rio de Janeiro e de São Paulo. Durante toda a semana o saguão do teatro esteve aberto ao público. Nele havia uma exposição de artes plásticas com obras de Anita Malfatti, Vicente do Rego Monteiro, Zina Aita, Di Cavalcanti, Harberg, Brecheret, Ferrignac e Antonio Moya. Nas noites dos dias 13,15 e 17 realizaram-se saraus com apresentação de conferências, leituras de poemas, danças e música. A primeira noite foi aberta com uma conferência de Graça Aranha, intitulada “ A emoção estética na arte moderna”, na qual o escritor pré-modernista, em linguagem tradicional e acadêmica, manifestou seu apoio à arte moderna. A conferência seguiu-se declamação de poemas, por Guilherme de Almeida e Ronald de Carvalho, e execução de músicas de Ernâni Braga e Villa-Lobos. Contrastanto com o comportamento da plateia na noite anterior, a segunda foi a mais importante e a mais tumultuada das três noites da Semana. Foi aberta por Menotti del Picchia, com uma conferência em que negava a filiação do grupo modernista ao futurismo de Marinetti, mas defendia a integração da poesia com os tempos modernas, a liberdade de criação e, ao mesmo tempo, a criação de uma arte genuinamente brasileira. Quando se iniciou a leitura de poemas e fragmentos de prosa, a plateia teve reações surpreendentes, ora vaiando, relinchando, latindo, gritando, ora aplaudindo. No intervalo entre uma parte e outra do programa, na escadaria do hall do teatro, Mário de Andrade fez, em meio a caçoadas e ofensas, uma pequena palestra sobre as artes plásticas ali expostas. Vinte anos depois, Mário de Andrade assim se referiu a esse episódio: “ Como pude fazer uma conferência sobre artes plásticas , nas escadarias do Teatro, cercado de anônimos que me caçoavam e ofendiam a valer?...” Na segunda parte do programa, um número de dança e o concerto de Guiomar Novaes acalmaram os ânimos da plateia... A IMPORTÂNCIA DA SEMANA A semana da Arte Moderna, vista isoladamente, não deveria merecer tanta atenção. Os jornais da época, por exemplo, não lhe dedicaram mais do que algumas poucas colunas e a opinião pública ficou distante. Seus participantes não tinham sequer um projeto artístico comum; unia-os apenas o sentimento de liberdade de criação e o desejo de romper com a cultura tradicional. Foi, portanto, um acontecimento bastante restrito aos meios artísticos, principalmente de São Paulo. Apesar disso, a Semana foi aos poucos ganhando uma enorme importância histórica. Primeiramente porque representou a confluência das várias tendências de renovação que, empenhadas em combater a arte tradicional, vinham ocorrendo na cultura brasileira antes de 1922, Mário de Andrade, em 1942, em uma conferência comemorativa dos vinte anos da semana de Arte Moderna, afirmou; “ O Modernismo, no Brasil, foi uma ruptura, foi um abandono de princípios e de técnicas consequentes, foi uma revolta contra o que era a Inteligência nacional”. Em segundo lugar porque conseguiu chamar a atenção dos meios artísticos de todo opaís e, ao mesmo tempo, aproximar artistas com ideias modernistas que até então se encontravam dispersos. A partir daí, em São Paulo e em várias outras cidades de todo o país, formaram-se grupos de artistas e intelectuais que fundaram revistas de arte e literatura, publicaram manifestos, enfim, levaram adiante e aprofundaram o debate acerca da arte moderna. Além disso, a Semana, ao aproximar artistas de diferentes áreas — escritores, arquitetos, músicos e bailarinos —, permitiu o intercâmbio de ideias e de técnicas, o que ampliaria os diversos ramos artísticos e os utilizaria em relação ao que se fazia na Europa. Os reflexos da Semana fizeram-se sentir em todo o decorrer dos anos 1920, atravessaram a década de 1930 e, de alguma forma, têm relação com a arte que se faz hoje.