Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
Centro Universitário Univel Av. Tito Muffato, 2317, Bairro Santa Cruz 85806-080, Cascavel (PR) Fone: (45) 3036-3653 | Fax: (45) 3036-3638 Centro de Pesquisa e Extensão (CPE) cpe@univel.br | cpeprojetos@univel.br 799 PSICOPATIA E IDENTIFICAÇÃO DE EXPRESSÕES FACIAIS EMOCIONAIS Caio Fernando de Carvalho1 Caroline de Cássia Francisco Buosi Velasco 2 Resumo: O presente artigo buscou investigar as capacidades dos psicopatas no reconhecimento de expressões faciais de emoções básicas (alegria, surpresa, medo, nojo, raiva e tristeza), buscando identificar se há alguma diferença entre eles e os indivíduos que não tem esse diagnóstico. Isso se torna relevante, pois entender como psicopatas reconhecem emoções expressas pela face pode se mostrar uma valiosa ferramenta complementar no diagnóstico desse transtorno, o que poderia tornar mais fácil o acesso a tratamento para psicopatas encarcerados. Para tanto, foi realizada uma pesquisa bibliográfica em diversas bases indexadoras para levantamento desses estudos. Concluiu-se que a maioria dos estudos revisados aponta um déficit dos psicopatas no reconhecimento do medo e tristeza, além de alguns artigos citarem outras emoções ou até mesmo a ausência de déficits em psicopatas comparados a não psicopatas. Foram levantadas hipóteses sobre a influência de algumas regiões cerebrais, como o córtex pré-frontal ventromedial, na presença de resultados tão distintos nos diferentes estudos. Esses contrastes também foram explicados através das diferenças metodológicas entre as pesquisas. Palavras-chave: Expressões Faciais de Emoções. Psicopatia. Funcionamento Cerebral. 1 Introdução A temática da universalidade das expressões faciais emocionais foi objeto de debate na comunidade científica durante muitas décadas. Um consenso sobre essa questão só foi atingido após a pesquisa de Ekman e Friesen (1971) com os membros da tribo “Fore” de Papua-Nova Guiné, a qual havia tido um contato ínfimo com a cultura ocidental, que conseguiram identificar emoções da mesma forma que pessoas de todo o mundo. A partir de então, diversos outros estudos foram realizados buscando compreender as capacidades de identificação das expressões faciais das seis emoções básicas (alegria, surpresa, medo, nojo, raiva e tristeza) em indivíduos com 1 Acadêmico do curso de Psicologia da UNIVEL – Centro Universitário UNIVEL. E-mail: caio_fernando.2002@outlook.com. 2 Professora do curso de Direito e de Psicologia da UNIVEL – Centro Universitário UNIVEL. Doutora em Psicologia Experimental PUC/SP e Mestre em Direito pela UFPR. Psicóloga e bacharel em Direito. Email: carolinebuosi@univel.br mailto:cpe@univel.br mailto:cpeprojetos@univel.br Centro Universitário Univel Av. Tito Muffato, 2317, Bairro Santa Cruz 85806-080, Cascavel (PR) Fone: (45) 3036-3653 | Fax: (45) 3036-3638 Centro de Pesquisa e Extensão (CPE) cpe@univel.br | cpeprojetos@univel.br 800 diferentes diagnósticos, como por exemplo, esquizofrenia (MANDAL, PANDEY e PRASAD, 1998), autismo (HARMS, MARTIN e WALLACE, 2010; CASTELLI, 2005) e diferentes lesões cerebrais (ADOLPHS et al., 1996). O mesmo foi feito com indivíduos psicopatas, dando origens a teorias divergentes sobre as capacidades dessa população no reconhecimento das emoções expressas pela face. De maneira semelhante, o presente artigo visou investigar se indivíduos psicopatas apresentam a mesma capacidade de um indivíduo sem esse diagnóstico na identificação de expressões faciais emocionais. Esta pesquisa demonstra sua importância cientifica quando se observa a dificuldade existente no diagnóstico do psicopata, de modo que uma maior compreensão da capacidade de processamento de emoções expressas facialmente pode se mostrar como um complemento para os métodos de diagnósticos já existentes. Essa melhoria no diagnóstico poderia aperfeiçoar o sistema prisional brasileiro, facilitando o acesso do psicopata ao tratamento e a uma possível reabilitação. A nível pessoal, o presente artigo é motivo de extrema satisfação para estes pesquisadores, uma vez que as expressões faciais de emoções foram um dos primeiros contatos de um destes com a psicologia. A metodologia do presente artigo consistiu em pesquisa bibliográfica em diversas bases indexadoras, bem como pesquisa exploratória, uma vez que esta é ainda uma pesquisa inicial sobre essa temática e que pode ser bastante aprofundada com outros estudos. 2 Desenvolvimento Os próximos subcapítulos trazem uma revisão bibliográfica a respeito das capacidades de psicopatas no reconhecimento de expressões faciais emocionais. Serão apresentadas algumas estruturas cerebrais responsáveis pelo processamento das informações emocionais expressas pela face, relacionando-as com as alterações cerebrais observadas em psicopatas. Em seguida as informações encontradas nessa etapa da pesquisa serão comparadas às principais teorias sobre esse aspecto da cognição social dos psicopatas. mailto:cpe@univel.br mailto:cpeprojetos@univel.br Centro Universitário Univel Av. Tito Muffato, 2317, Bairro Santa Cruz 85806-080, Cascavel (PR) Fone: (45) 3036-3653 | Fax: (45) 3036-3638 Centro de Pesquisa e Extensão (CPE) cpe@univel.br | cpeprojetos@univel.br 801 2.1 Estruturas cerebrais envolvidas no reconhecimento de expressões faciais de emoções Adolphs et al. (1996) realizaram testes com pacientes portadores de diferentes lesões em ambos os hemisférios cerebrais e concluíram que lesões no hemisfério esquerdo não causavam nenhum prejuízo no reconhecimento das expressões faciais emocionais. Em contrapartida, lesões diversas no hemisfério direito causavam déficits no reconhecimento de diferentes emoções. Constatou-se que duas regiões corticais estavam fortemente relacionadas a deficiências na identificação de expressões faciais de medo: o córtex parietal inferior direito, e a superfície medial do córtex infracalcarino direito (ADOLPHS et al., 1996). Outra região profundamente associada à detecção do medo é o lobo temporal anterior direito (ADOLPHS et al., 2000). A amígdala esquerda e os giros temporais inferior e médio apresentam respostas a expressões faciais de tristeza. Estímulos faciais de raiva geram respostas no córtex orbitofrontal direito. Já o córtex cingulado anterior e o polo temporal direito são ativados tanto por faces de raiva quanto de tristeza (BLAIR et al., 1999). Pacientes com lesões na amígdala também têm prejuízos no reconhecimento de expressões faciais de medo (ADOLPHS et al., 1994 apud BLAIR et al., 1999; CALDER et al., 1996 apud BLAIR et al., 1999; BROKS et al., 1998 apud BLAIR et al., 1999). Segundo Phillips et al. (1997 apud ADOLPHS, TRANEL e DAMASIO, 2003), regiões do córtex insular são ativadas quando uma expressão facial de nojo é identificada. Além disso, lesões na ínsula causam deficiências na experiência e na detecção do nojo, o que sugere que essa área esteja fortemente vinculada ao processamento de expressões faciais emocionais de nojo (CALDER et al., 2000 apud ADOLPHS, TRANEL e DAMASIO, 2003). Embora os gânglios da base não tenham apresentado ativação em pessoas sendo expostas a expressões faciais de nojo durante exames de imagem por ressonância magnética (PHILLIPS et al., 1997 apud BLAIR et al., 1999), pacientes acometidos pela doença de Huntington, que danifica os gânglios da base, também sofrem déficits no reconhecimento do nojo mailto:cpe@univel.br mailto:cpeprojetos@univel.br Centro Universitário Univel Av. Tito Muffato, 2317, Bairro Santa Cruz 85806-080, Cascavel (PR) Fone: (45) 3036-3653 | Fax: (45) 3036-3638 Centro de Pesquisa e Extensão (CPE) cpe@univel.br | cpeprojetos@univel.br 802 (SPRENGELMEYER et al., 1996 apud BLAIR et al., 1999; GRAY et al., 1997 apud BLAIR et al., 1999). Noestudo de Adolphs et al. (1996) nenhum dos pacientes com lesões cerebrais apresentou qualquer deficiência no reconhecimento de expressões faciais de alegria. No entanto, a região do sulco do cíngulo apresenta atividade durante o reconhecimento de expressões de alegria (KESLER-WEST et al., 2001 apud BATTY e TAYLOR, 2003; PHILLIPS et al., 1998 apud BATTY e TAYLOR, 2003). Uma última região relevante é o córtex pré-frontal ventromedial. Danos a essa estrutura estão relacionados a prejuízos no reconhecimento de expressões faciais de emoções (HORNAK et al., 2003 apud WOLF et al., 2014; HEBERLEIN et al., 2008 apud WOLF et al., 2014; TSUCHIDA e FELLOWS, 2012 apud WOLF et al., 2014). Constatou-se que pacientes com lesões nessa estrutura apresentam menor fixação nos olhos de pessoas durante o reconhecimento de expressões faciais de emoções em relação a indivíduos saudáveis ou com lesões em outras regiões do cérebro. Essa menor fixação nos olhos foi detectada com maior intensidade principalmente durante reconhecimento de expressões de medo. Resultados semelhantes foram obtidos durante o reconhecimento de faces neutras e de nojo (WOLF et al., 2014). Apesar de todas as estruturas acima citadas participarem do reconhecimento de expressões faciais emocionais, é importante ressaltar que elas não são as únicas envolvidas no processo. “Reconhecer uma emoção a partir de estímulos envolve múltiplos processos cognitivos, dependendo das demandas e restrições da tarefa utilizada para avaliar esse reconhecimento” (ADOLPHS et al., 2000, p. 2688, tradução nossa), de forma que as interações entre diferentes regiões do cérebro durante a identificação de expressões faciais de emoções são altamente complexas. 2.2 Alterações no funcionamento e nas estruturas cerebrais de psicopatas em relação a não psicopatas Primeiramente, se faz necessário diferenciar psicopatas “bem sucedidos” de psicopatas “mal sucedidos”: segundo Widom (1978 apud YANG et al., 2010), os mal sucedidos são aqueles que possuem um histórico de crimes, enquanto os bem sucedidos não apresentam nenhuma condenação criminal. mailto:cpe@univel.br mailto:cpeprojetos@univel.br Centro Universitário Univel Av. Tito Muffato, 2317, Bairro Santa Cruz 85806-080, Cascavel (PR) Fone: (45) 3036-3653 | Fax: (45) 3036-3638 Centro de Pesquisa e Extensão (CPE) cpe@univel.br | cpeprojetos@univel.br 803 De acordo com Raine et al. (2004 apud YANG et al., 2010), psicopatas mal sucedidos apresentam uma grande assimetria no hipocampo, o que não acontece com psicopatas bem sucedidos ou não psicopatas. O hipocampo é altamente conectado com o córtex pré-frontal e com a amígdala (LAAKSO et al., apud GLENN e RAINE, 2008), estruturas que, como citado anteriormente, são intimamente relacionadas ao reconhecimento de expressões faciais emocionais. Psicopatas mal sucedidos apresentam uma diminuição na espessura e no volume de substância cinzenta nos córtices orbitofrontal e frontal médio em relação a indivíduos em esse diagnóstico. Eles também possuem uma diminuição bilateral no volume da amígdala em relação a não psicopatas. Nenhuma deficiência no córtex pré- frontal ou na amígdala é apresentada por psicopatas bem sucedidos em relação a indivíduos normais (YANG et al., 2010). Ademais, o córtex orbitofrontal apresenta uma ativação menor em psicopatas durante condicionamento do medo (VIET et al., 2002 apud GLENN e RAINE, 2008; BIRBAUMER et al., 2005 apud GLENN e RAINE, 2008). A amígdala também tem uma menor ativação diante de estímulos emocionais em detentos psicopatas do que em indivíduos normais (KIEHL et al., 2001 apud GLENN e RAINE, 2008). As disfunções apresentadas na amígdala podem ser responsáveis por uma deficiência no reconhecimento de expressões faciais de tristeza e medo, enquanto as anomalias no córtex orbitofrontal podem causar prejuízos na identificação de expressões de raiva. No entanto, alguns estudos indicam que, durante a realização de tarefas emocionais, áreas cognitivas superiores do cérebro de psicopatas, como o córtex pré- frontal dorsolateral, apresentam um aumento na ativação (KIEHL et al., 2001 apud GLENN e RAINE, 2008; RILLING et al., 2007 apud GLENN e RAINE, 2008; GORDON, 2004 apud GLENN e RAINE, 2008; INTRATOR et al., 1997 apud GLENN e RAINE, 2008), o que sugere a possibilidade de que psicopatas usem mais recursos cognitivos no processamento de informações emocionais do que outros indivíduos (KIEHL et al., 2001 apud GLENN e RAINE, 2008). Isso significa que o processamento apropriado desse tipo de informação na psicopatia necessita de um componente racional, não dependendo somente de processos cerebrais involuntários. mailto:cpe@univel.br mailto:cpeprojetos@univel.br Centro Universitário Univel Av. Tito Muffato, 2317, Bairro Santa Cruz 85806-080, Cascavel (PR) Fone: (45) 3036-3653 | Fax: (45) 3036-3638 Centro de Pesquisa e Extensão (CPE) cpe@univel.br | cpeprojetos@univel.br 804 Em um estudo com detentos psicopatas e não psicopatas, Motzkin et al. (2011) concluíram que, quanto maior o grau de psicopatia de um sujeito, menor a integridade estrutural de seu fascículo uncinado direito, uma conexão de substância branca existente entre o córtex pré-frontal ventromedial e o lobo temporal anterior. Além disso, foi observada uma menor conectividade entre o córtex pré-frontal ventromedial e a amígdala. Como tanto a amígdala quanto o lobo temporal anterior direito apresentam ativação durante o reconhecimento de expressões faciais de medo, além de o último também atuar na detecção de raiva e tristeza (ADOLPHS et al., 2000; BLAIR et al., 1999), é possível inferir que a psicopatia esteja relacionada a déficits no reconhecimento dessas emoções, devido à fragilidade da conexão entre essas regiões. É importante destacar que as diferenças nos cérebros de psicopatas e indivíduos sem esse diagnóstico não se limitam às estruturas apresentadas acima. Está se tornando cada vez mais claro que o entendimento da neurobiologia da psicopatia vai muito além de identificar regiões do cérebro que possam estar envolvidas. Genética, neurotransmissores e hormônios impactam o funcionamento das estruturas cerebrais e a conectividade entre elas. Em pesquisas futuras será importante identificar como esses sistemas trabalham juntos para produzir a compilação única de traços e comportamentos característicos da psicopatia (GLENN e RAINE, 2008, n.p., tradução nossa). Dessa forma, possíveis diferenças no reconhecimento de expressões faciais emocionais na psicopatia podem estar relacionadas a fatores que não se limitam a diferenças em estruturas cerebrais. 2.3 O reconhecimento de expressões faciais emocionais por psicopatas: estudos divergentes e diferenças metodológicas Os resultados encontrados em estudos realizados com psicopatas são bastante divergentes. Dolan e Fullam (2006) concluíram, após comparar as performances de presidiários não psicopatas e psicopatas no reconhecimento de expressões faciais das seis emoções básicas, que os últimos apresentam um déficit na detecção de tristeza. mailto:cpe@univel.br mailto:cpeprojetos@univel.br Centro Universitário Univel Av. Tito Muffato, 2317, Bairro Santa Cruz 85806-080, Cascavel (PR) Fone: (45) 3036-3653 | Fax: (45) 3036-3638 Centro de Pesquisa e Extensão (CPE) cpe@univel.br | cpeprojetos@univel.br 805 Blair e Coles (2000, apud VASCONCELLOS et al., 2014) e Blair et al. (2001) encontraram deficiências no reconhecimento de expressões de tristeza e medo em crianças com tendências psicopáticas. Na pesquisa de Blair et al. (2001), os sujeitos eram expostos à uma espécie de animação composta de 21 fotografias representando uma mesma expressão facial em diferentes intensidades, de forma que uma fotografia era substituída por outra mais intensa a cada três segundos. A primeira fotografiaexibia uma expressão neutra, enquanto a última exibia a emoção com 100% de intensidade. Os sujeitos eram instruídos a informar a emoção apresentada assim que a reconhecessem, sem, no entanto, tentarem adivinhar. A pesquisa Blair et al. (2004 apud GLASS e NEWMAN, 2006), que se valeu de uma metodologia semelhante, recebeu algumas críticas. Pelo fato de a tarefa exigir que os participantes criassem hipóteses e então as modificassem enquanto a face continuava a se transformar, o desempenho pode ter dependido de uma habilidade de avaliar e modificar hipóteses referentes a expressões afetivas particulares (GLASS e NEWMAN, 2006, p. 819, tradução nossa). Tentando superar esse problema metodológico, Glass e Newman (2006) desenvolveram uma tarefa de duas etapas. Na etapa de identificação, o participante deveria dizer, dentre um conjunto de quatro faces, a emoção representada por uma face designada por um número. Já na etapa de localização, uma palavra relacionada a uma emoção era exibida antes do conjunto de quatro faces, e o indivíduo deveria dizer qual face era relacionada à palavra dada. Após submeterem presidiários psicopatas a esses testes, Glass e Newman (2006) concluíram que nenhum prejuízo no reconhecimento de expressões faciais emocionais era encontrado em psicopatas em relação ao grupo de controle. Kosson et al. (2002) também fizeram experimentos com psicopatas encarcerados. Os sujeitos foram expostos a imagens de homens e mulheres apresentando expressões faciais de emoções. As imagens eram exibidas por um segundo. Após isso, os participantes tinham 2,5 segundos para determinar a emoção exibida, apertando teclas de um teclado relacionadas à emoção detectada. Cada indivíduo foi exposto a 30 imagens, cinco de cada emoção básica. mailto:cpe@univel.br mailto:cpeprojetos@univel.br Centro Universitário Univel Av. Tito Muffato, 2317, Bairro Santa Cruz 85806-080, Cascavel (PR) Fone: (45) 3036-3653 | Fax: (45) 3036-3638 Centro de Pesquisa e Extensão (CPE) cpe@univel.br | cpeprojetos@univel.br 806 Foram reconhecidos prejuízos na percepção do nojo por psicopatas em relação ao grupo de controle. Além disso, constatou-se que psicopatas haviam se saído melhor do que não psicopatas no reconhecimento da raiva, principalmente quando dispuseram de alguma forma do hemisfério esquerdo do cérebro para realizar a tarefa, como responder com a mão direita, por exemplo. Segundo Kosson et al. (2002), esse resultado indica que a classificação de raiva dos psicopatas utiliza mais recursos do hemisfério esquerdo do que em não psicopatas. Essa conclusão se alinha com estudos que sugerem uma maior ativação do hemisfério esquerdo relacionada à raiva (HARMON-JONES e ALLEN, 1998 apud KOSSON et al., 2002; HARMON-JONES e SIGELMAN, 2001 apud KOSSON et al., 2002). Em uma revisão de literatura feita por Vasconcellos et al. (2014), nove dos 17 artigos revisados, incluindo Blair et al. (2001), concluíram que traços antissociais estavam relacionados a deficiências no reconhecimento de medo. Ainda, cinco desses artigos, incluindo Blair et al. (2001), descreveram prejuízos na percepção de tristeza; três apontaram um desempenho pior no reconhecimento geral das emoções, sendo que em um deles não foi encontrada nenhuma diferença entre detentos psicopatas e não psicopatas; dois relataram déficits na detecção de nojo, incluindo Kosson et al. (2002); e um associou traços antissociais à atribuição de raiva a faces neutras. Por fim, um não encontrou diferenças nos desempenhos de psicopatas e não psicopatas (GLASS e NEWMAN, 2006). Vasconcellos et al. (2014) apontam que resultados tão divergentes podem derivar dos métodos bastante distintos utilizados por cada grupo de pesquisadores. Por exemplo, o tempo de exposição aos estímulos variou em boa parte dos estudos, sendo que, de acordo com Schyns, Petro e Smith (2009), um tempo de 200 ms é necessário e suficiente para a identificação de um estímulo de expressão facial (apud VASCONCELLOS et al., 2014). 3 Conclusão Embora a universalidade das expressões faciais emocionais seja um consenso há relativamente pouco tempo, existe uma literatura vasta sobre o tema. Contudo, mailto:cpe@univel.br mailto:cpeprojetos@univel.br Centro Universitário Univel Av. Tito Muffato, 2317, Bairro Santa Cruz 85806-080, Cascavel (PR) Fone: (45) 3036-3653 | Fax: (45) 3036-3638 Centro de Pesquisa e Extensão (CPE) cpe@univel.br | cpeprojetos@univel.br 807 segundo Dolan e Fullam (2006), no que tange às capacidades de psicopatas no reconhecimento dessas expressões, apenas alguns grupos de pesquisadores publicam a maioria dos estudos sobre o assunto, o que pode acarretar um viés inconsciente nos resultados. É possível destacar três problemas relacionados aos métodos utilizados na maioria das pesquisas: o tempo de exposição aos estímulos não é padronizado, sendo que um tempo de 200 ms seria ideal (SCHYNS, PETRO e SMITH, 2009 apud VASCONCELLOS et al., 2014); a grande maioria dos estudos conta apenas com psicopatas mal sucedidos, o que pode influenciar na precisão dos resultados, uma vez que psicopatas bem sucedidos e mal sucedidos apresentam diferenças cerebrais entre si; e poucos estudos contam com mulheres psicopatas em suas amostras, o que pode afetar as conclusões, uma vez que mulheres parecem ter uma maior precisão no reconhecimento de expressões faciais de emoções do que homens (EKMAN, 2006 apud VASCONCELLOS et al., 2014). Apesar das ressalvas feitas acima, os estudos atuais indicam que boa parte dos materiais analisados demonstra psicopatas possuem um déficit no reconhecimento de medo e tristeza. Essas conclusões coincidem com as diferenças cerebrais encontradas em psicopatas em relação a indivíduos normais. Contudo, os estudos de Glass e Newman (2006) e Kosson et al. (2002) trazem resultados inesperados. O primeiro não apresenta diferenças no processamento de expressões faciais emocionais entre psicopatas e indivíduos normais, enquanto o segundo aponta déficits na detecção de nojo. Esses achados podem decorrer da menor conectividade entre o córtex pré-frontal ventromedial, que articula a atenção durante a tarefa do reconhecimento das expressões faciais, e outras regiões cerebrais responsáveis pela detecção de emoções específicas. Por fim, cabe destacar que é primordial que novas pesquisas acerca desse aspecto da cognição social dos psicopatas sejam realizadas, visto que um consenso sobre esse assunto ainda não foi alcançado. Fatores como maiores amostras de indivíduos e comparação entre psicopatas bem sucedidos e mal sucedidos são imprescindíveis para estudos futuros, bem com um melhor entendimento das mailto:cpe@univel.br mailto:cpeprojetos@univel.br Centro Universitário Univel Av. Tito Muffato, 2317, Bairro Santa Cruz 85806-080, Cascavel (PR) Fone: (45) 3036-3653 | Fax: (45) 3036-3638 Centro de Pesquisa e Extensão (CPE) cpe@univel.br | cpeprojetos@univel.br 808 estruturas cerebrais relacionadas ao processamento das expressões faciais de emoções. REFERÊNCIAS ADOLPHS, R. et al. Cortical Systems for the Recognition of Emotion in Facial Expressions. Journal of Neuroscience, v. 16, n. 23, p. 7678-7687, 1 de dezembro de 1996. Disponível em: <http://www.jneurosci.org/content/16/23/7678>. Acesso em 10 mai. 2019. ADOLPHS, R et al. A Role for Somatosensory Cortices in the Visual Recognition of Emotion as Revealed by Three-Dimensional Lesion Mapping. Journal of Neuroscience, v. 20, n. 7, p. 2683-2690, 1 de abril de 2002. Disponível em: <http://www.jneurosci.org/content/20/7/2683>. Acesso em 21 jun. 2019. ADOLPHS, R; TRANEL, D.; DAMASIO, A. R. Dissociable neural systems for recognizing emotions. Brain and Cognition, v. 52, n. 1, p. 61-69, junho de 2003. Disponível em <http://citeseerx.ist.psu.edu/viewdoc/download?doi=10.1.1.486.5685&rep=rep1&type=pdf>.Acesso em 21 jun. 2019. BATTY, M.; TAYLOR, M. J. Early processing of the six basic facial emotional expressions. Cognitive Brain Research, v. 17, n. 3, p. 613-620, outubro de 2003. Disponível em <https://www.ece.uvic.ca/~bctill/papers/facerec/Batty_Taylor_2003.pdf>. Acesso em 22 jun. 2019. BLAIR, R. J. R. et al. Dissociable neural responses to facial expressions of sadness and anger. Brain, v. 122, n. 5, p. 883-893, maio de 1999. Disponível em <https://www.semanticscholar.org/paper/Dissociable-neural-responses-to-facial-expressions- Blair-Morris/548afed945cfda32052eff51db9a73380bc2c8f7>. Acesso em 21 jun. 2019. BLAIR, R. J. R. et al. A Selective Impairment in the Processing of Sad and Fearful Expressions in Children With Psychopathic Tendencies. Journal of Abnormal Child Psychology, v. 19, n. 6, p. 491-498, dezembro de 2001. Disponível em <https://www.researchgate.net/profile/Robert_Blair2/publication/225262152_A_Selective_Im pairment_in_the_Processing_of_Sad_and_Fearful_Expressions_in_Children_with_Psychopa thic_Tendencies/links/0deec5183e5953dbec000000.pdf>. Acesso em 27 mai. 2019. CASTELLI, F. Understanding emotions from standardized facial expressions in autismo and normal development. Autism, v. 9, n. 4, p. 428-449, outubro de 2005. Disponível em <https://www.researchgate.net/publication/7607858_Understanding_emotions_from_standar dized_facial_expressions_in_autism_and_normal_development>. Acesso em 13 set. 2019. DOLAN, M.; FULLAM, R. Face affect recognition deficits in personality-disordered offenders: association with psychopathy. Psychological Medicine, v. 36, n. 11, p. 1563-1569, novembro de 2006. Disponível em <https://www.researchgate.net/profile/Rachael_Fullam/publication/6894557_Face_affect_rec ognition_deficits_in_personality- disordered_offenders_Association_with_psychopathy/links/5684827608ae051f9af048a9/Fac mailto:cpe@univel.br mailto:cpeprojetos@univel.br http://www.jneurosci.org/content/16/23/7678 http://citeseerx.ist.psu.edu/viewdoc/download?doi=10.1.1.486.5685&rep=rep1&type=pdf Centro Universitário Univel Av. Tito Muffato, 2317, Bairro Santa Cruz 85806-080, Cascavel (PR) Fone: (45) 3036-3653 | Fax: (45) 3036-3638 Centro de Pesquisa e Extensão (CPE) cpe@univel.br | cpeprojetos@univel.br 809 e-affect-recognition-deficits-in-personality-disordered-offenders-Association-with- psychopathy.pdf>. Acesso em 27 mai. 2019. EKMAN, P.; FRIESEN, W. V. Constants across cultures in the face and emotion. Journal of Personality and Social Psychology, v. 17, n. 2, p. 124-129, 1971. Disponível em <https://pdfs.semanticscholar.org/a368/8ebcce02bbafa87e3f644841d7d78172fc08.pdf>. Acesso em 6 abr. 2019. GLASS, S. J.; NEWMAN, J. P. Recognition of Facial Affect in Psychopathic Offenders. Journal of Abnormal Psychology, v. 115, n. 4, p. 815-820, novembro de 2006. Disponível em <https://pdfs.semanticscholar.org/4f33/55b3ae32921ee17f552e2164f571fdcf59cd.pdf>. Acesso em 27 mai. 2019. GLENN, A. L.; RAINE, A. The neurobiology of psychopathy. Psychiatric Clinics of North America, v. 31, n. 3, p. 463-475, setembro de 2008. Disponível em <http://aglenn.people.ua.edu/uploads/1/4/1/8/14182546/glenn_pcna_2008.pdf>. Acesso em 23 jun. 2019. HARMS, M. B.; MARTIN, A.; WALLACE, G. L. Facial Emotion Recognition in Autism Spectrum Disorders: A Review of Behavioral and Neuroimaging Studies. Neuropsychology Review, v. 20, n. 3, p. 290-322, setembro de 2010. Disponível em <https://www.researchgate.net/publication/46108941_Facial_Emotion_Recognition_in_Autis m_Spectrum_Disorders_A_Review_of_Behavioral_and_Neuroimaging_Studies>. Acesso em 13 set. 2019. KOSSON, D. S. et al. Facial Affect Recognition in Criminal Psychopaths. Emotion, v. 2, n. 4, p. 398-411, dezembro de 2002. Disponível em <https://www.researchgate.net/publication/10630050_Facial_Affect_Recognition_in_Criminal _Psychopaths>. Acesso em 27 mai. 2019. MANDAL, M. K.; PANDEY, R.; PRASAD, A. B. Facial Expressions of Emotions and Schizophrenia: A Review. Schizophrenia Bulletin, v. 24, n. 3, p. 399-412, 1998. Disponível em <https://academic.oup.com/schizophreniabulletin/article/24/3/399/1839786>. Acesso em 13 set. 2019. MOTZKIN, J. C. et al. Reduced Prefrontal Connectivity in Psychopathy. Journal of Neuroscience, v. 31, n. 48, p. 17348-17357, novembro de 2011. Disponível em < http://www.jneurosci.org/content/jneuro/31/48/17348.full.pdf>. Acesso em 23 jun. 2019. VASCONCELLOS, S. J. L. et al. Psicopatia e Reconhecimento de Expressões Faciais de Emoções: Uma Revisão Sistemática. Revista Psicologia: Teoria e Pesquisa. Brasília, Abr- Jun 2014, v. 30, n. 2, p. 125-134. Disponível em: <http://periodicos.unb.br/index.php/revistaptp/article/view/17637/17013>. Acesso em: 27 abr. 2019. WOLF, R. C. et al. Ventromedial prefrontal cortex mediates visual attention during facial emotion recognition. Brain, v. 137, n. 6, p. 1772-1780, junho de 2014. Disponível em <https://academic.oup.com/brain/article/137/6/1772/2847736>. Acesso em 23 jun. 2019. mailto:cpe@univel.br mailto:cpeprojetos@univel.br Centro Universitário Univel Av. Tito Muffato, 2317, Bairro Santa Cruz 85806-080, Cascavel (PR) Fone: (45) 3036-3653 | Fax: (45) 3036-3638 Centro de Pesquisa e Extensão (CPE) cpe@univel.br | cpeprojetos@univel.br 810 YANG, Y. et al. Morphological Alterations in the Prefrontal Cortex and the Amygdala in Unsuccessful Psychopaths. Journal of Abnormal Psychology, v. 119, n. 3, p. 546-554, agosto de 2010. Disponível em <https://www.semanticscholar.org/paper/Morphological- alterations-in-the-prefrontal-cortex-Yang- Raine/a602c1df5741cfbe628060a2e6e03850e1271204>. Acesso em 23 jun. 2019. mailto:cpe@univel.br mailto:cpeprojetos@univel.br https://www.semanticscholar.org/paper/Morphological-alterations-in-the-prefrontal-cortex-Yang-Raine/a602c1df5741cfbe628060a2e6e03850e1271204 https://www.semanticscholar.org/paper/Morphological-alterations-in-the-prefrontal-cortex-Yang-Raine/a602c1df5741cfbe628060a2e6e03850e1271204 https://www.semanticscholar.org/paper/Morphological-alterations-in-the-prefrontal-cortex-Yang-Raine/a602c1df5741cfbe628060a2e6e03850e1271204
Compartilhar