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Enterobactérias APRESENTAÇÃO Em nosso corpo há mais células bacterianas que células próprias nossas! Essa afirmação tem a cada dia ganhado maior interesse de estudos, pois as bactérias que habitam nosso corpo, ou nossa microbiota, estão relacionadas a diversos eventos fisiológicos e patológicos. Um dos principais grupos de bactérias conhecido e presente em nossa microbiota são as enterobactérias. Nesta Unidade de Aprendizagem você irá conhecer as características deste grupo, os principais gêneros e espécies, assim como a relação com doenças e sua identificação laboratorial. Bons estudos. Ao final desta Unidade de Aprendizagem, você deve apresentar os seguintes aprendizados: Reconhecer os principais gêneros e espécies de enterobactérias.• Listar os processos infecciosos e os locais anatômicos de isolamento das enterobactérias.• Avaliar as principais metodologias de identificação laboratorial das enterobactérias.• DESAFIO As infecções do sistema urinário são um dos processos infecciosos frequentes na população, variando sua incidência de acordo com fatores, como gênero, hospitalização e idade. As causas desses processos infecciosos são principalmente bacterianas, sendo que os principais grupos de patógenos são os cocos gram-positivos e os bacilos gram-negativos. Desse modo, responda aos seguintes questionamentos: a) Qual a sua suspeita de bactéria isolada na urina? b) Como você pode confirmar a espécie bacteriana suspeita? c) Qual a relação dessa bactéria com infecções urinárias? INFOGRÁFICO A primeira etapa para identificação de uma bactéria da família Enterobacteriaceae é verificar sua morfologia ao Gram, ausência de citocromo oxidase e capacidade de fermentação de glicose. No infográfico você visualizará um esquema de identificação de uma bactéria dessa família. CONTEÚDO DO LIVRO As Enterobacteriaceae constituem um grande grupo heterogêneo de bacilos gram-negativos cujo habitat natural é o trato intestinal de seres humanos e animais, sendo que alguns micro- organismos entéricos fazem parte da microbiota normal e acidentalmente provocam doenças, enquanto outros, são regularmente patogênicos para os seres humanos. Acompanhe o trecho selecionado da obra Microbiologia médica de Jawetz, Melnick e Adelberg aspectos relevantes da microbiologia médica, particularmente às áreas de infecções clínicas. Boa Leitura. Tradução Cláudio M. Rocha-de-Souza Pesquisador visitante do Instituto de Tecnologia de Imunobiológicos Bio-Manguinhos — FIOCRUZ. Doutor em Microbiologia Médica pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Revisão técnica desta edição José Procópio Moreno Senna Pesquisador da vice-diretoria de desenvolvimento tecnológico do Instituto de Tecnologia de Imunobiológicos Bio-Manguinhos — FIOCRUZ. Professor da disciplina de Bacteriologia do Mestrado Profissional em Tecnologia de Imunobiológicos Bio-Manguinhos — FIOCRUZ. Doutor em Biologia Celular e Molecular pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). M626 Microbiologia médica de Jawetz, Melnick e Adelberg [recurso eletrônico] / Geo. F. Brooks ... [et al.] ; [tradução: Cláudio M. Rocha-de-Souza ; revisão técnica: José Procópio Moreno Senna]. – 26. ed. – Dados eletrônicos. – Porto Alegre : AMGH, 2014. Editado também como livro impresso em 2014. ISBN 978-85-8055-335-2 1. Microbiologia. I. Brooks, Geo. F. CDU 579 Catalogação na publicação: Ana Paula M. Magnus – CRB10/2052 oxidá-la, frequentemente com produção de gás; são catalase- positivos, oxidase-negativos e reduzem o nitrato a nitrito; e apresentam um conteúdo de 39 a 59% de DNA G + C. No Quadro 15.1, são fornecidos exemplos de testes bioquímicos utilizados para diferenciar as espécies de Enterobacteriaceae. Existem muitos outros testes além dos arrolados. Nos EUA, kits disponíveis comercialmente ou sistemas automatizados são amplamente empregados com essa finalidade. A imple- mentação da espectrometria de massa pela técnica de ionização por dessorção a laser assistida por matriz, seguida de análise por tempo de voo, em sequência (MALDI-TOF MS) para identificação de isolados clínicos poderá brevemente substi- tuir os painéis bioquímicos atualmente utilizados na maioria dos laboratórios de microbiologia. Essa nova tecnologia parece funcionar bem na identificação da maioria das espécies de En- terobacteriaceae encontradas nos diferentes espécimes clínicos (exceto espécies de Shigela), uma vez que essa tecnologia não diferencia Shigela de E. coli. Os principais grupos de Enterobacteriaceae são descritos e discutidos de modo sucinto nos parágrafos adiante. As carac- terísticas específicas das salmonelas, shigelas e outros bacilos gram-negativos entéricos de importância clínica, bem como as doenças que eles causam são discutidas neste capítulo. Morfologia e identifi cação A. Microrganismos típicos As Enterobacteriaceae são bacilos gram-negativos curtos (Fig. 15.1A). Sua morfologia típica é observada durante o cresci- mento em meios sólidos in vitro, mas é altamente variável em amostras clínicas. As cápsulas são grandes e regulares nas es- pécies de Klebsiella, menores nas de Enterobacter e incomuns nas outras espécies. B. Cultura A E. coli e a maioria das outras bactérias entéricas formam co- lônias lisas, circulares e convexas com margens distintas. As colônias de Enterobacter são semelhantes, porém um pouco mais mucoides. As colônias de Klebsiella são grandes e mui- to mucoides tendendo a coalescer com incubação prolongada. As salmonelas e shigelas produzem colônias semelhantes às de E. coli, mas não fermentam a lactose. Algumas cepas de E. coli causam hemólise em ágar-sangue. 15Bacilos entéricos gram-negativos (Enterobacteriaceae) C A P Í T U L O As Enterobacteriaceae constituem um grande grupo hetero- gêneo de bacilos gram-negativos cujo habitat natural é o tra- to intestinal de seres humanos e animais. A família abrange muitos gêneros (Escherichia, Shigella, Salmonella, Enterobac ter, Klebsiella, Serratia, Proteus e outros). Alguns microrga- nismos entéricos, tais como a Escherichia coli, fazem parte da microbiota normal e acidentalmente provocam doen ças, enquanto outros, como as salmonelas e shigelas, são regular- mente patogênicos para os seres humanos. As Enterobacteria- ceae são anaeróbios facultativos ou aeróbios, que fermentam ampla variedade de carboidratos, têm uma estrutura antigê- nica complexa e produzem diversas toxinas e outros fatores de virulência. Os termos Enterobacteriaceae, bacilos gram- negativos entéricos e bactérias entéricas são utilizados neste capítulo, mas essas bactérias também podem ser denomina- das coliformes. classificação As Enterobacteriaceae constituem o grupo mais comum de bacilos gram-negativos cultivados em laboratório clínico, e estão entre as bactérias mais comuns que causam doença, jun- tamente com os estafilococos e os estreptococos. A taxonomia das Enterobacteriaceae é complexa e está sofrendo rápidas mu- danças desde a introdução das técnicas que medem a distância evolutiva, como a hibridização e o sequenciamento de ácidos nucleicos. De acordo com a National Library of Medicine’s Internet Taxonomy database, (disponível em http://www. ncbi.nlm.nih.gov/Taxonomy/Browser/wwwtax.cgi) 51 gêneros foram definidos; porém, as Enterobacteriaceae de importância clínica compreendem 20 a 25 espécies, enquanto outras espé- cies são raramente encontradas. Neste capítulo, as complexi- dades taxonômicas serão minimizadas, e serão utilizados em geral os termos comumente empregados na literatura médica. Uma abordagem abrangente da identificação das Enterobacte- riaceae é apresentada nos Capítulos 35, 36 e 37 de Versalovic et al., 2011. Os membros da família Enterobacteriaceae apresentam as seguintes características: são bacilos gram-negativos, móveis com flagelos peritríquios ou imóveis; crescem em meios de peptona ou extrato de carne sem acréscimo de cloreto de só- dio ou outros suplementos; crescemadequadamente em ágar de MacConkey; apresentam crescimento aeróbio e anaeróbio (são anaeróbios facultativos); fermentam a glicose em vez de 230 SEção III Bacteriologia Q U A D Ro 1 5. 1 Ex em pl os d e re aç õe s bi oq uí m ic as d e al gu ns b ac ilo s en té ri co s gr am -n eg at iv os a Produção de indol Vermelho de metila Voges-Proskauer Citrato de Simmon Sulfito de hidrogênio Hidrólise da ureia Fenilalanina desaminase Lisina descarboxilase Arginina di-hidrolase ornitina descarboxilase Motilidade (36ºC) Hidrólise da gelatina (22ºC) d-Glicose, ácido d-Glicose, gás Fermentação da lactose Fermentação da sacarose Fermentação do d-manitol Fermentação do dulcitol Fermentação do adonitol Fermentação do d-sorbitol Fermentação da I-arabinose Fermentação da rafinose Fermentação da I-ramnose Fermentação da d-xilose Fermentação da melibiose Ci tr ob ac te r f re un di i 5 10 0 0 95 80 70 0 0 65 20 95 0 10 0 95 50 30 99 55 0 98 10 0 30 99 9 99 50 En te ro ba ct er a er og en es 0 5 98 95 0 2 0 98 0 98 97 0 10 0 10 0 95 10 0 10 0 5 98 10 0 10 0 96 99 10 0 99 En te ro ba ct er c lo ac ae 0 5 10 0 10 0 0 65 0 0 97 96 95 0 10 0 10 0 93 97 10 0 15 25 95 10 0 92 10 0 10 0 90 Es ch er ic hi a co li 98 99 0 1 1 1 0 90 17 65 95 0 10 0 95 95 50 98 60 5 94 99 50 80 95 75 Kl eb si el la p ne um on ia e 0 10 98 98 0 95 0 98 0 0 0 0 10 0 97 98 99 99 30 90 99 99 99 99 99 99 Kl eb si el la o xy to ca 99 20 95 95 0 90 1 99 0 0 0 0 10 0 97 10 10 0 99 55 99 99 98 10 0 10 0 10 0 99 M or ga ne lla m or ga ni i 98 97 0 0 5 98 95 0 0 98 95 0 10 0 90 1 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 Pr ot eu s m ira bi lis 2 97 50 65 98 98 98 0 0 99 95 90 10 0 96 2 15 0 0 0 0 0 1 1 98 0 Sa lm on el la c ho le ra es ui s 0 10 0 0 25 50 0 0 95 55 10 0 95 0 10 0 95 0 0 98 5 0 90 0 1 10 0 98 45 Sa lm on el la ty ph i 0 10 0 0 0 97 0 0 98 3 0 97 0 10 0 0 1 0 10 0 0 0 99 2 0 98 82 10 0 Sa lm on el la , m ai or ia d os so ro tip os 1 10 0 0 95 95 1 0 98 70 97 95 0 10 0 96 1 1 10 0 96 0 95 99 2 95 97 95 Se rr at ia m ar ce sc en s 1 20 98 98 0 15 0 99 0 99 97 90 10 0 55 2 99 99 0 40 99 0 2 0 7 0 Sh ig el la so nn ei 0 10 0 0 0 0 0 0 0 2 98 0 0 10 0 0 2 1 99 0 0 2 95 3 75 2 25 Sh ig el la d ys en te ria e, fl ex ne ri, bo yd ii 50 10 0 0 0 0 0 0 0 5 1 0 0 10 0 2 0 0 99 2 0 30 60 50 5 2 50 a Re pr od uz id o, c om a ut or iz aç ão , d e Fa rm er JJ 3 rd , D av is B R, H ic km an -B re nn er F W , e t a l: Bi oc he m ic al id en tif ic at io n of n ew s pe ci es a nd b io gr ou ps o f E nt er ob ac te ria ce ae is ol at ed fr om c lin ic al s pe ci m en s. J Cl in M ic ro bi ol 1 98 5, 21 :4 6. CAPÍTULo 15 Bacilos entéricos gram-negativos (Enterobacteriaceae) 231 fiGura 15.1 A. Coloração de Gram de Escherichia coli. Aumento original de 1.000 vezes. (Cortesia de H. Reyes.) B. Estrutura antigênica de Ente- robacteriaceae. C. Características de crescimento Os padrões de fermentação dos carboidratos e a atividade dos aminoácidos descarboxilases e outras enzimas são utilizados na diferenciação bioquímica (Quadro 15.1). Alguns testes (p. ex., a produção de indol a partir do triptofano) são comumente utiliza- dos em sistemas de identificação rápida, enquanto outros, como a reação de Voges-Proskauer (produção de acetilmetilcarbinol a partir da dextrose), são utilizados com menor frequência. A cul- tura em meios “diferenciais” que contenham corantes especiais e carboidratos (p. ex., eosina-azul de metileno [EMB], meio de MacConkey ou desoxicolato) distingue as colônias fermentado- ras de lactose (coloridas) daquelas que não fermentam a lactose (não pigmentadas), e podem permitir uma rápida identificação presuntiva das bactérias entéricas (Quadro 15.2). Muitos meios de cultura complexos foram elaborados para ajudar na identificação das bactérias entéricas. Um deles é o ágar com açúcar e ferro tríplice (TSI), frequentemente utiliza- do para ajudar a diferenciar salmonelas e Shigelas de outros bacilos gram-negativos entéricos em coproculturas. O meio contém glicose a 0,1%, sacarose a 1%, lactose a 1%, sulfato ferroso (para a detecção da produção de H2S), extratos teci- duais (substrato de crescimento proteico) e um indicador de pH (vermelho-fenol). O meio é distribuído em tubo de ensaio inclinado para a formação de uma base profunda, sendo inocu- lado para que ocorra crescimento bacteriano no interior dessa base. Se houver apenas fermentação da glicose, a área inclinada e a base irão se tornar inicialmente amarelas em consequên- cia da pequena quantidade de ácido produzido; à medida que os produtos de fermentação são subsequentemente oxidados em CO2 e H2O, bem como liberados a partir da área inclina- da, e à medida que prossegue a descarboxilação oxidativa das proteínas com a formação de aminas, a área inclinada torna-se alcalina (vermelha). Se a lactose ou sacarose forem fermenta- das, haverá a produção de uma quantidade tão grande de ácido que a área inclinada e a base permanecerão amarelas (ácidas). Em geral, as salmonelas e Shigelas resultam em área inclinada alcalina e base ácida. Embora espécies de Proteus, Providencia e Morganella produzam uma área inclinada alcalina e base ácida, podem ser identificados pela rápida formação da cor vermelha em meio de ureia de Christensen. Os microrganismos que pro- duzem ácido na área inclinada, bem como ácido e gás (bolhas) na base são outras bactérias entéricas. 1. Escherichia — E. coli apresenta reações positivas para os tes- tes de indol, lisina descarboxilase e fermentação do manitol, pro- duzindo gás a partir da glicose. Os microrganismos isolados da QUADRo 15.2 Identificação presuntiva rápida de bactérias entéricas gram-negativas Lactose fermentada rapidamente Escherichia coli: brilho metálico em meio diferencial; móvel; colônias planas, não viscosas Enterobacter aerogenes: colônias aumentadas, ausência de brilho metálico; frequentemente móveis, mais viscosas Enterobactercloacae: similares à Enterobacteraerogenes Klebsiella pneumoniae: muito viscosas, crescimento mucoide; imóveis Lactose fermentada lentamente Edwardsiella, Serratia, Citrobacter, Arizona, Providencia, Erwinia Lactose não fermentada Espécies Shigella: imóveis; não produzem gás a partir de dextrose Espécies Salmonella: móveis; formação de ácido e geralmente gás a partir da dextrose Espécies Proteus: “véu” no ágar; ureia rapidamente hidrolisada (odor de amônia) Espécies Pseudomonas (Cap. 16): pigmentos solúveis, fluorescência azul-esverdeada, odor adocicado A B Lipopolissacarídeo O, cadeias laterais (O) Cápsula (K) Flagelos (H) Envelope celular (membrana citoplasmática, peptidoglicano, membrana externa) 232 SEção III Bacteriologia urina podem ser rapidamente identificados, como a E. coli por hemólise em ágar-sangue, pela morfologia típica das colônias com “brilho” iridescente em meios diferenciais, tais como ágar- EMB, e por teste do indol positivo. Mais de 90% das E. coli isoladas são positivas para β-glicuronidase quando se utiliza o substrato 4-metilumbeliferil-β-glicuronídeo (MUG). Os microrganismos isolados de locais anatômicos, além da urina, com propriedades características (inclusive as anteriormente citadas, além de testes negativos para a oxidase) quase sempre podem ser identificados, como a E. coli, pelo resultado positivo no teste do MUG. 2. Grupo da Klebsiella-Enterobacter-Serratia — as espé- cies de Klebsiella exibem crescimento mucoide, grandes cáp- sulas de polissacarídeo e ausência de motilidade. Em geral, apresentam reações positivas para os testes de lisina descarbo- xilase e citrato. A maioria dasespécies de Enterobacter apre- senta resultados positivos nos testes para motilidade, citrato e ornitina-descarboxilase, produzindo gás a partir da glicose. Enterobacter aerogenes possui cápsulas pequenas. As espécies de Serratia produzem DNase, lipase e gelatinase. Já as espécies de Klebsiella, Enterobacter e de Serratia, em geral, apresentam reações de Voges-Proskauer positivas. 3. Grupo do Proteus-Morganella-Providencia — os mem- bros desse grupo desaminam a fenilalanina são móveis, crescem em meio de cianeto de potássio (KCN) e fermentam a xilose. As espécies de Proteus movem-se de forma muito ativa por meio de flagelos peritríquios, resultando na formação de um “véu” em meios sólidos, a menos que a motilidade seja inibida por subs- tâncias químicas (p. ex., álcool feniletílico ou meio CLED [defi- ciente em cistina-lactose-eletrólitos]). As espécies de Proteus e a Morganella morganii são urease-positivas, enquanto as espécies de Providencia geralmente são urease-negativas. O grupo Pro teusProvidencia fermenta a lactose muito lentamente ou não o faz. Proteus mirabilis é mais suscetível aos antimicrobianos, in- clusive penicilinas, do que os outros membros do grupo. 4. Citrobacter — essas bactérias são citrato-positivas e dife- rem das salmonelas, uma vez que não descarboxilam a lisina. Fermentam a lactose muito lentamente ou não o fazem. 5. Shigella — as Shigelas não são móveis e, em geral, não fer- mentam a lactose, enquanto fermentam outros carboidratos, produzindo ácido, mas não gás. Não produzem H2S. As quatro espécies de Shigella estão estreitamente relacionadas com a E. coli. Muitas compartilham antígenos entre si e com outras bacté- rias entéricas (p. ex., Hafnia alvei e Plesiomonas shigelloides). 6. Salmonella — as salmonelas são bacilos móveis que, em geral, fermentam a glicose e a manose sem a produção de gás, mas não fermentam a lactose nem a sacarose. A maioria pro- duz H2S. São frequentemente patogênicas para seres humanos e animais quando ingeridas. Organismos originalmente des- critos no gênero Arizona estão incluídos como subespécies no grupo das salmonelas. 7. outras Enterobacteriaceae — as espécies de Yersinia são discutidas no Capítulo 19. Outros gêneros ocasionalmente en- contrados em infecções humanas são o Cronobacter, Edward siella, Ewingella, Hafnia, Cedecea e Kluyvera. Estrutura antigênica As espécies de Enterobacteriaceae possuem uma estrutura anti- gênica complexa. São classificadas por mais de 150 diferentes an- tígenos somáticos O (lipopolissacarídeos) termoestáveis, mais de 100 antígenos K (capsulares) termolábeis e mais de 50 antígenos H (flagelares) (Fig. 15.1B). Na Salmonella enterica sorovar Typhi, os antígenos capsulares são denominados antígenos Vi. Os antígenos O constituem a parte mais externa do lipo- polissacarídeo da parede celular e consistem em unidades re- petidas de polissacarídeo. Alguns polissacarídeos O específicos contêm açúcares singulares. Os antígenos O são resistentes ao calor e ao álcool, sendo geralmente detectados por aglutinação bacteriana. Os anticorpos dirigidos contra os antígenos O são predominantemente IgM. Embora cada gênero da família Enterobacteriaceae esteja associado a grupos O específicos, um determinado microrga- nismo pode exibir vários antígenos O. Assim, a maioria das espécies de Shigella compartilha um ou mais antígenos O com a E. coli, a qual pode exibir reação cruzada com algumas espé- cies de Providencia, Klebsiella e Salmonella. Ocasionalmente, os antígenos O podem estar associados a doenças humanas específicas; por exemplo, os tipos O específicos da E. coli são encontrados na diarreia e em infecções do trato urinário. Os antígenos K são externos aos antígenos O em algumas Enterobacteriaceae, mas não em todas. Alguns são polissacarí- deos, inclusive os antígenos K da E. coli, enquanto outros são proteínas. Os antígenos K podem interferir na aglutinação por antissoros O e estar associados à virulência (p. ex., as cepas da E. coli produtoras de antígeno K1 são proeminentes na menin- gite neonatal, enquanto os antígenos K da E. coli provocam a fixação das bactérias às células epiteliais antes da invasão do trato gastrintestinal ou das vias urinárias). As espécies de Klebsiella formam grandes cápsulas cons- tituídas de polissacarídeos (antígenos K) que recobrem os antígenos somáticos (O ou H) e podem ser identificadas por testes de intumescimento capsular com antissoros específicos. As infecções humanas das vias respiratórias são causadas par- ticularmente pelos tipos capsulares 1 e 2, enquanto as do trato urinário são provocadas pelos tipos 8, 9, 10 e 24. Os antígenos H localizam-se nos flagelos, e são desnatu- rados ou removidos pelo calor ou pelo álcool. São preservados quando variantes bacterianas móveis são tratadas com formol. Tais antígenos H aglutinam-se com anticorpos anti-H, princi- palmente IgG. Os determinantes nos antígenos H dependem da sequência de aminoácidos na proteína flagelar (flagelina). Dentro de um único sorotipo, os antígenos flagelares podem estar presentes em uma ou duas formas, denominadas fase 1 (convencionalmente designada por letras minúsculas) e fase 2 (convencionalmente designada por algarismos arábicos), conforme indica o Quadro 15.3. O microrganismo tende a mu- dar de uma fase para outra; esse processo é conhecido como variação de fase. Os antígenos H na superfície bacteriana po- dem interferir na aglutinação por anticorpos anti-O. Existem muitos exemplos de estruturas antigênicas super- postas entre as Enterobacteriaceae e outras bactérias. A maioria das Enterobacteriaceae compartilha o antígeno O14 de E. coli. O polissacarídeo capsular tipo 2 de Klebsiella é muito seme- lhante ao polissacarídeo tipo 2 dos pneumococos. Alguns antí- genos K exibem reação cruzada com polissacarídeos capsulares CAPÍTULo 15 Bacilos entéricos gram-negativos (Enterobacteriaceae) 233 do Haemophilus influenzae ou Neisseria meningitidis. Por isso, E. coli O75:K100:H5 pode induzir os anticorpos que reagem com H. influenzae tipo b. A classificação antigênica das Enterobacteriaceae com fre- quência indica a presença de cada antígeno específico. Assim, a fórmula antigênica da E. coli pode ser O55:K5:H21. Colicinas (bacteriocinas) Muitos microrganismos gram-negativos produzem bacteriocinas. Essas proteínas bactericidas de alta massa molecular (toxinas for- madoras de poros) são produzidas por certas cepas de bactérias ativas contra algumas outras cepas da mesma espécie ou de espé- cies estreitamente relacionadas. Sua produção é controlada pelos plasmídeos. As cepas produtoras de bacteriocinas são resistentes à sua própria bacteriocina; por conseguinte, as bacteriocinas podem ser utilizadas para “tipagem” dos microrganismos. Toxinas e enzimas A maioria das bactérias gram-negativas tem lipopolissacarí- deos complexos em suas paredes celulares. Estas substâncias, endotoxinas do envelope celular (membrana citoplasmática, peptidoglicano e membrana externa) exercem uma variedade de efeitos fisiopatológicos resumidos no Capítulo 9. Muitas bactérias entéricas gram-negativas também produzem exoto- xinas de importância clínica. Algumas toxinas específicas são discutidas nas seções subsequentes. doenças causadas Por outras enterobacteriaceae além de salmonella e shigella Microrganismos causadores E. coli é um membro da microbiota intestinal normal (Cap. 10). Outras bactérias entéricas (espécies de Proteus, Enterobacter, Klebsiella, Morganella, Providencia, Citrobacter e Serratia) também aparecem como membros da microbiota intestinal normal, mas são consideravelmente menos comuns que E. coli. As bactérias entéricas são, às vezes, encontradas em pequeno número, como parte da microbiota normal das vias respirató- rias superiores e do trato genital. Em geral, as bactérias entéricas não provocam doenças e, no intestino, podem até contribuir para a função normal e nutrição. Quando ocorrem infecções clinicamente importantes,costumam ser causadas por E. coli, mas outras bactérias entéricas são causas de infecções hospi- talares e ocasionalmente provocam infecções adquiridas na comunidade. As bactérias tornam-se patogênicas somente quando atingem tecidos fora do trato intestinal, ou outros lo- cais com microbiota normal menos comum. Os locais de in- fecção mais frequentes e clinicamente importantes são o trato urinário, o trato biliar e outras áreas da cavidade abdominal, embora qualquer local anatômico (p. ex., corrente sanguínea, próstata, pulmões, ossos, meninges) possa ser o local da doen- ça. Algumas das bactérias entéricas (p. ex., Serratia marcescens, Enterobacter aerogenes) são patógenos oportunistas. Quando as defesas normais do hospedeiro são inadequadas — em par- ticular no lactente ou no idoso, nos estágios terminais de ou- tras doenças, após imunossupressão ou em decorrência do uso prolongado de cateteres venosos ou uretrais —, podem ocorrer infecções localizadas clinicamente importantes, e as bactérias podem alcançar a corrente sanguínea, causando sepse. Patogênese e manifestações clínicas As manifestações clínicas das infecções causadas por E. coli e outras bactérias entéricas dependem do local da infecção, e não podem ser diferenciadas dos processos causados por outras bactérias pelos sinais e sintomas. A. E. coli 1. Infecção do trato urinário — E. coli constitui a causa mais comum de infecção das vias urinárias e é responsável por cerca de 90% das primeiras infecções do trato urinário em mulheres jovens (Cap. 48). Os sinais e sintomas consistem em frequên- cia urinária, disúria, hematúria e piúria. A dor no flanco está associada à infecção das vias urinárias superiores, mas nenhum desses sinais ou sintomas é específico da infecção por E. coli. A infecção do trato urinário pode resultar em bacteriemia, com sinais clínicos de sepse. A maioria das infecções do trato urinário que envolve a be- xiga ou os rins em algum hospedeiro saudável é causada por um pequeno número de tipos antigênicos O que possuem fa- tores de virulência especificamente elaborados, que facilitam a colonização e infecção clínica subsequente. Estas bactérias são conhecidas como E. coli uropatogênicas. Estes microrganismos produzem hemolisina, que é citotóxica e facilita a invasão de tecidos. As cepas que causam pielonefrite expressam o antíge- no K e elaboram um tipo específico de pilus, a fímbria P, que se liga à substância P do grupo sanguíneo. 2. Doenças diarreicas associadas à E. coli — as E. coli que provocam diarreia são extremamente comuns no mundo in- teiro. São classificadas com base nas características de suas propriedades de virulência (ver adiante) e cada grupo provoca doença por pelo menos um dos seis diferentes mecanismos já previamente caracterizados. As propriedades de aderência nas células epiteliais do intestino delgado ou do intestino grosso são codificadas por genes nos plasmídeos. De modo semelhan- te, as toxinas são frequentemente mediadas por plasmídeos ou fagos. Algumas manifestações clínicas das doenças diarreicas são discutidas no Capítulo 48. QUADRo 15.3 Fórmulas antigênicas representativas de Salmonellae Grupo o Sorotipo Fórmula antigênicaa D Salmonella Typhi 9, 12 (Vi):d: — A Salmonella Paratyphi A 1, 2, 12:a — C1 Salmonella Choleraesuis 6, 7:c:1,5 B Salmonella Typhimurium 1, 4, 5, 12:i:1, 2 D Salmonella Enteritidis 1, 9, 12:g,m: — a Antígenos o: numerais em letra maiúscula. (Vi): antígeno Vi, se presente. Antígeno H fase 1: letras minúsculas. Antígeno H fase 2: numeral. 234 SEção III Bacteriologia A E. coli enteropatogênica (EPEC) representa uma impor- tante causa da diarreia em lactentes, particularmente nos paí- ses em desenvolvimento. A EPEC já foi associada a surtos de diarreia em berçários em países desenvolvidos, se aderindo nas células mucosas do intestino delgado. Dois importantes fatores são necessários na patogenicidade desse microrganismo: o pi lus formador de feixe (bundle forming pilus [BFP]) codificado por um plasmídeo, denominado fator de aderência de EPEC (EPEC adherence factor [EAF]), e uma ilha de patogenicidade denominada de locus cromossômico da destruição do enterócito (chomosomal locus of enterocyte effacement [LEE]), em que está localizado o gene cromossomial que codifica a proteína intimina responsável pela firme aderência ao enterócito. Após a aderên- cia, ocorre a perda das microvilosidades (apagamento), forma- ção de filamentos de actina ou estruturas semelhantes a taças, e, em certas ocasiões, penetração da EPEC nas células mucosas. Lesões características podem ser observadas nas micrografias eletrônicas do intestino delgado, a partir de amostras obtidas por biópsia. A infecção por EPEC, em crianças, resulta em diarreia aquosa grave, geralmente autolimitada, mas que pode prolongar ou se cronificar. A diarreia por EPEC tem sido associada a múlti- plos sorotipos específicos da E. coli; as cepas são identificadas por tipagem do antígeno O e ocasionalmente do antígeno H. Além disso, pode-se efetuar um modelo de infecção em dois estágios com a utilização de células HEp-2. Os testes para a identificação da EPEC são realizados em laboratórios de referência. A duração da diarreia causada por EPEC pode ser reduzida, e a diarreia crô- nica pode ser curada por tratamento com antibióticos. A E. coli enterotoxigênica (ETEC) constitui uma causa comum da “diarreia do viajante” e uma causa muito importan- te de diarreia em lactentes nos países em desenvolvimento. A aderência da ETEC nas células epiteliais do intestino delgado é promovida por fatores de colonização (também conhecidos como fatores de colonização antigênicos [colonization factor antigens, CFAs])* da ETEC específicos dos seres humanos. Al- gumas cepas da ETEC produzem uma exotoxina termolábil (LT) (MM de 80.000), que se encontra sob o controle genético de um plasmídeo. Sua subunidade B liga-se ao gangliosídeo GM1 na membrana apical dos enterócitos, e facilita a penetra- ção da subunidade A (MM de 26.000) na célula, em que ativa a adenilatociclase. Este processo aumenta acentuadamente a con- centração local de monofosfato de adenosina cíclica (cAMP) desencadeando uma complexa cascata que envolve o regulador da condutância transmembrana na fibrose cística (Cystic Fi brosis Transmembrane Condutance Regulator [CFTR])**. O re- * N. de R.T. A classificação das CFAs é confusa e inconsistente, sendo ca- da CFA um conjunto de fímbrias diferentes. As CFAs podem ser divididas baseadas em características morfológicas: rígidas e curtas (CFA I), longas e flexíveis (CFA II e IV) e flexíveis formando feixes (blundle forming pilus– CFA III). ** N. de R.T. Esta proteína é encontrada na membrana apical de célu- las epiteliais do trato respiratório, do trato gastrintestinal, de glândulas submucosas e do trato reprodutivo, entre outros sítios. Nestes locais, a sua principal função é agir como canal de cloro regulando o balanço en- tre íons e água através do epitélio. Recebe esse nome, pois em indivíduos com fibrose cística sua disfunção diminui a permeabilidade da membrana celular ao cloreto, trazendo dificuldades ao transporte e à secreção deste íon. Consequentemente, a concentração de cloretos na membrana apical das células epiteliais se eleva. Cada órgão que depende da proteína CFTR — pulmões, pâncreas, intestino, glândulas sudoríparas e vasos deferentes — expressa esta disfunção de maneira diferente, de acordo com a sensibi- lidade de cada um deles ao déficit funcional. sultado final é uma hipersecreção intensa e prolongada de água e cloretos que inibe a reabsorção de sódio. O lúmen intestinal sofre distensão com líquido, ocorrendo hipermotilidade e diar- reia de vários dias de duração. A LT é antigênica e exibe reação cruzada com a enterotoxina do Vibrio cholerae, que apresenta um mecanismo idêntico de ação. Estimula a produção de anti- corpos neutralizantes no soro (e talvez na superfície intestinal) de indivíduos previamente infectadospor E. coli enterotoxi- gênica. Os indivíduos que residem em regiões nas quais esses microrganismos são altamente prevalentes (p. ex., em alguns países em desenvolvimento) tendem a apresentar anticorpos e estão menos sujeitos a ter diarreia por ocasião de reexposição à E. coli produtora de LT. Os ensaios para a LT consistem em (1) acúmulo de líquido no intestino de animais de laboratório, (2) alterações citológicas típicas em células ovarianas de hamster chinês (células CHO) ou outras linhagens celulares em cultu- ra, (3) estímulo da produção de esteroides em células tumorais suprarrenais cultivadas, (4) ensaios de ligação e imunológicos com antissoros padronizados contra a LT e (5) deteção dos ge- nes que codificam as toxinas. Estes ensaios são feitos apenas em laboratórios de referência. Algumas cepas da ETEC produzem a enterotoxina termo- estável STa (MM de 1.500 a 4.000), sob o controle genético de um grupo heterogêneo de plasmídeos. A STa ativa a guanilil- ciclase nas células epiteliais entéricas e estimula a secreção de líquidos. Muitas cepas STa-positivas também produzem LT. As cepas com ambas as toxinas causam diarreia mais grave. Os plasmídeos que transportam os genes das enterotoxi- nas (LT, ST) também podem transportar genes para os CFAs que facilitam a fixação de cepas da E. coli ao epitélio intestinal. Os fatores de colonização reconhecidos ocorrem com especial frequência em alguns sorotipos. Certos sorotipos de ETEC ocorrem no mundo inteiro, enquanto outros apresentam dis- tribuição limitada. É possível que praticamente qualquer E. coli possa adquirir um plasmídeo que codifica enterotoxinas. Não existe associação definida da ETEC com as cepas da EPEC que causam diarreia em crianças. De modo semelhante, não há as- sociação entre as cepas enterotoxigênicas e as cepas capazes de invadir as células epiteliais intestinais. Recomenda-se muita cautela na seleção e no consumo de ali- mentos potencialmente contaminados com ETEC, para ajudar a prevenir a diarreia do viajante. A profilaxia antimicrobiana pode ser eficaz, mas pode resultar em aumento da resistência das bac- térias a antibióticos e provavelmente não deve ser recomendada de modo uniforme. Uma vez instalada a diarreia, o tratamento com antibióticos reduz de maneira eficaz a duração da doença. As E. coli produtoras de toxina Shiga (STEC) são assim chamadas por causa da toxina que produzem. Existem pelo me- nos duas formas antigênicas da toxina, conhecidas como toxina Shigalike 1 e toxina Shigalike 2. A STEC tem sido associada à colite hemorrágica, uma forma grave de diarreia, e à síndrome urêmico-hemolítica, doença que resulta em insuficiência renal aguda, anemia hemolítica microangiopática e trombocitopenia. A toxina Shigalike 1 é idêntica à toxina de Shigela produzida por Shigella dysenteriae tipo 1, enquanto a toxina Shigalike 2 conserva somente algumas propriedades. Além disso, as duas toxinas são antigênica e geneticamente distintas. Entre os so- rotipos de E. coli que produzem a toxina Shiga, o O157:H7 é o mais comum e o que pode ser identificado em amostras clí- nicas. A STEC O157:H7 não utiliza o sorbitol, ao contrário da CAPÍTULo 15 Bacilos entéricos gram-negativos (Enterobacteriaceae) 235 maioria das outras E. coli; além disso, é negativa (produz co- lônias incolores) em ágar MacConkey com sorbitol (utiliza-se sorbitol em vez de lactose); as cepas O157:H7 também são nega- tivas no teste MUG (ver anteriormente). Muitos dos sorotipos não O157 podem ser sorbitol-positivos quando cultivados. Uti- lizam-se antissoros específicos para identificação do O157:H7. Ensaios para detecção de ambas as toxinas de Shiga por meio de ensaios imunoenzimáticos (Elisa) comerciais são feitos em muitos laboratórios. Outros métodos sensíveis incluem o teste da citotoxina em cultura de células com o uso de células Vero e a reação em cadeia da polimerase para detecção direta dos genes da citotoxina em amostras de fezes. Muitos casos de colite he- morrágica e suas complicações associadas podem ser evitados com o cozimento completo da carne moída e o não consumo de produtos não pasteurizados como sidras de maçã. A E. coli enteroinvasiva (EIEC) causa uma doença muito semelhante à shigelose, mais comum em crianças de países em desenvolvimento, bem como em indivíduos que viajam para esses países. Ao exemplo de Shigela, as cepas da EIEC não fer- mentam a lactose ou são fermentadoras tardias da lactose, e são imóveis. A EIEC causa doença ao invadir as células epiteliais da mucosa intestinal. A E. coli enteroagregativa (EAEC) provoca diarreia agu- da e crônica (mais de 14 dias de duração) em indivíduos nos países em desenvolvimento e constitui uma importante causa de infecções transmitidas por alimentos em países industriali- zados. Esse microrganismo ainda está associado à diarreia dos viajantes e à diarreia em pacientes HIV-positivo. Caracteriza- se pelo padrão agregativo de aderência às células humanas*. Essa cepa de E. coli diarreiogênica constitui um grupo bastante heterogêneo e seus mecanismos de patogenicidade ainda não estão inteiramente compreendidos. Algumas amostras de EA- EC produzem uma toxina semelhante à toxina ST (enteroag gregative heat stable toxin [EAST-1], ver anteriormente), uma enterotoxina codificada por plasmídeo, que produz dano ce- lular, e uma hemolisina. O diagnóstico pode ser presuntivo, porém necessita de confirmação por testes de aderência em células de linhagem contínua, não disponível na maioria dos laboratórios clínicos**. 3. Sepse — quando as defesas normais do hospedeiro não es- tão adequadas, a E. coli pode alcançar a corrente sanguínea e provocar sepse. Os recém-nascidos podem ser altamente sus- cetíveis a sepse por E. coli, uma vez que não têm anticorpos IgM. A sepse pode ocorrer secundariamente à infecção do trato urinário. 4. Meningite — E. coli e os estreptococos do grupo B consti- tuem as principais causas da meningite em lactentes. Cerca de 75% das E. coli dos casos de meningite apresentam o antígeno * N. de R.T. A aderência agregativa provoca uma intensa secreção de mu- co pelo enterócito, favorecendo a aderência de EAEC e, assim, contribuin- do para a formação de biofilme e para persistência desse microrganismo na mucosa intestinal, observadas em casos de diarreia crônica. O padrão agregativo está relacionado com a expressão de estruturas fimbriais deno- minadas de fímbria de aderência agregativa (aggregative adherence frim briae, AAF). ** N. de R.T. Além do padrão agregativo de aderência utilizando células de linhagem contínua, pode-se observar a formação de biofilme em poliesti- reno, ou a formação de uma película esbranquiçada na superfície de meio líquido. Há também disponível, sondas genéticas para reconhecimento das fímbrias de aderência agregativa, AAFs. K1, que exibe reação cruzada com o polissacarídeo capsular do grupo B de N. meningitidis. O mecanismo de virulência asso- ciado ao antígeno K1 ainda não está compreendido. B. Klebsiella-Enterobacter-Serratia; Proteus-Morganella-Providencia; e Citrobacter A patogênese das doenças causadas por esses grupos de bacilos gram-negativos entéricos assemelha-se aos fatores inespecífi- cos na doença causada por E. coli. 1. Klebsiella — K. pneumoniae é encontrada nas vias res- piratórias e fezes de cerca de 5% dos indivíduos normais. É responsável por uma pequena proporção (cerca de 1%) das pneumonias bacterianas, e pode provocar extensa consolida- ção necrosante hemorrágica dos pulmões. Provoca infecção das vias urinárias e bacteriemia com lesões focais em pacientes debilitados. Outras bactérias entéricas também podem causar pneumonia. Espécies Klebsiella estão classificadas entre os dez principais patógenos causadores de infecções hospitalares. Duas outras espécies de klebsiella estão associadas a condições inflamatórias das vias respiratórias superiores: K. pneumoniae subespécie ozaenae foi isolada da mucosa nasal de pacientes com ozena, uma atrofia progressivae fétida das mucosas; e a Klebsiella pneumoniae subespécie rhinoscleromatis, a partir do rinoscleroma, doença granulomatosa destrutiva do nariz e da faringe. Klebsiella granulomatis (antigamente Calymmatobac terium granulomatis) causa doença genital ulcerativa crônica, denominada de granuloma inguinal, uma doença sexualmente transmitida incomum. Esse microrganismo apresenta seu cres- cimento inibido em meios que contenham gema de ovo. O tra- tamento é realizado utilizando-se ampicilina e tetraciclina. 2. Enterobacter — três espécies de Enterobacter, E. cloacae, E. aerogenes e E. sakazakii (recentemente transferida para o gênero Cronobacter) causam a maioria das infecções por En terobacter. Estas bactérias fermentam lactose, muitas contêm cápsulas que produzem colônias mucoides e são móveis. Esses microrganismos causam um largo espectro de infecções hos- pitalares como pneumonia, infecções do trato urinário, feridas e dispositivos infeccionados. A maior parte das cepas possui uma betalactamase cromossômica chamada AmpC, que as tor- na intrinsecamente resistentes à ampicilina e a cefalosporinas de primeira e segunda gerações. Mutantes podem fazer hiper- produção de betalactamase, conferindo resistência à cefalospo- rinas de terceira geração. 3. Serratia — Serratia marcescens é um patógeno oportunista comum em pacientes hospitalizados. As espécies de Serratia (ge- ralmente não pigmentadas) causam pneumonia, bacteriemia e endocardite, particularmente em indivíduos viciados em narcóti- cos e pacientes hospitalizados. Somente cerca de 10% dos isolados formam o pigmento vermelho (prodigiosina) que há longo tempo caracteriza a S. marcescens, a qual frequentemente se mostra resis- tente aos aminoglicosídeos e às penicilinas; as infecções podem ser tratadas com cefalosporinas de terceira geração. 4. Proteus — as espécies de Proteus provocam infecções nos seres humanos apenas quando deixam o trato intestinal. São encontradas em infecções das vias urinárias e causam bacte- riemia, pneumonia, e lesões focais em pacientes debilitados ou naqueles que recebem infusões intravenosas contaminadas. P. mirabilis causa infecções do trato urinário e ocasionalmente 236 SEção III Bacteriologia outras infecções. Proteus vulgaris e Morganella morganii são importantes patógenos hospitalares. As espécies de Proteus produzem urease, resultando em rápida hidrólise da ureia, com liberação de amônia. Por con- seguinte, nas infecções do trato urinário causadas por Proteus, a urina torna-se alcalina, favorecendo a formação de cálculos e tornando a acidificação praticamente impossível. A rápida motilidade do Proteus pode contribuir para invasão do trato urinário pelo microrganismo. As cepas de Proteus variam enormemente quanto à sua sen- sibilidade a antibióticos. P. mirabilis é frequentemente inibido pelas penicilinas; os antibióticos mais ativos contra outros mem- bros do grupo são os aminoglicosídeos e as cefalosporinas. 5. Providencia — as espécies de Providencia (P. rettgeri, P. alcalifaciens e P. stuartii) estão presentes na microbiota in- testinal normal. Todas causam infecções das vias urinárias e ocasionalmente outras infecções, e às vezes são resistentes ao tratamento com antimicrobianos. 6. Citrobacter — as espécies de Citrobacter podem causar in- fecções do trato urinário e sepse. Exames diagnósticos laboratoriais A. Amostras Urina, sangue, pus, líquido cerebrospinal, escarro ou outro ma- terial, conforme indicar a localização do processo infeccioso. B. Esfregaços As Enterobacteriaceae assemelham-se umas às outras do ponto de vista morfológico. A presença de grandes cápsulas sugere espécies de Klebsiella. C. Cultura As amostras devem ser semeadas em ágar-sangue e meios de cultura diferenciais, nos quais costuma ser possível proceder a uma rápida e preliminar identificação das bactérias entéricas gram-negativas (Cap. 47). Imunidade O desenvolvimento de anticorpos específicos é verificado nas infecções sistêmicas, mas não há certeza sobre se a imunidade contra os microrganismos é significativa. Tratamento Não há tratamento específico. As sulfonamidas, a ampicilina, as cefalosporinas, as fluoroquinolonas e os aminoglicosídeos exercem efeitos antibacterianos pronunciados contra as bac- térias entéricas, porém a variação na suscetibilidade é grande, e é essencial fazer antibiogramas. É comum haver resistência a vários fármacos, e tal resistência está sob o controle de plasmí- deos transmissíveis. Certas condições que predispõem a infecção por esses mi- crorganismos exigem correção cirúrgica (p. ex., desobstrução do trato urinário, fechamento de perfuração em órgão abdomi- nal ou ressecção de porção bronquiectásica do pulmão). O tratamento da bacteriemia por microrganismos gram-ne- gativos e do choque séptico iminente exige rápida instituição de terapia antimicrobiana, restauração do equilíbrio hidreletrolítico e tratamento da coagulação intravascular disseminada (CID). Foram propostos vários meios para prevenir a diarreia do viajante, como a ingestão diária de suspensão de subsalicilato de bismuto (o subsalicilato de bismuto tem a capacidade de inativar in vitro a enterotoxina de E. coli) e doses regulares de tetraci- clinas ou outros antimicrobianos por períodos limitados, mas como nenhum desses métodos é totalmente bem-sucedido ou isento de efeitos adversos, recomenda-se muita cautela quanto ao consumo de água e alimentos em regiões em que as condi- ções sanitárias são precárias e a profilaxia deve ser substituída por tratamento precoce e breve (p. ex., com ciprofloxacino ou sulfametoxazol-trimetoprima). Epidemiologia, prevenção e controle As bactérias entéricas instalam-se no trato intestinal normal poucos dias após o nascimento e, a partir desse momento, passam a constituir uma importante parte da microbiota aeró- bia (anaeróbia facultativa) normal. A E. coli é o protótipo. As bactérias entéricas encontradas na água ou no leite são aceitas como prova de contaminação fecal a partir do esgoto ou de outras fontes. As medidas de controle não são exequíveis até que a micro- biota endógena normal esteja envolvida. Os sorotipos de E. coli enteropatogênica devem ser controlados assim como as salmo- nelas (ver adiante). Algumas das bactérias entéricas representam um sério problema nas infecções hospitalares. É particularmen- te importante reconhecer que muitas bactérias entéricas são “oportunistas” que causam doenças quando introduzidas em pacientes debilitados. No ambiente hospitalar ou em outras ins- tituições, essas bactérias são comumente transmitidas por agen- tes de saúde, por instrumentos ou pelas medicações parenterais. Seu controle depende da lavagem das mãos, de assepsia rigorosa, da esterilização do equipamento, de desinfecção, da restrição da terapia intravenosa e de precauções restritas para manter as vias urinárias estéreis (i. e., drenagem fechada). as shigellae O habitat natural das Shigelas limita-se ao trato intestinal de seres humanos e outros primatas, no qual provocam disenteria bacilar. Morfologia e identificação A. Microrganismos típicos As Shigelas são bacilos gram-negativos delgados; formas coco- bacilares ocorrem em culturas jovens. B. Cultura As Shigelas são anaeróbios facultativos, apesar de crescerem melhor em condições aeróbias. As colônias convexas, circula- res e transparentes com bordas regulares atingem um diâmetro de cerca de 2 mm em 24 horas. C. Características de crescimento Todas as Shigelas fermentam a glicose. Com exceção da S. son nei, não fermentam a lactose. A incapacidade de fermentar a lac- tose distingue as Shigelas em meios de cultura diferenciais. As Shigelas formam ácidos a partir dos carboidratos, mas raramente produzem gás. Além disso, podem ser divididas em espécies que fermentam e que não fermentam o manitol (Quadro 15.4). CAPÍTULo 15 Bacilos entéricos gram-negativos (Enterobacteriaceae) 237 Estrutura antigênica As Shigelas exibem um padrão antigênico complexo. Verifica-se acentuada superposição no comportamento sorológico de diferentes espécies, e a maioria compartilha antígenos O com outros bacilos entéricos. Os antígenos O somáticos das Shigelas são lipopolissaca- rídeos. Sua especificidade sorológica depende do polissacarí- deo. Existem mais de 40 sorotipos. A classificação das Shigelas baseia-se em características bioquímicas e antigênicas. O Qua- dro 15.4 apresenta as espécies patogênicas. Patogênese e patologia As infecções causadas por Shigela são quase sempre limitadas ao trato gastrintestinal; a ocorrência de invasão para a corrente sanguínea é muito rara. As Shigelas são altamente contagiosas; a dose infectante é da ordem de 103 microrganismos (enquanto geralmente é de 105 a 108 no caso das salmonelas e dos vibriões). O processo patológico básico consiste na invasão das células epiteliais da mucosa (p. ex., células M) por fagocitose induzida, escape do vacúolo fagocítico, multiplicação e disseminação no citoplasma das células epiteliais, bem como passagem para as células adjacentes. A formação de microabscessos na parede do intestino grosso e no íleo terminal acarreta necrose da muco- sa, ulceração superficial, sangramento e formação de “pseudo- membrana” na área ulcerada. Essa pseudomembrana consiste em fibrina, leucócitos, restos celulares, mucosa necrótica e bac- térias. À medida que o processo cede, o tecido de granulação preenche as úlceras, e forma-se o tecido cicatricial. Toxinas A. Endotoxina Ao sofrerem autólise, todas as Shigelas liberam seu lipopolissa- carídeo tóxico, uma endotoxina que provavelmente contribui para irritação da parede intestinal. B. Exotoxina da Shigella dysenteriae A S. dysenteriae tipo 1 (bacilo de Shiga) produz uma exotoxina termolábil que afeta tanto o intestino quanto o sistema nervoso central. A exotoxina é uma proteína antigênica (que estimula a produção de antitoxina) e letal para animais de laboratório. Ao atuar como enterotoxina, provoca diarreia da mesma forma que a toxina Shigalike da E. coli, talvez pelo mesmo mecanis- mo. Nos seres humanos, a exotoxina também inibe a absorção de açúcar e aminoácidos no intestino delgado. Ao atuar como “neurotoxina”, esse material pode contribuir para a extrema gravidade e a natureza fatal das infecções por S. dysenteriae, bem como para as reações do sistema nervoso central obser- vadas (i. e., meningismo, coma). Os pacientes com infecções causadas por Shigella flexneri ou Shigella sonnei desenvolvem antitoxina que neutraliza a exotoxina da S. dysenteriae in vitro. A atividade tóxica é distinta da propriedade invasiva das Shige las na disenteria. As duas podem atuar em sequência, a toxina provocando uma diarreia inicial volumosa e não sanguinolen- ta, e a invasão do intestino grosso resultando em posterior di- senteria com sangue e pus nas fezes. Manifestações clínicas Depois de um curto período de incubação (1 a 2 dias), há o início súbito de dor abdominal, febre e diarreia aquosa. A diar- reia é atribuída à ação da exotoxina no intestino delgado (ver anteriormente). Em 1 dia ou mais, quando a infecção acomete o íleo e colo, o número de evacuações aumenta, e as fezes tor- nam-se menos líquidas, porém frequentemente contêm muco e sangue. Cada evacuação é acompanhada de esforço e tenes- mo (espasmos retais), com consequente dor na área abdominal inferior. Em mais de 50% dos casos em adultos, a febre e a diar- reia desaparecem espontaneamente em 2 a 5 dias. Contudo, em crianças e idosos, a perda de água e eletrólitos pode resultar em desidratação, acidose e mesmo em morte. A doença causada por S. dysenteriae pode ser particularmente grave. Durante a fase de recuperação, a maioria dos indivíduos eli- mina bacilos disentéricos por curto tempo, embora alguns con- tinuem sendo portadores intestinais crônicos, podendo sofrer surtos recorrentes da doença. Durante a recuperação da infecção, a maioria dos pacientes desenvolve anticorpos circulantes contra a Shigela que não protegem o indivíduo contra reinfecção. Exames diagnósticos laboratoriais A. Amostras As amostras consistem em fezes frescas, flocos de muco e swabs retais para cultura. Um grande número de leucócitos fecais e alguns eritrócitos são frequentemente vistos ao microscópio. As amostras de soro, quando desejado, devem ser obtidas a in- tervalos de 10 dias para se demonstrar uma elevação nos títulos de anticorpos aglutinantes. B. Cultura O material deve ser semeado em meios de cultura diferenciais (p. ex., ágar de MacConkey ou EMB) e em meios seletivos (ágar entérico de Hektoen ou ágar para SalmonellaShigella), os quais suprimem outras Enterobacteriaceae e microrganismos gram- positivos. As colônias incolores (lactose-negativas) são inocu- ladas em ágar TSI. Os microrganismos que não produzem H2S, que produzem ácido, mas não gás na base, e que alcalinizam a área inclinada em ágar TSI, e não são móveis devem ser subme- tidos a aglutinação em lâmina por antissoros específicos contra Shigela. C. Sorologia Os indivíduos normais frequentemente apresentam aglutininas contra várias espécies de Shigella. Entretanto, as determinações seriadas dos títulos de anticorpos podem revelar uma elevação QUADRo 15.4 Espécies patogênicas de Shigella Designação presente Grupo e tipo Manitol ornitina descarboxilase Shigella dysenteriae A – – Shigella flexneri B + – Shigella boydii C + – Shigella sonnei D + + 238 SEção III Bacteriologia de anticorpos específicos. A sorologia não é utilizada para se estabelecer o diagnóstico de infecções por Shigella. Imunidade A infecção é seguida de uma resposta dos anticorpos específi- cos de tipo. A inoculação de Shigelas mortas estimula a produ- ção de anticorpos no soro, mas não consegue proteger os seres humanos contra a infecção. Os anticorpos IgA no intestino podem ser importantes para limitar a reinfecção, podendo ser estimulados por cepas vivas atenuadas administradas por via oral em forma de vacinas experimentais. Os anticorpos séricos dirigidos contra antígenos somáticos de Shigela são IgM. Tratamento O ciprofloxacino, ampicilina, doxiciclina e sulfametoxazol-trime- toprima são mais comumente inibidores contra as Shigelas iso- ladas e podem suprimir as crises clínicas agudas de disenteria e reduzir a duração dos sintomas. Esses agentes podem não erra- dicar os microrganismos do trato intestinal. A resistência a vários fármacos pode ser transmitida pelos plasmídeos, e as infecções re- sistentes são disseminadas. Muitos casos são autolimitados. Deve- se evitar o uso de opioides na disenteria causada por Shigela. Epidemiologia, prevenção e controle As Shigelas são transmitidas por “alimentos, dedos, fezes e moscas” de uma pessoa para outra. A maioria dos casos de in- fecção por Shigela ocorre em crianças com menos de 10 anos de idade. A shigelose, causada primariamente por S. sonnei, se tornou um importante problema em creches nos EUA. A S. dysenteriae pode disseminar-se amplamente. A quimioprofilaxia em massa por períodos limitados (p. ex., em militares) tem sido experimentada, mas amostras de Shigela resistentes tendem a aparecer rapidamente. Como os seres humanos constituem o principal hospedeiro reconhecido das Shigelas patogênicas, os esforços de controle devem ser voltados para a eliminação dos microrganismos desse reservatório por meio de (1) controle sanitário da água, dos alimentos e do leite; disponibilidade de esgotos; e controle das moscas; (2) isolamento dos pacientes e desinfecção das fezes; (3) detecção de casos subclínicos e porta- dores, em particular em indivíduos que manipulam alimentos; e (4) tratamento antibiótico dos indivíduos infectados. GruPo da salmonella-arizona As salmonelas são frequentemente patogênicas para os se- res humanos ou animais quando adquiridas por via oral. São transmitidas a partir de animais e produtos de origem animal para os seres humanos, nos quais provocam enterite, infecção sistêmica e febre entérica. Morfologia e identificação As salmonelasvariam quanto ao comprimento. A maioria dos mi- crorganismos isolados é móvel, com flagelos peritríquios. As sal- monelas crescem rapidamente em meios de cultura simples, mas quase nunca fermentam a lactose ou a sacarose. Formam ácido e, às vezes, gás a partir da glicose e da manose. Em geral, produzem H2S. Esses microrganismos sobrevivem congelados em água por longo tempo. As salmonelas mostram-se resistentes a determina- das substâncias químicas (p. ex., verde-brilhante, tetrationato de sódio, desoxicolato de sódio) que inibem outras bactérias entéri- cas; esses compostos são, portanto, úteis para inclusão em meios de cultura, para isolar as salmonelas a partir de amostras de fezes. Classificação A classificação das salmonelas é complexa, uma vez que os mi- crorganismos representam mais um continuum do que uma espécie definida. Os membros do gênero Salmonella foram ori- ginalmente classificados com base na epidemiologia, na varie- dade de hospedeiros, nas reações bioquímicas e nas estruturas dos antígenos O, H e Vi (quando presentes). Os nomes (p. ex., Salmonella typhi, Salmonella typhimurium) foram dados como se fossem gênero e espécie; essa forma de nomenclatura conti- nua sendo utilizada, porém seu uso é incorreto. Os estudos de hibridização do DNA com DNA demonstraram que existem sete grupos evolutivos. Atualmente, o gênero Salmonella está dividido em duas espécies, cada uma com várias espécies e so- rotipos. As duas espécies são Salmonella enterica e Salmonella bongori (anteriormente subespécies V). S. enterica possui cin- co subespécies: subespécie enterica (subespécie I), subespécie salamae (subespécie II), subespécie arizonae (subespécie IIIa), subespécie diarizonae (subespécie IIIb), subespécie houtenae (subespécie IV) e subespécie indica (subespécie VI). A maioria das doenças humanas é causada pelas cepas da subespécie I, es- crita como Salmonella enterica subespécie enterica. Raramente, infecções humanas podem ser causadas pelas subespécies IIIa e IIIb ou por outras subespécies encontradas com frequência em animais de sangue frio. Muitas vezes essas infecções estão as- sociadas a animais de estimação exóticos, como répteis. Parece provável que a nomenclatura amplamente aceita para classifi- cação será a seguinte: S. enterica subespécie enterica, sorotipo Typhimurium, que pode ser reduzido a S. typhimurium com o nome do gênero em itálico e o nome do sorotipo em tipo ro- mano. Os laboratórios de referência nacionais e internacionais podem utilizar as fórmulas antigênicas após o nome da subes- pécie, visto que proporcionam uma informação mais precisa sobre os microrganismos isolados (Quadro 15.4). Existem mais de 2.500 sorotipos de salmonelas, inclusive mais de 1.400 no grupo da hibridização do DNA I capazes de infectar os seres humanos. Quatro sorotipos de salmonelas que causam febre entérica podem ser identificados no laboratório clínico por testes bioquímicos e sorológicos. Esses sorotipos de- vem ser rotineiramente identificados em virtude de sua impor- tância clínica. São eles: Salmonella paratyphi A (sorogrupo A), Salmonella paratyphi B (sorogrupo B), Salmonella choleraesuis (sorogrupo C1) e Salmonella typhi (sorogrupo D). As mais de 1.400 outras salmonelas isoladas em laboratórios clínicos são so- roagrupadas pelos seus antígenos O como A, B, C1, C2, D e E; alguns não são tipáveis com este grupo de antissoros. Em seguida, os microrganismos isolados são remetidos a laboratórios de re- ferência para identificação sorológica definitiva, o que possibilita aos órgãos de saúde pública monitorar e avaliar a epidemiologia das infecções por Salmonella em níveis estadual e nacional. Variação Os microrganismos podem perder antígenos H e tornar-se imó- veis. A perda do antígeno O está associada a uma alteração das CAPÍTULo 15 Bacilos entéricos gram-negativos (Enterobacteriaceae) 239 colônias, que passam de lisas para rugosas. O antígeno Vi pode ser perdido em parte ou completamente. Os antígenos podem ser adquiridos (ou perdidos) no processo de transdução. Patogênese e manifestações clínicas S. typhi, S. choleraesuis, S. paratyphi A e S. paratyphi B são pri- mariamente infecciosas para os seres humanos, e a infecção por esses microrganismos implicava na aquisição a partir de fonte humana. Entretanto, a maioria das salmonelas é princi- palmente patogênica em animais que constituem o reservató- rio para a infecção humana: aves domésticas, porcos, roedores, bovinos, animais de estimação (desde tartarugas até papagaios) e muitos outros. Os microrganismos quase sempre penetram por via oral, geralmente com água ou alimentos contaminados. A dose in- fectante média para causar infecção clínica ou subclínica em se- res humanos é de 105 a 108 salmonelas (podendo talvez ser de apenas 103 microrganismos no caso da Salmonella typhi). Entre os fatores do hospedeiro que contribuem para a resistência à in- fecção por Salmonella destacam-se a acidez gástrica, microbiota intestinal normal e imunidade intestinal local (ver adiante). As salmonelas causam três tipos principais de doença nos seres humanos, embora as formas mistas sejam frequentes (Quadro 15.5). A. “Febres entéricas” (febre tifoide) Esta síndrome é causada apenas por algumas salmonelas, das quais a mais importante é a S. typhi (febre tifoide). As salmonelas ingeridas alcançam o intestino delgado, a partir do qual pene- tram nos vasos linfáticos e, em seguida, na corrente sanguínea. Os microrganismos são transportados pelo sangue para muitos órgãos, inclusive o intestino. As salmonelas multiplicam-se no tecido linfoide intestinal e são excretadas nas fezes. Após um período de incubação de 10 a 14 dias, ocorrem febre, mal-estar, cefaleia, prisão de ventre, bradicardia e mial- gia. A febre aumenta até atingir um patamar elevado, o baço e o fígado tornam-se aumentados. Manchas rosadas, geralmente na pele do abdome ou do tórax, são observadas brevemente em casos raros. A contagem de leucócitos é normal ou baixa. Na fase pré-antibiótica, as principais complicações da febre entérica consistiam em hemorragia e perfuração intestinais, com taxa de mortalidade de 10 a 15%. Porém, o tratamento com antibióticos reduziu essa taxa para menos de 1%. As principais lesões consistem em hiperplasia e necrose do tecido linfoide (p. ex., placas de Peyer), hepatite, necrose focal do fígado e inflamação da vesícula biliar, do periósteo, dos pul- mões e de outros órgãos. B. Bacteriemia com lesões focais Tal quadro está comumente associado a S. choleraesuis, mas pode ser causado por qualquer sorotipo de Salmonella. Após infecção oral, ocorre a invasão precoce da corrente sanguínea (com possíveis lesões focais nos pulmões, nos ossos, nas me- ninges, etc.), mas em geral sem manifestações intestinais. As hemoculturas são positivas. C. Enterocolite Trata-se da manifestação mais comum de infecção por Salmo nella. Nos EUA, S. typhimurium e S. enteritidis são proeminen- tes, porém a enterocolite pode ser causada por qualquer um dos mais de 1.400 sorotipos do grupo I das salmonelas. No de- correr de 8 a 48 horas após a ingestão de salmonelas, ocorrem náuseas, cefaleia, vômitos e diarreia profusa, com poucos leu- cócitos nas fezes. É comum a ocorrência de febre baixa, porém o episódio geralmente desaparece em 2 a 3 dias. Há lesões inflamatórias nos intestinos delgado e grosso. Bac- teriemia é rara (2 a 4%), exceto em indivíduos imunodeficientes. Em geral, as hemoculturas são negativas, porém as coproculturas mostram-se positivas para as salmonelas, podendo permanecer assim por várias semanas após a recuperação clínica. Exames diagnósticos laboratoriais A. Amostras As amostras de sangue para cultura devem ser coletadas repe- tidamente. Nas febres entéricas e septicemias, as hemoculturas são frequentemente positivas na primeira semana da doença. As culturas de medula óssea podem ser úteis. As culturas de urina podem ser positivas depois da segunda semana. As amostras de fezes tambémdevem ser coletadas repe- tidamente. Nas febres entéricas, as fezes fornecem resultados QUADRo 15.5 Doenças clínicas induzidas por Salmonellae Febres entéricas Septicemias Enterocolites Período de incubação 7 a 20 dias Variável 8 a 48 h Início Insidioso Abrupto Abrupto Febre Gradual, passando para alto platô, com estado “tifoidal” Aumento rápido, com pico de temperatura “séptica” Geralmente baixa Duração da doença Algumas semanas Variável 2 a 5 dias Sintomas gastrintestinais Prisão de ventre precoce (com frequência); posteriormente, diarreia com sangue Frequentemente ausentes Náuseas, vômitos, diarreia no início Culturas de sangue Positivas na primeira e na segunda semanas da doença Positivas durante a febre alta Negativas Cultura de fezes Positivas a partir da segunda semana, depois negativas Geralmente negativas Positivas logo após o início 240 SEção III Bacteriologia positivos a partir da segunda ou da terceira semana. Na entero- colite, resultados positivos da coprocultura são obtidos duran- te a primeira semana. A obtenção de uma cultura positiva de drenagem duodenal estabelece a presença de salmonelas no trato biliar de porta- dores. B. Métodos bacteriológicos para isolamento das salmonelas 1. Culturas com meios diferenciais — os meios de cultura EMB, de MacConkey ou de desoxicolato possibilitam a rápi- da detecção dos microrganismos que não fermentam a lacto- se (não apenas salmonelas e Shigelas como também Proteus, Serratia, Pseudomonas, etc.). Os microrganismos gram-posi- tivos são ligeiramente inibidos. O meio de cultura com sulfito de bismuto possibilita uma rápida detecção de salmonelas, as quais formam colônias pretas devido à produção de H2S. Mui- tas salmonelas produzem H2S. 2. Culturas com meios seletivos — a amostra é semeada em ágar para SalmonellaShigella (SS), ágar entérico de Hektoen (HE), ágar desoxicolato-lisina-xilose (XLD) ou ágar de desoxi- colato-citrato, que favorecem mais o crescimento de salmone- las e Shigelas do que o de outras Enterobacteriaceae. 3. Culturas de enriquecimento — a amostra (geralmente fe- zes) também é colocada em caldo de selenito F ou tetrationato, ambos capazes de inibir a replicação das bactérias intestinais normais, permitindo a multiplicação das salmonelas. Após 1 a 2 dias de incubação, o material é semeado em meios de cultura diferenciais e seletivos. 4. Identificação final — as colônias sob suspeita dos meios de cultura sólidos são identificadas com base nos padrões de reações bioquímicas (Quadro 15.1) e testes de aglutinação em lâmina com soros específicos. C. Métodos sorológicos As técnicas sorológicas são utilizadas para identificar culturas desconhecidas com soros conhecidos (ver adiante). Tais técni- cas também podem ser utilizadas para determinar os títulos de anticorpos em pacientes com doença desconhecida, mas isso não é muito útil no diagnóstico de infecções por Salmonella. 1. Teste de aglutinação — soros conhecidos e o material de cultura desconhecido são misturados em uma lâmina. A aglu- tinação, quando ocorre, pode ser observada em poucos minu- tos. Esse teste é particularmente útil para a identificação rápida e preliminar das culturas. Existem kits disponíveis comercial- mente para aglutinação e determinação dos sorogrupos das salmonelas pelos seus antígenos O: A, B, C1, C2, D e E. 2. Teste de aglutinação e diluição em tubo (reação de Widal) — os níveis séricos de aglutininas aumentam acentua- damente durante a segunda e a terceira semanas de infecção por S. typhi. A reação de Widal para detectar esses anticorpos contra os antígenos O e H tem sido utilizada há décadas. São necessárias pelo menos duas amostras de soro, coletadas a um intervalo de 7 a 10 dias, para comprovar uma elevação nos tí- tulos de anticorpos. Diluições seriadas de soro desconhecido são testadas contra antígenos de salmonelas representativas. Resultados falsos positivos e falsos negativos podem ocorrer. O critério interpretativo, quando se testa uma única amostra de soro varia, mas um título contra o antígeno O maior que 1:320 e contra o antígeno H maior que 1:640 é considerado positivo. Títulos elevados de anticorpos contra o antígeno Vi são observados em alguns portadores. Alternativas à reação de Widal incluem o método colorimétrico rápido e os méto- dos de ensaios imunoenzimáticos. Há relatos conflitantes na literatura sobre a superioridade desses métodos em relação à reação de Widal. Resultados de testes sorológicos para a in- fecção por Salmonella não podem ser usados para estabele- cer um diagnóstico definitivo para a febre tifoide e são mais frequentemente utilizados em áreas no mundo de poucos re- cursos, quando as culturas de sangue não estão prontamente disponíveis. Imunidade As infecções por S. typhi ou S. paratyphi geralmente confe- rem certo grau de imunidade. Pode ocorrer reinfecção, porém costuma ser mais leve que a primeira infecção. Os anticorpos circulantes contra os antígenos O e Vi estão relacionados com resistência à infecção e doença. Entretanto, podem ocorrer re- cidivas 2 a 3 semanas após a recuperação, apesar da produção de anticorpos. Os anticorpos IgA secretores podem impedir a fixação das salmonelas ao epitélio intestinal. Os indivíduos com hemoglobina S/S (anemia falciforme) são excessivamente suscetíveis a infecções por Salmonella, em particular osteomielite. Aqueles com hemoglobina A/S (traço falciforme) podem ser mais suscetíveis que os indivíduos nor- mais (com hemoglobina A/A). Tratamento Apesar de as febres entéricas e a bacteriemia com lesões focais exigirem tratamento antimicrobiano, a maioria dos casos de enterocolite não necessita de tratamento. O tratamento anti- microbiano da enterite por Salmonella em recém-nascidos é importante. Na enterocolite, os sintomas clínicos e a excreção das salmonelas podem ser prolongados pela terapia antimicro- biana. Na diarreia grave, é essencial proceder a uma reposição de líquidos e eletrólitos. A terapia antimicrobiana das infecções invasivas por Sal monella é realizada com ampicilina, sulfametoxazol-trime- toprima ou cefalosporina de terceira geração. A resistência a vários fármacos, transmitida geneticamente por plasmídeos entre bactérias entéricas, representa um problema nas infec- ções por salmonela. O antibiograma é um importante auxiliar na escolha do antibiótico apropriado. Na maioria dos portadores, os microrganismos persistem na vesícula biliar (particularmente na presença de cálculos biliares) e no trato biliar. Alguns portadores crônicos foram curados ape- nas com ampicilina — porém, na maioria dos casos é necessário combinar a colecistectomia com tratamento medicamentoso. Epidemiologia As fezes dos indivíduos com doença subclínica insuspeita ou portadores constituem uma fonte de contaminação mais CAPÍTULo 15 Bacilos entéricos gram-negativos (Enterobacteriaceae) 241 importante que os casos clínicos evidentes imediatamente iso- lados (p. ex., quando portadores que manipulam alimentos estão “disseminando” os microrganismos). Muitos animais, inclusive bovinos, roedores e aves domésticas, são naturalmen- te infectados por uma variedade de salmonelas e apresentam as bactérias em seus tecidos (carne), excrementos ou ovos. A elevada incidência de salmonelas em frangos comercialmente preparados tem sido amplamente divulgada. A incidência da febre tifoide diminuiu, porém a de outras infecções por Sal monella tem aumentado notavelmente nos EUA. O problema é provavelmente agravado pelo uso disseminado de rações ani- mais contendo antimicrobianos que favorecem a proliferação de salmonelas resistentes a fármacos e sua transmissão poten- cial a seres humanos. A. Portadores Após a ocorrência de infecção manifesta ou subclínica, al- guns indivíduos continuam a abrigar salmonelas em seus te- cidos por um período variável (portadores convalescentes ou permanentes sadios). Cerca de 3% dos sobreviventes da febre tifoide tornam-se portadores permanentes, abrigando osmi- crorganismos na vesícula biliar, no trato biliar ou, raramente, no intestino ou no trato urinário. B. Fontes de infecção Consistem em bebidas e alimentos contaminados com salmo- nelas. As seguintes fontes são importantes: 1. Água — a contaminação com fezes frequentemente resulta em epidemias explosivas. 2. Leite e outros produtos derivados (sorvete, queijo, creme) — contaminação com fezes e pasteurização inadequa- da ou manipulação imprópria. Algumas epidemias podem ser atribuídas à fonte do abastecimento. 3. Frutos do mar — em virtude de água contaminada. 4. ovos desidratados ou congelados — provenientes de aves infectadas ou contaminados durante o processamento. 5. Carnes e derivados — a partir de animais infectados (aves domésticas) ou contaminação com fezes de roedores ou seres humanos. 6. Drogas “recreativas” — maconha e outras drogas. 7. Corantes de origem animal — corantes (p. ex., carmina) utilizados em medicamentos, alimentos e cosméticos. 8. Animais domésticos — tartarugas, cães, gatos e animais exóticos como répteis. Prevenção e controle Devem-se tomar medidas sanitárias para evitar a contamina- ção da água e dos alimentos por roedores ou outros animais que excretam salmonelas. É preciso cozinhar totalmente as aves domésticas, carnes e ovos. Os portadores não devem tra- balhar na manipulação de alimentos e precisam seguir precau- ções higiênicas estritas. Duas vacinas contra a febre tifoide estão atualmente dis- poníveis nos EUA, uma vacina atenuada administrada por via oral e uma vacina polissacarídica produzida com polissacarí- deo Vi para uso intramuscular*. A vacinação é recomendada para indivíduos em viagem para áreas endêmicas, especial- mente regiões rurais e pequenas cidades, em que as opções de comida são limitadas. Ambas as vacinas apresentam um grau de eficiência de 50 a 80%. O tempo necessário para imunização e a idade limite variam para cada tipo de vacina e os indivídu- os devem consultar o site do Centers for Disease Control and Prevention (CDC). resumo do caPítulo • Os membros da família Enterobacteriaceae são bastonetes gram-negativos, que geralmente apresentam bom cresci- mento em meios laboratoriais usuais. • Os membros desse grupo são catalase e nitrato-positivos e, com exceção de Plesiomonas, são todos oxidase-positivos. Esses microrganismos podem ser rapidamente identifica- dos pela habilidade de fermentar a lactose em meio Mac- Conkey e outras reações bioquímicas, ou ainda por novas tecnologias como o MALDI-TOF. • As Enterobacteriaceae expressam uma variedade de antí- genos que incluem o antígeno somático O (lipopolissaca- rídeo), o capsular K e o flagelar H. As espécies de Salmonella expressam os antígenos Vi. Esses antígenos são fatores de virulência e podem ser usados para sorotipagem desses mi- crorganismos. • As Enterobacteriaceae causam uma série de infecções huma- nas, que podem ser classificadas em doenças entéricas e doen- ças extraintestinais, como, por exemplo, infecções urinárias. • Os gêneros associados a doenças entéricas incluem: Sal monella, Shigella e Escherichia diarreiogênica. A E. coli apresenta pelo menos seis cepas baseadas em diferentes me- canismos de patogenicidade e fatores de virulência (p. ex., capacidade toxigênica ou invasiva). • A infecção extraintestinal mais comum causada por esses microrganismos é a infecção urinária. A E. coli é o agente etiológico mais comum, porém microrganismos urease- positiva, como espécies de Proteus, podem causar cistites e induzir a formação de cálculos renais. • As espécies de Enterobacteriaceae adquiridas em ambien- te hospitalar são geralmente resistentes a diferentes anti- bióticos. Questões de reVisão 1. Uma estudante universitária de 20 anos e idade foi ao centro de saúde por apresentar disúria e frequência urinária durante 24 horas. Ela tornou-se sexualmente ativa recentemente. Ao exame de urina, foram vistas muitas células polimorfonucleares. O microrganismo que tem maior probabilidade de ser o respon- sável por estes sinais e sintomas é: * N. de R.T. No Brasil, está disponível a vacina polissacarídica, fora do calendário vacinal, conhecida como Typhim Vi. Esta vacina apresenta efi- cácia de até 75%, oferecendo proteção contra a doença durante aproxima- damente três anos. 242 SEção III Bacteriologia (A) Staphylococcus aureus (B) Streptococcus agalactiae (C) Gardnerella vaginalis (D) Espécies Lactobacillus (E) Escherichia coli 2. Uma mulher de 27 anos de idade é admitida em um hospital de- vido a febre, com anorexia progressiva, dor de cabeça, fraqueza e estado mental alterado nos últimos 2 dias. Ela trabalha em uma companhia aérea como aeromoça, voando entre a Índia e outras regiões do Sudeste Asiático e a Costa-Oeste dos EUA. Dez dias antes de sua admissão no hospital, apresentou diarreia que durou cerca de 36 horas. Nos últimos 3 dias, apresentou prisão de ventre. A temperatura é de 39°C, pulso médio de 68/minuto, pressão san- guínea de 120/80 mmHg e 18 respirações por minuto. A paciente sabe quem ela é e onde está, mas não lembra a data. Apresenta lucidez para pegar suas roupas de cama. Observam-se manchas rosadas em seu tronco. O restante do exame físico é normal. São realizadas hemoculturas e um acesso intravenoso é colocado. O mais provável agente causador de sua doença é: (A) Escherichia coli enterotoxigênica (ETEC) (B) Shigella sonnei (C) Salmonella enterica subespécie enterica sorotipo typhimu rium (Salmonella typhimurium) (D) Salmonella enterica subespécie enterica sorotipo typhi (Sal monella typhi) (E) Escherichia coli enteroinvasiva (EIEC) 3. Na hemocultura da paciente da Questão 2, houve o crescimento de bacilo gram-negativo não fermentador de lactose. Qual das seguintes alternativas é um provável componente desse micror- ganismo? (A) Antígeno O 157, antígeno H 7 (O157:H7) (B) Antígeno Vi (cápsula; antígeno de virulência) (C) Antígeno O 139 (O139) (D) Urease (E) K1 (antígeno capsular tipo 1) 4. Uma mulher de 37 anos de idade com história de infecções do trato urinário foi internada em enfermaria de emergência com ardor ao urinar além de frequência e urgência urinária. Relatou que sua urina tem odor de amônia. A causa mais provável de sua infecção urinária é: (A) Enterobacter aerogenes (B) Proteus mirabilis (C) Citrobacter freundii (D) Escherichia coli (E) Serratia marcescens 5. Um estudante de 18 anos de idade teve cólicas abdominais e diarreia. Foi inoculada uma placa de ágar de MacConkey onde cresceram bacilos gram-negativos. O ágar de ferro tríplice (TSI) é usado para triar os isolados para salmonelas e Shigelas. Um re- sultado sugestivo de um destes dois patógenos pode ser: (A) Produção de urease (B) Motilidade no meio (C) Incapacidade de fermentar lactose e sacarose (D) Fermentação da glicose (E) Produção de gás no meio 6. Um sorotipo incomum da Salmonella enterica subespécie ente rica foi encontrado pelos laboratórios de saúde de estados adja- centes. Todos os isolados eram de uma pequena área geográfica situada entre os dois estados, sugerindo uma fonte comum para os isolados. (Os isolados eram provenientes de adultos jovens e saudáveis que haviam fumado maconha; a mesma salmonela foi isolada de uma amostra de maconha.) Por qual método o labora- tório pode determinar que esses isolados são os mesmos? (A) Tipagem do antígeno capsular (antígeno K) (B) Tipagem dos antígenos O e H (C) Sequenciamento do DNA (D) Determinação dos padrões de fermentação dos açúcares (E) Determinação dos padrões da reação da descarboxilase 7. Um homem de 43 anos de idade, diabético, teve uma úlcera aberta de 4 cm no pé. Na cultura de material da úlcera cresceram Sta phylococcus aureus, Bacteroides fragilis e um bacilo gram-nega- tivo, o qual formou um véu que cobriu a superfície da placa de ágar após 36 h. O bacilo gram-negativo é um membro do gênero: (A) Escherichia (B) Enterobacter (C) Serratia (D) Salmonella (E) Proteus 8. Um menino de 4 anos de idade, de Kansas City, que
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