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XXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXX Secção transversal de vilosidades intestinais (reforçado em vermelho). Dê-me uma boa digestão, Senhor, e também algo para digerir. Anônimo, A graça do peregrino. TÓPICOS ABORDADOS E OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM Anatomia do sistema digestório 655 21.1 Traçar o caminho de um pedaço de alimento não digerido da boca ao ânus. 21.2 Descrever as quatro camadas da parede do trato GI. Funções e processos digestórios 659 21.3 Descrever a função primária do sistema digestório. 21.4 Explicar os desafios da autodigestão, do balanço de massas e da defesa. 21.5 Descrever e comparar secreção, digestão, absorção e motilidade. 21.6 Descrever músculo liso unitário, potenciais de ondas lentas e contrações fásicas e tônicas. 21.7 Descrever e comparar peristaltismo, segmentação e complexo motor migratório. Regulação da função gastrintestinal 664 21.8 Comparar o sistema nervoso entérico com o sistema nervoso central. 21.9 Diferenciar reflexos longos, reflexos curtos e controle GI envolvendo peptídeos. 21.10 Citar as três famílias de hormônios GI e dar exemplos de cada uma. Função integrada: a fase cefálica 667 21.11 Explicar o controle por antecipação na digestão. 21.12 Mapear os processos e as vias de controle da fase cefálica. 21.13 Explicar as funções da saliva e o processo pelo qual ela é secretada. 21.14 Listar os passos do reflexo da deglutição (engolimento). Função integrada: a fase gástrica 669 21.15 Explicar as três funções do estômago. 21.16 Mapear os processos e as vias de controle da fase gástrica. 21.17 Descrever as secreções gástricas e as suas principais ações. Função integrada: a fase intestinal 672 21.18 Comparar e diferenciar digestão e motilidade nos intestinos grosso e delgado. 21.19 Descrever a anatomia e a função do sistema porta-hepático. 21.20 Descrever as principais secreções do pâncreas e do fígado. 21.21 Esquematizar os mecanismos celulares para secreção e para absorção de água e de íons. 21.22 Esquematizar a digestão e a absorção de carboidratos, de proteínas e de lipídeos. 21.23 Explicar o controle neural e hormonal da fase intestinal da digestão. 21.24 Explicar o papel das bactérias no intestino. Funções imunes do trato gastrintestinal 687 21.25 Descrever o GALT. 21.26 Diferenciar os reflexos protetores do vômito e da diarreia. CONHECIMENTOS BÁSICOS 16 Retroalimentação positiva e controle por antecipação 29 Biomoléculas 62 Micelas 68 Microvilosidades 72 Junções celulares 150 Epitélio de transporte 79 Membranas apicais e basolaterais 79 Glândulas endócrinas e exócrinas 99 Enzimas 113 Síntese e armazenamento de proteínas 143 Transporte ativo secundário 148 Exocitose e transcitose 403 Músculo liso 439 Sistemas portais 499 Linfáticos 604 Transporte renal 645 Acidificação da urina Sistema Digestório21 Fisiologia humana: uma abordagem integrada 655 U m ferimento no estômago, provocado por um tiro de es- pingarda, parece ser um início improvável para o estudo científico dos processos digestórios. Todavia, em 1822, no forte Mackinac, um jovem caçador canadense, chamado Alexis St. Martin, escapou por um triz da morte quando uma arma dis- parou a um metro dele, rasgando seu tórax e abdome e deixando um buraco na parede do seu estômago. O cirurgião do Exército dos Estados Unidos, William Beaumont, atendeu-o e cuidou dele durante dois anos até a sua recuperação. A ferida aberta no estômago não foi adequadamente curada, deixando uma f istula, ou abertura, para o lúmen. Como St. Martin era carente e incapaz de cuidar de si mesmo, Beau- mont “manteve-o com sua família para o propósito especial de realizar experimentos fisiológicos”. Em um documento legal, St. Martin até concordou em “obedecer, sofrer e cumprir com todas as experiências razoáveis e adequadas do referido William (Beaumont) em relação à... exposição... de seu estômago e a força e propriedades... e estados de seu conteúdo.” As observações de Beaumont sobre a digestão e sobre o estado do estômago de St. Martin sob várias condições fo- ram uma sensação. Em 1832, logo antes de as observações de Beaumont serem publicadas, a natureza do suco gástrico e da digestão no estômago foram objetos de muito debate. As obser- vações cuidadosas de Beaumont avançaram muito na resolução desse mistério. Assim como os médicos antigos provavam a uri- na quando faziam um diagnóstico, Beaumont provou o sabor do revestimento mucoso do estômago e o suco gástrico. Ele descre- veu que ambos eram “salgados”, mas o muco não era nada ácido, e o líquido gástrico era muito ácido. Beaumont coletou grande quantidade do líquido gástrico por meio da fístula, e, em experi- mentos controlados, ele confirmou que o líquido gástrico digeria carne, utilizando-se uma combinação de ácido clorídrico e outro fator ativo, que hoje se sabe que é a enzima pepsina. Essas observações e outras sobre motilidade e digestão no estômago se tornaram a base do que conhecemos sobre a fisio- logia digestória. Embora as pesquisas hoje sejam realizadas mais em nível celular e molecular, os pesquisadores ainda criam fístu- las cirúrgicas em animais experimentais para observar e coletar amostras do conteúdo do trato digestório. Por que o sistema digestório – também referido como sis- tema gastrintestinal – é de tanto interesse? A razão é que, atual- mente, as doenças gastrintestinais correspondem a cerca de 10% do dinheiro gasto em cuidados de saúde. Muitas destas condições, como azia, indigestão, gases e constipação, são problemas que cau- sam mais desconforto do que riscos à saúde, mas o seu significa- do não deve ser subestimado. Se você for a qualquer farmácia e observar o número de medicamentos relacionados a distúrbios di- gestórios, pode estimar o impacto que essas doenças têm em nossa sociedade. Neste capítulo, examinaremos o sistema gastrintestinal e o modo extraordinário pelo qual ele transforma a comida que ingerimos em nutrientes que são utilizados pelo corpo. ANATOMIA DO SISTEMA DIGESTÓRIO O sistema digestório inicia com a cavidade oral (boca e faringe), que servem de receptáculo para a comida (FIG. 21.1a). O alimento ingerido entra no trato gastrintestinal (trato GI), que consiste em esôfago, estômago, intestino delgado e intestino grosso. A porção do trato GI que vai do estômago até o ânus tam- bém é chamada de intestino. A digestão, a quebra química e mecânica do alimento, ocorre principalmente no lúmen do intestino. Ao longo do cami- nho, secreções são adicionadas ao alimento por células secretoras epiteliais e por órgãos glandulares acessórios, que incluem as glân- dulas salivares, o fígado, a vesícula biliar e o pâncreas. A mistura pastosa de alimento e secreções é conhecida como quimo. O trato GI é um longo tubo com paredes musculares alinhadas por um epitélio secretor e transportador (p. 150). Em intervalos ao longo do trato, anéis musculares funcionam como esf incteres para separar o tubo em segmentos com funções distintas. O alimento move-se pelo trato, sendo propelido por ondas de contrações musculares. Os produtos da digestão são absorvidos através do epitélio intestinal e passam para o líquido intersticial. De lá eles vão para o sangue ou para a linfa e são distribuídos para todo o corpo. Qualquer resíduo remanescente no lúmen ao final do trato GI deixa o corpo através de uma abertura, chamada de ânus. Uma vez que o sistema digestório se abre para o exterior, o lúmen do trato e seus conteúdos são, na verdade, parte do ambiente externo. (Pense em um orifício que atravessa o centro de uma péro- la) (Fig. 1.2, p. 4). Isso permite que uma incrível variedade de bac- térias vivam no lúmen, particularmente no intestino grosso. Este arranjo é comumente descrito como uma relação comensalismo, em que as bactérias se beneficiam de ter o fornecimento de uma casa e comida, ao passo que o corpo humano não é afetado. Entretan- to, estamos descobrindo meiospelos quais o corpo se beneficia de suas companheiras bactérias. A relação entre seres humanos e seus microbiomas bacterianos é um tema importante na fisiologia hoje, e você aprenderá mais sobre isso ao final deste capítulo. O sistema digestório é um tubo Na cavidade oral, os primeiros estágios da digestão iniciam com a mastigação e a secreção da saliva por três pares de glândulas salivares: glândulas sublinguais abaixo da língua, glândulas sub- mandibulares abaixo da mandíbula (osso maxilar) e glândulas paró- tidas encontradas perto da articulação da mandíbula (Fig. 21.1b). SOLUCIONANDO O PROBLEMA Cólera no Haiti Brooke estava procurando o que fazer nas suas férias de inverno de 2013, então ela se ofereceu para participar de uma equipe de socorro no Haiti. Após a sua chegada ao país devastado pelo terremoto, Brooke estava consternada com as condições de vida. Muitas pessoas ainda estavam vivendo em tendas com pouca ou nenhuma água corrente e saneamento. Para piorar a situação, em outubro de 2010, a Organização Mundial da Saúde (OMS) tinha emitido um alerta de epidemia global de cólera. O Vibrio cholerae, a bactéria da cólera, causa vômitos e volumes massivos de diarreia aquosa em pessoas que consumiram alimentos ou água contaminados. Não havia cólera no Haiti há cerca de cem anos, mas nos anos desde o terremoto, foram reporta- dos cerca de 700 mil casos e 8 mil mortes. 672659655 675 682 688 FIGURA 21.1 RESUMO ANATÔMICO Sistema digestório Cavidade oral Glândulas salivares Esôfago Pâncreas Estômago Intestino delgado Reto Intestino grosso Prega circular Mesentério Vilosidades Glândulas submucosas Serosa Submucosa Mucosa Vesícula biliar Fígado Esôfago Sublingual Submandibular Parótida Antro Piloro Dobras: a superfície dobrada aumenta a área Fundo Diafragma Corpo Músculo circular Músculo longitudinal (c) Estômago (d) Estrutura do intestino delgado (a) Visão geral do sistema digestório (b) Glândulas salivares Cite as glândulas acessórias e os órgãos do sistema digestório. QUESTÃO DA FIGURAQ (e) Vista seccionada do estômago (f) Vista seccionada do intestino delgado No estômago, a área de superfície é aumentada por invaginações, chamadas de glândulas gástricas. A área da superfície intestinal é aumentada por vilosidades semelhantes a dedos e por invaginações, chamadas de criptas. Epitélio Vaso linfático Plexo mioentérico Mucosa Muscular da mucosa Submucosa Músculo circular Músculo longitudinal Serosa Cripta Placa de Peyer Vaso linfático Plexo mioentérico Artéria e veia submucosas Artéria e veia Plexo submucoso Lâmina própria Muscular da mucosa Mucosa Submucosa Músculo circular Músculo longitudinal Serosa Abertura da glândula gástrica Camada oblíqua Vilosidades Muscular externa Muscular externa 658 Dee Unglaub Silverthorn O alimento deglutido passa pelo esôfago, um tubo estreito que atravessa o tórax até o abdome (Fig. 21.1a). As paredes do esôfago são constituídas de músculo esquelético no terço superior, mas so- frem transição para músculo liso nos dois terços inferiores. Logo abaixo do diafragma, o esôfago termina no estômago, um órgão em forma de saco que pode conter até dois litros de alimento e líquidos quando totalmente (embora desconfortavelmente) ex- pandido. O estômago tem três seções: o fundo superior, o corpo central e o antro inferior (Fig. 21.1c). O estômago continua a digestão que iniciou na boca, misturando o alimento com ácido e enzimas para criar o quimo. A abertura entre o estômago e o intestino delgado, ou piloro (porteiro), é protegida pela válvula pilórica. Esta faixa espessa de músculo liso relaxa para permitir que apenas pequenas quantidades de quimo entrem no intestino delgado simultaneamente. O estômago atua como um intermediário entre o ato com- portamental de comer e os eventos fisiológicos da digestão e da absorção no intestino. Sinais integrados e alças de retroalimenta- ção entre o intestino e o estômago regulam a velocidade na qual o quimo entra no duodeno. Isso garante que o intestino não seja sobrecarregado com mais do que ele pode digerir e absorver. A maior parte da digestão ocorre no intestino delgado, que possui três seções: o duodeno (os primeiros 25 cm), o je- juno e o íleo (os últimos dois, juntos, têm cerca de 260 cm de comprimento*). A digestão é realizada por enzimas intestinais, auxiliadas por secreções exócrinas de dois órgãos glandulares acessórios: o pâncreas e o fígado (Fig. 21.1a). As secreções desses dois órgãos entram na porção inicial do duodeno por ductos. Um esfincter tonicamente contraído (o esfincter hepatopancreático, ou esf incter de Oddi) impede que o líquido pancreático e a bile entrem no intestino delgado, exceto durante uma refeição. A digestão termina no intestino delgado, e quase todos os nutrientes digeridos e os fluidos secretados são absrovidos lá, deixando cerca de 1,5 litro de quimo por dia passar para o intes- tino grosso (Fig. 21.1a). No colo – a secção proximal do intesti- no grosso – o quimo aquoso transforma-se em fezes semissólidas à medida que a água e os eletrólitos são absorvidos do quimo para o líquido extracelular (LEC). Quando as fezes são propelildas para a seção terminal do intestino grosso, conhecida como reto, a distenção da parede re- tal desencadeia o reflexo de defecação. As fezes deixam o trato GI pelo ânus, sendo que o esfincter anal externo, constituído de músculo esquelético, está sob controle voluntário. Em uma pessoa viva, o sistema digestório da boca até o ânus tem cerca de 450 cm de comprimento. Deste comprimento, 395 cm consistem nos intestinos grosso e delgado. Tente imagi- nar 3,95 metros de corda, com 2,5 a 7,5 centímetros de diâmetro, toda enrolada dentro do seu abdome, do umbigo para baixo. O arranjo apertado dos órgãos abdominais ajuda a explicar por que você sente necessidade de soltar o seu cinto após ingerir uma grande quantidade de comida. As medidas do comprimento intestinal feitas durante au- tópsias são aproximadamente o dobro daquelas dadas aqui, uma vez que, após a morte, os músculos longitudinais do trato intesti- *N. de R.T. Referência do comprimento do intestino delgado de um in- divíduo vivo. nal relaxam. Esse relaxamento é responsável pela ampla variação na extensão do intestino descrita em diferentes referências. A parede do trato gastrintestinal possui quatro camadas A estrutura básica da parede gastrintestinal é similar no estôma- go e nos intestinos, embora existam variações de uma seção do trato GI para outra (Fig. 21.1e, f ). A parede intestinal é enrugada em dobras para aumentar a sua área de superfície. Essas dobras são chamadas de pregas no estômago e de dobras no intestino delgado. A mucosa intestinal também se projeta para o lúmen em pequenas extensões similares a dedos, denominadas vilosi- dades (Fig. 21.1f ). Mais área de superfície é adicionada por in- vaginações tubulares da superfície, que se estendem para dentro do tecido conectivo de sustentação. Essas invaginações são deno- minadas glândulas gástricas no estômago e criptas no intestino. Algumas das invaginações mais profundas formam glândulas submucosas secretoras que se abrem para o lúmen através de ductos. A parede intestinal consiste em quatro camadas: (1) uma mucosa interna virada para o lúmen, (2) uma camada conhecida como submucosa, (3) camadas de músculo liso, conhecidas cole- tivamente como muscular externa, e (4) uma cobertura de tecido conectivo, denominada serosa. Mucosa A mucosa, o revestimento interno do trato gastrintes- tinal, tem três camadas: uma única camada de epitélio mucoso vi- rado para o lúmen; a lâmina própria, tecido conectivo subepitelial que segura o epitélio no lugar; e a muscular da mucosa, uma fina camada de músculo liso. Várias modificações estruturais aumen- tam a área da superfície da mucosa, a fim de aumentar a absorção. 1. O epitélio mucoso possui a mais variável característica do trato GI,mudando de seção para seção. As células da mu- cosa incluem células epiteliais transportadoras (chamadas de enterócitos no intestino delgado), células secretoras en- dócrinas e exócrinas e células-tronco. Na superfície mu- cosa do epitélio (apical) (p. 79), as células secretam íons, enzimas, muco e moléculas parácrinas para o lúmen. Na superfície serosa do epitélio (basolateral), as substâncias absorvidas do lúmen e as moléculas secretadas por células epiteliais entram no LEC. As junções célula a célula que unem as células epite- liais do trato GI variam (p. 72). No estômago e no colo, as junções formam uma barreira impermeável, de modo que pouco pode passar entre as células. No intestino delgado, as junções não são tão apertadas. Este epitélio intestinal é considerado “permeável”, uma vez que parte da água e dos solutos pode ser absorvida entre as células (via paracelular), em vez de através delas. Agora, sabemos que as junções possuem plasticidade e que a sua permeabilidade e seleti- vidade podem ser reguladas em algum grau. As células-tronco GI são células indiferenciadas que se dividem rapidamente e produzem de forma contínua um novo epitélio nas criptas e nas glândulas gástricas. À me- dida que as células-tronco se dividem, as células recém- -formadas são empurradas em direção à superfície luminal do epitélio. A duração média de uma célula epitelial GI é Fisiologia humana: uma abordagem integrada 659 de apenas poucos dias, um bom indicador da vida dura que essas células têm. Como ocorre em outros tipos de epitélio, a rápida renovação e a taxa de divisão celular no trato GI torna esses órgãos suscetíveis ao desenvolvimento de cân- cer. Em 2013, os cânceres de colo e de reto (câncer colorre- tal) foram a terceira causa de morte por câncer nos Estados Unidos. Entretanto, a taxa de mortalidade tem caído, devi- do a mais exames de rastreio e melhores tratamentos. 2. A lâmina própria é o tecido conectivo subepitelial que con- tém fibras nervosas e pequenos vasos sanguíneos e linfáti- cos. Os nutrientes absorvidos passam para o sangue e para a linfa aqui (Fig. 21.1e). Esta camada também contém cé- lulas imunes patrulhadoras, como macrófagos e linfócitos, que patrulham invasores que tenham entrado através de rupturas do epitélio. No intestino, coleções de tecido linfoide adjacente ao epitélio formam pequenos nódulos e grandes placas de Peyer, que criam inchaços visíveis na mucosa (Fig. 21.1f ). Estes agregados linfáticos constituem a maior parte do te- cido linfático associado ao intestino (GALT). 3. A muscular da mucosa, uma fina camada de músculo liso, separa a lâmina própria da submucosa. A contração dos músculos dessa camada altera a área de superfície efetiva para absorção por mover as vilosidades em vai e vem, como a ondulação dos tentáculos de uma anêmona-do-mar. Submucosa A submucosa é a camada média da parede do intestino. Ela é composta de tecido conectivo com grandes vasos sanguíneos e linfáticos passando por ela (Fig. 21.1e, f ). A submucosa também contém o plexo submucoso, uma das duas principais redes nervosas do sistema nervoso entérico (p. 229). O plexo submucoso (também chamado de plexo de Meissner) inerva as células na camada epitelial, bem como o músculo liso da muscular da mucosa. Muscular externa A parede externa do trato gastrintestinal, a muscular externa, consiste primariamente de duas camadas de músculo liso: uma camada interna circular e uma camada externa longitudinal (Fig. 21.1d, f ). A contração da camada circular di- minui o diâmetro do lúmen. A contração da camada longitudinal encurta o tubo. O estômago possui uma terceira camada incom- pleta de músculo oblíquo entre a camada muscular circular e a submucosa (Fig. 21.1e). A segunda rede nervosa do sistema nervoso entérico, o plexo mioentéricoo, situa-se entre as camadas musculares lon- gitudinal e circular. O plexo mioentérico (também chamado de plexo de Auerbach) controla e coordena a atividade motora da ca- mada muscular externa. Serosa O revestimento exterior de todo o trato digestório, a serosa, é uma membrana de tecido conectivo que é uma continu- ação da membrana peritoneal (peritônio) que reveste a cavidade abdominal (p. 59). O peritônio também forma o mesentério, que mantém o intestino no lugar para que ele não fique enroscado quando se move. A próxima seção é uma breve visão sobre os quatro pro- cessos de secreção, digestão, absorção e motilidade. A fisiologia gastrintestinal é um campo em rápida expansão, e este livro não tenta incluir tudo. Em vez disso, ele concentra-se em aspectos gerais selecionados da fisiologia digestória. REVISANDO CONCEITOS 1. O lúmen do trato digestório está no lado apical ou basolateral do epitélio intestinal? Na superfície serosa ou mucosa? 2. Cite as quatro camadas da parede do trato GI, iniciando pelo lúmen e seguindo para fora. 3. Cite as estruturas pelas quais uma porção de alimento passa à medida que vai da boca ao ânus. FUNÇÕES E PROCESSOS DIGESTÓRIOS A função primária do sistema digestório é levar os nutrientes, a água e os eletrólitos do ambiente externo para o ambiente interno corporal. Para alcançar esse objetivo, o sistema usa qua- tro processos básicos: digestão, absorção, secreção e motilida- de (FIG. 21.2). A digestão é a quebra, ou degradação, química e mecânica dos alimentos em unidades menores que podem ser levadas através do epitélio intestinal para dentro do corpo. A absorção é o movimento de substâncias do lúmen do trato GI para o líquido extracelular. A secreção no trato GI possui dois significados. Ela pode significar o movimento de água e íons do LEC para o lúmen do trato digestório (o oposto da absorção), mas pode também significar a liberação de substân- cias sintetizadas pelas células epiteliais do GI tanto no lúmen quanto no LEC. A motilidade é o movimento de material no trato GI como resultado da contração muscular. Embora possa parecer simples digerir e absorver alimen- tos, o sistema digestório enfrenta três desafios significativos: 1. Evitar a autodigestão. O alimento que comemos está princi- palmente sob a forma de macromoléculas, como proteínas e carboidratos complexos, de modo que o nosso sistema SOLUCIONANDO O PROBLEMA Enfrentando uma epidemia de cólera no país, os mem- bros da equipe de socorro estavam apreensivos. Um tra- balhador do Centers for Disease Control and Prevention (CDC) dos Estados Unidos falou para o grupo sobre as precauções adequadas. Ele avisou-os para terem cuida- do com o que eles comiam e bebiam e para lavarem suas mãos frequentemente. Em seguida, em cerca de cinco dias de viagem, Brooke teve um surto de diarreia abun- dante e aquosa, que ela inicialmente atribuiu ao estresse emocional do trabalho de assistência. Contudo, quando teve tonturas e taquicardia, ela foi para a tenda médica. Lá, ela foi diagnosticada com desidratação causada pela diarreia induzida pela cólera. P1: Dada a diarreia aquosa de Brooke, como você esperaria que estivesse o volume de LEC dela? P2: Por que Brooke teve taquicardia? 672659655 675 682 688 660 Dee Unglaub Silverthorn digestório precisa secretar enzimas potentes para digerir os alimentos em moléculas que sejam pequenas o suficiente para serem absorvidas pelo corpo. Ao mesmo tempo, en- tretanto, essas enzimas não devem digerir o próprio trato GI (autodigestão). Se os mecanismos protetores contra a autodigestão falharem, escoriações, conhecidas como úlce- ras pépticas, desenvolvem-se nas paredes do trato GI. 2. Balanço de massa. Outro desafio que o sistema digestório enfenta diariamente é a manutenção do balanço de massa por meio da combinação da entrada e saída de líquidos (FIG. 21.3). As pessoas ingerem cerca de 2 litros de líqui- do por dia. Além disso, as glândulas e as células exócri- nas secretam aproximadamente 7 litros de enzimas, muco, eletrólitos e água no lúmen do trato GI. Estevolume de líquido secretado é o equivalente a um sexto da água corporal total (42 litros), ou mais de duas vezes o volume plasmático de 3 litros. Se o líquido secretado não puder ser absorvido, o corpo desidratará rapidamente. 3. Normalmente, a absorção é muito eficiente, e apenas cer- ca de 100 mL de líquido é perdido nas fezes. Entretanto, vômito e diarreia (fezes excessivamente aquosas) podem se tornar uma emergência quando as secreções GI são perdidas para o ambiente, em vez de serem reabsorvidas. Em casos graves, esse líquido perdido pode diminuir o vo- lume do líquido extracelular a ponto de o sistema circula- tório ser incapaz de manter a pressão sanguínea adequada. 4. Defesa. O desafio final que o sistema digestório enfrenta é proteger o corpo de invasores estranhos. Ao contrário do que se imagina, a maior área de contato entre o meio interno e o mundo exterior está no lúmen do sistema di- gestório. Como consequência, o trato GI, com sua área de superfície total do tamanho aproximado de uma quadra de tênis, enfrenta diariamente o conflito entre a neces- sidade de absorver água e nutrientes e a necessidade de evitar que bactérias, vírus e outros patógenos entrem no corpo. Para isso, o epitélio transportador do trato GI é auxiliado por um conjunto de mecanismos fisiológicos de defesa, incluindo muco, enzimas digestórias, ácido e a maior coleção de tecido linfático do corpo, o tecido linfá- tico associado ao intestino (GALT). Estima-se que 80% de todos os linfócitos (p. 514) do corpo são encontrados no intestino delgado. O corpo humano enfrenta esses desafios fisiológicos por vezes conflitantes por meio da coordenação entre motilidade e secreção para maximizar a digestão e a absorção. SECREÇÃO DIGESTÃO ABSORÇÃO MOTILIDADE Lúmen do trato digestório Parede Líquido intersticial Sangue Bolo alimentar Digestão Absorção Motilidade Secreção Quebra química e mecânica do alimento em unidades para absorção Movimento de material do lúmen GI para o LEC Movimento do material através do trato GI como resultado da contração muscular Movimento de material das células para o lúmen ou para o LEC FIGURA 21.2 Os quatro processos do sistema digestório. 7,5 L do intestino delgado 1,4 L do intestino grosso 0,1 L nas fezes 9,0 L removidos do lúmen 2 L de alimento e bebida 1,5 L de saliva (glândulas salivares) 0,5 L de bile (fígado) 2 L de secreções gástricas 1,5 L de secreções pancreáticas 1,5 L de secreções intestinais 9 L entrada total no lúmen Absorção Excreção Entrada de líquido no sistema digestório Líquido removido do sistema digestório Ingestão Secreção FIGURA 21.3 Balanço de massa no sistema digestório. Para manter a homeostasia, o volume de líquido que entra no trato GI por ingestão ou secreção deverá ser igual ao volume que deixa o lúmen. Fisiologia humana: uma abordagem integrada 661 Nós secretamos mais líquidos do que ingerimos Em um dia normal, 9 litros de líquido passam através do lúmen do trato gastrintestinal de um adulto – equivalente ao conteúdo de três garrafas de refrigerante de 3 litros. Apenas cerca de 2 litros desse volume entram no sistema GI pela boca. Os 7 litros restantes de líquido vem da água corporal secretada juntamente com íons, enzimas e muco (ver Fig. 21.3). Os íons são transpor- tados do LEC para o lúmen. A água, então, segue o gradiente osmótico criado por esta transferência de solutos de uma lado do epitélio para o outro. A água move-se pelas células epiteliais através de canais ou por junções comunicantes entre as células (a via paracelular). As células epiteliais gastrintestinais, como aquelas dos rins, são polarizadas (p. 150), com membranas apicais e basolate- rais diferentes. Cada superfície celular contém proteínas para o movimento de solutos e de água, muitas delas similares àquelas do túbulo renal. O arranjo das proteínas de transporte nas mem- branas apicais e basolaterais determina a direção do movimento de solutos e de água através do epitélio. Enzimas digestórias As enzimas digestórias são secre- tadas tanto por glândulas exócrinas (glândulas salivares e o pâncreas) quanto por células epiteliais no estômago e no in- testino delgado. As enzimas são proteínas, as quais são sinteti- zadas pelo retículo endoplasmático rugoso, empacotadas pelo aparelho de Golgi em vesículas secretoras e, então, estocadas na células até serem necessárias. Conforme a necessidade, elas são liberadas por exocitose (p. 148). Muitas enzimas intestinais permanecem ligadas às membranas apicais das células intesti- nais, ancoradas por proteínas transmembranas “hastes” ou ân- coras lipídicas (p. 64). Algumas enzimas digestórias são secretadas na forma de proenzimas inativas, conhecidas como zimogênios (p. 100). Os zimogênios devem ser ativados no lúmen GI antes que eles possam realizar a digestão. Sintetizar as enzimas em uma forma não functional permite que elas sejam estocadas nas células que as produzem sem causar dano às mesmas. A nomenclatura dos zimogênios frequentemente tem o sufixo –ogênio adicionado ao nome da enzima, como pepsinogênio. Muco O muco é uma secreção viscosa composta primaria- mente de glicoproteínas, chamadas de mucinas. As principais funções do muco são formar uma cobertura protetora sobre a mucosa GI e lubrificar o conteúdo do intestino. O muco é feito em células exócrinas especializadas, chamadas de células mucosas, no estômago e nas glândulas salivares, e células caliciformes no in- testino (Fig. 3.10, p. 78). As células caliciformes constituem entre 10 e 24% da população celular intestinal. Os sinais para a liberação de muco incluem inervação parassimpática, vários neuropeptídeos encontrados no siste- ma nervoso entérico e citocinas provenientes dos imunócitos. As infecções parasitárias e os processos inflamatórios no trato GI também causam aumento substancial na produção de muco, à medida que o corpo tenta fortalecer suas barreiras protetoras. REVISANDO CONCEITOS 4. Defina digestão. Qual é a diferença entre digestão e metabolismo (p. 102)? 5. Por que o sistema digestório está associado à maior coleção de tecido linfático do corpo? 6. Desenhe uma célula mostrando (1) uma enzima em uma vesícula secretora citoplasmática, (2) a exocitose da vesícula e (3) a enzima permanecendo ligada à superfície da membrana da célula, em vez de indo para longe. A digestão e a absorção tornam o alimento utilizável A maioria das secreções GI facilitam a digestão. O sistema GI di- gere macromoléculas em unidades absorvíveis usando uma com- binação de degradação mecânica e enzimática. A mastigação e a agitação gástrica produzem pedaços menores de alimento com mais área de superfície exposta às enzimas digestórias. O pH no qual as diferentes enzimas digestórias funcionam melhor (p. 100) reflete a localização onde elas são mais ativas. Por exemplo, enzimas que agem no estômago funcionam bem em pH ácido, e aquelas que são secretadas no intestino delgado funcionam melhor em pH alcalino. A maior parte da absorção ocorre no intestino delgado, com absorção adicional de água e de íons no intestino grosso. A absorção, assim como a secreção, utiliza muitas das mesmas proteínas de transporte do túbulo renal. Uma vez absorvidos, os nutrientes entram no sangue ou na circulação linfática. Motilidade: o músculo liso gastrintestinal contrai espontaneamente A motilidade no trato gastrintestinal tem dois propósitos: trans- portar o alimento da boca até o ânus e misturá-lo mecanicamen- te para quebrá-lo uniformemente em partículas pequenas. Essa mistura maximiza a exposição das partículas às enzimas digestó- rias, uma vez que aumenta a sua área de superfície. A motilida- de gastrintestinal é determinada pelas propriedades do músculo liso GI e é modificada por informações químicas dos nervos, doshormônios e dos sinais parácrinos. A maior parte do trato GI é composta por músculo liso unitário, com grupos de células eletricamente conectadas por junções comunicantes (p. 405) para criam segmentos contráteis. Regiões diferentes apresentam diferentes tipos de contração. As contrações tônicas são mantidas por minutos ou horas. Elas ocorrem em alguns esfincteres de músculo liso e na porção apical do estômago. As contrações fásicas, com ciclos de contração- -relaxamento que duram apenas alguns segundos, ocorrem na região distal do estômago e no intestino delgado. Os ciclos de contração e relaxamento do músculo liso são associados a ciclos de despolarização e repolarização, denomi- nados potenciais de ondas lentas, ou simplesmente ondas lentas (FIG. 21.4a). Pesquisas atuais indicam que as ondas lentas são originadas em uma rede de células, chamadas de células inters- ticiais de Cajal (denominadas pelo neuroanatomista espanhol FIGURA 21.4 CONTEÚDO ESSENCIAL QUESTÃO DA FIGURAQ Motilidade gastrintestinal Potencial de membrana (mV) Os potenciais de ação são disparados quando os potenciais das ondas lentas atingem o limiar. A força e a duração da contração muscular são diretamente relacionadas à amplitude e à frequência dos potenciais de ação. Limiar Potencial de ação Onda lenta Força da contração muscular Tempo (b) O complexo motor migratório (MMC) é uma série de contrações que iniciam no estômago vazio e terminam no intestino grosso. (a) As ondas lentas são despolarizações espontâneas no músculo liso GI. Direção do movimento O segmento que recebe relaxaContração Bolo alimentar O bolo move-se para a frente (c) As contrações peristálticas são responsáveis pelo movimento para a frente. Os segmentos alternados contraem e há pouco ou nenhum movimento para a frente. (d) As contrações segmentares são responsáveis pela mistura. Por que os picos das ondas de contração ocorrem depois dos picos dos potenciais de ação? Segundos depois Fisiologia humana: uma abordagem integrada 663 Santiago Ramón y Cajal), ou ICCs. Essas células musculares lisas modificadas estão localizadas entre as camadas de músculo liso e os plexos nervosos intrínsecos, podendo atuar como inter- mediárias entre os neurônios e o músculo liso. Parece que as ICCs funcionam como marca-passos para a atividade de ondas lentas em diferentes regiões do trato GI, bem como as células do sistema de condução cardíaca agem como mar- ca-passos para o coração (p. 455). Os potenciais de ondas lentas diferem dos potenciais de marca-passo miocárdicos, pois as ondas GI ocorrem a uma frequência muito mais baixa (3-12 ondas/min no TGI versus 60-90 ondas/min no miocárdio). A frequência das ondas lentas varia em cada região do trato GI, variando de 3 on- das/min no estômago a 12 ondas/min no duodeno. As ondas lentas, que iniciam espontaneamente nas células intersticiais de Cajal, espalham-se para as camadas musculares lisas adjacentes através de junções comunicantes. Assim como no sistema de condução cardíaco, o marca-passo mais rápido em um grupo de células intersticiais determina o ritmo (“marca o passo”) de todo o grupo (p. 456). A observação de que as células intersticiais parecem coordenar a motilidade GI tem levado os pesquisadores a trabalharem para estabelecer uma associação en- tre as células intersticiais e os distúrbios funcionais do intestino, como a síndrome do colo irritável e a constipação crônica. Outra diferença entre as ondas lentas e os potenciais de marca-passo cardíaco é que as ondas lentas não alcançam o li- miar em cada ciclo e, uma onda lenta que não alcança o limiar não causará contração muscular. Quando um potencial de onda lenta alcança o limiar, canais de Ca 2� dependentes de voltagem na fibra muscular abrem-se, o Ca 2� entra, e a célula dispara um ou mais potenciais de ação. A fase de despolarização do potencial de onda lenta, como nas células miocárdicas autorrítmicas, é o resultado da entrada de Ca 2� na célula. Além disso, a entrada de Ca 2� inicia a contração muscular (p. 407). A contração do músculo liso, como a do músculo cardíaco, é graduada de acordo com a quantidade de Ca 2� que entra na fibra. Quanto maior a duração das ondas lentas, mais potenciais de ação são disparados, e maior é a força da contração muscu- lar. A probabilidade de uma onda lenta disparar um potencial de ação depende principalmente das informações provenientes do sistema nervoso entérico. O músculo liso gastrintestinal apresenta diferentes padrões de contração As contrações musculares no trato gastrintestinal ocorrem em três padrões que levam a diferentes tipos de movimentos no tra- to. Entre as refeições, quando o trato está em grande parte vazio, ocorre uma série de contrações que começam no estômago e pas- sam lentamente de segmento em segmento, levando aproxima- damente 90 minutos para alcançarem o intestino grosso. Este padrão, denominado complexo motor migratório, é uma função de “limpeza da casa” que varre as sobras do bolo alimentar e bac- térias do trato GI superior para o intestino grosso (Fig. 21.4b). As contrações musculares durante e após uma refeição se- guem um dos dois outros padrões. (Fig. 21.4) O peristaltismo são ondas progressivas de contração que se movem de uma seção do trato GI para a próxima, assim como as “ondas” humanas que ondulam em torno de um estádio de futebol ou de uma arena de basquete. No peristaltismo, os músculos circulares contraem o segmento apical a uma massa, ou bolo, de alimento (Fig. 21.4c). Essa contração empurra o bolo para a frente até um segmento receptor, onde os músculos circulares estão relaxados. O segmento receptor, então, contrai, continuando o movimento para a frente. As contrações peristálticas empurram um bolo para a frente a uma velocidade entre 2 e 25 cm/s. O peristaltismo no esôfago propele o material da faringe para o estômago. A peristalse contri- bui para a mistura do bolo no estômago, porém, na digestão normal, as ondas peristálticas intestinais são limitadas a curtas distâncias. Nas contrações segmentares, segmentos curtos (1-5 cm) de intestino contraem e relaxam alternadamente (Fig. 21.4d). Nos segmentos contraídos, o músculo circular contrai, ao pas- so que o músculo longitudinal relaxa. Essas contrações podem ocorrer aleatoriamente ao longo do intestino ou a intervalos re- gulares. As contrações segmentares alternadas agitam o conteúdo intestinal, misturando-o e mantendo-o em contato com o epité- lio absortivo. Quando os segmentos contraem sequencialmente, em uma direção oral-aboral, os conteúdos intestinais são prope- lidos por curtas distâncias. Os distúrbios de motilidade estão entre os problemas gas- trintestinais mais comuns. Eles variam de espasmos esofágicos e retardo do esvaziamento gástrico (estômago) a constipação e diar- reia. A síndrome do colo irritável é um distúrbio funcional crônico caracterizado por alteração dos hábitos intestinais e dor abdominal. REVISANDO CONCEITOS 7. Qual é a diferença entre absorção e secreção? 8. Como as gorduras absorvidas pelo sistema linfático alcançam a circulação geral para a distribuição às células? (Dica: p. 499) 9. Por que alguns esfincteres do sistema digestório são tonicamente contraídos? FOCO CLÍNICO Diabetes: esvaziamento gástrico lento O diabetes melito atinge quase todos os sistemas de ór- gãos. O trato digestório não é exceção. Um problema que assola mais de um terço de todas as pessoas com diabe- tes é a gastroparesia, também chamada de esvaziamento gástrico lento. Nestes pacientes, o complexo motor migra- tório está ausente entre as refeições e o esvaziamento do estômago é lento. Muitos pacientes, como consequência, sofrem de náuseas e vômitos. A causa da gastroparesia diabética não está esclarecida, porém estudos recen- tes com modelos animais e pacientes mostram perda ou disfunção das células intersticiais de Cajal. Essas células funcionam como marca-passos e como ligação entreas células musculares lisas GI e os sistemas nervosos autôno- mo e entérico. Considerando o modelo cardíaco do marca- -passo externo, os pesquisadores estão testando um mar- ca-passo gástrico implantável para promover a motilidade gástrica em pacientes diabéticos com gastroparesia grave. 664 Dee Unglaub Silverthorn REGULAÇÃO DA FUNÇÃO GASTRINTESTINAL Dos quatro processos GI, a motilidade e a secreção são as prin- cipais funções reguladas. Se o alimento se move através do sis- tema muito rapidamente, não haverá tempo suficiente para que tudo no lúmen seja digerido e absorvido. A secreção é regulada para que as enzimas digestórias apropriadas possam quebrar o alimento em formas que possam ser absorvidas. A digestão, por sua vez, depende da motilidade e da secreção. Os cientistas acreditavam que a absorção dos nutrientes não é regulada, e que “você absorve o que você come”. Agora, en- tretanto, evidências indicam que a absorção de alguns nutrientes pode ser alterada em resposta a mudanças ambientais de longo prazo. O sistema nervoso entérico pode atuar de modo independente O sistema nervoso entérico (SNE) foi inicialmente reconhe- cido há mais de um século, quando os cientistas notaram que seções isoladas do intestino removidas do corpo criavam uma onda reflexa de contrações peristálticas quando a pressão do lú- men aumentava. O que eles observaram foi a habilidade do SNE de realizar um reflexo independentemente do controle exercido pelo sistema nervoso central (SNC). A este respeito, o SNE é muito similar às redes nervosas de águas-vivas e de anêmonas-do-mar (filo Cnidaria) (p. 275). Você pode ter visto anêmonas-do-mar sendo alimentadas em um aquário. Quando um pedaço de camarão ou de peixe flutua perto dos seus tentáculos, elas começam a ondular, captando “odores químicos” através da água. Uma vez que o alimento toca o tentá- culo, ele é levado à boca, passando de um tentáculo para o outro até desaparecer dentro da cavidade digestória. Este reflexo é realizado sem um encéfalo, olhos ou um nariz. O sistema nervoso da anêmona consiste em uma rede nervosa com neurônios sensoriais, interneurônios e neurônios eferentes que controlam os músculos e as células secretoras do seu corpo. Os neurônios da rede são ligados de modo que possam integrar a informação e agir sobre ela. Da mesma forma que uma anêmona captura seu alimento, o SNE recebe estímulos e atua sobre eles. O sistema nervoso entérico controla a motilidade, a secreção e o crescimento do trato digestório. Anatômica e funcionalmente, o SNE compartilha muitas características com o SNC: 1. Neurônios intrínsecos. Os neurônios intrínsecos dos dois plexos nervosos do trato digestório são aqueles que se situam completamente dentro da parede do trato GI, exatamente como os interneurônios estão contidos intei- ramente no SNC. Os neurônios autonômicos que levam sinais do SNC para o sistema digestório são denominados neurônios extrínsecos. 2. Neurotransmissores e neuromoduladores. Os neurônios do SNE liberam mais de 30 neurotransmissores e neuromo- duladores, a maioria dos quais são idênticos a moléculas encontradas no encéfalo. Esses neurotransmissores são algumas vezes chamados de não adrenérgicos, não colinér- gicos para os distinguir dos neurotransmissores autonô- micos tradicionais, noradrenalina e acetilcolina. Entre os neurotransmissores e neuromoduladores mais conheci- dos estão a serotonina, o peptídeo intestinal vasoativo e o óxido nítrico. 3. Células gliais de sustentação. As células gliais de susten- tação dos neurônios dentro do SNE são mais similares à astroglia do encéfalo do que às células de Schwann do sis- tema nervoso periférico. 4. Barreira de difusão. Os capilares que circundam os gân- glios no SNE não são muito permeáveis e criam uma bar- reira de difusão que é similar à barreira hematencefálica dos vasos sanguíneos encefálicos. 5. Centros integradores. Como observado anteriormente, re- flexos que se originam no trato GI podem ser integrados e atuar sem que os sinais neurais deixem o SNE. Assim, a rede de neurônios do SNE é o seu próprio centro integra- dor, assim como o encéfalo e a medula espinal. Acreditava-se que se pudéssemos explicar como o SNE integra comportamentos simples, poderíamos usar tal sistema como modelo para o funcionamento do SNC. Todavia, estudar o funcionamento do SNE é difícil, pois os reflexos entéricos não possuem um centro de comando distinto. Em vez disso, em uma tendência interessante, os fisiologistas GI estão aplicando infor- mações obtidas de estudos do encéfalo e da medula espinal para investigar o funcionamento do SNE. As complexas interações entre o SNE, o SNC, o sistema endócrino e o sistema imune prometem abastecer os cientistas com questões para serem inves- tigadas durante muitos anos. Reflexos curtos integrados no sistema nervoso enté- rico Os plexos nervosos entéricos na parede intestinal agem como um “pequeno cérebro”, permitindo que reflexos locais se- jam iniciados, integrados e finalizados completamente no trato GI. (FIG. 21.5, setas vermelhas). Os reflexos que se originam dentro do sistema nervoso entérico (SNE) e são integrados por ele sem sinais externos são denominados reflexos curtos. O plexo submucoso contém neurônios sensoriais que recebem sinais do lúmen do trato GI. A rede do SNE integra esta infor- mação sensorial e, então, inicia a resposta. O plexo submucoso controla a secreção pelas células epiteliais GI. Os neurônios do plexo mioentérico na camada muscular externa influenciam a motilidade. Reflexos longos são integrados no SNC Embora o SNE possa funcionar isoladamente, ele também envia informações sensoriais para o SNC e recebe aferências dele através dos neurô- nios autonômicos. Um reflexo neural clássico inicia com um estí- mulo transmitido por um neurônio sensorial para o SNC, onde o estímulo é integrado e atua. No sistema digestório, alguns refle- xos clássicos são originados nos receptores sensoriais no trato GI, mas outros são originados fora do sistema digestório (Fig. 21.5, setas cinza). Não importa onde eles se originam, os reflexos di- gestórios integrados no SNC são chamados de reflexos longos. Os reflexos longos que se originam completamente fora do sistema digestório incluem reflexos antecipatórios (p. 17) e reflexos emocionais. Esses reflexos são chamados de reflexos ce- fálicos, uma vez que eles se originam no encéfalo. Os reflexos Fisiologia humana: uma abordagem integrada 665 antecipatórios iniciam com estímulos – como visão, cheiro, som ou pensamento no alimento – que preparam o sistema digestório para a refeição que o encéfalo está antecipando. Por exemplo, se você está com fome e sente o cheiro do jantar sendo preparado, você fica com água na boca e seu estômago ronca. Os reflexos emocionais e a sua influência no trato GI ilustram outra ligação entre o cérebro e o sistema digestório. As respostas GI às emoções variam da constipação do viajante a “borboletas no estômago” para vômitos e diarreia induzidos psi- cologicamente. Nos reflexos longos, o músculo liso e as glândulas do trato GI estão sob controle autonômico. Em geraI, fala-se que a divi- são parassimpática é excitatória e realça as funções GI, levando ao seu apelido de “descansar e digerir”. A maioria dos neurônios parassimpáticos para o trato GI são encontrados no nervo vago. Os neurônios simpáticos normalmente inibem as funções GI. REVISANDO CONCEITOS 10. A excitação da função GI pela divisão parassimpatica e a inibição pela divisão simpatica é um exemplo de que tipo de controle? Os peptídeos gastrintestinais incluem hormônios, neuropeptídeos e citocinas Os peptídeos secretados pelas células do trato GI podem atuar como hormônios ou como sinais parácrinos. Alguns desses peptí- deos GI foram primeiro descritos e nomeados em outros sistemas corporais. Como seus nomes nada têm a ver com as suas funções no sistemaGI, aprender a sua terminologia pode ser um desafio. No sistema digestório, os peptídeos GI excitam ou inibem a motilidade e a secreção. Alguns peptídeos parácrinos são secre- tados para o lúmen, onde eles se ligam a receptores na membrana apical para desencadear uma resposta. Outros são secretados no líquido extracelular, onde eles difundem curtas distâncias para agir em células vizinhas. Os peptídeos GI também atuam fora do trato GI, e al- gumas de suas mais importantes ações envolvem o cérebro. Por exemplo, em estudos experimentais, o hormônio GI colecisto- cinina (CCK) melhora a saciedade, dando a sensação de que a fome foi saciada. No entanto, a CCK também é produzida por neurônios e funciona como um neurotransmissor no cérebro, assim é difícil determinar quanto da resposta normal de sacie- dade é devida à CCK proveniente do intestino. Outro peptídeo Receptores sensoriais e neurônios Estímulo local: Neurônios entéricos Músculos lisos, células exócrinas Inter- neurônios Neurônios simpáticos e parassimpáticos Sistema nervoso entérico “O pequeno cérebro” • Mudanças na motilidade GI • Liberação da bile e secreções pancreáticas • Síntese/liberação de enzimas, de ácido e de bicarbonato Encéfalo Fome/saciedade Insulina Glucagon Células secretoras do estômago e do intestino delgado Fase cefálica da digestão (antecipação) (visão, cheiro, etc.) Receptores sensoriais Estímulo Centro integrador Sensor Sinal eferente Alvo Resposta tecidual Pâncreas endócrino Peptídeos GI Encéfalo Os reflexos longos são integrados no SNC. Alguns reflexos longos se originam fora do trato GI, mas outros se originam no SNE. Os reflexos curtos são originados no SNE e são executados por neurônios localizados inteiramente na parede do trato GI. 1. Quais efetores e respostas são controlados pelo plexo mioentérico, e quais são controlados pelo plexo submucoso? 2. Que tipo de receptor sensorial responde ao estiramento? E à osmolaridade? E aos produtos da digestão? LEGENDA QUESTÕES DA FIGURAQ Distensão Presença de alimento Osmolaridade Acidez FIGURA 21.5 Integração dos reflexos digestórios. 666 Dee Unglaub Silverthorn GI, a grelina, é secretado pelo estômago e age no cérebro para aumentar a ingestão alimentar. Os pesquisadores têm agora sequenciados mais de 30 peptí- deos provenientes da mucosa GI, porém somente alguns deles são amplamente aceitos como hormônios. Alguns peptídeos têm efei- tos parácrinos bem definidos, mas a maioria entra em uma longa lista de candidatos a hormônios. Além disso, conhecemos molécu- las reguladoras não peptídicas, como a histamina, que funcionam como sinais parácrinos. Devido à incerteza associada ao campo, res- tringimos o foco neste capítulo às principais moléculas reguladoras. Hormônios GI Os hormônios GI, como todos os hormônios, são secretados no sangue e transportados através do corpo. Eles atuam sobre o trato GI, em órgãos acessórios, como o pâncreas, e em alvos mais distantes, como o encéfalo. Os hormônios do trato GI ocupam um lugar interessante na história da endocrinologia. Em 1902, dois fisiologistas cana- denses, W. M. Bayliss e E. H. Starling, descobriram que o quimo ácido que entrava no intestino delgado vindo do estômago causava a liberação de suco pancreático, mesmo quando todos os nervos que se dirigem para o pâncreas eram cortados. Uma vez que a úni- ca comunicação restante entre o intestino e o pâncreas era a cir- culação de sangue entre eles, Bayliss e Starling postularam a exis- tência de algum fator circulante (humoral) liberado pelo intestino. Quando extratos duodenais aplicados diretamente no pâncreas estimularam a secreção pancreática, eles souberam que estavam lidando com uma substância química produzida pelo duodeno. Eles nomearam a substância de secretina. Posterior- mente, Starling propôs que o nome geral hormônio, da palavra grega que significa “eu excito”, fosse dado a todo agente humoral que atua em um local distante da sua liberação. Em 1905, J. S. Edkins postulou a existência de um hor- mônio gástrico que estimula a secreção gástrica ácida. Foram necessários mais de 30 anos para os pesquisadores isolarem um extrato relativamente puro do hormônio gástrico, e foi em 1964 que o hormônio denominado gastrina foi finalmente purificado. Por que a pesquisa sobre os hormônios digestórios de- morou tanto para ser desenvolvida? A principal razão é que os hormônios GI são secretados por células endócrinas isoladas, espalhadas entre outras células da mucosa epitelial. A única maneira de se obter esses hormônios era fazer um extrato bruto de todo o epitélio, um procedimento que também li- berava enzimas digestórias e moléculas parácrinas produzidas em células vizinhas. Por essa razão, era muito difícil dizer se o efeito fisiológico induzido pelo extrato provinha de um único hormônio, de mais de um hormônio ou de um sinal parácrino, como a histamina. Famílias de hormônios GI Os hormônios gastrintestinais são geralmente divididos em três famílias. Todos os membros de uma família têm sequências de aminoácidos semelhantes e, em alguns casos, há sobreposição nas suas habilidades para se liga- rem aos receptores. As fontes, os alvos e os efeitos dos principais hormônios GI são resumidos na TABELA 21.1. TABELA 21.1 Os hormônios GI Estímulo para liberação Alvo(s) primário(s) Efeito(s) primário(s) Outras informações Estômago Gastrina (células G) Peptídeos e aminoácidos; reflexos neurais Células enterocromafins (ECL) e células parietais Estimula a secreção de ácido gástrico e o crescimento da mucosa A somatostatina inibe a sua liberação Intestino Colecistocinina (CCK) Ácidos graxos e alguns aminoácidos Vesícula biliar, pâncreas, estômago � Estimula a contração da vesícula biliar e a secreção de enzimas pancreáticas � Inibe o esvaziamento gástrico e a secreção ácida � Promove saciedade � Alguns efeitos podem ser devidos à ação da CCK como um neurotransmissor Secretina Ácido no intestino delgado Pâncreas, estômago � Estimula a secreção de HCO3 � � Inibe o esvaziamento gástrico e a secreção ácida Motilina Jejum: liberação periódica a cada 1,5 a 2 horas Músculos lisos gástrico e intestinal Estimula o complexo motor migratório Inibida pela ingestão de uma refeição Peptideo inibidor gástrico (GIP) Glicose, ácidos graxos e aminoácidos no intestino delgado Células beta do pâncreas � Estimula a liberação de insulina (mecanismo antecipatório) � Inibe o esvaziamento gástrico e a secreção ácida Peptídeo semelhante ao glucagon (GLP-1) Refeição mista que inclui carboidratos ou gorduras no lúmen Pâncreas endócrino � Estimula a liberação de insulina � Inibe a liberação de glucagon e a função gástrica Promove saciedade Fisiologia humana: uma abordagem integrada 667 A família da gastrina inclui os hormônios gastrina e cole- cistocinina (CCK) mais diversas variantes de cada. A sua similari- dade estrutural implica que a gastrina e a CCK podem se ligar e ativar o mesmo receptor CCKB. A família da secretina inclui a secretina; o peptídeo in- testinal vasoativo (VIP), um neurotransmissor não adrenérgico, não colinérgico; e GIP, um hormônio conhecido originalmente como peptídeo inibidor gástrico, uma vez que ele inibiu a secreção ácida gástrica em experimentos iniciais. Alguns estudos subse- quentes, contudo, indicaram que o GIP administrado em doses fisiológicas mais baixas não bloqueia a secreção ácida. Assim, os pesquisadores sugeriram um novo nome com as mesmas iniciais – peptídeo insulinotrópico dependente de glicose – que mais precisamente descreve a ação desse hormônio: ele estimula a li- beração da insulina em resposta à glicose no lúmen do intestino. No entanto, para a maioria das pessoas, o nome preferido perma- nece sendo peptídeo inibidor gástrico. Outro membro da família da secretina é o hormônio peptídeo 1 semelhante ao glucagon (GLP-1). O GIP eo GLP-1 agem juntos como sinais antecipatórios para a liberação de insu- lina, como você aprenderá quando estudar o pâncreas endócrino (Capítulo 22). A terceira família de peptídeos contém aqueles que não se encaixam nas outras duas famílias. O membro principal desse grupo é o hormônio motilina. Aumentos na secreção de motili- na são associados ao complexo motor migratório. No restante deste capítulo, integraremos motilidade, secreção, digestão e absorção conforme seguirmos o alimen- to passando através do trato GI. A FIGURA 21.6 é um resumo dos principais eventos que ocorrem em cada seção do trato GI. O processamento do alimento é tradicionalmente dividido em três fases: cefálica, gástrica e intestinal. FUNÇÃO INTEGRADA: A FASE CEFÁLICA Os processos digestórios no corpo iniciam antes que a comida entre na boca. Simplesmente cheirar, ver, ou até mesmo pen- sar sobre o alimento pode fazer a nossa boca salivar ou nosso estômago roncar. Estes reflexos longos que iniciam no cérebro criam uma resposta antecipatória, conhecida como fase cefálica da digestão. O estímulo antecipatório e o estímulo do alimento na cavidade oral ativam neurônios no bulbo. O bulbo, por sua vez, Fígado Vesícula biliar Piloro Pâncreas Papila ileal Reto Esfincteres anais Glândula salivar Esôfago Esfincter esofágico superior Esfincter esofágico inferior Motilidade Mastigação. Deglutição. Secreção Saliva (glândulas salivares). Digestão Carboidratos. Absorção Nenhuma. Cavidade oral e esôfago Mistura peristáltica e propulsão. Proteínas. Gorduras (mínima). Substâncias lipossolúveis, como álcool e ácido acetilsalicílico. Mistura e propulsão principalmente por segmentação. Alguma peristalse. Intestino delgado Motilidade Secreção Digestão Absorção Estômago Polipeptídeos. Carboidratos. Gorduras. Ácidos nucleicos. Motilidade Secreção Digestão Absorção Aminoácidos e pequenos peptídeos. Monossacarídeos. Ácidos graxos, monoacilgliceróis, colesterol. Bases nitrogenadas. Água. Íons, minerais, vitaminas. Enzimas (enterócitos). Muco (células caliciformes). Hormônios: CCK, secretina, GIP e outros (células endócrinas). Enzimas e bicarbonato (pâncreas exócrino). Bile (fígado, estocada na vesícula biliar). Mistura segmental. Movimento de massa para propulsão. Intestino grosso Nenhuma (exceto por bactérias). Motilidade Secreção Digestão Absorção Íons, minerais, vitaminas. Água. Pequenas moléculas orgânicas produzidas pelas bactérias intestinais. Muco (células caliciformes). HCl (células parietais). Pepsinogênio e lipase gástrica (células principais). Muco e bicarbonato (células mucosas superficiais). Gastrina (células G). Histamina (células ECL). FIGURA 21.6 Visão geral da função digestória. 668 Dee Unglaub Silverthorn manda sinais eferentes através de neurônios autonômicos para as glândulas salivares, e atráves do nervo vago para o sistema nervo- so entérico. Em resposta a esses sinais, o estômago, o intestino e os órgãos glandulares acessórios iniciam a secreção e aumentam a motilidade em antecipação ao alimento que virá. A digestão mecânica e química inicia na boca Quando o alimento inicialmente entra na boca, ele é inundado por uma secreção, a qual chamamos de saliva. A saliva tem qua- tro funções importantes: 1. Amolecer e lubrif icar o alimento. A água e o muco na saliva amolecem e lubrificam o alimento para torná-lo mais fácil de deglutir. Você pode avaliar essa função se alguma vez já tentou engolir uma bolacha seca sem mastigá-la comple- tamente. 2. Digestão do amido. A digestão química inicia com a secreção da amilase salivar. A amilase quebra o amido em maltose depois que a enzima é ativada por Cl � na saliva. Se você mastigar uma bolacha sem sal por algum tempo, perceberá a conversão do amido em maltose, a qual é mais doce. 3. Gustação. A saliva dissolve o alimento para que possamos sentir seu gosto (p. 325). 4. Defesa. A função final da saliva é a defesa. A lisozima é uma enzima salivar antibacteriana, e imunoglobulinas sa- livares incapacitam bactérias e vírus. Além disso, a saliva ajuda a limpar os dentes e manter a língua livre de partícu- las alimentares. A digestão mecânica dos alimentos inicia na cavidade oral com a mastigação. Os lábios, a língua e os dentes contribuem para a mastigação do alimento, criando uma massa amolecida e umedecida (bolo) que pode ser facilmente engolida. A saliva é uma secreção exócrina A saliva é um complexo fluido hiposmótico que contém água, íons, muco e proteínas, como enzimas e imunoglobulinas. Três pares de glândulas salivares produzem tanto quanto 1,5 litro de saliva por dia. As glândulas salivares são glândulas exócrinas, com o epitélio secretor disposto em agrupamentos de células como cachos de uvas, chamados de ácinos. Cada ácino circunda um ducto, e os ductos individuais juntam-se para formar ductos cada vez mais largos (como os caules em um cacho de uvas). O princi- pal ducto secretor de cada glândula esvazia na boca. As secreções dos três pares de glândulas salivares variam em composição. As glândulas parótidas produzem uma solução aquosa de enzimas, ao passo que as glândulas sublinguais produ- zem uma saliva rica em muco. As secreções das glânulas subman- dibulares são mistas, com ambos, muco e enzimas. A produção de saliva é um processo de dois passos. O flui- do inicial secretado pelas células acinares se assemelha ao líquido extracelular em sua composição iônica: uma solução isotônica de NaCl. Conforme este fluido passa através do ducto no seu cami- nho para a cavidade oral, as células epiteliais ao longo do ducto reabsorvem NaCl e secretam K � e íon bicarbonato até que a ra- zão entre os íons no fluido do ducto seja mais parecida com a do líquido entracelular (alta em K � e baixa em Na � ). As membranas apicais das células do ducto têm pouca permeabilidade à água, e a remoção efetiva de soluto do fluido secretado resulta em saliva hiposmótica em relação ao plasma. A salivação está sob controle autonômico e pode ser desen- cadeada por múltiplos estímulos, incluindo visão, cheiro, contato e até mesmo o pensamento no alimento. A inervação parassimpática é o estímulo primário para a secreção da saliva, mas também há al- guma inervação simpática nas glândulas. Na China antiga, algumas vezes era dado a uma pessoa sob suspeita de crime um punhado de arroz seco para mastigar durante o interrogatório. Se ela pudesse produzir saliva o suficiente para umedecer o arroz e o engolir, era li- bertada. No entanto, se seu nervosismo secasse a sua secreção salivar reflexa, ela seria declarada culpada. Pesquisas recentes têm confir- mado que o estresse, como o associado à mentira ou à ansiedade ao ser questionado, diminui o volume de secreção salivar. REVISANDO CONCEITOS 11. Como a mucina, a amilase e as imunoglobulinas movem-se das células epiteliais das glândulas salivares para o lúmen da glândula? (Dica: elas são todas proteínas.) A deglutição leva o bolo alimentar da boca para o estômago O ato de engolir, ou deglutição, é uma ação reflexa que empur- ra o bolo de alimento ou de líquido para o esôfago (FIG. 21.7). O estímulo para a deglutição é a pressão criada quando a língua empurra o bolo contra o palato mole e a parte posterior da boca. A pressão do bolo ativa neurônios sensoriais que levam informa- ções pelo nervo glossofaríngeo (nervo craniano IX) para o centro da deglutição no bulbo. As eferências do centro da deglutição consistem em neurô- nios motores somáticos que controlam os múculos esqueléticos da faringe e do esôfago superior, bem como neurônios autonômicos que agem nas porções inferiores do esôfago. Quando o reflexo de deglutição inicia, o palato mole eleva-se para fechar a nasofaringe. A contração muscular move a laringe para cima e para a frente, o que ajuda a fechar a traqueia e abrir o esfincter esofágico superior. Enquanto o bolo se move para baixo no esôfago, a epi- glotedobra-se para baixo, completando o fechamento das vias aéreas superiores e prevenindo que alimentos ou líquidos en- trem nas vias aéreas. Ao mesmo tempo, a respiração é breve- mente inibida. Quando o bolo se aproxima do esôfago, o esfinc- ter esofágico superior relaxa. Ondas de contrações peristálticas, então, empurram o bolo em direção ao estômago, auxiliadas pela gravidade. Entretanto, a gravidade não é indispensável, como você deve saber se já participou da brincadeira de engolir de cabeça para baixo. A extremidade inferior do esôfago situa-se logo abaixo do diafragma e é separada do estômago pelo esfincter esofágico inferior. Esta área não é um esfincter verdadeiro, mas uma re- gião de tensão muscular relativamente alta que atua como uma barreira entre o esôfago e o estômago. Quando os alimentos são deglutidos, a tensão relaxa, permitindo a passagem do bolo ali- mentar para o estômago. Fisiologia humana: uma abordagem integrada 669 Se o esfincter esofágico inferior não permanecer contraído, o ácido gástrico e a pepsina podem irritar a parede do esôfago, levando à dor e à irritação do refluxo gastresofágico, mais conheci- do como azia. Durante a fase da inspiração da respiração, quando a pressão intrapleural cai, as paredes do esôfago expandem-se (p. 549). A expansão cria uma pressão subatmosférica no lúmen esofágico, que pode sugar o conteúdo ácido do estômago se o esfincter estiver relaxado. A agitação do estômago, quando este está cheio, pode também esguichar ácido de volta para o esôfago se o esfincter não estiver completamente contraído. A doença do refluxo gastresofágico ou DRGE, é um dos mais comuns proble- mas digestórios na sociedade norte-americana. FUNÇÃO INTEGRADA: A FASE GÁSTRICA Aproximadamente 3,5 litros de comida, bebida e saliva entram no fundo do estômago a cada dia. O estômago possui três fun- ções gerais: 1. Armazenamento. O estômago armazena alimento e regu- la a sua passagem para o intestino delgado, onde ocorre a maior parte da digestão e da absorção. 2. Digestão. O estômago digere a comida, química e me- canicamente, formando a mistura “cremosa” de partículas uniformemente pequenas, chamada de quimo. 3. Defesa. O estômago protege o corpo por destruir muitas das bactérias e outros patógenos que são deglutidos jun- tamente com a comida ou aprisionados no muco das vias respiratórias. Ao mesmo tempo, o estômago precisa prote- ger a si mesmo de ser agredido por suas próprias secreções. Antes da chegada do alimento, a atividade digestória no estômago inicia com um reflexo vagal longo da fase cefálica (FIG. 21.8). Depois, quando o bolo entra no estômago, estímulos no lúmen gástrico iniciam uma série de reflexos curtos, que cons- tituem a fase gástrica da digestão. Nos reflexos da fase gástrica, a distensão do estômago e a presença de peptídeos ou de aminoácidos no lúmen ativam cé- lulas endócrinas e neurônios entéricos. Hormônios, neurotrans- missores e moléculas parácrinas, então, influenciam a motilidade e a secreção. O estômago armazena o bolo alimentar Quando o alimento chega do esôfago, o estômago relaxa e ex- pande para acomodar o volume aumentado. Este reflexo media- do neuralmente é chamado de relaxamento receptivo. A metade superior do estômago permanece relativamente em repouso, re- tendo o bolo alimentar até que ele esteja pronto para ser digerido. A função de armazenamento do estômago é talvez o aspecto me- 1 A língua empurra o bolo contra o palato mole e a parte posterior da cavidade oral, disparando o reflexo da deglutição. Palato duro Língua Bolo alimentar Epiglote Esfincter esofágico superior tonicamente contraído A laringe move-se para cima e para a frente. O palato mole eleva-se, fechando a nasofaringe. Glote 2 A respiração é inibida à medida que o bolo passa pela via aérea fechada. A epiglote dobra-se para baixo para ajudar a manter o material engolido fora das vias aéreas. O esfincter esofágico superior relaxa. 3 O alimento move-se para baixo no interior do esôfago, propelido por ondas peristálticas e auxiliado pela gravidade. FIGURA 21.7 Deglutição: o reflexo de deglutição. A deglu- tição é integrada no bulbo. Aferentes sensoriais no nervo crania- no IX e neurônios motores somáticos e autonômicos medeiam o reflexo. 670 Dee Unglaub Silverthorn nos óbvio da digestão. Todavia, quando ingerimos mais do que necessitamos do ponto de vista nutricional, o estômago precisa regular a velocidade na qual o quimo entra no intestino delgado. Sem essa regulação, o intestino delgado não seria capaz de digerir e absorver a carga de quimo que chega, e quantidades significativas de quimo não absorvido passariam para o intesti- no grosso. O epitélio do intestino grosso não é projetado para absorção de nutrientes em larga escala, então a maioria do quimo se tornará fezes, resultando em diarreia. Este “distúrbio do esva- ziamento” (“síndrome de dumping”) é um dos efeitos colaterais mais desagradáveis da cirurgia que remove porções do estômago ou do intestino delgado. Enquanto a parte superior do estômago está retendo o bolo alimentar, a parte inferior do estômago está ocupada com a digestão. Na metade distal do estômago, uma série de ondas peristálticas empurra o bolo alimentar para baixo, em direção ao piloro, misturando-o com o ácido e as enzimas digestórias. Quando as partículas grandes são digeridas e a textura do qui- mo fica mais uniforme, cada onda contrátil ejeta uma pequena quantidade de quimo no duodeno através do piloro. O aumento da motilidade gástrica durante a refeição está principalmente sob controle neural e é estimulada pela distensão do estômago. Secreções gástricas protegem e digerem O lúmen do estômago é alinhado com o epitélio produtor de muco, pontuado por aberturas de fovéolas (fossas) gástricas. As fossas levam a glândulas gástricas profundas dentro da ca- mada mucosa (ver Fig. 21.1e). Múltiplos tipos celulares dentro das glândulas produzem ácido gástrico (HCl), enzimas, hormô- nios e moléculas parácrinas. As várias secreções das células da mucosa gástrica, seus estímulos para liberação e suas funções são resumidos na FIGURA 21.9 e descritos a seguir. Secreção de gastrina As células G, encontradas profunda- mente nas glândulas gástricas, secretam o hormônio gastrina no sangue. Em reflexos curtos, a liberação de gastrina é estimulada pela presença de aminoácidos e de peptídeos no estômago e por distensão do estômago. O café (mesmo o descafeinado) também estimula a liberação de gastrina – uma razão para que pessoas com síndromes de secreção ácida excessiva evitem a ingestão de café. A liberação de gastrina é também desencadeada por refle- xos neurais. Os reflexos curtos são mediados por um neurotrans- missor do SNE, chamado de peptídeo liberador de gastrina (GRP). Nos reflexos cefálicos, os neurônios parassimpáticos do nervo vago estimulam as células G para que elas liberem gastrina no sangue. A principal ação da gastrina é promover a liberação de ácido. Ela faz isso diretamente por agir nas células parietais e indiretamente por estimular a liberação de histamina. Secreção Ácida As células parietais profundas nas glân- dulas gástricas secretam o ácido gástrico (HCl) no lúmen do estômago. A secreção ácida no estômago é, em média, de 1 a 3 litros por dia e pode criar um pH luminal tão baixo quanto 1. O pH citoplasmático das células parietais é de cerca de 7,2, ou seja, as células bombeiam H � contra um gradiente que pode ser 1,5 milhão de vezes mais concentrado no lúmen. O ácido gástrico tem múltiplas funções: � O ácido no lúmen do estômago causa a liberação e a ativa- ção da pepsina, uma enzima que digere proteínas. � O ácido desencadeia a liberação de somatostatina pelas células D. A somatostatina é discutida posteriormente na seção de sinais parácrinos. � O HCl desnatura proteínas por quebrar as ligações dissul- feto e de hidrogênio que mantêm a estrutura terciária da proteína (p. 32). Cadeiasproteicas desenoveladas podem deixar as ligações peptídicas entre os aminoácidos mais acessíveis à digestão pela pepsina. � O ácido gástrico ajuda a destruir bactérias e outros micror- ganismos ingeridos. � O ácido inativa a amilase salivar, cessando a digestão de carboidratos que iniciou na boca. A via das células parietais para a secreção ácida é descrita na Figura 21.9c. O processo inicia quando o H � do citosol da Entrada sensorial Neurônios parassimpáticos pré-ganglionares no nervo vago Neurônios parassimpáticos pós-ganglionares e neurônios entéricos intrínsecos Secreção e motilidade Reflexos curtos iniciados pela distensão ou por peptídeos e aminoácidos. Bulbo Estômago Nervo vago Lúmen do estômago REFLEXO CURTO Mucosa gástrica Plexo entérico Bolo alimentar REFLEXO LONGO VAGAL Comida! Células-alvo FIGURA 21.8 Reflexos das fases cefálica e gástrica. A vi- são, o cheiro e o gosto do alimento iniciam um reflexo longo que prepara o estômago para a chegada do alimento. célula parietal é bombeado para o lúmen do estômago em troca por K � , que entra na célula, por uma H � -K � -ATPase. O Cl � , então, segue o gradiente elétrico criado por H � , movendo-se através de canais de cloreto abertos. O resultado líquido é a se- creção de HCl pela célula. Ao aprender o mecanismo celular de secreção ácida na célula parietal, os cientistas foram capazes de desenvolver uma nova classe de fármacos para tratar a hipersecreção de ácido gás- trico. Estes fármacos, conhecidos como inibidores da bomba de prótons (PPIs), bloqueiam a atividade da H � -K � -ATPase. Ver- sões genéricas de alguns PPIs (p. ex., omeprazol) estão disponí- veis para venda nos Estados Unidos. Enquanto o ácido está sendo secretado no lúmen, o bicarbonato produzido a partir de CO2 e OH � da água é absorvido para o sangue. A ação tamponante do HCO3 � torna o sangue menos ácido ao deixar o estômago, criando uma maré alcalina que pode ser medida enquanto uma refeição está sendo digerida. FIGURA 21.9 CONTEÚDO ESSENCIAL Mucosa gástrica Abertura da glândula gástrica Tipos celulares Substância secretada Estímulo para liberaçãoFunção da secreção Célula mucosa do colo Célula mucosa superficial Muco Bicarbonato Secreção tônica; irritação da mucosa Secretado com o muco Barreira física entre o lúmen e o epitélio Tamponar o ácido gástrico para evitar dano ao epitélio Células parietais Ácido gástrico (HCl) Fator intrínseco Acetilcolina, gastrina, histamina Ativar a pepsina; matar bactérias Combinar-se com a vitamina B 12 para permitir sua absorção Células semelhantes às enterocromafins Histamina Acetilcolina, gastrina Estimular a secreção de ácido gástrico Células principais Pepsina(ogênio) Lipase gástrica Acetilcolina, secreção do ácido Digerir proteínas Digerir gorduras Células D Somatostatina Ácido no estômagoInibir a secreção do ácido gástrico Células G Gastrina Acetilcolina, peptídeos e aminoácidos Estimular a secreção de ácido gástrico Capilar Lúmen do estômago Célula mucosa gástrica Suco gástrico pH ~ 2 Camada de muco Gotículas de muco pH ~ 7 na superfície celular HCO3 – HCO3 – A camada de muco é uma barreira física O bicarbonato é uma barreira química que neutraliza ácido. (b) Barreira muco-bicarbonato (c) Secreção ácida no estômago (a) Células secretoras da mucosa gástrica Líquido intersticial Lúmen do estômago C a p ila r K+ H+ CO2 H2O AC ATP Célula parietal Cl– Cl– Cl– HCO3 – HCO3 – H+ + OH– K+ Cl– Secreçõs gástricas 672 Dee Unglaub Silverthorn Secreção enzimática O estômago produz duas enzimas: pepsina e uma lipase gástrica. A pepsina realiza a digestão inicial de proteínas. Ela é particularmente efetiva no colágeno e, assim, tem um importante papel na digestão de carne. A pepsina é secretada na forma inativa pepsinogênio pelas células principais das glândulas gástricas. O ácido estimula a li- beração de pepsinogênio por meio de um reflexo curto mediado no SNE (FIG. 21.10). Uma vez no lúmen do estômago, o pepsi- nogênio é clivado à pepsina ativa pela ação do H � , e a digestão proteica inicia. A lipase gástrica é cossecretada com a pepsina. As lipases são enzimas que quebram triacilgliceróis. No entanto, menos de um terço da digestão de gordura ocorre no estômago. Secreções parácrinas As secreções parácrinas da muco- sa gástrica incluem histamina, somatostatina e fator intrínseco. A histamina é um sinal parácrino secretado pelas células seme- lhantes às enterocromafins (células ECL) em resposta à esti- mulação por gastrina ou por acetilcolina. A histamina difunde- -se para o seu alvo, as células parietais, estimulando a secreção ácida por se ligar a receptores H2 nas células parietais (Fig. 21.10). Os antagonistas de receptores H2 (p. ex., cimetidina e ranitidina) que bloqueiam a ação da histamina são a segunda classe de fár- macos usados para tratar a hipersecreção ácida. O fator intrínseco é uma proteína secretada pelas células parietais, mesmas células gástricas que secretam ácido. No lú- men do estômago e do intestino delgado, o fator intrínseco se complexa com a vitamina B12, um passo que é necessário para a absorção da vitamina no intestino. A somatostatina (SS), também conhecida como hormô- nio inibidor do hormônio do crescimento, é secretada por célu- las D no estômago. A somatostatina é o sinal de retroalimenta- ção negativa primário da secreção na fase gástrica. Ela reduz a secreção ácida direta e indiretamente por diminuir a secreção de gastrina e histamina. A somatostatina também inibe a secreção de pepsinogênio (Fig. 21.10). O estômago equilibra digestão e defesa Sob condições normais, a mucosa gástrica protege a si mesma da autodigestão por ácido e enzimas com uma barreira muco- -bicarbonato. As células mucosas na superfície luminal e no colo das glândulas gástricas secretam ambas as substâncias. O muco forma uma barreira física, e o bicarbonato cria uma barreira tam- ponante química subjacente ao muco (Fig. 21.9b). Os pesquisadores mostraram, utilizando microeletrodos, que a camada de bicarbonato logo acima das células da superfície do estômago possui um pH próximo a 7, mesmo quando o pH no lúmen é bastante ácido – próximo a 2. A secreção de muco aumenta quando o estômago é irritado, como pela ingestão de ácido acetilsalicílico ou de álcool. Mesmo a barreira muco-bicarbonato pode falhar algumas vezes. Na síndrome de Zollinger-Ellison, os pacientes secretam níveis excessivos de gastrina, geralmente de tumores secretores de gastrina no pâncreas. Como resultado, a hiperacidez no estô- mago supera os mecanismos protetores normais e causa úlcera péptica. Na úlcera péptica, o ácido e a pepsina destroem a muco- sa, criando orifícios que se estendem para dentro da submucosa e muscular do estômago e do duodeno. O refluxo ácido para o esôfago pode corroer a camada mucosa. O excesso de secreção ácida é uma causa incomum de úlcera péptica. As causas mais comuns são os fármacos anti- -inflamatórios não esteroides (AINEs), como o ácido acetilsali- cílico, e a inflamação da mucosa gástrica promovida pela bactéria Helicobacter pylori. Por muitos anos, a principal terapia para o excesso de se- creção ácida, ou dispepsia, foi a ingestão de antiácidos, agentes que neutralizam o ácido no lúmen gástrico. Contudo, à medida que os biólogos moleculares exploraram o mecanismo da secre- ção ácida pelas células parietais, o potencial para novos trata- mentos tornou-se evidente. Atualmente, existem duas classes de fármacos para combater a hiperacidez: os antagonistas de recep- tores H2 e os inibidores da bomba de prótons que bloqueiam a H � -K � -ATPase. FUNÇÃO INTEGRADA: A FASE INTESTINAL Uma vez que o quimo passa ao intestino delgado, a fase intesti- nal da digestão inicia. O quimo que entra no intestino delgado sofreu relativamente pouca digestão química, então sua entrada noduodeno deve ser controlada para evitar sobrecarga ao in- testino delgado. A motilidade no intestino delgado também é controlada. Os conteúdos intestinais são lentamente propelidos para a frente por uma combinação de contrações segmentares e peristálticas. Essas ações misturam o quimo com enzimas, e elas expoem os nutrientes digeridos para o epitélio mucoso para absorção. Os movimentos para a frente do quimo ao longo do intestino devem ser suficientemente lentos para permitir que a digestão e a absorção sejam completadas. A inervação parassim- pática e os hormônios GI gastrina e CCK promovem a motilida- de intestinal; a inervação simpática inibe-a. SOLUCIONANDO O PROBLEMA Brooke, que sempre foi saudável, estava confusa. Como ela havia contraído cólera? Todavia, após discutir os métodos de transmissão com seus prestadores de cuidados de saú- de, ela percebeu que não havia sido tão cuidadosa, como deveria ter sido ao consumir somente água engarrafada. Um dos médicos notou que o histórico médico de Brooke listava esomeprazol entre seus medicamentos atuais. “To- mar esomeprazol também pode ter contribuído para você contrair cólera.” P3: Esomeprazol é um inibidor da bomba de prótons (PPI). Para que sintoma ou condição Brooke estava tomando esse medicamento? P4: Por que tomar um inibidor da bomba de prótons, como o esomeprazol, aumentou a chance de Brooke contrair cólera? 672659655 675 682 688 Fisiologia humana: uma abordagem integrada 673 Aproximadamente 5,5 litros de alimentos, líquidos e secreções entram no intestino delgado a cada dia, e cerca de 3,5 litros de secreções hepática, pancreática e intestinal são adicionados, perfazendo uma entrada total de 9 litros no lúmen (ver Fig. 21.3). Tudo, menos cerca de 1,5 litro deste volume, é absorvido no intestino delgado, a maioria no duo- deno e no jejuno. A anatomia do intestino delgado facilita a secreção, a digestão e a absorção por maximizar a área de superfície (FIGS. 21.11 e 21.1f ). No nível macroscópico, a superfície do lúmen é esculpida em vilosidades similares a dedos e criptas profundas. A maior parte da absorção ocorre ao longo das vi- losidades, ao passo que a secreção de fluidos e de hormônios e a renovação celular a partir de células-tronco ocorrem nas criptas. Ao nível microscópico, a superfície apical dos enteró- citos é modificada em microvilosidades, cujas superfícies são cobertas com enzimas ligadas à membrana e um revestimento de glicocálice (p. 64). A superfície do epitélio intestinal é cha- mada de borda em escova devido à aparência de cerdas das microvilosidades. A maioria dos nutrientes absorvidos ao longo do epité- lio intestinal vai para capilares nas vilosidades para distribuição através do sistema circulatório. A exceção são as gorduras dige- ridas, a maioria das quais passa para vasos do sistema linfático. O sangue venoso proveniente do trato digestório não vai direta- mente de volta ao coração. Em vez disso, ele passa para o sistema porta-hepático (p. 439). Essa região especializada da circulação tem dois conjuntos de leitos capilares: um que capta nutrientes absorvidos no intestino, e outro que leva os nutrientes direta- mente para o fígado (FIG. 21.12). O envio de materiais absorvidos diretamente para o fíga- do ressalta a importância desse órgão como um filtro biológico. Os hepatócitos contêm uma variedade de enzimas, como as iso- enzimas citocromo p450, que metabolizam fármacos e xenobióti- cos e os retiram da circulação sanguínea antes de eles alcançarem a circulação sistêmica. A depuração hepática é uma das razões pelas quais um fármaco administrado via oral deve ser dado em doses mais altas do que o mesmo fármaco administrado por in- fusão intravenosa. As secreções intestinais promovem a digestão A cada dia, o fígado, o pâncreas e o intestino produzem mais de 3 litros de secreções, cujos conteúdos são necessários para comple- tar a digestão dos nutrientes ingeridos. As secreções adicionadas + Lúmen do estômago Mucosa gástrica Plexo entérico Célula principal Gastrina Somatostatina Aminoácidos ou peptídeos Estímulo via nervo vago Neurônio sensorial entérico Neurônio sensorial entérico Célula ECL Célula G Célula D H+ Bolo alimentar Histamina Pepsina Pepsinogênio Célula parietal Via da retroalimentação negativa O alimento e/ou os reflexos cefálicos estimulam a secreção gástrica de gastrina, histamina e ácido. 1 1 1 A gastrina estimula a secreção ácida por ação direta nas células parietais ou indiretamente por meio da histamina. 2 2 O ácido estimula a secreção de pepsinogênio por um reflexo curto. 4 A somatostatina estimulada pelo H+ é um sinal de retroalimentação negativa que modula a liberação de ácido e de pepsina. 3 3 1. O estímulo vagal autonômico é simpático ou parassimpático? 2. Quais são o neurotransmissor e o receptor para este estímulo? 4 LEGENDA Reflexos curtos Reflexos longos FIGURE QUESTIONSQ FIGURA 21.10 Integração da secreção das fases cefálica e gástrica. A fase cefálica é iniciada por visão, cheiro, sons, pensa- mento sobre o alimento ou pela presença do alimento na boca. A fase gástrica é iniciada pela chegada do bolo alimentar no estômago. 674 Dee Unglaub Silverthorn incluem enzimas digestórias, bile, bicarbonato, muco e solução isotônica de NaCl. 1. As enzimas digestórias são produzidas pelo epitélio intesti- nal e pelo pâncreas exócrino. As enzimas da borda em es- cova intestinal são ancoradas à membrana luminal das cé- lulas e não são varridas para fora do intestino conforme o quimo é empurrado para a frente. As vias de controle para a liberação de enzimas variam, mas incluem vários sinais neurais, hormonais e parácrinos. Em geral, a estimulação dos neurônios parassimpáticos do nervo vago aumenta a secreção de enzimas. 2. A bile produzida no fígado e secretada pela vesícula biliar é uma solução não enzimática que facilita a digestão de gorduras. 3. A secreção de bicarbonato para dentro do intestino delgado neutraliza o quimo extremamente ácido que vem do estô- mago. A maior parte do bicarbonato vem do pâncreas e é liberado em resposta a estímulos neurais e à secretina. 4. O muco das células caliciformes intestinais protege o epité- lio e lubrifica o conteúdo intestinal. 5. Uma solução isotônica de NaCl mistura-se com o muco para ajudar a lubrificar o conteúdo do intestino. Secreção isotônica de NaCl As células das criptas do intestino delgado e do colo secretam uma solução isotônica de NaCl em um processo similar ao passo inicial da salivação (FIG. 21.13). O cloreto do LEC entra nas células via transpor- tadores NKCC e, em seguida, sai para o lúmen através de um canal de Cl � , conhecido como canal regulador de condutância transmembrana de fibrose cística, ou canal CFTR. O movi- mento do Cl � negativamente carregado para o lúmen atrai o Na � por meio do gradiente elétrico através de junções comu- nicantes celulares. A água segue o Na � ao longo do gradiente osmótico criado pela redistribuição do NaCl. O resultado é a secreção de solução salina isotônica. O pâncreas secreta enzimas digestórias e bicarbonato O pâncreas é um órgão que contém ambos os tipos de epitélio secretor: endócrino e exócrino (p. 79). A secreção endócrina é proveniente de agrupamentos de células, chamadas de ilhotas, e inclui os hormônios insulina e glucagon (FIG. 21.14). As secre- ções exócrinas incluem enzimas digestórias e uma solução aquo- sa de bicarbonato de sódio, NaHCO3. A porção exócrina do pâncreas consiste em lóbulos, chamados de ácinos, similares àqueles das glândulas salivares. Os ductos dos ácinos esvaziam no duodeno (Fig. 21.14a). As cé- lulas acinares secretam enzimas digestórias, e as células do ducto secretam solução de NaHCO3. Secreção de enzimas A maior parte das enzimas pancreá- ticas são secretadas como zimogênios, que devem ser ativados no Os enterócitostransportam nutrientes e íons. Os capilares transportam a maioria dos nutrientes absorvidos. As células caliciformes secretam muco. O ducto lactífero transporta a maior parte das gorduras para a linfa. As células-tronco dividem-se para substiruir as células danificadas. As células da cripta secretam íons e água. As células endócrinas secretam hormônios. Muscular da mucosa Microvilosidades Lâmina própria Borda em escova Enterócito Lúmen da cripta FIGURA 21.11 As vilosidades e as criptas no intestino delga- do. As vilosidades e as criptas aumentam a área de superfície efe- tiva do intestino delgado. As células-tronco nas criptas produzem novas células epiteliais para reposição daquelas que morrem ou são danificadas. A maior parte da absorção ocorre ao longo das vi- losidades. A maior parte da secreção de fluidos ocorre nas criptas. Aorta Veia hepática Veia cava inferior Artérias do trato digestório Veia porta do fígado Artéria hepática Capilares do fígado Capilares do trato digestório: estômago, intestino, pâncreas e baço Fígado Nutrientes FIGURA 21.12 O sistema porta-hepático. A maioria dos nu- trientes absorvidos pelo intestino delgado passa pelo fígado, o qual atua como um filtro que pode remover xenobióticos poten- cialmente nocivos antes que eles entrem na circulação sistêmica. Fisiologia humana: uma abordagem integrada 675 momento de chegada no intestino. Este processo de ativação é uma cascata que inicia quando a enteropeptidase da borda em escova (previamente chamada de enterocinase) converte o tripsi- nogênio inativo em tripsina (Fig. 21.14b). A tripsina, então, con- verte os outros zimogênios pancreáticos em suas formas ativas. Os sinais para a liberação das enzimas pancreáticas in- cluem distensão do intestino delgado, presença de alimento no intestino, sinais neurais e hormônio CCK. As enzimas pancreá- ticas entram no intestino em um fluido aquoso que também con- tém bicarbonato. Secreção de bicarbonato A secreção de bicarbonato para o duodeno neutraliza o ácido proveniente do estômago. Uma pe- quena quantidade de bicarbonato é secretada por células duode- nais, mas a maior parte vem do pâncreas. A produção de bicarbonato requer altos níveis da enzima anidrase carbônica, níveis similares àqueles encontrados nas célu- las tubulares renais e nos eritrócitos (pp. 577, 646). O bicarbona- to produzido a partir de CO2 e água é secretado por um trocador apical Cl � -HCO3 � (Fig. 21.14c). Os íons hidrogênio produzidos juntamente com o bicarbonato deixam a célula por trocadores Na � -H � na membrana basolateral. O H � então reabsorvido na circulação intestinal ajuda a equilibrar o HCO3 � colocado na cir- culação quando as células parietais secretaram H � no estômago (ver Fig. 21.9c). O cloreto trocado por bicarbonato entra na célula pelo cotransportador NKCC na membrana basolateral e sai por um canal CFTR na apical. O Cl � luminal, então, reentra na célula em troca de HCO3 � entrando no lúmen. Defeitos na estrutura ou na função do canal CFTR causam a doença f ibrose cística, e a pertur- bação da secreção pancreática é uma característica dessa doença. Na fibrose cística, uma mutação herdada faz a proteína do canal CFTR ser defeituosa ou ausente. Como resultado, a secre- ção de Cl � e fluido cessa, mas as células caliciformes continuam a secretar muco, resultando em espessamento do muco. No sistema digestório, o muco espesso obstrui ductos pancreáticos pequenos e impede a secreção de enzimas digestórias no intestino. Nas vias aéreas do sistema respiratório, onde o canal CFTR também é encontrado, a falha na secreção de líquido dificulta o movimento mucociliar (Fig. 17.5c, p. 541) devido ao muco espesso, levando a infecções pulmonares recorrentes. Em ambos, pâncreas e criptas intestinais, a secreção de só- dio e água é um processo passivo, dirigido por gradientes eletro- químicos e osmóticos. O movimento de íons negativos do LEC para o lúmen cria um gradiente elétrico negativo no lúmen que atrai Na � . O sódio move-se a favor do gradiente eletroquímico através de junções comunicantes entre as células. A transferência de Na � e de HCO3 � do LEC para o lúmen cria um gradiente os- mótico, e a água segue por osmose. O resultado final é a secreção de uma solução aquosa de bicarbonato de sódio. O fígado secreta a bile A bile é uma solução não enzimática secretada pelos hepató- citos, ou células do fígado (ver Foco em: O fígado, FIG. 21.15). Os componentes-chave da bile são (1) sais biliares, que facilitam a digestão enzimática de gorduras, (2) pigmentos biliares, como a bilirrubina, que são os produtos residuais da degradação da he- moglobina, e (3) colesterol, que é excretado nas fezes. Fármacos e outros xenobióticos são depurados do sangue pelo processamen- to hepático e são também excretados na bile. Os sais biliares, que agem como detergentes para tornar as gorduras solúveis durante a digestão, são produzidos a partir dos ácidos biliares esteroides combinados com aminoácidos e ionizados. A bile secretada pelos hepatócitos flui pelos ductos hepá- ticos até a vesícula biliar, que armazena e concentra a solução biliar. Durante uma refeição que inclua gorduras, a contração da vesícula biliar envia bile para o duodeno através do ducto co- lédoco. A vesícula biliar é um órgão que não é essencial para a digestão normal, e se o ducto torna-se bloqueado por depósitos K+ Na+ 2 Cl– Na+ K+ K+ O Cl– entra no lúmen através do canal CFTR. 2 O Na+ é reabsorvido. 3 4 O efluxo de Cl– torna o lúmen eletronegativo e atrai o Na+ através da via paracelular. A água segue por osmose. Líquido intersticial Na+, H2O Na+, H2O Cl– Cl– Lúmen Célula intestinal ATP 1 Na+, K+ e Cl– entram na célula por cotransporte. 1 2 3 4 FIG. 21.13 Secreção isotônica de NaCl. Células da cripta in- testinais e colônicas e ácinos das glândulas salivares secretam soluções isotônicas de NaCl. SOLUCIONANDO O PROBLEMA Uma característica da infecção por Vibrio cholerae é uma diarreia profusa e diluída, algumas vezes lembrando “água de arroz”. A toxina secretada pelo Vibrio cholerae é uma proteína complexa com seis subunidades. A toxina liga-se às células intestinais, e a subunidade A é endocitada pelos enterócitos. Uma vez dentro do enterócito, a toxina ativa a adenilato-ciclase, que, por sua vez, produz AMPc continua- mente. Devido ao canal CFTR do enterócito ser um canal dependente de AMPc, o efeito da toxina da cólera é abrir o canal CFTR e manter o mesmo aberto. P5: Por que manter continuamente aberto o canal CFTR no enterócito causa diarreia secretora e desidratação em se- res humanos? 672659655 675 682 688 FIGURA 21.14 CONTEÚDO ESSENCIAL O pâncreas (a) O pancreas exócrino secreta enzimas digestórias e bicarbonato de sódio. As ilhotas pancreáticas secretam os hormônios que entram no sangue. Lú m en K+ 2 Cl– Na+ Na+ K+ Canal CFTR Células do ducto pancreático ou célula duodenal Líquido intersticial Lúmen do pâncreas ou intestino K+ CO2 H2O + CO2 H2O, Na + AC HCO3 – HCO3 –+ H+ ATP Na+ Cl– Cl– C a p ila r Pâncreas Ducto pancreático Intestino delgado Capilar As células do ducto secretam NaHCO3, que entra no trato digestório. As células acinares secretam enzimas digestórias. Os ácinos pancreáticos formam a porção exócrina do pâncreas. (b) As enzimas inativas secretadas pelo pâncreas são ativadas em uma cascata. O tripsinogênio é ativado em tripsina pela enteropeptidase da borda em escova, e a tripsina, então, ativa outras enzimas pancreáticas. Lúmen do intestino delgado Mucosa intersticial Ducto pancreático • Profosfolipase • Fosfolipase • Procolipase • Procarboxipeptidase • Carboxipeptidase • Quimotripsinogênio • Colipase • Quimotripsina Secreções pancreáticas (incluindo enzimas inativas) Tripsinogênio Tripsina A enteropeptidase da borda em escova ativa a tripsina ZIMOGÊNIOS ENZIMASATIVADAS ativa (c) Secreção de bicarbonato no pâncreas e no duodeno. Ativação dos zimogênios pancreáticos Secreção de bicarbonato As células que produzem bicarbonato possuem alta concentração de anidrase carbônica (AC). O cloreto entra nas células por transporte ativo secundário e deixa o lado apical através de um canal CFTR. O Cl– então reentra na célula em troca de HCO3–. As junções comunicantes permitem o movimento paracelular de íons e água. Os íons negativos no lúmen atraem o Na+ pela via paracelular. A água segue. Anatomia do pâncreas exócrino e endócrino 1 1 2 2 3 2 3 FIGURA 21.15 FOCO EM… O fígado (c) Os hepatócitos são organizados em unidades hexagonais irregulares, denominadas lóbulos. (b) Vesícula biliar e ductos biliares Vesícula biliar Sinusoide Fígado Secretado no duodeno Veia porta do fígado Veia porta do fígado Artéria hepática Canalículo biliar Fígado Vesícula biliar (a) O fígado é o maior dos órgãos internos, pesando cerca de 1,5 kg em um adulto. Ele está localizado logo abaixo do diafragma, no lado direito do corpo. Artéria hepática Veia hepática Ducto colédoco Veia porta hepática • Bilirrubina • Nutrientes • Fármacos • Substâncias estranhas • Bilirrubina • Metabólitos de hormônios e fármacos • Nutrientes • Sais biliares • Bilirrubina • Água, íons • Fosfolipídeos Metabólitos para os tecidos periféricos • Glicose • Proteínas plasmáticas: albumina, fatores de coagulação, angiotensinogênio • Ureia • Vitamina D, somatomedinas • Metabólitos para excreção • Metabolismo de glicose e gorduras • Síntese de proteínas • Síntese de hormônios • Produção de ureia • Destoxificação • Armazenamento Absorvidos do trato gastrintestinal Metabólitos e fármacos dos tecidos periféricos Estômago Pancreas O ducto hepático comum leva a bile produzida no fígado à vesícula biliar para armazenamento. A artéria hepática traz sangue oxigenado contendo metabólitos dos tecidos periféricos para o fígado. O sangue da veia porta hepática é rico em nutrientes absorvidos do trato gastrintestinal e contém produtos da quebra da hemoglobina vindos do baço. O sangue deixa o fígado pela veia hepática (não mostrada). O ducto colédoco leva a bile da vesícula biliar para o lúmen do intestino delgado. Cada lóbulo é distribuído ao redor de uma veia central, que drena o sangue para a veia hepática. Na sua periferia, um lóbulo é associado a ramos da veia porta do fígado e da artéria hepática. Estes vasos se ramificam entre os hepatócitos, formando sinusoides dentro dos quais o sangue flui. Os hepatócitos são células do fígado. Cerca de 70% da área de superfície de cada hepatócito está voltada para os sinusoides, maximizando a troca entre o sangue e as células. Os canalículos biliares são pequenos canais nos quais a bile é secretada. Os canalículos unem-se, formando os dúctulos biliares que percorrem o fígado junto das veias porta. (d) O sangue entra no fígado, trazendo nutrientes e substâncias estranhas do trato digestório, bilirrubina da quebra de hemoglobina e metabólitos dos tecidos periféricos do corpo. Por sua vez, o fígado excreta alguns destes na bile e estoca ou metaboliza outros. Alguns dos produtos do fígado são resíduos a serem secretados pelos rins, outros são nutrientes essenciais, como a glicose. Além disso, o fígado sintetiza um conjunto de proteínas plasmáticas. O esfincter de Oddi controla a liberação de bile e de secreções pancreáticas no duodeno. 678 Dee Unglaub Silverthorn duros, conhecidos como pedras da vesícula, a vesícula biliar pode ser removida sem criar problemas de longo prazo. Os sais biliares não são alterados durante a digestão das gorduras. Quando eles alcançam a seção terminal do intestino delgado (o íleo), eles encontram células que os reabsorvem e os enviam de volta para a circulação. De lá, os sais biliares retornam para o fígado, onde os hepatócitos os captam novamente e os ressecretam. Esta recirculação dos sais biliares é essencial para a digestão das gorduras, uma vez que o pool de sais biliares do cor- po deve circular de 2 a 5 vezes em cada refeição. Alguns resíduos secretados na bile não podem ser reabsorvidos e passam para o intestino grosso para excreção. A maior parte da digestão ocorre no intestino delgado A secreção intestinal, pancreática e hepática de enzimas e de bile é essencial para a função digestória normal. Embora uma quantidade significativa de digestão mecânica ocorra na boca e no estômago, a digestão química do alimento é limitada a uma pequena quantidade de quebra de amido e digestão incompleta de proteínas no estômago. Quando o quimo entra no intestino delgado, a digestão de proteínas cessa quando a pepsina é inati- vada no pH intestinal alto. As enzimas pancreáticas e da borda em escova, então, finalizam a digestão de peptídeos, carboidratos e gorduras em moléculas menores que podem ser absorvidas. Os sais biliares facilitam a digestão de gorduras Gorduras e moléculas relacionadas à dieta ocidental incluem triacilgliceróis, colesterol, fosfolipídeos, ácidos graxos de cadeia longa e vitaminas lipossolúveis (Fig. 22.1, p. 30). Aproximada- mente 90% das calorias das gorduras vêm dos triacilgliceróis, pois eles são as formas principais de lipídeos, tanto de plantas quanto de animais. A digestão de gorduras é complicada pelo fato de que a maioria dos lipídeos não é particularmente solúvel em água. Como resultado, o quimo aquoso que deixa o estômago con- tém uma emulsão grosseira de grandes gotículas lipídicas, que tem menos área de superfície do que partículas menores. Para aumentar a área de superfície disponível para a digestão enzimá- tica da gordura, o fígado secreta sais biliares no intestino delgado (FIG. 21.16a). Os sais biliares ajudam a quebrar a emulsão de par- tículas grandes em partículas menores e mais estáveis. Os sais biliares, como os fosfolipídeos das membranas celulares, são anfipáticos, isto é, eles têm tanto uma região hi- drofóbica quanto uma região hidrofílica. As regiões hidrofóbicas dos sais biliares associam-se à superfície das gotas lipídicas, ao passo que a cadeia lateral polar interage com a água, criando uma emulsão estável de pequenas gotas de gordura solúveis em água (Fig. 21.16a). Você pode ver uma emulsão similar quando agita uma garrafa de molho vinagrete para temperar salada para mis- turar a camada aquosa e a oleosa. A digestão enzimática das gorduras é feita por lipases, enzimas que removem dois ácidos graxos de cada molécula de triacilglicerol. O resultado é um monoglicerol e dois ácidos graxos livres (Fig. 21.16c). Todavia, a cobertura de sais biliares da emul- são intestinal dificulta a digestão, uma vez que a lipase é incapaz de penetrar nos sais biliares. Por essa razão, a digestão de gorduras também requer a colipase, um cofator proteico secretado pelo pâncreas. A colipase desloca alguns sais biliares, permitindo à li- pase acessar as gorduras por dentro da cobertura de sais biliares. Os fosfolipídeos são digeridos pela fosfolipase pancreática. O colesterol livre não é digerido e é absorvido intacto. Enquanto a digestão enzimática e mecânica prossegue, ácidos graxos, sais biliares, mono e diacilgliceróis, fosfolipídeos e colesterol coalescem para formar pequenas micelas no formato de discos (Fig. 21.16b) (p. 63). As micelas, então, entram na fase aquosa sem agitação da borda em escova. Absorção de gorduras As gorduras lipofílicas, como áci- dos graxos e monoacilgliceróis, são absorvidos primariamente por difusão simples. Eles saem de suas micelas e difundem- -se através da membrana do enterócito para dentro da célula (Fig. 21.16d). Inicialmente, os cientistas acreditavam que o co- lesterol também se difundia através da membrana do enteróci- to, mas a descoberta de um fármaco, chamado de ezetimibe, que inibe a absorção do colesterol, sugere que estejamenvolvidas proteínas de transporte. Os experimentos agora indicam que algum colesterol é transportado através da borda em escova da membrana por transportadores de membrana específicos, de- pendentes de energia, incluindo o chamado NPC1L1, a pro- teína que é inibida por ezetimibe. Uma vez dentro dos enterócitos, os monoacilgliceróis e os ácidos graxos movem-se para o retículo endoplasmático liso, onde se recombinam, formando triacilgliceróis (Fig. 21.6d). Os triacilgliceróis, então, combinam-se com colesterol e pro- teínas, formando grandes gotas, denominadas quilomícrons. Devido ao seu tamanho, os quilomícrons devem ser armazenados em vesículas secretoras pelo aparelho de Golgi. Os quilomícrons, então, deixam a célula por exocitose. O grande tamanho dos quilomícrons também impede que eles atravessem a membrana basal dos capilares (Fig. 21.16d). Em vez disso, os quilomícrons são absorvidos pelos capilares linfáti- cos, os vasos linfáticos das vilosidades. Os quilomícrons passam atra- vés do sistema linfático e, por fim, entram no sangue venoso logo antes que ele se direcione para o lado direito do coração (p. 499). Alguns ácidos graxos curtos (10 ou menos carbonos) não são agrupados em quilomícrons. Esses ácidos graxos podem, por- tanto, atravessar a membrana basal dos capilares e ir diretamente para o sangue. REVISANDO CONCEITOS 12. Os sais biliares digerem os triacilgliceróis em monoacilgliceróis e em ácidos graxos livres? 13. Os ácidos biliares são reabsorvidos no intestino distal por um transportador de ácidos biliares apical dependente de sódio (ASBT) e por um transportador basolateral de ânions orgânicos (OAT). Desenhe um enterócito. Marque o lúmen, o LEC e os lados basolateral e apical. Esquematize a reabsorção de ácidos biliares como descrito. 14. Explique como o pH pode ser utilizado para predizer a localização onde uma enzima digestória em particular poderá ser mais ativa. FIGURA 21.16 CONTEÚDO ESSENCIAL A maior parte dos lipídeos são hidrofóbicos e devem ser emulsi- ficados para facilitar a digestão no ambiente aquoso do intestino. Digestão e absorção: gorduras Triacilglicerol Monoacilglicerol Ácidos graxos livres + Lipase, colipase Lado hidrofóbico associado aos lipídeos. Gotícula lipídica recoberta de sais biliares Sal biliar Sal biliar Diacilglicerol Fosfolipídeos Cadeias laterais polares (lado hidrofílico associado à água). Monoacilglicerol Ácidos graxos livres Água Bile proveniente do fígado Lipase pancreática e colipase (a) Os sais biliares cobrem os lipídeos, formando emulsões. (b) As micelas são pequenos discos com sais biliares, fosfolipídeos, ácidos graxos, colesterol e mono e diacilgliceróis. (d) Digestão e absorção de gorduras (c) Lipase e colipase digerem triacilgliceróis. Colesterol Célula do intestino delgado Líquido intersticial Lúmen do intestino delgado Capilar Colesterol + triacilgliceróis + proteína Grandes glóbulos de gordura provenientes do estômago Linfa para a veia cava Lactífero Emulsão Reciclagem de sais biliaresSais biliares Aparelho de Golgi RE liso Quilomícron1 3a 3b 2 4 Micelas Pâncreas Esfincter de Oddi Fígado 1 2Os sais biliares provenientes do fígado cobrem as gotas de gordura. A lipase e a colipase pancreáticas quebram gorduras em monoacilgliceróis e ácidos graxos estocados em micelas. 3a Os monoacilgliceróis e os ácidos graxos movem-se para fora das micelas e entram nas células por difusão. O colesterol é transportado para as células. 3b Os lipídeos absorvidos combinam-se com o colesterol e as proteínas nas células intestinais para formar os quilomícrons. 4 Os quilomícrons são removidos pelo sistema linfático. 5 5 Os carboidratos são absorvidos como monossacarídeos Cerca de metade das calorias que um norte-americano médio in- gere estão na forma de carboidratos, principalmente amido e sa- carose (tabela de açúcares). Outros carboidratos da dieta incluem os polímeros de glicose glicogênio e celulose, dissacarídeos, como a lactose (açúcar do leite) e a maltose, e os monossacarídeos glicose e frutose (Fig. 2.2, p. 31). A enzima amilase quebra longos políme- ros de glicose em cadeias menores de glicose e no dissacarídeo maltose (FIG. 21.17a). A digestão do amido inicia na boca com a amilase salivar, mas essa enzima é desnaturada pela acidez do estômago. A ami- lase pancreática, então, retoma a digestão do amido em maltose. A maltose e outros dissacarídeos são quebrados pelas enzimas da borda em escova intestinal, conhecidas como dissacaridases (maltase, sacarase e lactase). Os produtos finais absorvíveis da digestão de carboidratos são glicose, galactose e frutose. Devido à absorção intestinal ser restrita a monossacarídeos, todos os carboidratos maiores devem ser digeridos para serem usados pelo corpo. Os carboidratos complexos que podemos di- gerir são o amido e o glicogênio. Nós não somos capazes de dige- rir celulose por não termos as enzimas necessárias. Como resulta- do, a celulose da matéria vegetal torna-se o que é conhecido como f ibra dietética ou formador de massa e é excretada não digerida. De forma similiar, a sucralose (Linea®), o adoçante artificial feito de sacarose, não pode ser digerida devido aos átomos de cloro que substituem três grupamentos hidroxila, bloqueando a digestão enzimática deste derivado de açúcar. Absorção de carboidratos A absorção intestinal de glicose e galactose usa transportadores idênticos àqueles encontrados nos túbulos renais proximais: o simporte apical Na � -glicose SGLT e o transportador basolateral GLUT2 (Fig. 21.17b). Esses transportadores movem tanto a galactose quanto a glicose. A absorção de frutose, entretanto, não é dependente de Na � . A frutose move-se através da membrana apical por difusão faci- litada pelo transportador GLUT5 e através da membrana baso- lateral pelo GLUT2 (p. 144). FIGURA 21.17 CONTEÚDO ESSENCIAL A maior parte dos carboidratos em nossa dieta são dissacarídeos e carboidratos complexos. A celulose não é digerível. Todos os outros carboidratos devem ser digeridos a monossacarídeos antes que eles possam ser absorvidos. Digestão e absorção de carboidratos (a) Quebra dos carboidratos em monossacarídeos. (b) Absorção dos carboidratos no intestino delgado. Amido, glicogênio SacaroseMaltose Maltase 2 glicose 1 glicose + 1 frutose 1 glicose + 1 galactose Sacarase Lactase Lactose Polímeros de glicose Dissacarídeos Amilase Monossacarídeos Glicose ou galactose A frutose entra pelo GLUT5 e sai pelo GLUT2. A glicose entra com Na+ pelo SGLT e sai pelo GLUT2. Na+ K+ Na+ Lúmen do intestino Mucosa intersticial SGLT GLUT2 GLUT5 C ap ila r A T P LEGENDA FOCO CLÍNICO Intolerância à lactose A lactose, ou açúcar do leite, é um dissacarídeo compos- to de glicose e de galactose. A lactose ingerida deve ser digerida antes de ser absorvida, uma tarefa feita pela enzi- ma da borda em escova lactase. Em geral, a lactase é en- contrada apenas em mamíferos jovens, exceto em alguns seres humanos de ascendência europeia. Essas pessoas herdaram um gene dominante que lhes permite produzir lactase após a infância. Os cientistas acreditam que o gene da lactase forneceu uma vantagem seletiva para os seus antepassados que desenvolveram uma cultura em que o leite e seus derivados desempenham um papel importante. Em culturas não ocidentais, nas quais os produtos lácteos não fazem parte da dieta após o desmame, a maioria dos adultos não tem o gene e sintetiza menos lactase intesti- nal. A redução da atividade da lactase é associada a uma condição conhecida como intolerância à lactose. Se uma pessoa com intolerância à lactose beber leite ou ingerir seus derivados, ela pode ter diarreia. Além disso, bacté- rias no intestino grosso fermentam a lactose, produzindo gás e ácidos orgânicos, levando ao inchaço e à flatulência. A solução mais simples é remover os produtos do leite da dieta, apesar de já estardisponível o leite pré-digerido com lactase. Como os enterócitos são capazes de manter as concentra- ções intracelulares de glicose altas para que a difusão facilitada leve a glicose para o espaço extracelular? Na maioria das célu- las, a glicose é o principal substrato metabólico para a respiração aeróbia e é imediatamente fosforilada quando entra na célula. (p. 142). No entanto, o metabolismo dos enterócitos (e células dos túbulos proximais) aparentemente difere da maioria das ou- tras células. Estas células transportadoras epiteliais não usam gli- cose como fonte preferencial de energia. Estudos atuais indicam que essas células usam o aminoácido glutamina como sua prin- cipal fonte de energia, permitindo, assim, que a glicose absorvida passe inalterada para a circulação sanguínea. As proteínas são digeridas em pequenos peptídeos e aminoácidos Diferentemente dos carboidratos, os quais são ingeridos em formas que variam de simples a complexas, a maior parte das proteínas ingeridas são polipeptídeos ou maiores (Fig. 2.3, p. 32). Contudo, nem todas as proteínas são igualmente digeridas pelo ser humano. As proteínas vegetais são as menos digeríveis. Entre as mais digeríveis está a proteína do ovo, 85 a 90% encontra-se em uma forma que pode ser digerida e absorvida. Surpreenden- temente, de 30 a 60% das proteínas encontradas no lúmen intes- tinal não são provenientes do alimento ingerido, mas de células mortas que se desprendem e de proteínas secretadas, como as enzimas e o muco. As enzimas para a digestão de proteínas são classificadas em dois grupos amplos: endopeptidases e exopeptidases (FIG. 21.18b). As endopeptidases, mais comumente chamadas de proteases, atacam as ligações peptídicas no interior da cadeia de aminoáci- dos e quebram uma cadeia peptídica longa em fragmentos me- nores. As proteases são secretadas como proenzimas inativas (zi- mogênios) pelas células epiteliais do estômago, do intestino e do pâncreas. Elas são ativadas quando alcançam o lúmen do trato GI. Exemplos de proteases incluem a pepsina secretada no estômago, e a tripsina e a quimotripsina, secretadas pelo pâncreas. As exopeptidases liberam aminoácidos livres de dipep- tídeos por cortá-los das extremidades, um por vez. As amino- peptidases agem na extremidade aminoterminal da proteína; as carboxipeptidases agem na extremidade carboxiterminal. As exo- peptidases digestórias mais importantes são duas isoenzimas da carboxipeptidase secretadas pelo pâncreas. As aminopeptidases desempenham um papel menor na digestão. FIGURA 21.18 CONTEÚDO ESSENCIAL Digestão e absorção de proteínas Após a digestão, as proteínas são absorvidas principalmente como aminoácidos livres. Poucos di e tripeptídeos são absorvidos. Alguns peptídeos maiores que os tripeptídeos podem ser absorvidos por transcitose. (b) Enzimas para digestão de proteínas. (c) Absorção de peptídeos. COOH COOH COOHCOOH H2N H2N H2NH2N +H2O +H2O +H2O Aminoácidos Extremidade carboxiterminal Extremidade aminoterminal Aminopeptidase Carboxipeptidase A exopeptidase digere as ligações peptídicas terminais, liberando aminoácidos. A endopeptidase digere as ligações peptídicas internas. 2 peptídeos menores COOH COOH H2N H2N H2N COOHCOOH H2N Ligações peptídicas Aminoácido AminoácidoPeptídeo Cotransporte de di e tripeptídeos com H+ pela PepT1. Aminoácidos cotransportados com Na+. Pequenos peptídeos são transportados intactos através da célula por transcitose. Peptídeos Proteínas Na+Na+ H+H+ Peptidases Na+Na+ K+ H+ Para o fígadoSangue A T P (a) Proteínas são cadeias de aminoácidos. As endopeptidases incluem a pepsina no estômago, e tripsina e quimiotripsina no intestino delgado. 682 Dee Unglaub Silverthorn REVISANDO CONCEITOS 15. O que ativa o pepsinogênio, o tripsinogênio e o quimotripsinogênio? Absorção de proteínas Os produtos principais da digestão de proteínas são aminoácidos livres, dipeptídeos e tripeptídeos, to- dos os quais podem ser absorvidos. A estrutura dos aminoácidos é tão variável que múltiplos sistemas de transporte de aminoácidos ocorrem no intestino. A maioria dos aminoácidos livres são car- regados por proteínas cotransportadoras dependentes de Na � si- milares às encontradas nos túbulos proximais renais (Fig. 21.18b). Poucos transportadores de aminoácidos são dependentes de H � . Os dipeptídeos e tripeptídeos são carregados para os enteró- citos pelo transportador de oligopeptídeos PepT1 que usa o cotrans- porte dependente de H � (Fig. 21.18c). Uma vez dentro das células epiteliais, os oligopeptídeos têm dois possíveis destinos. A maioria é digerida por peptidases citoplasmáticas em aminoácidos, os quais são, então, transportados através da membrana basolateral e para a circulação. Aqueles oligopeptídeos que não são digeridos são trans- portados intactos através da membrana basolateral por um trocador dependente de H � . O sistema de transporte que move esses oligo- peptídeos também é responsável pela captação intestinal de certos fármacos, como alguns antibióticos �-lactâmicos, inibidores da en- zima conversora de angiotensina e inibidores da trombina. Alguns peptídeos maiores podem ser absorvidos intactos Alguns peptídeos que possuem mais de três aminoácidos são ab- sorvidos por transcitose (p. 152) após se ligarem a receptores de membrana na superfície luminal do intestino. A descoberta de que as proteínas ingeridas podem ser absorvidas como pequenos pep- tídeos tem implicações na medicina, pois esses peptídeos podem atuar como antígenos, substâncias que estimulam a formação de anticorpos e resultam em reações alérgicas. Como consequência, a absorção intestinal de peptídeos pode ser um fator significativo no desenvolvimento de alergias alimentares e intolerância a alimentos. Em recém-nascidos, a absorção de peptídeos ocorre princi- palmente nas células da cripta intestinal (Fig. 21.11). Ao nascimen- to, como as vilosidades intestinais são muito pequenas, as criptas são bem expostas ao conteúdo luminal. À medida que as vilosidades crescem e as criptas têm menos acesso ao quimo, a alta taxa de ab- sorção de peptídeos presente ao nascimento declina continuamente. Se os pais retardam o início da ingestão de peptídeos indutores de alergias pelos bebês, o TGI tem oportunidade para amadurecer, di- minuindo a probabilidade da formação de anticorpos. Um dos antígenos mais comuns responsável por alergias a alimentos é o glúten, um componente do trigo. A incidência de alergias por glúten na infância tem diminuído desde a década de 1970, quando os pais foram orientados a não alimentar os bebês com cereais à base de glúten até que eles tivessem vários meses de idade. Em outra aplicação médica, as indústrias farmacêuticas desenvolveram fármacos peptídicos indigeríveis que podem ser administrados oralmente, em vez de por injeção. Provavelmente, o exemplo mais bem conhecido é o DDAVP (1-deamino-8-d- -arginina vasopressina), o análogo simpático da vasopressina. Se o hormônio natural vasopressina é ingerido, ele é digerido, em vez de ser absorvido intacto. Ao se alterar levemente a estrutura do hormônio, os cientistas conseguiram criar um peptídeo sintético que possui a mesma atividade, mas é absorvido sem ser digerido. Os ácidos nucleicos são digeridos, formando bases e monossacarídeos Os polímeros de ácidos nucleicos, DNA e RNA, são apenas uma parte muito pequena da maioria das dietas. Eles são digeridos por enzimas pancreáticas e intestinais, primeiro em seus compo- nentes nucleotídicos e depois em bases nitrogenadas e monossa- carídeos (Fig. 2.4, p. 34). As bases são absorvidas por transporte ativo, e os monossacarídeos são absorvidos por difusão facilitada e transporte ativo secundário, bem como outros açúcares simples. O intestino absorve vitaminas e minerais Em geral, as vitaminas solúveis em lipídeos (A, D, E e K) são absorvidas no intestino delgado junto com as gorduras – razão pela qualos profissionais da saúde se preocupam com o con- sumo excessivo de “falsas gorduras”, como o olestra, que não são absorvidas. A mesma preocupação existe em relação ao orlistat (Lipoxen ® ), um inibidor da lipase utilizado para perda de peso. Os usuários deste auxiliar de perda de peso são aconselhados a to- mar um multivitamínico diário para evitar deficiências vitamínicas. As vitaminas solúveis em água (vitamina C e a maior parte das vitaminas B) são absorvidas por transporte mediado. A prin- cipal exceção é a vitamina B12, também conhecida como cobala- mina por conter o elemento cobalto. Obtemos a maior parte de nosso suprimento dietético de B12 de frutos do mar, carnes e lati- cínios. O transportador intestinal para B12 é encontrado somente no íleo e reconhece a B12 somente quando a vitamina está com- plexada com uma proteína, chamada de fator intrínseco, secre- tada pelas mesmas células gástricas parietais que secretam ácido. Uma preocupação sobre o extensivo uso de fármacos que inibem a secreção ácida gástrica, como os inibidores da bomba SOLUCIONANDO O PROBLEMA Reidratar as pessoas com cólera é a chave para a sua sobre- vivência. A maioria dos pacientes que desenvolvem cólera podem ser tratados sucessivamente com sais de reidratação oral. Entretanto, em cerca de 5% dos pacientes, a desidra- tação causada pela diarreia induzida pela cólera pode ser grave. Se deixados sem tratamento, estes pacientes podem morrer por colapso circulatório tão cedo quanto 18 horas após a infecção. Devido à pressão arterial de Brooke estar tão baixa, a equipe médica decidiu que ela necessitava de fluidos por via intravenosa (IV) para restaurar seu volume. P6: Receitas para a terapia de reidratação oral normalmente incluem açúcar (sacarose) e sal de mesa. Explique como o açúcar aumenta a absorção intestinal de Na � . P7: Que tipo de solução IV você selecionaria para Brooke, e por quê? As suas opções de escolha são salina normal (isotônica), salina na metade da concentração normal e dextrose 5% em água (D-5-W). 672659655 675 682 688 Fisiologia humana: uma abordagem integrada 683 de prótons, discutidos anteriormente, é que eles possam causar a redução da absorção da vitamina B12. Na ausência completa do fator intrínseco, a severa deficiência de vitamina B12 causa uma condição conhecida como anemia perniciosa. Nesse estado, a sín- tese de eritrócitos (eritropoiese), que depende de vitamina B12, é severamente diminuída. A falta do fator intrínseco não pode ser reparada diretamente, mas os pacientes com anemia perniciosa podem receber doses de vitamina B12. Ferro e cálcio A absorção de minerais geralmente ocorre por transporte ativo. O ferro e o cálcio são duas das poucas substân- cias cuja absorção intestinal é regulada. Para ambos os minerais, um decréscimo na concentração do mineral no corpo leva ao au- mento da captação no intestino. O ferro é ingerido como ferro heme (p. 521) na carne e como ferro ionizado em alguns produtos vegetais. O ferro heme é absorvido por um transportador apical no enterócito (FIG. 21.19a). O Fe2� ionizado é ativamente absorvido por co- transporte com H � por uma proteína, chamada de transportador de metal divalente 1 (DMT1). Dentro da célula, as enzimas con- vertem o ferro heme em Fe 2� e ambos os pools de ferro ionizado deixam a célula por um transportador, chamado de ferroportina. A absorção de ferro pelo corpo é regulada por um hor- mônio peptídico, chamado de hepcidina. Quando os estoques de ferro do corpo estão altos, o fígado secreta hepcidina, que se liga à ferroportina. A ligação da hepcidina faz o enterócito destruir o transportador ferroportina, o que resulta em redução da captação de ferro pelo intestino. A maior parte da absorção do Ca 2� no intestino ocorre por movimento passivo e não regulado através da via paracelular (Fig. 21.19b). O transporte de Ca 2� transepitelial hormonal- mente regulado ocorre no duodeno. O cálcio entra no enterócito através de canais apicais de Ca 2� e é ativamente transportado através da membrana basolateral tanto por uma Ca 2� -ATPase quanto por antiporte Na � -Ca 2� . A absorção do cálcio é regulada pela vitamina D3, discutida no Capítulo 23. O intestino absorve íons e água A maior parte da absorção de água ocorre no intestino delgado, com um adicional de 0,5 L por dia absorvido no colo. A absorção de nutrientes move o soluto do lúmen do intestino para o LEC, criando um gradiente osmótico que permite que a água siga junto. A absorção de íons no corpo também cria os gradientes osmóticos necessários para o movimento da água. Os enteróci- tos no intestino delgado e os colonócitos, as células epiteliais da superfície luminal do colo, absorvem Na � utilizando três pro- teínas de membrana (Fig. 21.19c): canais apicais de Na � , como o ENaC, um transportador por simporte Na � -Cl � e o trocador Na � -H � (NHE). No intestino delgado, uma fração significa- tiva da absorção de Na � também ocorre por meio de captação Cl– Cl– Cl– Na+ Na+ Na+ Na+ H+ HCO3 – Água e K+ movem-se através da via paracelular. Lúmen 2 1 O Na + entra nas células por múltiplas vias. A Na+-K+-ATPase bombeia Na+ para o LEC. Célula intestinal LEC K+ Na+ ATP Heme Heme DMT1 Fe2+ Fe2+ Fe2+ Ferroportina Lúmen Enterócito LEC Porfirina + Fe2+ H+ Ca2+ H2O, K + Ca2+ Canal de Ca2+ Ca 2+ Ca2+ A absorção paracelular não é regulada. O transporte transcelular é regulado por vitamina D3. 3 Na+ ATP (a) Absorção do ferro (b) Absorção do cálcio (c) Absorção de Na+, K+, Cl– e água Soluto orgânico FIGURA 21.19 Absorção de água e íons. 684 Dee Unglaub Silverthorn dependente de Na � de solutos orgânicos, como pelo SGLT e por transportadores Na � -aminoácidos. No lado basolateral de ambos, enterócitos e colonócitos, o transportador principal para o Na � é a Na � -K � -ATPase. A cap- tação de cloreto usa um trocador apical Cl � -HCO3 � e um canal basolateral de Cl para movimento através das células. A absorção de potássio e de água no intestino ocorre principalmente pela via paracelular. Regulação da fase intestinal A regulação da digestão e da absorção intestinal vem primaria- mente de sinais que controlam a motilidade e a secreção. Sen- sores no intestino desencadeiam reflexos neurais e endócrinos que retroalimentam para regular a taxa de entrega do quimo pelo estômago e antecipam informações para promover a digestão, a motilidade e a utilização de nutrientes. Os sinais de controle para o estômago e o pâncreas são ambos neurais e hormonais (FIG. 21.20): 1. O quimo entrando no intestino ativa o sistema nervoso en- térico, que, então, reduz a motilidade gástrica e a secreção, retardando o esvaziamento gástrico. Além disso, três hor- mônios reforçam o sinal de “motilidade reduzida”: secre- tina, colecistocinina (CCK) e peptídeo inibidor gástrico (GIP) (ver Tab. 21.1). 2. A secretina é liberada pela presença de quimo ácido no duodeno. A secretina inibe a produção ácida e diminui a motilidade gástrica. Além disso, a secretina estimula a produção de bicarbonato pancreático para neutralizar o quimo ácido que entrou no intestino. 3. A CCK é secretada na corrente sanguínea se uma refeição contém gorduras. A CCK também diminui a motilidade Secreção ácida Motilidade gástrica Secreção de pepsina e lipase Sistema nervoso entérico O quimo movendo-se para o duodeno desencadeia reflexos neurais e endócrinos que 1. Iniciam a secreção de enzimas e de bicarbonato; 2. Retroalimentam para reduzir a digestão e o esvaziamento gástrico; 3. Antecipam informações para iniciar a secreção de insulina. Ácido Solução hiper- osmótica Carboidratos Gorduras, proteínas ? Célula endócrina GIP GLP-1 CCK Secretina Secreção pancreática de bicarbonato Secreção de enzimas pancreáticas Secreção de insulina Bolo alimentar no estômago Quimo no intestino delgado Estômago Intestino delgado Pâncreas FIGURA 21.20Integração das fases gástrica e intestinal. CONCEITOS EMERGENTES Receptores gustatórios no intestino Os cientistas sabem há anos que o trato GI tem a capa- cidade de detectar a composição de uma refeição e res- ponder especificamente e diferencialmente. As gorduras e as proteínas não estimulam as mesmas respostas endócri- nas e exócrinas que uma refeição com carboidratos puros. Contudo, como o trato GI “sabe” o que há em uma refei- ção? Receptores sensoriais tradicionais, como os osmor- receptores e os receptores de estiramento, não são pro- gramados para responder a biomoléulas. Pesquisas atuais indicam que as células epiteliais do trato GI, principalmente algumas células endócrinas, expressam os mesmos recep- tores acoplados à proteína G e à proteína G gustducina as- sociada ao gosto dos botões gustatórios (p. 325). Os pes- quisadores, utilizando camundongos nocaute e linhagens de células cultivadas, estão tentando estabelecer a ligação funcional entre os “receptores gustatórios” gastrintestinais e as respostas fisiológicas ao alimento. Fisiologia humana: uma abordagem integrada 685 gástrica e a secreção de ácido. Como a digestão de gordura ocorre mais lentamente que a digestão de proteínas ou de carboidratos, é fundamental que o estômago permita que apenas pequenas quantidades de gordura entrem no intes- tino em um determinado momento. 4. Os hormônios incretinas GIP e o peptídeo similar ao gluca- gon 1 (GLP-1) são liberados se a refeição contém carboi- dratos. Ambos, GIP e GLP-1, atuam por antecipação para promover a liberação da insulina pelo pâncreas endócrino, permitindo que as células se preparem para receber a gli- cose que está para ser absorvida. Eles também retardam a entrada do quimo no intestino, diminuindo a motilidade gástrica e a secreção ácida. 5. A mistura de ácidos, enzimas e alimentos digeridos no quimo normalmente formam uma solução hiperosmótica. Os osmorreceptores na parede do intestino são sensíveis à osmolaridade do quimo que entra. Quando estimulados pela alta osmolaridade, os receptores inibem o esvazia- mento gástrico em um reflexo mediado por alguma subs- tância circulante desconhecida. O intestino grosso concentra os resíduos No final do íleo, resta apenas cerca de 1,5 litro de quimo não absorvido. O colo absorve a maior parte desse volume, de modo que, em geral, apenas cerca de 0,1 litro de água é perdido dia- riamente na fezes. O quimo entra no intestino grosso pelo óstio ileal (válvula ileocecal). Essa é uma região muscular tonica- mente contraída que estreita a abertura entre o íleo e o ceco, a seção inicial do intestino grosso (FIG. 21.21). A papila ileal relaxa cada vez que uma onda peristáltica a atinge. Ela também relaxa quando o quimo deixa o estômago, como parte do reflexo gastroileal. O intestino grosso possui sete regiões. O ceco é uma bolsa com o apêndice, uma pequena projeção sem saída similar a um dedo, em sua terminação ventral. O material move-se do ceco para cima através do colo ascendente, horizontalmente ao longo do corpo pelo colo transverso e, então, para baixo pelo colo des- cendente e pelo colo sigmoide. O reto é a seção terminal curta do intestino grosso (cerca de 12 cm). Ele é separado do ambiente externo pelo ânus, uma abertura controlada por dois esfincteres, Reto Reto O reflexo de defecação inicia com a distensão da parede retal. Esfincter interno do ânus Ânus Esfincter externo do ânus Ceco Apêndice vermiforme Íleo Colo ascendente Colo transverso AortaVeia porta do fígado Veia cava inferior Colo descendente Colo sigmoide Saculações do colo Tênia do colo Músculo circular Camada longitudinal (tênia do colo) As glândulas intestinais são o local da secreção de fluido. Linfonodo Submucosa Muscular externa Muscular da mucosa O alimento entra no intestino grosso através da valva ileocecal. FIGURA 21.21 Anatomia do intestino grosso. 686 Dee Unglaub Silverthorn um esfincter interno de músculo liso e um esfincter externo de músculo estriado esquelético. A parede do colo difere da parede do intestino delgado em que a musculatura do intestino grosso tem uma camada in- terna circular, mas uma camada de músculo longitudinal descon- tínua concentrada em três bandas, chamadas de tênias do colo. As contrações das tênias puxam as paredes, formando bolsões, chamados de haustrações. A mucosa do colo possui duas regiões, como as do intesti- no delgado. A superfície luminal não apresenta vilosidades e tem aparência lisa. Ela é composta de colonócitos e células calicifor- mes secretoras de muco. As criptas contêm células-tronco que se dividem para produzir um novo epitélio, bem como células caliciformes, células endócrinas e colonócitos maduros. Motilidade no intestino grosso O quimo que entra no colo continua a ser misturado por contrações segmentares. O movi- mento para a frente é mínimo durante as contrações de mistura e depende principalmente de uma única contração colônica, cha- mada de movimento de massa. Uma onda de contração diminui o diâmetro de um segmento do colo e manda uma quantidade substancial de material para a frente. Essas contrações ocorrem de 3 a 4 vezes ao dia e são associadas à ingestão alimentar e à distensão do estômago por meio do reflexo gastrocólico. O movi- mento de massa é responsável pela distensão súbita do reto, que desencadeia a defecação. O reflexo da defecação remove as fezes, material não digerido, do corpo. A defecação assemelha-se à micção, pois é um reflexo espinal desencadeado pela distensão da parede do órgão. O movimento do material fecal para o reto normalmen- te vazio dispara o reflexo. O músculo liso do esfincter interno do ânus relaxa, e as contrações peristálticas no reto empurram o material em direção ao ânus. Ao mesmo tempo, o esfincter externo do ânus, que está sob controle voluntário, consciente- mente é relaxado se a situação for apropriada. A defecação é frequentemente reforçada por contrações abdominais conscien- tes e movimentos expiratórios forçados contra a glote fechada (a manobra de Valsalva). A defecação, assim como a micção, está sujeita à influência emocional. O estrese pode aumentar a motilidade intestinal e causar diarreia psicossomática em alguns indivíduos, mas pode diminuir a motilidade e causar constipação em outros. Quando as fezes estão retidas no colo, ou por ignorar conscientemente o reflexo da defecação ou por redução da motilidade, a absorção contínua de água gera fezes duras e secas que são difíceis de se eliminar. Um tratamento usado para constipação são supositórios de glicerina em formato de pequenos projéteis que são inseridos no reto pelo ânus. A glicerina atrai a água e ajuda a amolecer as fezes para facilitar a defecação. Digestão e absorção no intestino grosso De acordo com a visão tradicional do intestino grosso, nenhuma digestão significativa de moléculas orgânicas acontece ali. No entanto, recentemente, essa visão tem sido revista. Agora sabemos que inúmeras bactérias que habitam o colo degradam uma quan- tidade significativa de carboidratos complexos e de proteínas não digeridos por meio da fermentação. O produto final inclui lactato e ácidos graxos de cadeia curta, como o ácido butírico. Muitos desses produtos são lipofílicos e podem ser absorvidos por difusão simples. Os ácidos graxos, por exemplo, são usados pelos colonócitos como seu substrato preferencial para obten- ção de energia. As bactérias colônicas também produzem quantidades significativas de vitaminas absorvíveis, sobretudo vitamina K. Os gases intestinais, como o sulfeto de hidrogênio, que escapam do trato gastrintestinal, são produtos menos úteis. Alguns ali- mentos contendo amido, como os feijões, são notórios por sua tendência a produzirem gases intestinais (flato). A diarreia pode causar desidratação A diarreia é um estado patológico no qual a secreção intestinal de líquido não é equilibrada pela absorção, resultandoem fezes aquosas. Ela ocorre se os mecanismos intestinais normais de absorção de água forem alterados ou se houver solutos osmoti- camente ativos não absorvidos que “seguram” a água no lúmen. Substâncias que causam diarreia osmótica incluem a lactose não digerida e o sorbitol, um poliálcool de plantas. O sorbitol é usado como um adoçante “artificial” em algumas gomas de mascar e em alimentos feitos para pessoas com diabetes. Outro soluto não absorvível que pode causar diarreia osmótica, cólica intestinal e gases é a olestra, a “falsa gordura” sintetizada a partir de óleo ve- getal e açúcar. No cenário clínico, os pacientes que precisam ter seus in- testinos limpos antes de uma cirurgia ou de outro procedimento muitas vezes recebem quatro litros de uma solução isotônica de CONCEITOS EMERGENTES O Projeto Microbioma Humano Será que você percebe que o corpo humano médio tem muito mais bactérias vivendo nele do que células? E que a maioria dessas bactérias reside no intestino? Os cientistas sabem há décadas sobre as bactérias intestinais e os pro- blemas que elas causam quando deixam o ambiente ex- terno do lúmen intestinal e entram no corpo propriamente dito. Infecções bacterianas são comuns se o seu apêndice rompe ou se um trauma, como uma facada, atinge a pa- rede do intestino. Ao mesmo tempo, a saúde continuada depende da absorção de vitaminas e de outros nutrientes do metabolismo bacteriano. A relação entre a nossa micro- biota (as bactérias que habitam nossos corpos) e a nossa saúde tornou-se um tema de pesquisa nos últimos anos, e os dados estão sendo coletados por uma colaboração internacional, denominada Projeto Microbioma Humano (http://commonfund.nih.gov/hmp). Os alimentos anuncia- dos como “probióticos” realmente fazem algo? As bac- térias podem influenciar se nós ganhamos peso ou não? Elas afetam o desenvolvimento fetal e/ou a suscetibilidade a doenças? Aprenderemos mais sobre as respostas a estas questões nos próximos anos. Fisiologia humana: uma abordagem integrada 687 polietilenoglicol e eletrólitos para beber. Como o polietilenogli- col não pode ser absorvido, um grande volume de solução não absorvida passa para o colo, onde provoca uma intensa diarreia que remove todos os resíduos sólidos do trato GI. Diarreias secretoras ocorrem quando toxinas bacterianas, como a toxina da cólera do Vibrio cholerae e a enterotoxina da Escherichia coli, aumentam a secreção colônica de Cl � e de flui- dos (ver Fig. 21.13). Quando a secreção excessiva de líquido é associada ao aumento da motilidade, ocorre diarreia. A diarreia secretora em resposta a uma infecção intestinal pode ser vista como adaptativa, uma vez que ajuda a arrastar patógenos para fora do lúmen. No entanto, ela também tem o potencial de cau- sar desidratação se a perda de líquidos for excessiva. A Organização Mundial de Saúde estima que, nos países em desenvolvimento, 4 milhões de pessoas morrem de diarreia a cada ano. Nos Estados Unidos, a diarreia em crianças causa apro- ximadamente 200 mil hospitalizações por ano. A reposição oral de fluidos para o tratamento da perda de sais e água pela diarreia pode prevenir a morbidade (doença) e a mortalidade (morte) asso- ciada à diarreia. As soluções de reidratação oral normalmente con- têm glicose ou sacarose, bem como Na � , K � e Cl � , uma vez que a inclusão de açúcar aumenta a absorção de Na � . Se a desidratação é grave, a infusão intravenosa de líquido pode ser necessária. REVISANDO CONCEITOS 16. Na diarreia secretora, as células epiteliais das vilosidades intestinais podem ser danificadas ou perdidas. Neste caso, será melhor usar uma solução de reidratação oral contendo glicose ou sacarose? Explique o seu raciocínio. FUNÇÕES IMUNES DO TRATO GASTRINTESTINAL Como você aprendeu no início deste capítulo, o trato GI é o maior órgão imune do corpo. A sua superfície luminal é continuamente exposta a organismos causadores de doença, e as células imunes do GALT precisam impedir que esses patógenos entrem no cor- po através dos delicados tecidos absortivos. A primeira linha de defesa são as enzimas e as imunoglobulinas da saliva e o ambiente extremamente ácido do estômago. Se patógenos ou materiais tó- xicos são produzidos no intestino delgado, os receptores senso- riais e as células imunes do GALT respondem. Duas respostas comuns são a diarreia, recém-descrita, e o vômito. As células M coletam conteúdos do trato GI O sistema imune da mucosa intestinal consiste em células imunes espalhadas por toda a mucosa, aglomerados de células imunes nas placas de Peyer (ver Fig. 21.1f ) e células epiteliais especializadas, chamadas de células M, que ficam sobre as placas de Peyer. As células M fornecem informações sobre o conteúdo do lúmen para as células imunes do GALT. As microvilosidades das células M estão em menor núme- ro e mais espaçadas do que na célula intestinal típica. A superfí- cie apical das células M contém depressões revestidas por clatri- na (p. 148) com receptores de membrana. Quando os antígenos se ligam a esses receptores, as células M usam transcitose para transportá-los para sua membrana basolateral, onde eles são libe- rados para dentro do líquido intersticial. Macrófagos e linfócitos (p. 514) estão esperando no compartimento extracelular para que a célula M os apresentem aos antígenos. Se os antígenos são substâncias que ameaçam o corpo, as células imunes mudam a sua ação. Elas secretam citocinas para atrair células imunes adicionais que podem atacar os invasores e citocinas que desencadeiam uma resposta inflamatória. Uma terceira resposta às citocinas é o aumento da secreção de Cl � , de fluido e de muco para retirar os invasores do trato GI. Nas doenças inflamatórias do intestino (como colite ulcerati- va e doença de Crohn), a resposta imune é desencadeada inapro- priadamente pelo conteúdo normal do intestino. Um tratamento experimental aparentemente bem-sucedido para essa doença envolve o bloqueio da ação de citocinas liberadas pelo tecido lin- fático associado ao intestino (GALT). A maneira como certas bactérias patogênicas cruzam a bar- reira criada pelo epitélio intestinal tem desafiado os cientistas du- rante anos. A descoberta das células M pode ser a resposta. Parece que algumas bactérias, como Salmonella e Shigella, evoluíram, pro- duzindo moléculas de superfície que se ligam aos receptores nas células M. As células M, então, obsequiosamente transportam a bacteria através da barreira epitelial e as depositam dentro do cor- po, onde o sistema imune imediatamente reage. Ambas as bacté- rias causam diarreia, e a Salmonella também causa febre e vômitos. O vômito é um reflexo protetor O vômito, ou êmese, a expulsão forçada de conteúdo gástrico e duodenal pela boca, é um reflexo protetor que remove materiais tóxicos do trato GI antes que eles possam ser absorvidos. Contu- do, o vômito excessivo ou prolongado com perda de ácido gástri- co pode causar alcalose metabólica (p. 647). O reflexo do vômito é coordenado por um centro do vô- mito no bulbo. O reflexo inicia com a estimulação de receptores sensoriais e é muitas vezes (mas não sempre) acompanhado por náusea. Uma variedade de estímulos de todo o corpo pode de- sencadear o vômito. Eles incluem substâncias químicas no san- gue, como citocinas e certos fármacos, dor, equilíbrio perturbado, como o que ocorre em um carro em movimento ou em um barco balançando, e estresse emocional. A estimulação da parede pos- terior da faringe também pode induzir o vômito. Os sinais eferentes do centro do vômito iniciam uma onda peristáltica retrógrada que inicia no intestino delgado e se move para cima. Essa onda é ajudada pela contração abdominal que aumenta a pressão intra-abdominal. O estômago relaxa de modo que a pressão aumentada force o conteúdo gástrico e intestinal de volta para o esôfago e para fora da boca. Durante o vômito, a respiração é inibida.A epiglote e o palato mole fecham a traqueia e a nasofaringe para prevenir que o vômito seja inalado (aspirado). Se o ácido ou as partículas pe- quenas de alimento entram nas vias aéreas, podem lesar o sistema respiratório e causar pneumonia de aspiração. 688 Dee Unglaub Silverthorn O Vibrio cholerae, a bactéria que causa cólera, foi inicialmente identificada na Índia, por volta de 1800. Ela causou sete epidemias mundiais desde então. Cerca de 75% das pessoas que são infectadas com o V. cholerae não têm sintomas, mas os 25% remanescentes desenvolvem uma diarreia secretora potencialmente fatal. O sistema imune intestinal na maioria das pessoas supera a infecção em cerca de uma semana. Mas até que isso aconteça, mesmo pessoas assintomáticas liberam bactérias em suas fezes, o que contribui para a propagação da doença. No Haiti, atormentado por saneamento inadequado e danos no suprimento de água causa- dos pelo terremoto, a cólera propagou-se rapidamente. Por volta de novembro de 2013, cerca de 700 mil casos e mais de 8 mil mortes foram reportados. A análise genética da linhagem de Vibrio cholera no Haiti sugere que a bactéria foi aciden- talmente trazida para a ilha por pacificadores das Nações Unidas vindos da Ásia. Se você planeja viajar para o Haiti ou para qualquer lugar com uma epidemia declarada de cólera, visite www.cdc.gov/travel e revise as diretrizes e os pro- cedimentos para evitar o contato com esta bactéria potencialmente letal. Para testar o seu conhecimento, compare as suas respostas com as informações sintetizadas na tabela a seguir. Pergunta Fatos Integração e análise P1: Como você esperaria que estivesse o volume de LEC de Brooke? A maioria dos fluidos na diarreia são secretados do corpo para o lúmen do trato GI. A perda de fluidos do corpo diminuirá o volume do LEC. P2: Por que Brooke teve taquicardia? A perda do volume do LEC pela diarreia diminuiu a pressão arterial de Brooke. A pressão arterial diminuída desencadeia um reflexo barorreceptor (p. 493). O aumento do estímulo simpático e a redução do parassimpático para o nó SA resulta em frequência cardíaca aumentada. P3: Esomeprazol é um inibidor da bomba de prótons (PPI). Para que sintoma ou condição Brooke estava tomando esse medicamento? “Bomba de próton” é outro nome para um transportador de H � dependente de ATP. O ácido do estômago é secretado por H � -K � -ATPase. Um inibidor da bomba de prótons diminuiria o ácido do estômago, assim Brooke poderia estar tomando o PPI para azia ou para doença do reflexo gastresofágico (DRGE). P4: Por que tomar um inibidor da bomba de prótons, como o esomeprazol, aumentou a chance de Brooke contrair cólera? Inibidores da bomba de prótons diminuem a acidez no estômago. O baixo pH gástrico é um dos mecanismos de defesa do corpo. Em um ambiente estomacal menos ácido, mais bactérias da cólera poderiam sobreviver à passagem através do estômago para o intestino delgado, onde elas poderiam infectar enterócitos. P5: Por que manter continuamente aberto o canal CFTR no enterócito causa diarreia secretora e desidratação em seres humanos? O cloreto deixa os enterócitos pelo canal CFTR. O Na � e a água o seguem pela via paracelular. Ver Figura 21.13. Um canal CFTR continuamente aberto significa uma aumentada secreção de NaCl e água para o lúmen, o que leva à diarreia aquosa. O sal e a água são provenientes do LEC, e sua perda causa desidratação. P6: Receitas para a terapia de reidratação oral normalmente incluem açúcar (sacarose) e sal de mesa. Explique como o açúcar aumenta a absorção intestinal de Na � . A sacarose é digerida a glicose e frutose. A glicose é absorvida por transporte ativo indireto dependente de Na � pelo SGLT. A captação de Na � pelo SGLT fornece uma via adicional para a absorção do Na � e acelera a reposição do fluido perdido. P7: Que tipo de solução IV você selecionaria para Brooke, e por quê? As suas opções de escolha são salina normal (isotônica), salina na metade da concentração normal e dextrose 5% em água (D-5-W). A secreção de cloreto pelos enterócitos faz Na � e água seguirem, com o resultado líquido sendo a secreção de fluido isotônico. O fluido de reposição deve corresponder à perda de líquidos tanto quanto possível. A salina normal (isosmótica) é mais próxima do fluido perdido na diarreia colérica. A salina na metade da concentração diluiria a osmolaridade corporal. A D-5-W não é aceitável, uma vez que é equivalente a dar água pura e não iria repor a perda de NaCl. Este problema foi escrito por Claire Conroy quando ela era uma estudante de graduação em Ciências Nutricionais/Terapia Pré-Física na University of Texas, em Austin. 672659655 675 682 688 SOLUCIONANDO O PROBLEMA CONCLUSÃO Cólera no Haiti Fisiologia humana: uma abordagem integrada 689 RESUMO DO CAPÍTULO O sistema digestório, como o sistema renal, tem um papel-chave no balanço de massas no corpo. A maioria do material que entra no sistema, pela boca ou por secreção, é absorvida antes de alcançar o final do trato GI. Em distúrbios como a diarreia, na qual a absorção e a secreção estão desequilibradas, a perda de material pelo trato GI pode alterar grave- mente a homeostase. A absorção e a secreção no trato GI fornecem inú- meros exemplos de movimento através das membranas, a maioria dos pro- cessos segue padrões que você já encontrou no rim e em outros sistemas. Finalmente, a regulação das funções do trato GI ilustra as complexas interações que ocorrem entre os sistemas de controle endócrino e neural e o sistema imune. Anatomia do sistema digestório 1. O alimento entrando no sistema digestório passa através da boca, faringe, esôfago, estômago (fundo, corpo, antro), intestino del- gado (duodeno, jejuno, ileo), intestino grosso (colo, reto) e ânus. (p. 658; Fig. 21.1a) 2. As glândulas salivares, o estômago, o pâncreas e o fígado adicio- nam secreções exócrinas contendo enzimas e muco ao lúmen. (p. 655; Fig. 21.1a) 3. O quimo é uma solução cremosa que se forma quando o alimento é degradado por digestão mecânica ou química. (p. 655) 4. A parede do trato GI consiste em quatro camadas: mucosa, sub- mucosa, muscular externa e serosa. (p. 658; Fig. 21.1d) 5. A mucosa está junto ao lúmen e consiste em epítélio, lâmina própria e muscular da mucosa. A lâmina própria contém células imunes. Pequenas vilosidades e invaginações aumentam a área de superfície. (p. 658; Fig. 21.1e, f ) 6. A submucosa contém vasos sanguíneos e linfáticos e o plexo sub- mucoso do sistema nervoso entérico. (p. 659; Fig. 21.1f ) 7. A muscular externa consiste em uma camada de músculo circular e uma camada de músculo longitudinal. O plexo mioentérico fica entre essas duas camadas musculares. (p. 659; Fig. 21.1e, f ) 8. A serosa é a camada de tecido conectivo externa que é a continua- ção da membrana peritoneal. (p. 659; Fig. 21.1d) Funções e processos digestórios 9. O trato GI move os nutrientes, a água e os eletrólitos do meio ex- terno para o meio interno. (p. 659) 10. A digestão é a degradação química e mecânica dos alimentos em unidades absorvíveis. A absorção é a transferência de substâncias do lúmen do trato GI para o LEC. A motilidade é o movimento do material ao longo do trato GI. A secreção é a transferência de fluido e eletrólitos do LEC para o lúmen ou a liberação de subs- tâncias pelas células. (p. 659; Fig. 21.2) 11. Cerca de 2 litros de líquido por dia entram no trato GI pela boca. Outros 7 L de água, íons e proteínas são secretados pelo corpo. Para manter o balanço de massas, quase todo esse volume é reabsorvido. (p. 661; Fig. 21.3) 12. Muitas enzimas digestórias são secretadas como zimogênios inati- vos para prevenir a autodigestão. (p. 661) 13. Para defesa contra invasores, o trato GI contém a maior coleção de tecido linfoide do corpo, o tecido linfoide associado ao intestino(GALT). (p. 660) 14. As células musculares lisas do trato GI despolarizam espontanea- mente e são eletricamente conectadas por junções comunicantes. Alguns segmentos do intestino são tonicamente contraídos, mas outros exibem contrações fásicas. (p. 661) 15. O músculo liso intestinal exibe poteniais de ondas lentas espontâ- neos que se originam em células intersticiais de Cajal. (p. 661) 16. Quando uma onda lenta alcança o limiar, ela dispara potenciais de ação, e o músculo contrai. (p. 663; Fig. 21.4a) 17. Entre as refeições, o complexo motor migratório move o alimen- to restante do trato GI proximal para as regiões distais. (p. 663; Fig. 21.4b) 18. As contrações peristálticas são ondas progressivas de contração que ocorrem principalmente no esôfago. As contrações segmen- tares são contrações mistas. (p. 663; Fig. 21.4c, d) Regulação da função gastrintestinal 19. O sistema nervoso entérico pode integrar informações sem en- tradas do SNC. Os neurônios intrínsecos estão completamente dentro do SNE. (p. 664) 20. Os reflexos curtos originam-se e são integrados no SNE. Os reflexos longos podem se originar no SNE ou fora dele, mas são integrados no SNC. (p. 664; Fig. 21.5) 21. Em geral, a inervação parassimpática é excitatória, e a inervação simpática é inibidora para a função GI. (p. 665) 22. Os peptídeos GI estimulam ou inibem a motilidade e a secreção. A maioria dos estímulos para a secreção de peptídeos GI vem da ingestão dos alimentos. (p. 665) 23. Os hormônios GI são divididos na família da gastrina (gastrina, colecistocinina), família da secretina (secretina, peptídeo inibi- dor gástrico, peptídeo similar ao glucagon 1) e hormônios que não se encaixam em nenhuma dessas duas famílias (motilina). (p. 665, 667; Tab. 21.1) A fase cefálica 24. A visão, o gosto ou o cheiro do alimento inicia um reflexo GI na fase cefálica da digestão. (p. 668; Fig. 21.8) 25. A digestão mecânica inicia com a mastigação, ou mastigamento. A saliva umedece e lubrifica o alimento. A amilase salivar digere os carboidratos. (p. 668) 26. A saliva é uma secreção exócrina que contém água, íons, muco e proteínas. A secreção salivar está sob controle autonômico. (p. 668) 27. Engolimento, ou deglutição, é um reflexo integrado por um cen- tro medular. (p. 668; Fig. 21.7) A fase gástrica 28. O estômago armazena o bolo alimentar, inicia a digestão de pro- teínas e gorduras e protege o corpo contra patógenos deglutidos. (p. 669) 29. O estômago secreta muco e bicarbonato pelas células muco- sas, pepsinogênio pelas células principais, somatostatina pelas células D, histamina pelas células ECL e gastrina pelas células G. (p. 670, 672; Fig. 21.9a, b; Fig. 21.10) 30. As células parietais nas glândulas gástricas secretam ácido clorí- drico e fator intrínseco. (p. 670; Fig. 21.9c) 31. A função gástrica é integrada com as fases cefálica e intestinal da digestão. (p. 670; Fig. 21.8, Fig. 21.20) 690 Dee Unglaub Silverthorn A fase intestinal 32. A maior parte da absorção dos nutrientes ocorre no intestino del- gado. O intestino grosso absorve água e íons. (p. 673) 33. A maior parte dos nutrientes vai diretamente para o fígado via sistema porta-hepático antes de entrar na circulação sistêmica. (p. 673; Fig. 21.12) 34. As enzimas intestinais são parte da borda em escova. As células caliciformes secretam muco. (p. 673) 35. As células intestinais secretam uma solução isotônica de NaCl usando o canal de cloreto CFTR. A água e o Na � seguem o Cl � a favor dos gradientes osmótico e eletroquímico. (p. 674; Fig. 21.13) 36. O pâncreas secreta uma solução aquosa de NaHCO3 pelas células dos ductos e enzimas digestórias inativas pelos ácinos (p. 674; Fig. 21.14) 37. A bile produzida pelos hepatócitos contém sais biliares, bilirru- bina e colesterol. A bile é armazenada e concentrada na vesícula biliar (p. 675; Fig. 21.15) 38. A digestão de gorduras é facilitada pelos sais biliares. Conforme a digestão prossegue, as gotículas de gordura formam micelas. (p. 675; Fig. 21.16) 39. A digestão de gorduras requer a enzima lipase e o cofator colipase. (p. 678; Fig. 21.16) 40. A absorção de gorduras ocorre principalmente por difusão simples. O colesterol é transportado ativamente. (p. 676; Fig. 21.16) 41. Os quilomícrons, feitos de monoacilgliceróis, de ácidos graxos, de colesterol e de proteínas, são absorvidos para a linfa. (p. 678; Fig. 21.16) 42. A amilase digere amido em maltose. As dissacaridases digerem dissacarídeos em monossacarídeos. (p. 680; Fig. 21.17) 43. A absorção da glicose usa o transportador por simporte SGLT Na � -glicose e o transportador GLUT2. A frutose usa os transpor- tadores GLUT5 e GLUT2. (p. 680; Fig. 21.17) 44. As endopeptidases (também chamadas de proteases) quebram proteínas em peptídeos menores. As exopeptidases removem aminoácidos dos peptídeos. (p. 681; Fig. 21.18) 45. Os aminoácidos são absorvidos via cotransporte dependente de Na � ou de H � . Os dipeptídeos e tripeptídeos são absorvidos via cotransporte dependente de H � . Alguns peptídeos maiores são absorvidos intactos via transcitose. (p. 682; Fig. 21.18) 46. Os ácidos nucleicos são digeridos e absorvidos como bases nitro- genadas e monossacarídeos. (p. 682) 47. As vitaminas lipossolúveis são absorvidas junto com as gorduras. As vitaminas hidrossolúveis são absorvidas por transporte media- do. A absorção da vitamina B12 requer o fator intrínseco secretado pelo estômago. (p. 682) 48. A absorção mineral geralmente ocorre via transporte ativo. Algum cálcio se move pela via paracelular. Íons e água movem-se pela via pa- racelular, bem como por proteínas de membrana. (p. 682; Fig. 21.19) 49. Ácido no intestino, CCK e secretina retardam o esvaziamento gás- trico. (p. 684; Fig. 21.20) 50. O material não digerido no colo se move para a frente por mo- vimento de massa. O reflexo de defecação é desencadeado por distensão repentina do reto. (p. 686; Fig. 21.21) 51. As bactérias colônicas usam a fermentação para digerir material orgânico. (p. 686) 52. As células do colo podem absorver e secretar líquido. A secreção excessiva de líquido ou a diminuição da absorção causam diarreia. (p. 686) Funções imunes do trato gastrintestinal 53. Os mecanismos protetores do trato GI incluem a produção de muco e ácido, vômitos e diarreia. (p. 687) 54. As células M coletam o conteúdo do trato GI e apresentam antí- genos para as células do GALT. (p. 687) 55. O vômito é um reflexo protetor integrado no bulbo. (p. 687) QUESTÕES PARA REVISÃO Além da resolução destas questões e da checagem de suas respostas na p. A-28, reveja os Tópicos abordados e objetivos de aprendizagem, no início deste capítulo. Nível um Revisando fatos e termos 1. Relacione cada uma das descrições que seguem com o(s) termo(s) apropriado(s): a. o quimo é produzido aqui b. órgão onde a maior parte da digestão ocorre c. seção inicial do intestino delgado d. adiciona secreções exócrinas ao duodeno via ducto e. esfincter entre o estômago e o intestino f. as enzimas são produzidas aqui g. a distensão de sua parede desen- cadeia o reflexo de defecação 1. colo 2. estômago 3. intestino delgado 4. duodeno 5. íleo 6. jejuno 7. pâncreas 8. piloro 9. reto 10. fígado 2. Para a maior parte dos nutrientes, quais são os dois processos que não são regulados? Quais são os dois que são continuamente regu- lados? Por que você acredita que essas diferenças existem? Justifi- que a sua resposta. 3. Defina os quatro processos básicos do sistema digestório e dê um exemplo de cada. 4. Liste as quatro camadas das paredes do trato GI. Que tipo de teci- do predomina em cada camada? 5. Descreva o tipo funcional do epitélio que reveste o estômago e os intestinos. 6. O que são placas de Peyer? E as células M do intestino? 7. Para que propósito serve a motilidade no trato GI? Que tipode tecido contribui para a motilidade do trato GI? Que tipos de con- trações os tecidos sofrem? 8. O que é um zimogênio? E uma proenzima? Liste dois exemplos de cada. Fisiologia humana: uma abordagem integrada 691 9. Relacione cada uma das células seguintes com seu(s) produto(s) secretado(s). Os itens podem ser usados mais de uma vez. a. células parietais b. células caliciformes c. células da borda em escova d. células pancreáticas e. células D f. células ECL g. células principais h. células G 1. enzimas 2. histamina 3. muco 4. pepsinogênio 5. gastrina 6. somatostatina 7. HCO3 � 8. HCl 9. fator intrínseco 10. Como cada um destes fatores pode afetar a digestão? Explique brevemente como e onde cada fator exerce seus efeitos. (a) Emulsificação. (b) Atividade neural. (c) Baixo pH. (d) Tamanho das partículas de alimento. 11. A maioria dos nutrientes digeridos é absorvida no ______ do sistema ______, entregando nutrientes para o _______ (órgão). Todavia, as gorduras digeridas vão para o sistema _________, pois os capilares intestinais possuem uma _________ que a maioria dos lipídeos é incapaz de atravessar. 12. O que é sistema nervoso entérico e qual é a sua função? 13. O que são reflexos curtos? Que tipos de respostas eles regulam? O que se entende pelo termo reflexo longo? 14. Que papel desempenham as substâncias parácrinas na digestão? Dê exemplos específicos. Nível dois Revisando conceitos 15. Mapeamento. Mapa 1: liste os três principais grupos de biomo- léculas no topo de uma folha grande de papel. No lado inferior esquerdo do papel escreva boca, estômago e intestino delgado. Para cada biomolécula em cada local, preencha com a enzima que dige- re a biomolécula, o produto da digestão de cada enzima e o local e mecanismos pelos quais esses produtos são absorvidos. Mapa 2: Crie um diagrama ou mapa usando os seguintes termos relacionados à absorção do ferro: • DMT1 • endocitose • enterócito • Fe 2� • ferro heme • ferroportina • fígado • hepcidina 16. Defina, compare e diferencie os seguintes pares ou conjuntos de termos: (a) mastigação, deglutição. (b) microvilosidade, vilosidade. (c) peristaltismo, contrações segmentares, complexo motor mi- gratório, movimentos de massa. (d) quimo, fezes. (e) reflexos curtos, reflexos longos. (f ) plexo submucoso, plexo mioentérico, nervo vago. (g) fases cefálica, gástrica e intestinal da digestão. 17. (a) Esquematize os mecanismos celulares pelos quais Na � , K � e Cl � são reabsorvidos do intestino. (b) Esquematize os mecanismos celulares pelos quais H � e HCO3 � são secretados para o lúmen. 18. Compare o sistema nervoso entérico com o cérebro cefálico. Dê alguns exemplos específicos de neurotransmissores, neuromo- duladores e células de sustentação dos dois. 19. Liste e descreva brevemente as ações dos membros de cada um dos três grupos de hormônios GI. 20. Explique como os antagonistas do receptor H2 e os inibidores da bomba de prótons reduzem a secreção ácida gástrica. Nivel três Solucionando problemas 21. Na doença chamada hemocromatose, o hormônio hepcidina está ausente ou não funcional. Utilize os seus conhecimentos sobre a homeostasia do ferro para prever o que ocorre com a captação in- testinal de ferro e com os níveis plasmáticos de ferro nessa doença. 22. O bebê de Erica, Justin, teve episódios graves de diarreia e agora está desidratado. É mais provável que seu sangue esteja em acidose ou alcalose? Por quê? 23. Mary Littlefeather chegou ao consultório do seu médico recla- mando de uma dor intensa e constante no quadrante superior direito do abdome. A dor iniciou logo após ela comer frango frito, batatas fritas e ervilhas. Exames de laboratório e ultrassom revela- ram a presença de cálculos do ducto colédoco que vai do fígado, da vesícula biliar e do pâncreas para o intestino delgado. (a) Por que a dor de Mary foi desencadeada pelo alimento que ela comeu? (b) Quais dos seguintes processos serão afetados pelas pedras na vesícula: formação de micelas no intestino, digestão de carboidratos no intestino e absorção de proteínas no intestino. Explique o seu raciocínio. 24. Com base no que você apendeu sobre o transporte epitelial, desenhe uma figura das células dos ductos salivares e do lúmen. Organize os seguintes canais de membrana e transportadores nas membranas apical e basolateral para que as células do ducto absorvam Na � e secretem K � : canais ENaC, Na � -K � -ATPase e K � . Com a estimulação neural, a taxa do fluxo de saliva pode au- mentar de 0,4 mL/min para 2 mL/min. O que você acha que ocor- re com o conteúdo de Na � e K � da saliva a uma alta taxa de fluxo? Nível quatro Problemas quantitativos 25. O transporte intestinal do análogo de aminoácidos MIT (monoio- dotirosina) pode ser estudado com o uso da preparação do “saco intestinal invertido”. Uma porção do intestino é virada ao avesso e preenchida com uma solução contendo MIT, amarrada em ambas as extremidades e, então, colocada em um banho contendo nutrien- tes, sais e uma concentração igual de MIT. Mudanças na concen- tração de MIT são monitoradas no banho (lado mucoso ou apical do intestino invertido), nas células intestinais (tecido) e dentro do saco (lado seroso ou basolateral do intestino) por um período de 240 minutos. O resultado é mostrado no gráfico. (Dados de Nathans et al., Biochimica et Biophysica Acta 41: 271-282, 1960.) 692 Dee Unglaub Silverthorn 0 60 120 180 240 C o n c e n tr a ç ã o d e M IT Tecido Tempo (minutos) Lado seroso Lado mucoso (a) Com base nos dados mostrados, o transporte transepitelial de MIT é um processo passivo ou ativo? (b) Por qual via o MIT se move: (1) de apical para tecido para basolateral, ou (2) de basolateral para tecido para apical? Esse movimento é de absorção ou secreção? (c) O transporte através da membrana apical é ativo ou passivo? Explique o seu raciocínio. (d) O transporte através da membrana basolateral é ativo ou pas- sivo? Explique o seu raciocínio. As respostas para as questões de Revisando conceitos, Figuras, Questões gráficas e Questões para revisão ao final do capítulo podem ser encontradas no Apêndice A (p. A-1). Unidade 4 - Metabolismo, crescimento e envelhecimento Capítulo 21 - Sistema Digestório