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DOENÇAS TRANSMITIDAS POR ALIMENTOS (DTA) Profa. Camila Santa Rosa Suhett Biomédica CRBM: 1031 As doenças transmitidas por alimentos podem ser causadas por "fatores de natureza química, física e biológica, que em quantidades suficientes e com capacidade para se manterem no curso da cadeia alimentar podem causar agravo à saúde" (BRASIL, 2010, p. 99). Alimentos contaminados não têm uma aparência definida, podem apresentar odor e sabor normais e, como o consumidor não está devidamente esclarecido ou consciente dos perigos envolvidos, não consegue identificar um alimento contaminado somente pelas suas características físicas ou organolépticas (FORSYTHE, 2000). De acordo com a Associação Brasileira das Empresas de Refeições Coletivas (ABERC, 2013), as doenças transmitidas pelos alimentos podem ser assim classificadas: • Toxinose ou Intoxicação: ingestão de toxinas bacterianas pré-formadas nos alimentos, decorrente da multiplicação microbiana com produção de toxina no alimento. Exemplo de algumas bactérias toxinogênicas: o Staphylococcus aureus. o Clostridium botulinum. o Bacillus cereus emético. • Infecção: ingestão de microrganismos patogênicos que se multiplicam no trato gastrointestinal, produzindo toxinas ou agressão ao epitélio. Exemplo de alguns microrganismos infectantes: o Bacillus cereus clássico. o Clostridiun perfringens. o Salmonella sp. o Escherichia coli patogênica. DOSE INFECTANTE A dose infectante consiste no número de microrganismos capaz de desencadear uma doença. O nível da dose infectante mínima é muito difícil de determinar, pois varia de pessoa para pessoa, depende das condições fisiológicas de cada um, como: imunidade, estado nutricional, nível de estresse, flora intestinal e grau de acidez gástrica. Ainda existem os grupos especiais de risco, que são as crianças, os idosos, as gestantes e os imunodeprimidos, que podem adoecer com uma dose infectante menor do que o necessário para causar doença em um adulto saudável (BAPTISTA; VENÂNCIO, 2003). Características de agentes causadores de DTA Staphylococcus aureus (toxinose): • Proveniente do nariz, região orofaríngea e mãos de manipuladores. • Período de incubação (aparecimento dos primeiros sintomas após o consumo): 1 a 6 horas. • Sintomas: vômitos, cólicas, mal-estar, dores musculares, raras diarreias, sem febre. • Como ocorre: através do consumo de alimentos contaminados por manipuladores, que apresentaram condições adequadas para a proliferação destes microrganismos (ABERC, 2013). Bacillus cereus emético (toxinose): • Proveniente do solo, água, vegetais, grãos e farinhas. • Período de incubação: 1 a 6 horas. • Sintomas: vômitos, cólicas, mal-estar, raras diarreias, sem febre. • Como ocorre: através do consumo de alimentos cozidos, como arroz, carnes, verduras, pudins etc., armazenados em condições inadequadas de temperatura por algumas horas (FRANCO; LANDGRAF, 2008; SILVA JR., 2014). Clostridium botulinum (toxinose): • Proveniente do solo, água, vegetais, aves e pescados. • Período de incubação: 8 a 36 horas. • Sintomas: visão dupla, dificuldade de falar, deglutir, respirar, mucosa da boca ressecada, insuficiência respiratória e morte. • Como ocorre: através do consumo de alimentos cozidos mantidos em anaerobiose e deixados por várias horas em temperatura inadequada, como: carnes, embutidos não refrigerados, enlatados mal processados e conservas caseiras de vegetais e pescados (ABERC, 2013). Bacillus cereus clássico (infecção): • Proveniente do solo, água, vegetais, grãos e farinhas. • Período de incubação: 8 a 16 horas. • Sintomas: cólicas, diarreia, raros vômitos, sem febre. • Como ocorre: através do consumo de alimentos cozidos, armazenados em condições inadequadas de temperatura por algumas horas (SILVA JR., 2014). Clostridiun perfringens (infecção): • Proveniente do solo, água e vegetais. • Período de incubação: 8 a 16 horas. • Sintomas: cólicas, diarreia, raros vômitos, sem febre. • Como ocorre: através do consumo de alimentos cozidos ou refogados que mantém condições de anaerobiose, armazenados por várias horas em condições inadequadas de temperatura (ABERC, 2013). Escherichia coli patogênica (infecção): • Proveniente das fezes do homem ou de animais de sangue quente. • Período de incubação: 8 a 16 horas. • Sintomas: cólicas, diarreia, raros vômitos, sem febre. • Como ocorre: através do consumo de alimentos contaminados no ambiente ou na manipulação, que foram cozidos e deixados por várias horas em condições inadequadas de temperatura (SILVA JR., 2014). Salmonella sp (infecção): • Proveniente de carnes, aves, produtos lácteos, frutos do mar, gema de ovo, hortaliças plantadas em locais adubados com fezes e também manipuladores que possam estar contaminados. • Período de incubação: 12 a 72 horas. • Sintomas: cólicas, diarreia, vômitos e febre. • Como ocorre: através do consumo de alimentos malcozidos, deixados por várias horas em condições inadequadas de temperatura (ABERC, 2013). Os sintomas apresentados pelo portador de DTA dependerá do agente causador envolvido e pode variar de um leve desconforto intestinal até quadros mais sérios, podendo ocasionar desidratação grave, diarreia sanguinolenta e insuficiência renal aguda (BRASIL, 2016). A figura a seguir apresenta alguns exemplos de perigos que têm classificação de risco alta, ou seja, que podem causar efeitos graves para a saúde, obrigando ao internamento para reverter a situação, podendo, inclusivamente, provocar a morte. As doenças transmitidas por alimentos podem causar surtos, definido pelo Ministério da Saúde como "episódio em que duas ou mais pessoas apresentam os mesmos sinais/sintomas após ingerir alimentos e/ou água da mesma origem” (BRASIL, 2016, p. 5). No país, desde 1999 faz-se um controle e vigilância dos surtos, por isso a importância da notificação quando há casos de doenças transmitidas por alimentos. Essa notificação permite a investigação do estabelecimento e/ou produto causador do surto e a elaboração de estatísticas, tornando possível o conhecimento do perfil epidemiológico dos surtos causados por DTA no Brasil. Segundo estatísticas, no ano de 2016 o Brasil apresentou 543 surtos com 9907 pessoas doentes, número menor de surtos e doentes se comparados aos dados do ano anterior. Em um período histórico de 2007 a 2017, homens e mulheres na faixa etária de 20 a 49 anos foram os mais acometidos com DTA no Brasil. O principais locais de ocorrência dos surtos foram residências, restaurantes e padarias (BRASIL, 2016). A figura a seguir apresenta os principais alimentos envolvidos em surtos de DTA no Brasil, o que oferece uma ideia dos alimentos que são potencialmente mais perigosos, embora façam parte dessa estatística alimentos que não foram identificados pelos doentes. A Australian New Zealand Food Autorithy (ANZFA, 2001) define como alimentos potencialmente perigosos aqueles que necessitam de controle de temperatura para minimizar o crescimento de microrganismos que possam estar no alimento, ou previnir a formação de toxinas no alimento. A organização ainda classifica alimentos, segundo termos de risco para a saúde, em alto, médio e baixo. Segundo a ANZFA (2001), alimentos de risco alto são alimentos que suportam o crescimento de microrganismos patogênicos e produção de toxinas, como: • carne; • carne de aves; • salsichas frescas; • salames; • peixes; • ostras; • leite; • arroz cozido; • lasanha; • ovos. Para a ANZFA (2001), alimentos de médio risco são alimentos que podem conter microrganismos patogênicos, mas geralmente não suportam o seu crescimento, o que pode estar relacionado às características do próprio alimento, devido a sua natureza ou ao seu processamento, tais como: • frutas; • vegetais; • sucos de laranja; • carnes enlatadas; • leites pasteurizados; • produtos lácteos; • produtos de confeitaria à base de leite. Os alimentos de baixo risco são aqueles alimentos que não suportam o crescimento microbiano e que a presença de microrganismosé improvável (ANZFA, 2001), são eles: • cereais; • farinhas; • produtos de panificação; • refrigerantes; • produtos de confeitaria à base de açúcar; • bebidas alcoólicas; • óleos e gorduras. Casos de contaminação de alimentos • Noma e a falta de água quente As 63 pessoas que passaram mal após comerem no restaurante Noma, considerado o melhor do mundo pela revista Restaurant, não foram as primeiras, nem serão as últimas a sofrer com alimentos contaminados. Seja por deslizes durante o preparo em restaurantes ou falhas no processo industrial dos alimentos, várias empresas já mancharam sua reputação pelo mesmo motivo que hoje o Noma vê sua hegemonia como melhor do mundo ameaçada. No caso do Noma, essencialmente, o incidente aconteceu por falta de medidas mais rígidas de higiene e falhas na cultura de contaminação. Por ora, o estabelecimento prometeu reembolso às vítimas ou outra refeição no local. • Ketchup Heinz com pelo de rato Em fevereiro passado, a Proteste (associação de defesa do consumidor) encontrou três pelos de rato em uma amostra de ketchup da Heinz durante testes de qualidade. Em comunicado, a associação afirmou que o material encontrado indica problemas “graves de higiene, além da falta de cuidados mínimos para a fabricação ou acondicionamento”. • Funcionário do Burger King pisando em alface Um funcionário do Burger King em Ohio, nos Estados Unidos, postou na internet uma fotografia em que aparece pisando em potes com alface dentro. As imagens tinham a seguinte legenda: "Esta é a alface que vocês comem no Burger King". Os funcionários foram demitidos. • Rato em salgadinho Em outubro de 2011, uma dona de casa de Joinville (SC) encontrou um filhote de rato morto dentro de um pacote de salgadinho da Elma Chips, da Pepsico. No ano passado, um estudante também encontrou um camundongo morto dentro do pacote lacrado de um salgadinho de soja da marca Jasmine. As duas empresas negaram contaminação do processo de fabricação. • Toddynho com detergente Em 2011, ao menos 39 pessoas de 15 cidades do Rio Grande do Sul passaram mal após ingerirem achocolatado Toddynho contendo detergente. Análises laboratoriais indicaram que cerca de 80 unidades de 200 ml possuíam um pH muito alto para um alimento. No ano passado, a justiça decidiu que a Pepsico deveria pagar R$ 420 mil em indenização às vítimas.