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CURSO DE ESPECIALIZAÇÃO em PRECEPTORIA EM SAÚDE unidade 1 Sistema Único de Saúde: histórico, princípios e diretrizes Maria da Conceição de Mesquita Cornetta Abordagem Introdutória de Preceptoria em Saúde 2 ASPECTOS FUNDAMENTAIS DO SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE: HISTÓRICO, PRINCÍPIOS E DIRETRIZES CONTEUDISTA: MARIA DA CONCEIÇÃO DE MESQUITA CORNETTA RESUMO Este módulo aborda o conceito de preceptoria, buscando discutir o papel do preceptor na área da saúde para que sua atuação, baseada nos novos conhecimentos, colabore com a formação do novo profissional da área da saúde, o qual tem seu perfil descrito nos documentos e nas legislações direcionadas pelo MEC que trazem os objetivos da aprendizagem para os cursos da saúde. As novas abordagens pedagógicas são pautadas nos conhecimentos registrados pela literatura e alicerçam as características da aprendizagem do adulto e as metodologias ativas de ensino- aprendizagem. Essas atividades se tornaram um marco na modernização do ensino na saúde, mudando o foco do processo: do professor, na educação bancária em que ele era o detentor do conhecimento, para o aluno, até então receptáculo, passando a ter um papel proativo na construção do seu conhecimento. Enfim, o módulo traz noções sobre a importância do trabalho interprofissional em saúde, representando uma nova forma do profissional valorizar o resultado de sua atuação. 3 EMENTA Conceito de preceptoria. Papel do preceptor na área da saúde. Bases históricas da construção das novas abordagens pedagógicas. Diretrizes e legislação que recomendam objetivos de aprendizagem nos cursos da saúde. Aprendizagem do adulto como alicerce para novas metodologias de ensino-aprendizagem. Metodologias ativas de aprendizagem. A intenção de atuar como preceptor. A equipe multi- profissional no trabalho na saúde. OBJETIVOS OBJETIVO GERAL Disponibilizar subsídios aos profissionais que exercem preceptoria, para que desenvolvam uma postura crítico- -reflexiva e compreendam a importância do seu papel na formação de um profissional da saúde, além de realizar uma introdução para o conhecimento de ferramentas educa- cionais como as metodologias ativas de ensino-aprendizagem. OBJETIVOS ESPECÍFICOS • Discutir o papel do preceptor, considerando suas várias formas de atuação que convergem para a formação do profissional da saúde. • Apresentar as bases documentais e legais que direcio- nam a definição dos objetivos de aprendizagem. • Introduzir o conhecimento sobre as metodologias ativas de ensino-aprendizagem, discutindo suas estratégias baseadas na aprendizagem do adulto. • Ressaltar a importância do trabalho interprofissional e a inserção do profissional da saúde em formação nesse contexto. CONTEÚDO UNIDADE 1: CONHECENDO AS BASES DA PRECEPTORIA AULA 1: Papel do preceptor na área da saúde AULA 2: Diretrizes para os objetivos de aprendizagem AULA 3: Noções sobre andragogia UNIDADE 2: ATIVIDADES DO PRECEPTOR AULA 1: Introdução a metodologias ativas de aprendizagem e avaliação AULA 2: O fim do trabalho solitário: a construção interprofissional da atuação UNIDADE 1: CONHECENDO AS BASES DA PRECEPTORIA 6 Esta unidade descreve e discute os papéis desempenhados pelo pre- ceptor dentro de um serviço de saúde e ressalta a importância de sua postura para a formação do futuro profissional da saúde. Objetivos: • Discutir o papel do preceptor, considerando suas várias formas de atuação que convergem para a formação do profissional da saúde. • Apresentar as bases documentais e legais que direcionam a definição dos objetivos de aprendizagem. • Oferecer subsídios ao aluno deste curso, melhorando a compreensão sobre aprendizagem do adulto para melhor aplicação das metodologias de ensino-aprendizagem. 7 AULA 1 - Papel do preceptor na área da saúde UM NOVO OLHAR SOBRE AS ESTRATÉGIAS DE ENSINO-APRENDIZAGEM Não haveria melhor forma de começar a falar sobre formação profissio- nal ou sobre o papel do preceptor do que citando o patrono da educação brasileira, aquele que inovou a forma de educar e apresentou a visão crítica do processo ensino-aprendizagem, nomeando a aquisição do conhecimento como processo libertador, transformador da realidade: Paulo Freire. Quando pensamos a formação do profissional da saúde, precisamos incluir a integralidade do cuidado, as relações interpessoais e o aspecto humanístico do processo, fugindo da educação bancária, da passividade na aquisição do conhecimento, para o processo facilitador da construção do próprio conhecimento pelo indivíduo. Tudo isso parece muito teórico e distante da realidade, mas se refletirmos a respeito das mudanças do processo de ensino, seja teórico, seja prático, percebemos como essas teorias são extraídas da realidade, da rotina do dia a dia. Até algum tempo atrás, o estudante da saúde aprendia na prática repetindo habilidades e atitudes de alguém mais experiente, sem desenvolver sua visão crítica e sem considerar que o outro com quem interage é uma pessoa humana, portadora de uma doença, e por isso trata apenas a doença, e não o doente, um indivíduo inserido num contexto biopsicos- social, familiar e econômico, que naquele momento tem uma doença. Nessa perspectiva, a proposta da educação problematizadora de Paulo Freire mostra que alunos e professores são transformados durante o processo educativo, aprendem enquanto ensinam e ambos são levados a desenvolver a consciência crítica e a postura ativa. Nesse mecanismo é fundamental então alcançar a autonomia, a busca pelo conhecimento e a consciência da metacognição. 8 Você sabia? Metacognição é a capacidade de perceber o que ainda não sabe e ter a postura de buscar o conhecimento, pesquisar, procurar saber, ou seja, desenvolver a curiosidade científica, enfatizada por Freire, pelo uso da estratégia da ação-reflexão-ação. Ação-reflexão-ação, por sua vez, é uma expressão utilizada para explicar que, todas as vezes que observamos uma situação real, temos que pensar os pontos importantes que podem ser a causa, buscar a teoria para explicar e propor uma conduta que vai ser aplicada na realidade observada para mudá-la, melhorando-a. É a capacidade de refletir o que se faz, enquanto se está fazendo. Ela é muito utilizada para descrever suma- riamente a metodologia da problematização. Você já refletiu alguma vez sobre os papéis que desempenha na sua rotina diária? Já se perguntou o que é ensinar? Pois é, você deve ser uma daquelas pessoas que dormiu profissional da saúde e acordou precep- tor. Não pense, contudo, que isso é um privilégio seu...para muita gente aconteceu da mesma forma. O jeito foi usar a intuição, ensinar do jei- to que aprendeu. Você aprendeu observando alguém conversar com o paciente, examinar e fazer uma prescrição ou indicar um procedimento. Então vai ensinar do mesmo jeito. Calma! A partir deste curso, tudo vai ser diferente. Vamos em frente! Você achava que o certo era “transmitir” seus conhecimentos, mas nos dias de hoje não se pode mais agir assim, não é mesmo? Na verdade, o seu papel é agir da forma correta no seu trabalho, saber acolher o paciente e o aluno, saber ajudar o aluno a construir seu próprio conhe- cimento, instruir o aluno a buscar o conhecimento para aplicá-lo e ajudá-lo a desenvolver a autonomia no seu próprio processo de aprendi- zagem na vida profissional. Viu como é diferente do que você pensava? Você pode perguntar: o que posso fazer para entender melhor os papéis que devo desempenhar? Vamos lá! 9 Vamos abordar, inicialmente, o conceito de preceptoria. Consultando o significado da palavra preceptor, encontramos no dicionário Aurélio (2017) que a palavra significa: pre.cep.tor /ô/ adjetivo substantivo masculino O que dá instruções ou preceitos; mestre; aio. Nononon /ô/ Lorem ipsum dolor sit amet, consectetuer adipiscing elit, sed diam nonummy nibh euismod tincidunt ut laoreet dolore magna aliquam erat volutpat. Ut wisi enim ad minim veniam, quis nostrud exerci tationullamcorper suscipit lobortis nisl ut aliq Nononon /ô/ Lorem ipsum dolor sit amet, consectetuer adipiscing elit, sed diam nonummy nibh euismod tincidunt ut laoreet dolore magna aliquam erat volutpat. Ut wisi enim ad minim veniam, quis nostrud exerci tation ullamcorper suscipit lobortis nisl ut aliq A literatura brasileira discute isso muito bem, e podemos citar Botti e Rego (2008), que definem o papel do preceptor de forma clara e paten- te, além de informar algumas de suas atuações. São elas: 1- Ensinar a clinicar, por meio de instruções formais e com determinados objetivos e metas e 2- integrar os conceitos e valores da escola e do trabalho. O local de atuação é o próprio ambiente de trabalho, com situações clínicas reais. As avaliações formais também fazem parte da pre- ceptoria e o preceptor precisa ter conhecimento e habilidade em desempenhar procedimentos clínicos e ter também competência pedagógica (BOTTI & REGO, 2008). Uma importante reflexão traz à tona mais do que conceito, mas a atuação do profissional junto ao aluno. Acompanhe o desenrolar do raciocínio: os papeis que o preceptor desempenha flutuam entre mos- trar o caminho a ser seguido, aconselhar ou cuidar do crescimento profissional e pessoal do jovem, além de estimular o raciocínio ou exigir postura ativa do aluno. PAPÉIS DO PRECEPTOR Apontar caminhos Aconselhar Cuidar do crescimento do jovem Estimular o raciocínio Exigir postura ativa 10 A complexidade é imensa, não acha? Embora o preceptor não tenha papel passivo, tem especial importância em observar atitudes e desem- penho do aluno, além de oferecer-lhe retorno, corrigindo falhas, estimulando o desenvolvimento da consciência crítica e discutindo valo- res morais e éticos (BOTTI; REGO, 2011). A missão deste módulo é dar subsídios para que você encontre um tem- po para a preceptoria na sua rotina diária, de modo que, no final do seu dia de trabalho, seja possível refletir e sentir-se satisfeito, recompensado e que no movimento de ensinar e aprender todos sejam beneficiados: você, os alunos e os pacientes. Mas, finalmente, o que é ser um precep- tor? Qual o conceito de preceptoria? Podemos dizer que ainda não existe normatização quanto a esse conceito, embora possamos coletar alguns consensos nos variados conceitos já descritos, como ser um profissional que tem ou não o cargo de professor, ou ser aquele que está junto com o discente no campo de prática. Saiba mais Saiba mais aprofundando a reflexão sobre a questão funda- mental desta aula: “o que é ser um preceptor?”. Apresentamos um artigo bastante interessante intitulado A Preceptoria na Formação Médica e Multiprofissional com Ênfase na Atenção Primária – Análise das Publicações Brasileiras. Confira na biblio- teca do curso e boa leitura! O preceptor ensina a clinicar, inserindo o conhecimento teórico na atividade prática, ou melhor, intermediando a construção do conheci- mento e estimulando a curiosidade científica do aluno. Esse papel de docente-clínico, como descrevem Botti e Rego (2011), é assumido pelo profissional que domina a prática clínica e seus aspectos educacio- nais. Esse profissional identifica oportunidades de aprendizagem e os cenários adequados, proporcionando condições para o desenvolvimen- to técnico e ético nos cenários reais. Avaliação feita sobre trabalhos apresentados no Congresso Brasileiro de Educação Médica traz informações e reflexões importantes sobre o que é ser um preceptor e como é o desenvolvimento de suas atividades, 11 considerando as mudanças nas características exigidas ao novo profis- sional da saúde. Nessa análise, fica clara a fundamental importância do preceptor para a formação dos alunos, ressaltando dentre as funções do preceptor a de incentivar a curiosidade científica e o interesse pela busca de atualização. As pesquisas apontam também algumas características como as mais importantes de um bom preceptor, como ter compromis- so com o aprendizado do aluno, ter conhecimento do seu papel como preceptor e ter capacidade de incentivar o aluno para buscar sua apren- dizagem (BRANT, 2008). Seria até interessante que existisse uma fórmula que, após tomar, um profissional da saúde se transformasse num preceptor com todas as competências que lhe são necessárias, mas não existe. Na verdade, o que precisa ser considerado é a necessidade de formação pedagógica do preceptor, para que ele possa incluir a preceptoria e as atividades de ensino-aprendizagem em sua rotina assistencial, de forma tranquila e efi- ciente,. Isso surge a partir do entendimento que somente o conhecimento profissional é insuficiente para atingir os objetivos assistenciais, sendo importante a troca de saberes, o trabalho em equipe multiprofissional e o conhecimento didático-pedagógico a ser aplicado no campo de prática. 12 AULA 2 - Diretrizes para os objetivos de aprendizagem LEGISLAÇÃO E PROJETOS PEDAGÓGICOS DOS CURSOS (PPC) Uma das estratégias para alcançar o bem-estar com nosso trabalho é saber que estamos atingindo os objetivos planejados, o que podemos encontrar nas Diretrizes Curriculares Nacionais, que em 2001 foram instituídas para os cursos de enfermagem, medicina e nutrição e que descrevem algumas características semelhantes entre os perfis dos egressos, como a formação de um “profissional crítico e reflexivo, pautado em postura ética e com noção de responsabilidade social e compromisso com a cidadania e atuando na promoção da saúde e prevenção de doenças”. Nessas diretrizes, os cursos de graduação encontram orientação sobre o perfil do seu egresso, competências gerais e específicas a serem desenvolvidas ao longo do curso, os conteúdos a serem contemplados, as atividades práticas curriculares e complementares, a organização do curso e as avaliações discentes e até mesmo a avaliação do próprio curso, que permitirá ajustes para seu aperfeiçoamento. 13 Saiba mais As diretrizes curriculares trazem muitas informações impor- tantes e vale a pena fazer uma leitura mais detalhada. Espero que você goste! • BRASIL. Ministério da Educação. Conselho Nacional de Educação. Câmara da Educação Superior. Parecer CNE/ CES n. 1.133, de 7 de agosto de 2001, sobre as Diretrizes Curriculares da Medicina, Enfermagem e Nutrição. Brasília, DF; 2001. Disponível em: <http://portal.mec.gov. br/dmdocuments/ces1133.pdf>. Acesso em: 2018 abr. 5. • Novas Diretrizes Curriculares para o Curso de Medicina. Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/cne/arquivos/pdf// Med.pdf>. Acesso em: 11 abr. 2018. • RIBEIRO, L. C. C.; RIBEIRO, M.; SOARES, V. A. R. Avaliação aca- dêmica acerca das Diretrizes Curriculares Nacionais em saúde. Tempus, actas de saúde colet., v. 9, n. 1, p. 167-187, 2015. Essa é a descrição das características profissionais que se espera ao final dos cursos da saúde. Essas são algumas das características dos profis- sionais que temos a missão de ajudar a construir enquanto preceptores. Então, se o preceptor souber claramente o que é esperado do seu traba- lho com o aluno, poderá planejar, determinar os objetivos de aprendiza- gem de acordo com os objetivos do curso e, ao final, conseguirá contribuir para a formação integral de um novo profissional. O mais importante é o preceptor ter a consciência de que seus ensinamentos não são guia- dos somente por sua intuição ou percepção, mas que são norteados por documentos e bases legais, com objetivos específicos a serem alcançados. Além desse importante documento de âmbito nacional, os cursos de graduação e de pós-graduação na modalidade residência (médica ou multiprofissional) possuem um Projeto Pedagógico (PPC), no qual é descrita a concepção do curso, os fundamentos de gestão e os princípios educacionais, sempre pautado nas Diretrizes Curriculares Nacionais (DCN) do curso em questão e respeitando a legislação das Comissões Nacionais: de Residência Médica (CNRM) e de Residência Multiprofissional em Saúde (CNRMS). Nas DCN são descritos os objetivos gerais, a estruturacurricular, a carga horária e 14 todas as características pedagógicas do curso no qual os docentes irão se basear para desenvolver os componentes curriculares com todas as suas peculiaridades metodológicas. Esses objetivos são traçados para o conhecimento teórico e também para o prático, uma vez que estão entrelaçados, cada um apontando a necessidade de alcance do outro. O preceptor teria a incumbência de orientar a prática com base nos conhecimentos teóricos, logo a formação técnica e a vivência do preceptor tornam-se fundamentais para um aprendizado adequado. Podemos dizer então que ser preceptor não significa simplesmente repassar conhecimentos com postura vertical, arrogante, detentora do saber. Ele precisa ser preparado para saber o que e como ensinar, ali- nhado ao PPC e de forma a atingir metas e alcançar objetivos amplos. Ainda sobre as Diretrizes Curriculares Nacionais, após atua- lização, encontram-se orientações que alinham a formação profissional de medicina com as necessidades do SUS, ou seja, da sociedade. No artigo 4º, está descrito que a formação do graduado no curso de medicina se dará em três áreas, por meio da articulação entre conhecimentos, habilidades e atitudes necessárias para o exercício profissional: I- Atenção à Saúde, II- Gestão em Saúde e III- Educação em Saúde. Entre essas áreas, os cursos normalmente se detêm na de Atenção à Saúde, inclusive durante a fase de estágio supervisionado, entre o 9º e o 12º períodos. Na seção II, Gestão em Saúde, as DCN recomendam que o graduando seja capaz de compreender os princípios do SUS, suas diretrizes e políticas, além de participar de ações de geren- ciamento e administração, capacitação nunca antes disponibi- lizada ou recomendada ao graduando em medicina. Para isso, é necessário o conhecimento de densidade tecnológica, o que configura o aprendizado em gestão do cuidado, e também de valorização da vida, tomada de decisões (utilizando as evidências científicas), comunicação (acesso à base de dados), liderança, trabalho em equipe, construção participativa do sistema de saúde e participação social e articulada nos campos de ensino e aprendizagem das redes de atenção à saúde, promovendo, entre outras coisas, a boa prática clínica, pautada em princí- pios humanísticos, éticos, sanitários e da economia na saúde. Na seção III, da Educação em Saúde, o artigo 7º descreve cuidadosa- mente a recomendação que o graduando deve responsabilizar-se pela própria formação ao mesmo tempo que deve se compro- meter com a formação das futuras gerações de profissionais da saúde. Por meio da mobilidade acadêmica e profissional, o aluno deve ter o objetivo de “aprender a aprender”, desenvolvendo a curiosidade científica, formulando questões para respostas cienti- ficamente consolidadas e avaliando criticamente as informações obtidas (evidências científicas). Além disso, as novas DCN (2014) trazem a necessidade de “aprender com autonomia”, “aprender interprofissionalmente” (troca de saberes) e “aprender em situa- ções e ambientes protegidos e controlados (simulação). Por fim, o estudante deve também ser incentivado a dominar uma língua estrangeira para manter-se atualizado com os avanços na saúde e divulgar as conquistas científicas”. Com essas recomendações fica explícito que, se os graduandos e recém-graduados do curso de medicina (extensivo a outros cursos da saúde) precisam adquirir essas competências e pra- ticar essas atividades, eles serão orientados pelos preceptores, logo, os preceptores têm que desenvolver igualmente essas habilidades para que possam ajudar os alunos nessa construção. 16 A Lei orgânica de Saúde nº 8.080 deixa clara a necessidade de estraté- gias para o desenvolvimento de políticas para a formação de recursos humanos para a saúde. Desde sua promulgação, os serviços públicos que fazem parte do SUS devem ser campo de prática para o ensino e a pesquisa, com normas alinhadas com o sistema educacional (BRASIL, 1990; BRASILIA, 1988). Com isso, as estratégias governamentais, por meio de programas de for- mação na saúde, como o PROMED (Programa de Incentivo às Mudanças Curriculares das Escolas Médicas), o PRÓ-SAÚDE (Programa Nacional de Reorientação da Formação Profissional em Saúde) e outros, colocam o preceptor em papel de destaque no processo de formação. Porém duas ressalvas precisam ser feitas a respeito da preceptoria: primeiro, a necessidade de inserir na prática profissional atividades distintas daque- las que eram a rotina, como o olhar integral à saúde e o conhecimento e a valorização do SUS na participação do processo formativo. Em segun- do lugar, a necessidade de supervisão e orientação de alunos utilizando conhecimento pedagógico, desafio crescente tendo em vista a evolução da aplicação dos conhecimentos e a existência de novas metodologias educacionais na área da saúde. 17 AULA 3 - Noções sobre andragogia A IMPORTÂNCIA DA APRENDIZAGEM SIGNIFICATIVA As metodologias de ensino são desenvolvidas e difundidas para serem usa- das conforme a população a ela destinada. Os adultos têm características de aprendizagem diferentes dos outros grupos etários e é fundamental o conhecimento desses princípios para o alcance do melhor resultado. A arte e a ciência de conduzir o adulto ao aprendizado é conhecida como andragogia, vocábulo que vem do grego andros (adulto) e gogos (educar), e deve ser considerada no embasamento das estratégias de aprendizagem. Há três tipos básicos de aprendizagem descritos por David Ausubel: a cognitiva, a afetiva e a psicomotora. DOMÍNIO PSÍCOMOTOR SER Conhecimentos disciplinares Conhecimento declarativo Conhecimentos pro�ssionais Conhecimentos processual Habilidades a destreza Conhecimentos atitudinal Conhecimentos interpessoais Conhecimento COGNITIVO Figura 1 - Tipos de aprendizagem. A estrutura cognitiva se organiza e se integra em relação à aprendizagem, que por sua vez pode ser mecânica ou significativa. A aprendizagem significativa traz como base um conhecimento já existente no indivíduo. A partir daí o conhecimento se expande somando-se a um conceito já exis- tente ou pode formar novos conceitos, novas ideias, porém mais abrangentes. Cabe ao preceptor, no papel de facilitador, identificar o 18 que o aluno já sabe e encontrar recursos que promovam a interação desse conhecimento com a nova proposta, transformando o processo em aprendizagem significativa. Não adianta falar sobre aprendizagem significativa e promover aprendizagem mecânica, aquela que necessita de memorização apenas. A aprendizagem significativa vai além da “aula bem dada”, do “aluno aplicado” ou do atendimento de “casos complexos”. Reter conhecimento precisa de significado e necessita o compreender, o saber explicar e conseguir descrever. As situações-problema trazem esse sentido aos conceitos, e o progresso do domínio dessas situações oferece segurança para o domínio das situações mais complexas. A atuação do preceptor nesse contexto é fundamental para fazer o aluno relacionar o que está vivenciando com o conhecimento que traz. A principal característica do processo de aprendizagem do adulto é que ele precisa querer aprender e, para isso, é necessário desenvolver nele a motivação intrínseca, o interesse por sua formação. Tempski et al. (2017) ressaltam a grande importância da motivação para a aquisição do conhecimento, estabelecendo conexões importantes entre vários elementos envolvidos no processo ensino-aprendizagem, como diálogo, feedback, metodologias adequadas, individualização do aprendizado e relevância do ensino. Novamente Paulo Freire volta à base da discussão pelo seu posicionamento em relação ao educando. Não se pode querer impor o que vai ser aprendido e desconsiderar que o adulto tem vivên- cias e saberes prévios, e que esse entendimento parte de um princípio dialógico, portanto, o DIÁLOGO é o primeiro princípio da educação de adultos de Freire. DISPOSIÇÃO CONFIANÇA AVALIAÇÃO ABERTURAREFLEXÃO DIÁLOGO 19 O papel do preceptor segue premissas da docência, pois isso independe se ele está atuando na sala de aula ou em pequenos grupos ao redor de uma mesa discutindo um caso, ou mesmo diante de um paciente no leito hospitalar. O aluno adulto precisa saber se suas condutas técnicas, éticas e profissionais estão corretas ou se precisam ser redirecionadas, pois assim terá um potencial maior de aprendizagem. Esse componente motivacional é chamado devolutiva ou feedback, que segue uma meto- dologia específica para ser aplicado, pois se sabe que a capacidade de receber críticas precisa ser exercitada, mas é preciso saber como realizar essa abordagem. O uso das novas metodologias de ensino-aprendizagem, modificadas pela alteração da lógica do processo educacional, as chamadas metodo- logias ativas, é também considerado elemento motivador. Você sabia? O termo ensino-aprendizagem é usado sempre ligado por um traço por significar que é um processo único, em que quem ensina sempre aprende e vice-versa. A educação bancária centrada no professor e com participação passiva do aluno perdeu espaço para essas metodologias, nas quais o foco é o estudante e não o professor, e é aí que se encaixa perfeitamente a atuação do preceptor, exercendo o papel de facilitador na construção do conhecimento. O cenário real é importante para que o aluno busque o conhecimento teórico e saiba aplicá-lo, o que acontece na metodologia da problematização (a diferença é que nessa metodologia a teorização é uma busca externa, em fontes como livros, artigos científicos etc.), uma das mais frequentes formas de ensino utilizadas no exercício da preceptoria, que seria a contextualização natural, necessária para potencializar o aprendizado. 20 ACESSO NA PLATAFORMA Saiba mais Você se recorda do artigo que disponibilizamos na biblioteca do curso e que indicamos para leitura na primeira aula desta unidade? Atente para a descrição das atividades e das carac- terísticas do preceptor apontadas na publicação. Taylor e Hamdy (2013) também nos brindam com relevantes considera- ções sobre andragogia, chamando atenção para a existência de diversas maneiras de o adulto obter conhecimento e que se tivermos uma visão construtivista será mais fácil planejar a forma mais efetiva de ajudá-lo a aprender. Visão construtivista é aquela que acredita que o indivíduo consegue construir seu próprio conhecimento, desde que existam boas condições; considera importante o conhecimento prévio do indivíduo e que não é necessário descartar o que o indivíduo já sabe para agregar novo conhecimento. Precisamos conhecer o modelo motivacional e o reflexivo de aprendiza- gem. Para que a motivação intrínseca aconteça, é preciso que haja mais três elementos: autonomia, competência e sensação de pertencimento. Ou seja, o preceptor precisa envolver o aluno no contexto do aprendiza- do (por isso o cenário real é importante) e induzir o desenvolvimento de autonomia (quando chama atenção para o que ele não sabe e orienta a busca por esse conhecimento – metacognição). Os modelos reflexivos e que utilizam também o feedback como ferramenta desenvolvem conhe- cimento e habilidades, ajudando ainda os estudantes a desenvolver sua autonomia na aprendizagem. Há muito tempo se discute a aprendizagem de jovens e adultos, a qual conhecemos por andragogia, e a quantidade de retenção do conhe- cimento de acordo com a maneira com que foi adquirido. No final da década de 1940, um perito em educação da Universidade de Ohio, nos Estados Unidos, chamado Edgar Dale, realizou um importante estu- do que foi transformado no que conhecemos hoje por “Pirâmide do Aprendizado”. Sua teoria fala sobre o quanto conseguimos nos lembrar depois de duas semanas de um evento de aprendizagem, ressaltando o alto percentual de retenção do conhecimento quando somos sub- metidos a metodologias ativas, aquela na qual o aluno é o centro do processo e tem postura proativa, participando da produção do próprio 21 conhecimento. Portanto, depois desse período, retemos 5% das aulas que assistimos, 10% das leituras que fazemos, 20% do que vemos/ouvi- mos (vídeos, por exemplo), 30% das demonstrações que observamos, 50% do que discutimos com outras pessoas, 70% do que fazemos e 90% dos conteúdos que ensinamos a outros. Percebeu que características têm as atividades de ensino com 50% ou mais de índice de retenção? Elas promovem integração e participação do aluno (SILVA et al., 2017). PIRAMIDE DO APRENDIXADO DE EDGAR DALE Índice de retenção do conhecimento Assistindo palestra Recursos audiovisuais Demonstrando (uso imediato) Discutindo em grupo Praticando Ensinando Leitura 5% 10% 20% 30% 50% 75% 85% Figura 2 - Pirâmide de aprendizado. Fonte: Autoria própria com base em Silva et al (2017).