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A Comissão Nacional de Literatura Infantil no Governo Vargas

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Universidade Federal do Rio de Janeiro 
Instituto de História 
Programa de Pós-graduação em História Social 
 
 
 
 
 
 
 
A Comissão Nacional de Literatura Infantil e a formação do público leitor 
Infanto-Juvenil no Governo Vargas (1936 – 1938) 
 
 
Aline Santos Costa 
 
 
 
 
 
2011 
Universidade Federal do Rio de Janeiro 
Instituto de História 
Programa de Pós-graduação em História Social 
 
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A foto que ilustra a capa desta dissertação foi publicada no periódico O Jornal, de 1° de maio de 1936. 
Na foto, o registro da reunião da Comissão Nacional de Literatura Infantil, em 31 de maio do mesmo 
ano. 
 
 
Universidade Federal do Rio de Janeiro 
Instituto de História 
Programa de Pós-graduação em História Social 
 
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A Comissão Nacional de Literatura Infantil e a formação do público leitor 
Infanto-Juvenil no Governo Vargas (1936 – 1938) 
 
 
 
 
Aline Santos Costa 
 
 
 
 
Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de 
Pós-graduação em História Social, Instituto de 
História, da Universidade Federal do Rio de Janeiro, 
como parte dos requisitos necessários à obtenção do 
título de Mestre em História Social. 
 
 
 
 Orientador(es): Profa. Dra. Norma Côrtes 
 
 
 
 
 
 
 
Rio de Janeiro 
 Maio de 2011 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Universidade Federal do Rio de Janeiro 
Instituto de História 
Programa de Pós-graduação em História Social 
 
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A Comissão Nacional de Literatura Infantil e a formação do público leitor 
Infanto-Juvenil no Governo Vargas (1936 – 1938) 
 
Aline Santos Costa 
 
 
Orientador: Profa. Dra. Norma Côrtes 
 
 
 
Dissertação de Mestrado submetida ao Programa de Pós-graduação em História Social, Instituto 
de História, da Universidade Federal do Rio de Janeiro, como parte dos requisitos necessários à 
obtenção do título de Mestre em História. 
 
 
 
 
Aprovada por: 
 
______________________________ 
Profa. Dra. Norma Côrtes 
(Orientador) 
 
_______________________________ 
Profa. Dra. Márcia Cabral da Silva 
 
_______________________________ 
Profa. Dra. Marieta de Moraes Ferreira 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Rio de Janeiro 
 Maio de 2011 
 
 
Universidade Federal do Rio de Janeiro 
Instituto de História 
Programa de Pós-graduação em História Social 
 
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 Ficha Catalográfica 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
COSTA, Aline Santos. 
 A Comissão Nacional de Literatura Infantil e a formação do público 
leitor infanto-juvenil no Governo Vargas (1936 – 1938)/ Aline Santos Costa. 
 vii n folhas f ; 30 cm. 
Orientador: Profa. Dra. Norma Côrtes 
Dissertação (Mestrado ) – UFRJ / IH / PPGHIS /Programa de Pós Graduação 
em História Social, 2011 
Referências Bibliográficas: f. n° 
 1. Literatura Infantil. 2. formação do leitor. 3.Governo Vargas I. CÔRTES, 
Norma. II. Universidade Federal do Rio de Janeiro, Instituto de História. III. 
Título. 
 
 
Universidade Federal do Rio de Janeiro 
Instituto de História 
Programa de Pós-graduação em História Social 
 
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Agradecimentos: 
 
 
 
Agradeço em primeiro lugar à minha orientadora, Professora Dra. Norma Côrtes, que 
acreditou no meu trabalho e contribuiu para meu gradual amadurecimento acadêmico. 
Também agradeço à professora Márcia Cabral da Silva, que conheci em um simpósio 
e que através das conversas me apontou caminhos importantes para o desenvolvimento da 
pesquisa sobre Literatura Infantil. 
À professora Marieta de Moraes, que aceitou participar da minha banca e que também 
contribuiu com valiosas sugestões. 
Esta pesquisa não seria possível também sem os estagiários do CPDOC – RJ, que me 
ajudaram a acessar a base dos documentos referentes ao arquivo pessoal Gustavo Capanema, 
onde se encontram as fontes aqui utilizadas. 
À professora Maria Nélida Gonzáles de Gómez, do IBICT, pelas sugestões ao 
trabalho. 
A Equipe do Centro de Memórias do Instituto de Educação do Rio de Janeiro, em 
especial às professoras Fátima Galvão e Mônica Ladeira, que mesmo com os documentos 
ainda por serem catalogados, fizeram a gentileza de criar uma pasta específica para minha 
pesquisa sobre a professora Elvira Nizynska, membro da Comissão Nacional de Literatura 
Infantil e sobre a qual poucos relatos havia. 
À professora Jussara Pimenta, na PUC RJ, que me indicou caminhos para encontrar 
informações sobre a professora Elvira Nizynska. Através dela, fui à Associação Brasileira de 
Educação, onde conheci a professora Arlete, que me indicou falar com a sobrinha direta da 
referida professora, a sra. Ruth Camarinha. 
Universidade Federal do Rio de Janeiro 
Instituto de História 
Programa de Pós-graduação em História Social 
 
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Agradeço especialmente a professora Ruth Camarinha, sobrinha de Elvira Nizynska da 
Silva, que me recebeu gentilmente em sua casa, prestando-me informações sobre a vida 
profissional e pessoal da tia. 
Também foram importantes para o desenvolvimento desta dissertação as bibliotecárias 
da Biblioteca Infantil Monteiro Lobato, de São Paulo. São dos livros da coleção da BIML as 
ilustrações que constam em anexo. 
À Deize Albernaz, colega e bibliotecária da Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro, 
pela atenção e ajuda nas consultas bibliográficas realizadas na instituição. 
Também contribuiu para este trabalho a amiga Nayara Galeno, com as revisões, as 
conversas, os debates, me ajudou a ampliar os horizontes da pesquisa e ir por caminhos que 
ainda não havia pensado. 
 Os amigos Marcos, Natan, Renata, Willian, Walmyr, Luciene, Letícia e Lair, Reinaldo 
Andressa, Melissa, Grazielly, Andréia, Arrizon e Antônio pelas revisões e contribuições feitas 
para este trabalho. 
 À minha mãe Vera Lúcia, ao meu irmão Alex e à minha cunhada Vanessa, pelo 
incentivo e apoio ao meu trabalho. Também agradeço às minhas primas Elizabeth e Isis e à 
minha amiga Sandra, por me proporcionarem alegria e me acalmarem nos momentos mais 
angustiosos desta trajetória. 
 Também devo agradecer ao CNPq pelo apoio através de bolsa de estudo, sem a qual 
este trabalho certamente seria mais difícil. 
 
Universidade Federal do Rio de Janeiro 
Instituto de História 
Programa de Pós-graduação em História Social 
 
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“(...) Na criação da fala e da linguagem, brincando com essa maravilhosa faculdade de 
designar, é como se o espírito estivesse constantemente saltando entre a matéria e as coisas 
pensadas. Por detrás de toda expressão abstrata se oculta uma metáfora, e toda metáfora é 
jogo de palavras. Assim, ao dar expressão à vida, o homem cria um outro mundo, um mundo 
poético, ao lado do da natureza.” 
(Johan Huzinga, Homo Ludens). 
 
 
Universidade Federal do Rio de Janeiro 
Instituto de História 
Programa de Pós-graduação em História Social 
 
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 RESUMO 
 
 
 
 
Este trabalho é resultado da pesquisa realizada oficialmente desde 2009 sobre a Comissão 
Nacional de Literatura Infantil, criada em 1936, pelo então ministro da Educação e Saúde 
Gustavo Capanema. O trabalho expõe e analisa os debates em torno da Literatura Infanto-
Juvenil no Brasil dos anos de 1930 a partir de uma série de pareceres, artigos, atas de reunião 
e projetos de incentivo à Literatura Infantilapresentada pela CNLI ao M.E.S. A preocupação 
da Comissão mostrou-se além do incentivo à criação de novos livros infantis apresentando um 
projeto de criação de Centros de Cultura e Lazer, que deveriam servir de biblioteca e local de 
“recreação útil” (ou pedagógica) para as crianças. Não se pode, no entanto, pensar a comissão 
sem levar em consideração os debates educacionais existentes à época, assim como também 
as relações existentes entre intelectuais e o Estado Novo. Destarte, este trabalho discute os 
projetos de livro infantil apresentados pela comissão, sua proximidade e suas interlocuções 
com idéias progressistas da educação que faziam parte dos debates intelectuais do período. 
 
 
 
 
 
 
 
Palavras- chave: Literatura Infantil – Governo Vargas – Formação do público leitor infantil. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Universidade Federal do Rio de Janeiro 
Instituto de História 
Programa de Pós-graduação em História Social 
 
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ABSTRACT 
 
 
 
 
This work is the result of a research conducted since 2009, officially known as the National 
Commission on Children's Literature, founded in 1936 by the then Minister of Education and 
Health Gustavo Capanema. The paper expounds and analyzes the debates upon children's 
Literature in Brazil in the 1930s from a series of opinions, articles, minutes of meetings and 
projects to encourage Children's Literature presented by the MES CNLI The Committee's 
concern proved to be beyond the incentive to create new children's books, presented a project 
for the creation of cultural centers for children. These centers should serve as a library and 
place of "useful recreation" (or educational) for kids. We cannot, however, think the 
Committee without taking into consideration the existing educational debates at the time, as 
well as the relationship between intellectuals and the New State. Thus, this paper discusses 
the children's book projects submitted by the committee, its proximity or remoteness of the 
Vargas government’s ideology and its dialogues with progressive ideas of education which 
were part of the intellectual debates of the period. 
 
 
 
Key- words: Governement Vargas – Children’s Literature – Educating the Clid reader. 
 
 
 
 
 
 
 
 
Universidade Federal do Rio de Janeiro 
Instituto de História 
Programa de Pós-graduação em História Social 
 
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SUMÁRIO 
 
INTRODUÇÃO ---------------------------------------------------------------------------- 01 
 
Capítulo I Uma nova literatura para uma nova criança ----------------------------- 07 
 
Capítulo II Em busca do estatuto da Literatura Infanto-Juvenil ----------------------- 45 
 
Capitulo III Por um aproveitamento útil das horas de lazer ------------------------------90 
 
 
CONCLUSÃO ---------------------------------------------------------------------------------111 
 
Referências Bibliográficas --------------------------------------------------------------------115 
 
 
 
ANEXOS ----------------------------------------------------------------------------------------124 
 
 
 
ANEXO 1. Verbetes Biobibliográficos dos componentes da Comissão ----------------125 
 
 
 
ANEXO 2. ---------------------------------------------------------------------------------------142 
 
 Ilustrações de alguns livros infantis indicados da Comissão Nacional de Literatura Infantil 
 
 
ANEXO 3 ----------------------------------------------------------------------------------------149 
 
Gravuras de alguns dos livros que venceram o concurso de 1937, promovido pela Comissão 
Nacional de Literatura Infantil. 
 
 
 
 
 1 
 
INTRODUÇÃO 
 
 
 
 
A presente dissertação é resultado de um trabalho de pesquisa sobre a Comissão 
Nacional de Literatura Infantil (CNLI), criada em 1936, pelo ministro de Educação e 
Saúde Gustavo Capanema. O foco da pesquisa incidiu sobre as atividades da CNLI que 
visavam conceituar a Literatura Infantil e também as suas propostas para a formação do 
público leitor infanto-juvenil. No que tange à conceituação de Literatura Infantil, foi 
fundamental tanto apreender a concepção de criança e infância apresentada pelos 
intelectuais que compunham à CNLI — Cecília Meireles, Elvira Nizynska, Jorge de 
Lima, José Lins do Rego, Manoel Bandeira, Maria Eugênia Celso e Murilo Mendes — 
quanto as posições sobre Estética e nacionalismo apresentadas por eles e também seus 
modos de compreender o nacionalismo. 
Além da tentativa de definir o que era a Literatura Infantil, a CNLI também 
elaborou — de acordo com as exigências que lhes foram conferidas — algumas 
propostas para a promoção da Literatura Infanto-Juvenil brasileira, bem como o 
incentivo à formação do público leitor nessa faixa etária. Dentre as principais propostas, 
analisadas neste trabalho, estão: o Concurso de Literatura Infanto-Juvenil, de 1937 e a 
proposta de criação dos Centros de Cultura e Lazer, apresentada ao ministro Gustavo 
Capanema também no mesmo ano. 
Para compreender a criação da Comissão Nacional de Literatura Infantil é 
fundamental considerar o momento histórico vivido pelo país, mais especificamente nas 
áreas da Cultura e da Educação. Dessa maneira, no primeiro capítulo deste trabalho, 
cujo título é ―Uma nova literatura para uma nova criança: debates em torno do livro 
infantil no Brasil das décadas de 1920 e 1930‖ há uma explanação desse ambiente de 
 2 
disputas políticas e educacionais vigentes e que se relacionam com a própria montagem 
e instalação da CNLI. Também foi fundamental para entender melhor a posição e a 
atuação dos integrantes da Comissão, fazer um levantamento biobibliográfico de cada 
um dos componentes. Ao longo da pesquisa, observou-se que Elvira Nizynska da Silva 
foi a mais atuante de todos os componentes da CNLI. No entanto, ela também era a 
pessoa sobre quem menos havia informações biográficas. E a única informação 
relevante sobre ela era sua atuação como docente no Instituto de Educação do Rio de 
Janeiro. As primeiras visitas ao Centro de Memória do Instituto de Educação (CEMI) 
não revelaram, a princípio, qualquer documento referente à passagem da professora 
Elvira pela instituição. No decorrer do ultimo ano, todavia, foram encontrados alguns 
escassos, mas muito valiosos documentos, que apontavam essa professora estava 
bastante próxima do movimento de renovação educacional nos anos de 1920 e 1930. 
Além de manusear os documentos presentes no CEMI, também fui à Associação 
Brasileira de Educação (ABE), onde Elvira Nizynska teria participado de atividades a 
partir de 1928
1
. Lá encontrei a senhora Arlete Pinto de Oliveira e Silva — cuja família 
era amiga de Elvira — que me indicou o contato direto com uma sobrinha da professora 
Nizynska. Desde então, pude manter longas conversas com senhora Ruth Camarinha
2
, 
sobrinha da Professora Elvira. A partir dessas conversas obtive informações importantes 
que me auxiliaram na reconstrução da vida intelectual da professora(apesar de grande 
 
1
 A ida à Associação Brasileira de Educação foi uma valiosa sugestão da professora Jussara Pimenta 
(PUC RIO), que me informou de que durante suas pesquisas, que culminaram na Dissertação de mestrado 
sobre a Biblioteca do Pavilhão Mourisco, havia encontrado o nome da professora Elvira Nizynska da 
Silva em algumas atas de reunião. 
 
2
 Torno público meu agradecimento à Sra. Ruth Camarinha, por sua receptividade e colaboração com esta 
pesquisa, ao disponibilizar informações muito importantes sobre a professora Elvira Nizynska, nos 3 dias, 
entre os meses de Setembro e outubro de 2010, em que conversamos. 
 
 3 
parte das informações estarem no campo da memória e, portanto, carregada de 
sentimentos e significados construídos posteriormente ao período referido na pesquisa)
3
. 
O segundo capitulo deste trabalho, intitulado ―Em busca do estatuto da 
Literatura Infanto-Juvenil‖ se vale especificamente da análise das fontes produzidas 
pela Comissão, nas quais estão presentes as concepções sobre crianças, infância, 
Literatura Infantil, nacionalismo e política de seus componentes. Durante a pesquisa, foi 
observada a aproximação entre as concepções sobre a criança e a infância e as idéias 
trazidas para o Brasil pela Psicologia construtivista
4
. Autores como Jean Piaget e 
Edouard Claparède foram citados direta ou indiretamente nas fontes analisadas. Diante 
da complexidade da questão, além das fontes produzidas pela CNLI foram também 
utilizadas fontes ―auxiliares‖, produzidas fora da Comissão, mas por alguns de seus 
componentes
5
. Foi o caso, por exemplo, da professora Elvira Nizynska. Professora do 
Instituto de Educação do Distrito Federal, Elvira ministrou aulas de Literatura Infantil 
para alunas do segundo ano do curso normal entre os anos de 1934 e 1938. 
Os poucos documentos referentes à sua atuação no Instituto de Educação foram 
encontrados no Acervo de Memórias da mesma instituição. Dentre eles, encontra-se 
uma ementa do curso, com a bibliografia básica, onde foram encontrados autores como 
John Dewey, Willian Kiplatrick, Piaget e Claparède, todos ligados à Psicologia 
construtivista ou a Escola Nova. Os livros de autoria dos estudiosos citados, presentes 
no documento encontrado no CEMI foram lidos e as concepções apresentadas por eles 
de infância e criança comparados aos discursos apresentados pela CNLI. 
 
3
As biobibliografias encontram-se nos anexos. 
 
4
 A importância das idéias construtivistas para a construção de uma literatura infantil pautada na fantasia 
e no estímulo à imaginação infantil é ponderada por Nelly Coelho Novaes. 
Ver: NOVAES, Nelly Coelho. Panorama histórico da Literatura Infantil/Juvenil. Ática, São Paulo; 1991. 
 
5
Em O declínio dos Mandarins Alemães (1968), Fristz K. Ringer salienta que tão importante quanto 
pensar sobre os intelectuais (que compunham o grupo dos mandarins alemães) era pensar com esses 
intelectuais. Nesse sentido, procurei também me interar dos autores citados pelos componentes da CNLI, 
na tentativa de traçar paralelos e compreender melhor as idéias que nortearam os projetos da Comissão. 
 4 
As concepções sobre criança e infância apresentadas pelos intelectuais da CNLI 
são importantes para compreender aquilo que a Comissão estabeleceu como sendo bons 
livros de Literatura Infanto-Juvenil. Dois exemplos dessa importância foram: a defesa 
da fantasia como elemento fundamental dos livros infantis e a discussão em torno da 
relevância do interesse literário infantil para o estabelecimento dos critérios avaliativos 
da boa Literatura para crianças. O debate sobre a fantasia mobilizou tanto educadores 
quanto literatos. Na CNLI, houve forte defesa desse elemento no livro infanto-juvenil, o 
que pode ser explicado tanto pelas concepções estéticas de seus componentes (filiados 
ao movimento modernista, que apresentou outras possibilidades estéticas, além do 
mimetismo) quanto pelas concepções psicopedagógicas em relação à criança, uma vez 
que essas novas abordagens salientavam a importância da fantasia e do 
desenvolvimento da imaginação no processo de aprendizagem infantil. 
Outras duas tópicas que preocupavam a CNLI eram a presença do nacionalismo 
e de ideologias políticas nos livros destinados às crianças e aos jovens. Sobre o 
nacionalismo, a professora Elvira Nizynska salientou que este deveria estar presente —
quando possível — nos livros infanto-juvenis, apresentando aos leitores estereótipos de 
personagens nacionais, fatos da História do Brasil e histórias baseadas no folclore. 
Contudo, sem criar qualquer de sentimento de xenofobia ou preconceito. Na análise dos 
documentos, foi possível perceber que a maior preocupação da Comissão era menos 
com a exaltação das qualidades nacionais, que com a unidade cultural e política da 
nação. Isso se expressa tanto no fato da CNLI buscar definir uma Literatura Infanto-
juvenil Brasileira, que falasse do Brasil como um todo (quando nacionalista) ou temas 
gerais (contos de fada, fábulas, aventuras), quanto na preocupação de Murilo Mendes 
com a política nos livros infantis. 
 5 
O período de criação da CNLI ainda estava sob o ―impacto‖ da Revolta 
Comunista de 1935. Segundo o poeta, era importante que os livros infantis fossem 
observados e qualquer apelo tanto ao Comunismo, quanto ao culto exagerado ao líder 
do Estado (tal qual ocorria nos países do Eixo) deveriam ser rechaçados. Também 
condenava que livros que sugerissem que o Brasil se encontrava dividido (politicamente 
e culturalmente) também deveria ser alvo da ―censura‖ da Comissão. Nesse sentido, 
vislumbra-se a preocupação com a ideia de unidade nacional. O nacionalismo defendido 
pelos intelectuais da CNLI se diferenciava, ao que indica, do nacionalismo exaltado por 
autores do século XIX, como Afonso Celso, Manuel de Bonfim (baseado no culto às 
grandezas nacionais)
6
. 
Além da análise das concepções sobre a criança e a infância e das definições do 
que era Literatura Infantil para a CNLI, este trabalho também analisará os projetos da 
Comissão para a formação do público leitor infanto-juvenil. Dentre esses projetos 
estavam: a criação de um concurso para premiar novos livros para crianças e os Centros 
de Cultura e Lazer — que além de formar jovens leitores — deveria também cooperar 
com a formação dos futuros cidadãos. Esse último projeto será o tema do terceiro 
capitulo, intitulado ―Por um aproveitamento útil das horas de lazer: os Centros de 
Cultura e Lazer para crianças e jovens‖. Vale ressaltar que os Centros de Cultura e 
Lazer guardam proximidades com os preceitos da Escola Nova, principalmente no que 
se refere à importância dada às experiências de convivência social entre as crianças, que 
deveria proporcionar-lhes aprendizagens para uma vida adulta saudável. Também é 
importante observar que os Centros de Cultura e Lazer seguiam os parâmetros das 
bibliotecas infantis de São Paulo (1935) e do Rio de Janeiro (1934). Dessa maneira, 
pode-se afirmar que havia uma harmonia entre as idéias da Comissão no que concerne à 
 
6
Ver: HANSEN, Patrícia. Brasil, um país novo: a literatura cívico-pedagógica e a construção de um 
ideal de infância brasileira na Primeira República. Tese de Doutorado. São Paulo: USP; 2007. 
 6 
formação do pequeno Leitor e as apresentadas pelos organizadores dessas duas 
bibliotecas. 
Por fim, embora não seja o momento mais oportuno para abordagens teóricas, é 
importante ressaltar que em À beira da falésia, ao discutir as inquietações teóricas e 
epistemológicas pela qual veio passando a disciplina História, Roger Chartier aponta 
que a partir da década de 1970, a História começou a redescobrir e descobrir novos 
objetos de estudo. Para trabalhar com esses novos objetos, o historiador se viu diante da 
necessidadede recorrer a conceitos e categorias de análise de outras disciplinas das 
Ciências Humanas tais como Letras, Filosofia e Antropologia
7
. Dentre esses novos 
objetos está o estudo da Literatura. Desta Maneira, ao construir o objeto de pesquisa 
desta dissertação, foi fundamental buscar o diálogo com autores de outras áreas do 
conhecimento. 
Dentre os autores que me ajudaram a pensar as questões formuladas estão 
Marisa Lajolo (Literatura Infantil); Nelly Novaes Coelho (Literatura Infantil); Alfredo 
Bosi (Teoria Literária); Afrânio Coutinho (Teoria Literária); Antonio Cândido (Teoria 
Literária); Diana Vidal (História da Educação); Marta Carvalho (História da Educação); 
Helena Bomeny (História Social); Clarice Nunes (História Social)
8
 e Ângela de Castro 
Gomes (História). 
 
 
 
 
 
 
7
Ver: CHARTIER, Roger. À Beira da Falésia: A História entre incertezas e inquietudes. Porto Alegre: 
Ed. UFRGS, 2002. 
 
8
Outros autores como Gabriella Palegrino (História Social); Patrícia Hansen (História) e Jussara Pimenta 
(Teoria Literária), também foram fundamentais para a construção deste trabalho. 
 7 
 
 
 
Capítulo I: 
 
 
 
 
 
 
 
Uma nova literatura para uma nova criança: 
debates em torno do livro infantil no Brasil das décadas de 1920 e 1930 
 
 
 
Em 04 de maio de 1936 foi publicada no Diário Oficial a Portaria assinada pelo 
Ministro da Saúde e Educação Gustavo Capanema, convocando a Comissão Nacional 
de Literatura Infantil
9
. Dessa Comissão participaram Jorge de Lima
10
, Cecília 
 
9
 Sobre a Comissão Nacional de Literatura Infantil ver: 
 
ABREU, Tâmara Costa e Silva. O livro para crianças em tempo de Escola Nova: Monteiro Lobato e 
Paul Faucher. Tese de Doutorado em Literatura Comparada. Universidade Estadual de Campinas; São 
Paulo: 2010. 
 
COSTA, Aline Santos. A criança e a Literatura Infantil no Governo Vargas (1936 – 1939): um estudo 
sobre ―A terra dos meninos pelados‖ de Graciliano Ramos. Monografia de Final de Graduação em 
História. Universidade Federal do Rio de Janeiro; Rio de Janeiro: 2008. 
 
GOMES, Ângela de Castro. As aventuras de Tibicuera: literatura infantil, história do Brasil e Política 
Cultural na Era Vargas. In: Revista USP, São Paulo, n° 59, p. 116 – 133, setembro/novembro 2003. 
 
PAUTASSO, Andréa Milan Vasques. A Comissão de Literatura Infantil do Ministério da Educação e 
Saúde Pública do Brasil nos anos de 1936 a 1938. Dissertação de Mestrado em Educação. Universidade 
Federal do Rio Grande do Sul; 2010. 
 
ZUGNO, Ana Lucia Ioppi. USOS DA LITERATURA INFANTIL NO ESTADO NOVO: O CASO DEAS 
AVENTURAS DE TIBICUER. Dissertação de mestrado pelo programa de Pós Graduação em Educação. 
Universidade do Extremo Sul catarinense. Criciúma 2007. 
 
10
 Jorge de Lima (1893 – 1953) nasceu em Alagoas e foi formado em medicina. Além da profissão de 
formação, também se dedicou à literatura. Dentre suas obras estão poesias (a maioria de sua produção), 
prosas e um livro infantil, cujo foco era histórias populares. O livro chamava-se Histórias da velha 
Totonha. Dentre as obras conhecidas estão XIV Alexandrinos (1914); Tempo e Eternidade (1935) e 
Invenção de Orfeu (1952). 
 
 8 
Meireles
11
, Murilo Mendes
12
, Manuel Bandeira
13
 , Elvira Nizynska
14
 e Maria Eugênia 
Celso
15
. O educador Lourenço Filho
16
 ainda não havia sido oficialmente convocado, no 
entanto, seu nome já era citado em algumas atas das atividades da CNLI como 
participante das reuniões. A partir de 1939, a Comissão Nacional de Literatura Infantil 
passou a fazer parte do Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos (INEP) e Lourenço 
Filho era, então, responsável pelas atividades da Comissão. Nesse momento, a sua 
composição já havia mudado. E apenas a professora Elvira Nizynska permaneceu até o 
fim das atividades, em 1941. Durante o seu primeiro período de existência (1936 – 
 
11
Cecília Meireles além de poetiza, também foi educadora, lecionou no Instituto de Educação e escreveu 
diversos trabalhos teóricos sobre educação e alguns também sobre literatura infantil. Em 1934, por 
iniciativa própria e com o apoio de alguns amigos criou um centro cultural para crianças, o conhecido 
―Pavilhão Mourisco‖, localizado na Praia de Botafogo. Dentre suas obras literárias estão: ―Crianças, meu 
amor...‖ (1923); ―Saudação à menina de Portugal‖ (1930); ―A festa das letras‖ (1937); ―Romanceiros da 
inconfidência‖ (1953). Já os trabalhos não literários, estão ―Batuque, Samba e Macumba‖ (1935) – livro 
sobre os ritmos brasileiros de influência africana; ―Problemas da Literatura Infantil‖ (1950). 
 
12
 Murilo Mendes (1901 – 1975) nasceu em Minas Gerais. É considerado um dos principais poetas 
representantes do surrealismo no Brasil. Católico, assim como Jorge de Lima, Murilo Mendes também 
escreveu poesias religiosas. Dentre suas obras estão: Tempo e Eternidade (em conjunto com Jorge de 
Lima); Poesia em Pânico (1938); O Visionário (1941). 
 
13
O poeta Manuel Bandeira (1886 – 1968) nasceu em Recife. Entre suas obras estão poesias, prosas, 
crônicas e críticas literárias. No que se refere especificamente à literatura infantil, Manuel Bandeira 
escreveu Berimbau e Outros Poemas; Andorinha, Andorinha (1966); 
 
14
 Elvira Nizynska da Silva (1896 – 1964) foi professora primária e trabalhou no Instituto de Educação 
(1932 a 1934), como professora de prática de ensino. Também atuou em pesquisas ao lado de Lourenço 
Filho na ABE (Associação Brasileira de Educação) de 1932 até 1938. No Instituto de Educação, lecionou 
uma disciplina sobre a utilização da literatura infantil na alfabetização. Foi também subdiretora da Escola 
Municipal Rodrigues Alves (1928 – 1933), no bairro do Catete, Distrito Federal e da Escola Municipal 
Argentina (1938 - 1952), localizada no Bairro de Vila Isabel. Vale ressaltar que foi nesta escola que 
Anísio Teixeira implementou as primeiras mudanças de técnicas pedagógicas desenvolvidas por 
intelectuais da Escola Nova. 
 
15
 Maria Eugênia Celso Carneiro de Mendonça (1886 – 1963) nasceu em Minas Gerais. Era filha do 
Conde Afonso Celso de Assis Figueiredo Júnior. Foi poetisa e jornalista. Dentre suas obras está Poemas 
completos (1955). Também escreveu para diversas revistas como O Malho (1936) e Fom-fom (1920). 
Apresentou programas sobre literatura na Rádio Nacional, durante os anos de 1930. Teve participação 
ativa no movimento feminista brasileiro. 
 
16
Manoel Bergström Lourenço Filho (1897 – 1970) nasceu no interior de São Paulo. Foi um dos pioneiros 
do chamado movimento da Escola Nova, junto com Anísio Teixeira e Cecília Meireles. Acreditava ser a 
educação fundamental para a formação moral e material dos futuros cidadãos brasileiros. Teve importante 
atuação durante o Estado Novo. Além de trabalhar na Comissão de Literatura Infantil, também escrevia 
pareceres avaliativos de livros infantis para a Editora Melhoramentos, de São Paulo. A partir de 1938 
passou a presidir a comissão e esta apresentou mudança significativa no que se refere à posição diante das 
obras infantis. Mais interventora e declaradamente com preocupações pedagógicas, uma das medidas 
tomada por Lourenço Filho foi a proibição de romances policiais para crianças. 
 9 
1938), a Comissão Nacional de Literatura Infantil se reunia sempre às quintas-feiras no 
Edifício Rex, sede do MES, e os encontros aconteciam no gabinete de Gustavo 
Capanema. Sempre que possível o Ministro participaria das suas reuniões; e nessas 
ocasiões ele presidiria a Comissão
17
. Do contrario, na sua ausência, o Secretário Geral 
da CNLI, Murilo Mendes, seria o presidente da Seção. As atas das reuniões indicam, 
contudo, que Capanema raramente participou dos trabalhos da CNLI. 
 Segundo a Portaria, publicada no Diário Oficial do dia 04 de maio de 1936as 
atribuições da Comissão Nacional de Literatura Infantil eram: 
 
―O Ministério de Estado da Educação e Saúde 
Pública, em nome do presidente da República dos 
Estados Unidos do Brasil, resolve expedir as 
seguintes instruções relativas à Comissão de 
Literatura Infantil [...] 
a) Organizar, periodicamente, relações, com 
apreciação crítica, das obras de literatura infantil, 
existentes em língua portuguesa, originais e 
traduzidas; 
b) Escolher, dentre as obras de literatura infantil 
existentes em língua estrangeiras, aquelas cuja 
tradução ou adaptação seja conveniente fazer; 
c) Indicar ao governo as providências que devam ser 
tomadas para a eliminação das obras de Literatura 
Infantil, perniciosas ou sem valor; 
d) Indicar ao governo as providências tenentes a 
promover em todo país o desenvolvimento da boa 
literatura infantil, bem como a instituição de 
bibliografia para crianças‖ 
18
. 
 
Como se pode observar, a primeira incumbência da Comissão foi organizar uma 
relação de livros de literatura infantil em língua portuguesa (originais e traduzidas), que 
circulavam no Brasil, além de emitir pareceres críticos sobre os mesmos. A professora 
Elvira Nizynska se encarregou dessa primeira tarefa e organizou uma lista com 500 
títulos de livros infanto-juvenis existentes no Brasil. Lamentavelmente, os pareceres 
 
 
18
 Portaria publicada em D.O em 4 de maio de 1936, p. 9277. GCg1936.04.29p.430. rolo 42. fot. 814 a 
1006 
 10 
críticos referentes a esses livros não foram encontrados dentre os documentos da CNLI. 
Embora exista menção a eles em uma entrevista que Jorge de Lima concedeu ao jornal 
A Tarde (c.1938), do Rio de Janeiro. 
 
―[A.Tarde]: E que fez a comissão desde o seu 
início? 
 [Jorge de Lima] Fizemos tudo isso – 
Estabelecemos uma ficha especial para julgar os 
livros. Lemos e julgamos sob este critério 
centenas e centenas de obras. Estabelecemos 
prêmios e conferimo-los a vários escritores e 
pintores de assuntos infantis, como Santa Rosa, 
Jardim e Lúcia Miguel Pereira entre os mais 
dignos. ‖
19
 
 
 Nessa mesma entrevista, quando perguntado sobre o que a CNLI havia feito, 
Jorge de Lima respondeu que criaram uma Ficha Especial de Avaliação com diversos 
critérios, considerando as características positivas ou negativas de todos os livros 
infanto-juvenis que estavam sob apreciação. A ficha avaliativa foi utilizada tanto para 
julgar os livros já publicados no Brasil quanto outros livros, inéditos, que anteriormente 
fizeram parte do concurso promovido em 1937 (que será tratado no próximo capitulo)
20
. 
 A segunda atribuição da CNLI era estabelecer uma lista com os livros em língua 
estrangeira que seus integrantes considerassem apropriados para a tradução. Tanto 
Elvira Nizynska quanto Jorge de Lima apresentaram as suas sugestões. Ao fim, cerca de 
duzentas obras foram analisadas e algumas indicadas para a tradução
21
. 
 O terceiro objetivo foi sugerir quais medidas deveriam ser tomadas pelo 
Governo para eliminar as obras que eventualmente não possuíssem valor artístico ou 
 
19
 Entrevista concedida por Jorge de Lima ao jornal A Tarde, do Rio de Janeiro (c.1938). 
 
20
 Dos 500 títulos analisados, 60 foram indicados como sendo os melhores e dignos de serem adotados 
por bibliotecas infantis e bibliotecas de escolas públicas. Tanto as fichas padrão quanto a lista dos livros 
indicados pela CNLI encontram-se no segundo capitulo desta dissertação. 
 
21
 Lista dos livros estrangeiros indicados para tradução. GCg1936.04.29p.430. rolo 42. fot. 814 a 1006 
 
 11 
fossem perniciosas. Entre 1936 e 1938, não foram encontrados indícios dessa atividade 
de censura da CNLI. No entanto, quando a Comissão de Literatura Infantil tornou-se 
parte do INEP, em 1939, Lourenço Filho redigiu uma carta ao MES com o pedido de 
proibição da venda de livros de aventuras policiais para crianças. O educador 
argumentava que as histórias de suspense e intrigas poderiam prejudicar o bom 
desenvolvimento intelectual, psicológico e moral dos pequenos leitores
22
. 
Se a censura da CNLI até 1938 não incidiu sobre os livros infantis, o mesmo não 
ocorreu com os jornais. Os componentes da Comissão redigiram uma carta à 
Associação Brasileira de Imprensa, que foi publicada em pelo menos três jornais do Rio 
de Janeiro
23
. Nessa carta, a Comissão salientava que as noticias sobre crimes e 
acidentes, com fotos amplamente divulgadas na imprensa, eram prejudiciais às crianças. 
Pediam, então, a colaboração da ABI, sugerindo aos editores que retirassem esse tipo de 
notícia ao menos das capas dos jornais. 
 
“A literatura infantil e os jornais. 
 
 O presidente da Associação Brasileira de 
Imprensa recebeu o seguinte importante oficio, 
tendo designado, desde logo, para se entender com 
a comissão, o nosso confrade Pinheiro de Lemos: 
―A Comissão de Literatura Infantil, abaixo 
assinada, constituída por portaria do Sr. Ministro 
da Educação e Saúde Pública, para o estudo da 
literatura infantil e seu aperfeiçoamento no país 
reconhecendo, desde o início de seus trabalhos, o 
extraordinário poder de penetração da imprensa e 
a importância que a revista e o jornal, de cunho 
especializado ou não para crianças e 
adolescentes,pode ter sobre a formação educativa 
das novas gerações, vem solicitar a V. Ex se digne 
de considerar o assunto, no seio desta prestigiosa 
associação, que tão louváveis serviços tem já 
prestado a cultura do país. A comissão 
 
22
 Ver: COSTA, Aline S. A Literatura Infantil no Governo Vargas: um estudo sobre A terra dos meninos 
pelados de Graciliano Ramos (1936 – 1939). Monografia de Fim de Curso. Universidade Federal do Rio 
de Janeiro, 2008. 
23
 Publicação da carta escrita pela CNLI à Associação Brasileira de Imprensa pedindo que se evitassem 
noticias de crimes e acidentes na primeira capa de jornais e revistas. 
 12 
autorizada pelo Sr. Ministro, pede permissão a 
V. Ex para sugerir seja estudado por uma 
comissão especial de membros dessa associação, 
o delicado problema dos efeitos da imprensa 
sensacionalista, sobre as crianças e adolescentes, 
especialmente no que diz respeito à publicação 
de extenso e minucioso noticiário sobre crimes 
de morte,roubos, suicídios e desastres 
impressionantes, apresentado com copiosa 
documentação fotográfica, cujos aspectos nem 
sempre são dos mais felizes, no que respeita à 
ação que a imprensa pode e deve ter sobre a 
educação do povo. Igualmente, seria de grande 
interesse e significação que essa associação fizesse 
uma ação de propaganda, no sentido de 
desenvolvimento, nos jornais e revistas de todo o 
país, de seções especialmente destinadas as 
crianças e aos jovens, cuja orientação educativa, de 
modo geral,pode ser feita, se assim for julgado 
conveniente, por meio de sugestões periódicas da 
Comissão de Literatura Infantil. Esta comissão, 
que se reúne todas as quintas-feiras, das 17 às 19 
horas, na sede do Ministério da Educação (Edifício 
Rex, 14° andar) receberá, com muito agrado, em 
qualquer de suas seções, a visita de V. Ex ou de 
membros dessa associação, empenhados no estudo 
do importante problema, e que tão perto interessa à 
formação das novas gerações. Com os seus 
agradecimentos, a comissão aproveita a 
oportunidade para apresentar à V. Ex os protestos 
de elevada estima e distinta consideração. 
 
A comissão: (a.a) Lourenço Filho; José 
Lins do Rego; Jorge de Lima; Maria Eugênia 
Celso; Elvira N da Silva; Manoel Bandeira e 
Murilo Mendes ―
24
 
 
 
 O quinto objetivo da CNLI era incentivar e promover a boa literatura infanto-
juvenil. Para cumpri-lo, a Comissão indicou uma listagem bibliográfica com obras desse 
gênero, promoveu concurso literário e também apresentou um projeto para a criação de 
bibliotecasinfanto-juvenis. Das principais ações propostas, a mais importante foi o 
concurso que iria premiar ao todo nove livros, divididos em três categorias (para 
 
24
 Jornal O Globo, 3 de junho de 1936. A mesma nota carta foi publicada nos jornais: Jornal do 
Comercio; Jornal do Brasil e Diário Carioca, todos circulantes no Rio de Janeiro (os três últimos, a 
publicação foi no jornal do dia 4 de junho de 1936). 
 13 
crianças de 03 a 06 anos; de 07 a 10 anos e por fim, para crianças a partir dos 11 anos). 
O concurso ocorreu em 1937 e premiou diversos autores, alguns bastante conhecidos à 
época
25
. Além disso, como decorrência do mesmo concurso, Murilo Mendes sugeriu 
que o Ministério também financiasse a edição de livros em material mais simples, para 
que os preços dessas edições fossem barateados e estivessem ao alcance da maioria das 
crianças. 
Também visando à formação do público leitor infanto-juvenil, a CNLI propôs a 
criação de Centros de Cultura e Lazer, no qual haveria uma Biblioteca para crianças e 
jovens. Pensada para oferecer um ambiente que estimulasse as crianças e jovens a ler, 
quebrando assim o ambiente tradicionalmente rígido das bibliotecas, nelas as estantes 
ficariam ao alcance do público leitor. Também seria oferecido nesses centros culturais 
teatro infantil, seções de cinema, aulas de música e dança, jogos e atividades recreativas 
de cunho educativo que contribuíssem para a formação das crianças e dos jovens, 
complementando, assim, a educação escolar. 
 A criação da Comissão Nacional de Literatura Infantil foi anunciada durante o 
Evento Comemorativo de aniversário de 28 anos da morte do escritor Italiano Edmundo 
de Amicis, autor de Cuore (1886), traduzido no Brasil por João Ribeiro (data da 
tradução)
26
. O evento ocorreu no salão da Faculdade de Belas Artes na segunda semana 
 
25
 Dentre os vencedores do concurso estavam: 
1° Categoria (crianças de 03 a 06 anos): 1°)Santa Rosa, O Circo; 2°) Luiz Jardim, O tatu e o macaco; 
3°) Paulo Werneck e Margarida Estrela, A Carnaubeira. 
 
2° Categoria (crianças de 07 a 10 anos): 1°) Marques Rebelo, A casa das três rolinhas; 2°) Lúcia Miguel 
Pereira, A fada menina; 3°) Graciliano Ramos, A terra dos meninos pelados. 
 
3° Categoria (crianças a partir da 10 anos): 1°) Erico Veríssimo, As aventuras de Tibicuera; 2° ) JR 
Alves, O boi de Aruá. 
 
 
26
 Ver: SANDRONI, Laura. De Lobato a Bonjunga: as reinações renovadas. Rio de Janeiro: Agir, 1987. 
 
ZILBERMAN, R.; MAGALHÃES, L. C. Literatura Infantil: Autoritarismo e Emancipação. São Paulo, 
Ática, 1987. 
 
 14 
de março de 1936. Nesse evento, diversos escritores e pedagogos foram convidados e 
proferiram palestras sobre a situação do livro infanto-juvenil no país. Quase um mês e 
meio após essas comemorações, em 30 de abril de 1936, Gustavo Capanema convocou 
a primeira Reunião da Comissão Nacional de Literatura Infantil, mas apenas em 4 de 
maio a portaria — que comunicava sua criação — foi publicada em D.O
27
. 
 
 
Foto tirada durante o evento em comemoração ao aniversário de morte de Edmundo de Amicis, em março 
de 1936. Na foto estão presentes alguns participantes da Comissão Nacional de Literatura Infantil. Na 
primeira fileira da esquerda para a direita, sentados, estão: Lourenço Filho (o primeiro), o ministro 
Gustavo Capanema (o terceiro) e Elvira Nizynska da Silva (com roupas claras, na ponta direita). De pé 
está Manuel Bandeira, o terceiro da esquerda para a direita
28
. 
 
 
 Vale lembrar que o livro de Edmundo de Amicis contava o cotidiano de um 
menino italiano durante seu ano letivo. Escrito durante o período da unificação italiana, 
Cuore trazia episódios nos quais os valores familiares, a Escola e o sentimento nacional 
 
27
 A Primeira Reunião da Comissão Nacional de Literatura Infantil foi noticiada pelo periódico O Jornal, 
em 1° de maio de 1936, Rio de Janeiro. A foto que ilustra a capa desta dissertação pertence a essa 
reportagem. ( Acervo Jorge de Lima de Recortes de Jornal; Pasta 06. – Arquivo Casa de Rui Barbosa). 
28
 Acervo de Fotos Digitalizadas do Arquivo Pessoal de Lourenço Filho. CPDOC – FGV. Título: 
Conferência em homenagem à Edmundo de Amicis. 
 15 
eram exaltados – sobretudo no que se refere à idéia da ―Grande Itália‖. Em seu livro, 
Amicis sempre representava família como a base dos valores sociais, e a Escola, em 
complemento, era uma espécie de pequena nação que visava refletir mimeticamente a 
unidade da sociedade italiana. Para ele, portanto, a Escola era uma espécie de balão de 
ensaio que prepararia a criança para o exercício da vida cívica. 
 Bastante lido no Brasil dos anos de 1930, Cuore foi um dos indicados como 
melhor livro infanto-juvenil. A obra tem o formato de diário, no qual o menino Henrico 
Bottini, estudante do terceiro ano da escola primária, conta o seu dia-a-dia: as lições 
aprendidas, a relação com os amigos e a família. Com suas histórias edificantes e lições 
ficcionalizadas de História e Geografia italiana, Amicis pretendia que o livro fosse 
adotado pelas escolas públicas e auxiliasse o ensino Moral e Cívico. 
 
―Outubro, 2° feira, 17. 
Primeiro Dia. 
 
Primeiro dia de escola, hoje. Vão longe como um 
sonho aqueles três meses de férias no campo! De 
manhã, mamãe levou-me para matricular na classe 
adiantada. O campo não me saía da cabeça e eu ia 
de mau humor. As ruas estavam cheias de 
meninos; as duas livrarias apinhavam-se de pais e 
mães que compravam bolsas, cadernos e carteiras. 
Diante da escola havia tanta gente que o bedel e o 
guarda civil a muito custo conseguiram deixar a 
porta desimpedida. [...] 
A minha mestra da primeira classe cumprimentou-
me da porta, olhando-me e dizendo-me com 
tristeza: 
 – Tu vais agora para o andar de cima, para a 
classe adiantada, e nem ao menos te verei passar! 
[...]‖ 
29
 
 
Do ponto de vista estético, esse livro guarda proximidade com o romantismo. Há 
forte apelação emocional (começando pelo título, Cuore) e a temporalidade da história 
 
29
 AMICIS, Edmundo de. Coração. Rio de Janeiro, Francisco Alves, 1959. 
 
 16 
segue uma ordem cronológica linear (o calendário escolar). A preocupação com a 
descrição do ambiente e a pretensão de contar histórias que se aproximassem do 
cotidiano infantil também eram elementos que caracterizavam o livro de Edmundo de 
Amicis. Os aspectos emotivos também aparecem nos personagens, que são exaltados 
por suas condutas morais exemplares – em especial, as crianças
30
. 
 
 
A criação da Comissão Nacional de Literatura Infantil não passou despercebida 
e foi noticiada na imprensa. Algumas pequenas notas saíram nos jornais Jornal do 
Comércio (1° de maio de 1936; Rio de Janeiro); A Gazeta de Notícias (Rio de Janeiro 
em 2 de maio de 1936); Estado de Minas (1° de maio de 1936, Belo Horizonte). A 
seguir, a nota publicada pelo periódico O Jornal, do Rio de Janeiro, em 1° de maio de 
1936: 
 
 
 ―Prosseguindo a execução do plano recentemente 
posto em destaque por ocasião das comemorações 
de Edmundo de Amiccis o Sr. Gustavo Capanema 
nomeou uma comissão composta das senhoras 
Maria Junqueira Schmidt, Cecília Meireles, Elvira 
Nizinska e senhores Jorge de Lima, Murilo 
Mendes, José Lins do Rego e Manuel Bandeira. 
 O ministro da Educação determinou para a 
referida comissão as seguintes incumbências: 
 Organizar uma relação de obras de literatura 
infantil em língua portuguesa, originais ou 
traduzidas; escolher dentre as obras de literatura 
infantil em língua estrangeira, aquelas cuja 
tradução seja conveniente; indicar as idades das 
crianças a que cada obra literária possa convir; 
indicar ao governo as providências que devem ser 
tomadas para a eliminação das obras deliteratura infantil perniciosa ou sem valor; 
indicar as providências tendentes para 
promover em todo país o desenvolvimento da 
 
30
 Ver: COELHO, Nelly Novaes. Literatura Infantil: Teoria, Análise, Didática. São Paulo: Moderna, 
2000. 
ZILBERMAN, R.; MAGALHÃES, L. C. Literatura Infantil: Autoritarismo e Emancipação. São Paulo, 
Ática, 1987. 
 
 17 
boa literatura infantil, bem como a instalação 
de bibliotecas para crianças.‖ 
31
 
 
 
Além das notas sobre a criação da CNLI, Raymundo de Magalhães Junior, 
também publicou no O Jornal de 08 de maio de 1936 o seguinte artigo: 
 
―A literatura infantil não é uma coisa tão simples 
quanto pode parecer à primeira vista. É questão de 
alto interesse humano e social. Dela, porém, jamais 
se cuidou no Brasil. A questão tem aspectos 
delicadíssimos. O livro infantil, sobretudo pela sua 
falta de fiscalização pode tornar-se um veículo 
poderoso, e tão nocivo quão poderoso, de difusão 
de idéias dissolventes, de pontos de vista falsos, de 
doutrinas inconvenientes e contrárias à nossa 
formação social, moral e até mesmo política. 
Tenho de mim e para mim que um dos nossos 
defeitos máximos é gerado, sobretudo, pela má 
educação da mocidade. É o defeito da indiferença, 
do conformismo, do ―assim está bem‖, do ―vamos 
deixar como está‖. É necessária uma grande dose 
de equilíbrio, um senso perfeito e apurado, para 
não se toque um dos extremos – ambos 
equivalentes em seus efeitos: o do “porque me 
ufano do meu país” incutindo nos garotos 
noções que não condizem com a nossa realidade, 
– o maior e mais rico país onde a natureza de 
excedeu em tudo, o que acaba deixando a 
impressão de que é desnecessário e inútil o 
esforço humano – ou o pessimismo doentio, o 
ceticismo, o desalento, a desesperança dos que não 
nos julgam capazes de realizar coisa alguma, dos 
que acreditam que só um Brasil fragmentado, 
subdividido, desarticulado, poderá progredir e 
enriquecer [...] 
A comissão, para melhor realizar seu 
trabalho, deve classificar as obras de acordo com a 
idade dos pequeninos leitores. É uma providência 
que não podia deixar de ter sido adotada. Nos 
primeiros anos, já é grande coisa despertar o 
interesse dos guris para leitura. É a época do 
maravilhoso, do reino encantado, das fantasias 
poéticas de Grimm, de Perrault e de Andersen. Dos 
cinco aos dez anos não se deve cansar a memória 
das crianças com a sobrecarga de outros 
conhecimentos além daqueles que constituem os 
seus deveres escolares, mesmo que esses 
 
31
 O Jornal, 01 de maio de 1936. Acervo Jorge de Lima – Casa Rui Barbosa; Pasta 06. 
 18 
conhecimentos sejam dissimulados sob a forma de 
diálogos ou historietas. As crianças têm direitos 
que ninguém mais pode ter ou reclamar. Têm o 
direito à poesia, ao maravilhoso, ao sonho com as 
coisas impossíveis. [...] A transição entre o 
maravilhoso e os conhecimentos práticos deve ser 
feita lentamente. Depois dos dez anos ou mesmo 
dos oito, já podem discernir melhor sobre certos 
assuntos, consultar, comparar, tirar conclusões. É o 
tempo dos ―livros úteis‖. Estes, no entanto, devem 
ser ao mesmo tempo próprios para as crianças. 
Essa é a tarefa da comissão, tarefa necessária de 
higiene e de saneamento mental. Produzirá, 
entretanto, resultados eficientes, positivos, 
dourados, a iniciativa que o Sr. Gustavo Capanema 
acaba de lançar, enfrentando um problema novo na 
esfera das suas largas e complexas atribuições? 
Entendo que só se obterá esse resultado se a 
comissão tiver um caráter efetivo e as obras 
destinadas às crianças, como jornais infantis e 
ainda as ―horas infantis‖ das estações de rádio 
ficarem sob a sua censura prévia, que ninguém 
poderá iludir. Fora disso não terá proveito a 
iniciativa governamental, pois em pouco voltará o 
abuso e a obra da comissão além de efêmera, será 
unilateral. É como se alguém se lembrasse de 
fechar o sangradouro de um açude, deixando dez 
outros abertos, ao ímpeto da água fugidia...‖ 
32
 
 
 
O artigo escrito pelo teatrólogo e jornalista Raymundo de Magalhães Junior 
chamava a atenção para o potencial educativo que a literatura infanto-juvenil possuia. 
Para ele, havia a necessidade de que essas obras fossem cuidadosamente analisadas para 
evitar que idéias contrárias à moral e à política vigentes fossem veiculadas. Mas a 
principal preocupação do escritor era com o tipo de nacionalismo que os livros infantis 
apresentavam: ele era contrário ao ufanismo de Afonso Celso, que ao exaltar 
excessivamente as nossas qualidades naturais conduzia os jovens não só ao sentimento 
de xenofobia, mas também ao de inércia cívica — isto é, à veneração cega das virtudes 
naturais do país (exuberância da flora e fauna brasileiras, etc...) — o que impediria as 
novas gerações de compreender os verdadeiros problemas da nação. Ademais, ele 
 
32
 O Jornal . Rio de Janeiro, 8 de maio de 1936. Acervo Jorge de Lima, Pasta n°6. Casa de Rui Barbosa. 
 19 
também criticava o excesso de realismo edificante, que suprimia o caráter fantasioso e a 
livre imaginação infantil, conduzindo o jovem leitor ao mundo adulto sem qualquer 
mediação. Para Magalhães Junior, as crianças, sobretudo aquelas entre 05 e 10 anos, 
necessitam da fantasia, dos contos maravilhosos e da poesia para se desenvolver 
gradualmente, tanto intelectual quanto psicologicamente. Quando propôs uma 
classificação dos livros infanto-juvenis por faixa etária, ele apontava para uma nova 
concepção de criança e infância, afirmando que a formação psíquica e intelectual 
infantil se realizava através de sucessivas e específicas fases — o que era compatível 
com as modernas teorias sobre criança e a infância, em especial a de Jean Piaget. 
Por fim, Raymundo de Magalhães Junior salientava a importância que a 
Comissão deveria dispensar aos programas de rádio e demais produções culturais 
especificas para as crianças. Com isso, na sugestão dele, a CNLI não deveria apenas 
ocupar-se dos livros de literatura infantil, mas de todas as produções culturais voltadas 
para o publico infanto-juvenil. 
 
Convém recordar que a preocupação com a formação de leitores na infância, no 
Brasil, não foi inaugurada pela Comissão Nacional de Literatura Infantil. Desde finais 
do século XIX 
33
, quando Carlos Jansen
34
 traduziu e adaptou livros para o público 
infantil e juvenil (dentre os contos traduzidos estão: Contos Seletos das Mil e Uma 
Noites (1882) e Robinson Crusoé (1885)), já havia sinais evidentes dessa preocupação. 
 
33
Ver: SOARES, Gabriela Pellegrino. Semear horizontes: uma história da formação de leitores na 
Argentina e no Brasil, 1915-1954. Belo Horizonte: Editora UFMG/ FAPESP, 2007; 
 LAJOLO, Marisa. Literatura infantil brasileira: história e crítica. São Paulo: Ática, 1984; 
SANDRONI, Laura. De Lobato a Bonjunga: as reinações renovadas. Rio de Janeiro: Agir, 1987. 
34
 Carlos Jansen (1829 – 1889) era alemão, mas viveu muitos anos no Brasil. Foi professor e escreveu 
livros didáticos, como uma cartilha para o ensino de língua alemã. Traduziu diversos livros infantis, como 
Contos Seletos das Mil e Uma Noites (1882) e Robinson Crusoé (1885). 
 20 
Muitos outros escritores, como Figueiredo Pimentel
35
, Julia Lopes de Almeida
36
 e Tales 
de Andrade
37
, também foram atuantes na escrita de histórias específicas para jovens 
leitores. 
Outro autor que se ocupou de livros para crianças foi Olavo Bilac
38
. Dentre os 
livros escritos por ele estão ―Poesias infantis‖ e ―Teatro para crianças‖, mas o mais 
famoso e significativo — segundo especialistas em literatura infantil
39
 — foi Através do 
Brasil, no qual se percebe forte caráter pedagógico, procurando ensinar às crianças o 
português formal e lições sobre aHistória e a Geografia do Brasil
40
. As preocupações 
apresentadas nos livros infantis de Olavo Bilac também estavam presentes nas obras de 
 
35
 Alberto Figueiredo Fimentel (1869 – 1914), nascido em Macaé, no Rio de Janeiro. Escreveu poesias e 
crônicas. Foi também tradutor e escritor de obras infantis, como Contos da Carochinha (1894) e 
Histórias da Avozinha (1896). Também atuou como colaborador do jornal Gazeta de Notícias. 
36
 Júlia Lopes de Almeida (1862 – 1934) nasceu no Rio de Janeiro. Mudou-se ainda criança com a família 
para a cidade de Campinas, em São Paulo, onde anos mais tarde iniciou sua carreira de escritora com 
poesias e contos para o jornal Gazeta de Campinas. Escreveu também artigos, contos e romances para 
jornais e revistas femininas, tais como A Família (SP- 1888 – 1889); A mensageira (SP, 1898 – 1900) e 
Revista Feminina ( SP 1915-1917). Dentre os livros voltados às crianças estão Contos Infantis (1886); 
Histórias da nossa terra (1907) e Era uma vez... (1917). Algumas vezes utilizava-se de pseudônimos, e o 
mais conhecido era Jacinto Filinto de Almeida. Importante ressaltar que Júlia Lopes de Almeida foi tão 
importante em seu período que seu nome foi indicado para assumir uma cadeira na Academia Brasileira 
de Letras. Entretanto, apenas homens compunham a Academia na época, e por isso decidiram indicar o 
nome do escritor português Filinto de Almeida, marido de Julia Lopes de Almeida, para representá-la na 
ABL. 
37
 Tales Castanho de Andrade (1890 – 1977) nasceu na cidade de Piracicaba em São Paulo. Na juventude, 
trabalhou como tipógrafo no jornal Gazeta Piracicabana, além de ajudar o pai na indústria de bebidas da 
família. Estudou em colégios tradicionais e a partir de 1912, na cidade de Jaú, também em São Paulo, 
iniciou sua carreira como professor. Sua atuação foi na formação de professores, na Escola Normal de 
São Paulo. Lecionou as disciplinas de História da Civilização, História do Brasil e História das Américas. 
Dentre suas obras para crianças mais conhecidas estão: Coleção Encantos e Verdades (1919 – Editora 
Melhoramentos); Saudade (1919) e Ler Brincando (1949), esta última era uma cartilha, lançada pela 
editora Companhia Nacional; 
 
38
Olavo Bilac era, no início dos anos de 1930, um dos escritores mais conhecidos, tanto que em seu 
inquérito sobre gostos literário infantis, realizado pelo Departamento de Educação do Distrito Federal, 
Cecília Meireles indica ser ele o autor mais citado como conhecido pelas crianças. 
 
39
 Ver: LAJOLO, Marisa. Usos e abusos da literatura na escola: Bilac e literatura escolar na república 
velha. São Paulo: Ática, 1998. 
ARROYO, Leonardo. Literatura Infantil Brasileira. São Paulo: Melhoramentos; 1967. 
 
40
 Ver: LAJOLO, Marisa Usos e abusos da literatura na escola: Bilac e literatura escolar na república 
velha. São Paulo: Ática, 1998. 
 
 21 
Julia Lopes de Almeida, mas com algumas distinções
41
. Esses livros possuíam histórias 
nas quais o bom comportamento infantil e a obediência aos valores pátrios e familiares 
eram valorizados. Outro escritor, Tales de Andrade, escreveu uma coleção de livros 
intitulada ―Encantos e Verdades‖ 
42
, lançada em 1925 pela Editora Melhoramentos, em 
São Paulo. Esta coleção reunia uma série de livros escrita pelo autor, tais como 
Saudades (1919); A filha da floresta (1921) e El rei D. Sapo (1923), livros presentes na 
lista de livros infantis considerados bons segundo a Comissão Nacional de Literatura 
Infantil, criada em 1936 pelo ministro da Educação e Saúde Gustavo Capanema e 
estudou os livros infantis produzidos no Brasil até aquele momento. 
 Apesar de outros literatos e pedagogos escreverem livros infantis nesse 
momento, foi o escritor Monteiro Lobato que se tornou referência como autor de livros 
infantis. Lobato, além de investir no empreendimento editorial para crianças, também 
escreveu uma série de livros infantis. Seus livros, embora preocupados com a educação 
em algum sentido (como, por exemplo, ―Gramática de Emília‖), já apresentavam 
preocupações estéticas que não eram secundárias às características pedagógicas. Sua 
obra infantil possui como principais características as crianças em posição de sujeito 
ativo – curiosas e questionadoras. Há também exaltação ao elemento ―fantasia‖, em 
oposição a algumas obras oferecidas às crianças até então, cuja principal característica 
era a busca por um ―realismo‖, pretendendo-se que as histórias refletissem a sociedade 
da qual as crianças faziam parte. 
 
41
 LAJOLO, Marisa. Usos e abusos da literatura na escola: Bilac e literatura escolar na república velha. 
São Paulo: Ática, 1998. 
 
LAJOLO, Marisa. Literatura Infanto-juvenil brasileira: História e histórias. São Paulo: Ática, 2003. Para 
Marisa Lajolo, Julia Lopes de Almeida, em seus livros, demonstrava uma maior preocupação com os 
valores morais e o ensino da língua e da História do Brasil. Já Olavo Bilac, além da preocupação 
pedagógica ―escolar‖, também se preocupava com a formação do sentimento nacional dos pequenos 
leitores. 
 
42
 Embora autor de livros infantis conhecidos à época, Tales de Andrade não fez parte da Comissão 
Nacional de Literatura Infantil. 
 22 
Havia um debate em torno do livro infanto-juvenil que agregava diferentes 
posições em relação a sua forma e conteúdo. Maria Eugênia Celso, em artigo para o 
jornal Correio da Manhã, preocupou-se em fazer uma defesa dos elementos fantásticos 
nos livros infantis. Tal preocupação tornou-se bastante compreensível se levarmos em 
consideração que autores consagrados como Olavo Bilac, Joaquim Manuel de Macedo e 
Afonso Celso (pai de Maria Eugênia Celso) acreditavam que os livros infantis deveriam 
apresentar histórias edificantes, em linguagem sempre formal e correta, sem a 
contaminação por ―noções equivocadas ou falsas‖. Para esses autores, os elementos 
fantásticos prejudicariam o desenvolvimento intelectual dos pequenos leitores e 
deveriam, portanto, ser evitados 
43
. 
Esses debates sobre a literatura infantil e a preocupação com a criação de 
bibliotecas infanto-juvenis similares às já existentes em países como França, Inglaterra e 
Estados Unidos da América ocorreram principalmente entre os educadores vinculados à 
Associação Brasileira de Educação (ABE). Fizeram parte deste debate a professora 
Juraci Silveira, a poetisa Cecília Meireles, os educadores Anísio Teixeira e Lourenço 
Filho e a professora Elvira Nizynska da Silva
44
. 
Em 1926, educadores ligados a ABE promoveram um inquérito que procurou 
averiguar as preferências literárias infantis. Essa pesquisa, todavia, não foi a única. Em 
1931, Cecília Meireles realizou um inquérito sobre os gostos literários infantis (nesse 
período, o educador Anísio Teixeira era o Direção Geral de Instrução Pública do distrito 
Federal). Em Minas Gerais, a professora Helena Antipoff também realizou semelhante 
 
43
 Ver: LAJOLO, Marisa Usos e abusos da literatura na escola: Bilac e literatura escolar na república 
velha. São Paulo: Ática, 1998. 
HANSEN, Patrícia dos Santos. Brasil, um país novo: literatura cívico-pedagógica e a construção de um 
ideal de infância brasileira na Primeira República. PUC SP; 2007. 
 
44
 Através dos documentos analisados, apesar de Elvira Nizynska da Silva não ter assinado o Manifesto 
dos Pioneiros, foi possível identificar em seu discurso idéias vinculadas ao movimento da Escola Nova, 
como será analisado posteriormente neste trabalho. 
 
 23 
pesquisa com alunos de escolas públicas
45
. Esses inquéritos e demais trabalhos 
realizados foram utilizados pela CNLI para auxiliar na classificação de livros infantis e 
como embasamento empírico e teórico dos pareceres escritos. Assim, apesar de não ter 
inaugurado os debates sobre a Literatura InfantilBrasileira, a CNLI representou a 
institucionalização destes. Além disso, apresentou uma outra proposta de literatura 
infantil a ser valorizada, que era diferente daquela escrita por autores da virada do 
século XIX para o XX. 
 A Comissão Nacional de Literatura Infantil estava a par das discussões ocorridas 
nos anos de 1920 e 1930 sobre a criança e a infância e isso possibilitou que a voz da 
criança fosse ouvida, tornando-a, de certa forma, protagonista deste processo de definir 
os livros que lhes fossem mais apropriados. Nesse sentido, a nova concepção de 
infância, trazida pela Psicologia Experimental, fez com que não fosse apenas 
considerado aquilo que especialistas entendiam como sendo o livro infantil, mas 
também que suas historias estivessem de acordo com o gosto das crianças. Pode-se 
entender essa participação a partir do ―protagonismo infantil‖ trazido pelos novos 
estudos e adotados pelos educadores ligados à Renovação do Ensino. Enquanto seres 
dotados de pensamento e reagindo ao ensinamento que lhes eram ministrados, as 
crianças passaram a ser o centro da atenção dos educadores. Assim, não era apenas 
importante estabelecer critérios e fórmulas para uma boa literatura infantil, mas também 
considerar a opinião dos jovens leitores. 
 A partir da concepção de que a criança necessita dos elementos fantásticos, da 
imaginação para interagir com o mundo e de, aos poucos, adquirir conhecimentos sobre 
ele, a Comissão passou a defender uma literatura que partisse do imaginário e, 
paulatinamente, desse à criança a dimensão da vida real (harmonia entre o real e o 
 
45
 SILVA, Elvira Nizynska da. Os problemas da Literatura Infantil. In: Infância, ano 02; 1936. Este 
artigo será explorado mais adiante. 
 24 
imaginário). Diante disso, os poetas modernistas que participaram da CNLI demonstram 
suas concepções de estética. Não mais excessivamente preocupados com uma 
verossimilhança que se queria imitação perfeita do mundo extra-ficcional, a 
preocupação maior da CNLI era destinar às crianças e jovens histórias plausíveis, 
convincentes dentro de um dado universo criado na ficção. Além de uma linguagem 
fácil, simples e acessível às crianças, o livro infanto-juvenil deveria preocupar-se em 
apresentar histórias que envolvessem os pequenos e jovens leitores. No entanto, a 
preocupação com os elementos estéticos dos livros e o gosto de leitura infanto-juvenil 
não significou a despreocupação com seu caráter pedagógico: o livro infantil continuava 
sendo visto como um aliado do processo de socialização infantil. Contudo, na CNLI 
essa preocupação é demonstrada de maneira distinta. Para Afonso Celso, Julia Lopes de 
Almeida e Olavo Bilac o livro infantil deveria conter histórias que seguissem a um 
padrão estético realista e a partir de histórias edificantes, ensinar boas maneiras e 
condutas morais e sociais exemplares. A Comissão, por sua vez, afirmava que o livro 
infantil deveria cumprir tais funções, mas a partir de histórias fantásticas, ensinando e 
divertindo ao mesmo tempo, levando também em consideração o gosto literário infanto-
juvenil. 
 O último papel do livro infanto-juvenil, isto é, divertir, estava em segundo plano 
durante os primeiros anos de República. Com a CNLI, ele volta a ter importância e a 
dividir espaço com o caráter pedagógico comum ao livro infanto-juvenil. Dessa forma, 
atendendo aos gostos das crianças pelos contos maravilhosos, a Comissão premiou 
livros que seguissem a essas expectativas infantis. Contudo, não bastava que o livro 
fosse do gosto da criança ou do jovem, o caráter educativo também eram essenciais para 
um bom livro infanto-juvenil. 
 25 
 Assim, a concepção de criança apresentada pela CNLI era a de um ser em 
formação, mas com características psicológicas distintas e com necessidades 
específicas, diferentes dos adultos. Diante dos ―modernos estudos‖ sobre a criança e a 
infância, ela deixa de ser um ―papel em branco‖ para ser aquela com mecanismos 
próprios de construir conhecimento, que devem ser respeitados, mas orientados pelos 
adultos (principalmente pais e professores). Com isso, em nome do desenvolvimento do 
futuro cidadão, não era possível à criança ter sempre seus desejos satisfeitos, mas era 
importante – ao menos no que se refere à literatura infantil – que se unisse ―o útil (para 
os especialistas, que era educar a criança para a vida em sociedade) ao agradável (aquilo 
que era interessante, que chamava a atenção das crianças). 
 
 
I.1) As políticas culturais do MES e a Comissão Nacional de Literatura Infantil. 
 
A criação da Comissão Nacional de Literatura Infantil fez parte das ações 
culturais implementadas pelo MES durante a gestão de Gustavo Capanema (1935 – 
1845). Encarregado não apenas de estruturar a Educação Formal, o MES deveria 
também ocupar-se com a formação de um novo ethos, que representaria o novo Estado 
que estava sendo criado
46
. Dessa forma, em seu caráter amplo de educação, o MES 
também se preocupou em criar projetos para a promoção da cultura nacional (concursos, 
Comissões Especiais, Eventos Cívicos, Projetos na área de Saúde, etc). Nos anos de 
1930, muitos eram os projetos em torno da Educação e da Cultura Nacional, e o 
Governo Vargas, através principalmente do MES, trouxe para si essas discussões, 
procurando orientá-las de acordo com as necessidades e interesses desse novo Estado. 
 
46
 Ver: SCHWARTZMAN, Simon; BOMENY, Helena. (org). Tempos de Capanema. São Paulo: Editora 
Paz & Terra; 2000. 
 26 
Dentre os grupos que disputavam espaço na educação estavam os Católicos 
(representados por Alceu Amoroso Lima e os educadores vinculados à Associação dos 
Professores Católicos do Distrito Federal) e os educadores adeptos da Escola Nova 
(cuja participação mais atuante foi através da Associação Brasileira de Educação). O 
primeiro grupo defendia que a Igreja, em conjunto com a Família, deveria ser a 
responsável pela educação dos jovens e das crianças. Nesse sentido, os intelectuais 
católicos defendiam, em primeiro lugar, o ensino religioso nas escolas públicas. A 
postura do laicato católico deve ser entendida como uma tentativa da Igreja Católica 
reconquistar seu espaço de atuação polícia na sociedade brasileira, perdido após a 
instauração da República, que separou o Estado da Igreja
47
. A Igreja pretendia assegurar 
sua importância na formação das novas gerações, e para isso, além da defesa do ensino 
religioso, escrevia inúmeros artigos ressaltando a importância da Igreja Católica na 
sociedade brasileira e atacando ferozmente aqueles que pretendiam instaurar a Educação 
Renovada, cuja principal característica era a expansão do ensino laico. 
 Os educadores defensores da Escola Nova, cujos principais nomes foram Anísio 
Teixeira, Lourenço Filho e Fernando de Azevedo, defendiam uma escola pública laica, 
um ensino voltado para as necessidades práticas da sociedade, público e universal. As 
concepções educacionais defendidas pelo movimento da Escola Nova tinham por base 
os estudos e projetos educacionais realizados nos Estados Unidos, França e Inglaterra 
nas décadas de 1920 e 1930. Não obstante o grupo não apresentasse uma concepção 
educacional homogênea, definida, criticava duramente a velha didática, baseada na 
repetição dos conhecimentos, na disciplina rígida (quase militar) e na autoridade 
máxima do professor. Propunham um ensino dinâmico, no qual a criança deveria 
 
47
 Ver: CÔRTES, Norma. Católicos e autoritários: Breves considerações sobre a sociologia de Alceu 
Amoroso Lima. In: Revista Intelectus. Ano I n° 1. http://www.uerj.br/~intelectus 
 
SCHWARTZMAN, Simon; BOMENY, Helena. (org). Tempos de Capanema. São Paulo: Editora Paz & 
Terra; 2000. 
http://www.uerj.br/~intelectus
 27 
aprender vivenciando situaçõesque mais tarde lhes seriam cotidianas. Nas escolas que 
seguiram o Ensino Renovador os alunos eram estimulados a participar ativamente das 
aulas; nos laboratórios havia observação dos experimentos realizados e nas bibliotecas 
estimulava-se a pesquisa por parte dos alunos. 
 As disputas entre Escolanovistas e Católicos tiveram seu auge durante a criação 
das universidades no Distrito Federal. Em 1935, sob a gestão de Anísio Teixeira na 
Direção de Instrução Pública do Distrito Federal, foi criada a Universidade Federal do 
Distrito Federal (UDF). O principal objetivo da UDF era o incentivo à pesquisa 
cientifica e à formação de professores do ensino secundário. É importante salientar que 
a UDF não foi a primeira universidade no Rio de Janeiro, pois desde 1920, com a união 
das faculdades de Direito e Medicina, além da Escola Politécnica, foi criada a 
Universidade do Rio de Janeiro
48
. No entanto, foi com a UDF que a universidade – que 
até então vinha desempenhando o papel de formar bacharéis e médicos – passou a se 
preocupar com a formação de professores e pesquisadores. 
 A UDF, no entanto, passou a ser alvo de duras críticas, principalmente advindas 
dos intelectuais católicos, que acusavam seu idealizador, Anísio Teixeira, de ser um 
comunista e exigiam intervenção do governo na universidade. Em 1939, a UDF foi 
fechada. A Universidade do Brasil passou por uma reestruturação e começou a oferecer 
cursos antes oferecidos pela universidade fechada. Foi o caso, pro exemplo, do curso de 
História. No entanto, a importância da formação de pesquisadores ficou em segundo 
plano, dando lugar à formação mais erudita, focada nos conteúdos disciplinares
49
. 
 
48
 FERREIRA, Marieta de Morais. ―Notas sobre a institucionalização dos cursos universitários de 
História no Rio de Janeiro‖. In: GUIMARÃES, Manoel L. Salgado (org). Estudos Sobre a Escrita da 
História. Rio de Janeiro: Editora Sete Letras; 2006. 
 
49
 Idem. 
 
 28 
 Apesar das críticas ao movimento da Escola Nova, algumas de suas idéias 
ganharam espaço nos projetos do MES. A idéia da formação para a vida prática e as 
novas técnicas pedagógicas foram pontos que ganharam a simpatia do Estado. Por outro 
lado, a defesa de uma Educação voltada para a democracia e os valores liberais era o 
ponto mais atacado por seus críticos, em especial, os Católicos. Todavia, é importante 
ressaltar que as querelas entre católicos e ―pioneiros‖ começaram a se acirrar a partir 
dos anos de 1930 — sobretudo após a IV Conferência Nacional de Educação, 
organizada pela ABE e que gerou polêmicas em torno da defesa da educação pública 
laica. Durante os anos de 1920, a ABE possuía como membros tanto os intelectuais que 
viriam a ser chamados de ―pioneiros‖, quanto aqueles defensores dos valores católicos 
na educação. Dentre os católicos havia defensores do movimento de renovação de 
ensino, e que, posteriormente, apresentaram uma versão católica da Escola Nova. Do 
mesmo modo, alguns educadores escolanovistas posicionavam-se (explícita ou 
implicitamente) a favor do ensino religioso nas escolas públicas
50
. Assim, o principal 
―pomo da discórdia‖ entre católicos e escolanovistas era a laicização do ensino e a 
exclusão do ensino religioso do currículo escolar. Alguns opositores também criticavam 
a idéia de liberdade presente na pedagogia escolanovista, argumentando que a liberdade 
concedida aos alunos prejudicava a autoridade do professor. 
 Vale lembrar que o governo instaurado em 1930 por Getúlio Vargas era 
esperado como uma alternativa ao Liberalismo, visto como um fracasso que levou o 
país e o mundo à crise (com seu ápice em 1929) e ao Comunismo - visto por muitos 
como um mal a ser combatido. Os grupos de apoio a Getúlio Vargas esperavam que o 
novo governo fosse centralizado e capaz de promover a modernização política, 
 
50
 Ver: CARVALHO, Marta M. Chagas de. ―O território do consenso e a demarcação do perigo: política e 
memória do debate educacional dos anos 30‖. In: FREITAS, Luciano Cezar de (Org). Memória do 
Intelectual da Educação Brasileira. São Paulo: EDUSP; 2002. 
 29 
econômica, social e cultural do país
51
. Nesse sentido, nas palavras de Francisco Campos 
(ministro da Educação e Saúde de 1931 a 1935), seria inútil educar para a democracia 
(como defendido por grande parte dos escolanovistas, inspirados pelas idéias de John 
Dewey), uma vez que ela era um modelo em decadência
52
. 
 Foi em 1934, com a nomeação de Gustavo Capanema para Ministro da 
Educação e Saúde, que as políticas de universalização do ensino e promoção da cultura 
nacional se intensificaram. Para auxiliar nessas políticas, Capanema contou com a 
colaboração de diversos intelectuais vinculados ao movimento Modernista
53
. Muitos 
desses intelectuais já possuíam laços de amizade com o ministro, sobretudo aqueles que 
compunham a chamada intelectualidade mineira (dentre os quais se encontram Carlos 
Drumond de Andrade, que durante a gestão Capanema no MES ocupou o cargo de 
secretário geral do Ministro) 
54
. 
 Se o desejo de modernização do Brasil, sobretudo na Cultura e na Educação, era 
um desejo em comum dessa geração intelectual dos anos de 1920 e 1930
55
, diferentes e 
divergentes eram as concepções políticas e projetos educacionais delas decorrentes. 
Capanema e seu antecessor, Francisco Campos, já haviam tecido pactos de apoio aos 
intelectuais católicos, no que se refere à indicação das diretrizes educacionais. Tanto 
 
51
 SCHWARTZMAN, Simon; BOMENY, Helena. (org). Tempos de Capanema. São Paulo: Editora Paz 
& Terra; 2000. 
52
 Ver: SCHWARTZMAN, Simon; BOMENY, Helena. (org). Tempos de Capanema. São Paulo: Editora 
Paz & Terra; 2000. 
 
53
 Idem. 
 
54
 Ver: SCHWARTZMAN, Simon; BOMENY, Helena. (org). Tempos de Capanema. São Paulo: Editora 
Paz & Terra; 2000. 
 
55
 O conceito de intelectual aqui utilizado é aquele apresentado por Daniel Pecault. Segundo o autor, no 
Brasil dos anos de 1930 o intelectual era aquele que possuía algum tipo de conhecimento sobre a 
sociedade brasileira. Assim, os intelectuais possuíam perfis profissionais diferenciados, e, em comum, 
compartilhavam certa tradição literária e a preocupação em estudar a sociedade brasileira em seus mais 
variados aspectos. Não havia, à época, a institucionalização de carreiras que hoje compõem o quadro das 
disciplinas nas universidades, como Letras, História, Geografia, Sociologia. Assim, as pesquisas 
realizadas por esses intelectuais era feita por iniciativa particular. 
 
Ver: PECAULT, Daniel. Os intelectuais e a Política no Brasil: entre o povo e a nação. São Paulo: Ática; 
1990. 
 30 
Francisco Campos quanto Gustavo Capanema mostravam-se afinados com as idéias 
católicas acerca da política e da melhor maneira de conduzir a educação. Uma das 
expressões mais importantes desse apoio foi o decreto lei de 1931, que permitia o 
Ensino Religioso em escolas públicas de ensino secundário. No entanto, o apoio dado 
aos católicos não significou uma total exclusão de intelectuais escolanovistas, tampouco 
que todas as novas concepções pedagógicas tenham sido banidas das reformas 
educacionais
56
. 
 No âmbito dos projetos voltados para a universalização cultural, Capanema criou 
comissões para incentivar diversas áreas da cultura, tais como o teatro, o cinema (visto 
como um instrumento potencial de educação do homem), o rádio (que durante os anos 
de 1930 contou com programas educativos, que eram ouvidos em várias escolas) e o 
livro Didático. A importância do rádio na sociedade dos anos de 1930 era tanta que a 
CNLI entrou em contato com o presidente da Rádio Nacional e este concedeu à 
Comissão um programa de 10 minutos diários para falar sobre Literatura Infantil. 
 O Estado, através do MES, cooptou diversos intelectuais

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